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Porandubas Políticas

Por dentro da política.

Gaudêncio Torquato
quarta-feira, 4 de outubro de 2023

Porandubas nº 824

O Estado forte Na primeira parte da coluna de hoje, tentarei analisar o porte do Estado. Um Estado forte ou um Estado mínimo? De pronto, a resposta: o Estado necessário. A intervenção do Estado O sociólogo Alain Touraine, que foi professor e amigo de Fernando Henrique, prega o aumento da capacidade de intervenção do Estado como forma de o país atenuar as desigualdades sociais. Seria este o caso do Brasil? O Estado tem sido fraco para debelar as mazelas sociais, a partir da violência nas cidades, como essa guerra de milícias como a que se observa no Rio de Janeiro? Autoritarismo Libelo candente contra os ultraliberais, para quem o mercado é a panaceia para todos os nossos males, a visão do professor não deixa de ser um hino de louvor às utopias. Pois Estado forte, no Brasil, tem sido sinônimo de autoritarismo, arbitrariedade, estrutura burocrática ineficiente e corporativismo. Como liberar o Estado do universo corporativo, como prega Touraine, dando-lhe uma capacidade de manobra, de orientação a longo prazo, sem uma profunda reforma política, capaz de deflagrar novos costumes e consolidar nossas instituições? Poder de decisão Só mesmo uma visão utópica é capaz de colocar na mesma equação componentes como liberalismo, eliminação de desigualdades sociais, Estado forte, maior institucionalização política, extinção do corporativismo e clientelismo. O fortalecimento do poder de decisão do Estado é uma meta que deve ser perseguida, até para se combater a cultura dos interesses individuais e grupais que, entre nós, prevalece sobre as políticas sociais. Mas este é um desafio que ultrapassa décadas, não sendo objeto de consideração de um só governo. O toma lá dá cá Por aqui, a reforma do Estado esbarra na cultura paroquial da política. O fisiologismo substitui a mudança do sistema. A lista de cargos ou liberação de recursos do orçamento é a chave para abrir as portas da política, o instrumento adequado para pavimentar a governabilidade. O fisiologismo é um dos galhos podres da árvore patrimonialista. A política volta a ser aquilo que Paul Valéry mais temia: "a arte de impedir que as pessoas cuidem do que lhes dizem respeito". Nesses tempos de grande influência da mídia, é bom ter cuidado, porque a espetacularização da política pode significar a ruína dos atores. As táticas A ciência política ensina que o reformador deve isolar cada questão o mais depressa possível, retirando-a da agenda política antes que os seus oponentes possam mobilizar suas forças. Se quiser tentar fazer tudo ao mesmo tempo, termina por conseguir pouco ou nada. Se angariar condições para operar em escala global, à base da blitzkrieg, é claro que deve fazer o cerco por todos os lados, rapidamente, antes que a oposição seja ativada. Ora, por aqui, a tática é a de fazer uma coisa por vez, de forma lenta e gradual. Estabilidade É assim que o país sobe a escada da mudança. Seu desafio, agora, é andar num ritmo mais apressado. Reformar o Estado não é tarefa para uma só legislatura. Maquiavel já lembrava que nada é mais difícil de executar, mais duvidoso de obter êxito ou mais perigoso de manejar do que iniciar uma nova ordem de coisas. O reformador tem inimigos na velha ordem, que se sentem ameaçados pela perda de privilégios, e defensores tímidos na nova ordem, temerosos que as coisas não deem certo. O dilema Qualquer análise sobre o sistema político há de contemplar a complexidade da dialética da mudança. Como fazer o Estado mais forte com a debilidade de nossas instituições? Como aparar as desigualdades sociais, com programas liberais, que dão vazão a climas concorrenciais e suas consequências sobre a corrente dos marginalizados? Como deixar de atender a um parlamentar dos grotões, que sem clientelismo é expurgado da política? O x da questão Lula quer ver a velha Eletrobras. Ou melhor, rever a privatização do sistema Eletrrobras, privatizado em junho de 2022, durante o governo Bolsonaro. O então governo de Jair Messias colocou ações da empresa à venda e reduziu sua participação nela de 65% para 42%. Com isso, deixou de ser acionista majoritário e perdeu o controle da companhia. O governo teria recebido cerca de R$ 30 bilhões. O atual presidente diz que o feito com a Eletrobras foi uma "sacanagem". Os braços compridos do Estado são propícios para abrigar legiões de comilões das migalhas do poder. Um projeto de poder Ora, um projeto de poder para o longo prazo requer um Estado gordo. Amplos espaços de mando, principalmente por meio de estruturas que mexem com questões vitais, energia, óleo e água. Em São Paulo, o governador Tarcísio se vê às voltas com a privatização da Sabesp. E pensa colocar no menu da privatização outras empresas, como CTPM e Metrô. O tema gera grande polêmica. O fato é que os liberais de direita acreditam que o Estado menor é o mais eficaz para avançar com seus projetos de crescimento. Os governantes de esquerda defendem o Estado gordo. Nem lá nem cá. O ideal é o Estado necessário. Parte II Raspando o tacho -Lula começa no Alvorada seu programa de recuperação. Lula quer acelerar os passos. E começa seu home office. Ansiedade geral: escolha dos nomes para a PGR e o STF. - Oito horas após o encerramento das votações para o Conselho Tutelar na cidade de São Paulo, os nomes dos 260 conselheiros eleitos foram divulgados em evento de apuração na Câmara Municipal. - Até nessa eleição para Conselhos Tutelares, foi intensa a polarização entre direita e esquerda. Brasil dividido. Interessante fenômeno. Durando mais que o previsto. - Congresso articula mudar negociação de emendas e retirar mais poder de Lula. Plano prevê retomar controle maior sobre a verba e um cronograma de liberação para obras e municípios escolhidos pelos parlamentares. Conferir com minha leitura na parte I da coluna. - Escândalo no kirchnerismo ameaça campanha de Sergio Massa na reta final das eleições na Argentina: imagens do chefe de gabinete do governo de Buenos Aires, de férias, com uma modelo em iate na Espanha. Modelo Sofia Clerici publicou em seu Instagram fotos junto com Martin Insaurralde, kirchnerista, chefe de Gabinete da Província de Buenos Aires. Vai bater em Massa. O extremista de direita, Javier Milei vai faturar. - Queda de braço em São Paulo: grevistas do metrô, CPTM e Sabesp versus Tarcísio, o governador. Pano de fundo: privatização das companhias. P.S. O governador abre os cofres para atenuar o conflito com os deputados estaduais. Coisa de R$ 10 milhões para parlamentares da base e R$ 5 milhões para oposicionistas. - Governo em queda de braço com MST. Ministro Paulo Teixeira, da Agricultura, puxando os cabelos. - Quinta-feira, às 16h, ocorrerá o lançamento do livro "Mulheres no Controle Externo", uma homenagem ao centenário de Lindalva Torquato Fernandes, na sede do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, à avenida Rangel Pestana, 315, Centro, São Paulo/SP. O livro tem como organizadoras Andressa Guimarães Torquato Fernandes, Adriana Cavalcanti Magalhães Faustino Ferreira e Ana Cristina Moraes. A homenageada Lindalva Torquato foi a primeira mulher a presidir um Tribunal de Contas, o do Rio Grande do Norte. O evento ocorre durante o II Congresso Internacional de Direito Financeiro e Cidadania. Muito simbólico nesse momento em que o país clama pela presença de mulheres nas entidades de controle externo. - Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, incrementa defesa de tempo de mandato para ministros do STF. Conflitos à vista. - Juros no cartão: bancos terão 90 dias para fixar teto. - Ministro André Mendonça, do STF, altera cronograma de votação dos processos em julgamento de réus acusados nos ataques de 8 de janeiro. A Corte, a partir de decisão de Mendonça, deverá julgar em plenário físico e não no plenário virtual. Atraso no fluxo de julgamentos. - Os 70 anos da Petrobras comemorados com muitos planos e promessas pelo presidente Jean Paul Prates, que faz uma boa gestão. - Murilo Hidalgo, do Instituto Paraná Pesquisas, manda pesquisa sobre a disputa para a prefeitura de São Luís, no Maranhão. Eduardo Braide (PSD), o prefeito, lidera, com 34,8% das intenções de voto, seguido do deputado Federal Duarte Junior (PSB), com 22,6% pontos percentuais. Fecho a coluna com o cônego Amando, de Mariana/MG. Mudou de nome? Mariana, em Minas Gerais, já foi chamada de Roma brasileira. Terra de fé e de velhas igrejas. E cheia de placas com nomes engraçados nas ruas: - Cônego Amando - Armando Pinto O cônego Amando era conhecido pela verve. Um dia, viajando pelo interior do município, uma de suas acompanhantes caiu do cavalo. Rapidamente ficou em pé. Meio sem graça, perguntou ao cônego: - O senhor viu a minha agilidade? - Minha filha, respondeu, eu até que vi. O que eu não sabia é que tinha mudado de nome.
quarta-feira, 27 de setembro de 2023

Porandubas nº 823

Qual a identidade do governo Lula, após nove meses de administração do país? A coluna pretende, na primeira parte, fazer uma leitura de sua índole, permanecendo na esfera qualitativa, não se detendo, portanto, na análise de cifras. Na segunda parte, raspo o tacho. Parte I O espírito do governo I O terceiro mandato de Lula sinalizava uma retomada do traçado petista, com a visão socializante do PT e sua inserção na margem esquerda do arco ideológico. Mesmo levando em consideração as mudanças na fisionomia geopolítica dos países na contemporaneidade, apostava-se que o lulopetismo haveria de fincar estacas profundas na vida do país, em sua volta triunfal ao centro do poder. O espírito do governo II Mas, ao pisar no terreno da realidade nua e crua de uma Nação que tem mostrado intensa busca por resultados, não se deixando enganar por muito tempo, o novo mandatário desloca-se, sem sobressaltos, para o centro do arco. Deixou à distância protagonistas importantes da fase ideológica do PT, puxou outros para o meio do palco, faz alianças com blocos oportunistas e utilitaristas da política e montou um programa que parece satisfazer a gregos e troianos. O espírito do governo III O PT, evidentemente, teve que amainar o seu discurso. Garantiu o naco principal do bolo, ao ganhar as pastas no entorno do presidente, aquelas localizadas no Palácio do Planalto, e os comandos decisivos das ações administrativas. Não levou tudo que pediu, daí os reclamos que continua a fazer para abocanhar fatias gordas dos programas. O fato é que o espírito do governo exibe um posicionamento no campo de centro-esquerda, apesar de muitos discordarem dessa visão quando se faz uma leitura de perfis de um grupo de ministros, todos eles ligados ao que se pode designar como o território conservador-patrimonialista-personalista. Lula, palanque e gabinete Luiz Inácio Lula da Silva não abandonou o palanque. Porém, agora, sobe em palanques mais grupais. Nos tempos idos dos palanques do ABC paulista, Lula expressava contundência, agressividade. Era o João Ferrador, personagem criado pelo jornalista Antônio Félix Nunes para apresentar as reivindicações dos trabalhadores na Tribuna Metalúrgica, jornal do sindicato. Ao driblar a censura que o regime militar impunha à imprensa, o personagem era o porta-voz dos trabalhadores. O seu bordão mais conhecido era: "Hoje eu não tô bom". O tempo voa. Lula, agora, faz manifesto com Joe Biden, presidente dos EUA, com pauta comum em defesa dos trabalhadores. O palanque aberto ficou menor, as massas cederam lugar a grupamentos setoriais. Novos tempos O fato é que Lula apressa-se para se adaptar às novas realidades. O chão de fábrica está bem organizado. As greves sumiram. As reivindicações são feitas por lideranças. A sociedade brasileira é exemplo de organicidade social. A luta de classes dá lugar ao diálogo entre patrões e empregados. Lula compreende a nova dinâmica e procura interpretar o fenômeno. Vez ou outra comete a asneira de resgatar antigos bordões. É lembrado sobre a inconveniência e refaz o dito no dia seguinte. Sem admitir que errou. Isso ele nunca admite. Andando nas curvas e retas de estradas mais largas, o comandante-em-chefe tenta se equilibrar. Os ministros Não se pode dizer que o maxistério de Lula seja um todo uníssono. São ilhas de um arquipélago, cada qual com sua vegetação. E ponha grama nesses territórios fragmentados... A Casa Civil, chefiada pelo ministro Rui Costa, tenta apitar o jogo. E evitar que os jogadores queiram aparecer muito. Tem sido difícil coordenar as ações. Ministros correm atrás de recursos. O verbo é para liberar a verba. E usam o cargo para administrar seus feudos. O Parlamento O Congresso quer convalidar as decisões. A seu modo. A reforma tributária anda a passos de caranguejo. A reforma administrativa vai para as calendas. Existe proposta? A minirreforma eleitoral é um arranjo para driblar os apertos do TSE. Rodrigo Pacheco se mostra contrário à reeleição para o Executivo, enquanto ensaia apoio ao senador Davi Alcolumbre para substituí-lo. Arthur Lira quer fazer de Elmar Nascimento, deputado do União Brasil, da Bahia, seu sucessor no comando da Câmara. A conferir com um olho no conjunto de parlamentares que vota com a mão pedindo verba. Poder Judiciário O Poder Judiciário vive momentos de má fama. Entrou no vocabulário das imprecações. Nos próximos dias, o preparado ministro Luís Barroso assumirá o comando do STF, sucedendo Rosa Weber. Promete todo seu esforço para resgatar a era de confiança na Corte, sob o império da segurança jurídica. O Supremo carece mesmo de ampla e intensa campanha para recuperar seu respeitado papel constitucional. A direita O país sinaliza leve inclinação para a direita, com a banda que perdeu as eleições procurando se organizar nos Estados e municípios para garantir uma grande bancada de prefeitos e vereadores em 2024. Bolsonaro não tem estofo para correr o país no esforço de mobilização que o PL e adjacentes precisa desenvolver. As cartas começam a ser jogadas. Seu desempenho dependerá das próximas decisões do Judiciário sobre sua atuação. Será preso? Mesmo preso, será forte cabo eleitoral. E Michelle, a pastora? Também estará nas ruas. O PL poderá bancar os movimentos do casal. Está com o cofre cheio. Classes médias Para onde caminharão as classes médias, com seu poder de fogo? Elas exercem o poder da pedra no meio do lago, ou seja, o poder de criar pequenas ondas que correm até as margens. As classes D e E serão influenciadas pelas classes B e C. Tudo vai depender dos resultados do governo Lula. A esfera internacional Lula inscreve o país na moldura internacional. O Brasil passa a ser ouvido. O discurso é bom. Mas há certas contradições. A sustentabilidade ambiental ganha manchetes, mas a busca de petróleo na foz do Amazonas, com que o governo Lula acena, compromete o ideário defendido na ONU. O bem-estar Como está o Produto Nacional Bruto do Bem-Estar Social em nove meses de governo? Aumentando ou diminuindo? Cada qual com suas conclusões. As redes sociais Serão o termômetro do clima ambiental e do estado de espírito dos grupamentos sociais nos próximos tempos. Parte II Raspando o tacho - Lula será operado do quadril nessa sexta-feira. Passará um mês no estaleiro do Palácio do Alvorada. Cirurgia bem dominada pela medicina. Haja despacho, com correntes de ministros entrando pelos portões do Alvorada. Enxurrada de imagens. - Murilo Hidalgo, do instituto Paraná Pesquisas, manda pesquisa que mostra, em Santos, a seguinte posição para a prefeitura, em 2024: Rosana Valle, com 34,4%; Rogério Santos, com 24,7% e Telma de Souza, com 17,8%; Ivan Sartori, com 3,9% e Débora Camilo, com 3,4%/. Num segundo cenário, Paulo Alexandre Barbosa tem 40,0% e Rosana Vale, 28,9%, enquanto Telma de Souza tem 12,6%, Ivan Sartori, 3,7% e Débora Camilo, 2,7%. - O uso de aviões da FAB pelos ministros e assessores bate recorde. Fins de semana de lazer e ócio. - Aperta-se o cerco ao ex-presidente Bolsonaro. - O calor excessivo bate recordes no país. El Nino não perdoa. Primavera quentíssima. Verão de pegar fogo. - Forças Armadas com prestígio abalado. Urge resgatar sua imagem constitucional. - Zelenski, da Ucrânia, vive seu inferno astral. Parceira, a Polônia, puxou sua orelha. OTAN se retrai. - Trump passa Biden nas pesquisas mais recentes. Cada povo com suas loucuras. - Armênia sob o pano de fundo de grandes tragédias. - O extremista argentino de direita, Javier Milei, ameaça ganhar a eleição, no primeiro turno, em 22 de outubro próximo. - General Augusto Heleno, ex-poderoso ministro do GSI, garante "nunca ter discutido assuntos políticos com subordinados". - Copom sinaliza: redução de 0,5% na taxa de juros, conforme ata da última reunião. - Bancada evangélica se prepara para atuação mais firme a favor de pautas conservadoras. - Moraes vota para condenar mais cinco réus do 8/1 a penas que variam de 12 a 17 anos. - Gasolina sobe e prévia da inflação atinge 5% em 12 meses. Fecho a coluna com Tancredo Neves. Conchavo Premido pelos casuísmos, Tancredo Neves foi obrigado a fundir o seu PP com o MDB de Itamar. Alguns pepistas pularam do barco e protestaram alegando conchavo. Tancredo foi curto e seco: "Conchavo é a identificação de ideias divergentes formando ideias convergentes". O sábio tinha razão. Há curvas que desembocam em retas.
quarta-feira, 20 de setembro de 2023

Porandubas nº 822

Parte I O Brasil do improviso e do pragmatismo Nesta primeira parte, tento fazer breve leitura sobre mais um pacote legislativo que se embrulha sem consulta ao freguês, o eleitor. Trata-se da minirreforma eleitoral, em discussão na Câmara dos Deputados. Como é sabido, teremos eleição municipal em outubro de 2024. Nada mais oportuno fazer um pacotão de regras que beneficiem a esfera dos representantes e candidatos. Essa análise, em parte, se ancora em matéria do Brasil de fato. Cerca de 500 mil postulantes Teremos cerca de 500 mil candidatos na eleição municipal. Se possível, regidos por novas regras. No dia 14, a Câmara dos Deputados aprovou dois projetos da minirreforma eleitoral. Os projetos ainda precisam passar pelo Senado e ser sancionados até o dia 5 de outubro para entrarem em vigor para o pleito de 2024. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), diz não ter pressa. Mas tudo vai depender do jogo de pressões. Proposta - Mudar a Ficha Limpa Analisemos algumas alterações no Código Eleitoral. O relator do projeto, o deputado Federal Rubens Pereira Júnior (PT-MA), como se percebe, deve ter o endosso do Executivo, ficando implícito o apoio do PT. O projeto quer mudar a lei da Ficha Limpa, diminuindo o tempo em que os políticos ficam afastados das disputas. Há dois pontos de vista na mesa de debates: o do Ministério Público, que prega o rigor da lei e defende penas de até 20 anos; e a visão dos advogados, que acham exagero apenar com um afastamento de 10 a 15 anos. Proposta - Quociente eleitoral Outra proposta é para alterar a norma que abriga as sobras eleitorais no Legislativo. O texto sugere que apenas as siglas que alcançarem 100% do quociente podem disputar as cadeiras que sobrarem, em detrimento de candidatos mais votados, mas cujos partidos foram menos selecionados pelos eleitores. Ou seja, um fortalecimento dos grandes partidos. Um perigo para formar poder hegemônico. Sofrerão os partidos pequenos, onde se constata maior abrigo à diversidade e inclusão. Quem é dono da flauta quer dar o tom. Proposta - Prestação de contas Um dos imensos gargalos da legislação é a prestação de contas. Muitos candidatos pelejam na Justiça para terem a aprovação de suas contas. Pelo projeto em tela, flexibiliza-se a prestação de contas de campanhas e a punição a contraventores. Mais uma importante mudança: hoje, há a possibilidade de cassar a chapa para quem for pego na compra de votos. As alterações resultarão em apenas multa, que varia de R$ 10 mil a R$ 150 mil para quem fizer a compra de voto. E, ainda, alteração do artigo 100, que fala que não vai precisar de mais de documento de subcontratação de empresa. Um alívio para aqueles que usam o caixa 2, a par de centenas de candidatos que não preencheram os quesitos exigidos pelo TSE. O projeto contempla a possibilidade de doações via Pix e vedação de cheques cruzados. Porém... os Pix são rastreáveis. Proposta - Cotas Propõe-se mudança nas cotas femininas, nas cotas de negros(as) e a proibição de candidaturas coletivas. Segundo a proposta, a cota de 30% de candidaturas femininas passa a ser contabilizada por federação e não mais por partido. Além disso, abrem-se espaços para o uso de verbas que atualmente são destinadas apenas a candidaturas femininas. As despesas poderiam ser combinadas com as dos homens, desde que acompanhadas de mulheres e pessoas negras em publicidades. Portanto, o projeto é para diminuir as cotas, significando que a cota de 30% de candidaturas femininas seja contabilizada por federação, não mais por partidos. Implicará em significativa redução de mulheres. Proposta - O coletivo As candidaturas coletivas integram o pacote. Como se sabe, nesse modelo, um grupo de pessoas se junta numa chapa, mas apenas um nome aparece na urna. Essa pessoa será a responsável legal pelo mandato. Toma posse, enquanto as outras pessoas passam a trabalhar no gabinete. Os partidos de esquerda defendem o coletivo na representação legislativa, por ver no mecanismo a possibilidade de agregar forças. Há segmentos diversos que formam o poderio de esquerda. Mas os partidos de direita, a partir do Partido Liberal, querem acabar com as candidaturas coletivas. Proposta - Cota racial O relator incluiu no texto uma cota mínima de 20% dos recursos dos fundos eleitoral e partidário para candidaturas de pessoas pretas e pardas, independentemente do sexo. Além disso, quilombolas poderão ser incluídos na lei de Cotas, nos termos de projeto já aprovado pela Comissão de Direitos Humanos. Atualmente, as cotas valem para pessoas pretas, pardas, indígenas, estudantes de escolas públicas e com deficiência. Enfim... A minirreforma eleitoral, nos termos como se apresenta, nada mais é que um empurrão dos grandes partidos para contornar o contencioso jurídico que os abarca. Todo esforço se fará para que este pacotão de benefícios (para uns) e prejuízos (para outros) seja aprovado até 5 de outubro. Mais ação e menos discurso Perguntaram, certa vez, a Demóstenes, o maior orador da Antiguidade: "qual a principal virtude do orador"? Respondeu: "ação". E depois? Repetiu: "ação". Sabia ele que essa virtude, própria dos atores, era mais nobre que a eloquência. E qual a razão? Ora, a razão é o motor da Humanidade. Mais ação, governantes; mais ação, ministros; mais ação, parlamentares. RS espera por ação Possivelmente tenha sido esse o motivo pelo qual o presidente Luiz Inácio não foi ao Rio Grande do Sul prestar solidariedade às famílias das vítimas. Especula-se que antes da visita, iria esperar pelos resultados do pacote financeiro que liberou para ajudar municípios e populações atingidas por inundações. Lula é esperto. E o RS espera resultados da ajuda do governo. Parte - II Raspando o tacho - O discurso de Lula na abertura da Assembleia da ONU foi muito objetivo. Destaco alguns aspectos: cobrou responsabilidade dos países ricos pela poluição que maltrata o planeta; defendeu de forma veemente mudança no Conselho de Segurança, com número maior de assentos para ser mais representativo; sugeriu diálogo para acabar com a guerra entre Rússia e Ucrânia; fez severa crítica ao neoliberalismo; destacou a importância do Brics ampliado, com a entrada de mais países; colocou o Brasil na vanguarda dos programas mundiais de sustentabilidade; destacou a diminuição, em oito meses, do desmatamento na Amazônia; conclamou as nações para acabar com a fome no mundo; fez uma defesa de Cuba, condenando os embargos contra a ilha. Foi aplaudido em sete momentos. - O discurso de Joe Biden focou na crise climática. Ucrânia perde espaço. - Lula, com dores, deve antecipar volta ao Brasil. - Zelensky ouviu com atenção discursos de Lula e Biden. - Os investidores internacionais deram um mergulho no Brasil durante os últimos dias, quando políticos e empresários, em caravana, baixaram em Nova Iorque. - Dona Janja prepara o Alvorada para uma temporada do marido-presidente naquele Palácio. Lula será submetido a uma cirurgia para aliviar as dores que sente na cabeça do fêmur. - Minha solidariedade ao querido ex-senador e hoje vereador de SP, Eduardo Suplicy. Ele padece de Parkinson, conforme anunciou, ontem, em entrevista para Mônica Bergamo, da Folha de SP. "Me sinto bem, continuo ativo, faço ginástica", frisou. Suplicy revelou que se trata com cannabis. - O que Lira colocará em votação quando voltar de NY? Fecho a coluna com um "causo" de Benedito Valadares, a raposa da política mineira. Desde que o dinheiro venha Mais uma da matreirice mineira. Benedito Valadares chegou a Curvelo/MG, para visitar a exposição de gado do município. Na hora do discurso, atrapalhou-se: - Quero dizer aos fazendeiros aqui reunidos que já determinei à Caixa Econômica e aos bancos do Estado a concessão de empréstimos agrícolas a prazos curtos e juros longos. Lá do povo, alguém corrigiu: - É o contrário, governador! Empréstimo a prazo longo e juro curto. Valadares: - Desde que o dinheiro venha, os pronomes não têm importância.
quarta-feira, 13 de setembro de 2023

Porandubas nº 821

Parte I A avaliação dos governantes A primeira parte da coluna desta quarta será dedicada à análise das razões que contribuem para colocar os governantes no fundo do poço ou no pico da glória, sejam eles prefeitos e governadores, seja ele presidente da República. Não adianta querer olhar apenas para as pesquisas de avaliação de imagem. Olhem, senhoras e senhores governantes, para o seu dia a dia. O roteiro abaixo tem a intenção de colocá-los na sala de aula da credibilidade. Promessas - Não se deve prometer o que não se poderá cumprir. O país exige verdade, sinceridade. Alegorias, promessas mirabolantes, planos fantásticos acabam sendo cobrados pelo cidadão. Identidade - Um político deve ter identidade, personalidade, eixo. Coluna vertebral torta gera desconfiança. A imagem que um político quer projetar deverá corresponder ao seu conceito. Não convém uma comunicação exuberante para enaltecer feitos inexistentes. Quando isso ocorre, o eleitor fará sua avaliação nas urnas. Coluna reta abriga as vértebras da lealdade, coerência, honestidade e senso do dever. Representação social - Representar o povo significa escolher as melhores alternativas para propiciar bem-estar. Discurso demagógico para amenizar as dores das periferias angustiadas não vai resistir ao tempo. O apoio que o povo dá ao político, hoje, poderá, amanhã, ser retirado. O governante sério se preocupa com rumos permanentes e medidas condizentes com as demandas das populações. Sabedoria - Sapiência não significa vivacidade. Sabedoria é mistura de aprendizagem, compromisso, equilíbrio, paciência, busca de melhores alternativas, capacidade de convivência e decisões racionais. Já a vivacidade reflete a cara de fisiológicos, aproveitadores e demagogos. Cheiro do povo - O cheiro do povo está nas ruas, nos ônibus, no metrô, nos escritórios, nas fábricas e nos espaços rurais. Há governantes que se isolam em seus gabinetes e, até nas catástrofes, não dão as caras. A população, principalmente a vitimada por desastres naturais, sabe quem está a seu lado. O trabalho (estafante...?) de Brasília e dos rincões mais distantes do território não impede que um político saia de suas tocas. Esconderijos - Não dá mais para alguém se esconder. A corrupção, é claro, não acabará. Mas é preciso atentar para o fato de que as denúncias sobre negociatas e trocas de favores ilícitos constituem o prato predileto das redes sociais e das mídias. Alguém pode estar ingerindo um alimento indigesto e amanhã todo mundo ficará sabendo. A hora requer transparência. Discurso - O discurso que vinga deve ser composto por propostas concretas, viáveis, simples e de metas temporais. Sua adaptação ao momento é fundamental. A população dispõe de entidades que a representam em diversos foros, algumas delas com atuação política tão importante quanto a das casas representativas. Simplicidade e modéstia - O homem público não precisa se vestir com a roupa de Deus. A honraria que os cargos conferem é passageira. Mandatos pertencem aos eleitores. Ser simples não é deixar se fotografar com crianças no colo, ou comer cachorro quente na esquina e gesticular para os transeuntes. Simplicidade é pensar bem, dizer bem e agir com naturalidade. Sem artimanhas e maquiagens. O marketing da atualidade se inspira em verdade. Estado e Nação - A Nação é a pátria, que acolhe a população. É o território onde os cidadãos se sentem bem, gostam de viver e constituir um lar. O Estado é a entidade técnico-jurídico-institucional, composta por interesses e conflitos, recebendo as críticas de pessoas e grupos de diversas classes. Aproximar o Estado da Nação constitui a missão basilar da política, compromisso cívico inegociável. O Brasil de hoje e do amanhã vislumbra essa meta. Parte II Raspando o tacho - A afirmação de Lula de que, na próxima cúpula do G-20, Putin poderia vir ao Brasil, sem medo, pois não seria preso, é a quinta-essência do lema L'État c'est moi, de Louis XIV, da França. O Estado sou seu, tentou garantir dom Luiz, do Brasil. - Ainda bem que, alertado e surpreso com a repercussão negativa da afirmação, corrigiu a "loucura" dizendo que seria a Justiça a tomar qualquer decisão sobre a prisão de Vladimir Putin, caso venha a entrar em território brasileiro em 2024. - Eis o que disse Lula: Eu não sei se o tribunal, não sei se a Justiça brasileira vai prender. Isso quem decide é a Justiça, não é o governo [brasileiro], nem o Parlamento. É importante. Eu, inclusive, quero muito estudar essa questão desse Tribunal Penal [Internacional], porque os Estados Unidos não são signatários dele, a Rússia não é signatária dele também. Então, eu quero saber por que o Brasil é signatário de um tribunal que os EUA não aceitam. Por que somos inferiores e temos que aceitar uma coisa? - Só para lembrar. Lula nomeou, em 2003, a juíza Sylvia Steiner, para compor os quadros do TPI. Mais recentemente, petistas até tentaram pedir a condenação do ex-presidente Bolsonaro por aquele Tribunal. Dizer que não conhecia essa Corte até o momento, como frisou na cúpula do G20, é driblar a verdade. - Há um conjunto de 123 países que firmaram compromisso com o Tribunal Penal Internacional, com sede em Haia. Os signatários do Estatuto de Roma se comprometem a cumprir as disposições do Órgão. O Brasil, em 2002, ainda sob FHC, aprovou o TPI. Leiam: Decreto nº 4.388, de 25 de setembro de 2002. Promulga o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso VIII, da Constituição, Considerando que o Congresso Nacional aprovou o texto do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, por meio do decreto legislativo no 112, de 6 de junho de 2002; Considerando que o mencionado Ato Internacional entrou em vigor internacional em 1o de julho de 2002, e passou a vigorar, para o Brasil, em 1º de setembro de 2002, nos termos de seu art. 126; Decreta: Art. 1º O Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, apenso por cópia ao presente Decreto, será executado e cumprido tão inteiramente como nele se contém. - O planeta está dando sinais de saturação. E responde às ações de degradação feitas pelos dominadores do poder com catástrofes e terríveis eventos. Inundações, ciclones, tempestades, terremotos ocorrem em diversos recantos. Como em Marrakech, no Marrocos, na Líbia, nos EUA, e em cidades do Rio Grande do Sul, Brasil. - O fenômeno El Nino, com o esquentamento das águas dos oceanos, ainda poderá provocar este ano muita devastação. Como o planeta aguentará o aumento de sua temperatura em 2,5% nas próximas décadas, já dando sinais de que as águas estão mais quentes? - Alckmin (com n) levou oito ministros em sua viagem, domingo último, ao Rio Grande do Sul. E arrumou R$ 741 milhões para ajudar cidades e populações. Pelo tamanho da tragédia parece pouco. Geraldo cumpre bem o seu dever. Pessoa que cultiva a simplicidade. - O G20 passou para a coordenação do Brasil. Por enquanto, simbolicamente. A presidência efetiva terá início em em 1º de dezembro de 2023 e se encerra em 30 de novembro de 2024. A agenda do G20 será decidida pelo governo do Brasil, com apoio direto da Índia, última ocupante da presidência, e da África do Sul, país que exercerá o mandato em 2025. - Lula faz bem em acentuar que o Mercosul, hoje sob a presidência do Brasil, não aceitará as restrições feitas pela União Europeia. Restrições que golpeariam os programas dos países que integram o bloco. - Alexandre de Moraes, o ministro mais midiático do STF, acalenta ódios e anima platéias, que acompanham as ocorrências junto ao Judiciário, que carece esforço para resgatar a boa imagem. Viu, ministro Barroso, nosso próximo presidente da Alta Corte! - Ex-deputado estadual e ex-prefeito do município, Carlos Grana lidera, hoje, a disputa para prefeito de Santo André, com 19,5% das intenções de voto. O 2º lugar é de Luiz Zacarias, vice do prefeito Paulo Serra, com 15,2%. Pesquisa do Paraná Pesquisas que a coluna acaba de receber. - O transplante cardíaco de Faustão despertou a sociedade. As doações de órgãos têm aumentado. - O super festival The Town, que levou uma multidão a Interlagos, em SP, teve muitos problemas de logística e apoio, escondidos da mídia. A partir das imensas filas para comprar alimentos. Haverá outro em 2025. Plano de Medina. Claro, se o imprevisível não der as caras. Batam na madeira três vezes... - Esperemos o discurso de Lula na abertura da Assembleia Geral da ONU nos próximos dias. Será ouvido com muita atenção. Luis Inácio tenta repor o Brasil na moldura das Nações a serem ouvidas. Mas comete frequentemente "luladas". Fecho a coluna com a era JK. O ciclo Kubitschek Figura carismática, Juscelino Kubitschek era jovial, alegre. Encarnava o Brasil moderno. Em 1959, o palhaço Carequinha popularizou uma batucada de Miguel Gustavo - Dá um jeito nele, Nonô ("Meu dinheiro não tem mais valor./Meu cruzeiro não vale nada./Já não dá nem pra cocada./Já não compra mais banana./Já não bebe mais café./Já não pode andar de bonde./Nem chupar picolé./Afinal, esse cruzeiro é dinheiro ou não é?"). O ministro da Fazenda era o mineiro José Maria Alkmim (com m). O clima ambiental era de descontração, como demonstra a historieta gráfica da revista Careta: "Juscelino: - Preciso de divisas, ouro, seu Alkmim, para as realizações do meu governo. O ministro: - Ouro, seu Juscelino?! Eu sou Alkmim, não sou alquimista". JK vestiu a camisa do desenvolvimento e seu slogan "50 anos em 5" foi um sucesso. Colou. Seu sorriso era a estampa de um país feliz. (História narrada pela historiadora Isabel Lustosa)
quarta-feira, 6 de setembro de 2023

Porandubas nº 820

Parte I Análise do regime presidencialista A coluna, nesta primeira parte, vai se debruçar sobre o nosso regime de governo. Como temos lido, cotidianamente, Lula conversa aqui, conversa ali, para remanejar o ministério e ceder mais alguns nacos ao Centrão. E recebe um, outro e mais outro que vão até ele fazer pressão e indicar candidatos para o STF, o STJ, o TST e para as Cortes Estaduais? Em suma, Luiz Inácio age como um monarca. Daí este escriba carimbar a natureza do regime como presidencialismo de cunho imperial. As origens A disposição monocrática de exercer o poder vem, no Brasil, desde 1824, quando a Constituição atribuiu a chefia do Executivo ao imperador. A adoção do presidencialismo, na Carta de 1891 - que absorveu princípios da Carta americana de 1787 -, só foi interrompida no interregno de 1961 a 1963, quando o país passou por ligeira experiência parlamentarista. Portanto, o presidencialismo está fincado no altar mais alto da cultura política. Benemérito O poder que dele emana impregna a figura do mandatário, elevado à condição de pai da Pátria, protetor, benemérito. Essa imagem ganhou tintas fortes no desenho de nossa cidadania. Presidencialismo de cunho imperial a caminho da autocracia. Para os mais refinados, o Brasil adota como sistema de governo o presidencialismo de coalizão. A premissa é: quanto mais extensa a aliança em torno do Executivo, maior a probabilidade de seu comandante, o presidente, administrar sismos nas frentes congressuais e garantir a governabilidade. O estilo europeu Siglas e blocos, portanto, detêm boa dose de mando na condução do país, mesmo que se reconheça a índole monárquica do presidencialismo brasileiro, que se revela avassaladora nos espaços do Legislativo. A relação de troca é a medida do equilíbrio entre os dois Poderes. O presidencialismo de coalizão alimenta-se da base política e esta come do seu pasto para engordar. É assim o jogo. Por isso mesmo, qualquer tentativa de atenuar a hegemonia presidencial por nossas bandas soa como loas à utopia. O presidencialismo mitigado, ou um parlamentarismo à moda europeia, francesa ou portuguesa, não parece combinar com os traços de nossa realidade política. Sua arquitetura é mais refinada. Seu escopo, mais plural. Presidente deveria bater o pênalti A semente presidencialista, como se sabe, viceja em todos os espaços, dos mais simples e modestos aos mais elevados. O termo presidente faz ecoar significados de grandeza, forma associação com a aura do Todo-Poderoso, com as vestes do monarca, com a caneta do homem que tem influência, poder de mandar e desmandar. Até no futebol o presidente é o mandachuva. O chiste é conhecido: como o ato mais importante da partida de futebol, o pênalti deveria ser cobrado pelo presidente. De presidente para presidente Em 1980, no final do campeonato brasileiro, o Flamengo ganhou por 3 a 2 do Atlético Mineiro, em polêmica partida disputada no Maracanã. O árbitro expulsou três jogadores do Atlético, a bagunça tomou o campo e agitou os nervos. No fim, transtornado com o "resultado roubado", Elias Kalil, presidente do Atlético, exclamou aos berros: "Vou apelar para o presidente da República, João Figueiredo! Vou falar pra ele de presidente para presidente!" O culto à figura do presidente e, por extensão, a outros atores com forte poder de mando faz parte da glorificação em torno do Poder Executivo. Tronco do patrimonialismo ibérico. Os ritos da Corte Herdamos da monarquia portuguesa os ritos da Corte: admiração, bajulação, respeito e mesuras, incluindo o beija-mão. O sociólogo francês Maurice Duverger defende a tese de que o gosto latino-americano pelo sistema presidencialista tem que ver com o aparato monárquico na região. O vasto e milenar Império Inca, com seus grandes caciques, e depois o poderio espanhol, com seus reis, vice-reis, conquistadores, aventureiros e corregedores, plasmaram a inclinação por regimes de caráter autocrático. O traçado de Marshall O presidencialismo por estas plagas agrega uma dose de autocracia. Já o parlamentarismo que vicejou na Europa teria inspirado na ideologia liberal da Revolução Francesa, cujo alvo era a derrubada do soberano. Isso explicaria a frieza europeia ante o modelo presidencialista. De acordo com o conhecido traçado do sociólogo Thomas Marshall, os ingleses construíram sua cidadania abrindo, primeiro, a porta das liberdades civis, depois, a dos direitos políticos e, por fim, a dos direitos sociais. Entre nós, os direitos sociais precederam os outros. A estadania A densa legislação social (benefícios trabalhistas e previdenciários) foi implantada por Getúlio Vargas entre 1930 e 1945, num ciclo de castração de direitos civis e políticos. Portanto, o civismo e o sentimento de participação ficaram adormecidos por muito tempo no colchão dos benefícios sociais. A imagem do Estado (e a do governante) imbricava-se ontem como se junta hoje. Sob essa configuração, imaginar que o parlamentarismo tenha chance por aqui é apostar que a fada madrinha decidiu deixar o reino da fantasia para nos visitar. Portanto, como já dizia José Murilo de Carvalho, vivemos sob uma estadania, uma cidadania abrigada na sombra do Estado. Temos um "imperador", que age como autocrata. O poder concentrado num único governante. Parte II Raspando o tacho - Esta semana devem aparecer mais dois ministérios cedidos ao Centrão, que, aliás, Lula diz que não existe. - A CPI do MST acaba como um cabo de guerra vencido por ninguém. - Antes de embarcar para a Índia, nesta quinta, para participar do G-20, Lula participará do desfile do 7 de setembro em Brasília engalanada. - O G-20 é o principal fórum de cooperação econômica internacional, reunindo as 20 maiores economias mundiais. Caberá ao Brasil coordenar o fórum de economia digital e receber o grupo no país em 2024. - O ministro José Múcio, da Defesa, tem feito das tripas coração para apaziguar ânimos e acalmar grupos descontentes nas Forças Armadas. - São Paulo, capital, verá um dos pleitos mais acirrados em 2024. A eleição municipal abrirá o palco mais polarizado do território nacional. - Cresce o número de artistas, influencers (e profissões assemelhadas) na arena das agressões e violência. - O ministro Flávio Dino pode ser descartado logo, logo, com eventual nomeação para compor o STF. Assim, teríamos um postulante a menos no pleito de 2026. - Bolsa Família aumentado será o grande eleitor no pleito municipal. Vai avolumar o governismo. - Para tanto, Executivo precisará de aval para destravar R$ 318 bilhões. Presidencialismo imperial conseguirá. - Curiosidade: Jorge Paulo Lemann já não é o mais rico brasileiro no ranking da revista Forbes. É Eduardo Saverin, com fortuna de US$ 17,6 bilhões, superando Lemann e Vicky Safra. - Ele é o cofundador do Facebook. Saverin também entrou para o clube dos 100 mais ricos do mundo, aparecendo na 91ª posição no ranking geral da revista. - Mudança à vista: inelegibilidade dos políticos deve se contar a partir da condenação e não após a pena cumprida. Medida está parada no Senado. - Xi Jinping não irá ao G-20 em Nova Délhi. Motivo? Acirramento de tensões entre China e Índia. - Clima maluco: temperatura variando 12 a 15 graus por dia. Enchentes de um lado, chuvas de outro. El Niño dando as cartas. - Semana passada, sexta, Lula foi até os confins do Polígono das Secas, no sopé da serra de minha querida cidade natal: Luis Gomes, na fronteira com Paraíba e Ceará. Foi ver a obra do viaduto que subirá que furará a montanha para levar água a 57 municípios da região. A propósito, o hoje senador Rogério Marinho, então ministro de Bolsonaro, esteve no mesmo lugar para ver a mesma coisa. - Felicito o povo de minha terra por mais um compromisso dos governantes para o município, mas não posso deixar passar a dica: o Brasil é um eterno retorno. Vemos hoje as coisas de ontem e, com certeza, as veremos também amanhã.
quarta-feira, 30 de agosto de 2023

Porandubas nº 819

Abro com um "causo" da Justiça. Esselentíssimo juiz Ao transitar pelos corredores do fórum, o advogado, que também era professor, foi chamado por um dos juízes: - Olha só que erro ortográfico grosseiro temos nesta petição. Que coisa vergonhosa! Estampado logo na primeira linha do petitório lia-se: "Esselentíssimo juiz". Gargalhando, o magistrado perguntou ao advogado: - Por acaso, professor, esse advogado foi seu aluno na faculdade? - Foi sim - reconheceu o mestre. Mas onde está o erro ortográfico a que o senhor se refere? O juiz pareceu surpreso: - Ora, meu caro, acaso você não sabe como se escreve a palavra Excelentíssimo? Então explicou o professor: - Doutor juiz, acredito que a expressão pode significar duas coisas diferentes. Se o colega desejava se referir à excelência dos seus serviços, o erro ortográfico efetivamente é grosseiro. Entretanto, se fazia alusão à morosidade da prestação jurisdicional, o equívoco reside apenas na junção inapropriada de duas palavras. O certo então seria dizer: "Esse lentíssimo juiz". ... Silêncio geral! Depois desse episódio, aquele magistrado nunca mais aceitou o tratamento de "Excelentíssimo juiz", sem antes perguntar: - Devo receber a expressão como extremo de excelência ou como superlativo de lento? __________ Nas Porandubas de hoje, tento mergulhar nas águas do ethos nacional. Compreender o que é e como o brasileiro abre trilhas para o entendimento dos nossos costumes e o modus operandi da política. Parte I - O ethos nacional Errado no lugar do certo Quem escreve errado por linhas corretas? O brasileiro. Para ser mais justo, os políticos. Mais certo, os governantes, que não cumprem promessas de campanhas, que administram como donos de feudos, que geralmente governam no estilo dos três macaquinhos: não vi, não ouvi, não falei. E assim, corroboram a expressão: o dito pelo não dito. O tanto faz como tanto fez. O Brasil é o território por excelência para abrigar a desorganização dos Trópicos. Uma historinha Costumo ilustrar a cultura do país com uma historinha. Há quatro tipos de sociedade no mundo. A primeira é a inglesa, a mais civilizada, onde tudo é permitido, salvo o que é proibido. A segunda é a alemã, sob rígidos controles, onde tudo é proibido, salvo o que é permitido. A terceira é a totalitária, pertinente às ditaduras, na qual tudo é proibido, mesmo o que é permitido. E, coroando a tipologia, o quarto tipo, a sociedade brasileira, onde tudo é permitido, mesmo o que é proibido. Heterogeneidade Como explicar o fato de o Brasil ser um país tão usado como caricatura da esquisitice? Fazendo uma leitura sobre o ethos nacional. A engenharia social brasileira, assentada sobre a miscigenação de raças (colonizadores portugueses, índios e negros), expressa uma heterogênea coleção de valores. Temos, porém, uma unidade étnica básica, apesar da confluência de tão variadas matizes formadoras, que poderiam, na visão de Darcy Ribeiro, resultar numa sociedade multiétnica, "dilacerada pela oposição de componentes diferenciados e imiscíveis". Um povo-nação Nosso saudoso antropólogo e ex-senador, em seu livro O Povo Brasileiro, arremata: "Mais que uma simples etnia, porém, o Brasil é uma etnia nacional, um povo-nação, assentado num território próprio e enquadrado dentro de um mesmo Estado para nele viver seu destino. Ao contrário da Espanha, na Europa, ou da Guatemala, na América, por exemplo, que são sociedades multiétnicas regidas por Estados unitários". Trabalhador? Desconfiado? A adjetivação para qualificar o homo brasiliensis é vasta e, frequentemente, dicotômica: cordial, alegre, trabalhador, preguiçoso, verdadeiro, desconfiado, improvisado. Afonso Celso, em Porque me Ufano do meu País, divide as características psicológicas do brasileiro entre positivas e negativas, dentre elas a independência, a hospitalidade, a afeição à paz, caridade, acessibilidade, tolerância, falta de iniciativa, falta de decisão, falta de firmeza, pouco diligente. Antagonismos equilibrados? Gilberto Freyre, em Casa Grande & Senzala, pontifica: "Considerada de modo geral, a formação brasileira tem sido, na verdade, um processo de equilíbrio de antagonismos. Antagonismos de economia e de cultura. A cultura europeia e a indígena. A europeia e a africana. A africana e a indígena. A economia agrária e a pastoril. A agrária e a mineira. O católico e o herege. O jesuíta e o fazendeiro. O bandeirante e o senhor de engenho. O paulista e o emboaba. O pernambucano e o mascate. O grande proprietário e o pária. O bacharel e o analfabeto. Mas predominando sobre todos os antagonismos, o mais geral e o mais profundo: o senhor e o escravo". O primeiro mito Sérgio Buarque de Holanda, no clássico Visão do Paraíso, desenha a paisagem que baliza a índole nacional, com o pincel dos três mitos que construíram a moldura do nosso tecido valorativo. Primeiro, o mito do Éden. Ao aportarem, os nossos colonizadores se depararam com a exuberância da natureza e seus habitantes, rudes e inocentes, índios sem vestes, uma paisagem deslumbrante, o jardim do paraíso. A descoberta do país proporcionou ao europeu: "o enlevo ante a vegetação sempre muito verde, o colorido, a variedade e estranheza da fauna, a bondade dos ares, a simplicidade e inocências das gentes", como, aliás, já escrevera Pero Vaz de Caminha. Sob essa primeira visão, a seara valorativa produziu seus primeiros frutos: o ócio, a indolência, a sensualidade, a voluptuosidade, a glutonaria, a improvisação, a festa, a dança, o eterno carnaval. O segundo mito O segundo mito: o Eldorado. As riquezas apareciam ao longo das descobertas do ouro e das pedras preciosas. Na esteira da exploração predatória, outro conjunto de valores tomou corpo: a cobiça, a ganância, a traição, a destruição da natureza, a ambição, a disputa, a guerra entre grupos, os conflitos. O terceiro mito O inferno verde é o terceiro mito. A cobiça levou os colonizadores ao interior profundo. A floresta despontava como ambiente inóspito, selvagem, agressivo. As doenças debilitaram corpos, fustigando as mentes. Claude Lévi-Strauss, em seu celebrado Tristes Trópicos, radiografava o Brasil como o lugar mais inabitável do planeta, onde seria impossível a um homem sobreviver. Na paisagem da conquista do interior do país, outro feixe de características aparece: a miséria, a desorganização, a improvisação, a sujeira, a marginalidade, o desleixo. Outros ingredientes O sentido da importância individual: "Você sabe com quem está falando?" O gosto pela imprecisão, para a ausência de objetividade: "Quantas horas você trabalha por semana?" "Trabalho mais ou menos 40 horas". Petrolândia nunca teve petróleo. Nos termos de Jorge Amado, a Bahia de Todos os Santos é a Bahia de Todos os pecados. O senhor é católico? "Sou, mas não frequento a igreja". O mais ou menos é coisa muito nossa. O fingimento: o político, ao cumprimentar o interlocutor, pisca para alguém que está ao lado. O sentido de grandeza O catastrofismo comum na interlocução diária: os maiores potenciais, as maiores riquezas ou a mais degradante miséria. A propensão para a protelação do fazer: vou deixar para amanhã. A semente da anarquia. Buarque de Holanda em Raízes do Brasil: "os elementos anárquicos sempre frutificaram aqui facilmente, com a cumplicidade ou a indolência displicente das instituições e costumes. As iniciativas, mesmo quando construtivas, foram continuamente no sentido de separar os homens, não de os unir". Vulcão emotivo O apadrinhamento, o patrocínio dos favores, o ludismo. Somos o país do futebol. E um vulcão de explosões emotivas. Trocamos com facilidade o choro pelo riso, a festa pela briga. A recorrência aos eixos valorativos e a descrição de seus efeitos sobre o caráter da política se fazem presentes nas abordagens que expresso em minhas análises. Desde a Independência, conservamos o feito para compor arranjos partidários, múltiplas colorações, sistemas de governos, alguns de talhe autoritário e outros traumáticos, farta produção de cartas constitucionais e o desenvolvimento dos corpos jurídicos que plasmam a arquitetura do Estado. Parte II Raspando o tacho - A escolha da advogada Daniela Teixeira para o STJ sinaliza a indicação de um homem para o STF. Minha leitura. Daniela, componente da lista tríplice de advogados encaminhada ao presidente, é preparada, tem visão progressista e é muito bem relacionada nos universos jurídico e político. Um tento de Lula. - Dizem que a primeira-dama, Rosângela da Silva, a Janja, faz pressão para Lula indicar uma mulher ao Supremo. Dizem também que a disputa está hoje entre dois homens: o ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), Jorge Messias, e o presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas. Lula quer nomear uma pessoa com a qual tenha interlocução. - Do modo como se apresenta a reforma tributária, o setor de serviços vai pagar o pato, a conta, algo que beira 96% de impostos e tributos. O setor de serviços é o que detém a maior fatia do PIB, 70%, e o maior empregador, 60% dos empregos. A indústria, como sempre, trabalha com o lobby mais poderoso. E aí, meu amigo Hauly? - Lula cria Ministério da Pequena e Média empresa e do Empreendedorismo. Para acolher o Centrão. Mais um espaço burocrático. Quase 40 ministérios. 15 a 20 já seria uma boa régua. - A taxação dos super-ricos, investidores de fundos fechados, passará pelo crivo parlamentar? Tenho dúvidas. - Déficit zero no Orçamento de 2024? Duvido. - A violência no país chega ao cume da montanha. Chacinas e mortes em tiroteio na festa da bala. - Deputado Rubens Pereira Junior, do PT do Maranhão, quer mexer em tópicos da legislação eleitoral, a saber: 1) federações partidárias, prestação de contas,) propaganda eleitoral, regras do sistema eleitoral, registro de candidatura, financiamento de campanhas, inelegibilidade e violência política contra a mulher. - Bolsonaro faz queixa-crime, recurso contra o hacker Walter Delgatti Neto, conhecido por invadir o Telegram de membros da operação Lava Jato, por suposta prática do crime de calúnia. Fecho a coluna com o meu RN. "Só quero os ócro" O oftalmologista Manoel Teixeira de Araújo recebeu a mulher em seu consultório, em São João do Sabugi, para um exame de vista. Convidou a paciente para ler a tabuleta, para a qual apontava: "Por favor, a senhora pode ler estas letras"? Em sua sertaneja ingenuidade, a mulher respondeu com calma e muita convicção: "Doutor, ler mesmo eu não sei não, mas essa menina que tá aqui pode fazer isso por mim. O que eu quero mermo é os ócro. Só os ócro". Divertida historinha narrada por Valério Mesquita, da Academia Norte-riograndense de Letras, historiador e nosso pesquisador de "causos".
quarta-feira, 23 de agosto de 2023

Porandubas nº 818

Abro com o pai do Ariano. Quanta terra...! João Suassuna, velho coronel e líder político do Estado da Paraíba, pai do escritor Ariano Suassuna, ao punir um trabalhador de seu latifúndio, mandou dar um purgante de óleo de rícino e chamou dois jagunços aos quais deu essa ordem, no relato de Sebastião Nery: - Levem esse cabra até a fronteira da fazenda. Vão os três a pé. E o purgante não pode fazer efeito em minhas terras. Se fizer, podem sumir com ele. O homem saiu na frente dos dois capangas, andou, andou, apertou o passo, escureceu, e nada de chegar o fim da fazenda. O remédio começava a torturar e o homem suando frio e andando ligeiro. De repente, não aguentou mais, gemeu: - Êta coronel pra ter terra! Parte I Os heróis, onde estão? A figura do herói Em o Estado Espetáculo, Roger-Gérard Schwartzenberg pontua: o grande papel com que sonham os monstros sagrados da política é o de grande homem. O de herói, o semideus da mitologia, o homem excepcional, o homem das façanhas, do entusiasmo e da glória, o salvador, o messias, o chefe genial, o profeta de sua gente. Os clássicos Xenofonte desenhava o esboço do herói. Aquele que impunha respeito, um ser superior. Aristóteles via no herói o gênio. Maquiavel também admitia o homem excepcional que se impõe sem contestação, um "deus entre os homens". Rousseau via no herói o homem "extraordinário", o legislador que produz leis, o fundador do Estado. Max Weber distingue três tipos de autoridade; a tradicional, fundamentada nos costumes; é a do senhor feudal, o monarca hereditário e a legal-racional, ancorada nas instituições. A ele se emprestando obediência em função do papel conferido pela Constituição. E, por último, a carismática, aquela que porta um dom particular conferido pela graça divina. Nietzsche O filósofo dizia: "o super-homem destrói os ídolos, orna-se com seus atributos; a apoteose da aventura humana é a glorificação do homem-Deus". A propaganda nazista/fascista criava uma nova religião: o culto do Estado e de seu chefe. Os heróis? Quem? Quem teriam sido heróis? César, Jesus Cristo, Luiz XIV, Hitler, Mussolini, Tito, João XXIII, o papa, De Gaulle, Roosevelt, Kennedy, Churchill, Stalin, enfim, que perfis podem ser inseridos na seara do heroísmo? Os seres que ilustraram a história com seus atos e sua política ou aqueles reverenciados sem as trambicagens do autoritarismo, o poder de mando pela força? Cada país tem seus heróis, seres venerados e cultuados por seu povo. Trata-se de tarefa inglória defender ou limitar os espaços de domínio dos heróis. Assassinos? Afinal, é possível considerar herói quem foi responsável pelo assassinato de milhões ou milhares de pessoas? Seria cabível considerar Hitler um herói? Só mesmo na imaginação de seus adeptos. Da mesma forma que Stalin e todos os outros, do passado ou da contemporaneidade, cujo âmbito de ação abrigaria a responsabilidade pela "matança" ou desaparecimento de seres humanos ou mesmo destruição da natureza. Por isso, é complexa a tarefa de classificar heróis e heroísmo. E por aqui? Quem são os nossos heróis? O descobridor Pedro Álvares Cabral? Uh, longe de ganhar essa láurea... Pedro I, o Imperador, ganharia no voto popular. Tiradentes já entraria melhor na galeria. Os ídolos populares de nossa história integrariam também a fileira de retratos na parede. Alguns dele ainda estão presentes no memorial de nossa gente: Getúlio Vargas, Kubitschek, Jânio, Garrincha, Pelé, Airton Sena. Fiquemos assim... Viram como é difícil classificar o tipo heroico? Na área política, este escriba tem restrições para considerar heróis aqueles que, reconhecidamente, provocaram e/ou provocam atos contra o povo, assassinatos ou desaparecimento de indivíduos, e que cometeram/cometem injustiças. Por isso, a luz que ilumina essa trilha é a da Justiça, a virtude de dar a cada qual o que lhe merece por direito, fazendo o bem, partilhando suas glórias com a coletividade. Por isso, é mais fácil (ou cômodo) ficar no terreno esportivo, onde os aplausos e o reconhecimento aos feitos dos protagonistas são mais intensos. Quem tem dúvidas de que Garrincha, Pelé, Guga, o tenista, e Airton Sena, o campeão de automobilismo, se enquadram nessa categoria? O povo procura um herói O Brasil está à procura de um herói. Mas o herói procurado não é aquele capaz de operar milagres, um São Jorge de espadas determinado a matar os dragões da maldade. O povo passou a rejeitar perfis milagreiros, divinos. O herói procurado deve ter face humana, uma feição plasmada pelos valores da honestidade, ética, autoridade, respeito, determinação, coragem, despojamento, simplicidade. Há alguém com esse perfil? Quem se arrisca a apontar algum? A nossa galeria de heróis é uma parede vazia. A seleção de futebol já não encanta. Os esportes, por sua vez, são enrolados com o manto do marketing. P.S. Atenção, muita atenção. O populista não é necessariamente um herói. Neymar? Jamais Veja-se Neymar, o contundido, com seu quase um bilhão das Arábias. Puro marketing. As disputas são movidas pela força do metal. E o glamour se esvai dos palcos e estádios, sufocando nossas emoções. O mundo se materializa. Os homens são cada vez mais tratados como coisas. Aqueles que merecem aplausos unânimes estão enterrados no cantinho da saudade. Da política, sobram poucos. Tancredo nem teve tempo de dar fulgor à imagem. Recebeu o pranto nacional, com as esperanças perdidas. Juscelino Kubitschek foi um símbolo de progresso. Quem mais? Só mesmo os vultos de nossa história mais antiga. A dissonância nacional O desfile nas telas de TV é uma ampla exibição da dissonância nacional. Passam pelos nossos olhos figuras esquisitas e discursos tortos. Alguns querendo aparecer como heróis. A demagogia campeia nas promessas mirabolantes, na recitação artificial de qualidades inventadas, na exposição de cenários e propostas irreais, nas mentiras proferidas nas CPIs. A política no Brasil está se transformando em um grande comércio, onde atores procuram se revezar no balcão das trocas. Será que a maior parte dos 5.568 prefeitos estarão se recandidatando? Para ficar mais pobres ou mais ricos? Ache seu herói Leitor, procure achar seu herói. Não precisa distinguir nele a aura dos santos. Basta olhar para os perfis, avaliar o seu passado, examinar o que faz ou o que promete, compará-lo com outros. Tenha cuidado para não comprar gato por lebre. Há muito canalha desejando parecer santo. Parte II Raspando o lixo.... - Na Conferência dos BRICS, há uns 20 países que tentam entrar no Grupo. Seria uma desconfiguração do atual modelo. Lula quer incluir os latino-americanos. - Dilma, com seu supersalário, presidente do Banco dos BRICS, posa de toda poderosa. - Já estão culpando o competente Marcos Troyjo, ex-presidente do Banco, por faltar dinheiro nos cofres. - Osires Silva, meu candidato à "guerreiro da educação" no troféu CIEE. O setor aeronáutico brasileiro deve muito a ele. - A cúpula das Forças Armadas está preocupada com a queda da boa imagem do setor. E mais ainda com o desenrolar da CPMI do 8 de janeiro. O que acontecerá com o tenente-coronel Mauro Cid e com o pai dele, o respeitado general Lorena Cid? - A campanha para a prefeitada, em 2024, será a mais endinheirada dos últimos tempos. O primeiro turno da eleição ocorrerá no primeiro domingo de outubro, dia 6. - Os municípios com mais de 200 mil eleitores terão, caso necessário, segundo turno, no último domingo de outubro, para o cargo de prefeito, caso nenhuma das candidatas ou candidatos ao cargo obtenha metade mais um dos votos válidos no primeiro turno. - Os partidos do centro lutarão para fazer a maior "baciada" de prefeito. - O ministro José Múcio, da Defesa, expõe seus dotes como cantor/compositor de músicas românticas. Com um disco na praça. - Parte considerável do planeta padece do maior calor da história. Anúncio da terra devastada. - Se Milei ganhar a eleição, na Argentina, os nossos trópicos viverão tempos mais tensos e perigosos. - A Fiesp promove importantes debates sobre o país, com palestras dos presidentes do Senado e Câmara, Rodrigo Pacheco de Arthur Lira, do diretor de política monetária do Banco Central, Gabriel Galípolo e do ex-deputado Fábio Feldmann, que sob o comando do ex-presidente da República, Michel Temer, discorreu sobre Meio Ambiente. Programação intensa. O maior foro de debates, depois do Congresso Nacional. Parabéns ao presidente Josué Gomes da Silva. - A campanha paulistana para prefeito será ideologizada: esquerda versus direita. A conferir. - Quando a vida de um depende da morte de outro: é o que me vem à mente com essa triste notícia do transplante de coração para Faustão. E para milhares de outros que estão na fila de espera do SUS. Fila da morte. - A vida é como um pequeno fio que se esgarça na camisa quando apertamos o botão. - Tristeza pela morte da mãe Bernadete, líder quilombola. A lei do fuzil. Fecho com mais uma historinha da Paraíba. Brejo das Freiras é uma Estância Termal nos confins da Paraíba, perto de Uiraúna e Souza. Trata-se de um lugar para relaxamento e repouso. O Governo da Paraíba tinha (não sei se ainda tem) um hotel, com uma infraestrutura para banhos nas águas quentes. Década de 70. Apolônio, o garçom, velho conhecido dos fregueses da região, recebe, um dia, um hóspede de outras plagas. Pessoa desconhecida. Lá pelas tantas, quase terminando a refeição, o senhor levanta a mão, chama Apolônio e pede: - Meu caro, quero H2O. Susto e surpresa. Anos e anos de serviços ali no restaurante e ninguém, até aquele momento, havia pedido aquilo. Que diabo seria H2O? Apolônio, solícito: - Pois não, um instante! Aflito, correu na direção da única pessoa que, no hotel, poderia adivinhar o pedido do hóspede. Tratava-se de Luiz Edilson Estrela, apelidado de Boréu (por causa dos olhos grandes de caboré), empedernido boêmio, acostumado aos salamaleques da vida. - Boréu, tem um senhor ali pedindo H2O. O que é isso? Desconfiado, pego sem jeito, Boréu coça o queixo, olha pro alto, tenta se lembrar de algo parecido com a fonética e, desanimado, avisa: - Apolônio, sei não. Consulte o Freitas. Freitas era o diretor do Grupo Escolar, o intelectual da região. Localizado, o professor tirou a dúvida no ato: - H2O é água, seus imbecis. Quer dizer água. Apressado, Apolônio socorreu o freguês com uma jarra do líquido. Depois, no corredor, glosando o feito, gritou em direção a Boréu: - Ah, ah, ah, esse sujeito achava que nós não sabia ingrês. Lascou-se!
quarta-feira, 16 de agosto de 2023

Porandubas nº 817

Parte I Abro com Goiás. Não mudou nada Miguel Rodrigues, velho e sábio político de Goiás, foi visitar uma escola primária. Ali, a professora ensinava os primeiros dias de Brasil: - No começo do Brasil colônia, como a América e o Brasil ficavam muito longe, para cá vieram, primeiro, muitos ladrões, degredados, condenados. O coronel Miguel suspirou: - Então não mudou nada. Modos de governar - Chimpanzé, Maquiavel e Gandhi A democracia é um jogo de cooperação e oposição. No tabuleiro de cooperação, as regras são a persuasão, a negociação, os acordos, a busca de espaços de consenso. No campo de oposição, o método é o de medir forças, confrontar o adversário, provocar tensões, desgastar, impor a vontade pela força. Esse jogo implica em escolher as formas de governar que expressem o estilo do governante. Carlos Matus, cientista social chileno, aponta três estilos: o modo chimpanzé, o modelo Maquiavel e a forma Gandhi. O modo chimpanzé Esse modelo se ancora no projeto de poder pessoal, na rivalidade, na hierarquização de forças. Quem entra como uma luva na mão no modo chimpanzé é Arthur Lira e seus comandados, que lutam por espaços de poder e influência, com o chefe olhando para seu projeto de poder pessoal, usando seu corpo de aliados para garantir "o poder pelo poder". Usam a arma de manobra da agenda legislativa e o voto em plenário. O objetivo é ampliar terrenos e aumentar o número de "feudos" sob seu mando. Para tanto, adotam a tática de disparar processos de tensão, ameaçar o governo com retiradas de apoio, buscar novas coalizões de um lado e de outro. "O fim sou eu mesmo". A representação popular é algo menor. O ideal da vida é conservar o próprio representante. O modo Maquiavel Ancora-se no personalismo do Príncipe, coluna vertebral do modelo, que procura desfraldar a bandeira do projeto de Estado. Ele, o Príncipe não é o projeto, o projeto é o Brasil. Quem se encaixa no modelo? Luiz Inácio Lula da Silva. É o que mostra, por exemplo, o novo PAC, ambicioso empreendimento em praticamente todas as áreas do governo, com um orçamento de R$ 1,7 trilhão. O objetivo, que se infere, é a reeleição em 2026. Tudo deve ser sacrificado pelo projeto, a partir da distribuição de recursos por partidos e representantes. Para atender à competição feroz da classe política, a conduta maquiavélica faz concessões ao estilo chimpanzé, e este acaba ganhando o jogo. Não há como escapar à sensação de que o país desce o despenhadeiro. A imagem pode ser forte. Mas é o que se vê, quando se constata a imensa dificuldade de se cumprir os compromissos da âncora fiscal. Gastar menos do que o país pode suportar. O modo Gandhi No Brasil, as manobras divisionistas vencem as táticas de cooperação e é por isso que o país anda devagar. As reformas caminham a passos lentos. Se em cima e no meio, elites e políticos fazem a confrontação, em outras margens da sociedade reina um clima de concórdia e solidariedade. Os pobres não têm munição para fazer guerra. No meio de humildes e marginalizados, reparte-se o pão, cultiva-se a amizade, busca-se a cooperação, o adversário é respeitado e a honestidade é um valor coerente entre a palavra e a ação. A política obedece ao estilo Gandhi, onde o líder representa o consenso, a austeridade e a modéstia. Ele não carece de força física, porquanto repousa seu poder na espiritualidade. Trata-se de um estágio superior de cultura, mas não é necessário alguém se transformar em Papa ou Madre Tereza de Calcutá para alcançar tal grandeza. Esse é o estilo que o Brasil precisa incorporar à modelagem governativa. Quem se enquadra nessa moldura? Há alguém no horizonte? P.S. Nunca precisamos tanto como agora do diálogo, da elevação dos espíritos, da negociação, da convivência, de um pacto por causas coletivas. Transformar a cultura egocêntrica da política numa cultura socio-cêntrica, inspirada na motivação pelos ideais da sociedade. A maldição de Sísifo A vida é um eterno recomeço. Recordemos o castigo de Sísifo. De vida solerte e pecaminosa, conseguiu livrar-se da morte por duas vezes, sempre blefando. Rei de Corinto, não cumpria a palavra empenhada, até que Tânatos veio buscá-lo em definitivo para jogá-lo no Hades. Como castigo, os deuses o condenaram impiedosamente a rolar montanha acima com um grande bloco de pedra sobre os ombros. Quase chegando ao cume, o bloco desaba montanha abaixo. A maldição de Sísifo: recomeçar tudo de novo, tarefa que há de durar eternamente. O povo brasileiro se sente no estado de um eterno recomeço. Quando acha que as coisas estão se normalizando, o desastre aparece. Os horizontes estampam: pequenas e grandes catástrofes, escândalos, corrupção desbragada, favorecimentos, ausência de critérios racionais, mandonismo, novos impostos, politicagem, feudos, deterioração dos serviços públicos, falta de continuidade nas administrações. Parte II Raspando o tacho - Se o fluxo de novas descobertas continuar desvendando o affaire das joias oferecidas ao ex-presidente Jair Bolsonaro em viagens internacionais, que teria tentado passá-las para seu patrimônio pessoal, desenha-se uma prisão. - O ministro Alexandre de Moraes, com quem está o imbróglio, no STF, deve estar sob intensas dúvidas. Tomar uma decisão sobre o caso: remeter a questão para a 1ª instância? Ordenar uma prisão? - O advogado e jurista Miguel Reale Jr. garante que tem fundamento uma prisão preventiva. - Jair coloca suas contas à disposição da Justiça. Comenta-se que só usa dinheiro vivo para pagar contas. - O jurista e desembargador Walter Maierovitch identifica os crimes de peculato, lavagem de dinheiro e outros no caso, mas é cauteloso quanto a uma prisão no momento. Sugere seguir a trilha da legalidade. Em sua contabilidade, os crimes cometidos já somam uma pena de uns 10 anos. - Bolsonaro não tem mais foro privilegiado. O caso pode seguir para a 1ª instância. - O fato é que aliados se afastam ante um silêncio que fecha a boca de protagonistas. - Há ilícitos de todos os lados. Sujeira. Procurador alerta Aras, o PGR, sobre 'ilegalidades' em desconto de R$ 6,8 bilhões em favor da J&F. - Se ocorrer prisão, é de se prever manifestação de rua. O Brasil continua dividido. Há certa preocupação com o 7 de setembro. - Grandes empresas têm avançado na montagem de sistemas de proteção de dados. - A polícia da Bahia matou 1.464 pessoas em intervenções em 2022. Nos Estados Unidos, as forças de segurança mataram 1.201 pessoas. A Bahia ganha o título de território de maior letalidade, comparada a de um país de 330 milhões. Tem apenas 15 milhões. Santo Antônio de Jesus é o município mais perigoso, com 116,9 mortes a cada 100 mil habitantes. A taxa média brasileira é de 24,9. Proteja Santo Antônio, Jesus. - Essa é surpreendente: o ser humano pode chegar a viver 20 mil anos. É o que garante o especialista em biogerontologia molecular, professor português João Pedro de Magalhães, da Universidade de Birmingham, na Inglaterra. Publicou um estudo no site Scientific American. - O governador de Roraima, Antônio Denarium, foi cassado pelo TRE. Teria distribuído cestas básicas na campanha. Apelou para o TSE. Defende-se no cargo. - E se Javier Milei, candidato da extrema-direita, ganhar a eleição presidencial na Argentina? Como será a convivência com Lula, hein? Defensor do fim do Banco Central e de propostas libertárias na economia, o candidato não depende de apoio militar. Como Bolsonaro, é a favor do povo armado. Considera-se um "anarcocapitalista". - Ronaldo Caiado se prepara para o embate de 2026. A acompanhar. - Outra variante do Covid-19: Eris. Trata-se de subvariante da ômicron, predominante nos EUA, com crescimento no Reino Unido. Não causa doença grave nem representa maior risco à saúde pública, garantem autoridades no tema. - Fernando Haddad, o poderoso ministro da Economia, dá o aviso: "a Câmara está com um poder muito grande e não pode humilhar o Senado e o Executivo". - Atenção com gorduras e carboidratos. Mais um alerta da OMS, destacando a importância de levar em conta tanto a quantidade quanto a qualidade do que é consumido. "Não há novidades nas orientações sobre o consumo de gorduras, mas, em relação aos carboidratos, a nova orientação destaca a importância da inclusão de carboidratos de boa qualidade para uma boa saúde", avalia a nutricionista Serena del Favero, do Hospital Israelita Albert Einstein. - Esse novo PAC é o guarda-chuva que Lula reconstruiu para abrigar seu governo de chuvas e trovoadas. Vai ser difícil. Controlar as obras e conferir as "inacabadas" é tarefa para um Hércules sem dores no quadril. Fecho com o Paraná. De paranaenses Jorge Takachi, japonês simpático e generoso, querido em toda a cidade, saiu candidato a prefeito de Nova Esperança/PR. A oposição começou a falar mal dele. Jorge Takachi não aguentou. Foi fazer comício: - Jorge Takachi bom para a cidade, constrói hospital, dá dinheiro para a igreja, ajuda os pobres, paga feira dos outros, povo diz: Jorge Takachi muito bom. Jorge Takachi candidato a prefeito, povo diz: Jorge Takachi filho da puta. Num é, né? Assim, Jorge Takachi não entende povo. Risadas. E comentários gerais: "Takachi não entende mesmo".
quarta-feira, 9 de agosto de 2023

Porandubas nº 816

Abro com JK nos velhos tempos ditatoriais. JK? Anos de chumbo grosso. Tempos magros, época de fechadura braba. Falar em Juscelino era, no mínimo, pecado mortal. Mudança das placas dos carros, as chamadas alfanuméricas. A Câmara Municipal de Diamantina oficia ao CONTRAN solicitando as letras JK para as placas dos carros do município, "como uma forma de homenagear o grande estadista John Kennedy". O CONTRAN não atende. Um conterrâneo de Juscelino desabafa: - Esse pessoal do Conselho deve ser republicano, eleitor do Nixon. (Historinha de Zé Abelha) Parte - I As democracias correm perigo? Sim. A resposta é afirmativa. As democracias correm o risco de estiolamento ante a emergência de um conjunto de ameaças que partem de lideranças, situações e ondas que aparecem em todos os quadrantes do planeta. Mesmo as democracias consolidadas, como a norte-americana, não estão imunes aos fenômenos corrosivos. O livro Nesse sentido, os pensadores Steven Levistky e Daniel Ziblatt escreveram o livro "Como as democracias morrem". Descrevem uma paisagem de corrosão, com destaque para o caso dos EUA, onde, nos anos recentes, assistimos a uma tentativa de golpear o sistema. O autor da mal-sucedida operação foi Donald Trump. Morte ou enfraquecimento? É mais viável acreditar e constatar o enfraquecimento dos sistemas democráticos, não na sua morte, cujos efeitos seriam desaparecimento, extinção, ausência. Daí acharmos conveniente falar em perda de vigor, entorpecimento, queda de alguns dos eixos democráticos. Quantas democracias? Deve haver, segundo critérios de institutos que se dedicam à análise do tema, cerca de 100 democracias no mundo. O Polity Project - projeto que classifica o regime político dos países ao longo do tempo - havia nos meados dos anos 80, 42 democracias, abrigando 20% da população mundial. Em 2015, esse número subiu para 103, com 56% da população mundial. Atente-se para a existência de 195 países no mundo. Com uma população de 8,05 bilhões. Fatores Segundo Levitsky e Ziblatt, há fatores que estão por trás da fragilização das democracias. Um deles trata das regras de escolha dos candidatos a presidente, que propiciam condições para a escolha de um outsider como Trump. Outro é a tolerância mútua, o reconhecimento de que os rivais têm o mesmo direito de competir pelo poder e governar. E há ainda o compromisso com as instituições, significando evitar ações que, mesmo respeitando a lei, violam claramente seu espírito. Em suma, uma democracia necessitaria de líderes que conheçam e respeitem as regras informais. O autoritarismo O fato é que, mesmo nos EUA, as instituições podem dar vazão ao autoritarismo. É quando "reescrevem regras eleitorais, redesenham distritos eleitorais e até mesmo rescindem direitos eleitorais para garantir que não perderão", de acordo com Levistky. Qualquer semelhança com o Brasil não é mera coincidência. Por aqui, temos observado um forte ímpeto autoritário, a par de intensa interpenetração de deveres e funções entre as instituições do Estado. (Tirem suas conclusões) Tempos imemoriais O autoritarismo se instala com a ascensão de um poder central e supressão das liberdades individuais e coletivas. Muita repressão. Perseguição. Censura. Caímos nas ditaduras. Há um líder supremo. A ordem deve emanar de uma pessoa. Trata-se de um sistema secular. O apoio popular A viabilidade de líderes que se inserem no território autoritário ocorre quando as massas, insatisfeitas com o status quo, manifestam de modo explícito ou subjacente razoável grau de apoio aos protagonistas que encarnam "virada de mesa" ou mudança da ordem governativa. Quando as massas acorrem às ruas, o sucesso dos "autoritários" sob a capa populista é mais viável. Dessa forma, vemos os "mudancistas" assumirem o poder sob um poderio corrosivo para as instituições. A insatisfação As manifestações das massas se avolumam quando as economias descem o despenhadeiro. Falta de dinheiro no bolso para prover as mínimas necessidades do indivíduo adensam a insatisfação popular. Nesse meio, quando surge um protagonista envergando nova aparência, as massas se inclinam em sua direção. Ganha ele mais apoio quando desafia a velha ordem, prometendo refazer as coisas e acenando com o lenço da esperança (seja ele branco, vermelho ou verde-amarelo). O declínio dos partidos Nessa moldura, são visíveis os traços de definhamento dos partidos políticos, nas ondas que engolfam as ideologias, os parlamentos, a desmotivação das massas, a personalização da política. De modo paulatino, as democracias perdem seiva e vigor. O resgate dos eixos democráticos Reconstruir o edifício da democracia, vitalizando seus andares, é um exercício de muita paciência. Quando se trata de militares, que tomam o poder sob a força das armas, tal recuperação vai depender da índole dos líderes, da pressão das massas nas ruas, da pressão internacional e a imagem (geralmente desgastada ) do país, entre outros componentes. No contexto internacional, o autoritarismo que abre portas para as ditaduras, enfrenta grandes dissabores. Mesmo as grandes potências, como Rússia e China, entram na área do desgaste. Parte - II Raspando o tacho - Lula desce do trono ambiental e proclama: o bioma amazônico não pode ser visto apenas como "santuário". Deve gerar riqueza. - A cúpula amazônica é mais um evento político. Um sucesso. Seu caráter técnico está esquecido. Os países do grupo amazônico têm réguas diferentes. - Vem aí a moeda digital: Drex, o primo do Pix. O público deve ter acesso a ela em finais de 2024. Inserção digital da moeda. - 410 bilhões de dólares. Espantado? Pois essa é a soma do comércio ilícito na economia mundial. Só na América Latina, o contrabando movimenta US$ 210 bilhões ao ano. No Brasil, segundo o COAF, o setor mais vulnerável ao comércio ilegal é a indústria do tabaco, onde quase metade (48%) do mercado nacional é dominado por cigarros contrabandeados, principalmente do Paraguai. - 17 mil e-mails na lixeira, eis o legado que o grupo bolsonarista, no entorno de Bolsonaro, deixou para conferência da Justiça. - Ozonoterapia, a nova receita aprovada pela Anvisa e sancionada por Lula. Cada qual com suas maluquices. - De Fernando Rodrigues, o competente jornalista de Poder360: Bolsonaro se articula com Ricardo Nunes, prefeito de São Paulo, após apoio oficial e manifesto do PT ao pré-candidato Guilherme Boulos, do PSOL. Campanha será nacionalizada. - Romeu Zema, governador de MG, com sua visão separatista, mostra-se um ponto fora curva da política: jejuno, inexperiente, infantil, despreparado, um elefante limpando uma loja de cristais. O Nordeste agradece. Mobilizar os Estados do Sul/Sudeste contra o NE é um disparate. Para não usar uma palavra mais forte. - Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo, volta e refaz opinião: Escolas podem e devem usar livros impressos, não apenas digitais. Política é a arte de dançar bem em todas as circunstâncias. Tarcísio vai bem nos mais diferentes palcos. - A técnica da seleção brasileira feminina de futebol, a sueca Pia Sundhage, deverá deixar o cargo. Por pressão. - Os casos de assédio, estupro e violência, praticados por jogadores de futebol, com destaques diários na mídia, serão intensamente diminuídos. O receio de punição baixou nos gramados. A conferir. - O Plano Real completou 29 anos no dia 1º de julho último. Foi o grande marco na história econômica do país. Em 1994, sob o governo de Itamar Franco, tendo FHC como ministro da Fazenda, o Real acabou com uma inflação de 40% ao mês. - Na época, o PT votou contra o Plano Real. O Diário do Congresso de 19 de maio de 1994 dá conta que o então deputado Jair Bolsonaro, então no PRP, também votou contra a Medida Provisória 482, que implementou a URV (Unidade Real de Valor) e, consequentemente, a conversão da moeda. O aniversário de 92 anos de FHC reuniu uma coleção de figurantes de todos os partidos, 90 pessoas, em torno de uma grande mesa de almoço, organizado por Andrea Matarazzo. Passaram por lá o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, e o ex-presidente da República, Michel Temer. Fecho a coluna com Benedito Valadares. Zema, o atual governador de MG, deveria conhecer melhor suas tiradas para aprender sobre "raposice política". Quiçá e cuíca Benedito Valadares, governador, foi a Uberaba para abrir a Expozebu. E passou a ler o discurso preparado pela assessoria. A certa altura, mandou ver: "cuíca daqui saia o melhor gado do Brasil". Ali estava escrito: "quiçá daqui saia o melhor gado". A imprensa caiu de gozação. Passou-se o tempo. Tempos depois, em um baile na Pampulha, o maestro, lembrando-se do famoso discurso na terra do zebu, começou a apresentar ao governador os instrumentos da orquestra. Até chegar na fatídica cuíca. E assim falou: "e esta, senhor governador, é a célebre cuíca". Ao que Benedito, querendo dar o troco, redarguiu com inteira convicção: - Não caio mais nessa não. Isto é quiçá! (Historinha enviada por J. Geraldo).
quarta-feira, 2 de agosto de 2023

Porandubas nº 815

Abro com a matreirice do sábio mineiro JMA. José Maria Alkmin, um dos maiores sábios mineiros, nunca perdia a tirada. O eleitor chegou aflito: - Doutor Alkmin, meu filho nasceu, eu estava desprevenido, não tenho dinheiro para pagar o hospital. A matreira raposa tascou: - Meu caro, se você que sabe isso há nove meses, estava desprevenido, calcule eu que soube agora. Parte I A vida é um espetáculo Hoje, o tema é a violência, que para ser compreendida, carece do desenho da paisagem onde se apresenta. Pinço, para começar, o lembrete do escritor francês Roger-Gérard Schwartzenberg (O Estado Espetáculo): A política, outrora, era ideias. Hoje, pessoas. Personagens... Cada dirigente parece escolher um emprego e desempenhar um papel. Como num espetáculo. Vou mais adiante. Não só a política virou espetáculo. A vida hoje é embalada no celofane da espetacularização. Até a violência é espetáculo. Puxa os fios do divertimento. Às vezes, puxa a catarse. Divertir Roger-Gérard lembra que divertir significa desviar-se da ocupação. Distrair a atenção. A pessoa é desviada de pensar em problemas essenciais com os quais deveria se preocupar. Pascal, a partir desse conceito, passou a usar a palavra "divertimento", que nos distrai e nos ilude, nos engana. O divertimento político absorve a atenção do público. Daí se extrai uma nova leva de conceitos. Personalização A pessoa se sobrepõe à ideia. Figurantes substituem a estrela na hora de ajustar os focos de luz. Na contemporaneidade, o espetáculo tomou conta do Estado. Seus personagens e programas entraram no palco. Até a morte ganhou adereços de espetáculo. Números da morte Todos os dias, deparamo-nos com os números da morte. O último grande número foi o da Covid-19, que registrou 700 mil mortes no Brasil. 500, 600, 1 milhão, cifras impactam, mas se nivelam. Morrem amigos. Antigamente, ante a notícia de morte de um conhecido, a reação seria assim: "Que Deus o tenha... puxa, foi embora cedo". A comoção já não tem a intensidade de outrora. Até as 18h40 desta segunda-feira, a população mundial era de 8.051.535.706; 77.910.603 nascidos neste ano; 286.560 nascidos hoje; 35.253.725 mortes este ano; 129.213 mortes hoje; 42.656.879 - crescimento populacional este ano. Até dez minutos atrás. Quem se importa se houver um milhão a mais?Manchetes do início da semana Os dados do cotidiano aparecem. Abrimos a semana com as manchetes estampando: ...Agentes celebram e fazem 'contagem de mortes' em operação em meio a relatos de tortura no Guarujá (SP): 'Hoje as pessoas vão morrer'... ...Sniper do tráfico que matou agente em SP deixou ao menos 10 mortos... ...PMS comemoram mortes em massacre no Guarujá. ...Tiro a mais de 50 metros que matou PM da Rota no Guarujá partiu de 'sniper do tráfico'... ...Bahia registra 15 mortos após confrontos entre policiais e suspeitos; arsenal apreendido era exibido em redes sociais. ...Morrem 110 pessoas por dia no Brasil, vítimas da violência. ...Sobe para 54 o número de mortos em atentado suicida reivindicado pelo Estado Islâmico no Paquistão. Banalização gera amortecimento Um dos efeitos da exposição diária da violência é a banalização. As gigantescas quantidades de mortes que as mídias registram no cotidiano acabam gerando o fenômeno do embrutecimento, que carrega o amortecimento, a ausência de emoção, surpresa, susto, enfim, a impassividade do leitor/ouvinte/telespectador diante das situações de violência expostas. A falta de comoção social ganha intensidade na paisagem de sangue desenhada pelos atos violentos. Um incêndio Costumo pinçar o exemplo do incêndio para focar a catarse que laça os contingentes sociais. Diante de um incêndio que devasta os andares de um arranha-céu, as pessoas vão chegando, chegando, formando uma aglomeração diante do fogo que se alastra. O espetáculo toma conta dos ânimos. As cenas de bombeiros subindo em escadas atraem a atenção. Helicópteros surgem do alto e tentam baixar no teto do edifício para salvar vítimas que correram para o último andar. As pessoas, mesmo sob lamentos e até choro, entram em catarse. "Graças a Deus, não estou ali", pensam em seus íntimos. O incêndio vira um espetáculo, que vai render longa conversa com os familiares ao chegarem em suas casas. Anomia Outros fenômenos se juntam para impregnar a alma do vivente. A anomia é um deles. A ausência de lei. A desordem toma o lugar da ordem. E aí, a desordem institucional nos cerca. O estado de anomia começa com a falta de boa fé entre os homens. Ou de confiança. Basta verificar a política de emboscadas que inspira o relacionamento entre os partidos nacionais. Na base governista, as dissensões se acentuam. Os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário vivem às turras, energizados por visões que parecem inconciliáveis a respeito de temas polêmicos. A impunidade generalizada reforça o sentimento de descumprimento de lei. As eleições As eleições, então, constituem uma batalha acirrada, onde não faltam os impropérios, as denúncias contra adversários, a calúnia e a difamação, a compra de votos, a cooptação pelo empreguismo e pela distribuição de benesses. A política, como exercício democrático da defesa de um ideário social, como missão para salvaguarda dos interesses coletivos, está cada vez mais assemelhada ao empreendimento negocial, voltado para o enriquecimento de indivíduos e grupos. A liberdade comprimida O conceito de liberdade confunde-se com a baderna gerada pela liberalidade extrema, tocada pela improvisação, pela irresponsabilidade, pela invasão dos espaços privados (MST continua sua política de invasão). Quando o escopo libertário foi esculpido, no bojo da Revolução Francesa, carregava consigo o eixo da promoção dos valores do homem, da defesa dos direitos individuais e sociais, da dignidade e da Cidadania. O imperalismo disfarçado O inimigo que se combatia era o Estado opressor, o absolutismo monárquico e a escravização que fazia do ser humano. Erigiu-se o altar das liberdades que, ao longo da história, tem sido conspurcado por outras formas de vilania e torpeza. Na modernidade, a opressão econômica, a subordinação dos valores e princípios espirituais ao prazer das coisas materiais, a miséria absoluta que maltrata parcelas significativas da sociedade, a desigualdade de classes, o descompromisso de governos e representantes do povo para com os destinos da coletividade, entre outros elementos, contribuem para corroer o sentido da liberdade e da dignidade do homem. A banalização da desordem A banalização da violência; a morte súbita a que estão sujeitas pessoas de todas as idades, em qualquer região do país; o descumprimento das leis; a falta de parâmetros reguladores que definam responsabilidades nas instâncias públicas; a angústia do desemprego; a frustração das classes médias em constatar rebaixamento em seu nível de vida; e o enriquecimento escandaloso de grupos que se incrustam na administração pública; a política incapaz de promover mudanças profundas no tecido institucional, a corrupção que continua e a impunidade - arrematam o sentimento de que a vida do país é um território de anarquia. Um país desorganizado. O lamento de Bolívar Simon Bolívar, em tempos idos, escreveu: "não há boa fé na América, nem entre os homens nem entre as nações. Os tratados são papéis, as constituições não passam de livros, as eleições são batalhas, a liberdade é anarquia e a vida um tormento". Parte II Raspando o tacho -O humor de Lula está diminuindo. O mau humor se avoluma sob as dores no quadril e no fêmur. - Bolsonaro começou a campanha de 2024. Começa a alavancar seus candidatos às prefeituras. - O governo político anda de forma trôpega. O governo econômico anda a passos firmes. - Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, é uma estampa em processo de boa visibilidade. - Quem anda na moita é Gilberto Kassab. Passarinho na muda não pia. - Trump deverá ser candidato à presidência dos EUA, condenado ou não. E ameaça ganhar. - Como um preparador físico de um grande time dá um soco na cara de um jogador? Sendo este um dos principais quadros? Estado geral de esculhambação, nos termos da parte I deste texto. - Dona Janja, a primeira-dama, é figura onipresente em eventos. Não está nem aí para comentários negativos. - Onde anda FHC? Encolhido? Olhando a cena de bico calado? - Lula, teoricamente, conta com 370 deputados alinhados ao governo. Na prática, cerca de metade. Muitos esperando o cofre abrir. - Camilo Santana, ministro da Educação, embola palavras e frases em seus improvisos. Parece natural. O ministro da Educação, porém, carece dar o exemplo. - Lula entre a cruz e a caldeirinha: a cruz, as invasões do MST sobre áreas privadas e públicas; a caldeirinha, o apetite voraz do Centrão. Lula garante que ele não existe. Mas vem reforma por aí para o grupo indicar seus prediletos. Fecho a coluna com a Paraíba. Campina Grande Num comício em Campina Grande/PB, o grande tribuno Alcides Carneiro falava e foi aparteado por um popular. - "Campina Grande é de Argemiro!..." ( seu opositor ) De imediato respondeu: - "Campina, és muito grande para pertenceres a um só homem...". Cruz das armas Em Cruz das Armas, na campanha política de 1950, iniciado o discurso de Alcides, o tempo mudou e começou a chover. Motivado, Alcides declarou: - "Sou recebido com palmas, bênção dos homens e, sob a chuva, bênção de Deus, que umedece e fertiliza o generoso solo da nossa Paraíba".
quarta-feira, 26 de julho de 2023

Porandubas nº 814

Abro com a hilária historinha do amigo Sebastião Nery. Ô jardineira... Na cidadezinha do norte do Rio de Janeiro, a procissão de Senhor Morto caminhava lenta e piedosa, na sexta-feira da Paixão, com o povo cantando, de maneira compungida, os hinos sacros. O velho padre na frente, o sacristão ao lado e os fiéis atrás, cantando as músicas que o vigário puxava. De repente um pequeno ônibus, que na região chamam de "jardineira", passou perto e começou a subir a íngreme ladeira da igreja, bem em frente da procissão. No meio da ladeira, a "jardineira" afogou, encrencou, parou, deu aceleradas fortes e inúteis e começou a dar para trás, de costas. Os fiéis não viram, mas o padre, atento, viu. E ficou apavorado. A "jardineira" já despencava numa grande velocidade. O padre gritou: - Olha a jardineira! E os fiéis começaram a cantar, em ritmo de samba: - Ô jardineira, por que estás tão triste? Mas o que foi que te aconteceu? Foi a camélia que caiu do galho, deu dois suspiros e depois morreu. A "jardineira" descambou ladeira abaixo, até que parou. Não atropelou ninguém. Sob o olhar do Senhor Morto! Mas os fiéis não aguentavam de tanto rir. Pergunta que não cala A pergunta continua no ar. Quem mandou matar Marielle Franco? Vou dar a resposta: o Brasil encapuzado. O Brasil do crime organizado. O Brasil dos bandidos das drogas, dos assassinos que comercializam as mortes, dos oportunistas e dos esquemas de apropriação ilícita do dinheiro público. Estourar o Brasil da arbitrariedade é meta impossível, mas diminuir seu tamanho é dever inarredável dos homens públicos e da sociedade organizada, sob pena de vermos cada vez mais fraquejar o ideal da democracia como governo do poder visível. Malhas da corrupção A tarefa em desvendar os poderes ocultos e as malhas de corrupção e de violência institucionalizada, que se processa no âmbito político e na esfera dos meios de comunicação, tem sido didática e de alta relevância para a conscientização da sociedade. A estratégia de combate aos poderes invisíveis, voltados para a arbitrariedade e a rapinagem, requer a força da pressão coletiva, mais que simples castigos aos criminosos. Não adianta prender um ou dois. Urge prender todos os integrantes do poder invisível. A ambição desmesurada No meu livro Marketing Político e Governamental, cito um pensamento do cientista político Robert Lane, em Political Life, que explica como a ambição desmesurada pelo poder funciona como um bumerangue. "A fim de ser bem-sucedida em política, uma pessoa deve ter habilidades interpessoais para estabelecer relações efetivas com outras e não deve deixar-se consumir por impulsos de poder, a ponto de perder o contato com a realidade. A pessoa possuída por um ardente e incontrolável desejo de poder afastará, constantemente os que a apóiam, tornando, assim, impossível a conquista do poder". O Brasil subterrâneo Na área do Brasil subterrâneo, são bastante disputados os jogos de interesse entre políticos; entre políticos e grupos econômicos; entre tecnocratas dos governos (Federal, estadual e municipal) e empresários; e facínoras. Os grupos se multiplicam em subgrupos, formando uma esteira que desce do topo até as bases da sociedade, onde nadam os "bagrinhos" levados pela onda dos grandes "tubarões". Na área do Brasil arbitrário e violento, o campeonato é disputado, entre outros, por contingentes marginais das drogas, pelo aparato policial e pelos dois sistemas conjuntamente, que frequentemente jogam no mesmo time. E não se pense que o sistema jurídico está fora disso tudo. Não. A corrupção e a arbitrariedade também imantam perfis de parcelas do sistema judiciário, na forma de decisões injustas, parcialidade em julgamentos, enfraquecimento de posições, atenuação de culpas, vistas grossas a processos, prejulgamentos e desvio de padrões condizentes com a missão da Justiça. Sentimento de descrença Os comportamentos tortuosos de representantes e agentes de todos os setores da vida produtiva e do sistema institucional do país acabam estabelecendo uma densa camada de insensibilidade social e fortes manchas nos padrões morais e éticos. Além, é claro, de contribuírem para o estiolamento das instituições nacionais. A escalada do caos resulta na sensação geral de incredibilidade, descrença, frieza, mesmice, eixos da cultura de acomodação que amortece o tecido social. Os súbitos ciclos de sensibilização, fruto de violências explícitas do aparelho policial e de denúncias sobre grandes escândalos, chegam até a criar na sociedade um desejo de participação e um sentimento de indignação. Lutar pela plena cidadania Mas os sentimentos de repúdio tendem a cair no vazio, por não encontrarem mecanismos de continuidade capazes de deixar sempre acesa a chama da consciência coletiva. Essa meta só será conseguida quando o mais humilde dos cidadãos decidir abandonar o anonimato das massas para se transformar em agente ativo de sua própria história. Daria ele, assim, um gigantesco passo rumo à plena cidadania. A conquista da cidadania O povo, em suas extremas carências, tem dificuldades de exercer sua cidadania. Sua autonomia de decisão é escassa e tênues são suas vontades. Em consequência, submete-se, como entidade passiva, à opressão dos discursos e a uma engenhosidade operacional e técnica que acaba sugando suas emoções. Vota em candidatos salvadores da pátria, confia em promessas e propostas e morre na praia dos desconfortos. Quando se abre a portinha do lamaçal, começa-se a desvendar a identidade cultural da política brasileira e a hipocrisia das elites. Estas são verdadeiramente as fontes do poder corrupto. Quem acredita em CPI Instalam-se CPIs, a dos movimentos golpistas de 8 de janeiro, a do MST. Ora, ninguém aposta em seus resultados. É espetáculo. O Congresso quer desfiar o novelo das mazelas? Ora, já sabemos qual sua extensão. Muitos parlamentares são eleitos por meio de uma engrenagem viciada, que não resistiria a um bom código de ética. Não faz bem ao Congresso tirar proveito da crise para melhorar sua imagem, se, em paralelo, ele não tomar decisões a respeito dos mecanismos eleitorais, da reforma partidária e do sistema de representação política. Mudança? Coisa longínqua As figuras que comandam o processo político dominam a cena política nacional há bastante tempo. Vejam Arthur Lira. Representa ele mudança? Respira ar novo? O populismo aparece como arma de mistificação das massas e os truques das denúncias funcionam mais como altar de visibilidade do que como ato de patriotismo. Constituem uma espécie de para-choque do grupismo em que se transformou o sistema político. A mudança política é uma meta de longo prazo. Significa reordenamento nas instituições e redefinição de padrões e valores. Defesa e ataque "A invencibilidade está na defesa; a possibilidade de vitória, no ataque. Quem se defende mostra que sua força é inadequada; quem ataca, mostra que ela é abundante". (Sun Tzu) Parte II Raspando o tacho - Mais uma semana teremos um raio-x completo ou quase? Do caso Marielle Franco. - Lula deve fazer um tremendo esforço para suportar as dores na bacia. Tenho artrose no joelho, coloquei prótese e sei bem como é viver com essas dores. O mau humor se instala. - Vem uma reforminha ministerial por aí. Lula vai ser compelido a fazê-la. - O futebol feminino é um bailado que não se vê no futebol masculino. - Sonho cheio: Os Bolsonaros querem eleger como senadora/senadores, Michele, Eduardo e Flávio. Três de uma vez. - Hoje, 26 de julho, é dia de Senhora Santana, a padroeira de minha cidade, Luis Gomes, na tromba do elefante, como é o mapa do RN. Extremo oeste. - Ouvi de um empresário que Paulo Guedes derrete-se de elogios a Fernando Haddad. - Continuo achando que Janja faz muito bem ficando perto de Lula. Como Elizabeth Trudeau, não quer ser apenas uma rosa na lapela do marido. (Mãe do atual 1º ministro do Canadá, Justin Trudeau, primeira-dama na época do 1º ministro Pierre Trudeau). A socióloga tem conteúdo. - Quem está se entusiasmando com a visibilidade em crescimento é o governador Romeu Zema, de Minas Gerais. - O calor na Europa e EUA bateu na consciência dos sofridos. - A direita ganha volume em alguns países, nos últimos tempos. - Transferir a cracolândia dos Campos Elíseos para o Bom Retiro, como chegou a propor Tarcísio de Freitas, o governador de SP, é trocar seis por meia dúzia. - Em três mandatos, atual governabilidade de Lula é a mais baixa. - O El Nino é responsável pelas mudanças climáticas. Seca no Norte e chuvas no Sul. - Biden se arrisca a perder as eleições nos EUA. Fecho a coluna com pequenas lições de marketing eleitoral. - Saber ler corretamente o meio ambiente, os novos valores do eleitorado e as motivações de voto. - Escolher o discurso para o momento adequado. - Definir segmentos-alvo do eleitorado. - Selecionar sólidos reforçadores de decisão de voto. - Descentralizar a campanha para multiplicar pontos de eco e agregar organizações intermediárias. - Compor programa simples, objetivo, factível. - Trabalhar com modelos diferenciados de pesquisa. - Programar ações de surpresa e impacto - Organizar estrutura adequada e estabelecer cronograma prevendo: lançamento da campanha (junho); crescimento (julho - 1ª quinzena de agosto); consolidação / maturidade (segunda semana agosto - primeira quinzena de setembro); clímax (segunda quinzena de setembro - semana da eleição); declínio (evitar que esta fase ocorra antes da eleição). - Garantir meios e recursos.
quarta-feira, 19 de julho de 2023

Porandubas nº 813

Abro a coluna com uma historinha de Einstein. Einstein Certa vez, Einstein recebeu uma carta da Miss New Orleans onde dizia a ele: "Prof. Einstein, gostaria de ter um filho com o senhor. A minha justificativa se baseia no fato de que eu, como modelo de beleza, teria um filho com o senhor e, certamente, o garoto teria a minha beleza e a sua inteligência". Einstein respondeu: "Querida miss New Orleans, o meu receio é que o nosso filho tenha a sua inteligência e a minha beleza". Parte I - Panorama... Qual a taxa? 25%? 28%? 30? Qual será a alíquota do IVA, já considerando o tratamento diferenciado de alguns setores, agro, transporte, saúde, educação, hotéis, restaurantes, parques temáticos, por enquanto? Há quem diga que será o maior IVA do mundo. Outros defendem uma taxa menor que 25%. O debate está no ar. A bola está no campo do Senado. O arcabouço fiscal ainda está inclinado. Pegando a onda Lula tem faro apurado. Faz boa leitura do que ocorre no mundo. China crescendo menos. A depender do nosso agronegócio. Rússia metida na guerra contra a Ucrânia até o pescoço. EUA tentando se cacifar ante os países da União Europeia e com um olho na China e outro na Rússia. O Brasil colhendo a maior safra de grãos da história. Deflação mostrando economia sob controle. Juros altíssimos? Sim, é verdade, mas em agosto começarão a baixar. Nesse cenário, Lula comemora sua presença constante nas reuniões dos grandes. P.S. O Brasil comanda os BRICs e, a partir de 2024, comandará o G-20, o clube das maiores economias mundiais. Serviços, o bode expiatório Antonio Florêncio de Queiroz Junior, presidente da Federação do Comércio, Bens e Serviços, em primoroso artigo, ontem, 18, em O Globo. Martelou: "...tratar situações diferentes de forma igual gera desigualdades...é o que acontece com o setor de serviços. Com as empresas que terão a mesma alíquota de cobrança, poderão abater créditos, certamente aquelas que os possuem em maior quantidade pagarão menos impostos...como as empresas de serviços, por sua natureza, possuem o seu maior custo atrelado à mão de obra, e essa mão de obra não dá crédito, elas terão menos para abater no pagamento do novo tributo, o IVA. Assim, mesmo tendo tantas despesas quanto outros segmentos, por serem empresas que não dão crédito (isso mesmo, gerar emprego não dá crédito), o setor de serviços pagará mais impostos que os demais". Falou e disse Florêncio foi categórico. Os serviços serão castigados se for aprovada in totum a proposta de reforma tributária aprovada pela Câmara. O presidente da Fecomércio-RJ é filho do saudoso deputado e empresário Antônio Florêncio, de Pau dos Ferros, cidade polo do oeste potiguar. Centrão na mão Na contramão? Jamais. O Centrão, comandado por Arthur Lira, o comandante das Alagoas, se amarra na árvore do governo Lula. Ganha espaços e até ministérios. Luis Inácio aprendeu a lição que seus mandatos anteriores lhe ministraram. Diminui os carros parlamentares que viriam na contramão para atropelar sua administração. Coisa que Dilma Rousseff não soube fazer. Haddad, a surpresa O chamado mercado e seus afluentes até apostavam na entrada de Fernando Haddad na seara do comando da economia. Mas o sujeito está se saindo bem melhor que a encomenda. Entre 0 a 10, ganha um 8, enquanto, antes da caminhada, dava-se a ele um 6. No máximo. Imagem negativa O ministro-chefe da Casa Civil, o baiano Rui Costa, ex-governador da Bahia, é a nota mais dissonante do governo. Sua imagem cai na banda negativa da gestão lulista. Uma reflexão Vejam este pensamento de Hannah Arendt: "A sociedade burguesa, baseada na competição, no consumismo, gerou apatia e hostilidade em relação à vida pública, não somente entre os excluídos, mas também entre elementos da própria burguesia." Ou seja, a atividade econômica passou a exercer supremacia sobre a vida pública. Os eleitores se distanciaram de partidos, juntando-se em núcleos ligados ao trabalho e à vida corporativa - sindicatos, associações, movimentos. Eis a nova face da política. Se há participação dos aglomerados sociais, ela ocorre dentro das organizações intermediárias. Nivelando por baixo Saiu uma pesquisa mostrando que os políticos melhoram sua imagem. Será? Tenho cá minhas dúvidas. O fato é que o discurso institucional, levado a efeito por atores individuais e partidos, não faz eco. A estética da política pontua e remanesce nos sistemas cognitivos, emoldurando a policromia e o polimorfismo do modus operandi dos atores em seus palcos: parlamentares brigando em plenários, encontros mafiosos, dinheiro escondido, negociações por mais espaços na teia dos Poderes e assim vai. Desvio de papéis Os conjuntos representativos desviaram-se de seus papéis. Por quê? Ora, a política deixou de ser missão para se tornar profissão. No bojo da sociedade pós-industrial, outros condimentos passaram a compor parte do escopo político, refazendo escopos e reconstruindo práticas. Onde e como o Brasil evoluiu ao longo de sua história? Quais as frentes de progresso e modernidade que pode registrar? E quais os eixos que ainda ligam o país à tradição colonial, ao ethos nacional e à coleção de "ismos"? Força cresce É inegável que a moldura brasileira adquiriu atualidade no concerto das Nações. A nação brasileira se posiciona ao lado dos grandes, formando um bloco que provoca profundas mudanças na geopolítica internacional. Não se descartam otimistas previsões sobre a maior influência brasileira no mundo. O ponto nevrálgico O patrimônio brasileiro no campo da megabiodiversidade haverá de conferir maior prestígio à Nação. Esse é o ponto sensível que Lula percebeu para impor maior respeito ao país. Vamos acompanhar a trajetória brasileira na política ambiental. Mais carros As duas maiores capitais do país, com orçamentos extraordinários e administrações que se vangloriam de êxitos, atravessam um dos mais angustiantes ciclos de sua vida. São Paulo, com 12 milhões de habitantes, é a perfeita imagem do caos. Corredores se entopem de carros em todos os horários. Ao lado dos cerca de 1.000 veículos novos que entram diariamente no trânsito (vindo a se somar aos oito milhões que circulam na Grande São Paulo), ainda está às voltas com o problema de imigrantes. Não é de admirar que o número de mortes no trânsito, em São Paulo seja três vezes maior que as da Inglaterra, EUA e Canadá. E mais, a metrópole terá de suportar a onda de "carros populares" da era Lula. Compromisso com programas claros As aflições seriam menores se o processo de escolha dos dirigentes adotasse o figurino racional: candidatos devem ser obrigados a apresentar nas campanhas um programa a ser executado pela prefeitura sob rígido controle das Câmaras Municipais e fiscalizado pela sociedade. A verborragia de cada postulante daria lugar à exposição detalhada de ações para debelar os problemas. Os homens públicos deveriam aprender a lição: suas fogueiras de vaidade não resistem à água em ebulição. Parte II Raspando o tacho - Ricardo Nunes, o prefeito de São Paulo, conta com o apoio tucano à sua reeleição. Na visão deste analista, os tucanos estão observando sua floresta ser incendiada. Sem votos. - O futebol feminino começa a aparecer no ranking do prestígio e atenção da sociedade. Tem uma sueca como técnica. Com pouco domínio do português. Mas a seleção feminina não faz feio. - Como ficarão os salários das moças diante da norma estatuída pelo governo para que homens e mulheres tenham o mesmo salário nas mesmas funções? Ah, no futebol e em outras áreas, é diferente... - Antônio Furlan, atual prefeito de Macapá, é franco favorito na disputa para a prefeitura. Tem 66,8% das intenções de voto, enquanto José Alcolumbre, irmão do senador Davi Alcolumbre, tem 8,7%. Dados enviados à coluna por Murilo Hidalgo, do Instituto Paraná Pesquisas. - O cientista político Paulo Kramer tem ministrado interessantes e oportunos cursos de marketing político. O último: Como causar boa impressão? Anotem: @kramer.paulo no LinkedIn. Conheço o cientista político. E atesto sua seriedade. - Álvaro Dias, escritor e prefeito de Natal, foi eleito para a Academia Norte-rio-grandense de Letras. - Eleições livres na Venezuela, como pregam Lula e Macron? Mais crível é acreditar que, amanhã, o mundo não terá sol. - O calor extremo ameaça norte-americanos, que enfrentam semana de calor extremo. São 110 milhões de pessoas sob alerta de altas temperaturas. A situação é mais grave no sul e no oeste do país. Em Phoenix, no Arizona, há 18 dias as temperaturas estão acima dos 38°C. Em Las Vegas, termômetros ultrapassaram os 45. Na Califórnia, a temperatura bateu 56°C no Vale da Morte - um lugar conhecido por ser perigosamente quente. O mundo quase em chamas. Fecho a coluna com um "causo" de Recife. Creusa Joaquim Francisco Cavalcanti era delegado da polícia, em Recife. Uma noite, em um baile de travestis no bairro do Recife velho, a pancadaria come solta. Prisão de todos os participantes. O delegado fichava cada um e mandava embora: - Nome? - Greta Garbo. - Nome? - Sophia Loren. - E seu nome? - Marilyn Monroe. - E o seu? - Creusa. - O que, seu sem-vergonha? Creusa é o nome de minha mulher. Você vai ficar seis meses na prisão de Itamaracá. Seis meses depois, o delegado Joaquim Francisco manda buscar Creusa para soltá-lo: - Seu nome? - Joaquim Francisco. - O que, imbecil? Como tem coragem, sem-vergonha? Vai ficar mais seis meses na prisão. E para lá Creusa voltou. Sem piedade.
quarta-feira, 12 de julho de 2023

Porandubas nº 812

Abro a coluna com uma historinha dos velhos tempos. Promessas de campanha A historinha foi enviada por um leitor do Paraná. Candidatos de duas famílias disputavam a prefeitura de uma pequena cidade. Final de campanha. A combinação era de que os dois candidatos e seus familiares teriam de usar o mesmo palanque. Discursou, primeiro, o candidato que tinha 70% de preferência dos votos: - Povo da minha amada terra, povo ordeiro, trabalhador, religioso e cumpridor de suas obrigações. Se eleito, irei resolver o problema de falta de água e de coleta de esgoto. Farei das nossas escolas as melhores da região, educação em tempo integral. Vou construir uma escola técnica do município... E arrematou: - E tem mais, meus amigos, ordeiros, religiosos e cumpridores de seus deveres morais, vocês não devem votar no meu adversário. Ele não respeita nossa gente, nossas famílias, nossos costumes! Ele desrespeita nossa igreja. Ele nem se dá ao respeito. Vocês não devem votar nele. Porque ele tem duas mulheres. O adversário, com 20% de intenção de voto, quase enfartou quando viu a mulher, ao seu lado, cair no palanque. Ela não aguentara ouvir a denúncia do adversário de que o marido tinha uma amante. A desordem ganhou o palanque. A multidão aplaudia o candidato favorito e vaiava o adversário. Cabos eleitorais começaram a se engalfinhar. Passado o susto, com muita dificuldade, o estonteado candidato acusado de ter duas mulheres começa seu discurso, depois de constatar que a esposa estava melhor: - Meu amado povo, de bons costumes e moral ilibada, religioso e cumpridor de seus deveres morais, éticos e religiosos. Quero dizer aos senhores e senhoras aqui presentes, que, se agraciado com seus votos me tornar o prefeito desta cidade, farei uma mudança de verdade. Não só resolverei o problema da falta de água, como farei também o tratamento de todo o esgoto do município, construirei uma escola técnica e um novo hospital! A massa caçoava do coitado e de sua mulher. Foi em frente: - Vou melhorar o salário dos professores, a merenda das crianças e ainda vou instituir o Bolsa Cidadão. Agora, prestem bem atenção. Se os amigos acharem que não podem votar em mim porque tenho duas mulheres, votem no meu adversário. Mas saibam que a mulher dele tem dois maridos. A galera veio abaixo. O pau comeu. Brigalhada geral. Urnas abertas. O candidato chamado de corno perdeu. O adúltero ganhou com 76% dos votos. I Parte Panorama Bolsonaro está morto? Não. Ao contrário da opinião de alguns analistas, Jair ainda levanta a tocha do messias para milhares de pessoas que apostam em sua caminhada em direção à terra prometida. Por quê? Porque veste o manto do antipetismo. Impregna-se dessa imagem. E com ela, desfraldará a bandeira oposicionista nas eleições para prefeito e vereadores no próximo ano. Um presente ao PL Sua inelegibilidade, decidida pelo TSE, foi um presente ao PL, o maior partido da Câmara, com 99 deputados. A razão é que seu cacife para dominar o partido se arrefece. Ou seja, ele está politicamente fraco. Repito: politicamente. Porém, sob o prisma eleitoral, está forte. Não tem poder de mando no partido, mas conserva influência eleitoral. O PL continuará sob o domínio de Valdemar da Costa Neto, o boy, que usará Bolsonaro como isca para pescar votos em todo o país. A visão dos eleitores Existe um sentimento geral de que o PT é uma ameaça. Que o partido dos trabalhadores é contra as liberdades, contra propriedade, defensor de regimes como os da Venezuela, Cuba e Nicarágua. Lula tem ajudado a manter essa percepção, referindo-se a eles com certa constância. O presidente, ao que se constata, não tem papas na língua. Mais solto e tão verborrágico quanto se apresentava em mandatos anteriores. Lula tem pressa. E o PT poderá, mais uma vez, contar com o contexto internacional, favorável ao Brasil. Limites do bolsonarismo Mas o bolsonarismo raiz tem limites. Não ganhará tanta força se a situação da economia mundial favorecer o Brasil. Por bolsonarismo raiz devemos entender os eleitores que se identificam profundamente com a extrema direita. Pois há muitos simpatizantes de Bolsonaro que tomam posição apenas porque são antipetistas. Não gostam do PT. E optam por um protagonista que possa vencer a pretensão hegemônica do petismo. Sorte do PT e do Brasil Dito isto, vamos aos fatos: um panorama recessivo ameaça as economias europeias e a norte-americana. A China projeta um crescimento menor e depende de commodities, a partir dos nossos grãos. O Brasil registra uma das maiores safras de sua história. E a política liberal gestada pelo ministro Fernando Haddad recebe aplausos. A economia sob Haddad tem sido um azougue no apoio do mercado. Com as reformas na frente econômica, pode puxar o governo Lula para a liderança no conjunto das nações em desenvolvimento. Portanto, peço atenção dos leitores. Minha análise sobre o bolsonarismo tem a ver com o sucesso e/ou insucesso do governo Lula III. Guerra A guerra da Ucrânia x Rússia, por sua vez, tem levado substanciais recursos dos países da OTAN e dos EUA. Suas economias também sofrem impactos da guerra. E a posição do Brasil, nem lá nem cá, fazendo certa intermediação, é um fator de impulso às exportações, a par de uma articulação equidistante. Todos esses componentes precisam ser considerados. Até a posição do Brasil para alavancar sua indústria bélica - fabricação de blindados, principalmente - está sendo negociada com a Alemanha, produtora de peças. Empecilho tem sido a proibição do país em exportar armas/tanques velhos para a Ucrânia. Haddad Voltemos ao ministro Haddad. Pode ser o trunfo de Lula para 2026. Claro, se o governo der certo. Haddad ganhou a confiança do mercado, tem sido um grande articulador do governo, tem uma cara jovial. Lula se depara com a questão da idade e da perspectiva de viver momentos mais tranquilos com sua mulher, Janja. Mas o presidente deixará essa decisão para o último momento. Não quer acirrar as querelas partidárias que um anúncio antecipado provocaria. Sua intenção é a de fazer o maior governo da história. É matreiro e sabe esperar. Uma raposa. Haddad, por sua vez, é o traço de união que liga o PT do passado ao futuro. Índices de intenção de votos Os institutos de pesquisa começam a nos mandar pesquisas de intenção de voto para as Prefeituras no pleito do próximo ano. Donde sai a pergunta: é para considerar? Não servem? Aqui, vai a resposta: índice de intenção de voto é igual ao desenho do elefante visto nos céus. Dentro de pouco tempo, o que era elefante se esgarça e se transforma em gafanhoto; e o que era uma nesga de nuvem, parecendo um gafanhoto, se agiganta, mais parecendo o incrível Hulk. Durante uma exposição massiva, de semanas seguidas, qualquer desconhecido se transforma em astro, celebridade. As campanhas eleitorais fazem esse milagre. II Parte Raspando o tacho - A escolha do senador Eduardo Braga, do MDB, para relator do projeto de Reforma Tributária, no Senado, é uma jogada inteligente do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco, sob a confiança de que o parlamentar amazonense vai acolher os pontos defendidos pelo governo. - Quem está se saindo bem no fichário político é o senador piauiense, ex-ministro de Bolsonaro, Ciro Nogueira. Defende Bolsonaro e se mostra fiel. Sem açodamentos. - Ciro se prepara para apitar alto no próximo capítulo eleitoral. - O bate-boca no PL continua. O grupo de 20 deputados que votaram a favor da reforma partidária foi alijado da rede de mensagens. A dissensão pode acabar em saída de parlamentares em momento oportuno. - Tarcísio de Freitas, governador de SP, pensa na reeleição em 2026 e não na candidatura presidencial. Que seria seu alvo em 2030. Conta a esse analista fonte séria do Palácio dos Bandeirantes. - O PT pensa em ter entre 6 e 89 candidatos fortes para a prefeitura de capitais em 2024. Mas as parcerias com os partidos que formam a bancada de apoio ao governo atrapalham sua meta. - Calado, de boca fechada na CPI dos Atos Golpistas, Mauro Cid, o ex-ajudante e ordens de Bolsonaro, diz muita coisa. Acoberta situações. É uma confissão. - Há um grupo nas Forças Armadas que ainda não digeriu o governo Lula. Os bastidores estão infestados de conversas de tom negativista. - Os setores de alimentação, bebidas e combustíveis são responsáveis pela deflação de preços em junho. A população aplaude com o pequeno aumento no poder de compra. - A nomeação de novos ministros para o STJ forma um imenso rolo compressor a querer influenciar o processo junto a Lula. Que vai agir de maneira política. - Aliás, a intenção do presidente é fazer alianças com viventes do céu e do inferno. Pretende organizar imensa fortaleza de defesa no Congresso. Na área ministerial, isso implica a mudança de nomes em boa parte da Esplanada dos Ministérios. - Putin acabou chamando o comandante do Grupo Wagner, Prigozhin, para uma conversa. O comandante levou seus principais chefes. O grupo, ao que se diz, está de volta à Rússia. Estava em Belarus. Pragmatismo. Grana e poder. - Lula teria perguntado a Biden: você será candidato à reeleição? O presidente dos EUA teria respondido: sim. Lula deve ter pensado: minha idade em 2026 não será problema. - Lições de Napoleão e Sherman - É bom recordar as lições de Napoleão. Que dizia: faire som thème em deux façons (fazer as coisas de dois modos). O general William Sherman, que comandou a campanha de devastação durante a guerra da secessão norte-americana, também lembrava: "Ponha o inimigo nos cornos de um dilema." Nunca um político deve trabalhar com uma única hipótese. Um candidato precisa dispor de algumas alternativas. Fecho a coluna com Tenório Cavalcanti, na verve de Sebastião Nery Armado de admiração Tenório Cavalcanti, udenista e adversário político de Vargas, foi ao Catete numa comissão de deputados. Andava nas manchetes dos jornais por causa de suas estripulias em Caxias, na base da "Lourdinha" (metralhadora) e da capa preta. Getúlio o cumprimentou, olhou bem para o volume do revólver embaixo do braço esquerdo, sob o paletó: - Deputado, o senhor está armado? Tenório ficou vermelho, mas não perdeu o bote: - Sim, presidente, armado de admiração por Vossa Excelência.
quarta-feira, 5 de julho de 2023

Porandubas nº 811

Abro com o Largo da Carioca Precisamos trabalhar O brigadeiro Eduardo Gomes fazia, no largo da Carioca (Rio de Janeiro), seu primeiro comício da campanha presidencial de 1945. A multidão o ouvia em silêncio: - Brasileiros, precisamos trabalhar! Do meio do povo, uma voz poderosa gritou: - Já começou a perseguição! Bagunça geral. O comício quase acabou. Tratados são papéis Simon Bolívar lapidou o conceito; "não há boa fé na América, nem entre os homens nem entre as nações. Os tratados são papéis, as constituições não passam de livros, as eleições são batalhas, a liberdade é anarquia e a vida um tormento". Puxando para nós o pensamento. A vida nacional está se tornando cada vez mais um tormento e parcela desse sofrimento tem muita coisa a ver com a desordem institucional que nos cerca. Não há boa fé A boa fé foge de nosso alcance. Basta verificar a política de emboscadas que inspira o relacionamento entre os partidos nacionais. Na base governista, as dissensões se acentuam a cada dia. O Centrão quer o maior naco. O PT quer conservar os seus. O arco ideológico está esgarçado. Os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário vivem às turras, energizados por visões que parecem inconciliáveis a respeito de temas polêmicos. Critica-se o Judiciário por judicializar a política. CF, fonte de litígios A Constituição brasileira é um livro cheio de detalhes. Quando foi produzida, refletia o caldeirão de pressões da sociedade. Por ser uma Carta muito descritiva, propicia polêmica em demasia e abre espaços para uma infinidade de litígios. Hoje, é criticada pelo fato de muitos de seus artigos e incisos não serem obedecidos. E uma lei maior que deixa de ser cumprida acaba plasmando uma cultura de perniciosidade, impunidade e desorganização. Dessa forma, os tratados constitucionais perdem razoável parcela de força, transformando-se em letra morta. As eleições já estão nas ruas Nem bem termina uma eleição, a próxima ganha as ruas. As eleições constituem uma batalha acirrada, onde não faltam os impropérios, denúncias contra adversários, calúnia e difamação, a compra de votos, cooptação pelo empreguismo e pela distribuição de benesses. A política, como exercício democrático da defesa de um ideário social, como missão para salvaguarda dos interesses coletivos, está cada vez mais assemelhada ao empreendimento negocial, voltado para o enriquecimento de indivíduos e grupos. Improvisação O conceito de liberdade confunde-se com liberalidade, a baderna gerada pela permissividade extrema, tocada pela improvisação, pela irresponsabilidade, pela invasão dos espaços privados e até pelo denuncismo exacerbado da mídia. Quando o escopo libertário foi esculpido, no bojo da Revolução Francesa, carregava consigo o eixo da promoção dos valores do homem, da defesa dos direitos individuais e sociais, da dignidade e da Cidadania. O inimigo que se combatia era o Estado opressor, o absolutismo monárquico e a escravização que fazia do ser humano. Erigiu-se o altar das liberdades que, ao longo da história, tem sido conspurcado por outras formas de vilania e torpeza. Desigualdade As pesquisas evidenciam: as desigualdades entre classes são um abismo. A opressão econômica, a subordinação dos valores e princípios espirituais ao prazer das coisas materiais, a miséria absoluta que maltrata parcelas significativas da sociedade, a desigualdade de classes, o descompromisso de governos e representantes do povo para com os destinos da coletividade, entre outros elementos, contribuem para corroer o sentido da liberdade e da dignidade do Homem. As reformas, como a tributária, são gestadas para atender a grandes interesses. Governantes inescrupulosos Os governantes fazem sua agenda com um olho nas próximas eleições. Começam prometendo mundos e fundos. Parecem ter pressa. Vejam Lula pedindo aceleração na ferrovia leste-oeste, que ligará a Bahia ao centro-oeste. A construtora prometeu para 2027. Lula quer inaugurá-la em 2026. O saneamento do Estado tem muito dribles. O compromisso maior é com a gastança. No terceiro ano de governo, a ordem é cumprir uma agenda de obras aceleradas. Queimam-se etapas. Elefantes brancos são deixados ao próximo governante. Tinta na caneta Fruem as delícias do poder da caneta. Surpreendendo-se com a força do cargo, vai testando as capacidades de mandar, solicitar, nomear, desnomear, receber atenção. Mil e um cargos. É assessor por todos os lados em 37 ministérios e uma batelada de autarquias e empresas. Devem dormir contando carneirinhos, aliás, pedintes que entram e saem pela porta do curral, ou melhor, salão de despachos. A onda publicitária Saem do confinamento dos palácios e prefeituras, correm para canteiros de obras, lambuzam-se de poeira, visitam cidades, compram super-aviões, fazem um périplo pelo mundo, visitam obras, alguns chegam a despachar nas ruas, com as massas aplaudindo as obras. O governo é um território delimitado por placas, frases de efeito e logomarcas. As fotos de um governante suorento e trabalhador (símbolo do obreirismo faraônico) inundam redações para transmitir a imagem de uma administração transformada em canteiro de obras. A arrogância As caras dos mandatários expressam o próprio ciclo de vida da administração. Da simplicidade, da primeira fase de governo, à arrogância, da última fase, eles retratam a incultura política do país. Entram como inquilinos dos espaços públicos e saem como proprietários de feudos. Impregnam-se de onisciência e onipotência. Em muitos Estados, vestem-se de deus. A coisa pública (res publica), para muitos deles, se transforma em fazenda particular. Muitas vezes, a falta de preparo do governante torna-o refém de um grupo de donatários, que faz a partilha do governo, distribuindo cargos, benesses e posições. Este escriba, perplexo, ouviu de um alto empresário: malas de dinheiro voltaram a frequentar gabinetes e esconderijos. A corrupção voltou multiplicada. ??? II Parte Raspando o tacho - A reforma tributária, nos termos em que está escrita, é um golpe de morte no setor de serviços - Lula tem pressa. Quer obras, reformas, arcabouço fiscal, conquistar a simpatia de países que se afastaram do Brasil, ter grande base de apoio. Parece voar nas asas da autossuficiência. - Lira não conseguirá domar os apetites do centrão. - Tarcísio e Zema correm na dianteira na direção de 2026. - Importante secretário de Tarcísio confessa a este analista. O governador de SP vai, primeiro, disputar a reeleição em 2026 e, em 2030, a presidência. - Geraldo Alckmin cresce no escurinho dos contatos e articulação. - Nunes, MDB, prefeito de São Paulo, trabalha para ser conhecido como o "fiscal da cidade". - A CPMI do 8 de janeiro vai arrefecer sua força. - José Paulo Cavalcanti Filho, o grande jurista pernambucano, membro da Academia de Letras, tomará posse, em novembro na Academia Portuguesa de Letras. Viva! - Nos últimos tempos, os jornais passaram a manchetar sobre mortes misteriosas de jovens e casais em suas residências. A violência entrando nos lares. - Aumenta a quantidade de crimes com o uso de ferramentas tecnológicas. - Preparem-se para aguentar intenso calor no próximo verão, provocado pelo fenômeno El Nino. Segunda foi o dia mais quente na história da temperatura do planeta. - Perguntinha marota: os órgãos de controle conseguem apurar e descobrir onde estão as torneiras mais abertas da corrupção? - Os irmãos Gomes travam uma batalha no Ceará: o senador Cid trabalha para ser parceiro do PT; o ex-candidato à presidente quer levantar a bandeira do PDT, ficando longe do PT. Não é jogo de aparências. Os irmãos estão brigados. - Ser grande e forte nem sempre significa ser todo-poderoso. Pescadores acabam de flagrar piranhas atacando e comendo um jacaré no rio Javaés. Um grupo de abelhas atacam e matam. Fecho com as Minas Gerais Desde que o dinheiro venha Mais uma da matreirice mineira. Benedito Valadares chegou a Curvelo/MG, para visitar a exposição de gado do município. Na hora do discurso, atrapalhou-se: - Quero dizer aos fazendeiros aqui reunidos que já determinei à Caixa Econômica e aos bancos do Estado a concessão de empréstimos agrícolas a prazos curtos e juros longos. Lá do povo, alguém corrigiu: - É o contrário, governador! Empréstimo a prazo longo e juro curto. - Desde que o dinheiro venha, os pronomes não têm importância.
quarta-feira, 28 de junho de 2023

Porandubas nº 810

Abro com uma piadinha sobre corrupção. Negócio fechado Um político havia prometido construir uma ponte e para isso convocou três empreiteiros: um japonês, um americano e um brasileiro. - Faço por R$ 3 milhões - disse o japonês - Um pela mão de obra, um pelo material e um para meu lucro. - Faço por R$ 6 milhões - propôs o americano - Dois pela mão de obra, dois pelo material e dois pra mim. - Faço por R$ 9 milhões - disse o brasileiro. - Nove milhões? - Espantou-se o político - Por quê esse valor tão alto? E o brasileiro responde: - Três para mim, três para você e três para o japonês fazer a obra. - Negócio fechado! - responde o político. O futuro do PT Estará nas mãos de Lula. Trata-se do partido com maior adesão social, também o partido mais rechaçado pela comunidade política. Encarna apoios e contrariedades: ame-o ou deixe-o. Se o governo Lula III der certo e se brilhar o céu de brigadeiro em 2026, o PT estará cantando Hosana nas Alturas, ganhando volume e ostentando a condição de maior partido brasileiro. Mas se o governo for mal avaliado, cairá na escala de prestígio, porém sempre conservando boa margem na moldura partidária. O futuro do PSDB Seu futuro dependerá da movimentação partidária. Perdeu quadros e forças, mas conta com o amplo espaço de centro-esquerda, que se encontra hoje vazio. O partido tucano, caso decida apresentar programas e políticas para o centro da pirâmide social, onde estão as classes médias, com um olho virado para a esquerda e outro para a direita, seria uma boa opção. Seu amanhã vai depender também do desempenho do jovem governador Eduardo Leite, do RS; caso se saia bem, posiciona-se como candidato da sigla à presidência em 2026. O futuro do MDB Na coluna do meio, o partido tem condições de ser a opção para quem deseja se posicionar no centro; atrairá protagonistas de outros partidos que conhecem sua índole. Precisa de um fluxo de oxigênio para abrigar valores da atualidade, significando defesa clara de temas sensíveis e prioritários. O processo de renovação do partido tem sido lento. Carece de impulso e um banho de rejuvenescimento. O futuro do PSD Sob o comando de Gilberto Kassab, um dos melhores articuladores políticos do país, o partido tende a ser um imã, puxando figuras de outros partidos. O PSD costuma dar a seus integrantes o que eles pedem, garantindo, assim, sua identidade de ente que cumpre compromissos. Sairá forte do pleito de 2024, com uma grande bancada de prefeitos e vereadores. E aposta no governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, como figura central no processo eleitoral de 2026. O futuro do PP Sob as rédeas de Arthur Lira, continuará a dar as cartas no tabuleiro. Passada a fase de mando do "rei" que preside a Câmara dos Deputados, tende a se esvaziar. Sem densidade ideológica. É o ícone da prática franciscana do "é dando que se recebe". O futuro do União Brasil Deve perder muitos quadros por falta de identidade doutrinária. Tem sido o ponto de encontro daqueles que tiram férias, enquanto aguardam a consolidação da moldura partidária. Luciano Bivar não tem carisma e sua liderança é frágil. Hoje, com grande bancada, a sigla, amanhã, se verá esvaziada. A conferir. O futuro do PL Valdemar da Costa Neto, presidente do PL, mesmo sem identidade marcante, joga o partido no espectro ideológico, sob a esperança de que venha a ser o ente de direita e extrema direita. Nessa condição, será o contraponto ao PT e adjacências. Usará Jair Bolsonaro e Michele, a mulher do ex-presidente, como iscas para pescar votos e, desde já, acena para os horizontes de 2026. Continuará com grande bancada, mas a pressão poderá consumir a gordura partidária desse ente que já foi dirigido pelo falecido ex-deputado e diplomata, Álvaro Vale, que sabia usar bem a TV em campanhas eleitorais poéticas, sob o fundo musical do canto dos escravos hebreus, da ópera Nabuco. O futuro do PSOL Era um partido com a marca de extrema esquerda. Amainou a imagem. Assume identidade de esquerda com a cara mais esquerdista que o PT, porém, distanciando-se da imagem de destruição e virada de mesa. Boulos levantava a bandeira. Mas o próprio aliviou sua imagem para tentar ser palatável a eleitores do centrão ideológico. É candidato a prefeito de São Paulo, possivelmente com o apoio do PT. O mundo gira e a Lusitana roda... O futuro do PSB Já foi um partido com forte discurso socializante. Nos últimos tempos, arrefeceu sua chama ideológica. Passou a acomodar interesses de protagonistas fortes, entre os quais o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, que pode ser uma âncora para atrair uma parcela dos migrantes partidários. Ao seu lado, está o prefeito de Recife, João Campos. Alckmin também se insere na arena partidária de 2026, a depender do governo Lula III e da própria disposição do presidente em se candidatar ou não. Raspando o tacho - A reforma tributária ganha adeptos a cada dia. Com emendas de todos os tipos. E sob a esperança do paladino Luiz Carlos Hauly, que voltou à Câmara dos Deputados. - Chiste sobre Lula: avisa que no próximo mês visitará o Brasil. - A Comissão Mista do 8 de janeiro não ganhou o impacto que muitos esperavam. - Bolsonaro, inelegível, vai lutar para subir ao altar dos mártires. - O STF está com cara de delegacia de polícia. - Minhas homenagens ao professor de Direito Tributário da PUC-SP, advogado Robson Maia, pela contribuição que tem dado à cultura e às artes da terra potiguar. - A prefeitura de São Paulo deve monitorar melhor a correria tresloucada dos entregadores de aplicativos nas ruas de São Paulo. - Bolsonaro vai correr o país. Sucesso desse tour vai depender da economia do estado d'alma da população. - Arthur Lira está na mira (sem troça) da PF. - O deputado Celso Sabino, futuro ministro do Turismo, é uma carta sem muito valor na mesa dos grandes jogadores. - Depois de intensa pressão, Banco Central indica que, a partir de agosto, teremos baixa na taxa de juros, hoje em 13,75%. - O Judiciário assumiu por completo sua intromissão na seara do Legislativo. - São Paulo dará um salto para as alturas com a aprovação do novo plano diretor. Os espigões se multiplicarão. - Ministra da Saúde, Nísia Trindade, não será removida do ministério, apesar do rolo compressor de partidos que querem seu cargo. - Haverá pedido de vista do processo contra Bolsonaro por parte de algum ministro do TSE? Eis uma incógnita. - Ucrânia ganhou mais força depois do affaire com o Grupo Wagner, cujo comandante Pregozyn ameaçou avançar sobre Moscou. Recebeu US$ 2 bilhões de dólares da Rússia. E hoje diz que seu desafeto é o ministro da Defesa russo, Sergei Shoigu, e não Putin. Boa quarta a todos! Fecho com mais uma historinha de corrupção. Em um comício de uma pequena cidade, dizia o prefeito: Queridos cidadãos e cidadãs, durante todo o meu mandato, coloquei a minha honestidade acima de qualquer interesse político. Vocês podem ter certeza que neste bolso - e batia no bolso da calça com uma das mãos - nunca entrou dinheiro do povo. Neste instante alguém gritou: - Tá de calça nova, hein?
quarta-feira, 21 de junho de 2023

Porandubas nº 809

Abro a coluna com o desembargador Deoclides Mourão. Não sei por onde começar Século passado. O desembargador Deoclides Mourão, tio do poeta Gerardo Mello Mourão, fez acordo com Urbano Santos para governador do Maranhão. Eleito, Urbano não cumpriu nada. Deoclides Mourão mandou-lhe uma carta: - Senhor governador, diz o povo que o homem se pega pela palavra, o boi pelo chifre e a vaca pelo rabo. Supondo não ter V. Exa. nenhum desses acessórios, não sei por onde começar. As mídias digitais Tentaremos, na coluna de hoje, mostrar a importância das mídias digitais no universo da política. Ampliação da audiência O acesso à Internet abriga cerca de 150 milhões de pessoas no país. Talvez até mais, considerando o pacote de meios, computadores, celulares, consoles de jogos, TV digital, as plataformas digitais da rede - Twitter, Facebook, Instagram, LinkedIn etc. O Brasil está entre os cinco maiores usuários mundiais das redes. O fato é que saímos do mundo analógico para adentrar o universo digital. Significa que o cidadão-político aumenta sua participação na esfera da política e de suas manifestações. O que isso provoca? Bombardeio informativo O bombardeio informativo é inevitável. Mas a vertente interpretativo-opinativa é o perigo. Pois uma escalada de opiniões, versões, meias verdades, pirotecnia informativa tende a entupir os sistemas cognitivos das pessoas, o que as joga no caminho da desinformação, da desestruturação de mensagens, do jogo falso das ideias. De tanta repetição, verdades acabam se transformando em mentiras. E, desse modo, passamos a viver em um mundo de ilusões. Tem ainda a IA E, para confundir, vem sendo acionada com força a Inteligência Artificial, com a qual tive o prazer de me encontrar em uma ligeira troca de ideias. Sabem o que aconteceu? Fui bater nas Filipinas, onde a IA localizou um consultor e escritor Gaudêncio Torquato, com uma batelada de informações sobre o verdadeiro Gaudêncio, este escriba nascido em Luis Gomes, RN, Brasil. A política Propus que ela me levasse aos jardins de Platão, pois eu queria manter um diálogo com o mestre. Resposta frustrante: não posso lhe ajudar. Não tenho poder para transportar pessoas para o passado ou para o futuro. O que posso fazer é lhe oferecer informações sobre o pensamento de Plato (assim mesmo) e expor o que pensava. Aceitei e engatilhamos a conversa. Nos tempos de Platão Qual a diferença ou semelhança entre os tempos de Platão e os dias de hoje sobre os caminhos da corrupção? Sem grandes diferenças. Ontem, como na atualidade, os políticos olhavam para seus interesses, deixando de cumprir os deveres para com o bem comum. E dizia que os verdadeiros estadistas devem ser motivados pelo desejo de servir por uma profunda compreensão de Justiça. Relapsos. Corruptos existem em todos os tempos. III Guerra Indaguei da senhora, equipada de artificial inteligência, como ela própria lembrou, se corremos o risco de vivenciar uma III Guerra Mundial. Mais uma vez, foi peremptória: não tem acesso a informações que garantam essa probabilidade e não tem capacidade de prever o futuro, demonstrando modéstia e extrema sinceridade. Porém, faz a ressalva de que é possível trabalhar para soluções pacíficas e administrar conflitos internacionais, usando, para tanto, as ferramentas da diplomacia e da cooperação entre as Nações. Ou seja, a interlocutora, ao apregoar essa abordagem abre fresta para a possibilidade de ocorrência de um evento adjetivado como "catastrófico". E dá ênfase: temos de estar cientes dos riscos potenciais e tomar medidas para mitigá-los. Fui parar nas Filipinas No terreno do conhecimento sobre este figurante, a gentil madame pisou em falso. Fui parar nas Filipinas, na figura de um consultor político. Ocorre que a teia informativa que abrigava o filipino encaixava-se plenamente em minha trajetória. Por isso, reagi: não, quero saber sobre o fulano de tal, natural de Luis Gomes, RN, Brasil. Imediatamente, ela pediu desculpas, reconheceu que se confundiu e passou um esboço, com mais informações, incluindo as tarefas de escriba, que acompanham minha trajetória. Usou outras palavras, mas o conteúdo foi praticamente o mesmo. O ChatGPT 4 Lera, dias atrás, sobre o ChatGPT 4, mais avançado, que tratava da descrição de uma situação para que a IA, a partir do texto, criasse a imagem correspondente. Ao confirmar a novidade, um amigo mandou os impressionantes desenhos que recebeu de suas descrições: gatos brancos, de olhos amarelados; gatos pretos, de olhos esverdeados; um gato na praia chuvosa usando guarda-chuva e fotos de nossos ancestrais. Desenhos que impressionam pela singularidade dos quadros. Tenho poucas incertezas, entre elas, a de que a IA, mesmo com sua ligeireza para alinhavar trilhões de referências e encaminhar em segundos respostas aos perguntadores, não será capaz de se esquivar do cérebro humano. Tendências O fato é que o futuro chegou apressado. Os algoritmos nos cercam, fazendo pressão sobre o modo como vivemos. Da alimentação à roupa, do carro à política, um novo mundo nos espera. A política será devassada. Cortes, versões e falsidade estarão no nosso cotidiano, fustigando nossa maneira de pensar. A seletividade será maior. Os escândalos, escancarados. Os bons serão apontados junto aos ruins. O eleitor que faça sua seleção. II parte Raspando o tacho - O governo Lula ganha reconhecimento. Melhor avaliação. - Políticos da CPMI que investigam o 8 de janeiro adquirem maior visibilidade. O que resultará do espetáculo? - O vice Geraldo Alckmin é a peça do jogo alternativo no tabuleiro de 2026. - A curiosidade não tem tamanho: pagam 1,2 milhão para entrar num mini-submarino, mergulham em busca do Titanic, fundeado a 4.000 metros, assinam um documento sobre risco de vida e partem para o desconhecido. Bilionários e adjacentes. - Os trabalhadores, antes mobilizados pelas Centrais Sindicais, vivem dias de jejum grevista. - As classes médias estão no aguardo de programas que melhorem suas vidas. - Um nome em evidência: Jean-Paul Prates, presidente da Petrobras, que vislumbra amplos horizontes na política. Cara preparado. - Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, deve abrir a boca e dar suas razões para segurar os juros altos. - O inverno, que começa esta semana, será menos frio que os anteriores. O fenômeno El Nino tem a ver com isso. - Recursos do PIS/Pasep 'esquecidos' serão transferidos ao Tesouro até 20 de agosto; trabalhadores têm até cinco anos para resgatar. PEC da Transição autorizou transferência dos recursos aos cofres públicos para uso com investimentos, fora do limite de gastos. Segundo governo, 10 milhões de trabalhadores têm R$ 24,6 bilhões em recursos não resgatados do programa. Fecho a coluna com a política. Ninguém tem provas Numa festa, a dona de casa recebe um político famoso. - Muito prazer! - diz ele. - O prazer é meu! Saiba que já ouvi muito falar do senhor! - É possível, minha senhora, mas ninguém tem provas!
quarta-feira, 14 de junho de 2023

Porandubas nº 808

Abro com o hilário Zé Abelha. Eis mais uma historinha do repertório de Zé Abelha, o nosso mineirinho contador de causos. Dr. Luís da Costa Alecrim, juiz de Direito da comarca de Conselheiro Pena, interroga um cidadão acusado de ter esfaqueado uma prostituta, residente na Boate Luar. - O senhor conhece esta faca? - Não, doutor, nunca vi essa peixeira. Dr. Alecrim manda recolher o indiciado. Mês seguinte, novo interrogatório: - O senhor conhece esta faca? - Conheço sim senhor, responde com malícia o indiciado. - Então o senhor confessa a tentativa de homicídio? - Não senhor! Eu disse que conhecia a peixeira. Não é aquela que o senhor me mostrou, mês passado? Leitura por meio de conceitos Quem se arrisca a sair do ramerrame que se constata na leitura da imprensa, tem uma alternativa: tentar ler o cotidiano por meio de conceitos. É o caminho que este analista de política escolhe para sair da mesmice de Centrão, articulação precária do governo Lula, disputa por espaços e cargos e quetais... A organicidade social Começo apontando um fenômeno que tem sido recorrente em minhas análises: a intensa organicidade a que a sociedade tem se submetido nas últimas três décadas, consequência da emergência de grupos e setores, dispersão das massas, arrefecimento das agregações de grandes movimentos, cooptação de sindicatos e centrais sindicais pelo Estado, entre outros fatores. A sociedade tem procurado se organizar em torno de suas referências - setores e núcleos de interesse. Os valores da solidariedade, do companheirismo, da doçura nas relações humanas, da amizade, da comunhão, do trabalho em equipe cedem lugar a jogos mais competitivos. A sociedade de massas Da hipótese acima, extrai-se a observação de que as massas se dispersaram, deixando de se juntar em grandes concentrações, com exceção de movimentos de fundo religioso - Marcha Para Jesus, eventos de centrais sindicais sob a motivação de sorteios e shows com artistas. Esporadicamente, vemos um ou outro evento mais denso sem, porém, o chapéu ideológico dos velhos tempos. A globalização O mundo globalizado mostrou que as identidades nacionais perdem ímpeto ante a imperiosa interpenetração de fronteiras ideológicas, e esse fenômeno tem acionado mecanismos de defesa de padrões culturais. O Brexit é um exemplo. A globalização mostrou, ainda, que os movimentos setoriais - defesa de gêneros, raça, cor - disseminou-se, a ponto de aparecer como fator de padronização de comportamentos e atitudes. A velha política Do caixão de onde se tiram os elementos determinantes de uma nova ordem social, está a velha política, que elegerá, cada vez, menos representantes. A política não tem dado as respostas que a sociedade quer. Por consequência, parte ponderável dos eleitores tem virado as costas para a velha política, abominando seus métodos e recriminando seus modus operandi. O vazio entre política e sociedade Cria-se, assim, um vazio, um buraco entre os universos da política e o social, propiciando, dessa forma, a criação de novos polos de poder. Donde vejo a preamar de novas ondas de defesa social, em contraponto aos polos tradicionais da representação política - as instituições políticas do Estado, Câmara de vereadores, prefeituras, deputados estaduais, Federais e senadores, governadores, presidente da República. A pressão eficaz Se o Congresso não dá respostas ao que a sociedade almeja, os novos polos de poder oferecem seus préstimos. As organizações não governamentais constituem reflexos da onda organizativa da sociedade. As entidades intermediárias, até para dar respostas ao não atendimento das demandas de natureza política, começam, elas próprias, a mobilizar a sociedade, atuando junto aos Poderes, fazendo articulação para escolha de representantes e formando bancadas corporativas. As bancadas especializadas são o reflexo do que ocorre na sociedade. A ascensão da micropolítica Em decorrência de uma reversão de expectativas, comunidades passam a se inspirar pela moeda sonante do pragmatismo, ou seja, a satisfação de demandas imediatas e reprimidas. A macropolítica é substituída pela micropolítica, a política das pequenas coisas, das necessidades próximas aos conjuntos sociais: a iluminação do bairro, a escola próxima de casa, o alimento barato, o transporte rápido e acessível a todos. Lula tenta, com muito esforço, ser um aluno aplicado na implantação da micropolítica. O Centrão sabe disso. A democracia direta Há duas leituras que se extraem deste fenômeno. A primeira é a de que a organicidade social, dentro de limites restritos, absorve práticas da democracia participativa, a democracia direta. A sociedade opina e clama por demandas em seus núcleos de base. A outra leitura mostra que movimentos setoriais começam a questionar as Cartas nacionais, como nos Estados Unidos, onde as discussões baseadas em gênero, raças, opções sexuais, são condenadas por fragmentar a identidade nacional. Raspando o tacho Dito o que acima foi descrito, vamos aos fatos. - Luiz Inácio é o homem certo no lugar certo - é um feitor da velha política. Para fazer o que esta quer. - O Centrão é a fortaleza da micropolítica. - O ministério de Lula é a colcha de retalhos que encobre qualquer matiz ideológico. - Daniela do Waguinho é a ministra que não fala de turismo, mas quer ficar no cargo. - Marina Silva é um galho de uma árvore do bioma amazônico. Será derrubada pelo desmatamento. - Os Yanomamis são a ponta da visibilidade para a manutenção, mesmo precária, das conquistas indígenas. - Luiz Inácio terá imensas dificuldades nos tempos que se aproximam. - Luiz Carlos Hauly, do Podemos, que assume o mandato no lugar de Deltan Dallagnol, é o paladino da reforma tributária. Tem lutado como um leão. - Há um grupo de senadores eleitos que ainda não deu as caras. - As milícias darão as cartas nas eleições municipais do RJ. A conferir. - Lula aparece de branco nas solenidades. Pelas mãos da primeira-dama, Janja da Silva. - Os sindicatos hão de rever seus métodos de trabalho. Hoje, servem de cabide para muitos. A articulação política deve guiar seus passos. - A igualdade de salários entre homens e mulheres na AVON foi o passo mais avançado dado nesse espinhoso caminho. - O senador Randolfe Rodrigues, líder do governo no Congresso, perdeu o ímpeto. - O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, do MDB, ganha força e adquire voz. Estava calado. - As mulheres avançam em suas conquistas na frente da política. - O presidente da FIESP, Josué Gomes, continua como avestruz, de cabeça enfiada na terra. - O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, vai bem na gestão. Crescendo. - Joe Biden deve ser reeleito presidente dos EUA, a se manter a intensa divisão dos republicanos. - Trump deverá ser condenado (Análise com base nos dados de hoje). Este analista costuma acertar em suas previsões. Erra menos que acerta. A análise política é uma nuvem passageira. Fecho com o papa O bêbado entrou no ônibus aos tombos. Malvestido, sujo, tossindo, tropeçando, tremendo, com um jornal na mão, sentou-se ao lado de um padre. A cada arranco do ônibus, tombava para o lado do padre, que, irritado, o empurrava sem piedade ou indulgência, e com nojo. O bêbado abriu o jornal, tentou ler, mas não conseguia porque tremia muito, bateu no braço do padre: - Padre, o que é artrite? - É uma doença muito ruim, muito triste, muito feia, muito nojenta, que dá nas pessoas que bebem muito. - E mata, padre? - Mata sim, e mata rápido. Ou o doente para de beber ou morre logo. - Padre, o senhor jura que não está me enganando não? - Juro por essa cruz que está aqui no meu peito. Não estou enganando. E tem coisa pior. Quem morre de artrite, porque não parou de beber, não vai para o céu, nem mesmo para o purgatório. Vai direto para o fogo do inferno. - Coitadinho dele, padre. - Dele, quem? - Do Papa Francisco, padre. O jornal está dizendo aqui que o Papa operou do intestino e está com artrite no joelho. O padre se levantou, trocou de lugar, e foi lá pra frente. (Historinha de Sebastião Nery atualizada por este escriba)
quarta-feira, 7 de junho de 2023

Porandubas nº 807

Abro com as deliciosas historinhas de Leonardo Mota, o saudoso folclorista. Onde mora o dr. Agriço? Quem entra no "Hotel Roma" de Alagoinhas, na Bahia, vai com os olhos a uma tabuleta agressiva em que peremptoriamente se adverte: Pagamento adiantado, hóspedes sem bagagens e conferencistas Também, em Pernambuco, o proprietário do hotelzinho de Timbaúba é, com carradas de razão, um espírito prevenido contra conferencistas que correm terras. Notei que se tornou carrancudo comigo quando lhe disseram que eu era conferencista, a pior nação de gente que ele contava em meio à sua freguesia. Supunha o hoteleiro de Timbaúba que eu fosse doutor de doença ou doutor de questão. Por falar em Timbaúba. Há ali um sobrado, em cuja parte térrea funciona uma loja de modas, liricamente denominada "A Noiva". O andar superior foi adaptado para residência de uma família. Eu não sabia de nada disso quando tendo indagado do Major Ulpiano Ventura onde residia o dr. Agrício Silva, juiz de Direito da comarca, recebi esta informação chocante: - O Doutô Agriço? O Doutô Agriço está morando em riba d' "A Noiva"... Raspando o tacho... Recomeço com Porandubas imerso em dúvidas: essas mensagens estão sendo recebidas? E, se chegam ao receptor, quantas são internalizadas, ou explicando melhor, quantas são interpretadas e recebendo feedback? Quantas alicerçam o edifício do leitor, contribuindo para melhorar seu painel de conhecimentos? Em suma, qual o resultado da equação custo/benefício? Vale a pena se esforçar para compor painéis informativo-intepretativo-opinativos e constatar que tais pedaços do bolo de comunicação vão diretamente para a cesta de lixo da história? Canibalização Vejo que o processo de construção de conteúdos está sendo edificado sobre areia movediça. Lá se vão duas, três horas ou mais de pescagem conteudística, depois de jogar as redes para as diversas partes do lago. E zero de aproveitamento. É frustrante. As referências sobre fatos socialmente significativos se perdem nas marés do niilismo, que emergem de todos os lados. A seara literária Por isso mesmo, que tal jogar a rede na seara literária, produzindo contos, crônicas, ensaios e coisas adjacentes, sem querer mexer a colher nas panelas da poesia, cheia de gigantes da beleza e da estética? Que tal, por exemplo, tentar verificar o que se passa nas roças que cercam a literatura, examinando coisas como as ideias que Ítalo Calvino começou a descrever em Seis Propostas para o Próximo Milênio, um livreto que reuniu seis palestras de Calvino antes de morrer? Lembrando... Em Seis Propostas para o Próximo Milênio, Calvino reúne cinco conferências por meio das quais propunha a perenidade de determinados valores literários para o próximo milênio, listadas pelo autor na seguinte ordem: leveza, rapidez, exatidão, visibilidade, multiplicidade e consistência. Contudo, o autor faleceu antes de escrever a última conferência. A leveza A leveza, na concepção de Calvino, seria ancorada em elementos diversos que permeiam textos literários, capazes de fazer com que o leitor vivencie esta sensação. O autor faz considerações sobre a construção textual sinalizando como sendo esses elementos a corrente filosófica, o ponto de vista, as ferramentas linguísticas peculiares, a definição da ideia e a precisão na linguagem, visando estimular, em especial, a percepção. Esta característica tem o condão de afinar a volatilidade, descrevendo-a como algo mais leve que uma nuvem, uma espécie de campo de impulsos. Sua percepção se sente em três acepções: um despojamento de linguagem que permite aos significados consistência pouco densa; a narração de um raciocínio atravessado por itens que assegurem a abstração e, por fim, a formação de figuras visuais leves. A rapidez Refere-se à duração do texto, que propicia ao leitor uma colcha de detalhes em favor do ritmo, da lógica na narrativa. Calvino a vê como o nó de uma rede de correlações invisíveis, o mecanismo para a continuidade da narrativa, fazendo com que o leitor transite num campo de forças que envolve um liame verbal (uma palavra que dê ideia de continuidade) e um liame narrativo (elemento que sustenta a narrativa numa relação lógica de causa e efeito). Ouçam quanta poesia... no verso... Quadrupedante putrem sonitur quatitur ungula campum. Fechem os olhos e vejam a poeira levantada pelos cavalos ao trotear nos pedaços de pedra, nesse clássico verso de Vergílio, na Eneida: os cascos, com seu som de galope de quatro patas, estão sacudindo a planície de pó... O autor explica a rapidez de estilo e de pensamento como desenvoltura, mobilidade, a capacidade de juntar as partes no todo. Também distingo essas qualidades na expressão de muitos poetas e contistas brasileiros. Nossos grandes escritores, romancistas, cronistas e poetas - Machado de Assis, Álvares de Azevedo, Murilo Rubião, Cora Coralina, J.J.Veiga, Clarice Lispector, os sabiás modernistas da crônica (Rubem Braga, Vinicius de Moraes, Fernando Sabino, Stanislaw Ponte Preta, José Carlos Oliveira), o incomparável Carlos Drummond de Andrade, o retraído Dalton Trevisan, Rubem Fonseca, Nélida Pinon, João Ubaldo, Ledo Ivo, Osman Lins. A exatidão Exatidão é a terceira vertente literária de Ítalo Calvino, o cinzel que o escultor usa para lapidar sua obra, inserir visão particular, apor um diferencial, narrar o detalhe, ser preciso na narrativa, evitando fórmulas abstratas, anônimas, as dobraduras da linguagem - esses efeitos retóricos que diluem significados, ocupando muito espaço para dizer pouco. O exemplo de exatidão apontado pelo escritor que nasceu em Cuba, mas passou a vida na Itália, é o gênio de Borges: "cada texto seu contém um modelo de universo ou de um atributo do universo - o infinito, o tempo, o inumerável". A multiplicidade Valor insubstituível para a literatura, significando a capacidade de descrever a complexidade inextricável do mundo, a visão múltipla de sujeitos, vozes, olhares, sentimentos, desejos, expectativas, sonhos, frustrações. A consistência A conferência sobre a consistência, que talvez refutasse os chamados hábitos lights que teria a literatura contemporânea, não foi escrita por Calvino, que faleceu antes de concluir a sexta proposta para o milênio. Não podemos, entretanto, perdê-la de vista, especialmente para não permitir que as ideias de leveza e rapidez se confundam com a de superficialidade. Como tais valores haverão de impactar a palavra escrita na seara das novas tecnologias, nos ambientes multimídia? A Internet é a negação da literatura ou o resgate de especificidades? Seria a junção mais acessível de elementos técnicos, garantindo a sobrevivência da literatura neste e nos próximos milênios? Seria o palco mais aberto para se descrever relatos desde que o homem contou a primeira história numa caverna? Ora, a literatura está viva e corre pelas veias das mentes criadoras. Deixo aos leitores de Porandubas os pensamentos sobre tais questões...! Raspas do tacho... - A lengalenga de Lula e Arthur Lira sobre articulação política prova, de um lado, que o presidente deu ordem ao motorista para ligar o carro mas este não sai do lugar. Ele mesmo pegou a direção. - Pelo andar da carruagem, Luiz Inácio terá algumas montanhas a mais a escalar, desde que tomou posse. Triplica o número de curvas e obstáculos. - Lula quer aparecer na história como o político que tirou o Brasil do buraco. Isso faz sua cabeça. - Rui Costa não deve permanecer muito tempo na Casa Civil. O ministro tem índole rompante. - Alexandre Padilha é um perfil mais afinado às conveniências. Mas os tempos são outros. - As Forças Armadas, sob Lula, retraem-se. E voltam aos tempos de muita transpiração e conversas que lembram consp... - Não há clima para movimentos de ruptura nas frentes institucionais. - Uma andorinha só não faz verão. E muitas voando na mesma direção podem dar ideia de convergência de rumos. No governo Lula, as aves se dispersam. - O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, MDB, começa a crescer no conceito dos paulistanos. - A propaganda partidária fora das campanhas eleitorais, como as inserções que vemos nas TVs, é uma homenagem às mulheres. Nunca vi tantas representantes levantando bandeiras de partidos. - As dores do corpo humano são diferentes a cada ciclo de vida. Mas a fé atenua sua intensidade. - Há uma teia de abelhas que tecem os véus das colméias. São os verdadeiros heróis do cotidiano, entre elas e eles, nomes como Fernanda, Juliana, Mariana, Samanta, Thiago, César, Rafael, Luiz, Eduardo, Luciana, Daniela, Bárbara, Dorinha, Donaldo. Lembro de alguns, em nome de quem homenageio um generoso grupo que me ajudou a suportar as dos últimos tempos. Fecho com pequeno lembrete aos políticos. - Um bom marketing ajuda a eleger, mas é o candidato quem se elege. Marketing mal feito, ao contrário, ajuda um candidato a perder as eleições. Não adianta um bom marketing se o candidato é um boneco sem alma. Candidato não é sabonete. Tem vida, sentimentos, emoção, tristeza e alegria. Muita coisa depende dele, de sua alma, de seu fervor, de suas crenças, enfim, de sua identidade. Protagonistas da política não são produtos de gôndolas de supermercado. As inserções publicitárias na mídia até podem exibir um candidato de forma genérica, por falta de tempo para expor conteúdo. Mas o eleitor não se conformará com meros apelos emotivos e chavões-antigos, como os usados para embalar perfis saturados (candidatos beijando crianças e velhinhos, tomadas em câmera lenta mostrando o candidato no meio do povo). Hora da verdade. Estamos longe de 2024, mas já tem gente se apoiando nas estacas do marketing capenga. Maquiavel Atenção: "Um príncipe precisa usar bem a natureza do animal; deve escolher a raposa e o leão, porque o leão não tem defesa contra os laços, nem a raposa contra os lobos. Precisa, portanto, ser raposa para conhecer os laços e leão para aterrorizar os lobos." Arremata o perspicaz Maquiavel. "não é necessário ter todas as qualidades, mas é indispensável parecer tê-las."
quarta-feira, 3 de maio de 2023

Porandubas nº 806

Abro com mais uma hilária historinha do Sebastião Nery. Cambada de ladrões....!  Cabralzinho, líder estudantil em Campina Grande, foi passear em Sobral, no Ceará. Chegou em dia de comício. No palanque, longos cabelos brancos ao vento, o deputado Crisanto Moreira da Rocha, competente orador da província: - Ladrões! A praça, apinhada de gente, levou o maior susto. - Ladrões! Ladrões, porque vocês roubaram meu coração! Cabralzinho voltou para Campina Grande, candidatou-se a vereador. No primeiro comício, lembrou-se de Sobral e do golpe de oratória do deputado, fechou a cara, olhou para os ouvintes com ar furioso: - Ladrões! Ninguém se mexeu. Cabralzinho sabia que política em Campina Grande era briga de foice no escuro. Queria o impacto total. - Cambada de ladrões! Foi uma loucura. A multidão avançou sobre o palanque. Pedra, pau, sapatos. O rosto sangrando, acuado, Cabralzinho implorava: - Espera que eu explico! Espera, vou explicar! Explicou. Ao médico, no hospital. Panorama Quatro meses O governo Lula 3 chega aos quatro meses com uma nota 6 na escala 0 a 10. Referência deste analista. Número que deve ser 10 na contagem de um membro do PT, 6 a 7 na visão de um esquerdista moderado e 1 a 2 na opinião de um bolsonarista. Ou seja, a avaliação da administração lulista depende da origem da fonte. O posicionamento do participante da enquete explica má ou boa avaliação. Tento explicar minha posição. Arcabouço confuso Começo com o eixo que constitui o calcanhar de Aquiles do governo: o arcabouço fiscal. Trata-se de uma peça meio solta na engrenagem. Não está firme. O ministro Fernando Haddad se esforça para chegar a um ponto de equilíbrio, entre o controle dos gastos e a busca de novas fontes de receitas. Os últimos movimentos mostram a tendência da administração em taxar riquezas/investimentos no exterior e melhorar a condição do bolso das classes no pátio inferior da pirâmide social. Para tanto, melhoria do salário-mínimo e aumento do teto do IR para efeito de taxação. Nem lá, nem cá O trabalho da equipe econômica, que parecia mais robusto por ocasião dos primeiros informes, se estiola ao longo dos dias, a denotar a dificuldade do governo em agradar gregos e troianos. Por mais que Lula se esforce para arrumar um discurso convincente para satisfazer às classes médias, não tem melhorado sua avaliação. Ao contrário, a cada dia, o presidente insiste em resgatar o velho discurso de pobres contra ricos e a levantar bandeiras vermelhas dos tempos d'outrora. Ousadia "Desde o condutor dos transportes e o tocador de tambor até o general, a ousadia é a mais a nobre das virtudes, o aço verdadeiro que dá à arma o seu gume e brilho". (Clausewitz, em Da Guerra). IPESPE O Instituto do pesquisador Antônio Lavareda, na pesquisa de abril, encomendada pela Febraban, mostra certa estabilidade na avaliação do governo Lula. A aprovação cai 1 ponto, de 40 para 39 (ótimo e bom) e a desaprovação fica em 28 pontos (ruim e péssimo). A área da saúde e a de emprego e renda lideram as demandas por maior atenção. Vermelho É fato que, sob a paisagem estética, Lula aboliu o vermelho de suas roupas, que ostentam a cor branca, com desenhos e arremates cromáticos, mas a vermelhidão continua forte nos grupamentos do MST e da CUT, reunidos nos eventos de massa. Lula tem usado o palanque para atingir sua antiga plateia, a quem faz acenos com uma adjetivação polarizada. Daí as urras de "mito, mito, mito" que Messias continua a produzir em seus primeiros movimentos na volta dos Estados Unidos. Bolsonaro emerge Explicam-se, assim, os passos do ex-presidente Bolsonaro, saltitantes em função do tiroteio que continua a receber de Lula. Quem está pondo lenha na fogueira é Luiz Inácio. Jair conta com o tom agressivo do presidente para despontar como o comandante geral das oposições. E, nessa condição, espera construir massa de pressão contra a inelegibilidade, que ganha viabilidade junto aos membros do Tribunal Superior Eleitoral. Escapando Bolsonaro se coloca na condição de vítima. Incrível, mas verdadeiro. A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito será um palanque para o discurso oposicionista, espaço em que Lula será marcado como conivente (pois sabia dos riscos de depredação ocorridos em 8 de janeiro) e ele, Bolsonaro, longe do país, longe dos acontecimentos, teria nada a ver com a tragédia. Mesmo com o domínio do governo sobre a narrativa na CPMF, os bolsonaristas abrirão um berreiro. A conferir. Comunicação ruim O governo Lula 3 tem uma comunicação falha. O ministro Paulo Pimenta ainda não encontrou o fio da meada. Lula deve iniciar uma live semanal, quando, de maneira informal, dará informações e opiniões. Tudo a ver com o resgate de imagem. Amorim O assessor especial de Relações Internacionais, Celso Amorim, irá à Ucrânia. Mas terá dificuldades em arranjar um discurso que agrade a Zelensky, da Ucrânia, e a Putin, da Rússia. Interessante: o chanceler Mauro Vieira desapareceu. Amorim é o real ministro das Relações Exteriores. P.S. As declarações de Lula sobre a guerra na Ucrânia, apesar da mudança de fala, inviabilizaram o papel do Brasil na condução de uma política de paz. Tebet Simone Tebet, ministra do Planejamento, baixa na escala de visibilidade. Está contida. O agro O agronegócio está de costas viradas para o governo. Bolsonaro faz festa com os empreendedores do setor. Charles III Lula se prepara para ir ao Reino Unido. Vai assistir à coroação de Charles III, que, segundo se lê, dorme abraçado ao seu ursinho de pelúcia. E, ao escovar os dentes, já encontra 1 cm de pasta na escova, medido por seu mordomo. Doenças respiratórias Tempos de pólen no ar. Tempos de doenças respiratórias. Tempo de maior cuidado com as crianças. Pornografia No Brasil, 22 milhões de pessoas assumem consumir pornografia - 76% são homens e 24% mulheres. Assistir a cenas pornográficas, segundo estudo publicado pela revista alemã Psychiatry, pode atrofiar partes do cérebro, deixando o órgão menos eficiente. Vídeos eróticos podem estar mascarando problemas físicos ou emocionais. "Uma válvula de escape". Deu no site fatorrrh.com.br. Invasões As invasões de propriedades pelo MST serão uma dor de cabeça para o governo Lula. Em São Paulo, o governador Tarcísio de Freitas promete agir com força. AFIF O secretário de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia do Governo de São Paulo, Guilherme Afif, despontava como o motor da administração. É hábil e senhor de sua área de atuação. Prefere agir de modo low-profile. Viabilidade Carlos Matus, cientista social chileno, em um magistral estudo sobre Estratégias Políticas, demonstra que a viabilidade de um ator na política tem a muito que ver com a estratégia e seus princípios fundamentais. Eis alguns princípios estratégicos: a) Avaliar a situação; b) Adequar a relação recurso/objetivo; c) Concentrar-se no foco; d) Planejar rodeios táticos e explorar a fraqueza do adversário; e) Economizar recursos; f) Escolher a trajetória de menor expectativa; g) Multiplicar os efeitos das decisões; h) Relacionar estratégias; i) Escolher diversas possibilidades; j) Evitar o pior; k) Não enfrentar o adversário quando ele estiver esperando; l) Não repetir, de imediato, uma operação fracassada; m) Não confundir "reduzir a incerteza" com "preferir a certeza"; n) Não se distrair com detalhes insignificantes; o) Minimizar a capacidade de retaliação do adversário.
quarta-feira, 26 de abril de 2023

Porandubas nº 805

Abro com hilária historinha contada pelo formidável jornalista e historiador Sebastião Nery em seu livro sobre Folclore Político (Geração Editorial). José Maria Alkmin (este escriba lembra que foi uma das maiores raposas políticas de nossa história), advogou para um cliente em um caso de um crime bárbaro. No júri, conseguiu oito anos para o réu. Recorreu. Novo júri, pena de 30 anos. O réu ficou desesperado: - A culpa foi do senhor, dr. Alkmin. Eu pedi para não recorrer. Agora vou passar 30 anos na cadeia. - Calma, meu filho, não é bem assim. Nada é como a gente pensa da primeira vez. Primeiro, não são 30, são 15. Se você se comportar bem, cumpre só 15. Depois, esses 15 são feitos de dias e noites. Quando a gente está dormindo tanto faz estar solto como preso. Então, não são 15 anos, são 7 e meio. E, por último, meu filho, você não vai cumprir esses 7 anos e meio de uma vez só. Veja bem: vai ser dia a dia, dia a dia. Suavemente. Panorama Um ponto de interrogação O país entra nesse final de abril olhando para mais um ponto de interrogação: onde vamos chegar no caso 8 de janeiro? O STF julga os participantes da devastação dos espaços dos Três Poderes em lotes de 100. Os incriminados serão quantos? 200, 300, 1.000? Como o país irá reagir ante as condenações em ambiente desfavorável ao governo? Afinal, a economia, apesar dos esforços do ministro Fernando Haddad, não apresentará índices positivos no curto prazo. E, como se sabe, a economia é o motor da política. Capengando, esse motor para o carro na estrada. Lula sabia? A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, para investigar os atos de 8 de janeiro, terá 16 deputados e 16 senadores, abrindo o palco principal da política, a partir de sua instalação. As narrativas serão expostas. De um lado, a principal, que posicionará o governo Lula como vítima dos vândalos, e a bolsonarista, de oposição, que vai insistir na tese: Lula sabia. Sabia do que iria ocorrer. E a passagem do general G Dias pelo Palácio do Planalto, parecendo mais um bedel checando se as portas estavam fechadas, seria a prova da narrativa. Veremos um debate aceso. (Pausa para o riso) Tapioca pra viagem Seu Lunga chegou numa barraca de feira e pediu uma tapioca. O feirante: - É para viagem? - O senhor está vendo alguma bagagem aqui? Estranho Mesmo que não se comprove a tese bolsonarista de que os meios de inteligência do Gabinete de Segurança Institucional avisaram o governo sobre o que iria ou poderia ocorrer, as dúvidas serão alimentadas pela extrema direita. O país, dividido, atravessará mais um corredor de querelas e cutucadas recíprocas entre as alas. A polarização do discurso político tende a continuar beneficiando o bolsonarismo. Ruim para Lula, que tem sido o artífice da polarização. Suas falas improvisadas acendem a fogueira. O vencedor nesse primeiro embate da guerra pós eleições aponta para o bolsonarismo. Infelizmente. Em suma, é estranho para formidável parcela da sociedade a explicação do general Gonçalves. Seus gestos suaves não convencem. Senado e Câmara O Senado será governista na condução da CPMI. A Câmara dividirá seu posicionamento entre governo e oposição. Janja, um alvo Dona Rosângela Lula da Silva, Janja, tem sido o novo alvo de artilheiros que tentam macular sua posição de primeira-dama. Já escrevi sobre seu protagonismo em artigo nos jornais, mostrando que a socióloga não quer ser apenas uma rosa na lapela do marido. Pincei a imagem criada pela ex-primeira dama do Canadá, Margaret Trudeau, mulher de Pierre e mãe do atual primeiro-ministro, Justin Trudeau, que refutava a ideia de ser apenas um objeto de decoração na liturgia da política. "Não quero ser apenas uma flor na lapela do meu marido", dizia ela. Janja é cidadã. Tem direitos. Inclusive o de comprar uma gravata para o marido, ante o esquecimento do adereço na viagem a Portugal e Espanha. (Pausa para o riso) Tomando banho Seu Lunga estava tomando uma sopa num bar de Juazeiro. Um sujeito entra no estabelecimento e pergunta: - Tomando sopa, Seu Lunga? E Seu Lunga: - Não! Tô tomando banho! Chuvarada O país registra um índice pluviométrico elevado. O lado ruim é a destruição, que deixa milhares de famílias sem um teto. Enchentes que afligem as populações. O lado bom é a natureza cheia d'água, e sua exuberância verde, e com os reservatórios afastando a seca. Essa praga que maltrata o oeste do Rio Grande do Sul. Que país de contrastes...! Acomodação Depois de um ciclo de tensões, as camadas tectônicas parecem mais calmas nas cercanias das Forças Armadas. Certos bolsões não queriam a eleição de Lula. Inflação Emerge o temor de que a inflação comece a subir ante as incertezas do amanhã. Nesse último mês, pulou mais alto do que o salto previsto. O nome dos ministros O ministério de Lula é enorme. Um exercício difícil é lembrar o nome dos 37 ministros. Tente, leitor, declinar o nome de cinco ministros. Senador? Bolsonaro sinaliza interesse em se eleger senador na próxima eleição. Teria vaga garantida, segundo analistas, em Estados como Mato Grosso ou mesmo Distrito Federal. P.S. Sarney passou anos a fio como senador do Amapá. (Pausa para o riso) Treinando pra morrer Seu Lunga estava deitado no sofá quando alguém faz a pergunta: - Tá dormindo seu Lunga? - Não! Tô treinando pra morrer. Mundo menos democrático A democracia torna-se menor do que há três décadas. As ditaduras atingem o grau mais elevado desde 1995 no mundo. De 2009 para 2022, os sistemas democráticos caíram de 44 para 32, desde 1986. As ditaduras, de 22 para 33. As chamadas democracias falhas (tipo Brasil, África do Sul), que eram apenas 16 em 1970, hoje são 58. Resultados de uma pesquisa feita pelo Instituto sueco, V-Dem, da Universidade de Gotemburgo. Fatores considerados: liberdade de imprensa, independência entre Poderes, repressão policial, integridade do sistema eleitoral, entre outros. (Pausa para o riso) É pra matar? Seu Lunga foi à feira e comprou uma galinha caipira. Chegando a casa ele deu pra mulher. E ela pergunta: - Lunga, é pra matar? Lunga responde: - Não, dê uma surra e solte. A contribuição sindical O lobby é forte. Os sindicatos fazem pressão. E o STF tende a achar que a contribuição sindical é um instrumento legal. Mas uma portinha ficará aberta: aos não sindicalizados, a decisão de pagar ou não. A ronda da morte As redes sociais constituem o meio mais volumoso para noticiar sobre mortes. Quase todos os dias, leio amigos e familiares anunciando o adeus de entes queridos. E votos de sentimentos e pêsames. Nunca se viu uma ronda de morte tão intensa como a que cerca nossos tristes tempos. Mais imposto Vem mais imposto por aí. O governo precisa garantir aumento de arrecadação. Sem imposto, não sairá do buraco. E Haddad pede criatividade aos seus assessores. O fim da ajuda a setores na agenda principal do ministro da economia. Os indianos A Índia já teria ultrapassado a casa dos 1,425 bilhão de habitantes. E ultrapassado a China, onde as mortes suplantam os nascimentos. Os indianos liderando o ranking demográfico. Os horizontes sinalizam para o empoderamento de uma potência tecnológica. Chico O discurso de Chico Buarque, ao receber o prêmio Camões, no Palácio Queluz, em Portugal, o principal da literatura em língua portuguesa, foi poético e muito expressivo. Trechos: ...herdei de meu pai, o historiador e sociólogo Sergio Buarque de Holanda, alguns livros e o amor pela língua portuguesa. ...o meu pai era paulista, meu avô, pernambucano, o meu bisavô, mineiro, meu tataravô, baiano... tenho antepassados negros e indígenas, cujos nomes meus antepassados brancos trataram de suprimir da história familiar. Como a imensa maioria do povo brasileiro, trago nas veias sangue do açoitado e do açoitador, o que ajuda a nos explicar um pouco. Escrevi um primeiro romance, Estorvo, em 1990, e publicá-lo foi para mim como me arriscar novamente no escritório do meu pai em busca de sua aprovação...gosto em ser reconhecido no Brasil como compositor popular e, em Portugal, como o gajo que um dia pediu que lhe mandassem um cravo e um cheirinho de alecrim....recebo este prêmio menos como uma honraria pessoal, e mais como um desagravo a tantos autores e artistas brasileiros humilhados e ofendidos nesses últimos anos de estupidez e obscurantismo. Dez linguagens para os próximos tempos 1. A linguagem da afirmação. 2. A linguagem da factibilidade/credibilidade. 3. A linguagem das pequenas coisas. 4. A linguagem da participação - o NÓS versus o EU. 5. A linguagem da verificação - exemplificação - como fazer. 6. A linguagem da coerência. 7. A linguagem da transparência. 8. A linguagem da simplificação. 9. A linguagem das causas sociais - os mapas cognitivos do eleitorado. 10. A linguagem da tempestividade - rapidez - proximidade. (Adaptado do meu livro Tratado de Comunicação Organizacional e Política)
quarta-feira, 19 de abril de 2023

Porandubas nº 804

Todos os governadores de São Paulo leem de maneira enviesada o lema do Estado. Maluf, Montoro, Covas, Serra, Alckmin, Doria. E agora, Tarcísio de Freitas. Exame para Brasília Quem vai ao Palácio dos Bandeirantes encontra no Salão Nobre, cravado em madeira, o brasão do Estado: uma espada longa cercada por dois modestos ramos de café. Emoldurado pelo dístico: - Pro-Brasilia fiant eximia. (Façam-se as melhores coisas pelo Brasil). Que os governadores de São Paulo costumam traduzir assim: - Fazendo exame para Brasília. Panorama O senso Com perdão de Olavo Bilac, amparo-me em seu soneto para comentar sobre o nosso país. Ora (direis) ouvir estrelas! Certoperdeste o senso! E eu vos direi, no entanto,Que, para ouvi-las, muita vez despertoE abro as janelas, pálido de espanto... Pálido de espanto, cá estou, caro poeta. É só abrir a janelinha do consciente para perceber que o senso está dando adeus ao nosso presidente Luiz Inácio. Pois não é que em um momento tão crucial para a decolagem de seu avião nas pistas internacionais, o dirigente transforma uma visita ao maior parceiro comercial do Brasil, a China, para bater continência a um tradicional opositor do ideário ocidental, ele mesmo, o todo-poderoso Vladimir Putin? O encanto da Via Láctea E conversamos toda a noite, enquantoA via láctea, como um pálio aberto,Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,Inda as procuro pelo céu deserto. Admirar a Via Láctea, toda a noite, que cintila como um pálio aberto, é um risco de que sejamos envolvidos pelo encanto, a ponto de darmos uma cutucada, com fala curta, no maior aliado brasileiro no painel das democracias ocidentais, os EUA. Pois o invasor da Ucrânia foi a Rússia, e por isso mesmo, ela é a responsável pela guerra com seu ex-aliado. Ao chanceler russo, Sergey Lavrov, faz bem dizer que Brasil e Rússia comungam de ideias semelhantes sobre o conflito (conflito?) com a Ucrânia, pois essa linguagem faz parte do ritual de um embaixador que há 20 anos faz a limpeza da imagem do seu chefe, Vladimir Putin. Tresloucado amigo Direis agora: "Tresloucado amigo!Que conversas com elas? Que sentidoTem o que dizem, quando estão contigo?" Mas o nosso interlocutor no campo da diplomacia, Mauro Vieira, não pode sair por aí trombeteando a ideia de que só falou de paz com seu parceiro de conversas, Lavrov, sabendo-se que o nosso dirigente-mor, Lula, quer também ser o mediador da guerra que já devastou grande parte do território ucraniano. Ou será que Vieira conversava com estrelas, achando que Putin e seu embaixador são as maiores estrelas da Via Láctea? Vieira é um tresloucado? Entender estrelas E eu vos direi: "Amai para entendê-las!Pois só quem ama pode ter ouvidoCapaz de ouvir e de entender estrelas. Eis aqui o nó da questão. Trata-se de um exercício de entendimento. Quem é invasor e invadido na pendenga entre Rússia e Ucrânia? O que deseja Lula da Silva com seu entendimento, parco, sobre a situação? Tem ele ouvido para entender estrelas? Ou foi açodado pelas circunstâncias, a vontade de enaltecer para ser enaltecido? Como serão os próximos tempos de encantamento na visão da Via Láctea? Amém. Só quem ama pode ter ouvido para entender o que está dentro e fora do senso comum. O Judiciário Prisões e prisões de envolvidos no fatídico episódio de 8 de janeiro passado no planalto dos Três Poderes. Até quando este tema absorverá as atenções? Será que uma gigantesca pizza não está sendo esquentada nos fornos do Judiciário? Quantos serão condenados? Zanin Este é outro assunto que ocupa espaço na mídia e nas conversas. Ora, leia-se a Constituição. Cumpre ele todos os requisitos? Um quesito importante é sobre a bagagem jurídica. Preenche essa condição? Então, Lula, faça sua nomeação. Cristiano Zanin, seu ex-advogado, espera um assento na cadeira do STF. Isenção para bugigangas O governo voltou atrás na decisão sobre isenção para mercadorias até US$ 50, importadas principalmente da China. Viu que a taxação iria encarecer, sobremaneira, os produtos. Ora, ministro Haddad, deixe que se importem tais bugigangas. Invasão de terras O MST continua abrindo fogueiras no abril vermelho. Sob as barbas de João Pedro Stédile, que fez pose com Lula e Xi Jinping na China. Continua o Movimento invadindo propriedades privadas sob as barbas de Luiz Inácio. O que pode e o que não pode no governo Lula? Congresso O Congresso Nacional vai deixar Lula sob suas rédeas. Os tempos sinalizam mais força ao Poder Legislativo. Quanto mais o dirigente radicalizar na fala, mais dependência verá por parte dos partidos e blocos. Bolsonaro atirando para matar? Essa foi dura: vou atirar para matar. Teria dito Bolsonaro se a PF cumprir eventual ordem de prisão. Intimidação? O ex-presidente parece sincero. Se isso ocorrer, cenário feio mais adiante. Amigos de Bolsonaro, entrem em campo. Ou será um blefe? Cama e móveis Dona Michelle Bolsonaro diz que sempre usou as roupas de cama de sua propriedade, trazidas de sua residência no RJ. Não comprou nada. E que também trouxe seus móveis. Agora, revela-se uma compra no valor de R$ 35 mil para encomendas de roupa de cama. Alguém falta com a verdade. Quem matou? Marielle Franco? Quem? Quais os mandantes? Mais um pouco, teremos uma resposta. Não é possível tanto tempo de investigação para nada... Dilma no Brics Dilma Rousseff, ex-presidente, tomou posse no Banco dos países emergentes, Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Dilma deve incorporar ao Brics mais uns 10 países. Ou até mais que isso. As redes querem ver falas extravagantes da ex-presidente. Para montar seu espetáculo. Dilma monta sua equipe com bons quadros do Brasil. Merece um voto de confiança. Temer Um perfil em crescente elevação de conceito: Michel Temer. Seus feitos nas áreas de controle de gastos, recuperação de contas do país, articulação com o Congresso, "prestigiamento" a lideranças institucionais e afins, começam a ser reconhecidos. Sexta, 21 de abril, receberá o maior galardão de Minas Gerais, o Grande Colar da Medalha da Inconfidência, do governo de MG, presidido por Romeu Zema. Bolivar Fecho a coluna com o lamento do grande libertador Simon Bolívar: "não há boa-fé na América, nem entre os homens nem entre as nações. Os tratados são papéis, as constituições não passam de livros, as eleições são batalhas, a liberdade é anarquia e a vida um tormento". Hoje, a vida nacional está se tornando um tormento e parcela desse sofrimento tem muita coisa ver com a desordem institucional. O estado de violência. A falta de boa-fé entre as pessoas. E de confiança. O precário relacionamento entre partidos. Na base governista, as dissensões se acentuam. Os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário agem de forma desordenada. A impunidade escancara sua fragilidade. As oposições se esfacelam. As doutrinas murcham. Os ideários morrem.
quarta-feira, 12 de abril de 2023

Porandubas nº 803

A piada é antiga, mas ainda risível nesses tempos em que a China dá demonstrações de força e poder. Acaba de fazer operação de guerra na região de Taiwan, mostrando poderio. Argentina x China A Argentina declara guerra à China! Comoção geral. Após consulta popular feita na "Plaza de Mayo", a Argentina enviou uma mensagem à República Popular da China: - Chinos de mierda, maricones: les declaramos "guierra": - tenemos 105 tanques, 47 aviones sanos, 4 barcos que navegan y 5.221 soldados. O governo chinês deu a resposta: - Aceitamos a declaração. Informamos que temos 100.000 tanques, 50.000 aviões, 1.500 navios e 400 milhões de soldados. Orgulhosos, os argentinos retrucam: - Retiramos la declaración de guierra... No tenemos como alojar tantos prisioneros. Hora de trabalhar! Começo com o poeta Ascenso Ferreira, um dos gênios de Pernambuco, que cunhou o verso: "Hora de comer, comer! Hora de dormir, dormir! Hora de vadiar, vadiar! Hora de trabalhar, pernas pro ar que ninguém é de ferro!". Pois é, senhor presidente Lula. Hora de trabalhar, sem pernas pro ar. Não dá mais para postergar. Não perder tempo com mudanças em programas considerados positivos, de autoria de gestões anteriores. Não perder tempo com diatribes ideológicas. Não perder tempo com elogios em causa própria, um vitupério, segundo nossas avós. Não perder tempo em apontar antecessores como culpados. A hora é de trabalhar. Já se foram os 100 dias de governo. O gosto pelo instantâneo O Brasil cultiva o gosto pelo instantâneo, pelo provisório. Prefere-se, por aqui, administrar o varejo e não o atacado. É mais vantajoso apagar incêndios que preveni-los. Coisas planejadas com muita antecedência parecem não combinar com a alma lúdica brasileira, brincalhona, irreverente. Se não fosse obrigado a enfrentar o batente para sobreviver, o brasileiro adoraria passar o ano inteiro na folia. Oswald de Andrade traduziu, um dia, tal estado de espírito ao versejar: "quando dá uma vontade louca de trabalhar, eu sento quietinho num canto, e espero a vontade passar". Na volta da China Ouve-se, aqui e ali, Lula vai fazer isso e aquilo. Depois de voltar da China. Lula vai fazer lives semanais. Após visita à China. Lula vai cobrar ações de seus ministros. Depois de conversar com Xi Jiping. Até parece que Lula estará reiniciando seu governo, após o tour pela China. Não há tempo a perder, Excelência. Não se perca no labirinto de firulas. Não se enrole na linguagem de palanque. Não gaste precioso tempo execrando Bolsonaro. Não continue a enxergar golpismo no ex-presidente Michel Temer. Afinal, o STF, com o então presidente na época, Ricardo Lewandowski, presidiu o processo de impeachment. Estaria ele mancomunado com "golpistas"? Lula, seja o presidente de todos os brasileiros. O retrovisor Governar com os olhos no passado é perder a visão da realidade. O hoje é diferente do ontem. E o amanhã carece de um olhar estratégico, que contemple as circunstâncias que norteiam a caminhada de um país. Lula tem dito que não quer um país com Lula de novo. Mas um governo novo para o país. Capaz de consertar os buracos da gestão Bolsonaro. Capaz de resgatar confiança. Nesse sentido, Luiz Inácio precisa dar o exemplo e evitar o discurso de palanque. Estado Maior O presidente está com o pé no freio do caminhão das privatizações. Quer dar um basta ao programa de privatização que já se iniciara no país. Lula acredita no Estado forte, cheio de empresas, mesmo aquelas deficitárias. Trata-se de uma crença irremovível. Sendo assim, é possível, até, que ele lidere a volta do sistema Eletrobrás ao colo do Estado. Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo, fará o contraponto, com seu programa de privatização da Sabesp e adjacências. O tema estará na ordem do dia. Sonho de noites de outono Lula ganhando o Prêmio Nobel da Paz? Sonho de outono. Qual a proposta de Lula? Paz entre a Ucrânia e a Rússia? Paz com um pedaço da Ucrânia anexado à Rússia? O presidente Volodymyr Zelensky já proclamou: nem a pau, Juvenal. Mas o chanceler ad hoc para esta questão, Celso Amorim, esteve em Moscou, sentou-se do outro lado da mesa quilométrica de Putin, no Kremlin, e até iniciou a conversa em português, levando o todo-poderoso da Rússia a sorrir. Amorim ficou na proposta genérica e abstrata. Nada de concreto. O Prêmio Nobel da Paz passa longe do Palácio do Planalto. Mas, convenhamos, seria o sonho dos sonhos. 12 anos José Dirceu é bom de bola. Emplacou seu filho, Zeca Dirceu, como novo líder do PT na Câmara Federal. E dá uma entrevista pregando um ciclo de 12 anos para viabilizar as propostas do Partido. Um mandato simples de Lula seria pouco. Tem inteira razão. Sabendo-se da complexidade de realizar um programa substantivo por parte da gestão Federal, Zé Dirceu vai direto ao assunto: 12 anos. O mínimo. Ora, quem vai amparar essa proposta é o dinheiro no bolso dos brasileiros. A dona Economia. Se tudo for favorável e o bolso dos conterrâneos abrigar um "rico dinheirinho" para as compras, o índice de felicidade aumentará e dois mandatos a mais poderão ser conquistados. Bolso, Barriga, Coração, Cabeça: BO+BA+CO+CA. Polarização O berro está quase chegando às cordas vocais: "parem de radicalismos, guardem as peixeiras". Ninguém aguenta mais a polarização entre as duas alas, o nós e eles. Quem virá pelo meio? Quem, quem, quem? Trump, o ícone da malandragem Donald Trump é o primeiro ex-presidente norte-americano carimbado com o rótulo: incriminado, réu. E vejam quanta maluquice: ganhou uns pontinhos no índice positivo das pesquisas sobre os candidatos republicanos para a campanha de 2024. O republicano DeSantis, ex-aliado, hoje desponta como principal concorrente de Trump na disputa pela candidatura republicana para a eleição presidencial do ano que vem. Segundo pesquisa divulgada semana passada, o ex-presidente tem apoio de 54% dos eleitores republicanos para as primárias, contra 24% do rival que, apesar da retórica mais polida, é tão conservador quanto o antigo mandatário. Trump, na condição de indiciado, já arrecadou US$ 10 milhões. O líder e a multidão Sergei Tchakhotine, cientista social russo, em seu livro Mistificação das Massas pela Propaganda Política: "Entre os homens primitivos, o líder é, a princípio, um chefe religioso que a multidão acompanha cegamente. Mesmo os chefes militares se apóiam na autoridade do sacerdote. Os homens e não somente os povos primitivos procuram no chefe o herói, outorgado pelo destino, para livrá-los do mal. Assim, a multidão e o líder são duas noções complementares: não há multidão sem líder." Líderes e êxtase Os líderes se deixam acompanhar de um grupo coerente de seus acólitos mais fiéis, de fanáticos, previamente superexcitados, que formarão como que o núcleo em torno do qual as multidões que eles despertam virão naturalmente condensar-se. Esses grupos de exaltados propagam seu entusiasmo ou seu nervosismo. A embriaguez desses intoxicados psíquicos ganha os mais próximos e se estende como o incêndio na floresta. O Butão Pinço de um texto de Betina Ferraz, diretora do Deutsche Bank: ...O Butão, no sul da Ásia, país com menos de um milhão de habitantes, é o território com maior índice de Felicidade Interna Bruta... Não há um semáforo no país... 70% do território é coberto por florestas... É onde existe índice negativo de emissões de gás carbono negativas... Exemplo de ESG - gestão ambiental, social e governança... toda a política é pautada pela felicidade da Nação.
quarta-feira, 5 de abril de 2023

Porandubas nº 802

Na Semana Santa, uma historinha engraçada. Ô jardineira... Numa cidadezinha do norte do Rio de Janeiro, a procissão de Senhor Morto caminhava lenta e piedosa, na sexta-feira da paixão, com o povo cantando, de maneira compungida, os hinos sacros. O velho padre na frente, o sacristão ao lado e os fiéis atrás, cantando as músicas que o vigário puxava. De repente, um pequeno ônibus, antigamente chamado de "jardineira", passou perto e começou a subir a íngreme ladeira da igreja, bem em frente da procissão. No meio da ladeira, a "jardineira" afogou, encrencou, parou, deu aceleradas fortes e inúteis e começou a rodar para trás, de costas. Os fiéis não viram, mas o padre, atento, viu. E ficou apavorado. A "jardineira" já despencava em grande velocidade. O padre gritou: - Olha a jardineira! E os fiéis começaram a cantar, em ritmo de samba: - Ô jardineira, por que estás tão triste? Mas o que foi que te aconteceu? Foi a camélia que caiu do galho, deu dois suspiros e depois morreu. A "jardineira" descambou ladeira abaixo, até que parou. Não atropelou ninguém. Sob o olhar do Senhor Morto! Os fiéis não aguentavam de tanto rir. (Da coleção de Sebastião Nery) Panorama Abaixo do patamar A pesquisa do Datafolha, de certa forma, retrata o ânimo nacional nos 100 dias de governo Lula. Os resultados apontados pelo conjunto de perguntas mostram um patamar de aceitação, avaliação e credibilidade no governo abaixo das expectativas. São resultados aquém dos obtidos por mandatos anteriores de Lula. Mesmo assim, não são resultados decepcionantes. Há margem para melhor avaliação, quando os programas forem executados, aqueles que eram o eixo do Lula I e do Lula II. O grande mérito da atual gestão é ter colocado o país no vértice da governança, puxando os carros do trem para os trilhos. Mas o trem ainda está parado. Lula irritadiço O presidente Luiz Inácio, pelo jeito com que discursa, exibe acentuado grau de irritação. Deve estar insatisfeito com a performance de um ou outro ministro, cobra deles iniciativas e ações (o que vocês fizeram), apesar do tranco que deu no sentido de centralizar tudo o que os ministérios fazem, ou seja, quer ações, mas elas devem passar pela mesa de Rui Costa, da Casa Civil. Uma no cravo, outra na ferradura, Lula quer avanço, mas ele mesmo parece segurar os passos. E promete melhorias que os analistas não enxergam. Cometeu erros. A identidade Identidade é eixo, vértice, coluna vertebral de um administrador. Sem identidade, o governante tende a ser um dândi tateando na escuridão. Lula sempre construiu sua identidade na seara da proteção aos pobres e marginalizados. Hoje, outras forças exigem que sejam contempladas no caldeirão da identidade. As classes médias, por exemplo. Desassistidas e sem lideranças nacionais que as representem. O atual governo é um ente perdido. Ainda não firmou sua identidade. Será um exercício para um bom equilibrista compor uma identidade, o tronco que sustentará a árvore da administração. Corpo paquidérmico Entre os erros de Lula, até o momento, aponta-se a monumental estrutura ministerial, com quase 40 ministros. Deve haver imbricação de funções, atividades se misturando, desconforto pelo fato de que o corpo paquidérmico da administração acabou sugando recursos de algumas Pastas, que existem apenas para satisfazer ao apetite de siglas contempladas com a repartição política de cargos. Lula, nesse ponto, faz contraponto ao que tanto é objeto de desejo: uma reforma administrativa, que deveria enxugar a máquina, lubrificar suas engrenagens, e selecionar quadros pelo critério do mérito. A força oposicionista Diferentemente de outros tempos, quando o oposicionismo praticamente sumia após a vitória de um candidato, hoje sente-se um rebuliço nas mais variadas frentes da sociedade. Grupos de oposição abrem a garganta para gritar contra o governo; alas partidárias no Congresso se articulam, abrem a locução, questionam, atiram contra o lulopetismo; nos mais variados ambientes, o governo e seus líderes são objeto de ácidas declarações. Confesso que, em minha vida de analista político, em 100 dias de governo, nunca ouvi tantas críticas aos dirigentes. Aqui e alhures. Alhures Nos Estados Unidos, por exemplo, o oposicionismo extrapola a clássica rivalidade entre republicanos e democratas. Donald Trump, que enfrenta sérios problemas com a Justiça, a partir do caso com parceira sexual, que teria recebido 150 mil dólares para ficar calada, tem um numeroso número de simpatizantes e admiradores. Mesmo sob a ameaça de condenação, continua a receber vivas de apoio. Os escândalos já não têm o poder destrutivo de outrora. Tempos de banalização da criminalidade. Tempos das versões. Tempos das meias verdades. Os falsificadores encontram uma brecha para escapar da lama que neles se joga. Por aqui... Por nossas plagas, o escândalo das joias das Arábias está amortecido pelo efeito banalizador. Deu o que tinha de dar. Bolsonaro entregou o rolex cheio de diamantes. O terceiro pacote voltou ao patrimônio público. E a mídia conta que ele recebeu mais de 90 presentes guardados em seus armários. Pois bem, o homem das motociatas continua recebendo aplausos e ganhando selfies. E de muitos lados, ouvem-se seguidores que o consideram "o líder da salvação nacional". Ainda há mentes entorpecidas que enxergam nas esquinas e corredores os fantasmas do comunismo, com suas foices e martelos ameaçando fechar as portas do nosso futuro. Pai... Pai, perdoai aqueles que não sabem o que fazem... E a outros que não sabem o que dizem... Prates e a queimação Jean Paul Prates, ex-senador pelo RN, é um estudioso das melhores bibliotecas dos combustíveis. Um técnico de alto calibre. Conhece o mundo do petróleo como ninguém. Foi escolhido por Lula para dirigir a Petrobras. E já começa a ser alvo de queimação por áreas do próprio PT, que usam o nome do presidente em suas diatribes. Prates não se livrará tão cedo da maldade e dos bolsões de inveja que cercam sua gestão. Uma grande democracia Maurice Duverger, o renomado estudioso francês dos sistemas políticos: "o Brasil só será uma grande potência no dia em que for uma grande democracia. E só será uma grande democracia no dia em que tiver partidos e um sistema partidário forte e estruturado". Fenômenos da política Ligeiro pano de fundo que estampa a política. Dois fenômenos. 1. Ascensão da micropolítica - Comunidades passam a se inspirar pela moeda sonante do pragmatismo, ou seja, a satisfação de demandas imediatas e reprimidas. A macropolítica é substituída pela micropolítica, a política das pequenas coisas, das necessidades próximas aos conjuntos sociais: a iluminação do bairro, a escola próxima de casa, o alimento barato, o transporte rápido e acessível a todos. 2. Organicidade social - Em todas as esferas sociais e em todos os quadrantes, formam-se grupos em torno de entidades que passam a intermediar interesses e a fazer pressão. As organizações não governamentais constituem reflexos da onda organizativa da sociedade. As entidades intermediárias, até para dar respostas ao não atendimento das demandas de natureza política, começam, elas próprias, a mobilizar a sociedade, atuando junto aos Poderes, fazendo articulação para escolha de representantes e formando bancadas corporativas.
quarta-feira, 29 de março de 2023

Porandubas nº 801

Abro a coluna com uma historinha das Minas Gerais. Lei da Gravidade A Lei da Gravidade, de vez em quando, dá dor de cabeça aos mineiros. Na Câmara Municipal de Caeté, terra da família Pinheiro, de onde saíram dois governadores, discutia-se o abastecimento de água para a cidade. O engenheiro enviado pelo governador Israel Pinheiro deu as explicações técnicas aos vereadores, buscando justificar a dificuldade da captação: a água está lá em baixo e a cidade, lá em cima. Seria necessário um bombeamento que custaria milhões. - Sinceramente, acho o problema de difícil solução a curto prazo, conforme os senhores desejam. - Mas, doutor - pergunta o líder do prefeito - qual é o problema mesmo? - O problema mesmo - responde o engenheiro - está ligado à Lei da Gravidade. - Isso não é problema - diz o líder - nós vamos ao doutor Israel e ele, com uma penada só, revoga essa danada de lei que, no mínimo, deve ter sido votada pela oposição, visando perseguir o PSD. O líder da oposição, em aparte, contesta o líder do prefeito e informa à edilidade, em tom de deboche: - Ah, ah, ah, o governador Israel nada pode fazer, visto ser a Lei da Gravidade de âmbito Federal. O presidente deu por encerrada a sessão. (A historinha é de José Flávio Abelha, em seu livro A Mineirice). Panorama Adeus, março Estamos fechando os dias de março. E o governo vê quase completado seu ciclo de 100 dias. O que se pode dizer do Lula 3 até o momento? Tentemos, de forma breve, mostrar alguns sinais: 1. O governo parece sem rumo; 2. A base política da administração se apresenta esgarçada, desgastada; 3. O imponderável nos visita com certa regularidade; 4. O ambiente social está escurecido, tomado por denso nevoeiro; 5. Há uma ala mais tranquila e outra mais agitada na estrutura ministerial; 6. O bolsonarismo começa a se levantar depois do coice eleitoral que sofreu; 7. Os presidentes do Senado e da Câmara, em escaramuças, tendem a chegar a um acordo de convivência; 8. Os desastres naturais nesse início de ano mostram a fragilidade da infraestrutura de emergência; 9. A direita se organiza e vai mostrar a cara; 10. Lula, o veemente, sai da sombra de Lula, o apaziguador e 11. Os horizontes de 2024 apontam para acirramento das narrativas. Sem rumo O andar de caranguejo entra na imagem governamental. Para os lados, para a frente e para trás. Espera-se a âncora fiscal, sob o mando e comando do ministro Fernando Haddad, da Fazenda. Uma ala do PT quer uma teia mais flexível, menos engessada. O governo anuncia a volta de uma série de programas, do tipo Minha Casa, Minha Vida, Bolsa Família, e, ufa, o desastroso PAC, Programa de Aceleração do Crescimento, um fracasso no governo Dilma. Lula cobra novidades de seus ministros, mas centraliza todas as decisões. Até agora, nada importante pode ser mostrado. A não ser uma chama iluminando as relações internacionais. Base esgarçada Imaginava-se a formação de uma base política sólida, homogênea, capaz de funcionar como invencível fortaleza de defesa da administração. O que se vê é insatisfação de grupos, alas e partidos com a distribuição de recursos e espaços na máquina. Os parlamentares, à boca pequena, se queixam do ministro Rui Costa, da Casa Civil, e do ministro Alexandre Padilha, das Relações Institucionais, por não darem tratamento satisfatório a seus pleitos. E abrem buracos no queijo da administração Federal. O Imponderável De repente, uma infecção bacteriana muda a agenda tão esperada na China. A viagem de Lula e o grande encontro com Xi Jinping é adiado. Reversão de expectativas. Quase 300 empresários haviam se disposto a fazer parte da comitiva. Muitos já estão naquele país. Os acordos comerciais deverão aguardar por uma ida mais saudável de Lula à potência asiática. Em Londres, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, sentiu fortes dores, com pedras nos rins. Quem já padeceu desse sofrimento, sabe o tamanho da aflição. Aqui e ali, o Imponderável nos visita, trazendo catástrofes e pontos fora da curva. O ambiente social Impressão: os tempos voltaram à normalidade. As ruas estão lotadas de carros. O trânsito é infernal. O buzinaço dispara. Mas os dias parecem mais tristes. As pessoas exibem um ar de cansaço, estresse. O esfaqueamento e assassinato se espalham. Pesquisas de entidades científicas da Irlanda e do Reino Unido revelam o estado de tristeza e estresse das pessoas nesses tempos de guerra entre países e ameaça de recessão na economia. Aqui no Brasil, a descrença volta a subir, a credibilidade nos governos cai. O espírito do tempo nos afoga no mar das desilusões. Um denso nevoeiro paira sobre as expectativas do amanhã. Divisão na gestão Há uma ala do governo que se mostra menos tensa e mais equilibrada. Outra parece mais um exército fazendo tiro ao alvo. A primeira é a do estilo Geraldo Alckmin, o vice-presidente, com sua índole calma e senso de oportunidade. A outra é comandada por Flávio Dino, ministro da Justiça, que está na vanguarda de defesa do governo. A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, agita os exércitos de vanguarda. A gestão não é harmônica. Ressurreição bolsonarista O bolsonarismo começa a acordar da letargia que tomou seu corpo desde as eleições de outubro passado. O chefe do grupo anuncia volta para esta quinta-feira das férias prolongadas na Flórida, EUA. Vem com salário polpudo a ser pago pelo PL, escritório bem montado, cargo honorífico, casa alugada etc. Os bolsonaristas prometem arrulhos e barulhos. E a agitar o país, preparando as populações para o embate municipal de 2024. A construção do edifício político começa com a fixação da base, a eleição de prefeitos e vereadores. Lira e Pacheco As recentes rusgas entre os presidentes da Câmara Federal e Senado, Arthur Lira e Rodrigo Pacheco, serão administradas com um acordo de convivência. Voltarão as comissões mistas, as votações de medidas provisórias e o clima será distendido. Ambos terão como bússola o índice de popularidade de Lula. Agirão sob a batuta do pragmatismo. Desastres naturais O início deste ano abriu uma quantidade maior de desastres naturais. Inundações, devastação, mortes e miséria. A natureza cobra seu preço. As chuvas continuarão a causar devastações em algumas regiões. O que serve para escancarar o despreparo das estruturas governamentais. Soluções e ações são improvisadas. Não há um Plano Estratégico de Enfrentamento de Eventos Naturais. É o Brasil da improvisação. Direita e esquerda contundentes Os movimentos de direita, aqui e alhures, se avolumam. A direita deixou de ter vergonha. Assume seu ideário e levanta suas bandeiras. Acaba de se reunir, em Buenos Aires, um grupo de direita da América Latina. O senador Sergio Moro se fez presente. A esquerda também se enfurece. Na Nicarágua, a oposição é alvo do ditador Daniel Ortega, amigo (ou ex?) de Luiz Inácio. A Venezuela aguarda o diapasão brasileiro. Lula, o briguento Vemos um Lula briguento, tenso, palanqueiro e atirador com sacola de balas na cintura. O Lulinha Paz e Amor morreu. O mandatário parece tenso, cansado, revoltado, vingativo. A prisão em Curitiba parece não lhe sair da mente. Quer porque quer "foder" Sergio Moro, ex-juiz e atual senador pelo Paraná, que ganha manchetes no empuxo a ele dado por Lula. Moro estava meio esquecido. E Lula, com seu tiroteio, ressuscita o político inerte. A política como ela é... A lei do revólver Depois dessa rápida leitura, a inevitável conclusão: a polarização política tende a impregnar grupos e partidos. Melhor dizendo: a polarização tende a ser mais volumosa. O mundo se reparte. O ódio se espraia. Os embates se multiplicam. Samuel P. Huntington descreve: "Quebra da lei e da ordem, Estados fracassados e anarquia crescente, onda global de criminalidade, máfias transnacionais e cartéis de drogas, declínio na confiança e na solidariedade social, violência étnica, religiosa e civilizacional e a lei do revólver". Fecho a coluna com as perspectivas de Luis Pereira. Perspectivas Quais as perspectivas que se apresentam ao Brasil em um contexto de crise? Confesso que não sei responder. Mas uma historinha contada pelo amigo Sebastião Nery pode ajudar a responder. Luís Pereira, pintor de parede, dormiu com 200 votos e acordou como deputado Federal. Era suplente de Francisco Julião, líder das Ligas Camponesas, em Pernambuco, cassado pela ditadura. Chegou a Brasília de roupa nova e coração vibrando de alegria. Murilo Melo Filho, da revista Manchete, melou o jogo, logo no aeroporto, com a pergunta abrupta: - Deputado, como vai a situação? Confuso, nervoso, surpreso, sem saber o que dizer, jogou os termos que julgava mais apropriados para a fala de um deputado: - As perspectivas são piores do que as características. A esta altura, tem muito Luís Pereira perorando por aí...
quarta-feira, 22 de março de 2023

Porandubas nº 800

Fura ele, Jesus! Deu-se na encenação da Paixão de Cristo numa cidadezinha da Paraíba. O dono do circo, em passagem pela cidade, resolveu encenar a Paixão de Cristo. Elenco escolhido dentre os moradores e no papel de Cristo, foi escolhido o cara mais gato da cidade. Ensaios de vento em popa. Às vésperas do evento, o dono do circo soube que 'Jesus' estava de caso com sua mulher. Furioso, deu-se conta que não podia fazer escândalo sob pena de perder o investimento. Bolou uma maneira. Comunicou ao elenco que iria participar fazendo o papel do 'centurião'. - Como? - reclamaram - Você não ensaiou! - Não é preciso ensaiar, porque centurião não fala! O elenco teve que aceitar. Dono é dono. Chegou o grande dia. Cidade em peso compareceu. No momento mais solene, a plateia chorosa em profundo silêncio. Jesus carregando a cruz ... e o 'centurião' começa a dar-lhe chicotadas. - Oxente, cabra, tá machucando! Reclamou Jesus, em voz baixa. - É pra dar mais veracidade à cena, devolveu o centurião. E tome mais chicotada. Chicote comendo solto no lombo do infeliz. Até que Jesus enfureceu-se, largou a cruz no chão, puxou uma peixeira e partiu pra cima do centurião: - Vem, desgraçado! Vem cá que eu vou te ensinar a não bater num cara sem defesa! O centurião correndo, Jesus com a peixeira correndo atrás, e a plateia em delírio gritando: - É isso aí! Fura ele, Jesus! Fura, aqui é a Paraíba, não é Jerusalém, não! Panorama Felicidade se estreita O que é a felicidade? Cada terráqueo tem a sua definição. Seria uma composição de muitas coisas: bens materiais, paz de espírito, convivência harmoniosa com os outros, realizações pessoais e feitos que aumentam a autoestima, segurança, cumprimento de metas e objetivos e mais... e mais... e mais...! As pesquisas chegam a mensurar tudo isso? Há dúvidas. Medir coisas concretas, vá lá, medir coisas abstratas, ah, essa é tarefa inviável. De qualquer modo, vamos aos índices mostrados por pesquisas. O Brasil despenca no ranking da felicidade. Ocupa um longínquo lugar - 49º, tinha o 38º lugar no ano passado - no ranking de felicidade da World Happiness Report, iniciativa da ONU. O 1º. lugar no mundo é da Finlândia. O Afeganistão está no 137º lugar. E tem mais inferno adiante. Já o norte da Europa ganha as palmas de territórios abençoados. Dá para se perceber? Sim. Com a infelicidade, o clima ambiental se fecha. Torna-se mais contraído. Ruas mais tristes. Mais pedintes, mais habitantes sem teto, mais violência, mais imprecações, a sensação de que o paraíso está acenando um adeus, o inferno de nossas vidas aperta o cerco. Desconfiança, promessas não cumpridas, odor de sangue e morte. Aqui e ali. Na França, por exemplo, o fogaréu toma as ruas. A reforma da Previdência, de Macron, é frustrante. Pelo bem, diz ele, das contas públicas. Aliás... Custo, gasto e investimento O tema cai bem nessa quadra política. O presidente Luiz Inácio "ensina": os livros de economia estão errados. Ou precisam aperfeiçoar seus focos. Não dá mais governar, segundo os padrões tradicionais. Porque a tal política de contenção de gastos, o tal teto de gasto, segundo Lula, praticamente inviabiliza a administração. Não há margem, ainda segundo ele, para assegurar crédito aos pobres e desvalidos. Tudo é gasto. Deveria haver ponderação sobre o que é custo, gasto e investimento. Na área social, as políticas devem ser entendidas como investimento e não como gasto. Economistas de peso avisam: muita calma com o andor. É possível conciliar teto de gastos com políticas de crédito e de investimentos. Juros, inflação, crescimento do PIB, tudo isso deve ser colocado no caldeirão. O fato é que... Se não houver crescimento, o país descambará na direção do beleléu. E se isso ocorrer, nada feito para os governantes, que preferem ver o país cedendo em políticas sociais do que refluindo no compasso do gasto. O sucesso do comandante Lula da Silva dependerá do êxito econômico. Se der certo, poderá, mais adiante, se reeleger. Ou eleger quem quiser. Até um poste? Ih, nesse caso, será complexa a equação. O país tem um cordão umbilical com o passado. E tem medo de novas tragédias. Cautela e caldo de galinha...! Bom, o fato é que nossas plagas estão vacinadas (ou não?) contra as pragas da política. São Jorge São Jorge lutando contra o dragão da maldade - inflação, juros altos, alimento caro, hospital sem equipamentos, miséria galopante. Há anos o sistema cognitivo nacional associava Lula à imagem de São Jorge. Hoje, não. A imagem do maior exemplo da dinâmica social no Brasil mais parece um cavaleiro da Távola Redonda, na borda de uma imensa mesa oval, onde estão também o rei Arthur, o príncipe Rodrigo, o guerreiro Elmar, o comandante Bivar et caterva... e onde há, ainda, uma cadeira destinada a... Valdemar, o equilibrista. PT x PT Quem ganhará a luta no cabo de guerra? O PT que é favorável à responsabilidade fiscal ou o PT que aposta na gastança para preservar a farra eleitoral? Lula será o juiz. Na visão deste analista, a alma populista de Lula tem mais força para vencer o cabo de guerra. João Doria Dia 27, segunda, a partir das 18h30, na livraria da Travessa, no Shopping Iguatemi, será lançado o livro "João Doria, o poder da Transformação", de autoria do jornalista e escritor Thales Guaracy. Prefácio de Fernando Henrique e pela Matrix Editora. Será um evento e tanto. O ex-prefeito e ex-governador de São Paulo deve levar uma coleção de canetas para atender aos autógrafos de uma fila quilométrica. O mundo social e a esfera política estarão lá, sem dúvida. João tem enorme poder de mobilização. A coluna Porandubas estará presente. Juros cedendo A previsão é quase consensual. A taxa Selic recua do patamar de 13,75 ao ano. Devagarinho, sim. Beleza na política Que a madame Bolsonaro quer investir em sua beleza, não há dúvida. A mídia estampa sua cara ao lado de um influencer e fabricante de cosméticos. E apresenta uma linha By Michelle. Levará ela sua fisionomia charmosa para a política? É o que parece. Assume o comando do PL Mulher. Reforço à amizade Xi Jinping e Vladimir Putin, os todo-poderosos da China e da Rússia, deram um passo avançado no caminho da Guerra Fria. Xi foi visitar Putin em Moscou e ambos reafirmaram sua aliança histórica. A visita ocorre três dias após a Corte Internacional de Haia ter emitido mandado de prisão contra o maioral da Rússia por ter cometido crimes contra a Humanidade. P.S. Segunda-feira, um caça russo "vigiou" o voo de um supersônico norte-americano nas proximidades da fronteira da Rússia. O ato foi considerado uma ofensa. Os ânimos se exaltam. Israel x palestinos Os ânimos também se exaltam no Oriente Médio. O ministro das Finanças de Israel, em um evento na França, disse, alto e bom som, que não existe cultura palestina. Que não existe povo palestino. Confrontos à vista. Ucrânia Sem previsão, a paz entre Rússia e Ucrânia. Putin jamais assinará acordo de paz tendo de devolver territórios anexados à Rússia. Zelenski, o ucraniano, também não admite acordo tendo de referendar os espaços ocupados pelo invasor. Um jogo de perde-ganha. Parlamentarismo às avessas I Por aqui, o chefe do Executivo conta com duas armas para aprovar sua agenda legislativa: projeto de lei ordinária (PLO) e MP, Medida Provisória. Politicamente fraco, costuma valer-se desta última; quando possui ampla maioria, a arma é o PLO. E o Legislativo torna-se refém do Poder Executivo, que detém as prerrogativas de propor medidas e leis, "controlar" (?) a execução do orçamento e vetar projetos. Torna-se legislador, transforma-se em artífice de um parlamentarismo às avessas. Essa modalidade de parlamentarismo invertido, a propósito, foi aplicada, por aqui, em 1847, quando Pedro II, inspirando-se no modelo inglês, adaptou à sua conveniência. Parlamentarismo às avessas II No parlamentarismo, o primeiro-ministro, normalmente indicado pelo partido majoritário, comanda o gabinete e passa a exercer o governo. O imperador, ao contrário, fazia-se de Poder Moderador, escolhendo o presidente do Conselho de Ministros, e este indicava os membros do Ministério. Na discordância, demitia o Ministério e dissolvia a Câmara. Hoje, temos uma versão caricata do passado. O Executivo aplica o cipoal legislativo que constrói ou encomenda, em contraste com o presidencialismo de democracias consolidadas, como a norte-americana, onde o presidente não pode propor leis e nem controla a elaboração e a execução do orçamento. Fecho a coluna nas ruas de Madrid. Amor próprio Um maltrapilho dos arredores de Madrid pedia esmolas com grande dignidade. Um transeunte lhe disse: "Não tem vergonha de exercer essa infame atividade quando pode trabalhar?" "Senhor, respondeu o mendigo, peço-lhe esmola e não conselhos". Tendo dito isto, deu-lhe as costas, com toda a empáfia castelhana. Era um mendigo orgulhoso esse; pouca coisa bastava para ferir-lhe a vaidade. Por amor de si mesmo pedia esmola; e ainda por amor de si mesmo não permitia que alguém lhe fizesse qualquer reprimenda. (Voltaire)
quarta-feira, 15 de março de 2023

Porandubas nº 799

Abro com uma historinha de Pernambuco. O defeito do cavalo Em Caruaru/PE, o coronel João Guilherme, senador estadual e chefe político, comprou a um matuto um cavalo de sela. Cavalo bonito, mas com a pálpebra caída. Cego de uma das vistas. Ao descobrir o logro, o coronel ficou indignado. Fez vir à sua presença o espertalhão. Ameaçou-o de cadeia. - Você teve a coragem de me vender um cavalo cego dum olho! Isso é uma falta de seriedade! Você fez negócio com um homem e não com um tratante da sua laia! Por que você não teve a franqueza de me dizer que o cavalo tinha esse defeito? - Mas, seu coronéu, vamincê me desculpe, mas vou lhe dizer: o cavalo que eu lhe vendi não tem defeito, não! - Não tem defeito? Não tem defeito? Então, você acha que um cavalo cego dum olho não tem defeito? - Seu coronéu, vamincê me desculpe, mas eu acho que não tem não! Ser cego não é defeito: ser cego é uma infelicidade... (Historinha de Leonardo Mota em Sertão Alegre) Panorama Lula andante O presidente Luiz Inácio começa a correr o país. O que faz bem. A ele e aos Estados a serem visitados. Acaba de ir novamente à Roraima, o Estado com a menor população do país, onde garantiu a legitimação das terras indígenas. É saudável um administrador que veja in loco as demandas das populações e das regiões. Governando dessa maneira, o mandatário finca estacas profundas no território, garantindo apoio das massas. E assim também começa a campanha eleitoral de 2026. Bolsonaro ficante Jair Bolsonaro não tem data marcada para voltar ao país. Ao que se sabe, estaria na terrinha por esses dias de março, mas o episódio das joias mudou sua agenda. Teme voltar no calor das repercussões negativas que os estojos dos presentes (?) causaram à sua já desgastada imagem. Dona Michelle vai se encontrar com o marido, se já não foi. O casal, na Flórida, discutiria o melhor momento para o ex-presidente voltar e os próximos passos a serem dados pela mulher como chefe do PL Mulher, cargo a assumir daqui a uns dias. Câmara pedinte O recado dado, há dias, pelo presidente da Câmara, Arthur Lira, ao presidente Lula, ao dizer que este ainda não tem "base consistente" para aprovar matérias polêmicas, de interesse do governo, já deu resultados. Os parlamentares contarão com recursos mais polpudos - um montante de 40 bilhões - no Orçamento para direcionar a seus projetos. Lira tem a maior força política já conquistada por um dirigente da Câmara Federal no início de uma nova Legislatura. Incorpora, assim, o perfil de um primeiro-ministro. As joias chocantes As joias das arábias continuam a chocar as mentes racionais. Por que o ex-presidente, Jair Messias, não ordenou, logo no início da querela, entregar todos os estojos ao TCU? Protela a confusão e queima seus últimos estoques de credibilidade. A fogueira está alta. O incêndio deixa ver um monte de cinzas sobre o clã Bolsonaro. Dona Michelle é menos chamuscada. Zaratustra Se quereis atingir as alturas, usai as próprias pernas. Não vos deixeis levar para cima, não vos senteis nas costas e cabeças alheias. Aprendei, portanto, vós mesmos, ó homens superiores, a apoiar-vos firmemente nas vossas pernas. (Nietzsche) A política como ela é - I "Queria destacar a intransigente defesa democrática do país, da Constituição e dos valores. É uma defesa bem apresentada pelo governo Lula, principalmente expressada por seu ministro da Justiça, Flávio Dino, também pelo ministro José Múcio (Defesa) e outros ministros, e pelo próprio presidente da República." São palavras pronunciadas, segunda-feira, pelo ex-governador de São Paulo, João Doria, ao receber, em evento, o governador do Estado, Tarcísio de Freitas. Lembrando: João Doria fez oposição contundente aos governos do PT nos últimos anos. A política como ela é - II Já Tarcísio homenageou o ministro da Defesa, José Mucio Monteiro, por suas ações no Litoral Norte de São Paulo, por ocasião da enchente que devastou região de São Sebastião. A política como ela é - III O ex-presidente Jair Bolsonaro descartou a possibilidade de que o general Walter Braga Netto, seu ex-ministro e ex-candidato a vice, concorra à prefeitura do Rio em 2024. A candidatura de Braga Netto vinha sendo cogitada por setores do PL ligados à direção nacional e à bancada bolsonarista do partido. Braga Netto não deve ter gostado da queimação. A política como ela é - IV Jânio Quadros era perito na arte de se fazer surpreso. Perguntado por Leon Eliachar, o humorista, qual era seu slogan: 50 anos em 5 ou 5 anos em 60? Jânio responde: "50 anos em 5, mais o pagamento dos atrasados". O truque de mudar as palavras é comum. Ao político se pergunta: "o senhor vai dizer tudo o que sabe aos procuradores?" Resposta do político: "quem diz a verdade, tem tudo a seu favor. Quem não deve, não teme". O truque de deturpar as palavras é usual. "O sr. acredita que o relatório do Banco Central vai absolvê-lo?" Resposta: "O relatório pode ser uma peça de condenação ou de inocência. Quem me condena é a imprensa, não o banco". A política como ela é - V O truque da auto-justificação é artimanha para encobrir a verdade. "O senhor favoreceu fulano de tal, que tem folha corrida de corrupção"? E o político responde: "sou uma pessoa que acredita nos outros; sempre procurei ajudar. Se alguém utilizou de minha boa fé, não foi com minha aprovação". Simular idiotice ou demência não é comum, mas fingir-se de doente, isso, sim. No capítulo da santificação, a regra é comum: os políticos não costumam reconhecer os pecados. São todos inocentes ou vítimas. Não são orgulhosos, invejosos, vaidosos ou arrogantes. São franciscanos, beneditinos, lazaristas, cristãos. É assim a santa política. A política como ela é - VI - Mazarino Um dos precursores do marketing político foi o cardeal Mazarino, que recebeu o cardinalato sem nunca ter sido ordenado, mas em função dos dotes diplomáticos e dos bons serviços prestados a Luis XIII, como ajudante do cardeal Richelieu, tendo a este substituído. Pouco antes de morrer, Mazarino escreveu um Breviário dos Políticos, com pérolas como estas: "age com os teus amigos como se devessem tornar inimigos; o centro vale mais do que os extremos; mantenha sempre alguma desconfiança em relação a cada pessoa; a opinião que fazem de ti não é a melhor do que a opinião que fazem dos outros; simula, dissimula, não confies em ninguém e fala bem de todo mundo. E cuidado. Pode ser que neste exato momento, haja alguém por perto te observando ou te escutando, alguém que não podes ver". Eis a política como ela é. Constituinte exclusiva A ideia faz parte do eterno retorno. A ampulheta do virar e revirar-se, na simbologia de Nietzsche, nos visita com o retorno do tema pela cabeça do senador Humberto Costa (PT-PE). O argumento: uma Constituinte exclusiva impulsionaria a reforma política. Pano de fundo: necessidade de o governante fazer maioria nas casas parlamentares, sem o balcão de trocas. O assunto, na visão deste escriba, não passa na garganta social. O xarope é amargo. Muito amargo. Mandatos no STF Volta também a ideia de se estabelecer prazo para exercício dos ministros no STF. Pela vontade de se libertar da espada do Judiciário, que paira sobre sua cabeça, a esfera parlamentar se inclina favorável à tese. 8 anos, 10 anos, 12 anos? Os lobbies começam a se movimentar. Disputa com viés político. Quem mandou matar Marielle Franco? A pergunta se aproxima de uma resposta mais certeira. Liberdade x censura É tênue, muito tênue, a linha que separa a liberdade de expressão e a censura. As redes sociais precisam de alguma ferramenta que as controle? Pode se dizer tudo o que se quer e o que se pensa? Ou deve haver limites. Informar, interpretar, emitir juízo de valor com responsabilidade ou desobrigar uma fonte a respeitar os limites éticos? Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes defendem limites. O presidente da Câmara, Arthur Lira, é favorável às porteiras escancaradas. Eis uma boa mesa de debates. Gêneros Neste mês de março, dedicado às mulheres, urge reconhecer: o gênero feminino avança em sua luta pela igualdade. De posições com os homens, de cargos, de competência, de salários. Viva! Viva! Viva! A negritude Graças à sua luta, ao seu fervor, à sua resiliência, a negritude também dá passos avançados. A população negra do Brasil alarga seus espaços na cena social e na paisagem institucional. Viva! Viva! Viva! Imagens que ficam Há imagens que se perpetuam na consciência coletiva. E, não raro, resvalando pelo inconsciente. Querem uma? Um cidadão desfilando no Rolls-Royce da presidência, pela praça dos Três Poderes, sentado no banco traseiro do automóvel, enquanto o pai, em pé na parte dianteira, acenava para os participantes do evento de posse como presidente do Brasil. Dia 1 de janeiro de 2019. O cidadão: Carlos Bolsonaro. Estrategista das redes sociais do candidato Jair. Tinha um revólver na cintura. Pronto para apertar o gatilho. Cena extemporânea, hein? Pano de fundo: lembranças da facada em Juiz de Fora. Cena triste Polícia Federal cumprindo mandados de busca e apreensão contra um desembargador do TRF-1 e seu filho, suspeitos de corrupção ativa e passiva. Ontem, terça-feira. Fecho com hilárias passagens. O Código Penal Aluno de Direito ao fazer prova oral: - O que é uma fraude? - É o que o senhor, professor, está fazendo, responde o aluno. O professor fica indignado: - Ora essa, explique-se. Então diz o aluno: - Segundo o Código Penal, 'comete fraude todo aquele que se aproveita da ignorância do outro para o prejudicar'. Reservista Numa vara da Fazenda, no interior de São Paulo, o perito era coronel do Exército e o juiz, Plínio Gomes Barbosa, não sabia. Houve discussão, o coronel começou a gritar, o juiz bateu a mão na mesa e deixou o coronel sozinho. - Se o senhor continuar nesse tom, ponho-o daqui para fora. - Não saio, não. Sou coronel do Exército. - Então quem se retira sou eu, que sou reservista da 3ª categoria.
quarta-feira, 8 de março de 2023

Porandubas nº 798

Amigos me perguntam: e cadê "seu Lunga"? Pois é, vez ou outra tenho de ressuscitar o nosso "diplomata". Vamos abrir a coluna com o cearense. Os chatos O cearense seu Lunga virou uma metralhadora contra os chatos. Um deles questionou o autor sobre os casos narrados. Uma das passagens fala em sonâmbulo. Argumenta que seu Lunga não usaria tal expressão. Pode ser. Os chatos sempre nivelam por baixo. Se fosse dele, questiona o chato, a palavra seria algo parecido com "sonambo". Pois esse chato chegou na casa do Lunga, em Juazeiro do Norte, e se anunciou: - Ô de casa, tem gente? - Não. Só tem percevejo e chato - gritou lá de dentro nosso querido personagem. O chato não se afobou e, ao ver três imensos potes d'água, continuou: - Tem água de beber? - Não, só tem água de comer. O chato calou-se. Tomando banho Seu Lunga estava tomando uma sopa num bar de Juazeiro. Um sujeito entra no estabelecimento e pergunta: - Tomando sopa, Seu Lunga? E Seu Lunga: - Não! Tô tomando banho! Panorama Real politik Quando se pensava que o presidente da Câmara Federal, Arthur Lira, estava plenamente alinhado ao governo Lula, eis que ele aparece dando o mais duro recado ao lulopetismo: o governo não construiu uma base consistente de votos no Parlamento. Nem na Câmara nem no Senado. Não tem cacife para aprovar reformas nesse momento. Deu o recado num evento importante no palanque paulista, o mais poderoso do mercado. Lula foi surpreendido com a real politik dando as caras. O PT deve estar tonto. Juscelino fica Por não ter votos suficientes para aprovar a agenda que deseja no Congresso, Lula acabou deixando Juscelino Filho, ministro das Comunicações, no posto. Ora, as provas de que o ministro driblou o campo ético estão escancaradas, mas sua tese de "acusações infundadas" acabou satisfazendo ao presidente, com quem conversou segunda à tarde. Juscelino, um cowboy que coleciona cavalos de raça, não tem tanto apoio no União Brasil, que abriga 55 deputados. Mas sua demissão poderia ser usada como motivo para o partido romper os laços já esgarçados que ainda o prendem ao governo. O União Brasil tem três ministérios, mas quer mais, bem mais. Conter a borrasca O fato é que a administração Federal começa a enfrentar a primeira pororoca parlamentar. Formada por ondas de insatisfação em um Parlamento de índole liberal e conservadora, em sua maioria, que vai exigir largos espaços no governo para ceder votos aos projetos situacionistas. A ampla frente de articulação que o governo criou para aplainar as arestas, a partir do ministério da articulação dirigido pelo ministro Padilha, não será suficiente para diminuir as pressões. Um governo que enfrenta resistências logo em seu início, não completados nem 100 dias, sinaliza enormes dificuldades pela frente. Honestidade O saudoso Ulysses Guimarães já dizia: "uma pessoa 99% honesta é 100% desonesta, porque não existe honestidade relativa". Ou se é honesto ou não. É como gravidez. Economia, o alvo A economia começa a se apresentar como a fonte dos problemas. A primeira vitória do ministro Fernando Haddad, no affaire sobre combustíveis, não é sinal que continuará ganhando as batalhas da guerra em seu território, que deverão recrudescer nos próximos tempos. Haddad é visto como o candidato in pectore de Lula para sucedê-lo em 2026. Mas até por isso, terá de arregimentar sua tropa para enfrentar exércitos de outras alas do PT, mais radicais, que querem voltar a inserir o partido no alto patamar da hegemonia. O PT acha que será agora ou nunca sua chance de fincar as estacas de um modelo socializante. Vitórias na economia garantiriam vida longa ao ministro Haddad. A recíproca é verdadeira. Inconformada Quem parece inconformada é a presidente do PT, Gleisi Hoffmann. Não entrou para o Ministério, mas tem sido contemplada por Lula, que lhe confere força e expressão. Sua voz é ouvida. Se perdeu, por enquanto, na questão dos combustíveis, adquire cacife para continuar sendo a comandante do exército petista nesse ciclo de poder hegemônico. Há um mundão de cargos que estão sendo preenchidos. Gleisi está atenta. O governo procura atender às demandas do PT, mas abre fissuras nas bases de apoio, que lutam para ganhar espaços nos buracos do segundo e terceiro escalões. Empoderamento feminino As mulheres abrem muitas frentes de empoderamento. Analista político, nunca vi tanta defesa do empoderamento feminino como nesses dias em que mulheres do campo político, da academia e lideranças de organizações sociais ganham espaços na mídia para defender acesso amplo de mulheres aos Poderes, em defesa de igualdade salarial e de mando. Viva! Viva! Viva! P.S. O Brasil precisa de uma jurista negra no Supremo Tribunal Federal. Rapinoe Quem se destaca nesse campo é Megan Rapinoe, estrela da seleção de futebol dos EUA, que levou o debate para o Congresso americano. Fez um discurso exigindo igualdade salarial entre mulheres e homens. Há dois anos, Megan e as outras jogadoras da seleção processaram a federação de futebol dos EUA por discriminação de gênero. "Nós lotamos estádios, quebramos recordes de audiência e vendemos camisetas, todas as métricas populares pelas quais somos julgadas", disse ela. A seleção feminina receberá 24 milhões de dólares para serem distribuídos entre as jogadoras, a par da promessa da US Soccer de lutar pela igualdade salarial. O papel da mídia A moldura social e política seria diferente não fosse a mídia. Os meios de comunicação, com o vigor e a tempestividade das redes sociais, apesar de algum exagero nas denúncias, têm cumprido um papel extraordinário para os avanços sociais e institucionais. Atentos, acompanham os fatos, de maneira tempestiva, formando a grande cadeia nacional de pensamento. Como principal tuba de ressonância dos fatos, a mídia é responsável por investigação sobre corrupção (veja o caso das joias ofertadas pela ditadura da Arábia Saudita), a vida pregressa de políticos e a intersecção de interesses privados com a área pública. Se exagera, acerta muito, e, por isso mesmo, faz mais bem que mal. Vamos ver como ficará o caso das "joias da Coroa'. Hora do bolso O governo vem aí com um programa chamado "Desenrola". São 37 milhões de inadimplentes, que serão convidados a equacionar seus débitos, somando, hoje, cerca de 50 bilhões de reais. Leiam bem. 37 milhões que têm dívidas junto ao governo. Porque a inadimplência no país é maior, atingindo mais de 70 milhões de pessoas. Dúvida angustiante: bancos, lojas de varejo e outros credores darão bons descontos? Ora, mexer em bolso vazio é como dar murro em ponta de faca. Quem vai querer fazer isso? Que constatação triste... São Paulo tem mais policiais para vigiar presos do que para apurar crime.... Polícia Civil perdeu em 20 anos quase 1/3 do efetivo. Neymar se afasta Neymar, diz-se, tem levado uma vida desregrada. E ganha mais uma lesão, perdendo, assim, condições de atleta para competir. Passará por uma cirurgia no tornozelo. Quatro meses fora do campo. Afasta-se de mais uma temporada europeia. Um jogador em rota de adeus. Ou no caminho do desprestígio. Não tem sabido administrar a fama. Não se inspira no exemplo do amigo Messi, jogador equilibrado. Pestes... A hora continua a exigir cuidados. A Covid-19 não foi embora. Continua a nos visitar. A dengue está ali na água acumulada dos jardins. A doença da vaca louca visitou um bovino no Pará. A gripe aviária chegou na Argentina e no Uruguai. Longe daqui, pestes...! Água e seca Que país de contrastes. As águas de janeiro e fevereiro inundaram áreas em muitos Estados. As águas de março continuam a ameaçar com inundações e devastação. O reservatório de São Paulo, a Cantareira, está com 72,5% de sua capacidade. Mas exige precaução. A seca pode vir mais adiante. E no Rio Grande do Sul, a estiagem aflige os agricultores e os rebanhos. Montesquieu "Quando uma República está corrompida, não se pode remediar nenhum dos males que nascem, a não ser eliminando a corrupção e voltando aos princípios; qualquer outra correção, ou é inútil, ou é um novo mal." Montesquieu, em Do Espírito das Leis. Levítico "Ninguém pode desfrutar das coisas sagradas enquanto não estiver a limpo de corpo e de espírito". A lição do Levítico, da Bíblia sagrada, quer significar que ninguém pode almejar o paraíso se não for puro. Os impuros e os pecadores hão de pagar os seus pecados no purgatório, se não forem condenados diretamente ao fogo do inferno. Fecho a coluna com uma geladeira. À venda Um sujeito comprou uma geladeira nova e para se livrar da velha, colocou-a em frente a casa com o aviso: "De graça. Se quiser, pode levar". A geladeira ficou três dias sem receber um olhar dos passantes. Ele chegou à conclusão: ninguém acredita na oferta. Parecia bom demais pra ser verdade. Mudou o aviso: "geladeira à venda por R$ 50,00". No dia seguinte, a geladeira foi roubada!
quarta-feira, 1 de março de 2023

Porandubas nº 797

Abro com uma historinha do meu querido RN. O sabiá do senador Quando senador pelo Rio Grande do Norte, Agenor Maria (sindicalista rural, falecido em 1997), visitando o município de Grossos, foi interpelado pelo prefeito Raimundo Pereira. "Estamos precisando de uma escola para a comunidade de Pernambuquinho." De pronto, Agenor garantiu-lhe apoio à proposição. Semanas depois, um telegrama traz a boa-nova ao prefeito. "Escola está assegurada. Mande-me o croqui." Tomado pelo espírito de gratidão, Raimundo visita Agenor para agradecer o empenho, carregando uma gaiola à mão. Diante do senador, que estranha o acessório, Raimundo vai logo se explicando. "Eu não peguei um concriz como o senhor pediu, mas trouxe esse sabiá. O bichinho canta que é uma beleza!" (Historinha narrada em Só Rindo 2, por Carlos Santos). Panorama Pós-carnaval Depois da folia e do descanso carnavalesco, o país começa a funcionar. A desolação da paisagem no litoral norte de São Paulo, a partir de São Sebastião, ainda é a imagem que ocupa as nossas cacholas. E as velhas verdades sobem, mais uma vez, à tona: crônica das mortes anunciadas; irresponsabilidade dos nossos governantes, que não realizaram ações de prevenção; ambição de endinheirados, preocupados em manter sua vivência de conforto; ocupação desenfreada de espaços nas encostas das matas. O Brasil se repete no ciclo das tragédias provocadas pelas chuvas de verão. Conflitos na economia Pouco a pouco a realidade cotidiana desenha sua dureza, enquanto as comunidades aguardam o desfecho de medidas que afetarão seu bolso. A gasolina, por exemplo. Voltará a ser onerada, mais que o etanol. Afinal, o cofre do Tesouro Nacional não pode secar. Fernando Haddad, o ministro da Economia, defende a volta da oneração. Ganha a primeira batalha de uma guerra que vai durar. Seus opositores juntam os petistas com mando e força, a partir de Gleisi Hoffmann, a poderosa presidente do PT, que pregam conter aumentos de combustíveis para acarinhar as massas. Defendem, assim, medidas que consigam minorar as aflições dos consumidores. É o que se chama de populismo. Haddad ganhou, por enquanto. Lula lhe dá apoio. Olhar cismado da política Os guerreiros da política esperam as ordens de seus comandantes: presidentes das casas congressuais, líderes partidários, líderes governamentais e das oposições, comandantes de ministérios. Estão cismados. Voltam os olhos para os passos de Luiz Inácio. Vai entregar cargos de segundo escalão? Vai cumprir o acordo com as bancadas que lhe garantiram o assento presidencial? O semestre legislativo recomeça sob uma sombra de interrogações e dúvidas. Haverá ainda um bom tempo até se chegar aos 100 dias de governo, prazo tradicionalmente concedido ao mandatário-mor para dar conta do retrato da administração. Teremos mais 30 dias. Reforma tributária? Será a reforma mais urgente, com possibilidade de acender os interesses dos grupos parlamentares. Por via das dúvidas, consulto o especialista Luiz Carlos Hauly, ex-deputado e mais arguto consultor sobre matéria de tributos, que me diz: "A Câmara está tentando assumir novamente o protagonismo da Reforma Tributária com a criação de um Grupo de Trabalho - GT, que terá como relator o Agnaldo Ribeiro, relator da PEC 45, que foi arquivada pelo Lira e que foi também relator da Comissão Mista, cujo texto foi acolhido em parte pelo relator da PEC 110, Roberto Rocha. Meu foco está no protagonismo do Senado com a PEC 110 que está pronta para ser votada na CCJ. E é a que conta com maior apoio no congresso e nos setores produtivos". A visão de Appy O secretário da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, arremata em o Jornal da Globo: "Quando a economia cresce, todo mundo ganha. Ganham os cidadãos, porque aumenta o poder de compra das pessoas, ganham as empresas, porque quando elas crescem mais, elas têm mais rentabilidade, e ganha o próprio governo, porque, quando a economia cresce mais, o governo arrecada mais". As oposições Estão dispersas e à procura de um comandante geral. O perfil de Bolsonaro é magro para entrar nesse figurino. Faltam-lhe densidade, qualidade, conteúdo, E mais, as características de liderança abrigam, ainda, os valores do bom senso, do equilíbrio, de grandeza cívica. Jair é sinônimo de desastrado, desembestado, irreverente, mal-educado, destrambelhado. A ele faltaria uma visão de país. Só com meia dúzia de adjetivos e porradas expressivas, ele não conseguiria o respeito e a credibilidade que liderança forte requer. Figuras nevrálgicas O governo, por sua vez, exibe em sua galeria figuras que começam a ser alvo de bombardeios midiáticos, dentre os quais, alguns ganham destaque: André Ceciliano, nomeado secretário de Relações Institucionais, acusado no escândalo das rachadinhas, quando era deputado estadual no RJ; o ministro Juscelino Filho (União-MA), das Comunicações, acusado de fazer uso irregular do fundo eleitoral e de usar emendas do Orçamento em benefício próprio em 2022, quando era deputado Federal; e ainda acusado de usar avião da FAB para ver corrida de cavalo de raça em SP. A ministra do Turismo, Daniela Carneiro, gastou mais de R$ 1 milhão com gráficas que não têm serviço de impressão nos endereços cadastrados; e foi acusada de receber apoio da milícia do Rio de Janeiro durante sua campanha eleitoral. Anoto o que a imprensa levanta: "Mais da metade dos ministros de Lula tiveram problemas na Justiça". Judiciário na encruzilhada Com o Legislativo cismado, o Executivo em meio a atritos sobre caminhos a seguir, para onde vai o Judiciário? A pergunta ganha sentido ante a montanha de processos que batem na Corte, envolvendo os vândalos da tragédia por eles cometida em 8 de janeiro passado? O Judiciário parece tocar uma nota só, a que se ouviu por ocasião da tentativa de golpe. O STF tem ganho a cara de uma delegacia de polícia, um centro de aglutinação de amotinados e criminosos. Está entre a cruz e a caldeirinha: o que o Supremo deve fazer, qual a rota a seguir? Os ministros respondem: defender a letra constitucional. Ora, mas os seus canais parecem entupidos com tanta demanda na área criminal. Que falem sobre o tema os especialistas. Tarcísio Prestem atenção ao governador Tarcísio de Freitas. Sua estrela começa a ser vista nos céus. PSDB em frangalhos Pergunta para o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso: "qual a melhor saída para juntar os cacos do seu partido? O que os tucanos devem fazer para tentar salvar os poucos que ainda voam na floresta?" Boulos Do Instituto Paraná Pesquisas: Derrotado na eleição municipal de São Paulo em 2020, quando perdeu o segundo turno para Bruno Covas (PSDB), o deputado Federal Guilherme Boulos (PSOL-SP) aparece bem colocado para a disputa do Executivo municipal. No primeiro cenário, Boulos aparece com 26,3% da preferência, à frente do apresentador José Luiz Datena (PSC, 24,3%), o ex-governador Rodrigo Garcia (PSDB, 8,5%), o atual prefeito, Ricardo Nunes (MDB, 7,9%), os deputados Federais Ricardo Salles (PL, 4,8%), Tabata Amaral (PSB, 3,9%) e Kim Kataguiri (União Brasil, 3,3) e o ex-deputado Vinicius Poit (Novo, 1,6%). Onde está seu pai Fecho a coluna com Ariano Suassuna, um pilar da cultura nordestina. Freud disse uma coisa muito boa sobre o cômico. Ele disse que o cômico é a revelação do obsceno por baixo do simbólico, sendo o simbólico mostrado por palavras de aparência inocente. Repare como isso é curioso. Vou contar uma pequena história nordestina e brasileira para vocês verem o exemplo típico na teoria de Freud. O pessoal conta que, numa feira do sertão, no Nordeste, estava um profeta que ganhava a vida profetizando as coisas dos outros, a vida dos outros. Aí chegou um sujeito implicante e disse "Isso aí não é verdade não, isso é charlatanismo." Ele ficou indignado, né, era o meio de vida dele. "Não senhor, não é charlatanismo não, isso é verdade. Você quer ver eu provar que é verdade? Você duvida que eu lhe diga onde está o seu pai neste momento?" Aí o camarada disse: "Como é, rapaz, você vai dizer onde é que está o meu pai agora?" "É, vou dizer." Ele falou: "Tá, se você disser, eu acredito. Onde é que tá o meu pai?" Aí o profeta se concentrou assim e proclamou: "Seu pai está num bar em Campina Grande tomando cerveja." Aí o camarada diz: "Rapaz, você quebrou a cara. Eu aceitei de propósito. Meu pai morreu há 12 anos atrás." O profeta arrematou: "Quem morreu foi o marido de sua mãe. Seu pai está lá."
quarta-feira, 15 de fevereiro de 2023

Porandubas nº 796

Abro a coluna pré-carnavalesca com uma historinha do Ceará. Nesse tempo de sismos, é bom ficar alerta. Terremoto em Icó O governo brasileiro instalou um sistema de medição e controle de abalos sísmicos no país. O Centro Sísmico Nacional, poucos dias após entrar em funcionamento, detectou sinais de um grande terremoto na zona de Icó. Enviou um telegrama à delegacia de polícia da cidade, no Ceará, com a seguinte mensagem: "Urgente. Possível movimento sísmico na zona. Muito perigoso. 7,5 na escala Richter. Epicentro a 3km da cidade. Tomem medidas e informem resultados". Somente uma semana depois, o Centro Sísmico recebeu um telegrama com os seguintes dizeres: "Aqui é da polícia de Icó. Movimento sísmico totalmente desarticulado. Richter tentou fugir, mas foi abatido a tiros. Desativamos as zonas. Todas as prostitutas estão presas. Epicentro, Epifânio, Epicleison e os outros cinco irmãos estão detidos. Não respondemos antes porque teve um terremoto da porra aqui". Caldo começa a entornar Às vésperas do carnaval, o presidente Lula, de volta dos Estados Unidos, põe a mão nas bocas do fogão para tentar amainar o fogaréu que ameaça entornar o caldo nas bases de seu governo. Traduzindo: o União Brasil e o PSD pedem que Sua Excelência entre na paisagem de articulação política para ceder espaços do segundo escalão. Alegam que não adianta ficar com os dirigentes das Pastas, sem direito de nomear os assessores. Não estão conseguindo nomear quadros para as estruturas ministeriais porque o PT reivindica tais lugares. Querela grande. Ocorre que... A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, anuncia um "freio de arrumação" nos partidos da base governista. A questão envolve áreas do segundo escalão. Os partidos da base querem abocanhá-las. E o PT não quer ceder tanto território ao Centrão. Gleisi sabe que, a depender da gula dos partidos da base, não sobrarão fatias gordas para o Partido dos Trabalhadores. Água para esfriar Essa fogueira e seu resfriamento balizarão os passos da política durante todo o mandato de Luiz Inácio. O presidente entra em ação, joga um balde d'água no fogo, abaixa as chamas, até que o fogo suba outra vez de intensidade. E assim, entre jorros de contenção, a administração terá sequência, ensejando dúvidas sobre as pautas governamentais no Congresso e sua aprovação. Deve respingar na agenda. A conferir. Invasão do território Yanomami Outra frente de resistência será o paredão dos garimpeiros. Expulsos das terras Yanomami, saem, mas não deixam dúvidas que, mais cedo ou mais tarde, voltarão. Prova disso é a tentativa de se esconderem. Infiltram-se, aqui e ali, e mesmo com seus equipamentos destruídos, com queima de aviões e embarcações, resistem. Tentam se refugiar nas Guianas. O poder econômico não se subordina à ordem. Furam as defesas das forças policiais e voltam ao seu antigo refúgio. Este escriba conhece bem a história da garimpagem ilegal desde os idos de 1990. Objetos não identificados Mais três objetos não identificados foram derrubados nos espaços da América do Norte, depois da queda do balão chinês destruído pela força aérea norte-americana. O que seriam esses OVNIS? Alienígenas? Pouco crível a hipótese. Devem ser outros balões de tamanho e formato menores que o primeiro. O mundo espera uma resposta do presidente dos EUA, Joe Biden. E que venha antes do ex-presidente Donald Trump anunciar sinais da China para uma Terceira Guerra Mundial... E a guerra, hein? A guerra entre Rússia e Ucrânia chega nas bordas de um ano de lutas sangrentas. Milhares de mortos. Putin, arrogante e meio perdido, deve arremeter com fúria nos próximos tempos. Sob o risco de completa humilhação. Leio que a Rússia perdeu nas últimas semanas uma brigada de elite de cerca de cinco mil soldados. Falta de preparo. Improvisação tática. Generais russos completamente atabalhoados. A OTAN se une em torno da Ucrânia. Mais equipamentos, mais tanques, mais caças. E assim caminha, esvaindo-se em sangue, a Humanidade. 35 mil, 70 mil? O terremoto que devastou a Turquia e parte da Síria já registra cerca de 35 mil mortes. Há quem preveja o dobro. A pior tragédia de séculos na região. Qual a diferença entre uma centena de mortos e milhares? A banalização da morte impermeabiliza nossos sentimentos. As camadas de insensibilidade devastam nossos sentidos. Sorriso de esperança Porém, uma criança sendo retirada dos escombros do terremoto, depois de dias soterrada, e ainda com um sorriso estampado no rosto, é um sinal da grandeza humana. A esperança no ser humano é infinita. Eu e Deus O "causo" ocorreu em Conchas/SP. Era a audiência de um processo - requerimento do Benefício Assistencial ao Idoso para um senhor alto, velho, magro, negro, humilde e muito simpático, tipo folclórico da cidade. Antes da audiência, o advogado lembrou ao seu cliente para afirmar perante o juiz morar sozinho e não ter renda para manter a subsistência. Nisso residiria o sucesso da causa. Na audiência, veio a pergunta: - O senhor mora sozinho? - Não! respondeu ele (o advogado sentiu que a coisa ia degringolar). - Hum, não? Então, com quem o senhor mora? - Eu e Deus, respondeu o matreiro velhinho. O advogado tomou um baita susto. Mas a causa foi ganha. O juiz considerou procedente a ação. (Historinha enviada por Éder Caram e contada pelo pai dele). Menos 4 bilhões Leio que Jorge Paulo Lemann, um dos homens mais ricos do mundo, perdeu de uma dia para outro quatro bilhões. De dólares ou de reais? Ora, para que saber isso? Perder um dólar ou bilhões de dólares, para magnatas como Lemann, não vai abalar sua riqueza. O bolso dele não ficará murcho. Estará sempre cheio. Comam menos A restrição alimentar pode retardar o envelhecimento e prolongar os dias de vida das pessoas. Leio: um estudo, designado como CALERIE, foi feito para avaliar o impacto à restrição da ingestão calórica de 25% ao longo de dois anos entre indivíduos saudáveis. Atenção, gulosos. Comam menos se desejam viver mais. Carnavalizando Teremos dias de folia na próxima semana. Gritos represados, farras contidas. A epidemia segurou a índole folgazã das massas. O carnaval abrirá a catarse nacional. Estruturas de consolação descerão dos céus à terra para agasalhar a farra coletiva. Um carnaval sem excessos para todos. (Se existe carnaval contido... rs). Fecho a coluna com a gloriosa Paraíba. Traçando o ingrês... Brejo das Freiras é uma Estância Termal nos confins da Paraíba, perto de Uiraúna e Souza. Trata-se de um lugar para relaxamento e repouso. O governo da Paraíba tinha (não sei se ainda tem) um hotel, com uma infraestrutura para banhos nas águas quentes. Década de 70. Apolônio, o garçom, velho conhecido dos fregueses da região, recebe, um dia, um hóspede de outras plagas. Pessoa desconhecida. Lá pelas tantas, quase terminando a refeição, o senhor levanta a mão, chama Apolônio e pede: - Meu caro, quero H2O. Susto e surpresa. Anos e anos de serviços ali no restaurante e ninguém, até aquele momento, havia pedido aquilo. Que diabo seria H2O? Apolônio, solícito: - Pois não, um instante! Aflito, correu na direção da única pessoa que, no hotel, poderia adivinhar o pedido do hóspede. Tratava-se de Luiz Edilson Estrela, apelidado de Boréu (por causa dos olhos grandes de caboré), empedernido boêmio, acostumado aos salamaleques da vida. - Boréu, tem um senhor ali pedindo H2O. O que é isso? Desconfiado, pego sem jeito, Boréu coça o queixo, olha pro alto, tenta se lembrar de algo parecido com a fonética e, desanimado, avisa: - Apolônio, sei não. Consulte o Freitas. Freitas era o diretor do Grupo Escolar, o intelectual da região. Localizado com urgência, o professor tirou a dúvida no ato: - H2O é água, seus imbecis. Quer dizer água. Apressado, Apolônio socorreu o freguês com uma jarra do líquido. Depois, no corredor, glosando o feito, gritou em direção a Boréu: - Ah, ah, ah, esse sujeito achava que nós não sabia ingrês.... Lascou-se!
quarta-feira, 8 de fevereiro de 2023

Porandubas nº 795

Abro a coluna com uma historinha envolvendo Chopin Tavares de Lima na época do governo Montoro. Mel de abelhas Vai aqui uma historinha que Geraldo Alckmin me contou no 9º Fórum de Comandatuba, promovido pelo LIDE. A historinha de Alckmin aparece porque eu lembrava que, naquela época, Dora Kramer, minha ex-aluna na Faculdade de Comunicação Casper Líbero, tinha o sobrenome Tavares de Lima. Era sobrinha do grande e saudoso Chopin Tavares de Lima. Eis o relato do hoje vice-presidente da República: Chopin, como secretário do interior do governo Montoro, tinha a missão de fazer a articulação com os prefeitos. Um dos programas de Montoro contemplava a fabricação de mel. Mel caseiro. O prefeito de Silveiras, na microrregião de Bananal, de nome Miguel, no meio do caminho para a capital, aproveitando a parada para o almoço, comprou uma garrafa de mel, dessas comuns que se encontram em restaurantes de estrada. Tirou o rótulo, lavou a garrafa, embalou-a em celofane. Era um presente para Chopin. Planejava criar um impacto. - Secretário, aqui está o resultado do programa 'Colmeia' do governo Montoro. Mel de primeira qualidade. O melhor mel que São Paulo já produziu. Surpresa geral. Agradecimentos do Chopin com o aviso de que levaria o presente para o governador Montoro. A seguir, o astuto prefeito emendou: - Gostaria que o secretário providenciasse a liberação da verba para o asfalto, que pedimos faz bom tempo. Imediatamente, o secretário mandou localizar o pedido da prefeitura de Silveiras. Mas não havia nenhuma solicitação. O prefeito aproveitara a ocasião para jogar verde e colher maduro. Queria colher recompensa pela garrafa de mel que levara. Depois de algum tempo, a mensagem: a solicitação não foi encontrada. Mil pedidos de desculpas do secretário Chopin. O prefeito prometeu encaminhar novo pedido, conformado com a burocracia do Palácio que havia perdido o ofício. Geraldo Alckmin, então deputado estadual, ouviu o relato e percebeu a artimanha do prefeito. Aos ouvidos dele, cochichou a frase bíblica: - Miguel, Miguel, tu não tens abelha e trazes mel. Miguel regressou a Silveiras. No dia seguinte, ao telefonar para o secretário Chopin Tavares de Lima, comunicando que novo ofício estava seguindo pelo Correio, ouviu dele a confissão: - Não precisa mandar, prefeito, encontramos o ofício. Vamos liberar a verba. E assim Chopin Tavares de Lima, Miguel, Silveiras, Geraldo Alckmin, Dora Kramer e eu entramos juntos, pela primeira vez, numa mesma história. Panorama O cheiro do caos Dias sombrios. António Guterres, secretário-geral da ONU, faz o alerta: "os riscos de uma escalada da guerra e mais carnificina não param de aumentar...guerra na Ucrânia, crise climática, pobreza extrema, ano de 2023 começa com convergência de desafios nunca vistos em nossas vidas". O mundo se dirige para uma guerra mais ampla. O papa Francisco diz: o mundo está se autodestruindo. O relógio da parada final está batendo forte. O temor deste escriba extrapola os limites da análise jornalística. Para todos os lados, cheiro do caos. Tragédias Uma ligeira vista d'olhos mostra horizontes não muito claros. Aqui, ali e alhures. Por aqui, o verão quente e triste nos traz a notícia do naufrágio de uma traineira na Baia de Guanabara, que ceifou a vida de três pessoas e deixou outras desaparecidas. A embarcação voltava de um passeio de amigos no entorno da ilha de Paquetá. Na Turquia e na Síria, terremotos de grande magnitude devastam os dois territórios. Na Turquia, o primeiro foi de magnitude 7,8 graus, o maior a atingir o país desde 1939, tendo como epicentro a cidade de Gaziantepe, de 2 milhões de habitantes, perto da fronteira com a Síria. Cerca de 120 terremotos secundários foram registrados. As mortes devem ultrapassar cinco mil pessoas. Um teste para Erdogan Os terremotos serão um grande teste para o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, que está no comando do país desde 28 de agosto de 2014, tendo anteriormente ocupado o cargo de primeiro-ministro do país entre março de 2003 e 2014. Foi também prefeito de Istambul de 1994 a 1998. Há uma onda de insatisfação contra seus superpoderes. A Europa Ocidental une-se na ajuda aos dois países. Como pano de fundo, a guerra entre a Rússia e a Ucrânia. Mortandade diária. Sem perspectivas de paz. O planeta, maltratado, parece viver dias de fúria. Guga Chacra Quem conhece bem a região é Guga Chacra, colunista do Globo e comentarista de política internacional da GloboNews. Um pouco de sua visão: - A Guerra da Síria não acabou, embora seja de baixa intensidade e localizada em apenas algumas regiões. Uma delas é justamente a área próxima à fronteira com a Turquia, não muito distante de Gaziantepe. É a província síria de Idlib, nas mãos de grupos jihadistas sírios apoiados pelos turcos. - Essa região do território turco é uma das mais pobres do país, tendo pouco em comum com metrópoles ricas e avançadas como Istambul, Izmir e Ancara. Para agravar, a Turquia nesse momento vive uma crise econômica, com inflação e mega desvalorização da moeda, e instabilidade política às vésperas de eleições gerais nas quais Recep Tayyip Erdogan fará de tudo para não perder o poder. Na Síria de Bashar al-Assad Guga continua... "Bashar al-Assad, por sua vez, venceu a guerra e conseguiu se manter no poder. Mas comanda um país em ruínas, bem diferente do que era 2010, antes da eclosão do conflito. Depende da ajuda da Rússia e do Irã. Mas Moscou está com as atenções voltadas para a Guerra da Ucrânia e Damasco deixou de ser prioridade. O regime Irã, por sua vez, está com o foco no combate aos protestos contra o regime de apartheid anti-mulher no país. Diante deste cenário, Assad se aproxima cada vez mais dos Emirados Árabes, que devem ser a principal via de apoio ao regime após o terremoto. Sabe-se lá, no entanto, quanto de dinheiro chegará a quem necessita, ainda mais levando em conta que boa parte das áreas destruídas não estão sob o comando do regime." As nadadoras A propósito da Síria, uma sugestão: vale a pena ver o filme "As nadadoras". Um caso real envolvendo duas nadadoras sírias. Um teste para Lula Os dirigentes passam por vestibulares na frente da gestão. É o caso de Lula nesse período iniciante. O Brasil ainda vive sob o impacto da tragédia que faz padecer o povo Yanomami. População que morre de inanição e doenças. Agora vive o "dilema" dos juros altos. O presidente Luiz Inácio se queixa do presidente do Banco Central pela decisão do banco de taxar a Selic em 13,75%, uma das mais altas do planeta. Roberto Campos Neto, o presidente, tem mandato a cumprir, encerrando-se a 31 de dezembro de 2024 e garante seguir o jogo do mercado. O BC tem autonomia garantida. O dirigente aguentará a pressão de Lula? Se não cumprir bem com suas funções, sabe-se, pode ser demitido. Mas isso demandaria extraordinário esforço congressual. O marcado espera que o patamar de 13,75% seja mantido até o fim deste ano. BNDES O novo presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, tomou posse nesta segunda-feira, prometendo fomentar o desenvolvimento de micro, pequenas e médias empresas, prioridades de sua gestão. Prometeu, ainda, debater ajuste na Taxa de Longo Prazo (TLP) do banco de fomento. Não pretende fazer com que o BNDES concorra com bancos privados, defendendo a necessidade de juros mais competitivos para as micro, pequenas e médias empresas. "Não queremos padrão de subsídios como no passado, mas uma taxa de juros mais competitiva para micro, pequenas e médias empresas. Não pretendemos ficar disputando mercado com o sistema financeiro privado. Isso não é papel do BNDES." Mercadante foi um quadro que abriu arestas em sua credibilidade por ocasião da passagem pelo governo Dilma. Revolta dos ricos? "O que aconteceu no Palácio do Planalto, no Congresso e no STF foi uma revolta dos ricos que perderam as eleições. Nós não podemos brincar, porque um dia o povo pobre pode se cansar de ser pobre e fazer as coisas mudarem nesse país." Presidente Lula, em discurso no Rio. Seria o "nós contra eles"? E a pacificação nacional? Presidente Luiz Inácio, aceite o conselho deste escriba: não dê motivos para a "guerra" entre alas. O senhor precisa governar para todos os brasileiros: pobres, remediados, classes médias empobrecidas e ricos. O país quer viver sob paz e harmonia. Vez ou outra, cutuco o PT, mas reconheço os avanços do Brasil sob seu primeiro mandato. Aceite as críticas quando feitas com responsabilidade. Acomodação Entre pequenas e grandes tragédias, teste dos dirigentes em início de gestão e expectativas festejando o reinado do Rei Momo (eita, mais dias de farras e fanfarras), o país enxerga as placas tectônicas da política entrando em acomodação. O terremoto que abalou o território bolsonarista foi embora sob o acolchoado preparado por Lula e seus novos cabos eleitorais para acolher os que iriam ficar desabrigados. O presidente decidiu trazê-los para seu convívio com teto, cargos, comida e roupa lavada. O PL enquadra seus participantes, evitando sua fuga em massa. Valdemar, o esperto, vai enfrentar o desafio de controlar "ordem unida" em seus combatentes. Será um desafio e tanto. Lira, o campeão Na corrida de obstáculos, o destaque é o campeão Arthur Lira, que teve uma vitória retumbante em sua reeleição para a presidência da Câmara, 464 eleitores. A acachapante votação do alagoano mostra que a velha política continua a dar as cartas. Que o presidencialismo de coalizão está vivo e atuante, com Luiz Inácio aceitando as regras do jogo. E que o futuro continuará a ser pautado pela lei franciscana do "é dando que se recebe". A candidatura de Michelle Leio: Michele Bolsonaro nega candidatura. Só faltava essa: Michelle confirmando ser candidata a presidente em 2026 no lugar de Jair. O que a imprensa especulativa esperava? Ora, a mídia, com o apoio de Valdemar, o todo poderoso do PL, lançou o nome da ex primeira-dama em um momento em que ainda se sente o rescaldo da derrota bolsonarista. Mas a especulação continua. Poderá se candidatar ao Senado por São Paulo ou pelo Rio de Janeiro em 2026. Leio que Jair teria ficado irritado por ser "rifado" pelo Valdemar, com a especulação envolvendo sua esposa. Tratar de uma eleição para daqui a quatro anos? Quanta falta do que dizer... Jair nos EUA A revista Time traz matéria com Jair Bolsonaro, narrando o cotidiano do ex-presidente nos EUA. Usa o termo "bizarrice" para designar certas atividades do capitão, que promete voltar nas próximas semanas para liderar a direita no Brasil. Ele se coloca no papel de guardião contra a implantação do "comunismo" no país. A Direita Não se pode negar. A Direita deu as caras e vai querer participar da política. Precisa de perfis além de Bolsonaro para ganhar espaço no arco ideológico. Credibilidade. Confiança. Lideres respeitados. Bolsonaro poderia ser este não fosse tão desacreditado. Tão irreverente. A Esquerda Dividida, terá muitos polos de liderança. Não há um agregador-mor.  O Centro Espaço muito disputado. O vice-presidente Geraldo Alckmin veste o figurino de grande articulador das forças centrais.