COLUNAS

  1. Home >
  2. Colunas

Porandubas Políticas

Por dentro da política.

Gaudêncio Torquato
quarta-feira, 25 de março de 2015

Porandubas nº 437

Não sabe que não sabe Abro a coluna com um pequeno conto. Sobre pessoas que desconhecem o que se passa a seu redor. Como é o caso de ilustres figuras da nossa política. Conto uma parábola : "há pessoas que não conseguem perceber o que se passa ao seu redor. Não veem que não veem, não sabem que não sabem". Pequeno relato. Zé caiu em um poço e está a 10 metros de profundidade. Olhava para os céus e não viu o buraco. Desesperado, começou a escalar as paredes. Sobe um centímetro e escorrega. Passou o dia fazendo tentativas. As energias começaram a faltar. No dia seguinte, alguém que passava pelo lugar ouviu um barulho. Olhou para o fundo do poço. Enxergou o vulto de Zé. Correu e pegou uma corda. Lançou-a no buraco. Concentrado em seu trabalho, esbaforido, cansado, Zé não ouve o grito da pessoa : "pegue a corda, pegue a corda". Surdo, sem perceber a realidade, Zé continua a tarefa de escalar, sem sucesso, as paredes. O homem na beira do poço joga uma pedra. Zé sente a dor e olha para cima, irritado, sem compreender nada. Grita furioso : - O que você quer ? Não vê que estou ocupado ? O desconhecido se surpreende e volta a aconselhar : - Aí tem a corda, pegue-a, que eu puxo. Zé, mais irritado ainda, responde sem olhar para cima : - Não vê que estou ocupado, ó cara. Não tenho tempo para me preocupar com sua corda. E recomeça seu trabalho. Parábola : "Zé não vê que não vê, não sabe que não sabe". A maior crise O Brasil vive a maior crise de sua contemporaneidade. Quais os fatores que justificam tal hipótese ? Uma confluência de crises : a crise econômica, a crise política e do sistema partidário, a crise do petrolão, a crise social, a crise hídrica, a crise energética e a crise de gestão, com impacto sério na governabilidade. Analisemos cada uma. A economia A economia é a locomotiva do trem. Se faltar nela combustível, o trem fica parado. Se tiver pouco combustível, o trem dá solavancos e pode descarrilar. A locomotiva é quem puxa o trem Brasil, composto por seus carros : o PIB, a inflação, o emprego/desemprego, a política, a avaliação positiva/negativa dos governantes, o Produto Nacional Bruto da Felicidade/Infelicidade. Pois bem : começa a faltar óleo na locomotiva. As contas públicas estão desconjuntadas. O Estado gasta mais que arrecada. Trem descarrilando A ameaça de o trem descarrilar é real, abrindo espaço para corpos jogados fora dos carros : desemprego em massa, inflação chegando aos dois dígitos, recessão econômica, bolso mais vazio fazendo roncar o estômago das massas, cofres secos, setores produtivos em retração a partir da indústria com queda prevista de 5% para o ano e assim por diante. Um carro vai levando de roldão o outro. A política O primeiro carro a sofrer abalos é o da política, nesse caso, impulsionado para fora dos trilhos por causa do petrolão, que produz a lista de Janot, uma relação de nomes que deverá ser ampliada nas próximas semanas. O rebuliço na frente política dará ao Congresso um gigantesco escudo corporativista. Os presidentes das duas casas congressuais, na esteira de seus poderes, estabelecem uma pauta de grandes temas para votação. E exibem certa independência diante do Executivo, mudando o curso das tradicionais relações, quando o Congresso se postava como poder convalidador. Réus políticos O STF vai aprofundar as investigações sobre os políticos indiciados, enquanto o juiz Sérgio Moro começa a inserir empresários na lista de réus, tirando-os da faixa de indiciados. As novas delações premiadas - que são previstas, sob a pressão das famílias que não querem ver seus chefes purgando anos e anos na prisão - tendem a adensar as provas e a expandir a relação de réus. A expectativa é que nomes mais poderosos que os atuais envolvidos possam ser relacionados. A CPI da Petrobras na Câmara, por sua vez, funcionará como palco da espetacularização política, com tendência a contemporizar com os quadros políticos. Sociedade de costas A sociedade está de costas para a mandatária-mor e também para os políticos. As pesquisas mostram que 65% desaprovam a presidente Dilma e nunca foi tão evidente a distância entre a representação política e os grupamentos sociais. Portanto, a esfera da governança e da política vive dias de aperto. Formidável pressão social é exercida sobre os Poderes Executivo e Legislativo. O Poder Judiciário sai com imagem melhor. Esgotamento de um ciclo A crise política aponta para o esgotamento do modelo de presidencialismo de coalizão. A partilha dos cargos e espaços na administração pública gera fortes arestas junto aos partidos e estiola a força do Executivo. Portanto, o ciclo da partilha do poder está a exigir novos condicionamentos, abordagens mais avançadas. A estrutura governativa é lerda e paquidérmica, a mostrar que seu modelo é ultrapassado. Daí a sugestão de enxugamento da máquina. Que conta até com o apoio do PMDB, o maior partido da base, a pregar a redução de 39 para 20 ministérios. Centros de comando Multiplicam-se os centros de comando político, o que dificulta a tarefa de repartição de espaço, a cargo da presidente Dilma. O esgarçamento da base situacionista causa dores de cabeça, não havendo mais a tradicional fidelidade dos conjuntos parlamentares. E, sob uma economia que ameaça estrangular as veias produtivas da nação, os políticos também se afastam da arena governativa. Tentam se afastar da contaminação que impregna o corpo do Executivo. A frente das ruas A animosidade toma conta dos grupamentos sociais. Os movimentos se adensam e se espalham, com tendência a pontuar sobre matérias específicas. Os ânimos acirrados ocupam as redes sociais para uma guerrilha expressiva, observando-se maiores quantidades de falas contrárias ao governo. O rechaço à política toma conta de todos os setores. O repúdio à presidente e ao governo que comanda atinge os píncaros. A movimentação social mostra-se mais madura, crítica e consciente do que a grande mobilização de junho de 2003. Naquela ocasião, acendeu-se a faísca. De lá para cá, tonéis de gasolina com a "graxa" do propinoduto da Petrobras esticaram o tamanho das fogueiras. A água e a energia Apesar de chuvas intermitentes em grande parte do país, a partir do Sudeste, os reservatórios continuam muito abaixo de suas potencialidades. O racionamento não está fora das probabilidades e, na sequência, os apagões de energia também constituem ameaça. O aumento no preço da energia - em torno de 40% - podendo, ainda, ser mais alto, em julho, é outro elo da corrente da indignação. Bo+ba+co+ca ameaçada A equação que uso - Bolso, Barriga, Coração, Cabeça - começa a ser desfeita. As margens sociais já dão pulos de raiva quando constatam a carestia de vida. A feirinha de rua aumenta preços de hortifrutigranjeiros, crise alimentada pela greve dos caminhoneiros. As barrigas, então, começam a roncar e a enfurecer os corações. As cabeças decidem ir ruas para se manifestar. Pais e mães levando seus filhos. Portanto, não apenas as elites afluem às avenidas das grandes e médias cidades. O povo das classes mais necessitadas está também de olho aceso. A governabilidade Não por acaso, o país parece ingovernável. Os serviços públicos são precários, a violência ganha as ruas das grandes cidades e se espraia pelos fundões, amedrontando as populações. O Bolsa Família já deu tudo o que tinha de dar em matéria de lucro eleitoral. As famílias pobres já o incorporaram ao seu orçamento. E a inflação corrói sua força. Daí a exigência por serviços públicos mais qualificados. Os partidos estão sem rumo. Não sabem o que e como aprovar as medidas de ajuste econômico propostas pelo ministro Joaquim Levy. Os setores produtivos gritam contra mais impostos. Exigem que o governo corte profundamente suas gorduras. O que fazer ? O governo, por sua vez, está entre a cruz e a caldeirinha. Se cortar benefícios de trabalhadores, como prevêem as MPs 664 e 665, terá de enfrentar os tratores das centrais sindicais. Se cortar as desonerações concedidas a setores produtivos, ouvirá o clamor de frentes de produção que já padecem sob a falta de competitividade da indústria brasileira. O que fazer ? Negociar, negociar, chegar a um mínimo de consenso. O outono da matriarca Estamos no outono. Época de folhas caindo. Tempo de descenso. Seria também o outono da matriarca ? O termo, aqui, não tem sentido pejorativo. Apenas é utilizado como expressão para destacar sua índole autoritária, dura, fechada em torno de si mesma ? Este analista da política não tem resposta. Por enquanto. Vamos esperar pelo andar da carruagem ou, em outros termos, pela continuidade das investigações do petrolão. Poema do beco Fecho esta Leitura com o Poema do Beco, do imortal Manuel Bandeira : Que importa a paisagem, a Glória, a baía, a linha do horizonte ? - O que eu vejo é o beco.
quarta-feira, 18 de março de 2015

Porandubas nº 436

Abro a coluna nesses tempos com duas pitadinhas de humor. Do RJ. Armado de admiração Tenório Cavalcanti, udenista e adversário político de Vargas, foi ao Catete numa comissão de deputados. Andava nas manchetes dos jornais por causa de suas estripulias em Caxias, na base da "Lourdinha" (metralhadora) e da capa preta. Getúlio o cumprimentou, olhou bem para o volume do revólver embaixo do braço esquerdo, sob o paletó : - Deputado, o senhor está armado ? Tenório ficou vermelho, mas não perdeu o bote : - Sim, presidente, armado de admiração por V. Excelência. Escola para quê ? O presidente Dutra tinha um auxiliar capixaba, oficial do Exército, gago. Quando Dutra dava uma ordem, ele ficava mais gago ainda. Resolveu dar um jeito de curar a gagueira. Soube que o Méier tinha uma escola para gagos, tocou para lá. O endereço que levou não coincidia. Procurou no bairro todo, nada. Foi ao português da esquina, desses de bigode e tamanco : - O sesenhor popopodia me inininformar se aaaqui temtem uma escola para gagagago ? - Mas o senhor já fala gago tão bem, para que quer escola ? Flores no pântano A flor de lótus nasce no pântano. Exibe beleza e força. Das águas lodosas desabrocham flores brancas, imaculadas, uma perfeição da natureza. A imagem da flor foi usada por este escriba em um artigo no Estadão, há muito tempo, para expressar a crença de que no meio do caos há uma réstia de esperança. A frase era : "A política chegou ao fundo do poço em matéria de moral. Mas não morreu a esperança de nascer uma flor no pântano". Saulo Ramos, jurista e sábio, e também um incréu, pinçou a alegoria em seu livro Código da Vida para atribuí-la aos "puros, os poetas, os idealistas", como Gaudêncio Torquato, não sem fazer votos para que "eles tenham razão" na pregação. O Brasil tem recebido camadas e camadas de lama nesses tempos de petrolão. Mas são inegáveis as flores que nascem aqui e ali, sob os cuidados atentos de uma sociedade que junta forças e motivação para deixar o conforto de sua casa e organizar a maior mobilização de ruas dos últimos 30 anos. O Brasil é outro ? A pergunta recorrente é : o Brasil é outro, a partir do dia 15 de março ? A grande mobilização, a maior desde o movimento das Diretas Já, nos idos de 1984, terá impactos sobre a vida nacional ? Vamos a algumas reflexões. Primeira leitura : as cores Vimos um Brasil cívico e participativo. As cores verde, amarelo e branco denotam a estética cromática da bandeira nacional. Diferentemente, por exemplo, do vermelho total da manifestação do dia 13, puxada por PT, CUT e MST. Uma coisa é defender o país ; outra coisa, bem menor, é defender um partido. Quem foi às ruas ? Segunda leitura : as camadas Todas as camadas sociais se fizeram presentes. É evidente que as classes médias se fizeram representar em maior quantidade, eis que mais sensíveis e próximas aos eventos políticos. Mas não tem sustentação a hipótese de que as margens não estavam presentes. Desse modo, como se explica o fato de a presidente Dilma registrar, nesses dias turbulentos, apenas 7% na categoria bom/ótimo de avaliação positiva nas pesquisas de opinião ? Portanto, o chamado povão também estava lá. O metrô de São Paulo se encheu de gente dos bairros periféricos. Terceira leitura : o discurso Qual a razão maior para puxar o cordão das manifestações ? A teia de corrupção que envolve o país. Por mais que algumas entidades queiram dizer que o impeachment da presidente tenha sido o leit motiv, o arrastão das massas foi inspirado, com maior intensidade, pela ladroeira e, particularmente, pelo propinoduto no entorno da Petrobras. É claro que as faixas pedindo impeachment também se faziam ver nas correntes das ruas. Em plano menor. Quarta leitura : a quantidade A quantidade de pessoas é outro ponto polêmico. Um milhão, 200 ou 600 mil ? Não importa muito a quantidade. Importa aduzir que foi a maior movimentação cívica desde 1984. E que se traduziu por uma participação plural da sociedade. Não apenas do eleitorado da oposição, como erradamente opinou o ministro Miguel Rossetto, esse mais próximo à presidente. P.S. Se quiserem mais cálculo de pessoas, aqui vai um, enviado pelo amigo Álvaro Lopes e de autoria de Sylvio Teitelbaum. O cálculo de Sylvio "Para quem tem dificuldade de contar pessoas numa manifestação : Av. Paulista = 3.000 m x 50m x 4 pessoas /m2= 600 mil pessoas. Com o movimento das massas coloca-se seis pessoas/m2. Totalizando, no mínimo, um milhão de pessoas. Quem não conhece o cálculo e não sabe como calcular deslocamento de multidões que se cale e pare de desqualificar a maior movimentação genuína sem partido que o Brasil teve desde os anos 60. As "Diretas Já" tinham políticos envolvidos diretamente. Artistas, show e a Fafá cantando. Portanto, esta movimentação tecnicamente é muito diferente das 'Diretas Já'." Quinta leitura : a convocação Diferentemente de mobilizações do passado, o grito do dia 15 foi convocado pelas redes sociais e por ondas formadas a partir dos círculos concêntricos. Os meios foram múltiplos : boca a boca, usuários das redes, veículos massivos de comunicação, etc. Importante ressaltar que não houve convocação por meio de partidos políticos ou de centrais sindicais. Viu-se uma participação espontânea, natural, sem atendimento aos partidos ou a grupos pagos. Não houve distribuição de lanche nem passagem paga por patrocinadores. Sexta leitura : o país Errado também é confinar o movimento a SP. As regiões do país foram contaminadas pelo sangue do civismo, algumas com maior intensidade que outras. Viu-se, por exemplo, que as manifestações no Nordeste ganharam menor escala. Nem por isso, pode-se dizer que a região não se tocou pela mobilização. No RS, a concentração de 100 mil pessoas em Porto Alegre deixou forte marca. Sétima leitura : o panelaço A sequência do evento foi o panelaço/buzinaço. A tentativa dos ministros Miguel Rossetto e José Eduardo Cardozo foi recebida com a pancadaria nas panelas em muitas capitais. O ministro Cardozo se expressou melhor, uma fala mais política e mais certeira. O desastre ficou por conta de Rossetto, que atribuiu as manifestações aos eleitores que não votaram em Dilma. Um erro de visão. O ministro precisa tomar um banho de rua. Oitava leitura : a continuidade A sociedade mostra que a democracia participativa no país ganha densidade e solidez. Daí a nossa projeção de que esses movimentos deverão, doravante, se incorporar à paisagem urbana, de maneira pontual e em menores proporções. Veremos grupos e categorias profissionais indo às ruas para gritar por demandas específicas. E, ainda, acompanhar os passos do petrolão que devem seguir por todo o ano, batendo nas margens eleitorais de 2016. Nona leitura : efeitos O governo continua a estudar respostas. A mais alentada deverá ser um pacote contra a corrupção, prometido para estes dias. Teme o governo responder às demandas com lero-lero, ou seja, com discurso inconsequente. Deverá fazer cortes de gorduras e excessos. E, ainda, promover uma reforma ministerial para ajustar os parâmetros à realidade das ruas e à real politik. Décima leitura : o amanhã O amanhã será a aurora de um país passado a limpo, expurgado não de todas as mazelas, mas de alguns vícios e ilicitudes. Veremos os próximos tempos enxertados com sementes fortes : o escopo conceitual pedindo por mais ação e menos discurso ; transparência ; agilidade ; qualidade ; enxugamento ; reforma política ; ajustes econômicos ; participação ; envolvimento social ; poder centrípeto (das margens para os centros) ; punição ; rigor e zelo. Quem se fortalece PMDB sai mais fortalecido da crise, mesmo tendo alguns de seus nomes na lista de investigados. O vice-presidente da República, Michel Temer, terá papel mais substantivo na frente da articulação política. Congresso deverá assumir postura de independência em relação ao Executivo. Poder Judiciário subirá, mais uma vez, ao pódio da visibilidade pública. Organizações sociais ganharão prestígio. A ala lulista do PT adquirirá mais força. Mudança na índole A presidente Dilma começa a mudar sua postura. Agora, passa a usar modelagem mais coerente com as ruas : simplicidade, modéstia, diálogo, abertura, flexibilidade em substituição à arrogância, autossuficiência, dureza no trato. Poderá, doravante, usar o mineirês que aprendeu em sua vida nas MG. Pressa de Levy Joaquim Levy é um ministro apressado. Assim se expressa : "se fizermos um ajuste de forma rápida, de verdade e do tamanho necessário, as pessoas poderão sentir o chão firme para voltar a tomar risco e investir". O Congresso ouvirá seu apelo ? As pessoas, a que se refere o ministro, voltarão mesmo a investir ? Levy quer demonstrar que não se faz omelete sem quebrar ovos. A dificuldade é ter êxito na missão de pedir sacrifícios aos setores produtivos e à população. PT no despenhadeiro O PT continua a descer no despenhadeiro da imagem. De partido que mais encarnava a ética na política, virou o partido mais próximo aos dutos da corrupção. Para se levantar, o partido deverá se refazer. Com a agulha e o tecido de Lula. A partilha É possível governar sem a participação e partidos na administração ? Impossível. Sem o apoio dos partidos da base o chamado presidencialismo de coalizão soçobrará na missão. Mas há regras de bom senso para a distribuição das fatias do bolo do poder. Primeira regra : avaliar o peso relativo dos entes partidários. Segunda : selecionar perfis adequados e condizentes para as estruturas. Aristóteles, em suas reflexões sobre política, dá uma pista : "Quando diversos tocadores de flauta possuem mérito igual, não é aos mais nobres que as melhores flautas devem ser dadas, pois eles não as farão soar melhor ; ao mais hábil é que deve ser dado o melhor instrumento". Trata-se de meritocracia. Terceira : preservar e preencher as áreas econômicas com perfis técnicos. Quarta : controlar, cobrar resultados. Indicadores do turismo Mais de 90% das empresas de agenciamento turístico no Brasil são micro, segundo o estudo Indicadores Econômicos do Agenciamento Turístico Nacional, a ser divulgado nesta quarta-feira pelo Ipeturis (Instituto de Pesquisas, Estudos e Capacitação em Turismo) e pelo Sindetur/SP (Sindicato das Empresas de Turismo no Estado de São Paulo). De acordo com os dados, a maioria das organizações tem entre 21 e 30 anos de atuação. O Estado de SP tem o maior número de empresas (6.987), seguido pelo RJ (2.557) e MG (1.992). Pacotes turísticos, hospedagem e passagens aéreas são os serviços mais comercializados.
quinta-feira, 12 de março de 2015

Porandubas nº 435

Abro a coluna com o improviso dos cantadores do cordel nordestino. Saudação aos presidentes Juscelino Kubitschek, presidente da República, foi ao CE com Armando Falcão, seu ministro da Justiça. Sebastião Nery conta que Falcão, cearense, levou JK a um desafio de cantadores. Um cego estava lá, com sua viola, gemendo rimas. Juscelino chegou, cumprimentou-o. O cego respondeu na hora : - Kubitschek, ai, meu Deus, que nome feio. Dele eu só quero o cheque porque do resto ando cheio. Um ano depois, a mesma cena. Jânio Quadros, presidente, vai a Fortaleza, há um desafio de cantadores. Chega com os óculos grossos e longos bigodes, um cantador o vê, saúda : - Vou louvar o meu patrão que já vem chegando agora. Engoliu a bicicleta e deixou o guidão de fora. Nunca mais ninguém levou presidente para ouvir cantador no CE. A onda contra Dilma Os nomes se multiplicam : panelaço, buzinaço, apitaço, vaias, apupos, palavras de ordem, gritos fortes nos centros e ecos que chegam às margens. Essa é a onda contra Dilma, cujo índice de avaliação, na grade boa/ótima, chega a um dígito, portanto, baixo de 10%. O governo vai mal das pernas. E da cabeça. A indignação sai do epicentro da sociedade - classes médias - e vai chegando às margens, obedecendo ao fenômeno dos círculos concêntricos ou, ainda, ao movimento produzido pela pedra jogada no meio do lago. As marolas formadas chegam às margens. A observação é procedente, bastando ver que, há três ou quatro meses, a insatisfação restringia-se basicamente ao centro social. O empuxo da onda A onda de contrariedade obedece a alguns empuxos, a algumas alavancas. Na frente delas, a carestia. A inflação alta na área de alimentos bate forte nos bolsos dos grupamentos C, D e E. Que se defrontam com produtos hortifrutigranjeiros caros. A paralisação dos caminhoneiros esvaziou gôndolas e encareceu produtos, em alguns casos, em mais de 50%. A barulheira em torno dos dutos de propina da Petrobras funciona como bumbo nos ouvidos de todas as classes sociais. Quanto roubo, quanta malandragem, milhões aqui, bilhões ali são ecos que chegam forte nos ouvidos dos centros e das margens. O governo e os políticos acabam sendo vitimados pelo tiroteio social. Crises setoriais Para adensar o empuxo, emergem as crises setoriais : a crise hídrica, a crise energética (a ameaça de apagões), a crise política, todas arrastadas pelo rolo compressor de uma economia devastada. Joaquim Levy esperava que as coisas fossem mais fáceis em matéria de ajuste econômico. Dos 111 bilhões que espera arrecadar com seu pacotão, cerca de 25 bilhões dependem do Congresso Nacional. Como se deduz, o Congresso não cederá aos argumentos que a equipe econômica levanta. Como se viu na devolução da MP 669. Como se vê no repúdio das MPs 664 e 665, assumido publicamente por empresários e centrais sindicais, em grande reunião feita segunda feira passada na FIESP. Independência A crise política que se desenvolve na esteira da lista do procurador Rodrigo Janot deflagra algumas consequências : deputados e senadores tendem a assumir uma postura de maior independência em relação ao Poder Executivo, deixando, assim, de serem meros agentes de convalidação das matérias encaminhadas pelo Palácio do Planalto. Para efeito de opinião pública, o corpo parlamentar, mais independente do Executivo, será bem visto, principalmente nesse momento em que a chefe do Executivo é o alvo principal do bombardeio que parte da sociedade. Longe de impeachment O impeachment, como se sabe, é um ato político. E, claro, o ato político recebe impulso quando as forças vivas da nação se integram, em uníssono, em torno de um empreendimento como o de retirar alguém legalmente escolhido pelo povo para governá-lo. Não há fato concreto que possa incriminar a presidente da República. Essa versão de que sabia disso e daquilo sobre propina, como se pode concluir, é matéria polêmica. A culpa por irresponsabilidade na gestão pública também é objeto de muita discussão. Ao contrário de denúncias e provas de que fulano, beltrano e sicrano receberam recursos em espécie de outros fulanos e empresas. Sob essa teia complexa, o fato é que o impeachment da presidente é mais torcida de segmentos e setores que probabilidade política. Conchavo Premido pelos casuísmos, Tancredo Neves foi obrigado a fundir o seu PP com o MDB de Itamar. Alguns pepistas pularam do barco e protestaram alegando conchavo. Tancredo foi curto e seco : "Conchavo é a identificação de ideias divergentes formando ideias convergentes". Tinha razão. Há curvas que desembocam em retas. Petrolão : onda crescerá ? A imagem que o petrolão sugere é a de um tsunami no meio do oceano : pode amainar ao chegar à praia ou ganhar mais volume e arrebentar o território. Não há ainda condição de enxergar qual a alternativa. É possível que crie situações embaraçosas para outras figuras de porte da República ? Sim. E poderão tais figurantes entrar na lista de implicados ? A resposta, nesse caso, será política. Qualquer decisão nessa direção vai depender da temperatura econômica do momento em que tais revelações ocorrerem (se ocorrerem). Pelo visto, essa grande onda atravessará mais que um par de anos. Chegará às margens de 2018. E poderá fazer naufragar projetos eleitorais de um ou outro. Se o leitor estiver pensando em Lula, acertou na mosca. Renan e Cunha Não se pense que os presidentes do Senado e da Câmara, Renan Calheiros e Eduardo Cunha, perderão seus vetores de força porque foram incluídos na lista de Janot. Continuarão a presidir as Casas Legislativas durante toda a legislatura. E com maior independência. A conferir. Mercadante e Pepe O ministro Aloísio Mercadante começa a ser demonizado, atribuindo-se a ele a razão principal da desarticulação política. Pode deixar a articulação política e ficar apenas na área administrativa ? É possível. Será que tem faltado habilidade ao poderoso chefe da Casa Civil ? Ou será que o conjunto de crises do momento - política, econômica, hídrica, energética, de credibilidade, petrolão - não tem sido o motor quebrado que inviabiliza a máquina da articulação política ? Esta mesma referência serve para abrigar o ministro Pepe Vargas. Dizem que é um bom sujeito. Um nome adequado Eliseu Padilha tem o dom da articulação política. Henrique Alves, ex-presidente da Câmara, também tem seu nome citado para as Relações Institucionais. Ambos do PMDB. Seriam nomes adequados para fazer a ponte entre o Palácio do Planalto e o Congresso. Mas os petistas topariam um peemedebista nesta função ? Eis a questão. Núcleo institucional É do vice-presidente Michel Temer a ideia de a presidente Dilma formar um núcleo institucional, a ser integrado por ministros próximos a ela e mais os líderes partidários. Trata-se de abrir a análise da conjuntura política com quem efetivamente tem poder de mando e controle no Congresso. A presidente aceitou a sugestão, sem prejuízo de continuar a se valer de seu núcleo duro. Tofolli no comando A mudança do ministro Dias Toffoli para a segunda turma lhe conferirá a participação na operação Lava Jato. Toffoli pediu a transferência. Vai ganhar muita visibilidade. E será objeto de polêmica. O dia da CUT Será sexta, dia 13. Vai para as ruas lutar contra as MPs 664 e 665 e, de sobra, defender a Petrobras. Defender de que ? De ameaça de privatização. P.S. A petroleira está vendendo ativos para apurar uns 30 bilhões e suprir seus esvaziados cofres. O dia da mobilização Domingo, dia 15, as ruas de muitas capitais serão ocupadas por gente de todos os calibres. Não serão apenas classes médias e elite branca, como alguns pregadores vêem. Turismo sente o golpe As crises política e econômica já respingam no turismo nacional. As vendas da maioria das agências de viagens do país diminuíram no verão deste ano em comparação com o ano passado, segundo uma pesquisa do Ipeturis - Instituto de Pesquisa, Estudos e Capacitação em Turismo. Pelo estudo, 59,3% das empresas consultadas em todo o país tiveram queda na temporada. "Enquanto o quadro político estiver assim, com o Executivo brigando com o Legislativo e com denúncias de corrupção, haverá insegurança e, consequentemente, redução na intenção de viagens", explica Eduardo Nascimento, presidente do Sindetur/SP - Sindicato das Empresas de Turismo no Estado de São Paulo. Fim das coligações proporcionais Senado avança na reforma política, aprovando o fim das coligações nas eleições proporcionais (deputados Federais, estaduais e vereadores). O objetivo é fortalecer os partidos e acabar com as trocas fisiológicas e arrefecer as siglas de aluguel. O que é o povo ? Vejam essa : "o poder real em uma sociedade moderna está na sociedade civil, não no povo, o que configura uma crise política grave". A frase é de Luiz Carlos Bresser Pereira, ex-ministro dos governos Sarney e Fernando Henrique. Puxa vida, estou desaprendendo a cada dia : o povo não faz parte da sociedade. Tributação sobre cruzeiros A CLIA ABREMAR BRASIL (Associação Brasileira de Cruzeiros Marítimos) recebeu, em SP, Cynthia Gingrich, vice-presidente de Tributação Corporativa da Royal Caribbean International, e Jim Border, vice-presidente e membro do Conselho Fiscal Mundial do Grupo Carnival, com o objetivo de esclarecer as inúmeras tributações que incidem sobre o setor no Brasil. A reunião foi coordenada por Marco Ferraz, presidente da Associação, e por Mário Franco, Consultor Tributário. Retração Entre as grandes preocupações estão a cobrança de IR sobre remessas de serviços turísticos, que pode valer a partir 2016 ; a cobrança de taxas de importação não apenas sobre itens comprados a bordo, mas também sobre os itens consumidos nos navios, tais como alimentos e bebidas ; o aumento da cobrança de PIS/COFINS a partir de 1º de maio deste ano ; a cobrança de PIS/COFINS para combustíveis e fretamentos ; entre outras taxações que, segundo Cynthia Gingrich, representam um forte retrocesso do setor no país. A próxima reunião do Grupo Tributário da CLIA será na próxima semana, em Miami, durante o Cruise Shipping, um dos maiores eventos mundiais do setor de cruzeiros marítimos. Quiçá e cuíca Fecho a coluna com uma historinha das MG. Benedito Valadares, governador, foi a Uberaba para abrir a Expozebu. E passou a ler o discurso preparado pela assessoria. A certa altura, mandou ver : "cuíca daqui saia o melhor gado do Brasil". Ali estava escrito : "quiçá daqui saia o melhor gado". A imprensa caiu de gozação. Passou-se o tempo. Tempos depois, em um baile na Pampulha, o maestro, lembrando-se do famoso discurso na terra do zebu, começou a apresentar ao governador os instrumentos da orquestra. Até chegar na fatídica cuíca. E assim falou : "e esta, senhor governador, é a célebre cuíca". Ao que Benedito, querendo dar o troco, redarguiu com inteira convicção : - Não caio mais nessa não. Isto é quiçá ! (Historinha enviada por J. Geraldo).
quarta-feira, 4 de março de 2015

Porandubas nº 434

Abro a coluna com o riso da política, um "causo" da BA. O que eu sou ? O caso é engraçado, mas verídico. O farmacêutico Claodemiro Suzart, candidato do PTB à prefeitura de Feira de Santana, decidiu fazer o comício de encerramento da campanha na rua do Meio, na zona do meretrício. E jogou o verbo : "o povo precisa estudar a vida dos candidatos, desde o nascimento deles, os lugares onde nasceram, para saber em quem votar direito". Por exemplo, Arnold Silva, da UDN, nasceu em Palácio, nunca falou com o povo. O que ele é ? - Candidato dos ricos - gritava a multidão - É isso mesmo. Não pode ter o voto de vocês. E Fróes da Mota, candidato do PSD, nunca sentiu o cheiro de povo. Só gosta mesmo é do gado de sua fazenda. O que ele é ? - Candidato dos fazendeiros - delirava a galera - Isso mesmo. Não pode ter o voto do povo. Já eu, meus amigos, nasci aqui, nesta rua do Meio, a mais popular de Feira de Santana. E eu, meus amigos, o que eu sou ? Lá do fundo da turba, um gaiato soltou a voz : - Filho da puta. O comício acabou ali. (Historinha hilária do amigo Sebastião Nery). A cidade ideal - I A cidade ideal de Aristóteles deveria ter não mais que cinco mil habitantes, o que permitiria que todos se conhecessem, ao menos de vista. A cidade ideal de Platão teria funções bem definidas e administradas por três tipos de almas : os filósofos, almas racionais, a quem deveria ser entregue o governo ; os guerreiros, almas irascíveis, que se encarregariam da defesa e da manutenção da ordem ; e os produtores, espíritos concupiscentes, para os quais estariam reservadas as atividades econômicas de produção de bens. A cidade ideal de milhares de prefeitos no Brasil deve ser um território cheio de obras. Culto ao obreirismo faraônico. Horas tensas As próximas horas serão tensas na seara parlamentar. A famosa lista de Janot, enviada ao STF, agita os ânimos. Se não houver condenação direta, apenas pedido de investigação e abertura de inquéritos, haverá um bom tempo para deputados (em maior quantidade) e senadores (em menor quantidade) ganharem fôlego. A fase de inquérito deverá demorar, mas não tanto quanto o mensalão. Essa divisão do STF em turmas dará maior celeridade aos processos. O ministro Teori Zavascki abrirá o sigilo ? Essa é a questão nesse momento. Ou divulgará os nomes de acordo com as apurações feitas ? O procurador, ao que se diz, teria solicitado divulgação geral. Efeitos Seja qual for a lista e seu tamanho, provocará efeitos sobre o Congresso. Nesse momento, em que a presidente Dilma se ressente de baixa avaliação, uma teia envolvendo parlamentares impactaria negativamente o Congresso e, nessa textura, o Executivo poderia se sentir mais aliviado. Ou seja, as fragilidades se encontrariam na bifurcação de imagens corroídas pela crise. Na Câmara, pode-se projetar a tendência de uma defesa corporativista : um por todos, todos por um. Se um deputado, por exemplo, entrar na agenda do Conselho de Ética da Câmara, outros também serão ali julgados. A recíproca é verdadeira. Pressão da opinião pública Veríamos, então, de um lado uma fortaleza na defesa parlamentar sendo bombardeada pelos canhões midiáticos, cujos artefatos serão produzidos com os sentimentos da opinião pública na forma de indignação, repulsa, rejeição, insatisfação. O Congresso tenderá a reagir por meio de pautas positivas e um discurso de independência. Aliviará a carga sobre ele, mas não a ponto de receber aplausos. Principalmente porque o clima ambiental deverá receber altos níveis de poluição. Vejamos. O clima ambiental Vejamos como o clima será afetado pelos ares das circunstâncias. Primeiro, o Congresso terá de apreciar o fabuloso pacote de Joaquim Levy, que visa arrumar R$ 111 bi para os cofres do Tesouro, a partir de três fontes : 1. Corte de despesas ; 2. Diminuição de subsídios ; 3. Aumento de tributos. Os setores que foram beneficiados pelas desonerações já começaram a botar a boca no trombone. O desemprego já começa a inundar as ruas, a partir da Petrobras e das empreiteiras. A projeção para o PIB deste ano é a da maior retração em 25 anos. O movimento dos caminhoneiros já contabiliza aumento de até 70% para alguns produtos hortifrutigranjeiros. As MPs 664 e 665, que tratam de questões trabalhistas e previdenciárias - acesso ao seguro desemprego, ao abono salarial, à pensão por morte, ao auxílio-doença e ao seguro-defeso pago aos pescadores no período de proibição de suas atividades - são bombardeadas pelas centrais sindicais. A reação das massas Os conglomerados das margens começam a reagir de forma mais dura quando o bolso é atingido pelas políticas governamentais. Ora, isso já começou. A inflação real, não a artificial/criativa, já orbita em torno de 8%. Logo, o bolso já aperta a barriga. A carestia é uma palavra que volta ao vocabulário das ruas. Junte-se ao bolso mais vazio das periferias o transporte mais caro. A energia acaba de ser reajustada em 40%, com mais aumentos nos próximos meses. Os combustíveis também entram na rota de subida. Ora, não se faz omelete sem quebrar os ovos. E o omelete de Joaquim Mãos de Tesoura Levy está sendo preparado para agradar à bocarra da economia. Afinal, foi para isso que foi convocado. Por isso, enxerga-se expansão do Produto Nacional Bruto da Insatisfação Social (PNBIS). Dia 13 Temos à vista dois eventos sobre os quais devemos observar com atenção. O primeiro é o movimento da CUT, dia 13, para defender a Petrobras e, por consequência, o próprio governo. O argumento é o de que a petroleira sofre ameaças de privatização. E que, nesse momento, as forças da Direita se mobilizam para desestabilizar o país. O discurso serve como sinal de despiste. No fundo, objetiva criar uma frente de defesa do governo, cuja avaliação atinge índices muito ruins. Mas a velha CUT perdeu o eixo. De um lado, vai às ruas contra o governo, pedindo mudanças drásticas nas MPs 664 e 665. Ou seja, tem um discurso contra o governo, no qual enxerga o machado que corta a árvore dos benefícios trabalhistas. De outro lado, vai às ruas defender a Petrobras e o governo. Em quem acreditar ? Dia 15 No dia 15, as redes sociais e algumas entidades promovem um mutirão nacional contra os desvios e a roubalheira e, ainda na pauta, fazem um clamor pelo impeachment da presidente. Será uma manifestação extraordinária. Primeiro, urge lembrar que o dia será um domingo. As galeras deixarão seu lazer para ir às ruas ? É possível que essa arregimentação tenha mais efeito junto a setores e categorias organizadas das classes médias. Este consultor ainda não vê a movimentação de conglomerados das margens sociais. O movimento deverá se ater às grandes cidades. E poderá engrossar um pouco mais se o evento do dia 13 gerar conflito ou balbúrdia. Ou seja, os eventos estarão integrados nos polos da ação e reação. O olho do furacão A verdade é que o olho do furacão ainda não apareceu. Essa terrível visão poderá ocorrer mais adiante, se a situação destrambelhar. Para que isso ocorra, a par da inflação mais alta, desemprego dando o tom, aumentos gerais de produtos das gôndolas, teríamos, ainda, ameaças de apagão, se o consumo de energia não for reduzido. A questão da água, apesar de chuvas intermitentes em algumas regiões, ainda pesa em áreas do Sudeste e do Nordeste. Follow the money "Se tiver dificuldade de vincular a cúpula, siga o velho conselho norte-americano : follow the money". (Juiz Sérgio Moro) TT na ótica mundial Annemarie Muntz, presidente da Confederação Internacional das Agências Privadas de Emprego (CIETT), está no Brasil para uma série de reuniões que visam estabelecer metas para o pleno desenvolvimento do setor de Trabalho Temporário (TT) em nosso país. Ao redor do mundo são 40,2 milhões de trabalhadores temporários. Amanhã, 5/3, a especialista participa do Fórum CIETT/Sindeprestem no Hotel Tivoli, (al. Santos, 1437,SP), a partir das 9h. A abertura será coordenada pelo presidente do Sindeprestem e da Fenaserhtt, Vander Morales, pelo presidente da Clett&A, Fernando Calvet e pelo presidente da Cebrasse, Paulo Lofreta. Tucanos em cima do muro Os tucanos apreciam contemplar a cena em cima do muro. Vejam Fernando Henrique. Ele disse que o tucanato apoia o movimento do dia 15, mas é contra o "fora, Dilma". Claro, quer se referir ao "fora, FHC", dos tempos passados. Apoiar o movimento das ruas, mas ser contra o discurso que a turba expressará, mais parece o dilema : ser ou não ser, uma no cravo, outra na ferradura. - 3% do PIB As projeções se ampliam. A mais recente projeção fala de 0,58% negativos. Mas há quem aposte em -3%. E até mais. O país entraria em clima de caos. Alerta do SINSTAL As recentes medidas do ajuste fiscal anunciadas pelo governo vão interromper o desenvolvimento das telecomunicações em nosso país e provocar demissões em massa no setor. As empresas de Telecom investiram mais de R$ 19 bilhões em 2014 e são responsáveis por mais de um milhão de empregos. O fim das desonerações, alterações do PIS/COFINS e mudanças nas áreas trabalhistas dão uma ideia do cenário sombrio para o Brasil a partir de agora, ao contrário de todas as promessas de campanha da presidente Dilma. O setor produtivo nacional vai custear todo o programa de ajustes do governo. A engenheira Vivien de Mello Suruagy, presidente do SINSTAL (Sindicato Nacional das Empresas Prestadoras de Serviços e Instaladoras de Sistemas e Redes de TV por Assinatura, Cabo, MMDS, DTH e Telecomunicações), teme um retrocesso grave no desenvolvimento do país. PT x PT As querelas entre alas do PT continuam. Sempre existiram, mas no momento atingem seu clímax. Trata-se de lutar pelo domínio da máquina petista. E de ter mais peso na estrutura governativa. Dilma começa a ouvir Depois do ciclo da autossuficiência, vem o ciclo da modéstia. A presidente Dilma começará a ouvir os líderes dos partidos governistas. É o anuncia o vice-presidente Michel Temer. Levy e os petistas O ministro Joaquim Levy está encontrando muitas dificuldades para convencer os deputados petistas sobre o programa de ajustes econômicos do governo. Mais que as barreiras encontradas junto a outras bancadas. O PT gosta de bônus, não de ônus. O caranguejo O rei pediu a Chuang-Tsê que desenhasse um caranguejo, missão que o desenhista prometeu cumprir em cinco anos, e muito bem recompensada. Passado o tempo, o rei cobrou-lhe o desenho, mas ele pediu mais cinco anos. Após o décimo ano, o rei voltou à carga. O pintor, então, pegou o pincel e, num instante, com um único gesto, desenhou o mais perfeito caranguejo que jamais se viu. O Brasil precisa da agilidade de Chuang-Tsê. Cidade ideal - II A cidade ideal é aquela que respeita o cidadão. Enquanto essa cidade não aparece, podemo-nos contentar com a poesia de Luiz Enriquez e Sérgio Bardotti, na versão cantada de Chico Buarque : "Deve ter alamedas verdes/a cidade dos meus amores/e, quem dera, os moradores/e o prefeito e os varredores/e os pintores e os vendedores/as senhoras e os senhores/e os guardas e os inspetores/fossem somente crianças". Amigo do papa Fecho a coluna com outra historinha de Nery : Rui Carneiro, paraibano matreiro, era candidato a senador pelo PSD, em 1955. A UDN tinha apoio dos comunistas. Rui esteve na Europa, voltou, foi fazer o primeiro comício da campanha : - Paraibanos, estive em Roma com o papa. Ele me cochichou : "Rui, se destruírem meu trono aqui no Vaticano, sei que tenho um grande amigo lá na PB. Vá, dê lembranças à comadre Alice e diga ao povo que estou com você". Ganhou a eleição!
quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Porandubas nº 433

Abro a coluna de hoje com um conto milenar japonês, enviado pelo amigo Eduardo Nascimento, ele mesmo um bom colecionador de causos. O nascimento do peru "Em uma planície, viviam um urubu e um pavão. Um dia, o pavão começou expressar certa angústia : - Sou a ave mais bonita do mundo animal, tenho uma plumagem colorida e exuberante, porém nem voar eu posso, de modo a mostrar a minha incomparável beleza. Feliz é o urubu que é livre para voar para onde o vento o levar. O urubu, por sua vez, também refletia no alto de uma árvore : - Que infeliz ave sou eu, a mais feia de todo o reino animal ; e ainda tenho que voar e ser visto por todos. Quem me dera ser belo e vistoso tal qual aquele pavão. E aí as duas aves, pensando sobre suas conveniências e inconveniências, tiveram uma brilhante ideia : deveriam se juntar para realizar um cruzamento. O fruto que desse cruzamento surgiria seria uma ave esplendorosa, magnífica, um descendente que iria combinar o voo tão aerodinâmico do urubu com a graciosidade e elegância do pavão. Cruzaram-se. E daí nasceu o peru ! Que é feio pra cacete e não voa ! Moral da história, senhoras e senhores : se a coisa está ruim, não invente! Gambiarra só dá m....! Mais uma vez, o PMDB O plano de arrefecer o PMDB não deu certo. Era intenção do núcleo duro do Palácio do Planalto. Os "estrategistas" no entorno da presidente quebraram a cara. Viram que as derrotas dos planos governamentais viriam em série, caso o PMDB não estivesse no centro das articulações. As derrotas começaram a acontecer. Lula entrou correndo para alertar : não deixem o PMDB de lado ; corram para trazê-lo ao seio do governo. Mercadante se apressou para conversar com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha. O mais importante articulador do partido, o próprio vice-presidente Michel Temer, foi acionado. Recebeu a visita do líder do governo na Câmara, José Guimarães. Promoveu um jantar para que Joaquim Levy explicasse as medidas do ajuste fiscal ao comando do partido. E assim, mais uma vez, o PMDB aparece na hora H para diminuir o rombo nos costados do governo. PT com duas caras O PT está entre a cruz e a caldeirinha. De um lado, tem de aprovar as medidas de ajuste na economia. E pede aos partidos da base para engrossar a barreira de defesa das medidas. Mas, na frente da opinião pública, o PT diz que os trabalhadores não podem suportar perdas. Sua intenção é a de aparecer como o grande braço de apoio dos trabalhadores. Dois discursos. Duas caras. Quer assoviar e chupar cana ao mesmo tempo. Impossível. Mas o PT é mestre na arte da engabelação. Querem ver mais uma ? Defesa da Petrobras Os petistas, liderados por seu braço sindical - a CUT - fazem um movimento no RJ em defesa da Petrobras. O discurso é cheio de slogans : o petróleo é nosso ; querem destruir a Petrobras ; vamos proteger a Petrobras contra as forças do atraso. E por aí vai. Mas há uma pergunta que continua no ar : e quem construiu o propinoduto que rouba os recursos da petroleira ? O PT parece dizer que não tem nada a ver com isso. Estratagema clássico do PT. P.S. Leio que Lula estará presente ao ato. O momento As crises que estamos vivenciando - econômica, política, social (manifestações de protesto), hídrica, energética, petrolão e de descrença geral - apontam para a saturação de uma era caracterizada por : invasão da coisa pública pelo negócio privado ; arrefecimento das ideologias ; pasteurização partidária ; declínio do Parlamento ; desmotivação dos eleitores ; improbidade administrativa ; impunidade ou falta de rigor nas punições ; quebra geral da ordem, do respeito às instituições e da moral ; fragmentação dos núcleos familiares ; despreparo de quadros ; descrença na Justiça. As razões E o que está por trás dessas crises ? A fluidez do Estado ; a imbricação de fronteiras entre os Poderes constitucionais ; a transformação da política em profissão altamente rentável ; a fragilidade dos mecanismos de punição ; a morosidade da Justiça ; a rotação de dirigentes e a cultura regada com a semente do fisiologismo, herdada dos nossos colonizadores. Mas há uma esperança : da crise, brota a oportunidade. No pântano, pode vicejar uma bela flor. Quem vai pagar o pato Não há sacrifício sem dor. O país começa a perambular em um calvário. Durará até quando ? Vai entrar pelo ano de 2016. Sem dúvida. E as dores do sacrifício serão sentidas, mais uma vez, pelos corpos mais frágeis. No caso, os contingentes que já sofrem as agruras de tributos e impostos em cascata. Rui está defasado ? Simulemos um debate sobre ética na política entre parlamentares e o senador Rui Barbosa. O mestre lhes diria : "Não há nem pode haver aliança entre a política e os meus interesses privados. A política é e será sempre a inimiga da minha prosperidade profissional". O parlamentar poderia retrucar : "Ética é fidelidade aos amigos". Outro arremataria : "Aos amigos, pão, aos inimigos, pau". O velho Rui, no troco, lembraria trecho do discurso de 26/12/1901, que bem poderia servir de conselho a muitos dos nossos representantes : "Vespasiano dizia que, para um imperador, decência é morrer de pé, decência é cumprir bem o seu papel". O impacto sobre o Congresso A lista do procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, chegará ao STF nos próximos dias. Ele pedirá abertura do sigilo. Há políticos incriminados com provas ; outros, sem provas, mas com indícios de crimes ; e mais um grupo apontado, sem indícios e provas. Esta turma será inocentada. A menor parte. O que poderá ocorrer ? Encaminhamento às Comissões de Ética. Os casos entrarão numa demorada liturgia. A mídia fará acompanhamento estreito. Mas a tendência do corpo parlamentar é a de inocentar suas partes. A condenação de um deflagrará a queda das pedras do dominó. Será a condenação de todos. A conferir. O rubicão Se Dilma, até o final do ano, atravessar o Rubicão, mesmo com tropeços, entrará em 2016 mais forte do que hoje. O inferno astral do PT e da presidente deverá ir até o mês de dezembro. Menos apoio A lógica é essa : quanto mais vulnerável a presidente, menos apoio terá no Congresso. A recíproca é verdadeira. Polarização PT x PSDB A polarização entre tucanos e petistas também já rendeu o que deveria render. Está saturada. A sociedade quer enxergar novas disputas entre novos atores. Quem viver um pouco mais, verá. Reforma política Aprovação do distritão (deputado Federal) e distritinho (vereadores em cidades acima de 200 mil eleitores) ; financiamento privado (pessoa física) e financiamento público de campanhas ; mudanças nas campanhas eleitorais - estes são pontos que podem abrir com sucesso a reforma política. Crise energética O país corre sérios riscos de enfrentar apagões pelos meados do segundo semestre. E a crise hídrica não arrefeceu com as boas chuvas de fevereiro. O segundo volume morto do Cantareira acaba de ser coberto e para a cobertura do primeiro volume serão necessários mais aumento de cerca de 20% na capacidade. Mas, para chegar ao nível ótimo, será necessária uma expansão bem maior da estatística. Terceirização O PL 4.330, que trata da terceirização de serviços, deverá entrar na pauta da Câmara, pinçado com outros projetos em tramitação. O que querem as centrais sindicais ? Apenas grana pesada. Elas criticam o projeto, falando em precarização do trabalho. Lorota. Os terceirizados são garantidos por convenções coletivas promovidas por seus sindicatos. Têm todos os direitos garantidos. E as empresas que faltam aos compromissos legais são objeto de fiscalização e condenação. O que querem, então, as centrais ? Que as contribuições dos terceirizados sejam feitas junto ao Sindicato das Empresas Tomadoras de Serviços. Significa, por exemplo, que a mulher que serve o cafezinho numa metalúrgica será transformada de copeira em metalúrgica. O salário será ajustado pelo patamar dos siderúrgicos. A base de arrecadação das centrais será expandida aos céus. E isso acaba com o conceito de terceirização. Uma nova ordem Maquiavel predizia : "Nada é mais difícil de executar, mais duvidoso de ter êxito ou mais perigoso de manejar do que dar início a uma nova ordem de coisas". Implantar uma nova ordem na cultura política brasileira é tarefa para duas a três gerações. MP do Trabalho O MP do Trabalho também olha a terceirização com olhos de dinossauro. Não enxerga os benefícios de um setor que, a cada dia, ganha foros de especialização. A bomba do petrolão Ricardo Pessoa, o comandante da UTC, poderá ser a bomba do petrolão. Se fizer o acordo de delação premiada e abrir o bico, será um deus nos acuda. Empresas quebradas Se as grandes empresas arroladas no affaire do petrolão entrarem em colapso e deixarem de fazer obras para o Estado, o país expandirá o clima de caos. Milhares de brasileiros serão desempregados. Não haverá outras empresas em condições de tocar as obras. Urge olhar para essa questão. A par das necessárias investigações e condenações a serem feitas. Quem muito quer... Quem muito quer, tudo perde. O PMDB do RJ começa a olhar para o futuro, colocando o prefeito Eduardo Paes na estrada governativa de 2018. Mas consolida-se a impressão de que o rapaz não tem estofo. Poderá cair do cavalo. CPI da Petrobras A crença mais forte é que a CPI da Petrobras seja mais um fórum de debates e querelas entre situação e oposição. O relator deverá ser um deputado do PT. A engenharia do encantamento A engenharia de encantamento das massas ampara-se no campo do simbolismo. Daí deriva o marketing. Que trabalha com a liturgia do poder, que se faz presente na História da humanidade como sistema para lapidar a imagem de governantes, imperadores, reis, príncipes, presidentes, políticos e celebridades. Quinto Túlio já o experimentava em 64 A.C. quando aconselhava o irmão Marco Cícero, famoso tribuno romano, candidato ao consulado, a se apresentar como um "homem novo bem preparado para conseguir a adesão entusiasmada do povo". César calculava os gestos públicos. Maquiavel ensinava o príncipe a divertir o povo com festas e jogos. Luís XIV desfilava nos espetáculos que promovia. Napoleão era um pavão vestido de púrpura quando se coroou para receber a benção do papa em Notre-Dame. Hitler foi treinado em aulas de declamação para agitar as massas, usou a cruz gamada para propagar o nazismo, podendo-se dizer que o marketing político ganha status profissional sob o comando de Joseph Goebbels, seu "marqueteiro". Dilma e os empresários A presidente Dilma começa uma nova fase de articulação com o universo empresarial. Chama empresários graúdos para ouvir seus sentimentos sobre seus setores. Ideia saudável. Mas as reivindicações setoriais não combinam com o programa de ajuste fiscal. A base do governo As próximas votações na Câmara serão decisivas para o governo medir suas forças e tomar pulso do mando sobre as bancadas partidárias. Afinal, dos 360 deputados que formam a bancada governista, nem a metade vota hoje com o governo. Leva de gaguinhos ? A legislatura que se inicia abrirá oportunidade para constatação da qualidade da expressão parlamentar. Será que vamos ter uma leva de grandes oradores ou de gaguinhos ? Vamos à historinha. Em 1976, o candidato da Arena a prefeito de Palmares/PE, renunciou. O governador de PE, Moura Cavalcanti, correu lá e pesquisou : "Quem é mais popular na cidade"? Resposta : "O gaguinho. Não fala nada". O gaguinho subiu no palanque, endeusado pela oração do governador : "Prefeito não precisa falar. Precisa agir". A multidão, comovida, aplaudia o gaguinho, que apenas gesticulava com o V da vitória. Sem um dizer um A, ganhou. Pois é. Que diferença faz eleger uma pessoa séria ou um malandro, um gaguinho ou um falastrão ? Milhões de brasileiros infelizmente assim pensam. É o preço de uma democracia claudicante.
quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

Porandubas nº 432

Água, água Nesses tempos de falta d'água, uma deliciosa historinha sobre o "precioso líquido", que vem dos confins da gloriosa PB : Brejo das Freiras é uma Estância Termal nas lonjuras da PB, lá perto de Uiraúna e Souza. Trata-se de um lugar para relaxamento e repouso. O governo da PB tinha (não sei se ainda tem) um hotel, com uma infraestrutura para banhos nas águas quentes. Década de 70. Apolônio, o garçom, velho conhecido dos fregueses da região, recebe, um dia, um hóspede de outras plagas. Pessoa desconhecida. Lá pelas tantas, quase terminando a refeição, o senhor levanta a mão, chama Apolônio e pede : - Meu caro, quero H2O. Susto e surpresa. Anos e anos de serviços ali no restaurante e ninguém, até aquele momento, havia pedido aquilo. Que diabo seria H2O ? Apolônio, solícito : - Pois não, um instante ! Aflito, correu na direção da única pessoa que, no hotel, poderia adivinhar o pedido do hóspede. Tratava-se de Luiz Edilson Estrela, apelidado de Boréu (por causa dos olhos grandes de caboré), boêmio e galanteador, acostumado aos salamaleques da vida. - Boréu, tem um senhor ali pedindo H2O. O que é isso ? Desconfiado, pego sem jeito, Boréu coça o queixo, olha pro alto, tenta se lembrar de algo parecido com a fonética e, desanimado, avisa : - Apolônio, sei não. Consulte o Freitas. Freitas era o diretor do grupo escolar, o intelectual da região. Localizado, o professor tirou a dúvida no ato : - H2O é água, seus imbecis. Quer dizer água. Água. Ignorantes. Apressado, Apolônio socorreu o freguês com uma jarra do líquido. Depois, no corredor, glosando o feito, gritou em direção a Boréu : - Ah, ah, ah, esse sujeito lascou-se. Achava que nós não sabia ingrês. As crises e a índole As crises se integram para formar as nuvens de uma tempestade perfeita : crise econômica, com recessão e retração do PIB em 1% este ano ; aumento de impostos ; juros altos ; poder de compra reduzido, etc. Crise política, com rebuliço no Congresso, a partir da relação de nomes envolvidos no petrolão ; nova legislatura, com presidente da Câmara eleito contra a vontade do Palácio do Planalto. Crise hídrica, com a falta de chuva secando o poço da imagem dos governantes e mexendo com o ânimo dos consumidores. Crise energética, com grandes riscos de apagões no segundo semestre deste ano. Crise social, com as ruas infladas de movimentos indignados. Crise de confiança. Crise de credibilidade. Que isso tem a ver com a índole dos governantes ? A índole contribui para apertar os cinturões das crises ? Resposta : sim ! A índole de Dilma Dilma, a mandatária-mor, tem ojeriza à política nos moldes como nossa cultura ordena : balcão de recompensas, troca-troca, benefícios, votos sob influência do orçamento, cargos nas estruturas do governo, etc. O corpo político sabe disso. E aproveita para jogar mais lenha na fogueira. Se a presidente não tem disposição para cozer o feijão com o arroz da política, que arrume bons cozinheiros para sua cozinha. Ora, ela escolheu três gourmets gulosos : Aloizio Mercadante, Pepe Vargas e Miguel Rossetto. Que não são craques na articulação política. Falta-lhes o jogo de cintura. Por isso mesmo, a imagem do governo vai mal. E a presidente, com sua índole, contribui para expandir os atritos e conflitos. A imagem dos governos A imagem dos governos é a projeção de sua identidade. E a identidade é a soma dos conteúdos - ações, programas, promessas, rotinas, processos, sistemas, projetos, etc. Se os conteúdos não estão se desenvolvendo a contento, não há milagreiro que possa melhorar a imagem dos governos. Não há comunicação capaz de provar que o Brasil está vivendo momentos de fartura : água, energia, bons transportes, alimentos baratos, felicidade geral. O engodo não resiste à realidade. Não se tapa o sol com peneira. Os buracos não deixam. A imagem é, portanto, resultado do que se faz, do que se opera, do que se percebe. E a cognição social sobre o governo Federal não é boa. Limpando a imagem O que se pode fazer é uma limpeza periódica no painel da imagem. Nesse caso, os comunicadores dos governos devem trabalhar com as cinco pernas do marketing institucional : a pesquisa, o discurso, a comunicação, a articulação e a mobilização. Pela pesquisa, identificam-se os pontos positivos e negativos da imagem. O discurso precisa ser composto a partir dos inputs da pesquisa. Nesse ponto, cabe lembrar que o discurso comporta programas e projetos mais adequados para responder às demandas sociais. A comunicação abre as pontes do governo com a sociedade, levando suas ideias e intenções. A articulação complementa o esforço de ajustamento com os exércitos da política e dos movimentos sociais. E, por último, a mobilização é o motor que gira a agenda dos governantes : visitas às regiões, contatos com as massas, encontros com grupos organizados, etc. Quem pensa assim ? Perguntinha do momento : há alguém no governo que pense dessa forma ? Há alguém que entenda de comunicação e marketing como ferramentas estratégicas ? Quem faz a ligação entre os elos - pesquisa, discurso, comunicação, articulação e mobilização ? Thomas Traumann, o ótimo jornalista da grande mídia ? Mercadante, um ex-senador com fama de auto-suficiente ? Rossetto, um quadro da militância preocupado em abrir diálogo com os movimentos sociais ? Ou João Santana, o perito na arte publicitária, produtor de firulas nas campanhas de propaganda ? Comunicação governamental é algo mais complexo que campanha publicitária ou briefings jornalísticos para orientação da presidente. O périplo de Lula Lula está montando sua estratégia para tentar resgatar o vetor de peso da presidente Dilma. Como se viu pela pesquisa Datafolha, ela perdeu 40 pontos na boa avaliação. Lula vai viajar Brasil afora, mas em vez de rápidas passagens, deverá permanecer nas regiões alguns dias e mesmo semanas. Tentativa de correr o interior dos Estados, falando com prefeitos, vereadores e lideranças políticas e institucionais, a par de movimentos sociais. É claro que nessa nova caravana do lulismo, ele estará jogando seu nome nas ruas. Se essa for realmente a ideia, há um lado perverso na estratégia : antecipa o final do governo Dilma. O Volta, Lula assumirá maior visibilidade que o governo Dilma. A estética À guisa de provocação : Você imaginaria Jesus Cristo sem barba ? E Abraham Lincoln, seria o mesmo sem a barba ? Que tal um Ghandi cabeludo ? Elvis Presley sem o topete teria o mesmo charme ? O código estético é o primeiro a se infiltrar na mente. Geraldo cai Geraldo Alckmin também caiu na lorota de afirmar, por vezes seguidas, que não haveria falta d'água em SP. Teve queda de 10 pontos na imagem positiva. Pois bem, o racionamento já começou, apesar da tentativa do governo de disfarçar a decisão. No melhor cenário, se chover muito, a água vai faltar lá para os meados do segundo semestre. O que exigirá forte racionamento, algo como cinco dias de racionamento por dois dias de água na torneira. PMDB e PT Não interessa ao PMDB discutir coisas como impeachment, etc., como muitos pensam. O que há é muita especulação em torno do tema. Interessa mais que o PT deixe a arrogância de lado e seja mais parceiro dos partidos de base. Levy segura a peteca ? Gente de estofo na economia garante que o esforço de Joaquim Levy dará com os burros n'água. A retração puxará o PIB para a banda negativa. Sem crescimento, o país ficará patinando. Sem sair do lugar. Desemprego, nesse cenário, expandiria o Produto Nacional Bruto da Infelicidade. Três historinhas 1. Condenado à morte por corromper a juventude, Sócrates, o filósofo, recusou a oferta para fugir de Atenas sob o argumento de que seu compromisso com a polis não lhe permitia transgredir as regras. Os gregos cultivavam o respeito à lei. 2. Lúcio Júnio Bruto, fundador da República Romana, libertou seu povo da tirania de Tarquínio, derrubando a monarquia. Mais tarde, executou os próprios filhos por conspirarem contra o novo regime. Pregava o poeta Horácio : "Doce e digno é morrer pela Pátria". 3. Outro romano, rico e matreiro, conta Maquiavel no Livro III sobre os discursos de Tito Lívio, deu comida aos pobres por ocasião de uma epidemia de fome e, por esse ato, foi executado por seus concidadãos. O argumento : pretendia tornar-se um tirano. Os romanos prezavam mais a liberdade do que o bem-estar social. O melhor enredo ? Os relatos sugerem a seguinte pergunta : qual dos três personagens se sairia melhor caso o enredo ocorresse dentro do cenário da política contemporânea ? O terceiro, sem dúvida. Não seria executado por alimentar a plebe, mas glorificado, mesmo que por trás da distribuição de alimentos escondesse a intenção de alongar um projeto de poder. Essa é a hipótese mais provável em países, como o Brasil, de forte tradição patrimonialista e com imensas parcelas marginalizadas e carentes. FHC no Lava Jato ? O ministro José Eduardo Cardozo, da Justiça, afirma que a era FHC também entra na Operação Lava Jato. É o caso de conferir. Cada ciclo deve ter suas contas abertas. Em Cuba A propósito, Fernando Henrique e sua mulher passarão o carnaval em Varadero, em Cuba, a charmosa praia cheia de hotéis cinco estrelas, que os cubanos não podem frequentar. Terá encontro com Fidel ? Não pensem nisso. A imagem seria um estraga-prazer no carnaval dos tucanos. Justiça do Trabalho A Justiça do Trabalho é o fulcro dos gargalos no Judiciário. Acusada de expandir a burocracia e de legislar. Esforça-se para segurar velhos processos e métodos com o objetivo de evitar perda de poder. Quanto mais poder de punição, mais forte fica. Daí ter se posicionado contra novas regras para a flexibilização das relações capital/trabalho. 600 emendas A MP com mudanças na legislação trabalhista deverá receber uma enxurrada de 600 emendas no Congresso. Vai ser difícil alcançar consenso. PEC da Bengala A PEC da bengala começa a andar. Já não se trata de hipótese impossível a aposentadoria dos juízes aos 75 anos. Ativos e passivos John Stuart Mill, um dos pensadores liberais mais influentes do século 19, classificava os cidadãos em ativos e passivos, aduzindo que os governantes preferem os segundos, mas a democracia necessita dos primeiros. A comparação do filósofo inglês, pinçada por Norberto Bobbio em seu livro "O Futuro da Democracia", expressa, ainda, a ideia de que os súditos são transformados num bando de ovelhas a pastar capim uma ao lado da outra. Ao que Bobbio acrescenta : "Ovelhas que não reclamam nem mesmo quando o capim é escasso". Pois bem, por estas bandas, apesar do capim farto, equinos, caprinos e bovinos rompem o cabresto e saem dos currais. E mais, não querem ser comparados a animais irracionais e dóceis. A notícia boa é que a imagem acima desvenda um Brasil cidadão que decidiu expurgar o passado do voto amarrado à distribuição de benesses e à opressão dos senhores feudais da política. À guisa de conclusão "Misia Sert dominava a arte de caçar moscas. Estudava pacientemente os modos destes animais até descobrir o ponto exato em que havia de introduzir a agulha para pregá-las sem que morressem. Exímia na arte de fazer colares de moscas vivas, entrava em frenesi com a celestial sensação do roçar das patinhas desesperadas em seu colo." Conto de Elias Canetti. Um flagrante das esquisitices humanas. E assim caminha a humanidade...
quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Porandubas nº 431

Abro a coluna com duas historinhas que mostram a verve mineira. Mudou de nome ? Mariana, em MG, já foi chamada de Roma brasileira. Terra de fé e de velhas igrejas. E cheia de placas com nomes engraçados nas ruas : - Cônego Amando - Armando Pinto Cônego Amando era conhecido pela verve. Um dia, viajando pelo interior do município, uma de suas acompanhantes caiu do cavalo. Rapidamente ficou em pé. Meio sem graça, perguntou ao Cônego : - O senhor viu a minha agilidade ? - Minha filha, respondeu, eu até que vi. O que eu não sabia é que tinha mudado de nome. (Historinha de Zé Abelha em "A Mineirice") Pleonasmo Político tão esperto quanto simplório, Benedito Valadares era governador de MG quando encontrou na ante-sala de Getúlio Vargas o ministro da Educação, Gustavo Capanema, que estranhou seus óculos escuros. - É uma conjuntivite nos olhos - explicou Valadares. - Benedito, isso é um pleonasmo ! - reagiu o ministro, professoral. Valadares ignorou a observação e entrou para falar com Vargas. O presidente também estranhou os óculos escuros. Ele reagiu : - Presidente, o médico lá em Minas disse que era uma conjuntivite nos olhos, mas o Capanema, que quer ser mais sabido que os médicos, me disse que é um pleonasmo ! Em minha modesta interpretação penso que Capanema estava certo, existe outro lugar para dar conjuntivite, a não ser nos olhos ? Janot, o nome O nome mais temido nas próximas semanas : Rodrigo Janot, procurador-Geral da República. Sua expressão : combate à corrupção é prioridade. Sairá dele a relação de nomes de políticos. A ser encaminhada ao STF. A derrota do governo O governo saiu bastante ferido da batalha travada no Parlamento. No Senado, até que a vitória de Renan Calheiros contou com o apoio dos senadores do PT, com uma possível quebra de quatro votos. Na Câmara, a derrota foi humilhante, eis que Eduardo Cunha, eleito com 267 votos, deixou Arlindo Chinaglia apenas com 136, enquanto Júlio Delgado, do PSB, teve 100. A que deve essa fragorosa derrota ? Aos articuladores do governo, a começar pelo deputado Pepe Vargas, ministro das Relações Institucionais. Foi áspero no diálogo. Teria feito ameaças. A par disso, o chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, é considerado auto-suficiente, arrogante. Desidratar o PMDB Pepe Vargas foi escolhido pela proximidade gaúcha com a presidente. Não é um parlamentar com experiência de articulação. Mas a presidente, por seu estilo, não olha para essas coisas. Mercadante, por sua vez, é considerado o mentor da ideia de "desidratação" do PMDB, pela qual incentiva Kassab a resgatar o PL e fazer a fusão desse novo partido com seu PSD. A meta é a de atrair uma boa leva de parlamentares, incluindo peemedebistas. Com uma bancada maior que a do PMDB, o novo ente partidário abriria espaço para o projeto de poder de Kassab, que se transformaria no principal aliado do PT. O mundo é mesmo engraçado. O tiro pode sair pela culatra. Distanciamento No longo prazo, é possível enxergar distanciamento entre PMDB e PT. Afinal, esses dois partidos já avisaram que não abrirão mão de seus candidatos à presidência da República em 2018. Certamente, esse processo contará com a arrumação dos exércitos de vanguarda, a serem preparados na eleição de 2016, com a eleição dos prefeitos e vereadores. O PMDB quer continuar a ser o maior ente partidário do país. Logo, contará com candidatos próprios no maior número de municípios. Cunha será uma cunha ? Eduardo Cunha agirá partidariamente. Se o PMDB continuar maltratado pelo núcleo petista do poder efetivo, certamente o novo presidente da Câmara será instado a dar respostas. Eduardo Cunha está afinado às bases do partido. Portanto, deve corresponder aos anseios do corpo parlamentar. Sua atitude será a de independência, claro, na esteira das atitudes e gestos de boa ou má vontade do Executivo. As camadas tectônicas provocadas pela eleição devem se acomodar. Portanto, Cunha só será uma cunha aos desígnios do Executivo, caso este aja como adversário. Claro, neste caso tem mais a perder do que a ganhar. O novo presidente da Câmara é considerado uma águia : inteligente, rápido, trabalhador, cumpridor de palavra, amigo dos amigos. PT sem cargos O PT ficou sem os três cargos a que teria direito na Mesa Diretora na Câmara, porque os cedeu a aliados. E poderá ficar de fora do comando de Comissões importantes como a CCJ. Será um "deus nos acuda". Pela primeira vez em muitos anos, o PT é deslocado para a periferia do centro. O PT tentará, sexta próxima, em BH, unir suas alas. Quem vai pôr cola é Lula, o convidado especial do encontro. Significados Afinal, o que significa esse deslocamento para as margens ? O troco que o partido recebe por anos e anos a fio de operações exclusivas com foco nele mesmo. O PT não é solidário, não procura agradar parceiros. A lógica do PT é : primeiro, eu ; segundo, eu ; terceiro, eu. Sem chances para outros. Um dia, esta lógica iria se voltar contra o próprio partido. E é o que acontece. O fechamento do partido, essa sua ânsia de poder absoluto, tem contribuído para formar contrariedades no seio da própria base governista. O PT está em descenso. Corroído pela maior crise de imagem de sua história. Atolado em denúncias que abatem seus quadros, desde o mensalão. De manto puro das vestais, o PT veste, hoje, um esgarçado e sujo trapo. Desdobramentos O PT terá, necessariamente, de entrar no purgatório. Para purgar seus males. Vai tentar, em seu 5º Congresso, cuja preparação se fará já nesta próxima sexta, em BH, a reencontrar o fio da meada e tentar consertá-lo. O ciclo petista terá muitas dificuldades para continuar brilhando após 2018. O espectro partidário poderá assim ser dimensionado : um forte grupo conservador, à direita ; uma larga frente social democrata, no centro e uma banda de esquerda. Radicais, em grupos menores, nas extremidades do arco ideológico. Dominó da crise I A primeira pedra é : a crise econômica. Sob o seguinte pano de fundo : cortes em todas as áreas ; aumento de impostos ; juros altos ; rebaixamento da nota de investimento do Brasil pelas agências internacionais ; recessão econômica (retração) ; desmotivação de setores produtivos ; derretimento da Petrobras ; ações judiciais contra a Petrobras nos EUA ; efeitos que impactam o topo, o meio e a base da pirâmide. Dominó da crise II A segunda pedra é : a crise política. Sob o seguinte pano de fundo : relação de nomes que receberam propina do petrolão ; abertura de investigações pelo MPF ; julgamento pelo STF ; impactos das ações no Congresso ; terremoto político. Dominó da crise III A terceira pedra é : a crise hídrica. A falta d'água em SP, no RJ, em Minas, no Nordeste e em outras regiões começa a abrir um clima de calamidade pública. Já se fala em Plano de Evacuação de SP. Para onde iremos ? A seca dos reservatórios deverá atingir seu pico em meados do ano. Até lá, a verborragia será intensa, mas a solução continuará no ar. Dominó da crise IV A quarta pedra é : a crise energética. A seca que começa a impactar os reservatórios poderá contribuir para acelerar a ocorrência de apagões. O sistema elétrico em pane abrirá um ciclo de problemas nos estabelecimentos comerciais, industriais e nas habitações. A falta de luz semeará indignação. Com forte impacto sobre a imagem dos governantes. Dominó da crise V A quinta pedra é : a movimentação social. Os movimentos sociais irão novamente para as ruas, como já está ocorrendo em SP, e a tendência de recrudescimento é bastante previsível. A contrariedade se expandirá e os aparatos policiais serão convocados a tratar dos atos de vandalismo. Vai sobrar repercussão negativa para os governantes. Dominó da crise VI A sexta pedra é : o derretimento da Petrobras. A continuar a aura de escândalos que cerca a ex-empresa orgulho do Brasil, não é fora de propósito acreditar que tanto o ex-presidente Lula como a presidente Dilma sejam jogados no olho do furacão. E o rebuliço na área política será ainda mais forte. Graça Foster A última pedrinha do dominó tem a ver com a continuidade ou a substituição de Graça Foster no comando da Petrobras. A continuar, o despenhadeiro é o que se apresenta ; a substituição poderá dar nova vida à empresa. O mercado é um ente vivo. Reage às ondas. Pode ser que a Petrobras esteja perdendo, a par da credibilidade, também a Graça. A conferir. Famílias dos presos Os executivos envolvidos no affaire Petrobras estariam recebendo forte pressão de suas famílias para abrirem o bico. Afinal, se estão presos e sem esperança de serem soltos, que abram a boca e apontem os comandantes ou patrocinadores dos desvios. É o que se comenta à boca pequena. Daí o receio de que as denúncias entrem pela porta dos maiorais. Plano A e B do PT O plano A do PT ainda é Lula em 2018. O plano B inclui Jaques Wagner. O plano B de uma ala do PT inclui Aloizio Mercadante. Que passa a ser o plano A dele mesmo. O butim Começa agora a segunda fase de repartição do butim. Os partidos aliados deverão ser contemplados com espaços no segundo e terceiro escalões. Vai ser pressão e contrapressão de todos os lados. Não haverá cargos suficientes para atender a todos. A insatisfação continuará. Governos estaduais Os novos governantes estaduais enfrentarão a maior crise das últimas décadas em suas administrações. Abrirão o ciclo de "vacas magras" com o pires na mão. Mas quem poderia colocar alguma grana no pires vai dizer que seu bolso está sem um tostão. Fecho a coluna com a verve carioca O purgante e o efeito Ao abrir a sessão da Câmara Federal, quando ainda era sediada no RJ, o presidente Ranieri Mazzilli concedeu a palavra a Carlos Lacerda, então representante do DF. Rápido e agressivo, o deputado Bocaiúva Cunha gritou ao microfone, sob os risos do plenário : - Agora vocês vão ver o purgante ! Lacerda, num piscar de olhos, respondeu : - Os senhores acabaram de ouvir o efeito ! Nem os adversários prenderam o riso.
quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Porandubas nº 430

Abro a coluna com historinhas de PE e da PB. O verbo não "vareia" A Câmara Municipal de Paulista/PE vivia sessão agitada em função da discussão de um projeto enviado pelo prefeito, que pedia crédito para assistência social. Um vereador da oposição combatia de maneira veemente a proposição. A certa altura, disse que "era contra o crédito porque a administração municipal não merecia credibilidade". O líder da bancada governista intervém, afirmando que "o nobre colega não pode jogar pedras no telhado alheio, pois já foi acusado de algumas trampolinagens". - Menas a verdade - retrucou o acusado. Sou homem honesto, de vida limpa. - Vejam, senhores, - disse o líder - o nobre colega, além de um passado nada limpo, ainda por cima é analfabeto, pois, "menas" é verbo, e verbo não "vareia". (Uma historinha de Ivanildo Sampaio). E minhas ordens, tenente ? Camilo de Holanda, presidente da PB (nessa época, 1916/1920, governador era presidente), tinha uma namorada. Mas a namorada era mulher de um sargento da PM. Uma vez por semana, o tenente-comandante, auxiliar direto de Camilo, dava prontidão noturno no quartel. Uma noite, Camilo vai chegando à casa de seu amor e vê pendurado na cadeira da sala, o dólmã do sargento. Voltou furioso ao quartel : - Tenente, e minhas ordens ? - Que ordens, presidente ? - Prontidão rigorosa, pois a ordem pública está ameaçada. O tenente mandou tocar a corneta, dentro de pouco tempo o batalhão estava todo lá. De prontidão absoluta. Não faltava ninguém. Meia-noite, Camilo voltou lépido : - Tenente, relaxa a prontidão que o perigo já passou. Ele era o perigo ! O caldeirão da política A política ferve no caldeirão partidário. A eleição dos presidentes da Câmara e do Senado, seja qual for o resultado, deixará fortes sequelas, principalmente na concha que abriga os deputados. O líder do PMDB, Eduardo Cunha, ainda é o favorito, mas o cerco sobre os parlamentares que formam a base governista vai se fechando. Teme-se que Cunha na presidência da Câmara baixa aja como um comandante de oposição. Os ministros, de todas as áreas, receberam a missão de puxar votos para Arlindo Chinaglia, que é o líder do governo e ex-presidente da Casa. Até domingo, muita água deverá rolar. Tucanos com Cunha É bastante provável que os tucanos abandonem a candidatura do pessebista mineiro Júlio Delgado e entrem na liça em torno de Eduardo Cunha. Não lhes interessa, de nenhum modo, a eleição do petista Chinaglia. E se a disputa for para o segundo turno, é possível, até, que o poder da caneta governista atraia formidável parcela de deputados. Portanto, os tucanos podem engrossar a fileira do carioca Cunha para lhe dar vitória no primeiro turno. PMDB insatisfeito O fato é que o PMDB, mesmo contemplado com seis pastas na Esplanada dos Ministérios, está inquieto e muito insatisfeito. Nesses anos do lulopetismo, sempre ficou meio de lado a contemplar o mando petista na máquina. O PMDB é o partido mais capilar do Brasil, tendo o maior número de deputados estaduais, vereadores, senadores e prefeitos. Portanto, tem também enorme força nas bases políticas. Ademais, o ciclo do lulopetismo se aproxima do seu final. E o partido começa a se preparar para o amanhã. O vice-presidente da República e presidente do PMDB, Michel Temer, tem agido como algodão entre cristais. Mas tem o compromisso de conduzir seu partido para a avenida larga das eleições de 2016 e 2018. Andando com as próprias pernas e se afastando do PT. Oposições sem rumo As oposições ainda não encontraram um rumo. Estão tateando no escuro. Falta-lhes discurso denso. Por exemplo : Aécio Neves, o ex-candidato à presidente da República, está vendo Joaquim Levy ler pela cartilha ortodoxa que os tucanos defendiam na campanha, sob orientação de Armínio Fraga, o experiente economista que já dirigiu o BC. Até se recorda que Levy colaborou com o tucanato. Pois bem, Aécio deveria dizer que Dilma rasgou o discurso da campana petista e passou a ler a cartilha tucana. Ou seja, cumpre a agenda dos tucanos. Muito bem, nossos aplausos, deveria dizer. Faz o contrário : desanca Joaquim Levy e o governo. Uma burrice. Ministério sem estrelas Até dizem que Aloísio Mercadante age como primeiro ministro. Ele pode até querer vestir esse manto. Mas esse Ministério é uma moldura sem estrelas. Quem seria capaz de nomear 10 ministros dos 39 que compõem a Esplanada ? Esse fato elevará a visibilidade da presidente, que se mostra cada vez mais centralizadora. PT em baixo astral Há momentos de alta e baixa na vida de um partido. Este é um ciclo de baixa para o PT. Mas um ciclo que está demorando muito. Desde o mensalão, o PT desce o despenhadeiro da imagem. O petrolão corroeu mais ainda os cascos de seus navios. PT é o partido mais identificado nas pesquisas com o escopo da corrupção. Por isso, o 5º Congresso do PT, cuja primeira fase será nos próximos dias, em MG, deverá debater os rumos da sigla. Na segunda fase, em Salvador, no final do semestre, o PT apontará suas estratégias de sobrevivência. Reforma política Amanhã, quinta, a seccional paulista da OAB abrirá o primeiro grande evento do ano : um seminário sobre reforma política. Sob a direção do presidente Marcos da Costa, especialistas e cientistas políticos debaterão as diversas questões que integram o escopo da reforma política, como sistema eleitoral, as coligações proporcionais, a cláusula de barreira, o financiamento público de campanha, o estatuto da fidelidade partidária, as campanhas eleitorais, a figura do senador suplente, a concentração das eleições em um único ano eleitoral, o estatuto da reeleição, entre outras abordagens. Este consultor estará na mesa das exposições. Quem tudo quer... Gilberto Kassab é considerado um hábil articulador. Montou o PSD, um grande partido, e agora está construindo outro, o PL, que seria resgatado. O PL, na época do embaixador Álvaro Valle, era o ícone da direita e se apresentava nos programas de TV com a música "a fuga dos escravos hebreus", que encantava os ouvidos. O carioca Valle morreu e o partido virou outro. Kassab quer remontá-lo e, depois de edificado, fundi-lo com seu PSD, formando a maior bancada da Câmara Federal. Dará certo ? Este consultor acredita que ele terá problemas com o TSE e a oposição de outros grandes entes partidários. Dilma, responsável ? Alckmin, também Interessante anotar que a falta d'água, associada à ameaça de apagões de energia, leva o pacote de questões para o Palácio do Planalto e a Esplanada dos Ministérios. Ressalta-se a falta de planejamento na área energética. Mas a questão dos reservatórios secos em SP cai mais no colo de Geraldo Alckmin e nas torneiras de São Pedro do que no colo da presidente Dilma. As obras de captação e interligação de sistemas, em SP, deveriam ter sido iniciadas há anos. Só recentemente foram iniciadas. Perguntaram, durante a campanha, ao então secretário de Recursos Hídricos, Mauro Arce, também chamado de "general da água", qual seria o plano B para a falta d'água em SP e ele respondeu na lata : "não há plano B. Vai chover". O porta-voz do céu errou feio. Dedo na ferida O presidente da Clia/Abremar, Marco Ferraz, põe o dedo na ferida : a infraestrutura portuária no Brasil é precária. Os tributos, por sua vez, são muito altos. É o que aponta em nota na Folha de S. Paulo. O ambiente de recessão, ou de retração como prefere dizer o ministro Joaquim Levy, expõe ainda mais os graves problemas vivenciados por uma batelada de setores produtivos. Daí a atual temporada dos cruzeiros marítimos no Brasil comportar um número menor de navios que as anteriores. Se o país não cuidar de sua bocarra tributária e não arrumar uma estrutura bem equipada de portos, estará navegando à deriva nos próximos tempos. Evolução da educação Recebo de um leitor a seguinte radiografia sobre os "avanços" da educação em nosso país. Com ela, fecho a coluna : Antigamente o ensino comportava o estúdio da tabuada, caligrafia, redação, datilografia... E cobrava-se rigidamente o conhecimento dessas matérias. Havia aulas de Educação Física, Moral e Cívica, Práticas Agrícolas, Práticas Industriais; cantava-se o hino nacional, com hasteamento da bandeira nacional, antes do início das aulas. Eis o relato de uma professora : Semana passada, comprei um produto que custou R$ 15,80. Dei à balconista R$ 20,00 e peguei na minha bolsa 80 centavos, para evitar receber mais moedas. A balconista pegou o dinheiro e ficou olhando para a máquina registradora, sem saber o que fazer. Tentei explicar que ela tinha de me dar R$ 5,00 de troco, mas ela não se convenceu e chamou o gerente para ajudá-la. Ficou com lágrimas nos olhos enquanto o gerente tentava explicar e ela aparentemente continuava sem entender. Por que estou contando isso ? Porque me dei conta da evolução do ensino de matemática desde 1950, que foi assim : 1. Ensino de matemática em 1950 : um lenhador vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de produção é igual a 4/5 do preço de venda. Qual é o lucro ? 2. Ensino de matemática em 1970 : um lenhador vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de produção é igual a 4/5 do preço de venda ou R$ 80,00. Qual é o lucro ? 3. Ensino de matemática em 1980 : um lenhador vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de produção é R$ 80,00. Qual é o lucro ? 4. Ensino de matemática em 1990 : um lenhador vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de produção é R$ 80,00. Escolha a resposta certa, que indica o lucro : ( )R$ 20,00 ( )R$ 40,00 ( )R$ 60,00 ( )R$ 80,00 ( )R$ 100,00 5. Ensino de matemática em 2000 : um lenhador vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de produção é R$ 80,00. O lucro é de R$ 20,00. Está certo ? ( )SIM ( ) NÃO 6. Ensino de matemática em 2009 : um lenhador vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de produção é R$ 80,00. Se você souber ler, coloque um X no R$ 20,00. ( )R$ 20,00 ( )R$ 40,00 ( )R$ 60,00 ( )R$ 80,00 ( )R$ 100,00 7. Em 2010 ... : um lenhador vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de produção é R$ 80,00. Se você souber ler, coloque um X no R$ 20,00. (Se você é afro-descendente, especial, indígena ou de qualquer outra minoria social, não precisa responder pois não podemos reprová-los). ( )R$ 20,00 ( )R$ 40,00 ( )R$ 60,00 ( )R$ 80,00 ( )R$ 100,00 E se um moleque resolver pichar a sala de aula e a professora fizer com que ele pinte a sala novamente, os pais ficarão enfurecidos pois a professora provocou traumas na criança. Também jamais levante a voz para um aluno, pois isso representa voltar ao passado repressor (Pior : O aprendiz de meliante pode estar armado). P S - Pergunta vencedora em um congresso sobre vida sustentável : "Todo mundo está 'pensando' em deixar um planeta melhor para nossos filhos. Quando é que se 'pensará' em deixar filhos melhores para o nosso planeta ?"
quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Porandubas nº 429

Abro a coluna com três relatos engraçados. Salgar meu pai Historinha do Rio Grande do Norte, mais precisamente de Macaíba, vizinha à capital, Natal. Numa administração municipal, onde trabalhavam técnicos de Natal, um pobre rapaz procurou o gabinete do prefeito com um problema urgente. Era uma sexta-feira. - Meu pai morreu e vim pedir o caixão, suplicou o jovem à secretária natalense da mais fina flor da burocracia. - Hoje não há como atender. O prefeito e os assessores foram a Natal. Volte segunda-feira, está bem ?, respondeu a funcionária consciente do dever cumprido. Desolado o rapaz recuou e abriu novamente a porta do gabinete para nova abordagem : - Dona, poderia me arranjar dois reais ? - Pra quê você quer o dinheiro ?, interrogou a eficiente servidora. - É pra comprar sal grosso, vou salgar o meu pai até segunda-feira ! (Quem conta o "causo" é Valério Mesquita). Jung e o rei africano Jung perguntou, uma vez, a um rei africano : - Qual é a diferença entre o bem e o mal ? O rei meditou, meditou e respondeu às gargalhadas : - Quando roubo as mulheres do meu inimigo, isso é bom. E quando ele rouba as minhas, ah, isso é muito ruim. O economista e o empresário Dois homens andavam de balão e se perderam. Decidiram baixar o balão e perguntar para algum transeunte. - Ei, você poderia nos dizer onde estamos ? - Vocês estão em um balão, respondeu o transeunte. - A resposta é correta, mas absolutamente inútil. Este homem deve ser um economista, comentou um deles no balão. - E você deve ser um empresário, respondeu o transeunte. - Exato. Como você sabe disto ? - Você tem uma excelente visão de onde está. E mesmo assim você não sabe onde está. "Puro caos" Há 20 anos, o professor Samuel P. Huntington escrevia o clássico "O Choque de Civilizações", onde descreveu os conflitos da contemporaneidade. Gravei a imagem do "puro caos", termo que ele usou para expressar o estado da Humanidade : "uma quebra no mundo inteiro da lei a da ordem, Estados fracassados e anarquia crescente em muitas partes do mundo ; uma onda global de criminalidade, máfias transnacionais e cartéis de drogas; crescente número de viciados em drogas em muitas sociedades ; debilitação generalizada da família ; um declínio na confiança e na solidariedade social em muitos países ; violência étnica, religiosa e civilizacional e a lei do revólver predominam em grande parte do mundo". Atual A radiografia do professor Huntington é atual. O mundo cede à barbárie. A violência se dissemina pelos quadrantes do planeta. Vivemos o choque entre a civilização e a barbárie. O confronto entre fundamentalistas islâmicos e o Ocidente se acirra. Duas grandes civilizações entram em choque. O atentado de Paris é um sinal de que o conflito ultrapassa a barreira do terrorismo e chega ao terreno da religião. Assim, o conflito do século XX entre a democracia liberal e o marxismo-leninismo poderá não ultrapassar os limites de um fenômeno fugaz em comparação com a relação tumultuada e conflitiva entre o Islamismo e outras religiões, lideradas pelo cristianismo. Assim pensava o pensador de Harvard. A esmo O Brasil chega a um estágio civilizatório em que as reformas haverão necessariamente de ocorrer, sob pena de o país permanecer preso ao passado. O patrimonialismo precisa ter cortadas suas raízes e eliminar os "ismos" que impregnam a cultura política : o grupismo, o mandonismo, o caciquismo, o filhotismo, o nepotismo, o fisiologismo. Daí a premente e urgente necessidade de promover as duas reformas essenciais ao seu desenvolvimento : a reforma política e a reforma tributária. Se isso não ocorrer, o país navegará a esmo no oceano das turbulências. Horizontes sombrios Sempre se disse que o Brasil é maior que as crises periódicas que assolam seu território. Mas o país vive uma crise crônica que merece ser enfrentada com determinação : a crise da política. Absorvemos os inventos da tecnologia ; nossa economia passa a respirar o sopro de outras economias na esteira da interpenetração de fronteiras entre nações ; os ares da contemporaneidade, que impregnam os pulmões das democracias ocidentais, também chegam por aqui. Mas nossa ligação às raízes do passado é profunda. Já fomos a quinta potência e voltamos para a oitava, quiçá, nona posição no ranking das nações mais poderosas do planeta. Mas os horizontes do país continuam turvos. A pauta das carências Um país avança quando dispõe de líderes animados pelo ardor cívico, pela capacidade de enxergar o amanhã e, sob essa motivação, pela capacidade de tirar o carro do atoleiro. Estamos enxergando lama por todos os lados : no oceano de nossas riquezas naturais (óleo extraído por uma empresa que caiu do 1º lugar no ranking para o 6º lugar) ; nas frentes da corrupção que solapa o Estado ; na vanguarda de uma gestão amarrada à árvore patrimonialista ; nos flancos de uma carga tributária que se expande a cada período governamental. A moldura completa 2015 começa com um pacotaço tributário, inspirado na estratégia de arrefecer o consumo e, consequentemente, diminuir a graninha no bolso do consumidor. Os analistas econômicos aplaudem o Joaquim Levy, na medida em que um programa de ajustes - com aperto do bolso e aumento de juros - poderia resgatar a confiança de investidores. Mas a economia mais dura - com ajustes de preços, incluindo os de energia e transportes - acabará disparando o mecanismo da equação BO+BA+CO+CA= Bolso cheio, Barriga satisfeita, Coração agradecido, Cabeça aprovando o governante. A recíproca é verdadeira. Conclusão : a imagem Dilma despencará nos próximos tempos. A conferir. A imagem de todos O estado de carências - falta d'água no Nordeste, no Sudeste e no Sul -, bolso mais apertado, área política em turbulência (eleição das casas congressuais), ministérios com orçamentos cortados, desemprego dando sinais de expansão, aumento de pedintes nas ruas (em São Paulo, é visível o crescimento da pobreza nas ruas) - detonará um processo de corrosão de imagem dos governantes. Com exceção de um ou outro, este consultor enxerga no horizonte imagens com muita sombra e corrosão nos cascos de seus navios (estruturas governativas). Cunha e Chinaglia O governo escolheu estratégia errada ao lançar Arlindo Chinaglia contra Eduardo Cunha (PMDB) para a presidência da Câmara. Cunha é franco favorito e a lista do Petrolão, se seu nome lá estiver (pouco provável), só aparecerá após a eleição do dia 1º de fevereiro. Vai ser difícil convivência pacífica entre os dois partidos. Mas o vice-presidente Michel Temer fará o que estiver a seu alcance para compor as partes. Alckmin e a água Em qualquer cenário, a situação hídrica de São Paulo é gravíssima. Não haverá tempo para purificar os lençóis poluídos que poderiam fazer o abastecimento. O racionamento já é uma realidade. São Paulo mais se parece uma sauna. Obras reparadoras deveriam ter começado o ano passado. Geraldo Alckmin acreditou na ajuda de São Pedro. O perfil do "santo" e "bonzinho" governador irá para o buraco. A conferir. Fim do PT "Ou o PT muda ou acaba." O alerta foi feito pela senadora Marta Suplicy. Pois bem, o PT não mudará nem acabará. O problema é o seguinte : quem provou da maçã não quer voltar ao estágio inicial do nascimento. Depois que comeu a maçã, Adão abriu a boca e o estômago para saciar a sede e a fome. Os petistas entraram nas profundezas do paraíso. Conhecem e gozam de suas delícias. Preenchem quase 20 mil cargos comissionados. Deixar tudo isso sob a crença de princípios éticos e morais ? Difícil. Lula terá obstáculos para resgatar as raízes do partido. Nem ele acredita nessa possibilidade. Um homem não atravessa o rio duas vezes no mesmo lugar. Kassab em ação Gilberto Kassab está agindo nos bastidores para viabilizar o empreendimento político do ano : criar o PL e fundi-lo com o PSD. Tem prometido a alguns atores políticos regalias e recompensas. A um governador do Sudeste, prometeu, até, a presidência do novo partido, caso ele deixe sua atual agremiação. Pedintes e moradores de rua No fim de semana passado, este consultor perambulou, à noite, pelo centro de São Paulo. Foi à praça da Sé, seguiu pela 15 de Novembro e adjacências. Tomou um susto : espaços locupletados de moradores de rua e pedintes. O centro sempre foi uma estampa da miséria urbana. O que impressionou foi a quantidade de miseráveis. Sinal dos tempos ? A divisão que soma Muitos perguntam : por que o PMDB ainda é o maior partido brasileiro ? Resposta : porque subverte a aritmética. Como ? Transformando a divisão em soma. Vejamos : Com a morte de Tancredo, José Sarney, o vice, assumiu o governo e, em 1986, na esteira de um programa populista e de clima de "revolução francesa" (os gritos presos jorrando das gargantas), o PMDB forjou seu império. Elegeu 21 dos 22 governadores de Estado, perdendo apenas em Sergipe para o candidato Antonio Carlos Valadares, do então PFL, e conquistando 54% das cadeiras do Congresso. A eleição ocorreu sob a euforia do Plano Cruzado (congelamento de preços), detonou a explosão do consumo e criou os "fiscais do Sarney", que passaram a denunciar remarcação de preços. Maior partido Nas eleições municipais seguintes, o PMDB, fortemente estabelecido nas máquinas estaduais, criou formidável base municipal, tornando-se, de lá para cá, o partido mais capilar do Brasil. Essa herança continua sendo a mais densa. Sua preservação se deve ao fato de o partido produzir alianças com os parceiros mais convenientes nos Estados. Daí a regra a que se impôs : dividir para somar. Eis o imbróglio que tem perturbado siglas grandes e médias, incomodadas com o poderio de fogo peemedebista. Complô Ao que se vê, haveria um complô no sentido de arrefecer a força do PMDB, estratégia que teria como comandantes os atuais ministros Gilberto Kassab e Cid Gomes, o primeiro, presidente do PSD, e o segundo, ex-governador do Ceará, que dá as diretrizes no PROS. O fato é que a articulação para derrubar o principal partido da base governista ameaça se transformar em bumerangue. Não só pela alta probabilidade de PMDB eleger os dois presidentes das Casas Congressuais, mas pela insensibilidade do núcleo duro do Palácio do Planalto (Mercadante e adjacências). Um PMDB alijado do centro do poder significa lenha pesada na fogueira no segundo mandato da presidente Dilma. Churchill Lições de Winston Churchill : "Somos mestres das palavras não ditas, mas escravos das que deixamos escapar." "Um prisioneiro de guerra é um homem que tentou matá-lo, não conseguiu e agora implora para que você não o mate." "Alguns vêem a empresa privada como um predador a ser abatido, outros como uma vaca a ser ordenhada, mas muito poucos a vêem como um poderoso garanhão puxando a carreta." "Há terríveis mentiras circulando o mundo, e o pior é que metade delas é verdade." "Quanto mais você olhar para trás, mais à frente você verá." "Eu posso estar bêbado, senhorita, mas pela manhã eu estarei sóbrio e você continuará sendo feia." "A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas."
quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Porandubas nº 428

Vieram e não me encontraram Abro a coluna com deliciosa historinha do matreiro Mangabeira. Otávio Mangabeira foi governador da Bahia, ministro de Relações Exteriores e um sábio da velha política. Tinha um amor todo especial à língua. E cuidava do português a todo preço. Chega uma comissão de professoras ao palácio, Mangabeira as recebe no salão. - Governador, nós viemos aqui conversar com V. Excelência sobre a situação do ensino na Bahia. (Deviam, claro, ter dito "vimos", que é o presente. "Viemos" é o passado). Mangabeira respondeu apenas : - Que pena, senhoras professoras, vieram e não me encontraram. E voltou para o gabinete. Molduras de 2015 Cinco retratos mostram os horizontes do país nos próximos meses : um cobertor político esburacado ; uma tela de duas cores avermelhadas separando alas do PT ; o céu da economia totalmente coberto por nuvens pesadas ; a paisagem urbana nas metrópoles retocada pela agitação de grupos ; e, arrematando o cenário, a máquina governativa sendo puxada por ministros que sofrem para avançar no terreno íngreme da administração, esbarrando nos obstáculos da contenção de despesas e em cortes nos orçamentos. Os buracos políticos Os buracos no cobertor político foram feitos pela tesoura presidencial, que aparou espaços de partidos na colcha ministerial, como foi o caso do PMDB. O maior parceiro do PT na aliança governista ganhou um ministério a mais, mas perdeu poder. Das seis Pastas que ganhou (um a mais que no mandato anterior), três são secretarias de nível ministerial - Pesca, Portos e Aviação civil -, enquanto a Pasta da Agricultura foi destinada a uma senadora recém chegada ao PMDB, Kátia Abreu, não considerada indicação da ala peemedebista do Senado. O partido tentará resgatar parte da força perdida com cargos no segundo escalão, já sabendo que a estratégia em desenvolvimento, sob inspiração da presidente Dilma, visa a diminuir sua influência e, por conseguinte, a parcela de mando no tabuleiro do poder. Adensamento no meio O governo expressa tal intenção reforçando os partidos médios - PSD, PDT, PTB, PC do B, PR e outras siglas menores - que, juntas, somam votos suficientes para derrotar os oposicionistas, mesmo que estes possam vir a contar eventualmente com o rolo compressor do PMDB. A estratégia é arriscada tendo em vista a possibilidade de o PMDB voltar a comandar as duas casas congressuais. Já se sabe que os dois candidatos do partido - Renan Calheiros e Eduardo Cunha - deverão passar ao largo do petrolão. Para acirrar a disputa, o PT lança o deputado Arlindo Chinaglia à presidência da Câmara, pretendendo contar com o apoio dos partidos da base governista. Caso Cunha seja candidato e vitorioso, o PMDB aparecerá como independente. Caso perca, o líder do partido na Câmara deverá se esforçar para jogar o PMDB na oposição. PT em chamas O PT está em chamas. Um grupo de aranhas da teia lulista sente-se longe do ninho principal. Dilma chamou para perto de si companheiros com os quais conviveu na administração pública (formando um gauchutério), não pertencentes à ala CNB - Construindo o Novo Brasil - onde se abrigam os lulistas. Juntar os fios da malha é tarefa difícil, mesmo para Aloizio Mercadante, que age como primeiro-ministro e potencial candidato à sucessão de Dilma em caso de inviabilidade do nome de Lula. A entrevista da senadora Marta Suplicy no Estadão de domingo acendeu a fogueira. Ela disse que Mercadante não gosta de Lula, que queria ser candidato no lugar de Dilma em 2014. E que Rui Falcão, que já foi seu braço direito, é traidor do partido. Economia sob ajustes A moldura econômica estará esfumaçada neste ano. Grande sombra cobrirá a inflação, com perspectiva de ultrapassar 6,5%, o teto da meta. As águas dos preços represados encontrarão as comportas arrombadas, prevendo-se estouro do bolso do consumidor com os aumentos da gasolina, energia, transportes e alimentos. A Petrobras continuará a escurecer a conjuntura com suas ações caindo ao fundo do poço e ameaçando a viabilidade econômica do pré-sal. De primeira empresa brasileira, baixou para a quinta colocação. Já o petróleo cai de preço a cada semana. Cinto apertado - I O brasileiro que se prepare para apertar ainda mais o cinto ao longo deste novo ano, pois vamos cair no "realismo tarifário" do ministro Joaquim Levy. A começar pela conta de energia elétrica, que vai subir até 30% para recompor a defasagem no setor. Dilma mandou reduzir essa conta no começo de seu primeiro mandato - uma medida demagógica, pois não levou em conta a realidade brasileira. Agora o consumidor paga a conta. E o aumento deve estourar o teto da inflação de 6,5%. O ministro acha que recupera depois. Paciência, algum ovo vai ser quebrado.   Cinto apertado - II Outra medida em gestação : para Levy, as pessoas que trabalham como PJ (Pessoa Jurídica) recolhem pouco de imposto e quer elevar suas taxas. Esses PJs são enquadrados no Simples Nacional, criado para incentivar as micro e pequenas empresas do País, uma das bandeiras de Lula e Dilma. Todo o programa do PT vai cair assim, como peças de dominó ? Clamor das ruas Os bolsos vazios atingirão o estômago. Categorias profissionais e movimentos organizados já começaram a mobilização de grupos que abrem o clamor das ruas. O Movimento do Passe Livre já fez suas primeiras aparições. Os metalúrgicos do ABC fazem greve. A ameaça de desemprego agita as Centrais Sindicais. Todo esse barulho chegará aos corredores do Congresso Nacional. Petrolão O início de fevereiro será conturbado, também pela repercussão causada pela divulgação dos nomes de políticos envolvidos no petrolão. Será um bafafá. O ministro Teori Zavascki deverá anunciar os nomes. O mesmo deverá ser feito pelo procurador-Geral, Rodrigo Janot. Programas sociais Veremos poucos avanços nos programas sociais. O dinheiro será curto para cobrir todas as demandas. Cortes em orçamentos deixarão ministros a ver navios. Teremos um Ano de Vacas Magras. Cenário municipal Marta Suplicy, com sua polêmica entrevista ao Estadão, prepara o clima para se afastar do PT. Alguns partidos já lhe acenaram guarida. Marta quer, primeiro, arrumar uma justificativa para sair. Teme que seu mandato seja reivindicado pelo PT, caso saia sem demonstrar incompatibilidade entre ela e o partido. De acordo com o TSE, são três as hipóteses que autorizam o mandatário a sair do partido sem sofrer a perda do cargo : se o partido sofrer fusão ou for incorporado por outro ; se houver mudança substancial ou desvio do programa partidário ; ou ainda, ocorrer grave discriminação pessoal do mandatário. Nestes casos, a troca de partido é aceita por estar devidamente justificada. Novo partido não é motivo O TSE rejeita a hipótese de criação de novo partido como justa causa para o desligamento. Quem já se desfiliou ou pretende desfiliar-se, pode pedir a declaração de existência de justa causa, fazendo citar o partido. Os processos que tratam de fidelidade partidária terão preferência na pauta de julgamento, tanto do TSE quanto dos Tribunais Regionais Eleitorais, e deverão ser encerrados no prazo de 60 dias. Por isso, Kassab pensa em recriar o PL e fundi-lo com o PSD. Candidatos em SP Começam as movimentações em torno da campanha de 2016. O prefeito Haddad se volta na direção do PMDB, visando a uma aliança ; Marta Suplicy sairia por uma frente partidária ; e Celso Russomano, mais uma vez, se lançará no páreo. Mas o jogo ainda está longe de ser armado. Tudo vai depender de cenários mais amplos. Fecho a coluna com : Coisinhas do Jânio Historinhas selecionadas pelo jornalista e escritor Nelson Valente. Primeira : o prefeito Jânio Quadros, em 1987, dava entrevistas para os jornalistas sobre a sua administração (na época, havia uma polêmica a respeito dos homossexuais no Teatro Municipal), quando uma jovem jornalista o interrompeu para perguntar : - Você é contra os homossexuais ? Você vai exonerá-los ? O ex-presidente não gostou de ser tratado de "você" e deu o troco : - Intimidade gera aborrecimentos e filhos. Com a senhora não quero ter aborrecimentos e, muito menos, filhos. Portanto, exijo que a senhora me respeite.
quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Porandubas nº 427

Dinheiro e não pronomes Abro a primeira coluna do ano com a matreirice mineira. Benedito Valadares chegou a Curvelo/MG, para visitar a exposição de gado do município. Na hora do discurso, atrapalhou-se : - Quero dizer aos fazendeiros aqui reunidos que já determinei à Caixa Econômica e aos bancos do Estado a concessão de empréstimos agrícolas a prazos curtos e juros longos. Lá do povo, alguém corrigiu : - É o contrário, governador ! Empréstimo a prazo longo e juro curto. - Desde que o dinheiro venha, os pronomes não têm importância. Precisamos trabalhar O brigadeiro Eduardo Gomes fazia, no largo da Carioca (Rio de Janeiro), seu primeiro comício da campanha presidencial de 1945. A multidão o ouvia em silêncio : - Brasileiros, precisamos trabalhar ! Do meio do povo, uma voz poderosa gritou : - Já começou a perseguição ! Bagunça geral. O comício quase acabou. O espírito do ano : dureza 2015, como se sabe, será um ano de ajustes. Um ano duro. Dureza, nesse caso, quer significar aperto nas contas, corte de gastos supérfluos (e até comendo as beiradas de gastos necessários), contenção de despesas, eliminação de milhares de cargos comissionados nas administrações estaduais e municipais, cofres mais vazios. Essa é metade da aura de 2015 : a outra metade atingirá o bolso. Inflação alta, superando o teto da meta, alimentos, gasolina, energia, transportes mais altos, enfim, a planilha de bens e serviços mais caros baterá forte no bolso do consumidor. A alma consumista entrará em confronto com o espírito do ano. Teremos turbulência. Movimentos nas ruas É mais que previsível a reocupação das ruas - a partir do principal polo difusor de ideias do país, São Paulo - pelos movimentos organizados. Há um grupo de jovens líderes que quer aparecer na onda. Vão dar duro para liderar correntes sociais, a partir de Guilherme Boulos, um sujeito que aprecia visibilidade, principalmente a fosforescente. As centrais sindicais vão se agitar para evitar perdas em um ano de muitos sacrifícios. Baterão bumbo. Pretendem alertar à presidente sobre compromissos por ela assumidos na campanha. Categorias profissionais também afinarão suas tubas. O puxão de orelhas em Barbosa Nelson Barbosa é pessoa recatada, séria, um técnico muito comedido nas palavras. Um sujeito pacato. Disse apenas o que já se sabia em uma fala apressada com jornalistas. Que uma nova regra iria ser apresentada para correção do salário mínimo, a partir de 2016. De acordo, aliás, com o discurso de ajuste alinhado com a nova equipe econômica. As centrais não gostaram, enxergando na fala de Barbosa perda residual no mínimo. Dilma recebeu comunicação de Mercadante, que também faz o papel de parlador-mor. E ligou para o novo ministro do Planejamento mandando que ele se desmentisse. O que foi feito com uma nota. Barbosa, o comedido, não deve ter gostado. Passará um tempo de bico calado. Para não ter de suportar um segundo puxão de orelhas. Levy, sob observação Há quem diga que Joaquim Levy, caso tivesse de se desdizer em menos de 24 horas, sob ordens da presidente, não teria cumprido a ordem. Daria um adeus ao governo. Dono de vastos conhecimentos econômicos, o doutor pela renomada Escola de Chicago com experiência em ajuste de contas de governos, tem plena consciência de sua autoridade, não se dobrando a conceitos com os quais não concorda. Por isso, não são poucos os que acham que, em caso de confronto temático-conceitual com a presidente, não terá receio de pedir o chapéu. O mais provável é que continue por um bom tempo, até as camadas tectônicas da economia se acomodarem. A índole presidencial Já se conhece a índole mandona da presidente, seu jeito autoritário de ser. Os políticos, porém, sabem que a presidente terá de se curvar à real politik, que é a maneira brasileira de fazer política, com um agrado aqui, um benefício acolá, um adjutório ao corpo parlamentar. O voto, eles têm. E se negarão a ceder os votos em todas as votações. Por isso, esperam que Dilma seja mais acessível ao clamor da política. A conferir. Lula no entorno As alas dilmista e lulista estão em litígio. A presidente escolhe perfis mais próximos a ela, quadros do Rio Grande do Sul, como Pepe Vargas e Miguel Rossetto, afastando a turma de Lula. Mercadante, mesmo fazendo parte da CNB, há tempos se distancia do ex-presidente. É natural que Dilma escolha quadros com os quais mantém afinidade. Mas é visível a querela entre lulistas e dilmistas. A presidente sabe que a tendência Construindo um Novo Brasil, que reúne outras facções do PT, é amplamente majoritária. Lula, por sua vez, se esforça para resgatar a alma do petismo histórico e começa a se preparar para 2018. Apesar da rixa entre os grupos, ela e Lula procuram preservar a boa relação. De irmã para irmão mais velho. Lula doente ? Balela. Corre pelas redes sociais a informação de que Luiz Inácio estaria às voltas com a recidiva de câncer. Fofoca. Intrigas. Ele está bem de saúde, segundo pessoas que estão no seu entorno. Idas e vindas do ex-presidente para muitos cantos e recantos demonstram vitalidade. Mercadante Aloizio Mercadante encarna mesmo o papel de primeiro-ministro. É centralizador, preparado, um técnico de alta competência e um parlamentar com formidável experiência. Em um ministério de figuras apagadas - com exceção de uns poucos - tende a ganhar mais força e visibilidade. Teria sido dele a ideia da presidente exigir o desmentido de Barbosa sobre a nova regra para o salário mínimo entre 2016/19. Insatisfações O PMDB começa a ser chamado de partido de secretarias : da Pesca, da Aviação Civil e dos Portos. O fato é que, apesar de adicionar uma Pasta a mais às cinco que detinha no primeiro mandato, o maior aliado do governo foi contemplado com ministérios de menor importância. Quer compensar as perdas com cargos de segundo escalão. Ameaça tornar-se independente no Senado. Se o rebuliço ocorrer na Câmara Alta, imagine-se o que pode ocorrer na Câmara. Estratégia de Dilma A presidente distribuiu a estrutura ministerial de forma a contemplar as seguintes estratégias : diminuir força do PMDB ; fortalecer forças dos partidos médios - PDT, PTB, PSD, PROS, PC do B etc. ; tirar mais peso do PT lulista e reforçar a ala dilmista. Nessa linha, o novo ministro das Cidades, Gilberto Kassab, foi motivado a refundar o antigo PL e, depois de criado, fazer a fusão com seu PSD. Surgiria, então, um partido maior que o atual PMDB, a segunda bancada da Câmara. A conferir. Maré brava O novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, acenou com alta de impostos. Os preços represados de bens e serviços abrirão porteiras. As ações da Petrobras caem no fundo do poço, a ponto de ameaçar a viabilidade do pré-sal. A inflação tende a estourar o teto da meta, de 6,5%. As categorias profissionais exigirão aumentos acima da inflação. O arrocho será inevitável. Falta de credibilidade Prioridade das prioridades, definida no discurso de posse da presidente : fazer do país uma Pátria Educadora. Ora, mas boas intenções e slogans não são capazes de sustentar um bom programa. Urge credibilidade a quem cabe a responsabilidade de executá-lo. O novo ministro da Educação, Cid Gomes, não está no rol de pessoas críveis. Já chegou a dizer que professor de ensino público deve ensinar por prazer, não para ganhar dinheiro. Se for o caso, deve mudar para o ensino privado. O ex-governador do Ceará é aquele que pegou a família, sogra junto, e levou-a para um passeio pela Europa. Com recursos públicos. Embate A ministra da Agricultura, Katia Abreu, afirma que não há mais latifúndios no Brasil. O MST diz que eles ainda existem. E o ministro do Desenvolvimento Agrário, Patrus Ananias, entra na dança ao dizer que "não basta derrubar cerca do latinfúndio", mas fazer a reforma agrária. Ministros com armas em plena arena. Do mesmo governo. Demissões Mais de 800 trabalhadores demitidos na Volks. Metalúrgicos ameaçam com greve. Demissões na imprensa. Grupo Abril em refluxo. Metade do prédio de Veja entregue à Previ, que alugará os espaços desocupados a novos clientes. Crise começa chegar nas frentes do Emprego. E as chuvas, hein ? Quanto mais pé d'água em São Paulo, com queda de árvores e destruição de imóveis, menos água no sistema Cantareira. O nível está deixando os 7%. Como será a vida daqui a uns três, quatro meses, se não chover bastante até lá ? Não ouvi ainda explicação satisfatória. Fecho a coluna com mais essa deliciosa historinha. Tu não vais, não é ? Luís Simões Lopes era um miniditador. Diretor do DASP, fazia o que queria, com apoio de Getúlio. Mandou ofício aos ministros com uma série de determinações. Enquadrava todo mundo. Osvaldo Aranha, ministro da Fazenda, recebeu, leu, devolveu : "Ao remetente : vá à merda." Entregou ao chefe de gabinete. O chefe de gabinete ficou em pânico : - Devolver pelo protocolo reservado, não é, senhor ministro ? - Não, pelo protocolo comum. Era um escândalo. De mão em mão. Luís Simões Lopes recebeu, ficou furioso, foi a Getúlio pedir demissão. Getúlio puxou uma baforada do charuto : - Ora, Luís, para que demissão ? Tu não vais, não é ? Não indo, tu desmoralizas o Osvaldo. Ele vai ficar uma fera. Tu sabes. Tu sabes. Luís Simões Lopes foi. Mas foi de volta para seu gabinete no DASP.
quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Porandubas nº 426

Franco Montoro Abro a coluna com uma historinha de Franco Montoro, que presenciei. Depois de deixar a esfera governativa e parlamentar, Franco Montoro passou a se dedicar ao ILAM - Instituto Latino-Americano. Na condição de presidente desta entidade, foi a um almoço organizado por um pequeno grupo de professores da USP no restaurante do campus. O ex-governador, como se sabe, registrara em sua história casos de dislexia, momentos em que confundia nomes, alhos com bugalhos, motivando risos nas cerimônias. A conversa fluía bem, versando sobre os mais diferentes problemas do país. A certa altura, ele se surpreendeu ao saber que este escriba era potiguar. E mais : tio de Sônia, casada com João Faustino, tucano do melhor naipe, seu dileto amigo, que nos deixou não faz muito tempo. Montoro e dona Lucy foram padrinhos do casamento de uma das filhas de João e Sônia. De repente, lá vem a pergunta :  - E como está o Agrário ? Você sabe como ele vai ? Passo a lupa na mente e lamento ignorar a identidade da figura. Mas a pergunta ficou driblando a cabeça. Mudamos de assunto. Mas o Agrário continuava a me perturbar. De repente, Eureka ! Agrário ? Agrário ? Não seria o Urbano ? Tomo a iniciativa : - Governador, será que o senhor não confundiu o Agrário com o Urbano ? - Ah, sim, é claro, é claro. Desculpe. Como vai o Urbano ? Francisco Urbano era presidente da CONTAG - Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura. Um potiguar conhecido nos universos sindicalista e político. A dislexia do ex-governador paulista havia trocado o espaço rural com a geografia urbana. Franco Montoro, exemplo de honradez, dignidade, seriedade, civismo, independência e amor à pátria. Quanta falta ele faz nesses tempos de lamaçal político. O fundo do poço Tem sido recorrente a pergunta : "onde isso vai dar" ? "Isso" é o petrolão, o escândalo envolvendo a Petrobras. Os interlocutores querem, na verdade, saber coisas do tipo : Chegamos ao fundo do poço ? O caso afetará a presidente da República ? Como afetará ? Há ameaça de impeachment ? O que poderá ocorrer com políticos nomeados nas listas de delatores ? Enfim, o que poderá ocorrer com o país nos próximos meses ? Tentemos analisar alguns cenários. Imagens As imagens dos atores políticos abarcados pelo caso estão em pleno processo de corrosão. A Petrobras afunda a imagem no oceano da descrença. Graça Foster não tem condição de continuar a comandar a empresa. Trata-se de um perfil que, a continuar no comando, será permanente fonte de polêmica. A presidente Dilma há de separar amizade de profissionalismo e gestão da coisa pública. A imagem da chefe da Petrobras queima no caldeirão das denúncias. A imagem da presidente também está em baixa. Não há como redesenhá-la usando as tintas da contemporização. Atores envolvidos hão de purgar no inferno astral por muito tempo. Conhecimento de desvios As projeções de cenários indicam que a presidente Dilma será inserida na moldura de corresponsável pela situação caótica da Petrobras. Se Graça Foster sabia do que ocorria na petroleira, por ter sido comunicada pela gerente Venina, é evidente que, em conversas com a presidente e amiga Dilma, daria a ela conhecimento dos fatos. A partir daí, a presidente teria dado carta branca para Graça fazer assepsia completa. É o que se deduz. Razoável é imaginar que o conhecimento, tanto por parte de Graça quanto de Dilma, se refira a desvios, descaminhos, não propriamente a valores, percentagens, distribuição de propinas a A, B ou C. Impeachment ? Pouco provável O conhecimento sobre ilícitos pode gerar ação de impeachment da presidente ? As oposições, a depender do clima ambiental e ante a possibilidade de surgirem novos fatos, poderão, até, ensaiar uma solicitação de afastamento. Mas é pouco provável que esse recurso caminhe no Congresso. O rolo compressor governista evitará essa possibilidade. É sabido que as oposições também têm costados quebrados e, a qualquer hora, o escândalo do mensalão mineiro poderá voltar à tona. E tomar conhecimento de algo escandaloso e compactuar com ele são coisas diferentes. Este consultor não acredita na hipótese de que barulho sobre cassação do mandato presidencial prospere. A força das ruas Há, ainda, a fortaleza das ruas. Dilma foi eleita pela maioria do eleitorado. É possível que tenha perdido muitos votos das eleições até hoje. Mas a força das ruas ainda lhe é francamente favorável, significando muralhas e exércitos em sua defesa, comandados por Lula. Claro, o PT perdeu, e muito, de sua capacidade de mobilizar as massas. O partido sofre a maior crise de imagem de sua vida. Mas possui cacife para fazer mobilizações. 2015, aliás, será aberto sob a barulheira das ruas, com alas, setores, grupos, movimentos da situação e da oposição procurando, cada qual, arregimentar bases e demonstrar força. Os políticos Descartada a hipótese de impeachment da presidente, a atenção se volta para a esfera política : como os políticos reagirão ao envolvimento de seus nomes ? Se a lista for pequena e se as provas forem contundentes, é razoável apostar na alternativa de abertura de processos no âmbito das Comissões de Ética das duas Casas Congressuais. Coisa que deverá tumultuar o ambiente político. Se a lista apontar um número alto - digamos em torno de 50 - é razoável trabalhar com a hipótese de corporativismo, protelação do debate, patinação no mesmo lugar. Se o STF condenar os implicados, o nó terá de ser desfeito com a decisão das Mesas Diretoras de levar os processos a plenário. O imbróglio se estabelecerá. Se as ruas reagirem contra o corpo parlamentar, aí, sim, os representantes poderiam decidir cortar a própria carne. Saneamento geral Não se pode negar o efeito positivo que a crise deverá provocar na teia institucional. É o caso de apontar para o maior controle de máquinas e estruturas. O tão ambicionado lema "vamos passar o Brasil a limpo" teria condições de ser, finalmente, adotado. Transparência seria o eixo da gestão pública. Os painéis de investigação seriam mostrados nos organogramas de obras, nos processos de licitação, enfim, nas agendas da administração pública. Jogo de cintura O quadro que se desenha pode ser classificado como "confortável" para a presidente da República e outros atores políticos ? Este consultor enxerga de modo diferente. Para que essa "confortabilidade" ocorra, seria necessário, por parte de Dilma, eficiente jogo de cintura. A onisciência, a onipotência e a autossuficiência - valores que se identificam no perfil presidencial - deverão descer alguns degraus. Quer dizer, a presidente deverá mostrar, no segundo mandato, uma postura mais política, mais envolvente, mais aberta e menos intransigente. O corpo parlamentar, principalmente o da Câmara, deverá exigir recompensas para lhe dar apoio irrestrito nas votações de interesse do Executivo. Verdade dos dois lados Este consultor observa : tem crescido o clamor da banda não ouvida pela Comissão Nacional da Verdade para que a verdade seja completamente resgatada. Não apenas a verdade dos que foram perseguidos e torturados pela ditadura. Militares da ativa e instituições de cunho militar, como o STM, têm reagido de maneira negativa às conclusões do relatório preparado pela CNV. Esse fato merece atenção. O papel do vice O vice-presidente da República, Michel Temer, terá papel mais importante no segundo mandato de Dilma. Foi muito exigido no primeiro mandato para representar o Brasil junto a entidades e em missões no exterior. A par da continuidade dessa posição, será importante eixo de articulação com o Congresso Nacional, por conhecer muito bem os meandros das Casas Congressuais. A conferir. Wagner Ouve-se, nos bastidores, um comentário que faz sentido : Jaques Wagner, o nome mais cotado para assumir a Pasta das Comunicações, que passaria a absorver as contas de propaganda da Secom, faria os cochichos mais ouvidos pela presidente. Mais que os sussurros do todo-poderoso Aloysio Mercadante, da Casa Civil. Moreira A permanência de Moreira Franco, na Aviação Civil, se deve à boa condução da Pasta. Tem dialogado com o setor e iniciado amplo processo de aperfeiçoamento de controles e melhoria das condições dos aeroportos. Zavascki Os próximos tempos no STF terão o ministro Teori Zavascki como personagem central : relator do processo envolvendo os políticos. Quem é bom de matemática ? Fecho a coluna com uma questão intrigante. Fomos a uma lanchonete e, ao final, a conta somou R$ 30,00.  Cada um deu 10 reais ! Eu : R$ 10,00 Tu : R$ 10,00 Ele : R$ 10,00 O garçom levou o dinheiro ao caixa e o dono do restaurante disse : Esses três são clientes antigos ; vou devolver R$ 5,00 para eles ! Entregou ao garçom cinco notas de R$ 1,00. Esperto, o garçom pegou R$   2,00 para ele e deu R$ 1,00 para cada um de nós. No final, a conta ficou assim : Eu : R$ 10,00 (R$ 1,00 que foi devolvido) = Eu gastei R$ 9,00. Tu : R$ 10,00 (R$ 1,00 que foi devolvido) = Tu gastaste R$ 9,00. Ele :R$ 10,00 (R$ 1,00 que foi devolvido) = Ele gastou R$ 9,00. Logo, se cada um de nós gastou R$ 9,00, o que nós três gastamos juntos somou R$ 27,00. E se o garçom pegou R$ 2,00 para ele, temos : Nós: R$ 27,00 Garçom : R$ 2,00 TOTAL : R$ 29,00 Questão que entorta a cuca : Não consegui até agora saber onde está a droga de R$ 1,00. (Enviado pelo amigo Luis Costa)
quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Porandubas nº 425

A prisão ? Ora, coisa suave ! Abro a coluna com uma impagável historinha de José Maria Alkmin, ex-ministro da Fazenda de Kubitschek, considerado uma das maiores raposas políticas de MG. José Maria Alkmin foi advogado de um crime bárbaro. No júri, conseguiu oito anos para o réu. Recorreu. Novo júri, 30 anos. O réu ficou desesperado : - A culpa foi do senhor, dr. Alkmin. Eu pedi para não recorrer. Agora vou passar 30 anos na cadeia. - Calma, meu filho, não é bem assim. Nada é como a gente pensa da primeira vez. Primeiro, não são 30, são 15. Se você se comportar bem, cumpre só 15. Depois, esses 15 são feitos de dias e noites. Quando a gente está dormindo tanto faz estar solto como preso. Então, não são 15 anos, são sete e meio. E, por último, meu filho, você não vai cumprir esses 7 anos e meio de uma vez só. Vai ser dia a dia, dia a dia. Suavemente. Ano que nunca termina 2014 parece um ano interminável. A sensação decorre da bateria de escândalos que correu durante todo o ano. O petrolão, a cada dia, exibe nova faceta. A esfera política foi alvo de tiroteio. O primeiro mandato da presidente Dilma acaba com manchas nos costados. O PT sai na frente dos partidos mais bombardeados. O status quo da política e da gestão pública mostra imensa corrosão. O STF apresenta um saldo positivo. O MP e a PF aparecem bem na foto como entidades que cumprem sua missão republicana. A imagem do Executivo O Poder Executivo sai com a imagem borrada. Apesar da boa avaliação que o governo Dilma continua a manter perante os brasileiros - situação periodicamente detectada por pesquisas - a impressão é a de que o Executivo foi leniente em relação ao escândalo que devastou a imagem da principal empresa brasileira. A presidente Dilma perdeu pontos como gestora, perfil que acalentou por muito tempo. Poderia ter colhido bons resultados nessa área, caso o Brasil não ostentasse índice tão pífio de crescimento, que não chegará a nem 1% do PIB. Emerge a imagem de uma pessoa arredia aos políticos, autoritária, birrenta, sem jogo de cintura para administrar as pressões e contrapressões da sociedade organizada e da esfera política. A imagem do Legislativo As cúpulas do Congresso Nacional terminam o ano com a imagem de que, apesar dos surtos de independência demonstrados em matérias de interesse do Executivo, continuam a dar vazão ao axioma : quem é dono da flauta dá o tom. A caneta do Palácio do Planalto funciona como guia condutor das decisões parlamentares. Mas a força do Executivo, neste apagar de luzes, não mostra tanta intensidade quanto nos tempos iniciais da presidente. Tem se esgarçado. O Legislativo também empurra de barriga casos que envolvem seus parlamentares, bastando ver as curvas que o deputado André Vargas tem dado para se livrar da cassação. A imagem do Judiciário A imagem do Poder Judiciário se assemelha a uma paisagem onde, de um lado contempla-se um céu de brigadeiro e, de outro, um céu coberto de nuvens plúmbeas. Juízes de primeira instância, aqui e acolá, são flagrados cometendo abusos de autoridade ; as Cortes Superiores passaram a ganhar maior visibilidade com suas decisões, algumas entrando no terreno legislativo (como o TST, que não perde a mania de querer legislar) ; e o STF chega a momentos de glória e independência, a partir das decisões sobre a AP 470, conhecida como mensalão. As críticas e observações ácidas feitas a um e a outro ministro - principalmente pelo fato de terem sido nomeados no ciclo lulo-petista - não esmaeceram a imagem da mais alta Corte. Sob o reconhecimento de que a estrela do Supremo foi encarnada pelo ex-presidente da Casa, o hoje advogado Carlos Ayres Britto. A imagem dos governadores Os governadores fecham um ciclo administrativo sob o peso de imensas dificuldades. De forma geral, cumpriram suas obrigações administrativas, sem performances ou resultados que possam chamar a atenção pelo brilhou ou criatividade. Os reeleitos, como o governador Geraldo Alckmin, em SP, devem seus feitos às circunstâncias locais. Basta ver que SP atravessa a maior crise hídrica de sua história e este fato não teve impacto na campanha vitoriosa do tucano. Os governadores passaram boa parte do mandato de pires na mão, solicitando ajuda dos cofres Federais e oferecendo um parco feijão com arroz na mesa da gestão. Alguns governadores saem com a imagem entre boa e razoável, na média, e outros com a imagem entre as categorias razoável e ruim. A raposa Churchill Para amenizar a Coluna, pinceladas de Churchill. Churchill fazia um discurso mordaz quando um aparteador, saltando do lugar para protestar, só conseguiu emitir sons abafados. Churchill observou : - Vossa Excelência não devia deixar crescer uma indignação maior do que a que pode suportar. Em outra ocasião, estava sentado, sacudindo a cabeça de maneira tão vigorosa e perturbadora que o orador gritou, afinal, exasperado : - Quero lembrar ao nobre colega que estou apenas exprimindo minha própria opinião. Ao que Churchill respondeu : - E eu quero lembrar ao nobre orador que estou apenas abanando a minha própria cabeça. A imagem dos prefeitos Sobra a pior imagem para os prefeitos, que formam banda fraca do arco administrativo. Sem recursos e com as folhas de pagamento locupletadas, a prefeitada não tem alternativa que a de oferecer um pão duro aos munícipes, enquanto esperam a tão ambicionada reforma tributária. Alguns tomam decisões amargas, como aumento de tarifas e impostos. É o caso do prefeito Fernando Haddad. Que prefere ter um dinheirinho ao final da gestão do que realizar uma gestão populista, sem nenhum recurso. Haddad, aliás, começa a resgatar a imagem, habilitando-se a fazer uma boa administração nos dois últimos anos. As classes médias Estamos vivendo no país o fenômeno dos círculos concêntricos : a pedra jogada no meio da lagoa faz círculos concêntricos, os quais, em movimentos compassados, chegam até às margens. São os círculos formados pelo clamor das classes médias. Que começam a sentir o bolso menos cheio ou, se quiserem, mais vazio. As classes médias se dividem em três patamares : A, B e C. Esta última é também chamada de classe média emergente : os milhões que ascenderam da classe D, mas não dispõem dos serviços que suas vizinhas, B e A, conseguem ter. Gritam, esperneiam, integram movimentos. O Brasil de 2014 deu maior organicidade às classes médias. As periferias As margens sociais chegam ao final do ano com um grito que, vez ou outra, sai de sua garganta : "não aguentamos mais o abandono a que somos relegadas ; queremos mais saúde, educação, transportes, segurança". Vemos margens sociais engajadas no processo de participação, mais críticas às gestões. Daí podermos dizer que as periferias estão descobrindo sua força. Não por acaso, multiplicam-se as entidades de intermediação social, a partir dos movimentos que engajam as periferias urbanas. Novos polos de poder se espraiam, multiplicando as forças centrípetas do território. Um par de chifres No velório de Jânio (1992), apareceu um homem aos prantos. Jurava que, muitos anos antes, estava no alto de um prédio disposto a se matar quando Jânio, então um jovem vereador, gritou : "não faça bobagem". Ele explicou que ia pular porque a esposa o traíra. Jânio dissuadiu o suicida : "o que tua mulher te arrumou foi um par de chifres, não um par de asas. Desça daí já!". Salvou o homem. Os profissionais liberais Constituem os profissionais liberais o núcleo mais denso do pensamento nacional. Formado por amplas categorias, organizado em torno de suas entidades de cunho corporativo, estes profissionais são o contingente que acompanha mais de perto a política e as ações institucionais. De uns tempos para cá, estes núcleos passaram a ensaiar um discurso ácido e de contrariedade aos atores políticos e governamentais. Participam de redes sociais, fazem crítica aberta, fogem da velha política e muitos até mostram interesse em dar uma contribuição efetiva pela mudança de costumes. Nunca esta categoria esteve tão atenta. Levantará o facho da locução social em 2015. Núcleos de trabalhadores As entidades voltadas para defesa de trabalhadores - Centrais Sindicais, Sindicatos, Federações e Confederações - terminam o ano com uma agenda pronta para ser replicada nos próximos meses : reajuste do salário mínimo ; fator previdenciário ; reajuste da Tabela do IR ; desemprego ; terceirização de serviços ; contribuições compulsórias e recursos para programas de treinamento. Estarão prontas para fazer grandes movimentações nas capitais e em Brasília. Núcleos de empresários As entidades patronais não têm no país o nível de organização dos núcleos de trabalhadores. Agem de maneira fragmentada. A divisão ocorre em função de políticas de promoção pessoa e/ou disputa de poder. A CNI é um aglomerado de Federações de Indústria, cada qual com visões repartidas sobre os setores produtivos. A CNC é muito questionada, principalmente pelo setor de Serviços, para o qual pouco faz. Sindicatos têm força limitada ; no âmbito Federal, carecem do apoio de Federações e Confederações. O setor de Serviços é o mais prejudicado. Não recebe do governo a contrapartida à grande contribuição que gera para a economia nacional. Interpelando ato vil Fecho a coluna com uma historinha conhecida, que merece repeteco. Rui Barbosa, o Águia de Haia, chegava em casa, à noitinha, quando ouviu um barulho vindo do quintal. Chegando lá, viu um ladrão tentando levar seus patos de criação. Aproximou-se vagarosamente do indivíduo e, surpreendendo-o, ao tentar pular o muro com seus amados patos, passou-lhe um pito : - Oh, bucéfalo anacrônico ! Não o interpelo pelo valor intrínseco dos bípedes palmípedes, mas sim pelo ato vil e sorrateiro de profanares o recôndito da minha habitação, levando meus ovíparos à sorrelfa e à socapa. Se fazes isso por necessidade, transijo ; mas se é para zombares de minha elevada prosopopéia de cidadão digno e honrado, dar-te-ei com minha bengala fosfórica bem no alto da sua sinagoga, e o farei com tal ímpeto que te reduzirei à quinquagésima potência que o vulgo denomina nada. E o ladrão, perplexo e confuso, com um fio de voz, perguntou : - Doutor, eu levo ou deixo os patos ?
quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Porandubas nº 424

Em cinco anos, tudo pode ocorrer Abro a coluna com uma historinha de sabedoria : Um poderoso sultão, sábio entre os sábios, possuía um camelo muito inteligente. Obedecia a todas as ordens que nem precisavam ser emitidas de viva voz. Faltava-lhe apenas o dom da palavra. Esse detalhe entristecia, sobremaneira, o sultão. Um dia, decidiu convocar o grande conselho e chamou o Grão-Vizir. - Quero que ensine meu camelo a falar ! - Mas isso é impossível. - Cortem-lhe a cabeça ! Tragam-me o adjunto ! Mesma afirmação do desejo sultanesco, mesma resposta, mesma sentença. A cena repetiu-se diversas vezes e cabeças rolaram. Exasperado, o sultão declarou. - Aquele que ensinar meu camelo a falar será meu Grão-Vizir. Silêncio ! O sultão repetiu a exortação. Eis que surgiu um humilde ajudante de cozinheiro. Disse : -Dá-me, ó incomparável senhor, um prazo de cinco anos, e farei falar teu camelo. Estupefação geral. Seguida do cumprimento da promessa. -Doravante, és meu Grão-Vizir ! Com direito a palácios, mordomias e riquezas. Mas se falhares, sabes o que te espera ! - Bem sei ! Encantado, o jovem fez profunda reverência e saiu correndo para dar a boa notícia à esposa. - Infeliz, acabas de assinar tua condenação. - Não é bem assim, meu bem. Pedi cinco anos. Você sabe que muitas coisas poderão acontecer em cinco anos : morre o camelo, morre o filho do camelo, morre o sultão. (Fábula enviada pelo atento Alexandru Solomon, que arremata : "nada a ver com a AP 470, o Petrolão, etc.") Segunda fase do petrolão Vem por aí a segunda fase do petrolão. Vejamos os próximos passos : o ministro relator, Teori Zavascki, chama para si os processos envolvendo nomes de parlamentares. Começa a colher depoimentos e provas. A seguir, faz seu relatório, que é julgado em plenário. Tempo para essa operação : de três a cinco meses. Ou seja, teremos um primeiro trimestre de 2015 sob a fumaça do óleo da Petrobras encobrindo os céus de Brasília. Alternativas O cenário do que poderia ocorrer ainda não está claro. Vejamos algumas hipóteses : a. condenação de alguns réus pelo STF e/ou absolvição de outros ; b. encaminhamento dos processos às Casas Congressuais ; c. análise dos casos pelas mesas diretoras do Senado e da Câmara ; d. envio da situação às Comissões de Ética ; e. decisão de cassação de mandatos pela própria mesa dirigente da Casa congressual ; f. condenação ou absolvição dos casos pelos plenários. Repercussão O balão da opinião pública será inflado, nos próximos meses, pela operação política abrigando os nomeados pelo petrolão. Será mais uma onda desfavorável à representação política. A onda se espraiará pelo território sob o signo de um tempo cheio de apertos : cortes de gorduras, escassez, política econômica rígida, inflação no teto da meta. Portanto, não esperemos otimismo ou qualquer folga no bolso. O Produto Nacional Bruto da Felicidade entrará em queda. Ruim para o país. Tempos de controle Podemos enxergar uma luz no fim do túnel : maiores e melhores controles sobre a vida institucional. Ou seja, as estruturas do poder público ganharão lupas mais potentes. Nesse sentido, ainda é possível divisar um país sendo passado a limpo, com seus tumores extirpados pela lâmina da lei. A conferir. Políticos na corda bamba Os políticos não poderão ultrapassar a linha do bom senso. Pretenderão aumentar suas fatias no bolo do poder, mas deverão lutar por esta meta sem muito estardalhaço. Quer dizer, deverão conter seu ímpeto sob pena de sofrerem puxões de orelha dos movimentos organizados e de setores que afiarão seus aríetes. O Brasil continuará assistindo as manifestações de rua e o clamor por mudanças. Dilma mutante Pode ser que a presidente não altere seu comportamento na frente da política. Caso continue imune aos apelos e pressões que partem das representações na Câmara e no Senado, abrirá rombos nos costados do governo. Mais provável que tenhamos, no segundo mandato, uma presidente Dilma mais flexível, menos rígida no trato com os políticos, mais aberta ao diálogo e mais intensa na articulação. PT, mais à esquerda Já o PT deverá promover uma guinada à esquerda. No primeiro mandato, viu-se obrigado a entrar forte nos espaços centrais, deixando de lado antigas bandeiras. Agora, sob sugestões de Lula e de alas do partido, o PT quer resgatar a chama dos seus primeiros anos de vida. Não será uma tarefa fácil, eis que as fogueiras do mensalão e do petrolão ainda dispõem de muito combustível para queimar sua imagem. Mas o partido, mesmo assim, tentará passar um esmalte em seu escopo, na tentativa de se fazer diferenciado. O PT ficou pasteurizado. Tucanos e caciques Os tucanos, por sua vez, terão muita dificuldade de trocar a exuberante roupagem de caciques por modestas vestes de índios. O partido é uma plêiade de celebridades. Não aprendeu, ainda, a comer o pão requentado das massas. Prefere os brioches dos palácios. Por isso, é pouco provável que o PSDB vista a embotada camiseta oposicionista. Vai sempre preferir a última camisa da moda, a calça de grife. Ferraz no comando dos navios Marco Ferraz é o novo presidente executivo da CLIA/Abremar. Um dos mais qualificados perfis do TRADE, Marco deixa a Braztoa com uma das mais densas folhas de serviços prestadas ao turismo nacional. Junta experiência, profundo conhecimento dos problemas e situações dos setores que compõem o conglomerado do Turismo (nacional e internacional), alta performance na frente da articulação política, a par de muita simpatia pessoal. Os cruzeiros marítimos no Brasil terão no novo presidente executivo uma ajustada bússola para navegar em águas menos borrascosas. Fusões partidárias Teremos entre quatro a cinco blocos partidários na Câmara Federal, durante a próxima legislatura, maneira inteligente para abrir espaços de poder e uniformizar as linguagens. Lula à espreita Quem conversou com Lula nos últimos tempos, cochicha : o guru do PT está treinando todos os dias para voltar a frequentar palanques. Será o comandante das ruas do governo Dilma. A cara do governo perante as massas. Fiquei de orelha em pé com essa observação. Temo que Lula antecipe muito o pleito de 2018. Padilha no turismo ? O ex-deputado Eliseu Padilha, pessoa que está ao lado direito do vice-presidente Michel Temer, poderá vir a ser ministro do Turismo. Trata-se de um exímio organizador. É o Brasil O TRE/RR cassou o mandato do governador Chico Rodrigues (PSB). Chico era vice-governador e assumiu por ocasião da renúncia do governador Anchieta Filho. O TRE empossou no lugar de Chico Rodrigues o presidente da Assembleia, o deputado Chico Guerra. Que deixou de ter os votos computados, obtidos no pleito de outubro passado, por ter caído na ficha suja. Ou seja, assume hoje um governador de ficha suja. Só mesmo por essas plagas isso acontece. Feldman na CBF O ex-deputado Walter Feldman, que foi tucano e ultimamente era porta-voz da Rede Sustentabilidade, de Marina Silva, está dando um giro de 180 graus em sua vida profissional. Vai para a CBF com o objetivo de colaborar com o esforço de modernização da entidade, segundo se depreende de sua explicação. Trata-se de um esforçado quadro da política. Sabe fazer articulação. Jango envenenado ? As circunstâncias que cercaram a morte de Jango Goulart (um infarto agudo do miocárdio) até justificam uma análise toxicológica no corpo do ex-presidente. Mas encontrar alguma substância venenosa após 37 anos da morte é tão difícil quanto encontrar uma agulha no palheiro. P. S. O material colhido foi submetido a cerca de 700 mil substâncias. Ufa ! Fator previdenciário O PT defende o fim do fator previdenciário, mecanismo que desestimula aposentadorias precoces - e quer, ainda, adotar a jornada de trabalho de 40 horas semanais. Com essa defesa o partido tem como objetivo reaproximar-se dos movimentos sociais. Aliás, o PT também quer desbancar o PDT da cadeira no Ministério do Trabalho. Quer emplacar um dos seus como ministro da Pasta. Balança comercial O saldo da balança comercial, segundo Boletim do Bradesco, ficou negativo em US$ 2,350 bilhões em novembro, de acordo com dados divulgados ontem pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. As exportações somaram US$ 15,646 bilhões no mês passado, recuando 25%, quando consideramos a comparação entre as médias diárias de 2014 com novembro do ano passado. Todas as categorias atuaram nesse sentido : foram registradas quedas de 31,7% em manufaturados (devido a óleos combustíveis, materiais de transporte e açúcar refinado) ; de 25% em básicos (devido aos grupos soja e minérios, com quedas de 45% em ambos) ; e de 6,2% em semimanufaturados (devido a ferro fundido, açúcar em bruto e ouro em forma semimanufaturada). Por sua vez, as importações chegaram a US$ 18 bilhões, mostrando retração de 6% ante novembro de 2013. Ambições ! Fecho a coluna com uma pitoresca historinha enviada pelo amigo Luis Costa : Eduardo, promissor jovem advogado, descobriu que herdaria uma fortuna quando seu pai morresse devido a uma doença terminal. Decidiu, então, que era momento para encontrar uma mulher que fosse sua companheira para a vida fácil que se avizinhava. Assim, numa determinada noite, foi até ao bar onde se encontrava com amigas e amigos advogados, e lá conheceu uma bela mulher, a mais linda que já tinha visto em toda a sua vida. Sua extraordinária beleza, o porte elegante, o corpo curvilíneo, a inteligência, a maneira de falar, deixaram-no sem respiração. - Eu posso parecer um advogado comum - disse-lhe, enquanto iniciava o diálogo para a conquista da musa - mas, dentro de dois ou três meses, o meu pai vai morrer, e eu herdarei 20 milhões de euros. Impressionada, a bela jovem foi para casa com ele naquela noite. Três dias depois, tornou-se sua madrasta !
quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Porandubas nº 423

Lei da Gravidade Abro a coluna com uma historinha do impagável José Flávio Abelha, em "Mineirice". A Lei da Gravidade, de quando em vez, dá dor de cabeça aos mineiros. E a lei da gravidez, essa, nem se fala. Na Câmara Municipal de Caeté, terra da família Pinheiro, de onde saíram dois governadores, discutia-se o abastecimento de água para a cidade. O engenheiro enviado pelo governador Israel Pinheiro deu as explicações técnicas aos vereadores, buscando justificar a dificuldade da captação : a água lá em baixo e a cidade, lá em cima. Seria necessário um bombeamento que custaria milhões e, sinceramente, achava o problema de difícil solução a curto prazo, conforme desejavam. - Mas, doutor - pergunta o líder do prefeito - qual é o problema mesmo ? - O problema mesmo - responde o engenheiro - está ligado à Lei da Gravidade. - Isso não é problema - diz o líder - nós vamos ao doutor Israel e ele, com uma penada só, revoga essa danada de lei que, no mínimo, deve ter sido votada pela oposição, visando perseguir o PSD. O líder da oposição, em aparte, contesta o líder do prefeito e informa à edilidade, em tom de deboche : - O governador Israel nada pode fazer pois a Lei da Gravidade é de âmbito Federal. ... E assim, encerrou-se a sessão. Um pacto moral O futuro do obreirismo no país começa a ser redesenhado. As empreiteiras que comandam o processo, na esteira do escândalo nos costados da Petrobras, serão obrigadas a desenvolver um "pacto moral", implicando cortes de monta nas gorduras dos orçamentos, suspensão (mesmo que temporária) da cultura da partilha da propinagem, maior transparência das planilhas financeiras e dos cronogramas de obras. Os controles a cargo do Estado - estruturas do MP, PF, TCU, etc. - acenderão faróis mais potentes. Uma ou outra empreiteira poderá desistir de obras públicas. Campanhas menos exuberantes Outro cenário que se projeta é das campanhas eleitorais. Serão mais enxutas, menos extravagantes e dispendiosas. Haverá enorme pressão social para que o financiamento público de campanha entre no lugar do financiamento privado. Aliás, é bom lembrar que financiamento público já existe, na esteira das isenções concedidas aos grupos de comunicação que usam seus sistemas - TV e emissoras de rádio - para veiculação de programas partidários. O que está em discussão é a proibição de doações privadas aos candidatos e partidos. Modelo misto O PMDB será um dos partidos a defender o sistema misto, parte dos recursos de origem privada e parte de origem pública. Dos grandes partidos, o maior defensor do financiamento público é o PT, que, por cobrar um dízimo de seus filiados, é a sigla que dispõe de maiores recursos, a par das verbas partidárias a que tem direito. Não teria o PT grandes dificuldades caso for proibida a doação privada às campanhas. Ao lado do PMDB, outros partidos continuam favoráveis ao financiamento privado. O debate ganhará força com as pressões e contrapressões das organizações sociais. Morrendo O advogado, no leito da morte, pede uma Bíblia e começa a lê-la avidamente. Todos se surpreendem com a conversão daquele homem ateu, e uma pessoa pergunta o motivo. O advogado doente responde : - Estou procurando alguma brecha na lei. A farra dos cartórios Os concursos para cartório são uma exigência da Constituição de 1988. Hoje é necessário passar num concurso público - antes eles eram doados, apadrinhados ou vitalícios. Por isso, os Estados precisam selecionar os candidatos mais preparados, pois terão fé pública na emissão de documentos, registros, e cuidarão de arquivos com informações pessoais da população. Deveria ser um procedimento da maior seriedade, portanto. Mas está virando malandragem, com os mais preparados atropelados pelos mais espertos. A farsa da pós-graduação A farsa do certame para cartórios se monta dessa forma : a regra permite a cumulação indiscriminada de pós-graduação, diferente dos demais títulos, como experiência profissional na área. Para cada certificado de pós-graduação há um aumento de meio ponto na classificação final, o que ocasiona a chamada "dança das cadeiras" na reta final. Aí reside a esperteza : os candidatos mais preparados e com maiores notas são preteridos pelos que acumulam mais pós-graduação. A festa da malandragem Como acumular mais pós-graduação ? Simples : alguns candidatos apresentam 10, 15 ou 20 diplomas cursados simultaneamente entre seis meses e um ano. Impossível o cumprimento da carga horária exigida pelo MEC. Ora, de onde nascem tantos títulos simultâneos ? Essa é a "farra da pós-graduação" que se discute hoje no CNJ. Em vários Estados essa farra ou farsa é aceita, o que torna difícil botar um freio na malandragem. Uma discussão quilométrica se estende pelos Tribunais Estaduais, CNJ, Ministério da Educação, PF e o procurador-Geral da República. Nos próximos dias, a situação dos cartórios de PE será decidida pelo CNJ. A Comissão do concurso já decidira não acumular pós-graduações fajutas (aquelas sem possibilidade técnica de terem cumprido carga horária). Uma única conclusão, por enquanto : a malandragem no país é endêmica. Trio ortodoxo Os tempos são outros. Expansão do consumo, acesso geral do crédito, gastança desordenada darão lugar a uma política rigorosa na frente das contas públicas. A ortodoxia na área econômica acaba de adensar seu escopo com a escolha de Joaquim Levy para comandar a Fazenda, Nelson Barbosa, o Planejamento, e a continuidade de Alexandre Tombini no BC. Superávit fiscal, inflação na meta de 4,5% e câmbio flutuante guiarão as mentes desses três eixos de rigor macroeconômico. O que espera por estes três personagens do segundo mandato da presidente Dilma ? Como tirar a economia do país do buraco e rearrumar o orçamento de 2015, ainda por cima dando-lhe credibilidade e transparência ? Tarefa para super-homens. A missão - 1 As contas públicas estão ao rés do chão e a confiança dos empresários nunca foi tão baixa. A dos consumidores, então, nem se fala, resultado de uma inflação que saiu do controle e estourou o teto da meta. A economia no governo Dilma, ao final de seu primeiro mandato, se traduz por estagnação. Indústria na marcha-ré, comércio às moscas, serviços andando de lado. Crescimento quase zero - o PIB deverá ser o mais baixo da história recente do país. A missão - 2 A nomeação de Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda significa o fim do que se chamou de "nova matriz econômica" dos governos petistas, representada por expansão fiscal, redução dos juros e câmbio desvalorizado de forma artificial. Está claro que não deu certo, mas, pelo menos, a presidente se convenceu disso e resolveu mudar, mesmo contrariando setores importantes do PT. A missão - 3 A primeira tarefa, sem dúvida, será a de tornar viável a política fiscal para 2015. Cortar gastos é sempre coisa impopular. Mas o governo não tem saída se quiser controlar suas contas. Algumas medidas na alça de mira : aumento do número de meses trabalhados para pagamento do abono salarial ; a realização do curso de qualificação logo no primeiro pedido de seguro-desemprego e aumento de contribuição para ter acesso à pensão por morte. A missão - 4 Joaquim Levy é do ramo. Foi secretário do Tesouro do governo Lula e controlava o cofre do governo com mão de ferro. Mas não servia aos interesses de outro grupo da equipe do ex-presidente, que queria desengavetar projetos, ampliar investimentos e programas sociais. Ou seja, queria gastar. Líder desse grupo : Dilma Rousseff, nomeada ministra da Casa Civil. Resultado : Guido Mantega substituiu Antônio Palocci, que desembarcou do governo junto com seu secretário do Tesouro Joaquim Levy em 2006. A missão - 5 Grande ironia : durante a campanha a candidata Dilma acusava o oponente Aécio Neves de querer entregar o comando do país aos banqueiros por ter convidado Armínio Fraga para ministro. Os convidados de Dilma agora - Levy, ex-Bradesco, e Barbosa, PhD em Economia e com bom trânsito no meio acadêmico e no mercado financeiro - rezam pela cartilha de Armínio. A missão - 6 Nélson Barbosa é PhD em Economia pela New School for Social Research de Nova York e alongou seu perfil nos governos do PT. Começou aí em 2003, como chefe-adjunto da assessoria econômica do Planejamento na gestão Guido Mantega. Foi apeado do governo como secretário-executivo do Ministério da Fazenda em maio de 2013 na gestão Guido Mantega. Barbosa defendia transparência nas contas públicas, mesmo sem bater de frente com os defensores da contabilidade criativa. Para ele, tudo bem com o superávit primário mais enxuto, desde que feito de forma gradual e às claras. Caiu, e agora sobe para mais alto. A missão - 7 Tombini deverá fazer agora o que não conseguiu desde que assumiu a presidência do BC há quatro anos : domar a inflação, que ultrapassou o teto da meta de 6,5% e continua em sua trajetória para o alto. Funcionário de carreira, ele tem uma sólida formação econômica. Agora, com dois nomes de peso na condução da política econômica, as possibilidades de sucesso são maiores. Não em curto prazo. A missão - 8 Gastar à vontade rendeu a reeleição da presidente Dilma, mas parou a economia do país. Outra ironia : se os novos rumos derem certo e a roda da fortuna voltar a funcionar, com o receituário da direita, o PT pode asfaltar seu caminho rumo ao projeto de se manter no poder. Balançando do socialismo ao liberalismo. Apenas para confirmar o velho ditado : dinheiro não tem ideologia. Ou, como diziam os franceses no primeiro governo de François Mitterrand na década de 80 : socialismo é como violino. Toma-se com a esquerda e toca-se com a direita. Diferença Vocês sabem qual a diferença entre juízes da primeira instância e os da segunda ? - Os primeiros pensam que são Deus. Os outros têm certeza. Falsa delação ? A hipótese parece acertada : os delatores não deverão falsear os relatos. Sob pena de ver sobre seus ombros o falso testemunho. Se negociaram delações para reduzir suas penas, é evidente que mostrarão provas. Se não o fizerem e se for comprovado o blefe, a delação será um bumerangue. Dizem que Youssef já foi punido, uma vez, por ter feito uma delação falsa. Daí a conclusão : se fez isso, fará novamente. Este analista não acredita nessa hipótese. Seria muita burrice. Políticos de olho aceso Diz-se que o juiz Sérgio Moro não permite que os delatores, nesse momento, declinem os nomes de políticos. Porque se esforça para manter o affaire Petrobras em sua alçada, ou seja, no território de sua instância jurídica, PR. Se algum político for nomeado, o relator Teori Zavascki avoca o processo para o STF. Mas e os primeiros nomes já relatados no depoimento de Paulo Roberto Costa ? Ou aquela lista é pura especulação ? Tem boi na linha. Fraude Na faculdade, o aluno de Direito ao fazer prova oral : Professor - O que é uma fraude ? Aluno - É o que o senhor, professor, está fazendo. Indignado, o professor vocifera : - Explique-se, aluno. Aluno - Segundo o Código Penal, "comete fraude todo aquele que se aproveita da ignorância do outro para prejudicá-lo".
quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Porandubas nº 422

O velho padre Anacleto Abro a coluna com uma deliciosa historinha de padre Anacleto, o velho pároco de Uiraúna, cujas histórias são relatadas com a lábia do primo Zé Nêumanne, que teve o privilégio de ter convivido com ele. Padre Anacleto era conhecido por sua maneira engraçada de falar trocando situações e interpretando de maneira singular o ensinamento bíblico. (Nêumanne guarda uma boa coleção). Era temido pelos políticos porque não tinha papas na língua. Muita gente ainda hoje o imita. Uma vez, porém, caiu na armadilha engenhosamente preparada por Neco Pistola, figura muito popular da cidade. Para irritar o padre, Neco perguntou-lhe : "padre Anacleto, o que é artrite" ? O velho cônego respondeu : "artrite é a doença dos infiéis, das pessoas que não assistem missa aos domingos, é a doença dos vagabundos, dos cafajestes, viu seu Neco" ? Neco, todo compenetrado, passou a ler o jornal que levava na mão : "ah, agora entendo. Aqui tá dizendo que o Papa está com artrite". O affaire Petrobras O caso Petrobras vai deixar sequelas em muitas frentes. Não se trata apenas de focar as operações levadas a cabo pela PF, sob monitoramento do MP e autorização da Justiça. Trata-se de projetar seus efeitos sobre a esfera institucional e avaliar as consequências sobre o caminhar do governo e o cotidiano das instituições políticas. Daí o cenário que se esboça : o Natal e o réveillon serão comemorados sob o signo da instabilidade ; 2015 será aberto sob um abecedário de interrogações ; o governo padecerá de inércia administrativa, eis que passará boa parte do tempo dando respostas às indagações que tendem a se multiplicar ; a esfera representativa viverá no compasso da expectativa, esperando os nomes de políticos que entraram nas delações premiadas. O ambiente geral O escândalo no entorno da Petrobras será explorado pelas oposições de forma estrepitosa, ainda mais quando o clima ambiental deverá estar tomado por nuvens pesadas. A economia, no início do ano, causará preocupação caso a inflação ultrapasse o teto da meta, resvalando nas margens de 7% a 8%. A empregabilidade, passada a fase de contratação de temporários do fim de ano, tende também a refluir, trazendo em seu bojo insegurança, intranquilidade e preocupação. Os grupos organizados serão convocados a colocar suas tropas nas ruas e começarão a formar suas agendas e mobilizações por demandas. O caldo será tomado muito quente. As ruas cheias As ruas estarão cheias não apenas em função do corre-corre de fim de ano, quando as famílias entopem os shoppings centers fazendo compras de Natal, mas em atendimento à convocação que o PT já começa a fazer em defesa da presidente Dilma. A Esplanada dos Ministérios será um mar de gente, que acorrerá a Brasília para assistir a posse da presidente Dilma. O momento é histórico. Primeiro, porque a posse ocorrerá na esteira do maior escândalo que a contemporaneidade registra. A convocação petista assume, portanto, dimensão maior que a de simples comemoração. Embutiria a defesa do governo, significando o desfraldar de bandeiras petistas. As oposições O clima de guerra não amainou após as eleições. As redes sociais se infestam de tiros recíprocos entre os exércitos da situação e da oposição. O verbo soa alto sob os volumes inusitados de verbas bilionárias que teriam sido desviadas para pessoas e grupos. A animosidade impregna os ânimos sociais, com possibilidade de interferir nas ações governativas e nas atividades congressuais. Teremos eleições em 1º de fevereiro para composição das mesas do Senado e da Câmara, mas tais decisões dependerão dos nomes de políticos incriminados nas listas da delação premiada. Mais pressa O affaire Petrobras sinaliza um contencioso a correr mais depressa que o da AP 470. As coisas correm com muita velocidade. A impressão é a de que a sociedade não aguenta mais conviver com escândalos diários, sob intenso bombardeio da mídia. Daí a fabulosa teia de pressão que se forma em torno das Cortes Judiciárias para que se acelerem os processos. É claro que os advogados usarão todos os recursos que a Justiça lhes concede para a defesa de seus clientes, o que demandará um bom tempo. Mas as pressões serão insuportáveis para que julgamentos ocorram com rapidez. A frente política Na área política, a grande dúvida é sobre a extensão da crise. Será grande a relação de parlamentares envolvidos ? Como tenderão a agir os corpos parlamentares ? De maneira corporativa, em defesa dos pares, ou, sob pressão da sociedade, tomando decisões ágeis para que os processos passem pelas instâncias cabíveis nas casas congressuais ? Sejam quais forem as respostas, o fato é que o caso Petrobras acabará dando o tom à área política nos primeiros meses de 2015. Dilma com a palavra A presidente continuará a martelar que "doa a quem doer", o caso Petrobras vai mostrar corruptores e corruptos. As oposições continuarão a reagir : o MP e a PF são órgãos do Estado e não precisam de autorização para investigar. A lengalenga vai longe. O fato é que a mandatária precisará impor sua identidade no segundo mandato. No primeiro quadriênio, a imagem de excelente gestora deixou a desejar. Na área política, já se sabe, não cultiva a arte da articulação, tarefa que poderá transferir ao hábil articulador, que é Michel Temer, o vice-presidente. Lula na retaguarda Já a retaguarda do lulopetismo terá como comandante ele mesmo, Luiz Inácio. Que defende para o PT uma volta às origens. Significando maior aproximação aos trabalhadores. Ocorre que o partido, ao se inclinar pela volta às origens, deverá aceitar velhas bandeiras, algumas polêmicas, outras consideradas ultrapassadas. O PT atravessará um ciclo de profunda inflexão interna. Lula será o regente do exercício. Oposições mais fortes Esboça-se um discurso oposicionista contundente. Ora, nos anos do lulismo-petismo, as oposições não souberam se comportar como tal. Ficaram restritas ao discurso parlamentar, abandonando a articulação com a sociedade organizada. Com o incentivo adquirido por meio de 53 milhões de votos, Aécio Neves ganhará densidade, podendo vir a ser o que nunca foi : um comandante na arena de guerra. Tem idade e estofo para continuar a luta. Dilema de Dilma Como satisfazer o apetite de partidos famintos ? Como atender a uma base política mais larga e fragmentada ? Como imprimir ética e moral aos costumes políticos, como clama a sociedade, em um ciclo de grandes pressões partidárias ? Como satisfazer a sociedade, particularmente aos contingentes mais assistidos pelo Estado, no momento em que a economia exigirá ajustes, controles e arrochos ? Dilma mudará ? A questão mais recorrente é : Dilma mudará a índole ? Dará mais autonomia aos principais ministros ? Descentralizará a gestão ? São questões complexas, ainda mais quando o axioma criado pelo conde de Buffon em 1753 na Academia Francesa- le style est de l'homme même - continua na ordem do dia. Em se tratando da presidente, pelo que se ouve e o que se sabe, emerge um perfil de forte personalidade, ciosa de seu mando, centralizadora, atenta aos detalhes, de reações ágeis, em quem os psicólogos, pela clássica classificação de Hipócrates, poderiam enxergar traços temperamentais mais próximos aos tipos coléricos e sanguíneos (em que a força de excitação é maior ou iguala a da inibição) e mais distantes dos melancólicos e fleumáticos. Apostar na mudança ? Mesmo assim, há de se apostar na hipótese de mudanças ("novas ideias"), conceito que ela própria expressou na campanha. E isso pressupõe alteração na forma de pensar e agir. Significa intuir que ela vestirá o manto reformista. Ora, para cumprir essa missão, o reformador, como lembra Samuel Huntington, carece de habilidade política mais alta que a habilidade do "revolucionário", porquanto este precisa ser um político magistral para obter sucesso ; já "o reformador de sucesso sempre o é", diz o professor. E a reforma política ? E a reforma política, da qual todos proclamam, mas têm dúvidas por onde começar ? Por que não começar a desembrulhar o pacote pela régua do equilíbrio entre os Poderes ? Nesse caso, trata-se de administrar a índole avassaladora do presidencialismo, tornando-o menos voluntarista no plano das ações governamentais e ajustando-o ao molde concebido por Montesquieu na tripartição dos Poderes. A tese que se pretende esboçar é a de que a correção de rumos de nossa democracia representativa, antes de nova configuração dos organismos que a definem e a compõem - organização e funcionamento de partidos, escolha de candidatos, sistemas de voto, processo eleitoral, condutas dos agentes públicos em campanhas, etc. -, há de considerar um alinhamento no plano funcional dos Poderes. Se a relação entre eles tem rompido o fio constitucional da harmonia, independência e autonomia, por conta da apropriação de funções legislativas por parte do Executivo, qualquer projeto de reforma política será capenga se não considerar este fato. O que e como fazer ? O que e como fazer para amainar a fome pantagruélica do nosso presidencialismo ? Resposta simples : ajustar os buracos do cinturão econômico dos entes Federativos, tornando-os mais compatíveis às suas demandas. O fator econômico, como se sabe, ordena a disposição no tabuleiro da política. Vamos ao dado fundamental : a União fica com 60% dos impostos arrecadados e apenas 16% vão para os municípios, enquanto os Estados embolsam 24%. A inferência é óbvia : se não houver repartição da gigantesca fatia do bolo tributário, o Executivo continuará a encurtar e alongar (de acordo com suas conveniências) o cabresto dos "animais políticos" que procuram sua roça. A reforma fiscal, pois, se apresenta como a primeira barreira para deter a força descomunal do presidencialismo. Se municípios e Estados forem menos dependentes do poder central, seus representantes - governadores, senadores e deputados - terão melhores condições de se livrar do grilhão do fisiologismo. Só assim, o Poder Legislativo não seria tão refém do Executivo, e este, por sua vez, atenuaria suas funções legislativas. Relembrando "Seu Lunga" Banho em minhoca Zé Mané : - Seu Lunga tá pescando ? Seu Lunga : - Não... Dando banho na minhoca ! Quando faltar... O cara vai até a loja do seu Lunga e pergunta : - Seu Lunga tem carrinho de mão ? - Num tá vendo que tem ! - responde ele. - Quanto é  ? - Pergunta o cliente. - R$ 90,00. O cliente querendo comprar o carro mais barato argumenta : - Seu Lunga, "homi", ali na loja do lado é R$ 60,00, mas tá faltando o carrinho... Seu Lunga responde : - Pois quando aqui estiver faltando eu lhe vendo de graça.
quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Porandubas nº 421

As galochas, padre, as galochas ! Abro a coluna com uma historinha das Minas Gerais. Cuidado. Usem galochas. Um padre da paróquia de Caratinga procurou, um dia, o renomado médico, dr. Edmundo Lima. Queixava-se de um prosaico, mas renitente resfriado. O médico constatou, de pronto, não se tratar de resfriado. A coriza não era nasal. O padre insistiu alegando haver pisado no chão do banheiro com os pés descalços. O doutor Edmundo, experiente, já havia feito o diagnóstico : uma baita blenorragia. O médico sentiu o drama do sacerdote. Receitou os remédios da época para curar blenorragia, com um conselho : - Olha, padre, quando o senhor for tomar banho não se esqueça de usar galochas. Elas são de borracha, garantidas, e não deixam passar a friagem que provoca essa coriza que lhe está atormentando. Padre, as galochas, viu ? - Ah ! Já ia me esquecendo : é bom que o senhor bispo não fique sabendo desse resfriado. Padre, todo cuidado é pouco ! (Historinha do mineiro Zé Abelha). Governo Dilma A presidente Dilma estará entre a cruz e a caldeirinha nos próximos tempos. De um lado, será instigada a fazer reformas e a formar um Ministério asséptico e imune aos ataques sociais contra a velha política. De outro, será pressionada a oferecer comida ao apetite dos partidos, abrindo espaços. O ano de 2015 será duro. Cheio de ajustes. A tendência é que sua imagem caia com a desaprovação às medidas governamentais para melhorar os cofres do governo. A conferir. Os solavancos da imagem Tem sido assim. O mandatário eleito ou reeleito vive uma lua de mel até a posse. Quando a onça aparece para beber água, as coisas começam a se complicar. Aumentos de preços, reajustes, especulações, partidos insatisfeitos, líderes contrariados formam as nuvens do céu governamental. Vai explodir raio por todos os lados. A imagem da presidente entrará em descenso. O PT será colocado no poço do descrédito. E tentará voltar às origens, atendendo ao discurso de Lula. Vamos ver até onde isso vai dar. Ministro da Fazenda Cresce a ansiedade no mercado à espera da indicação do novo ministro da Fazenda para a vaga de Guido Mantega. Três nomes sobressaem : Henrique Meirelles, ex-presidente do BC no governo Lula ; Alexandre Tombini, atual presidente do banco e alinhado com a presidente Dilma. E Nélson Barbosa, ex-secretário executivo do ministério da Fazenda, que saiu após divergência com a equipe econômica. O empresariado torce por um economista ortodoxo para acalmar o mercado e promover a volta dos investimentos, encerrando este ciclo de desconfiança. Mais lenha Uma observação que tem condições de se realizar : os depoimentos dos delatores premiados (??) deverão adicionar mais lenha à fogueira. Por isso, é pouco provável que o quadro político de hoje se mantenha harmônico amanhã. Por exemplo, a eleição para presidentes do Senado e da Câmara hoje apresenta a cor azul, amanhã a cor pode ser vermelha para os atuais nomes - de um lado, o senador Renan Calheiros ; de outro, o deputado Eduardo Cunha. E se seus nomes aparecerem com ênfase na boca dos delatores ? Mesmo se apresentarem argumentos sólidos de defesa, permanecerá a dúvida levantada por eventual delação. Os fundos Garboso e exuberante, o candidato a prefeito de Jaguaribe/CE não economizou nas promessas. Prometeu construir maternidade, abrir poços artesianos, melhorar as estradas do interior do município, construir mais escolas. Mas não podia deixar de fazer o brinde final à demagogia. Tinha de prometer algo mais : - Pois é, minhas conterrâneas e conterrâneos, se vocês tiverem em suas casas redes rasgadas, guardem os punhos. Pois quando eu for eleito, darei os fundos. Pressão do Planalto Pelo que se enxerga, o Palácio do Planalto não tem objeção ao nome do senador Renan Calheiros para presidir o Senado. Renan tem sido hábil na condução da Câmara Alta. Trata-se de um articulador que sabe agradar as correntes do Senado. Só mesmo uma bomba de alto teor explosivo poderia tirá-lo da jogada presidencial. Quanto ao deputado Eduardo Cunha, tudo vai depender do rolo compressor do Palácio. Quem é dono da flauta, dá o tom. Os palacianos estão com a régua e o compasso. Mas Cunha está conta com a insatisfação de grande parcela dos deputados. Vai ser uma dura queda de braço. Alckmin pede água O governador Geraldo Alckmin não é tonto. SP com sede pede água. E se a conta para ter água é gigantesca, que se procure quem tem cofre para bancar. Geraldo foi ao Planalto. Quer 3,5 bilhões para viabilizar a água nas torneiras. Dilma ouviu e quer razões técnicas. Se o governo Federal aprovar o recurso, poderá dizer : sem nossa ajuda, os paulistas ficariam com a boca seca. Um belo argumento para a campanha de 2016. Serra, Anastasia, Aloysio, Aécio e Jereissatti Aécio vai ser o chefe. Antônio Anastasia, o chefe da Casa Civil de Aécio. Aloysio Nunes será o ministro da Política. Tasso Jereissatti deverá ser o comandante da arena de guerra. E José Serra será o quê ? O primeiro ministro do sistema parlamentarista que os tucanos querem criar com esse tal de governo paralelo ? Pode ser. Serra não tem vocação para ser comandado. Quer comandar. E lutará para ocupar a posição de primeiro ministro, que dá as cartas no sistema. Vai ser uma luta engraçada na floresta dos tucanos plantada no Senado. Reforma política Este consultor tem apostado na hipótese de uma reforma política. Uma reforma que contemple questões pontuais. Não uma reforma por inteiro. Se não ocorrer, o Congresso, já desmoralizado, não terá condições de dialogar com a sociedade, que está quilômetros adiante. Mudou de nome ? Mariana, em MG, já foi chamada de Roma brasileira. Terra de fé e de velhas igrejas. E cheia de placas com nomes engraçados nas ruas : - Cônego Amando - Armando Pinto Cônego Amando era conhecido pela verve. Um dia, viajando pelo interior do município, uma de suas acompanhantes caiu do cavalo. Rapidamente ficou em pé. Meio sem graça, perguntou ao Cônego : - O senhor viu a minha agilidade ? - Minha filha, respondeu, eu até que vi. O que eu não sabia é que tinha mudado de nome. (Mais uma de Zé Abelha) A renovação A renovação de quase 50% dos representantes na Câmara não significa inovação política. Os novos conservam forte parentesco com os velhos políticos. Eduardo Paes O PMDB começa a mapear os seus nomes para abrir os horizontes presidenciais de 2018. O mais afoito pré-candidato desse empreendimento se chama Eduardo Paes, prefeito do RJ. Ele quer pegar carona nas Olimpíadas de 2016 no RJ. O problema : não tem a alma tão peemedebista. Lula tem dúvidas Se meio mundo tem dúvidas sobre a possibilidade de mudança de comportamento por parte da presidente Dilma, seu tutor, Lula da Silva, também tem. Dilma precisa dialogar mais, ser mais flexível, ouvir a área política, contemporizar, coisas comuns no dicionário lulista. E se ela se mantiver irredutível ? Esse é imbróglio que aflige o PT. Cabral, onde está ? Pezão, o governador do Rio, sorri de um canto a outro da boca. E Sérgio Cabral, o ex-governador, está por onde ? Alguém o viu ? Regulamentação econômica Este consultor não tem dúvidas. Virá projeto de regulamentação econômica da mídia. Para evitar monopólios e oligopólios, conforme reza nossa Constituição. O que significa evitar a propriedade cruzada dos meios : jornais, revistas, rádio e TV em um mesmo mercado. Urge incentivar a competitividade. Este consultor é contra os monopólios. Chinaglia Arlindo Chinaglia é o candidato mais forte do PT à presidência da Câmara. Conhece o riscado. Vital O senador Vital do Rego é um nome de peso. Um senador preparado, articulador, dialoga com todos os lados. E pode ser o nome do PMDB para o TCU. Reúne todas as condições. Russomano Celso Russomano, o deputado mais votado de SP, já anuncia sua candidatura à prefeito da capital em 2016. Mas deverá enfrentar problemas sérios de imagem. Vem chumbo grosso por aí. Reforma tributária Este consultor também enxerga formidáveis pressões dos exércitos estaduais e municipais sobre o Executivo e o Legislativo. O pires na mão sugere inevitável reforma tributária já em 2015. Os Gomes Diz-se que Cid Gomes, um político que tem costados quebrados na frente da imagem pública, não quer ser ministro e sim um representante do Brasil no BID. Para aprimorar seu inglês. E Ciro, o irmão, assumiria um Ministério. Ciro, a metralhadora ambulante, pode ser útil ao governo Dilma ? Ela que o diga. Marta, a candidata do PT Marta Suplicy lutará para se candidatar a prefeita de SP. Não conseguiu a empreitada em 2012, quando Lula impôs Haddad, puxando o tapete dela. Agora, saindo do Ministério de Dilma, já atirando contra o governo que a abrigava, habilita-se a fazer política municipal. Aloysio, o melhor nome Já se abrem os espaços de especulação de candidaturas a prefeito de SP em 2016. O PSDB abre o leque com Andrea Matarazzo, vereador, e Bruno Covas, eleito deputado Federal. Este consultor enxerga o senador Aloysio Nunes Ferreira como o melhor candidato. Hoje. Tem peso. Skaf e Chalita O PMDB também apresentará seu candidato a prefeito em 2016. Paulo Skaf poderia ser o nome. Tem garra e vontade. Mas o partido o vê com certa suspeição : a de ser autossuficiente, não vestindo a camisa da sigla. Se quiser ser candidato, carece refazer a relação com o partido. E há também Gabriel Chalita, que se afastou do partido para continuar a fazer incursões intelectuais. Este tem bom trânsito no partido, mas, segundo se sabe, quer dar um basta na política. O comando da solução se chama Michel Temer. Sem ele, não existe possibilidade. Para um ou outro. Cruzeiros marítimos sob novo comando Diante da necessidade de profissionalizar a gestão e contar com um presidente full time, a CLIA Abremar Brasil (Associação Brasileira de Cruzeiros Marítimos) terá novo comando a partir de 1º/12. Marco Ferraz, que desde a década de 80 atua no setor de Turismo, foi escolhido para ocupar o cargo. Roberto Fusaro, atual presidente da CLIA Abremar Brasil, passa a presidir o Conselho da Associação. O executivo foi escolhido, segundo Fusaro, por sua grande experiência tanto no setor corporativo quanto no relacionamento com autoridades. Mais uma de "mineirim" Grande churrasco abrindo a campanha de Magalhães Pinto, no pátio do Centro Gaúcho, Pampulha, BH. Gabriel Procópio Loures, o Gabi, gerente da Caixa Econômica Estadual em Santos Dumont, pega o microfone para saudar o candidato : - Minhas senhoras e meus senhores ! Como disse o grande filósofo francês, "Madame, Monsieur"... Muitas palmas. E comentários gerais : "que homem culto, o homem sabe tudo".
quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Porandubas nº 420

A gorjeta de Bill Gates Abro com uma historinha de fazer pensar. Certo dia, Bill Gates foi ao restaurante junto com sua esposa e filhos, duas meninas e um garoto. Eles sentaram-se em mesas diferentes, mas foram atendidos pelo mesmo garçom. Durante o jantar tudo ocorreu normalmente. Depois de pedir a conta, Bill a pagou na mesa, deixando para o garçom uma gorjeta de cinco dólares. O que deixou o homem com uma cara estranha, chamando a atenção de Bill, que perguntou : - O que houve ? O garçom respondeu : - O senhor vai me desculpar, mas acho um pouco estranho, pois seus filhos me deram 500 dólares de gorjeta e você, sendo o homem mais rico do mundo, me deu apenas cinco. Bill sorriu e respondeu : - Eles são filhos do homem mais rico do mundo, eu sou filho de um lenhador. Moral : Jamais devemos nos esquecer de onde viemos. Feridas abertas As feridas da guerra eleitoral ainda estão abertas. Precisarão de remédio ainda por muito tempo. Os ânimos não se acalmarão tão cedo por causa da animosidade que teima em dar suas pauladas nas redes sociais. A cargo dos exércitos dos dois lados. Nesse momento, urge recuperar o bom senso. Não é o caso de duvidar dos resultados eleitorais, coisa que pode parecer virada de mesa à base do tapetão. Os tucanos podem até exigir investigação do processo eleitoral, mas esse pedido cai como inconformismo. A mídia nunca foi tão combativa e atenta quanto nesses tempos de voto dividido. E não estamos vendo a mídia trabalhar com o conceito de roubo nas urnas, conchavos, etc. Papel dos tucanos Ora, os tucanos não se saíram mal do processo eleitoral. Ao contrário, foram muito bem votados, a partir de SP, cujo maior colégio de eleitores elegeu Geraldo Alckmin no primeiro turno. Espera-se, agora, que façam uma oposição aguerrida, mas decente, séria, sem apelos populistas ou revanchismo. Essa trombeta de grupos radicais que pregam um golpe e a volta dos militares deixa o PSDB em maus lençóis. Por mais que o partido diga que não é esse o discurso, acaba caindo em seu colo esse queixume de derrotados. Bola pra frente. Aécio, a liderança tucana Aécio Neves vai consolidar sua posição de principal líder tucano. Teve uma grande votação. Aprimorou seu discurso. Poderá se firmar como liderança respeitável, admirada, aplaudida, caso consiga ser um oposicionista equilibrado. Como sói ocorrer, Dilma entrará num círculo de fogo, enfrentando ajustes, controles, represamento de preços, brigas de partidos por cargos. Será submetida a um imenso corredor polonês. E Aécio se sentará de maneira confortável no Senado, olhando a cena, perorando, cobrando, criticando. Dilma e as pressões A presidente reeleita entrará numa fase de pressões insuportáveis. Precisa agradar aos políticos, aos partidos, às organizações sociais, à miríade de setores produtivos. Precisa compor um ministério que agrade a todos, que seja representativo da composição política que a elegeu ; precisa mudar a índole no que diz respeito ao tratamento de políticos e partidos ; mas precisa formar um grupo mais homogêneo, forte no domínio da matéria econômica, compromissado com a meta do resgate do crescimento. Será um deus nos acuda. De um lado, as pressões puxando para a velha política ; de outro, a necessidade de botar o carro da nova política na trilha das mudanças. Lula quer mais força Lula, por sua vez, quer ter maior influência no governo. Não apenas para demonstrar força, mas para tentar fazer uma revolução no partido e ajudar o governo a encontrar o rumo. Lula sabe ouvir e agradar aos partidos. É o que dizem as lideranças partidárias. Sabe articular. E sabe pôr ordem na casa, a partir da mansão partidária. Nesse espaço, Lula pretende resgatar o ideário petista, fazendo renascer a chama dos trabalhadores e o escopo da esquerda por uma nova ordem social. A virada à esquerda se faz necessária porque o partido chegou ao centro, deslocando outros entes políticos, como o próprio PSDB, mais para a direita. Ele sabe que se o PT não redesenhar a imagem corroída, chegará ao fim de linha com o segundo mandato de Dilma. PMDB, o coringa O PMDB é o partido mais capilar do Brasil, aquele que consegue se infiltrar nas veias municipais, estaduais e no coração do poder. É um partido que divide para somar. Perdeu apenas quatro deputados em relação à bancada anterior, enquanto o PT perdeu 18 parlamentares. Terá o comando do Senado e vai brigar pelo comando da Câmara. Apesar de se mostrar, hoje, um partido dividido, é razoável pensar em sua unidade, principalmente tendo em vista o futuro pleito presidencial. O presidente do PMDB, vice-presidente da República Michel Temer, terá sob sua responsabilidade a integração de propósitos dos peemedebistas. Como hábil articulador, deve-se apostar na hipótese. Renovação A derrota de figuras importantes no partido abrirá portas para novas lideranças no PMDB. José Sarney está dando um adeus ao mandato de senador e perdeu no MA ; Lobão, o ministro das Minas e Energia, amarga a derrota de seu filho, no MA. Eunício Oliveira, o senador, perdeu a eleição no CE para governador ; o senador Eduardo Braga perdeu no AM ; o senador Romero Jucá perdeu em RR, com seu filho Rodrigo como candidato na chapa de Chico Rodrigues ; Jader Barbalho perdeu no PA com a derrota de seu filho Elder para o governo. Renan conseguiu se salvar com a vitória de seu filho, Renan, no primeiro turno, para o governo de AL. Requião, o senador de expressão contundente, perdeu o governo do PR. Geddel Vieira, ex-líder do partido e ex-ministro, perdeu a eleição para o Senado na BA. Henrique, presidente da Câmara, perdeu a eleição para o governo do RN. Mais força Não se pense, porém, que isso tenha reflexos em sua fortaleza política. Ora, o PMDB elegeu sete governadores, mostrando que continua a ser o ente com mais força na frente das composições políticas. E ante esse quadro, o presidente do PMDB, Michel Temer, sai fortalecido com sua vitória como vice-presidente da República. A pressão sobre ele, inclusive dos derrotados, será intensa. Este consultor acredita que a força do PMDB no segundo mandato de Dilma será maior. Tucanos nas prefeituras Os tucanos começam a planejar o futuro. A estratégia é a de eleger o maior número de prefeitos de capitais, de cidades grandes e médias, em 2016. Para tanto, poderá até convocar suas grandes lideranças. Este consultor ouviu de um prócer tucano a ideia do partido de escolher o senador eleito, Antonio Anastasia, como candidato a prefeito de BH. Já em SP, o senador mais votado do Brasil, Aloysio Nunes Ferreira, poderia ser o candidato a prefeito pelo partido dos tucanos. Pedrinhas no tabuleiro A derrota de hoje poderá ser a vitória de amanhã. A hipótese começa a ser considerada por muitos derrotados no último pleito, que já pensam em aproveitar o recall obtido e expandido na última campanha para utilizá-lo no próximo embate, em 2016. A campanha será mais barata, se nomes conhecidos forem os candidatos. Em SP, além de Aloysio Nunes, os tucanos pensam também no vereador Andrea Matarazzo. No PMDB, começa a circular a ideia de resgatar o nome de Gabriel Chalita, que hoje se dedica à vida cultural. Seria um nome de peso para a prefeitura. E também se volta a falar no nome de Paulo Skaf, um perfil sempre arrojado e determinado, possivelmente por outro partido que não o PMDB, onde ele ainda se encontra. Como se sabe, a última campanha deixou arestas entre ele e figuras do partido. Empresariado quer participar Seja quem for o escolhido para comandar o Ministério da Fazenda, o empresariado quer participar da formulação da nova política econômica. Há empresários do porte de Jorge Gerdau que não perdem a esperança de ver o país voltando a trilhar pelo caminho do crescimento econômico. Em meia de hora de conversa, Gerdau diz as coisas essenciais para a economia retomar o fio da meada em matéria de crescimento. Retrato do país Dia 7, sexta-feira, ao lado dos jornalistas José Nêumanne Pinto e Audálio Dantas, estarei fazendo uma pequena radiografia do Brasil após as eleições. No Espaço Sociocultural - Teatro CIEE-SP, rua Tabapuã, 445. Participação aberta. Meu último livro - Novo Manual de Marketing Político - será distribuído aos presentes. Quarta democracia O Brasil que sai das urnas mostra ser um dos maiores laboratórios da democracia contemporânea. Os nossos 142 milhões de votantes posicionam o país no quarto degrau do ranking eleitoral, cujos três primeiros lugares são ocupados pela Índia, com 815 milhões de eleitores, os Estados Unidos, com cerca de 215 milhões, e a Indonésia, com 187 milhões. Imperfeita A prestigiada revista The Economist fez uma pesquisa em 167 países, levando em conta uma planilha com as seguintes categorias : processo eleitoral e pluralismo, liberdades civis, funcionamento do governo, participação popular e a cultura política. Nela, ocupamos a 45ª posição, ao lado de países de democracia imperfeita, dentre os quais, pasmem, estão democracias de forte tradição como a francesa (29ª), a italiana (31ª) e a grega (32ª). A Índia, por exemplo, está na mesma faixa do Brasil, ocupando o 39º lugar. Ora, há 50 anos nosso país entrava na escuridão de um golpe militar que durou 21 anos, tendo fixado as linhas mestras de sua democracia apenas a partir de 1988, com a chamada Constituição cidadã, que veio atender as demandas da sociedade organizada. Sob uma pletora de liberdades, direitos e deveres, garantidos pela CF, realizou-se o pleito mais competitivo das últimas décadas. Índia A animação da vida cívica que se viu no último pleito constitui expressiva amostra da efervescência inerente às democracias incipientes. Não há motivo para assombro. Se formos projetar os tipos de voto dados aos candidatos da situação e da oposição, domingo passado, encontraremos pontos em comum com as competições de outros países. Em maio deste ano, por exemplo, o partido nacionalista da Índia obteve vitória esmagadora sobre o partido do Congresso, acabando com 10 anos de poder da dinastia Ghandi-Nehru, deteriorada (sabem por quê ?) pelo precário crescimento do país e por uma batelada de escândalos de corrupção. EUA Já nos Estados Unidos, a votação dos democratas é geralmente associada a grupos e setores avançados, progressistas, simpáticos às causas sociais ; os votos republicanos são oriundos de polos conservadores nas áreas dos costumes (contra o aborto, contra o casamento gay e a legalização de drogas), dos valores morais e da economia (defesa do Estado-mínimo, redução de impostos, privatizações, fim de programas sociais, etc.). Lá, a linguagem da "lama" (mudslinging) é frequente e intensa, sendo usada de forma intensa na mídia eletrônica. Aqui, dois tipos de voto Por aqui, essa estratégia acabou sendo usada pesadamente e com efeitos deletérios. Cada exército lutou por sua meta : de um lado, a continuidade do ciclo petista, de outro, a abertura de uma nova era. Por aqui, mais que uma luta esganiçada entre regiões, como incautos chegaram a enxergar, o que se viu foi uma batalha entre duas forças : uma, abrigando o voto material ; outra, o voto valorativo. A primeira reúne os contingentes atentos às coisas materiais, concretas, como os pacotes assistencialistas do governo - bolsa família, luz para todos, minha casa, minha vida, etc. O sufrágio ligado ao bolso e à barriga foi despejado nas urnas, sobretudo, pelas massas que dependem do Estado. A segunda força votou na carta de valores : a ética, a dignidade, a seriedade, a moral, tendo como pano de fundo, o repúdio aos escândalos e às denúncias. O voto material suplantou o voto valorativo.
quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Porandubas nº 419

O Brasil dividido ? O Brasil saiu das urnas rachado ao meio. O racha, ao contrário do que muitos pensam, não mostra um país separado por regiões - Nordeste contra o Sudeste - mas por votos. É só olhar a aritmética eleitoral. Dilma conseguiu uma montanha de votos no Nordeste - mais de 12 milhões de votos de maioria, ou seja, 71% dos votos. Apenas 29% foram para Aécio. Minas, o ponto nevrálgico No país, Aécio perdeu por três pontos. O que aponta para seu Estado, MG, onde Dilma venceu por quase cinco pontos (4,82%), cerca de 550 mil votos. Se Aécio tivesse lá metade dos pontos de vantagem que obteve em SP, venceria. No maior colégio eleitoral (SP), Aécio ganhou de 64,31% a 35,62%, uma diferença de 28,62%. Como se recorda, os tucanos prometiam uma vitória em Minas com uma vantagem de mais de três milhões de votos. Divisão mal feita Se o país fosse dividido em dois, por regiões, como alguns radicais chegaram a propor nas redes sociais, não seria o Nordeste contra o resto. Ao Nordeste, seriam somados os Estados de Minas e RJ, onde a presidente obteve 58% dos votos válidos contra 42% da votação dada a Aécio. Dilma, pior em 15 Estados Em comparação com o 2º turno da eleição presidencial de 2010, quando venceu pela primeira vez, a presidente Dilma Rousseff piorou seu desempenho em 15 Estados e no DF. Nos demais 11 Estados, ela teve votação porcentual superior à registrada há quatro anos. Os maiores avanços ocorreram em SE e no AC, onde a votação da presidenta aumentou 25%. Logo a seguir aparecem RR (24%) e RN (18%). Todos nas regiões Norte e Nordeste. No outro extremo, as maiores quedas proporcionais ocorreram em DF (-28%), SP (-22%), AM (-20%) e SC (-18%). Melhor desempenho Na região Nordeste, maior reduto de Dilma, ela conseguiu melhorar seu desempenho em seis dos nove Estados da região. Além de SE e RN, houve aumento expressivo de sua parcela de votação em AL (16%) e no PI (12%). Onde houve piora, a queda foi pequena : 1% ou menos na BA, no CE e no MA, e 7% em PE, onde ganhou a campanha, para surpresa de muita gente que esperava vitória de Aécio, depois de receber o apoio da família de Eduardo Campos. Voto material x voto valorativo O que este consultor enxerga é uma grande divisão na tipologia eleitoral. Enxergo duas grandes modalidades de voto : o voto material, que abriga as coisas concretas - as bolsas, as casas, a luz, as escolas, hospitais - e o voto valorativo, que explica a influencia dos valores - ética, moral, honestidade, dignidade, respeito, combate à corrupção em todas as áreas, etc. Pois bem, o voto material é o voto mais identificado com Dilma e o voto valorativo foi dado em maior profusão a Aécio. Não significa dizer que Dilma não recebeu votos valorativos. Ela os recebeu, mas em menor quantidade que Aécio. A recíproca é verdadeira. Regiões dependentes do Estado Daí a explicação que mostra as regiões mais dependentes do Estado votando maçicamente em Dilma. Em MG, por exemplo, a região Norte do Estado se assemelha ao Nordeste. Já o sul desenvolvido encheu mais as urnas de Aécio. Levantei esta hipótese do voto valorativo x voto material no sábado, meia noite, no Painel da Globo News. Instigado por William Waack que tipo de voto seria majoritário, respondi na lata : o voto material. Foi o que deu. Diálogo, palavra chave Ainda bem que a presidente Dilma cravou a palavra correta, em seu primeiro discurso depois de eleita, para definir sua missão nos tempos tensos que virão : diálogo. O Brasil que saiu das urnas, após assistir a mais virulenta campanha desde os idos de 1989, está rachado ao meio. A profunda divisão que se formou no seio de grupos, setores e regiões, poderia, até, ser considerada sinal de avanço político, pelo entendimento de que o escopo democrático se inspira na disputa entre contrários, se chegássemos ao final do pleito com o peito estufado de animação cívica e não com arsenais cheios de ódio e desejo de vingança. Juntar os cacos À presidente caberá a missão de juntar os pedaços partidos do corpo político nacional. Vai comandar um país conflagrado, fracionado em duas grandes bandas, separado por gigantesco apartheid, que lhe vai exigir extraordinário esforço para recompor a união da comunidade política, destemperada ao correr da campanha eleitoral pelo molho da discórdia. A agressividade da linguagem usada pelos candidatos deixará feridas abertas por um bom tempo, eis que os eixos centrais da política foram entortados : adversários passaram a ser inimigos ; o combate às ideias cedeu lugar ao embate pessoal ; a carga expressiva da competição eleitoral saiu da régua do respeito para descambar no tiroteio chulo. Não será fácil reconstruir a mesa da comunhão nacional, unir os sonhos da coletividade. Apagar o 'nós e eles' A cisão social vem sendo, há tempos, alimentada por recorrente discurso com foco na luta de classes, fenômeno que abandonou as ruas e foi apagado do discurso político desde a queda do Muro de Berlim. Por essas bandas, no entanto, a insistência de um partido e suas principais lideranças em manter vivo o alfabeto da separação - "nós e eles", "elite branca contra os miseráveis", "ricos e pobres", "Nordeste contra Sudeste" - contribuiu sobremaneira para expandir os atritos na esfera social, formando bolsões de animosidade entre grupos partidários, exércitos militantes e entidades com feição política, como centrais sindicais. Forte classe média O abecedário separatista não vingou por algumas razões, entre as quais pelo fato de estar defasado no tempo e no espaço - principalmente neste nosso espaço habitado por forte classe média - e ainda porque as fontes primárias da pregação foram envolvidas, de forma direta ou indireta, pela intensa fumaça de escândalos, desde os antigos, como o mensalão, e mais recentes, como o affaire da Petrobras. O discurso acabou perdendo credibilidade ao bater em ouvidos descrentes, fazendo eco apenas em grupos limitados. Pontes de equilíbrio Ante esse quadro, emerge uma tarefa monumental a ser desempenhada pela presidente reeleita : apaziguar a Nação repartida em raiva e mágoa. O caminho a seguir é longo, exigindo complexa engenharia na construção de pontes - perfis respeitados, críveis, sérios, preparados. Sua missão : aplainar o terreno esburacado e abrir canais de acesso nas áreas política, social e institucional. Urge levantar o pressuposto de que os programas de governo em qualquer esfera temática, para serem bem recebidos pela sociedade, hão de exigir uma comunidade pacificada, harmônica, identificada com grandes causas. Barreiras Na frente política, a engenharia de pontes, liderada por renomados articuladores, deverá ter uma dificuldade a mais : enfrentar os obstáculos gerados por um arco partidário mais amplo. Na Câmara, tomarão assento 28 partidos, a maior parcela constituída de siglas médias e pequenas, que certamente desejarão participar da administração. Maior fragmentação partidária vai requerer maior atenção na composição de interesses. O dilema se escancara. No momento em que se clama por instrumentos para tirar a política do poço da decadência moral - esforço que exigirá um mutirão pela reforma política - o novo governo terá de compor com mais partidos sedentos de poder. Um desafio e tanto. Junto aos grandes partidos a tarefa de harmonização também não será fácil. Sociedade organizada Papel importante terão também as entidades de intermediação social, pois o poder político encontrará nelas o contraponto para exigir mudanças. Em suma, aos vitoriosos caberá o exercício de tomar o pulso da comunidade política e evitar verbos palanqueiros que instiguem a animosidade e a formação de ilhas de discriminação no arquipélago social. Aos derrotados, impõe-se o dever democrático de aceitar os resultados e, da mesma forma que os vitoriosos, fechar o dicionário separatista. Pátria amada Nunca foi tão necessário um pacto pela harmonia social, conduzido com bom senso e emoldurado pelo ideário que ampara o conceito de Pátria, assim expresso pelo magistral escritor argentino, José Ingenieros : "os países são expressões geográficas e os Estados são formas de equilíbrio político. Uma Pátria é muito mais que isso : é o sincronismo de espíritos e corações, comunhão de esperanças, homogênea disposição para o sacrifício, aspiração à grandeza". Se o próximo governante estiver imbuído desse sentimento, veremos cenários menos turbulentos. Desse modo, o Brasil poderá virar uma página muito dolorida e substituir o espelho retrovisor pelas luzes do amanhã. Temer, o articulador O vice-presidente Michel Temer terá papel preponderante na engenharia da articulação política. Presidiu a Câmara Federal por três vezes, líder do PMDB por duas vezes, conhece bem as casas congressuais. Já teve uma primeira conversa com a presidente sobre a articulação política. Será um dos vértices dessa engenharia de pontes com o Congresso e a sociedade. Ademais, o PMDB se fortalece por ter feito o maior número de governadores, sete. A bem da verdade Pinço de minha agenda, a mensagem :" P.S. Às 13h25 do dia 23 de maio de 2014, aqui em meu escritório, o candidato a deputado, Galeno, garantiu a este incrédulo consultor que o próximo governador do RN será Robinson Faria, vencendo o candidato Henrique Alves". Pois bem, hoje, 28 de outubro, às 13h25, o deputado estadual eleito Galeno Torquato, o segundo mais votado do Estado, lembrou-me o episódio. Foi a eleição mais retumbante na esfera dos Estados, eis que Henrique Alves, presidente da Câmara dos Deputados, tinha o apoio da maior fortaleza política já construída no RN : uma coligação de 18 partidos, 130 dos 167 prefeitos, 21 dos 24 deputados estaduais, seis dos oito deputados Federais, três atuais senadores e sete ex-governadores vivos. Moral da história : o candidato precisa combinar o jogo com o povo. Relato o caso por sua relevância para a história eleitoral brasileira.
quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Porandubas nº 418

Tudo verdim Abro a coluna com deliciosa historinha do Seridó/RN. Os cientistas envolvidos com o estudo da agropecuária garantem que o gado bovino somente visualiza uma cor, a escura. Mas o Honorim Medeiros (que Deus o guarde), da Fazenda Pedra do Sino, em Caicó, não foi na conversa e, com a ajuda do seu próprio rebanho, jogou por terra a tese dos doutores em zootecnia. Foi na seca dos anos 50. Exauridos todos os recursos de pastagem, o gado rejeitava os restos do capim seco, duro, esturricado, preferindo apenas a torta de algodão, verdinha, fresquinha, ótimo sabor. Honorim vivia preocupadíssimo, aperreado, sem mais saber o que fazer : - Tô lascado, desse jeito vou alisar ! Matutou, matutou, e, criativo, bolou a ideia genial. Foi até a Paribana, casa comercial do amigo Antonio da Viola e fez uma inflacionada compra, deixando o comerciante boquiaberto : - Tem óculos de carnaval ? Pois então me dá todo o estoque, todos da cor verde (antigamente, eram comuns os óculos de plástico, com alças de elásticos, usados exclusivamente no período momesco). O fazendeiro levou-os para a Pedra do Sino e fantasiou o rebanho. Na volta à cidade, o amigo quer saber dos resultados : - Como é Honorim, deu certo ? O fazendeiro abriu um sorriso de orelha a orelha e deu a boa nova : - Mas, home, é um milagre. O gado tá comendo até as cercas e os mourões das porteiras ! (Quem conta em Segura Essa é Orlando Rodrigues) Quem ganha ? Em todos os lugares, a recorrente pergunta : e agora, quem ganha a campanha ? Mais uma vez, a bola de cristal está turva. E desta feita, não há esperança que as águas se acalmem e deixem a figura que está na frente. Tudo está mais embolado. Mas se as perguntas adiante forem respondidas, teremos chance de acertar as previsões : Aécio conseguirá retumbante vitória em seu Estado, MG, onde um governador do PT, Fernando Pimentel, eleito no primeiro turno, se transforma em cabo eleitoral de primeira linha de Dilma ? Dilma conseguirá expandir sua vitoria no Nordeste, onde teve 12,5 milhões de votos de maioria ? Aécio conseguirá expandir seus votos no Nordeste, a partir de PE, e sair dos 15% de votos que teve na região ? Ambos conseguirão aumentar seu cacife em SP e no RJ, grandes colégios eleitorais ? Hipóteses Todas as hipóteses acima são razoáveis para um e para outro, mas outra questão de colocar : a maioria de votos de Aécio no Sudeste conseguirá ultrapassar o latifúndio de votos de Dilma no Nordeste ? Se PE vai dar uma boa votação para Aécio, em função do apoio da família Campos a sua candidatura, a BA, que é o quarto maior colégio eleitoral do país, elegeu um governador do PT no primeiro turno. Jaques Wagner está, portanto, com a bola no pênalti para fazer mais um gol. A PB está dividida entre o tucano Cassio Cunha Lima e o socialista do PSB, Ricardo Coutinho, que apóia Dilma. O RN deu mais de 60% dos votos a Dilma. O CE, idem. PI e MA são redutos dilmistas. Já no Sul, Aécio tende a levar a melhor, inclusive no RS, onde terá o apoio do candidato Ivo Sartori, do PMDB. SP, a guerra maior Em SP, será travada uma guerra como nunca se viu. Os tucanos contam no Estado a maior rejeição ao PT - mais de 40% - entre todos os entes federativos. Mas o PT tem Lula. Será que o mosqueteiro-mor do partido está cansado ? Ou não tem mais munição ? Será que os artilheiros de pouco fogo - Fernando Haddad e Alexandre Padilha - terão pólvora para gastar ? E Aloizio Mercadante, que já foi candidato ao governo ? E Marta Suplicy, a maior herdeira dos votos periféricos do PT em SP ? Onde estas pessoas se encontram ? PMDB unido Já o PMDB, sob o comando de Michel Temer, deu inequívoca demonstração de força e unidade, na segunda-feira passada, quando os prefeitos do partido, vice-prefeitos, vereadores e lideranças regionais compareceram a um encontro-almoço numa churrascaria do bairro do Ipiranga. O único ausente da grande festa foi o candidato do PMDB ao governo, Paulo Skaf, que não recebeu menção ou lembrança na festa. As bases saíram motivadas para a batalha final. Marina e Aécio Marina, ufa, acabou dando seu apoio a Aécio Neves. Mas parcela de seus eleitores já havia decidido apoiar o candidato. Outra parcela, principalmente os eleitores de Marina no Nordeste, migram em direção à candidata Dilma. Afinal, os eleitores de Marina e Dilma são muito próximos. No Sudeste, a distância é maior, eis que parcela de ambos habita os andares do meio da pirâmide. Marina teve uma grande votação no Rio. Irá toda para o tucano ? Debates Ontem, na TV Bandeirantes, foram reiniciados os debates. Apenas corroborarão as decisões já tomadas por grupos e camadas de eleitores. Serão poucos aqueles que deixarão um candidato por outro em função de debate eleitoral. O que pode ocorrer é a migração de eleitores das bases que tendem a aderir a candidatos com melhores chances de vitória. Nesse sentido, esses eleitores querem se sentir vitoriosos. E sair das eleições de cabeça alegre. Teremos debates, ainda no SBT, TV Record e TV Globo. Os juízes I Os juízes, ensinava Francis Bacon, devem ser mais instruídos que sutis, mais reverendos do que aclamados, mais circunspectos do que audaciosos... e completava o velho filósofo : "o juiz deve preparar o caminho para uma justa sentença, como Deus costuma abrir o seu caminho elevando os vales e abaixando as montanhas, deve guardar-se de conclusões duras e inferências desmedidas, porque não há pior tortura do que a tortura das leis". Os juízes II Esta semana, este consultor ficou pasmo. Ao tomar conhecimento da decisão de uma juíza (até imaginava que as mulheres juízas tivessem mais humanidade que os homens juízes) no caso de um pleito de senhora de 97 anos, por meio de uma liminar apresentada por um advogado. Tendo uma síncope, foi internada em regime de urgência na UTI de um hospital. Precisava urgentemente ser atendida. A juíza negou provimento à liminar. Por erro procedimental. Faltava um documento, alegou. Que foi imediatamente providenciado. Mesmo assim, decidiu encerrar o recurso. Deixando no ar o alerta : não quero entrar no mérito. Em outras palavras, queria dizer : pouco me importa se a senhora vai morrer, agora, daqui a cinco minutos ou amanhã. Meu olho é para o procedimento. Meu Deus do céu : onde está o bom senso ? O que é ser justo ? O que é fazer Justiça ? Como garantir acesso do povo à Justiça quando, no meio do caminho, há um naipe de juízes com essa índole ? Integridade Acima de todas as coisas, a integridade é a virtude que na função caracteriza os juízes, ensina Bacon. Será que podemos atribuir a Sua Excelência, a tal juíza insensível, a virtude da integridade ? Mais uma lição - Nas causas de vida ou morte, devem os juízes não esquecer que com a Justiça está a misericórdia, para castigarem com olhos severos o exemplo, mas com olhos misericordiosos a pessoa. (Francis Bacon, em Ensaios, Capítulo sobre A Judicatura). (P.S. Seria muito útil que a Excelentíssima juíza pudesse ler essa modesta lição do grande filósofo inglês). Grandes juízes Este consultor não tem dificuldades em identificar grandes juízes. Magistrados que encarnam valores e virtudes do humanismo. Querem um exemplo ? O presidente da mais alta Corte do Judiciário paulista, o desembargador, José Renato Nalini, que luta por uma Justiça mais próxima ao cidadão. Ecos da eleição I A disputa produziu uma modelagem formada por três tipos de votos : o do bolso, com efeito na barriga ; o do coração e o da cabeça. O primeiro saiu da imensa população - cerca de 60 milhões de pessoas - que recebe o adjutório do governo, por meio dos programas Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida, Mais Médicos e outros. A equação é : bolso cheio enche a geladeira, que enche a barriga, gerando um voto de reconhecimento e de agradecimento. É o que explica os cerca de 60% da votação que a presidente Dilma obteve no Nordeste. O voto do coração foi dado, sobretudo, à ex-senadora Marina Silva, sob o empuxo da onda emotiva que se formou a partir do acidente que matou o ex-governador de PE, Eduardo Campos. Já o terceiro tipo, o voto racional, mesmo em expansão no país, sai da cabeça dos habitantes do meio da pirâmide, eleitores de maior renda, principalmente das regiões Sul e Sudeste, onde estão os maiores colégios eleitorais do senador Aécio. Ecos da eleição II A tal "nova política" assentará praça na próxima legislatura ? Infelizmente, não. Os resultados mostram, de um lado, grande renovação de quadros (46% de novos deputados na Câmara), e de outro, uma representação que espelha a continuidade de grupos familiares, ao lado de fortes bancadas de setores conservadores. Parece um paradoxo. O clamor das ruas por mudança não furou o bloqueio de bastiões tradicionais. A bancada de empresários subirá de 220 para 280 deputados ; a dos ruralistas vai crescer de 130 para 160, aumento de 23% ; e a dos sindicalistas diminui de 83 para 46, ou seja, 44% ; já a bancada da "bala", conhecida por agregar perfis de ex-militares e de posições radicais, ganhou votação expressiva ao lado da ala de 20 pastores e bispos, irmanados no evangelismo. Por último, ressalte-se a maciça votação de atores midiáticos, como Celso Russomano (que amealhou mais de 1,5 milhão de votos) e o palhaço Tiririca (mais de um milhão), que puxam seis candidatos de suas legendas, mais uma contrafação da velha política.
quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Porandubas nº 417

Coronel, eis as urnas... O coronel Lucas Pinto, que comandava a UDN no Vale do Apodi/RN, não dormia em serviço. Quando o Tribunal Eleitoral exigiu que os títulos eleitorais fossem documentados com a foto do eleitor, mandou um fotógrafo "tirar a chapa" do seu rebanho, aliás, do seu eleitorado. Numa fazenda, um eleitor tirava o leite da vaca quando foi orientado a posar para a foto. Não teve dúvida : escolheu a vaca como companheira do flagrante. Mas o fotógrafo, por descuido, deixou-o fora. O coronel Lucas Pinto não teve dúvida. Ao entregar as fotos aos eleitores, deparando-se com a vaca, não perdeu tempo e ordenou ao eleitor : "prega a foto aí, vote assim mesmo, na próxima eleição, nós arrumamos a situação". Noutra feita, o coronel levou as urnas de Apodi para o juiz, em Mossoró, quase 15 dias após as eleições. Tomou uma bronca. - Coronel, isso não se faz. As eleições ocorreram há 15 dias. - Pode deixar, "seu" juiz. Na próxima, vou trazer bem cedo. Não deu outra. Na eleição seguinte, três dias antes do pleito, o velho Lucas Pinto chegava com um comboio de burros carregando as urnas. Chegando ao cartório, surpreendeu o juiz : - Taqui, seu juiz, as urnas de Apodi. - Mas coronel, as eleições serão daqui a três dias. - Ah, seu juiz, não quero levar mais bronca. Tá tudo direitinho. Todos os eleitores votaram. Trouxe antes para não ter problema. Idos das décadas de 50/60. Não havia grandes empreiteiras financiando campanhas. A empreitada ficava mesmo a cargo dos coronéis. A voz de SP Primeiro, vale ressaltar a onda da razão. Ela veio e empurrou Aécio para o segundo turno. E veio de onde este escriba previa há bastante tempo : de SP, onde reside o eleitorado mais racional do país. Há um mês, no meu artigo dominical no Estadão, eu dizia que SP, com seus maiores agrupamentos especializados, deveria sinalizar o segundo turno, eis que no Estado se concentra a maior oposição ao PT. SP é um território à parte. A voz crítica se faz ver até nos municípios que são berço do PT, como São Bernardo do Campo e em outros do ABC paulista, onde Aécio teve mais votos que Dilma. A batalha de SP O artigo sobre SP abria assim : Non ducor, duco. "Não sou conduzido, conduzo". O lema do brasão da cidade de SP, criado em 1916 pelo prefeito Washington Luiz, que veio a assumir, depois, a presidência da República, expressa de modo adequado a importância do Estado mais poderoso da Federação no pleito eleitoral deste ano. Ancorando a hipótese, há uma densa lista de superlativos : cerca de 32 milhões de eleitores ; as mais populosas classes sociais, com destaque para três contingentes de classe média (A, B e C) e super-povoadas margens sociais ; os maiores conglomerados de categorias setoriais, abarcando trabalhadores e profissionais liberais ; centrais sindicais e entidades de áreas produtivas ; movimentos organizados, que promovem intensa mobilização e abrem a locução das ruas ; núcleos em defesa de direitos humanos, minorias e igualdade de gêneros ; e, para dar vazão às demandas dessa gigantesca teia de representação, SãP dispõe de vigorosa tuba de ressonância, cujo eco se faz ouvir em todo o território nacional. O meio da lagoa Mais adiante, arrematei : "costuma-se dizer que o pleito será decidido pela passagem do transatlântico eleitoral pelo Triângulo das Bermudas, constituído por SP, MG e RJ, os três maiores colégios. Ou ainda que Minas é quem decide, sob o argumento de que o Estado do Sudeste é uma encruzilhada que representa a síntese do país. Ora, quando há na disputa dois candidatos mineiros (Aécio e Dilma), a tese parece fraquejar. O fato é que SP possui os maiores exércitos da guerra eleitoral. As ondas de seu mar costumam empurrar para longe os eventos que geram : protestos, denúncias, discursos positivos/negativos, avaliações de candidatos, percepções sobre o cotidiano. Na simbologia da pedra jogada no meio da lagoa (associada à classe media), o Estado é a força centrípeta que faz as marolas chegarem às margens... a batalha de SP será decisiva". Marina desconstruída Marina sofreu os efeitos do bombardeio. Não resistiu, conforme também apontávamos em entrevista no programa Entre Aspas, da Globo News, há um mês e meio. Não tinha estrutura, seu discurso passou a mudar, o programa de governo ganhou uma bateria de críticas. E até foi flagrada em contradição forte ante a questão do voto que deu contra a CPMF. Magoada com o tiroteio mais retumbante da candidata Dilma, apoiará Aécio Neves, no que será seguida pela família de Eduardo Campos. É claro que exigirá colagem de programas e ajustes principiológicos, particularmente no que diz respeito à sustentabilidade e ao mandato de cinco anos, sem reeleição, nos cargos ao Executivo. Triângulo das Bermudas Este consultor volta a dizer : a decisão do segundo turno passará pelas fortes correntezas que se desenvolvem no Triângulo das Bermudas : SP, MG e RJ. Em SP, Aécio poderá aumentar a margem de mais de quatro milhões de votos de maioria que obteve sobre a presidente Dilma, caso consiga a participação e o empenho dos tucanos, a partir do governador eleito, Alckmin. Como se sabe, este já está sendo apontado como o candidato tucano em 2018. Como Aécio defende um mandato de cinco anos, sem reeleição, a receita cai bem no colo de Alckmin. Em Minas, Aécio precisa trabalhar com a mineiridade e vencer de ponta a ponta, não apenas no sul do Estado. Mas terá contra ele o governador eleito, Fernando Pimentel. Briga de foice no escuro Em Minas, veremos uma briga de foice no escuro. Aécio e Anastasia, de um lado, com seus sabres ensarilhados, e de outro, Dilma e Pimentel, guerreando para evitar que os mineiros se reúnam em torno do tucano. Dilma até poderá cantar : quem conhece Aécio não vota nele, toada que Pimentel já anuncia não ser boa. Em SP, Lula fará o que Maquiavel soprar no seu ouvido para aumentar a votação de sua pupila. Ele se mostra surpreso com a grande votação de Aécio, mas ele próprio é, em parte, responsável por esta situação, quando dá força ao slogan "nós contra eles", sem perceber que esse mote não bate bem na cabeça da poderosa classe média do Estado. O Nordeste Já na região nordestina, a candidata Dilma continuará a ter sua principal fortaleza, que abriga os milhões de famílias sob o teto da Minha Casa, Minha Vida, e diante do pão sobre a mesa, garantido pelo gigantesco programa Bolsa Família. Dilma quer ter mais de 60% dos votos na região para compensar eventual perda de votos no Sudeste do país. Em PE, por exemplo, deverá intensificar a mobilização, eis que Marina ganhou no Estado e a família Campos deverá fazer campanha para Aécio. Ela conta com um forte reduto na BA, onde o governador Jaques Wagner, mais uma vez, vira a campanha e coloca o PT na dianteira. O RJ No RJ, Dilma terá dois grandes palanques : o de Pezão e o de Crivella. Mas Aécio, que tem uma banda carioca no perfil, poderá aumentar a sua fatia, surfando na "onda da razão", que pega principalmente eleitores do meio da pirâmide. Rolo compressor O rolo compressor das máquinas tende a favorecer os candidatos situacionistas. É o que se viu, aliás, na última semana do primeiro turno, quando os candidatos governistas encostaram e alguns ultrapassaram os oposicionistas. Neste caso, urge sinalizar a força da candidata Dilma no segundo turno, apesar de se constatar a forte máquina tucana, que poderá beneficiar Aécio, a partir de SP e PR, onde dois tucanos erguem a bandeira da vitória. Debates e desconstrução É previsível um cenário de defesa forte de programas e ideias, mas não se descarta a probabilidade da continuação da campanha negativa. De um lado, o pano de fundo serão os escândalos e a corrupção, de outro, "os fantasmas" do passado, como crava a presidente Dilma, mostrando os traumas na economia no segundo ciclo FHC. Aécio deve retrucar, resgatando o Plano Real e mostrando os "monstros" de hoje. Será uma luta sangrenta. Ou tudo ou nada para os dois lados. Congresso fragmentado Teremos um Congresso mais fragmentado : as 22 siglas na Câmara passarão para 28 e das 16 no Senado, teremos 18. O rolo compressor governista será até maior, eis que os partidos da base elegeram 304 deputados Federais, mais que o dobro dos 138 deputados eleitos pelas 10 siglas que apoiaram o oposicionista Aécio Neves. Mas isso não significa alinhamento automático. Muitos poderão sair de seu lado e aderir a outro. Congresso conservador O Congresso será mais conservador, bastando ver os números : de 220, o número de empresários passará para 280 ; os sindicalistas diminuem de 83 para 46, ou seja, 44%; e os ruralistas sobem de 130 para 160, e, aumento de 23%. 46% - esse é o índice de renovação na Câmara, mas não significa compromisso com a "nova política", eis que muitos pertencem aos quadros tradicionais da política regional. A religiosidade também se expande : pastores e bispos aumentam para 20. Pesquisas erram ? Em nove Estados, as pesquisas apresentaram índices diferentes dos resultados : CE, PE, BA, RS, MG, DF, RJ, SP e PR. Alguns furos : Garotinho não vai ao segundo turno, conforme os Institutos de Pesquisa anunciavam ; Camilo Santana, do PT do CE, teve quatro pontos a mais que os índices de pesquisas ; Padilha, em SP, também teve cinco pontos a mais ; Rui Costa, na BA, idem, com cinco pontos a mais. Os Institutos precisam aumentar suas amostras e fazer controles mais rígidos. Posições radicais Posições radicais deram alta visibilidade a seus porta-vozes, que ganharam uma montanha de votos. Jair Bolsonaro teve 465 mil votos ; o delegado Eder Mauro teve 266 mil votos no PR ; no RS, Luiz Carlos Heinze teve 162 mil votos ; em GO, o delegado Waldir foi o mais votado, com 275 mil votos ; o coronel da reserva, Alberto Fraga, no DF, ganhou 155 mil votos. Midiáticos e religiosos Celso Russomano, do PRB, liderou com 1.524.361 votos ; Tiririca, do PR, abocanhou 1.016.796 ; pastor Eurico, do PSB, 233.762 ; pastor Marco Feliciano, 398.087 ; Paulinho da Força, do SD, 227.186. Maior perda A maior perda absoluta na Câmara é do PT : 18 deputados. PT fica com 70 (tinha 88) e o PMDB terá 66 (tinha 71). A terceira bancada será a do PSDB, com 54 deputados (tinha 44) ; a quarta bancada será a do PSD, com 37 (tinha 45) e a quinta será a do PP, com 36 (tinha 40). Um voto Alguns candidatos não tiveram um voto sequer, como acabo de ver na lista de deputados estaduais do RN. Mas Selma Silva, do PHS, teve um voto. Um. Donde se conclui que deve ter sido o dela. Merece destaque. Os outros podem até ter desistido. Selma, não. Marina, na quinta Marina anunciará seu apoio na quinta-feira. Tudo indica que acompanhará Aécio Neves.
quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Porandubas nº 416

Abro a coluna com uma historinha de advogado. Pequena doação Uma instituição de caridade nunca tinha recebido uma doação de um dos advogados mais ricos da cidade. O diretor da instituição decidiu ele mesmo falar com o advogado : - Nossos registros mostram que o senhor ganha mais de R$ 300.000,00 por ano e, assim mesmo, o senhor nunca fez uma pequena doação para nossa caridade. - O senhor gostaria de contribuir agora ? O advogado respondeu : - A sua pesquisa apurou que minha mãe está muito doente e que as contas médicas são muito superiores a renda anual dela ? - Ah, não ! - murmurou o diretor. - Ou que meu irmão é cego e desempregado ? - continuou o advogado. O diretor nem se atreveu a abrir a boca. - E ainda, que o marido da minha irmã morreu num acidente e deixou ela sem um tostão e com cinco filhos menores para criar ? - resmungou o advogado com ar de indignação. O diretor, sentindo-se humilhado, retrucou : - Desculpe, eu não tinha a menor ideia de tudo isso... - Então, se eu não dou um tostão para eles, por que iria dar para vocês ? E assim, o advogado fechou a conversa. (Enviado pelo amigo Luis Costa) Ufa, chegando ao final A corrida eleitoral chega ao seu final. Com registro de alguns fenômenos e situações inusitadas : 1. A campanha mais imprevisível dos últimos tempos ; 2. A campanha mais feroz e com linguagem mais agressiva ; 3. Possibilidade de um candidato ultrapassar uma adversária nos últimos dias ; 4. A possibilidade da candidata à reeleição Dilma Rousseff ganhar no primeiro turno ; 5. A indicação de que, mesmo ganhando a presidência da República, o PT sairá deste pleito menor do que entrou ; 6. A visão de que os tucanos, mesmo ganhando no maior colégio eleitoral do país - SP - também sairão menores do pleito ; 7. A surpresa de ver o PT registrando um teto de voto em SP muito inferior ao seu patamar histórico. São sinais de que as coisas estão mudando. Linguagem ferina A agressividade da campanha chama a atenção. A chamada campanha negativa, com foco na desconstrução da imagem de Marina Silva, deu resultados. Marina aparecia como um perfil sagrado, intocável em sua ética e moral, crível, encarnando a nova política. Um perfil exótico, com seu timbre agudo de voz, vestes suaves, cabelo em coque, Marina parecia uma fortaleza imbatível. Ou, como diria La Fontaine, um caniço, no deserto, que se dobra ao vento mas não se quebra, "um roseau pensant". O tiroteio sobre sua imagem, que chega aos finais da campanha com a trombeta de que ela votou contra a CPMF, acabou esfarelando suas possibilidades. No debate do domingo passado, viu-se seu abatimento. Aécio correndo Sob esse bombardeio incessante, o tucano Aécio Neves corre para ultrapassar Marina nesses últimos dias. Mas essa final de reta, digamos assim, tem alguns obstáculos. Aécio carece mostrar força em seu Estado, MG, onde seu candidato, Pimenta da Veiga, ameaça perder em primeiro turno para o petista Fernando Pimentel. E ele mesmo, Aécio, precisa chegar perto de Dilma e ultrapassar Marina no segundo maior colégio eleitoral do país. Em SP, subiu seis pontos nas últimas semanas. Se conseguir segurar esta tendência, é possível que no domingo, 5/10, adentre os portões do segundo turno. E Dilma, hein ? Pois é, Dilma está na faixa dos 40%. Se subir mais quatro pontinhos até domingo, tirando de Marina e deixando Aécio onde está, Dilma chegará aos 45%, com Marina descendo para 21% e Aécio se mantendo em 20%/21%, ou seja, deixando a candidata petista com pequena margem na frente de todos os candidatos. Seria uma vitória no primeiro turno. Possibilidade ? 30%. E 70% de ocorrência do segundo turno. Impressionante : a esta altura, nem os melhores adivinhos conseguem ver as coisas claras em suas brilhantes bolas de cristal. A raposa e o leão Atenção : "Um príncipe precisa usar bem a natureza do animal ; deve escolher a raposa e o leão, porque o leão não tem defesa contra os laços, nem a raposa contra os lobos. Precisa, portanto, ser raposa para conhecer os laços e leão para aterrorizar os lobos". Conselho do velho Maquiavel. Que arremata : "Não é necessário ter todas as qualidades, mas é indispensável parecer tê-las". PT e PSDB menores O PT fará um numero menor de governadores do que o alcançado em 2010. Deverá fazer quatro governadores (PI, MG, MS e AC). Pode, até, chegar a cinco, com Tasso Genro ganhando no RS para a senadora Ana Amélia, do PP. Mas não fará as bancadas na Câmara e no Senado com os números que pregava. E sairá chamuscado no maior colégio eleitoral do país, SP, onde a rejeição ao PT ultrapassa o índice de 30%. O PSDB, mesmo ganhando SP, mas perdendo a eleição Federal, deverá diminuir sua cota no Senado e na Câmara. Passará mais uma temporada Federal na oposição e poderá assistir a uma debandada de tucanos rumo a outras florestas. Seca e Alckmin ? Perguntam-me a razão pela qual Geraldo Alckmin navega tão bem pela seca que atinge SP ? Ou seja, porque a falta d'água nas torneiras não seca os votos do candidato Alckmin ? Esboço uma resposta : os eleitores tendem a considerar São Pedro como o culpado ; o argumento de falta de investimentos em obras de captação e represamento é coisa abstrata para as margens sociais ; a polarização entre PT e PSDB tem seu maior índice em SP, o que insere o PT na maior taxa de rejeição (ultrapassando 30%) ; os votos de classe média, por aqui, são racionais e inclinam-se para Alckmin ; o voto emotivo decresce ; o prefeito Haddad não tem sido bem avaliado, funcionando como um anti-cabo eleitoral do PT. Barbosa sem carteira ? Joaquim Barbosa, até meses atrás poderoso chefe da mais alta Corte do Judiciário brasileiro, acaba de ver negado seu pedido para ter de volta sua carteira de advogado. Quem deu parecer contrário foi Ibaneis Rocha, presidente da OAB/DF. Mas o parecer será submetido à Comissão de Seleção da subsecional da Ordem. Que coisa, hein ? Quem ganha ? O PMDB deverá ser o partido com os maiores ganhos do pleito. Fará a maior bancada de governadores, a maior bancada de senadores, a de deputados estaduais e a segunda maior bancada de deputados Federais. Pulverização As Casas Congressuais terão uma nova Legislatura com bancadas mais pulverizadas. Na Câmara, 28 siglas deverão se fazer representar. O numero era de 22. PT em SP Se Alexandre Padilha não ultrapassar os dois dígitos de votos em SP será protagonista da maior derrota do PT em SP em todos os tempos. Candidatos na dianteira : Senado Hoje, a posição na dianteira é esta : região Sudeste - José Serra, PSDB/SP ; Antônio Anastasia, PSDB/MG ; Romário, PSB/RJ ; Rose de Freitas, PMDB/ES. Região Sul - Álvaro Dias, PSDB/PR ; Dario Berger, PMDB/SC ; e Olívio Dutra, PT/RS. Região Centro-Oeste - Reguffe, PDT/DF ; Ronaldo Caiado, DEM/GO ; Simone Tebet, PMDB/MS ; e Wellington Fagundes, PR/MT ; Região Norte - Omar Aziz, PSD/AM ; Paulo Rocha, PT/PA ; Kátia Abreu, PMDB/TO ; José de Anchieta, PSDB/RR ; Acir Gurgacz, PDT/RO ; Gilvan Borges, PMDB/AP ; Gladson Cameli, PR/AC. Região Nordeste - João Paulo, PT/PE ; Tasso Jereissatti, PSDB/CE ; Geddel Vieira, PMDB/BA ; Fernando Collor, PTB/AL ; Roberto Rocha, PSB/MA ; Wilson Martins, PSB/PI ; Maria do Carmo, DEM/SE ; Fátima Bezerra, PT/RN e José Maranhão, PMDB/PB. Encerrando um ciclo Esta campanha fecha um ciclo de vida política no país. É pouco provável que tenhamos, em 2018, uma eleição nos moldes eleitorais desta. A previsão é a de que os políticos mudarão as regras. Para evitar o suicídio. Há muito tempo para a conferição deste cenário. Nascimento premiado Fundador da Nascimento Turismo e presidente do Sindetur-SP, Eduardo Vampré Nascimento receberá no dia 5/11, durante a WTM 2014, em Londres, o prêmio WTM Global Awards pela contribuição ao desenvolvimento e crescimento do Turismo no país. A homenagem faz parte de uma iniciativa do M&E, veículo media partner oficial da WTM no Brasil : "A notícia veio como uma surpresa muito agradável. É extremamente emocionante ser homenageado por uma entidade como a WTM. Espero que este prêmio sirva para encorajar outras pessoas do setor turístico a buscar e se dedicar, cada vez mais, ao desenvolvimento da atividade dentro e fora do país", diz Nascimento. Simples complicado A partir de 2015, mais de 140 atividades econômicas, equivalente a 500 mil empresas, poderão aderir ao novo Simples Nacional, sancionado recentemente pela presidente Dilma Rousseff, e que aperfeiçoa a Lei Geral da Micro e da Pequena Empresa. O objetivo é unificar impostos Federais, estaduais e municipais. Sérgio Approbato Machado Júnior, presidente do Sescon-SP, acredita que os avanços do novo Simples representam uma vitória, no entanto, os limites de enquadramento continuam baixos e a existência de uma nova tabela, com alíquota variando de 16,93% a 22,45%, impedem que o regime tenha amplitude maior. "Se não houver uma revisão destes números, aderir ao Simples pode não ser um bom negócio". Micro e pequenas empresas representam 20% do PIB brasileiro, respondem por 60% dos 94 milhões de empregos no país e constituem 99% dos seis milhões de estabelecimentos formais do país. A viabilidade de um político Carlos Matus, cientista social chileno, em um magistral estudo sobre Estratégias Políticas, demonstra que a viabilidade de um ator na política tem muito que ver com a estratégia e seus princípios fundamentais. Eis alguns princípios : a)Avaliar a situação ; b) Adequar a relação recurso/objetivo ; c) Concentrar-se no foco ; d) Planejar rodeios táticos e explorar a fraqueza do adversário ; e) Economizar recursos ; f) Escolher a trajetória de menor expectativa ; g) Multiplicar os efeitos das decisões ; h) Relacionar estratégias ; i) Escolher diversas possibilidades ; j) Evitar o pior ; k) Não enfrentar o adversário quando ele estiver esperando ; l) Não repetir, de imediato, uma operação fracassada ; m) Não confundir "reduzir a incerteza" com "preferir a certeza" ; n) Não se distrair com detalhes insignificantes ; o) Minimizar a capacidade de retaliação do adversário. A classe média, Colbert ! A política é um eterno retorno. Vejam este diálogo entre Colbert e o Cardeal Mazzarino, durante o reinado de Luís XIV, na peça teatral Le Diable Rouge, de Antoine Rault : Colbert : Para arranjar dinheiro, há um momento em que enganar o contribuinte já não é possível. Eu gostaria, senhor superintendente, que me explicasse como é possível continuar a gastar quando já se está endividado até o pescoço. Mazzarino : Um simples mortal, claro, quando está coberto de dívidas, vai parar na prisão. Mas o Estado é diferente ! Não se pode mandar o Estado para a prisão. Então, ele continua a endividar-se. Todos os Estados o fazem ! Colbert : Ah, sim ? Mas como faremos isso, se já criamos todos os impostos imagináveis ? Mazzarino : Criando outros. Colbert : Mas já não podemos lançar mais impostos sobre os pobres. Mazzarino : Sim, é impossível. Colbert : E sobre os ricos ? Mazzarino : Os ricos também não. Eles parariam de gastar. E um rico que gasta faz viver centenas de pobres. Colbert : Então como faremos ? Mazzarino : Amigo Colbert ! Tu pensas como um queijo, um penico de doente ! Há uma quantidade enorme de pessoas entre os ricos e os pobres : as que trabalham sonhando enriquecer e temendo empobrecer. É sobre essas que devemos lançar mais impostos. Cada vez mais, sempre mais ! Quanto mais lhes tirarmos, mais elas trabalharão para compensar o que lhes tiramos. Formam um reservatório inesgotável. É a classe média !
quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Porandubas nº 415

Lembram-se de Seu Lunga ? Faz tempo que ele desapareceu desta coluna. Vez ou outra, vem a pergunta : cadê Seu Lunga ? Respondo : está aposentado. Mas, com tanta insistência, abro uma janelinha para os leitores matarem a saudade. Apenas para lembrar a ficha do nosso protagonista : Seu Lunga, pai de 13 filhos, ourives em Juazeiro do Norte, vendedor de sucata. Tá com defeito ? Seu Lunga leva o aparelho eletrônico para a manutenção. O técnico pergunta : - Tá com defeito ? - Não, é que ele estava cansado de ficar em casa e eu o trouxe para passear. Vai sair nessa chuva ? Está caindo um toró em Juazeiro do Norte. Seu Lunga não se incomoda e se prepara para sair de casa. A mulher pergunta : - Vai sair nessa chuva ? - Não, vou sair na próxima. Acordou ? Seu Lunga acaba de levantar. O filho vem com a pergunta idiota : - Acordou ? - Não. Sou sonâmbulo ! Onde você está ? O amigo liga para sua casa e pergunta a Seu Lunga : - Onde você está ? E ele : No Pólo Norte ! Um furacão levou a minha casa pra lá ! Tomou banho ? Seu Lunga acaba de tomar banho e a mulher pergunta : - Você tomou banho ? - Não, mergulhei no vaso sanitário ! Quem sobe e quem desce ? Faltando 10 dias para as eleições, a pergunta mais ouvida em todos os ambientes é esta : quem subirá e quem cairá ? Tentarei dar uma resposta. Mantidas as condições de hoje, a situação deverá permanecer estável até o dia 5 ; mantida a tendência de queda lenta de Marina e recuperação de Aécio para as margens de um mês e meio atrás, ele poderá subir ao patamar de 22% e a ex-senadora descer para o 25º andar do prédio, o que resultaria em um empate técnico com o senador mineiro. Na reta final, a máquina tucana faria um esforço extraordinário para fazer com que o "vento da razão" sopre com mais força do que o "vento da emoção". Quanto à candidata Dilma, é mais provável que mantenha seu índice (entre 35% a 38%). Haverá tempo ? No território de Aécio, os assessores lidam com o dilema : haverá tempo para uma recuperação a ponto de fazê-lo desbancar Marina e entrar no segundo turno ? Este consultor acredita que o tempo é muito curto para fazer o cavalo tucano de Aécio disparar na pista. Tivesse a campanha mais duas ou três semanas, as chances de Aécio seriam bem maiores. A propósito, Guilherme Afif teria ganho de Eduardo Suplicy o mandato de senador, em 2006, caso a campanha se estendesse por mais duas ou três semanas. Encostou no Suplicy. Portanto, Aécio enfrenta a questão do tempo. O imponderável pode abrir a porta dele, dando chance ao segundo turno. Esse Imponderável da Silveira teima em fazer das suas.... Marina, a desconstrução O fato é que as estratégias do PT e do PSDB para desconstruir a imagem de Marina Silva têm dado certo. Passada a fase emotiva, o turbilhão de emoções provocado pela morte trágica de Eduardo Campos, as placas tectônicas do terremoto eleitoral começam a assentar e a colocar cada candidato em seu devido tamanho. Marina até que tentou se vitimizar, enxugando lágrimas e dando a "outra face" para os adversários baterem. Ora, o eleitor quer ver um perfil forte, resistente, capaz de reagir à altura ao embate político. Não quer se identificar com uma pessoa que seja incapaz de lhe defender. Nesse sentido, a estratégia de vitimização não deu certo. Marina deveria ter sido mais dura no ataque. Mutante ao extremo Outro fato que tem provocado polêmica, principalmente junto aos estratos mais racionais, é a mudança de posição. Nos últimos tempos, a Marina ambientalista, conservadora ao extremo, vai aliviando suas abordagens, mostrando intensa flexibilidade. Ela percebeu que a real politik - a nossa política e seus agregados - é um espaço de negociação, cooptação, regrado por velhos costumes. Ao mudar, a cada momento, sua imagem é burilada de acordo com as conveniências, passando a impressão de que não é firme, é leniente, cheia de dúvidas. Essa é outra nuance anotada pelos eleitores de classe média. Sudeste, maré enchente O Sudeste é a maré enchente de votos para Dilma e Marina. Esta tem maioria em SP, no ES e está em segundo no Rio. Aécio, por sua vez, precisa ganhar em Minas, seu Estado. Em SP, está bem atrás. Já Dilma lidera no Rio, tem uma grande votação no Nordeste e está em segundo lugar em SP. Portanto, a luta maior nessa reta final é aqui no Triângulo das Bermudas. Deu-se o vice-versa Dr. Dantinhas, ex-deputado da BA, chefe de poderoso clã político do Estado, neto do barão de Jeremoabo, foi convidado para ser padrinho de casamento da filha de um coronel do interior. No dia de viajar, recebeu um telegrama urgente : - Compadre, não precisa comparecer. Deu-se o vice-versa. A menina morreu. Polarização esvaziada Mesmo que a candidata Dilma seja a vitoriosa no plano Federal e os tucanos ganhem importantes Estados, como SP, PR e GO, o PT e o PSDB sairão menores da eleição. A velha polarização entre petistas e tucanos está desgastada. Essa corrosão, fruto do tempo, pode ser comprovada pela tênue disputa entre os dois partidos nos 27 entes Federativos. Ambos estão em disputa direta somente no MS, com o senador Delcídio Amaral, pelo PT, e Reinaldo Azambuja, do PSDB, o segundo colocado. De oito governadores eleitos em 2010, o PSDB deverá baixar para cinco ou seis. O PT, que elegeu cinco, pode cair para quatro. Dilma viaja A situação deve ser boa para as bandas de Dilma. Ela viaja hoje no final da tarde para a abertura da 69ª Assembleia das Nações Unidas. Amanhã, faz palestra na Conferência do Clima. Só deve voltar quinta-feira. Ou seja, perderá três dias de campanha. Deve estar tranquila. Marina, convidada para a Conferência do Clima, decidiu ficar aqui, para tentar segurar seu índice. O custo do blá blá blá A propaganda eleitoral gratuita custará, este ano, R$ 839,5 milhões em impostos com as inserções veiculadas entre 19/8 e 24/10. A quantia será descontada do total de tributos pagos pelas empresas de rádio e TV de sinal aberto, obrigadas a veicular a publicidade obrigatória. Prevista no PL Orçamentária Anual, a renúncia fiscal é tratada como gasto tributário. Cálculos de César Maia Em seu ex-Blog "Comparando as pesquisas do Datafolha de 8-9/9 e de 17-18/9 há alguns sinais que devem ser levados em conta. 1. Dilma manteve-se igual no Sudeste 28% e 28%. Manteve-se igual no Sul : 35% e 35%. Cresceu na margem no Nordeste : 47% e 49%. Da mesma forma no Centro-Oeste e no Norte : 30% e 32%, e 48% e 49% 2. Marina caiu no Sudeste : 36% e 32%. Caiu no Sul 28% e 25%. Caiu no Centro Oeste 35% e 31% e no Norte 32% e 28%. No Nordeste manteve-se quase igual : 31% e 32%. 3. Aécio cresceu no Sudeste e no Sul : 18% e 20%, e 20% e 22%. Cresceu de forma mais acentuada no Centro-Oeste : 16% e 23%. No Nordeste ficou igual : 8% e 8% e no Norte caiu um pouco : 10% e 8%. Aécio, com seus 8%, mantém-se muito longe das primeiras no Nordeste e Norte : Marina com média de 30% e Dilma 49%. No Sudeste, Sul e Centro-Oeste Aécio está num patamar de 21% em média. 4. São sinais que nas regiões do agronegócio e finanças (Sul/Sudeste/Centro-Oeste), Aécio tem crescido e trocado com Marina. 5. Reforçando esses sinais, estão as famílias com renda superior a 10 SM, onde Marina tem 32% e Aécio 31%, e com nível superior onde Marina tem 37% e Aécio 27%. No Nível Superior, Aécio cresceu de 22% para 27% e Marina caiu de 42% para 37%, numa troca nítida. Dentro da ideia de que o fator espacial é determinante, diremos que são dois cortes cruzados a favor de Aécio : Sudeste, Sul, Centro-Oeste com Nível Superior". A conferir essa tendência ! Três estreantes De 90 candidatos a deputado Federal que despontam no ranking dos bons de voto, apenas três são estreantes. Os 87 restantes são experientes ou têm um sobrenome de família tradicional na política. Redes sociais na campanha - I Três em cinco eleitores brasileiros estão nas redes sociais, algo em torno de 84 milhões de votantes. A campanha eleitoral entrou bem nos corredores eletrônicos. De julho até dias atrás, o Facebook registrou 58 milhões de mensagens relacionadas às eleições, propiciando curtidas, compartilhamentos, comentários a favor e contra. O monitoramento tem sido acompanhado pela cientista política norte-americana Katie Harbath, estudiosa do uso das redes em campanhas políticas, em passagem pelo país. Redes sociais na campanha - II Ocorreram cerca de nove milhões de interações com conteúdo relativo aos últimos dois debates entre presidenciáveis. Como explica Zbigniew Brzezinski, ex-conselheiro de segurança nacional dos EUA e mentor de planos da CIA, no livro "A Era Tecnotrônica", estamos abrindo as portas de um futuro, onde se enxergam coisas como : a escalada das classes médias, a expansão do setor terciário, o gigantismo dos núcleos universitários, as indústrias de ponta, o incentivo às modernas tecnologias e os trabalhadores bem formados e informados, entre outras. A importância da absorção do ferramental tecnológico pela política, em estágio avançado por aqui - eis que o Brasil está entre os cinco principais consumidores mundiais das redes - reside no fato de que este aparato eletrônico funciona como extensão da liberdade de expressão, um pulmão a oxigenar os fluxos institucionais, ampliando os circuitos da participação social, propiciando o deslocamento do discurso eleitoral para a esfera dos participantes. Lições de marketing 10 linguagens de campanha 1. A linguagem da afirmação. 2. A linguagem da factibilidade/credibilidade. 3. A linguagem das pequenas coisas. 4. A linguagem da participação - o nós versus o eu. 5. A linguagem da verificação/exemplificação - como fazer. 6. A linguagem da coerência. 7. A linguagem da transparência. 8. A linguagem da simplificação. 9. A linguagem das causas sociais - os mapas cognitivos do eleitorado. 10. A linguagem da tempestividade - proximidade (adaptado do meu livro Tratado de comunicação organizacional e política).
quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Porandubas nº 414

O candidato 'Pato' "Em setembro de 2009, fui a Campo Grande/MS fazer palestra sobre marketing político no 7º Encontro da União das Câmaras de Vereadores de Mato Grosso do Sul. Num grande auditório, havia mais de 500 assistentes. Eu sempre digo que posso falar sobre marketing político durante vários dias sem parar, pois acumulei 33 anos de prática em mais de 100 campanhas. Então, dou os fundamentos que norteiam o trabalho e abro perguntas para que temas específicos, de interesse daquela comunidade, sejam abordados. Um dos vereadores presentes fez uma pergunta que, mesmo localizada, tem muita abrangência e me permitiu criar nova definição. Ele contou que, na sua cidade, o candidato a prefeito do partido era do tipo "sabe-tudo". Sabia fazer a comunicação, sabia fazer os acordos políticos, sabia o melhor lugar para o comício, sabia escolher a música, sabia o ponto fraco do adversário, sabia o que dizer na entrevista, sabia. Veio a pergunta : 'Como agir com um candidato assim?'. Criei a definição na hora : 'Esse é o candidato-pato'. Age exatamente como essa ave. Sabe andar, mas anda mal, todo desajeitado, balançando o corpo grande. Sabe voar, mas voa mal, tem voo curto e raso, não voa alto, nem a longas distâncias. Sabe nadar, mas nada mal, não mergulha e não é rápido. Bota ovo, mas bota mal, pois o ovo é grande demais e muito pouco frequente. Foi uma gargalhada geral, pois o "candidato-pato" também é muito frequente, como o pato, que está nos quintais, mas também nos jardins e praças públicas. Como agir com ele ? Ah, eu levo na gozação e vou tocando, devagar e sempre, assim como se toca um bando de. patos ! Com a ave de verdade, pelo menos, há possibilidade de se fazer um confit de canard - delicioso prato francês no qual a ave é cozida em fogo brando. Meu marketing político é assim : sempre com alegria, sempre aprendendo, sempre inventando novidades". Grande Chico ! Mutantes em cena O cenário político-eleitoral tende a mudar. Nas próximas duas semanas, teremos de analisar para onde irão migrar os votos de Aécio Neves. Os tucanos ainda apostam na "virada da razão", pela qual o senador mineiro resgataria sua pontuação de dois meses atrás. Quase impossível. O tempo é curto. Ademais, Dilma e Marina, em duelo aberto, praticamente ocuparam o tabuleiro de xadrez, garantindo, assim, a jogada final do segundo turno. Muitos apostam na migração de votos de Aécio para Marina. Este consultor acredita que eles se repartirão entre as duas candidatas. Margens com Dilma Os grupamentos e famílias que estão laçados pelo programa Bolsa Família, particularmente na região Nordeste, tendem a fechar com Dilma. São os beneficiários da equação BO+BA+CO+CA (Bolso, Barriga, Coração, Cabeça). No NE, Dilma tem cerca de 50% dos votos, margem que lhe dará força para suportar as urnas mais vazias no Sudeste. Assim, Dilma tende a ganhar um "voto de coração" mais denso que o voto para Marina. Centro com Marina Já os setores que habitam o meio da pirâmide tendem a se direcionar para Marina, principalmente no Sudeste. Em SP, a rejeição ao PT e, consequentemente, a Dilma chega a ultrapassar 35%. Nunca se viu índice tão alto. Mas Dilma também terá muitos votos das faixas centrais, principalmente junto aos bolsões do petismo, que adentrou forte nas estruturas governativas, a par da classe média emergente, tendente a dar também um voto de reconhecimento. Por que a rejeição ? Por que a rejeição ao PT chegou a índices tão altos no pleito deste ano ? Porque o PT foi arrastado para a lama pelos escândalos que têm corroído a imagem de políticos e partidos. O PT está no centro das denúncias. Colhe os resultados dos eventos negativos que têm manchado a imagem do governismo. Para piorar, o prefeito Fernando Haddad, em pleno ano eleitoral, toma medidas antipáticas, a partir das decisões sobre avenidas e ruas, complicando o já congestionado trânsito de SP. É um cabo eleitoral do contra. O rolo compressor Este consultor sempre lembra a força do rolo compressor das máquinas governativas em final de campanha. Nesse caso, no segundo turno, Dilma ganhará um empuxo da máquina. São milhares de funcionários públicos que querem preservar seus empregos. São milhares de ativistas partidários nas bases. São militantes de outros partidos que, na reta final, costumam dar sangue para que seus candidatos (governistas) ganhem. Diante dessa hipótese, é possível dizer : Dilma conta com essa força a mais no frigir dos ovos. Pendendo para Dilma É até possível que parcela dos votos do tucano Aécio migre para Marina no segundo turno. Mas há de ser considerada a hipótese de integração dos partidos aliados de Dilma. No primeiro turno, por conveniências locais, muitos saíram da frente de apoio situacionista. No segundo turno, face ao pensamento restritivo de Marina sobre partidos, é evidente que alguns, desconfiados, tendem a se reunir sob o abrigo de Dilma. Ademais, a presidente tem boa vantagem em municípios de até 50 mil habitantes, reduto da velha política. Onde os partidos têm sua maior base. Mais um ponto de vantagem para a petista. Bancada no Senado A se confirmarem as tendências apontadas pelas últimas pesquisas, assim será o próximo Senado : PMDB, continuará com 19 senadores ; PT, de 13 passará para 14 ; o PSDB continuará com 12 ; o PSB sairá de 4 para 7 ; o PDT diminuirá de 6 para 3 ; o PR e o DEM poderão continuar com 4 ; o PTB sofrerá a maior queda, de 6 para 2 ; o PSC deverá ter 2 ; o PP poderá continuar com 5 ; o PSD tende a elevar de 1 para 2 ; o PSOL, o PC do B, o PPS, o PRB, o PV, o PROS, o SDD deverão, cada, ter 1 senador. Já o PMN e o PRTB não deverão ganhar representantes. Governo e oposição Se Dilma ganhar, deverá contar com uma bancada de cerca de 50 senadores ; Marina e Aécio contariam, juntos, com cerca de 30. Na Câmara Já a próxima legislatura deverá continuar com o PT e o PMDB liderando as duas maiores bancadas. O PT sonha em chegar a 100 deputados. Pode ter entre 85 a 90 ; e o PMDB deverá contar com cerca de 80 a 85. Mas o candidato com melhores condições (eleitorais) para presidir a Câmara será Eduardo Cunha, do PMDB do RJ, atual líder do partido na Casa. Paulo Roberto na CPI O que vai acontecer nesta quarta ? Paulo Roberto Costa irá à CPI mista que investiga a Petrobras. Mas não deverá dizer muita coisa. Sob pena de quebrar o sigilo da delação premiada. Confirmará os nomes de políticos por eles citados ? É mais provável que fique calado. A conferir. Maluf sai ou fica ? O procurador-Geral eleitoral, Rodrigo Janot, encaminhou ao TSE parecer desfavorável à candidatura do deputado Federal Paulo Maluf (PP) nas eleições de outubro. Com base na Lei da Ficha Limpa, Maluf seria inelegível em face da condenação por ato doloso de improbidade administrativa que gerou enriquecimento ilícito e lesão ao patrimônio público. Façam seus cálculos O eleitorado brasileiro é de 142.783.995 eleitores. O Sudeste abriga 62.066.251, ou 43,47% do eleitorado ; o Nordeste tem 38.218.398 eleitores, ou 26,76% dos votantes ; o Sul tem 21.127.282 eleitores, ou 14,79% dos votantes ; o Norte abriga 10.794.131 eleitores, ou 7,56% dos eleitores e o Centro-Oeste tem 10.240.481, ou 7,17% dos votos. Teremos uma abstenção, votos nulos e brancos em torno de 20%. Façam suas contas, usando os números das últimas pesquisas. Na última, do Datafolha, Dilma avançou para 36%, enquanto Marina ficou nos 33%, empate técnico. No segundo turno, a candidata do PSB teria sete pontos de vantagem : 47% contra 43%. Mas Dilma conta com o rolo compressor da máquina. 24º EESCON "Em busca de novos caminhos" é o tema central do 24º EESCON - Encontro das Empresas de Serviços Contábeis do Estado de São Paulo, considerado o maior evento do segmento empreendedor contábil de SP e o segundo maior do Brasil. Realizado a cada dois anos pelo Sescon/SP, sindicato da categoria, a abertura ocorre, hoje, quarta, no Campos do Jordão Convention Center, em Campos do Jordão/SP. Até 19/9 são esperados cinco mil visitantes, entre empresários, gestores e profissionais da área contábil. Haverá ainda feira de negócios, demonstrações e comercialização de produtos e serviços. Agências : temporada de inverno ruim Para 63% das agências de viagens e operadoras turísticas do Brasil, as vendas caíram durante a temporada de inverno deste ano, na comparação com o mesmo período de 2013, segundo pesquisa feita pelo Ipeturis - Instituto de Pesquisas, Estudos e Capacitação em Turismo, por encomenda do Sindicato das empresas de Turismo no Estado de São Paulo (Sindetur/SP). "Apontada por 46,4% dos entrevistados, a Copa do Mundo no Brasil foi o principal motivo para a queda nas vendas durante a temporada", destaca Marciano Freire, presidente do Ipeturis. Outros motivos que contribuíram para os baixos resultados foram : ano de eleições (8,5%), cenário econômico negativo no país (8,5%), preços altos das tarifas aéreas (7,5%) e a alta do dólar (5,2%). CONETT 2014 Nos dias 25 e 26/9, a cidade de SP recebe empresários internacionais para o debate da terceirização e do trabalho temporário na América Latina. O CONETT 2014 é uma realização do Sindicato das Empresas de Serviços Terceirizáveis e de Trabalho Temporário de São Paulo (Sindeprestem). Local : Grand Mercure São Paulo Ibirapuera (rua Sena Madureira, 1355). Até D. Orani ? Meu Deus. Quanta violência. O cardeal arcebispo do RJ, D. Orani Tempesta, foi assaltado no bairro de Santa Teresa, na zona sul, na noite de segunda-feira, 15, por três homens armados. D. Orani estava acompanhado do motorista, de um fotógrafo e de um seminarista. Todos foram roubados. O arcebispo, embora não esboçasse reação, chegou a ter uma pistola apontada para a cabeça. Ele entregou aos assaltantes o anel cardinalício e o colar com o crucifixo peitoral. Ladrões levaram celulares, carteiras, relógios, uma câmara fotográfica, o paletó do motorista e até a batina do seminarista. Lições de marketing Discurso Costumo bater nessa tecla. Muita gente se engana com a eficácia do discurso político. O discurso político é uma composição entre a semântica e a estética. O que muitos não sabem é que a eficácia do discurso depende 7% do conteúdo da expressão e 93% da comunicação não verbal. Esse é o resultado de pesquisas que se fazem sobre o tema desde 1960. E vejam só : das comunicações não verbais, 55% provêm de expressões faciais e 38% derivam de elementos paralinguísticos - voz, entonação, gestos, postura, etc. Ou seja, do que se diz, apenas pequena parcela é levada em consideração. O que não se diz, mas se vê, tem mais importância. Portanto, senhoras e senhores assessores dos programas eleitorais, anotem a informação. Consolidação telefonia celular Fora do cenário eleitoral, a ação ON da Oi dispara 13,25%, liderando as maiores altas da Bolsa. Segundo o jornal italiano Il Sore 24 Ore, a Telecom Itália, dona da TIM Brasil, está analisando uma parceira com a Oi. O objetivo da aproximação é evitar que a TIM Brasil se torne apenas um alvo de compra e negociação. Ao invés disso, os esforços visam a fazer com que a empresa seja um fator importante no processo de consolidação do setor de telefonia no país.
quarta-feira, 10 de setembro de 2014

Porandubas nº 413

Abro a coluna com duas historinhas, uma de PE, outra, do CE. Nunca vi nada "Eleição de 1958. O comício era então a grande festa cívica onde se sucediam inflamados oradores, longe das castradoras técnicas do marketing e da televisão. Em Caruaru, José Fagundes, cego de nascença, louvava seu candidato João Cleofas, com a força das boas intenções e de alguns trocados. - Eu queria que Deus me desse a luz dos meus olhos para eu ver o que o doutor Cleofas já fez por PE ! Do povaréu que se comprimia em frente ao palanque, crítico feroz de tudo o que cheirasse a governo, Biu Moscouzinho levantou o braço, esticou o pescoço e mandou o verbo : - Queira não, ceguinho ! Eu tenho dois olhos e nunca vi nada !" (Aldo Paes Barreto, cronista pernambucano, em seu livro Casos, causos e repentes) Meu jumento zurrando O padre da Igreja de São Mateus, no Vale do Jaguaribe, não tinha uma voz privilegiada. Todas as vezes que cantava, via-se uma mulher chorando copiosamente. O padre, intrigado com a situação, perguntou-lhe o motivo do choro. A mulher respondeu : - Ah, senhor, não consigo parar de chorar. Eu tinha um burro que era toda a minha riqueza... infelizmente, morreu. Quando ouço o sinhô padre cantar, parece o meu jumento zurrando ! O padre que esperava algum louvor, retirou-se irritado e confuso. (Causos Cearenses) Até onde a vista enxerga Confessando de cara : a vista deste consultor é turva. Há muita fumaça no ar. Que deixa apenas o que é muito próximo. Paulo Roberto, o delator, teve seu depoimento vazado. Começamos, por aqui, nossa análise. Por que vazou ? Porque há interesses políticos nesse vazamento. O caso está sob segredo de Justiça. Logo, tudo deveria ser secreto. Com o vazamento, emergem as inferências : há um grupo que quer colocar muita lenha na fogueira e causar danos de monta a alguns candidatos. Quem poderia se beneficiar do vazamento ? E mais : quem poderá ganhar com a torrente de denúncias que certamente continuará nos próximos dias ? Vêm mais coisas por aí... Paulo Roberto já dissera tempos atrás : se eu falar, não vai haver eleição. Forma rompante de dizer que seu depoimento provocaria impactos. E provoca mesmo. Por enquanto, ele forneceu uma primeira lista de nomes. Especula-se que vem mais por aí. Mas a delação premiada exige provas, sob pena de o denunciante não ver homologada a negociação para se livrar ou atenuar a pena. Provas. Que tipo de provas ? Corrupção. Entrega de dinheiro, por exemplo. Comprovação de que as empreiteiras tinham de depositar 3% de seus contratos para formar um fundo, cujos recursos seriam repassados a partidos. Não é fácil comprovar essa acusação. A lista A lista mostra atores de alguns partidos. Não se viu, por enquanto, nomeação de partidos ou seus pleitos. Eles aparecem em função de parlamentares neles abrigados. A lista nomeia parlamentares de partidos governistas. Sob esse prisma, os danos caem sobre o governismo, arrastando, de roldão, a candidata Dilma Rousseff. Mas Eduardo Campos, morto tragicamente, era o candidato do PSB, hoje substituído pela ex-senadora Marina Silva. E o ex-governador de PE aparece também na lista. Acordo em PE No caso do ex-governador de PE, Eduardo Campos, o que se diz é o seguinte : o ex-diretor de abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, teria concedido vantagens financeiras, dilatando prazos e suprimindo compromissos assumidos por PE em acordo firmado diretamente com o então governador Campos. Que teria assinado com Costa um termo de adiantamento de tarifas da Petrobras ao porto de Suape por conta do futuro uso do porto no transporte de produtos da refinaria Abreu e Lima. Repasses da estatal seriam da ordem de R$783 mi. Portanto... Portanto, ao dizer que querem "a segunda morte do Eduardo Campos", a candidata Marina procura dar ao fato um tom emotivo, eis que o "morto" não pode se defender das acusações. E uma onda de vitimização cairia bem nesse momento em que começa a ser apontada como favorita. O denunciante teria inserido em vão o nome do ex-governador na lista de beneficiados com o esquema de negócios montado no entorno da Petrobras ? Se a verdade libertará, como lembra Marina citando a Bíblia, que ela apareça. Diluição Por este prisma, a bateria de acusações - até o momento agrupadas na categoria de indícios - tende a se diluir, eis que se repare por todos da situação e da oposição, neste caso, da frente marineira. Aécio Neves seria o maior beneficiário do tsunami que já está sendo chamado de "petrolão". Mas Aécio teria tempo de se recuperar do estrago que Marina fez sobre seu mapa eleitoral ? Difícil. A banalização do mal, ou, em outros termos, a banalização da corrupção tem o efeito de horizontalizar as denúncias, repartindo-as de um lado para outro do espectro partidário. É quase impossível para um ator político ser considerado um santo, honesto, ético, nesses tempos de desmoralização da política. Marina, um logotipo Interessante é a figura de Marina. Poucos sabem dizer o que defende, o que prega, quais são suas propostas. Mas ela cativa pela estética. Uma evangélica, de origem negra, que se veste de maneira tradicional, um tom agudo de voz, expressão de quem está no púlpito de um templo. Nela se cristaliza a lição de Marshall McLuhan, o filósofo da comunicação da década de 60 : o meio é a mensagem. Ela, como meio, é a mensagem. Junte-se a isso a rejeição que se expande nos terrenos do PT. Ouve-se por muitos lados : chega de PT. Mas o partido tem ainda um bom lastro nas margens sociais. Projeções Sob essa moldura, pode-se fazer um conjunto de inferências : 1. Aécio só se recupera caso consiga acender o pavio da racionalidade no Sudeste do país. Ora, ele está em terceiro lugar em seu próprio Estado, MG, o segundo maior colégio eleitoral do país. 2. Os tucanos paulistas não se envolveram com Aécio de forma tão estreita, como seria de esperar entre correligionários. 3. O Nordeste será repartido entre Dilma e Marina. 4. Ambas têm, hoje, praticamente assegurados seus passaportes para o segundo turno. 5. As bases petistas, para aumentar o cacife eleitoral da presidente Dilma, precisam resgatar o ardor com que vestiam seu ânimo em campanhas passadas. Parece que até Lula está sem entusiasmo. 6. Marina, ao que parece, bateu em seu teto. Mas o emocionalismo que imanta sua imagem pode lhe render mais alguns pontinhos. Religião e política Política e religião não devem se misturar. É preocupante ver a imbricação de religião e política. O pastor Lélis Marinho, coordenador do Conselho Político das Assembleias de Deus está coletando assinaturas para formar o partido da igreja de Marina, usando, para tanto, um exército formado por 40 mil pastores e 100 mil locais de culto no país. Um perigo um partido político evangélico. A César o que é de César, a Deus o que é de Deus. E a lei ficha Limpa ? Pois é, e a lei ficha limpa, hein, vale ou não vale ? A LC 135, sancionada em 4 de junho de 2010, que contou com o apoio de 1,3 milhão de assinaturas para sua aprovação pelo Congresso, prevê 14 hipóteses de inelegibilidade, impedindo candidaturas de políticos que tiveram mandato cassado, condenados em processos criminais ou quem renunciou ao mandato para evitar processo de cassação. A punição é de oito anos de afastamento das urnas. Levantamento da PGR aponta que existem no Brasil, atualmente, 346.742 processos de potenciais inelegíveis devido à lei ficha limpa. O MPF já impugnou 4.115 candidatos por irregularidades nos registros das eleições de 2014. Desses, 497 ações foram em decorrência da lei ficha limpa. Dados foram contabilizados até 19 de agosto. Correção O STF tomou uma decisão histórica ao reconhecer a existência da união estável entre companheiros do mesmo sexo. Por unanimidade, os ministros definiram que as uniões homossexuais configuram uma entidade familiar. Assim, os casais gays passarão a ter direitos previdenciários e poderão partilhar bens e herança, assim como fazer declaração conjunta de IR e adotar filhos. Semana passada, Porandubas afirmara que Marina defende a "união civil" nos termos definidos pela CF. Correção : não existe a união civil de pessoas do mesmo sexo, mas união estável. Obrigado ao leitor André Bocuzzi pela oportuna correção. Atenção, MP e Poder Judiciário 1. Senhores promotores, senhores juízes. Atentem para a aplicação rigorosa da ficha limpa. Não deixem passar em brancas nuvens a sujeira feita por políticos de ficha suja. 2. Se candidatos ficha suja habilitam suas candidaturas, estão maculando o império da ética, da moral e da Justiça. 3. Vejam quais os excessos cometidos e estendam seus braços para evitar que a sujeira contamine os espaços éticos do nosso território.
quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Porandubas nº 412

Matreirice 31 de março de 1964. Benedito Valadares, raposa mineira, se encontra no aeroporto de BH com outra raposa, José Maria Alkmin, sob o olhar atento de Olavo Drummond, também mineiro e amigo de meio mundo. - Alkmin, para onde você vai ? - Para Brasília. - Para Brasília, ah, sim, muito bem, para Brasília. Os três saem andando para o cafezinho, enquanto Benedito cochicha no ouvido de Drummond : - O Alkmin está dizendo que vai para Brasília para eu pensar que ele vai para o Rio. Mas ele vai mesmo é para Brasília. Gargalhada. Artimanha maquinada para um pegar o outro. Esta modalidade é chamada de engano de segundo grau. Quer dizer : engano meu interlocutor, dizendo-lhe a verdade para tirar proveito da sua desconfiança. A historinha é de origem judia e expressa com humor o refinamento a que leva a tática de ocultar informações. No original, conta-se que dois judeus russos encontraram-se em um aeroporto. Resposta de um para o outro : "Que burla, você está me dizendo que vai a Minsk para que pense que vai para Moscou. Acontece que você vai mesmo para Minsk". O espírito das ruas O Brasil ingressou, apressado, no ciclo das mobilizações. Parece desejar recuperar o tempo perdido com a inércia. O espírito das ruas saiu da toca e passou a animar os ânimos de pessoas de todas as classes sociais. As manifestações de junho de 2013, que chegaram a juntar, de uma vez só, cerca de 1,5 milhão de pessoas, precisavam ancorar em algum porto. Em outros termos, alguém deveria canalizar os sentimentos dos becos, vielas, escritórios e esquinas do país. Até a morte trágica de Eduardo Campos, não se sabia quem seria essa pessoa. Ele teria condições de ser o ponto de confluência das manifestações sociais ? Não. Para onde iria o espírito das ruas ? Claro, para a vice de Eduardo, Marina Silva. Não se trata apenas de um ponto de convergência, aberto por comoção social. O perfil da ex-seringueira se adapta ao molde da contemporaneidade. Por isso, ela já tem ingresso para entrar no segundo turno. "O estadista deve trazer o coração na cabeça". (John Kennedy) Votos estão cristalizados ? Estão em processo de cristalização. Forte parcela já aderiu a Marina pelo que ela representa. Expressa o conceito do "diferente do que se vê". Estética que chama a atenção : negra, magra, alfabetizada aos 16 anos, timbre agudo de voz, pequena, coque no cabelo, vestes que lembram uma evangélica entrando em um templo religioso. Uma semântica que abriga um discurso com palavras de difícil alcance - como transversalidade - conceitos conservadores em áreas polêmicas (casamento entre gays, aborto, fé religiosa, etc.) e linguagem que toca os píncaros da abstração. Fala muito e diz pouco, procurando abrigo em platitudes e plataformas genéricas. Mas transmite impressão de sinceridade, honestidade, moralidade. É o vento da vez. "Os políticos terão de ser, um dia, animais de circo". (Richard Nixon em 1968, referindo-se aos debates na TV americana) O vento da vez Meu saudoso pai, falecido aos 86 anos, vivia olhando o nascente e o poente para distinguir sinais de chuva. Antes, porém, sentia o vento correndo em uma direção. Dependendo da direção, ele garantia : vem chuva desse lado de cá, está chovendo nas bandas do CE. Essa onda vem do Norte, do MA. Nossa cidade, Luis Gomes, encravada na fronteira entre RN, PB e CE, servia de biruta para ele nos proporcionar seus cenários de chuva forte ou chuvinha fina. Nunca errava : "quando o vento vem do nascente, ninguém é capaz de mudar sua rota ; é chuva na certa". Pois bem, toda campanha eleitoral tem seu vento correndo numa direção. O vento deste ano se chama Marina Silva. "Deves parecer clemente, fiel, humano, íntegro, religioso e sê-lo, mas com a condição de estares com o ânimo disposto a tornar-te o contrário". (Maquiavel) Marina e Lula Há quem a compare ao ex-metalúrgico Luiz Inácio Lula da Silva. Nascida nas margens sociais, pobre, trabalhadora de seringal no AC, vítima de doenças causadas pelas intempéries da região (mercúrio nos rios, onde se buscava ouro), Marina subiu a montanha da política na locomotiva do discurso da ecologia e sustentabilidade. Criou uma identidade como Lula assim também o fez. Foi, como Lula, fundadora do PT, amiga de Chico Mendes, o ambientalista, assassinado, ícone da defesa ambiental no país. Lula de saias ? A comparação dá a ela mais vigor por encarnar valores que Lula não empunhava, particularmente na frente dos costumes e da moral. É uma pessoa mais contrita, religiosa, uma crente que se vale da Bíblia a todo o momento. Lula, digamos assim, está mais próximo ao dia a dia da vida urbana, incluindo os lazeres e o prazer de um bom prato. Até nisso Marina é diferente. Faz uma dieta rigorosa exigida por um corpo fragilizado pela carga de doenças do passado. "Não é por culpa do espelho que as pessoas têm uma cara errada". (Gogol) Ganhará ? Essa pergunta não passa, ainda, pela bola de cristal de nenhum adivinho, quanto mais pela lupa de um analista político. No final da segunda semana deste mês de setembro, será possível ver onde estará a régua da cristalização de votos. Nesse caso, veremos o que será de Aécio Neves e sua votação. Se os votos em Marina estiverem consolidados e tendência de estabilidade confirmada, a equação ficará mais perto da solução : os votos de Aécio migrarão para Marina e outra parte para Dilma. Aqueles que dizem que o maior contingente cairá nas urnas de Marina podem acertar. Porque a velha polarização PT x PSDB afastará tucanos das urnas do partido de Lula. Dilma, porém, conta com alguns trunfos. A capacidade de recuperação de suas margens históricas no Nordeste, hoje em queda. "O tom do mundo consiste muito em falar de bagatelas como se fossem coisas sérias e de coisas sérias como se fossem bagatelas". (Montesquieu) Recuo marineiro Outro fator em condição de criar um borrão na imagem de Marina é a gangorra que a leva para cima e para baixo. Começa a mostrar uma disposição para se adaptar às regras do jogo político, aceitando posições e abordagens que, anteriormente, não aceitava. O caso do combate à homofobia, por exemplo. Depois de admitir o casamento de gays, ela retrocede, falando de "erro processual", e passa a aceitar apenas a defesa da união entre pessoas do mesmo gênero nos termos já definidos pelo STF. Ou seja, Marina recuou por conta das críticas feitas por grupos evangélicos, como o do pastor Silas Malafaia. Os evangélicos podem decidir a tendência de um segundo turno. O pragmatismo marineiro ficou escancarado. "Não há nem pode haver aliança entre a política e os meus interesses privados ; a política é e sempre será a inimiga da minha prosperidade profissional". (Rui Barbosa) Mercado já aceita A independência do BC agrada ao mercado. Os bancos começam a gostar do programa de Marina na área econômica, que prevê menor intervenção do mercado na economia. Nesse ponto, o programa do PSB é mais próximo ao programa tucano de Aécio Neves que ao escopo do PT. As bolsas sobem no embalo de uma visão menos intervencionista no mercado, que é a visão de Marina. O ministro Mantega, sob esse prisma, é uma carta que começa a ser descartada pelo sistema produtivo. O país está em recessão técnica. E o ministro da Fazenda acha que, mesmo com o pibinho, o Brasil está indo muito bem. "Tenho um programa com soluções rápidas para o trânsito do Rio : carro novo vai pelo túnel novo ; carro velho só entra no túnel velho". (Antônio Luvizaro, candidato ao governo do Estado da Guanabara, nos idos de 60) Nomes em alta Nomes em alta do staff marineiro : Walter Feldman, ex-deputado Federal, ex-tucano e um perfil preparado ; a educadora Neca Setúbal, que nunca esteve na esfera de trabalho do Grupo Itaú, sendo conhecida por sua inserção nas áreas social e educacional ; Maurício Rands, ex-deputado petista, de PE, ex-líder do PT na Câmara dos Deputados. "As leis são como teias de aranha, os pequenos insetos prendem-se nelas e os grandes as rasgam sem custo". (Anacaris, um dos sete sábios da Grécia) PMDB mais forte Ao contrário de alguns prognósticos, o PMDB será muito forte no próximo governo. Deverá fazer a maior bancada de governadores. A conferir. Deverá manter a maior bancada no Senado. E, na Câmara Federal, deverá continuar como a segunda bancada. No jogo de composições, o partido é ator fundamental. Difícil governar sem o apoio do PMDB. Eduardo Cunha, o atual líder do partido na Câmara, é forte candidato à presidência da Casa. "O voto é secreto, imbecil". (Coronel na década de 30, ao entregar o voto fechado em um envelope para o súdito depositar na urna, assim respondeu à pergunta sobre o nome em quem estava votando) Debates Os debates continuam engessados e burocráticos. Este último, promovido pelo SBT, FSP, Uol e Jovem Pan, foi uma chatice. Dilma e Marina entraram num corpo a corpo e, por isso mesmo, lideraram a visibilidade. Aécio foi relegado ao grupo dos nanicos. Quase três horas de debates, dentro de um modelo fechado, agregam muito pouco ao debate político. O debate sobre economia - juros, metas de inflação, políticas fiscal e tributária - não chega às margens. Bate no centro racional e esclarecido. Que já tem posições firmadas sobre o assunto. Logo, o debate apenas reforça pontos de vista já assumidos por grupos de eleitores. "Ao contrário do que os brasileiros pensam, a Amazônia não é deles, mas de todos nós". (Ex-vice presidente dos EUA, Al Gore) Pesquisas Vem mais pesquisa neste final de semana. Datafolha deve divulgar dados sobre a situação para governos de SP, MG, PE, CE, RS e DF. Em SP, deve confirmar liderança de Alckmin (PSDB), mas é bem provável uma subida de Paulo Skaf (PMDB), que está confrontando o governo tucano. Em PE, Paulo Câmara (PSB), o candidato lançado por Eduardo Campos, deverá crescer ; no CE, Eunício Oliveira (PMDB continuará na liderança ; em Minas, Pimentel, do PT, está dando um banho no candidato de Aécio, Pimenta da Veiga ; no RS, a senadora Ana Amélia (PP) lidera ; tende a subir ou a cair ? No DF, como fica a situação ante a impugnação de Arruda e o baixo índice do governador Agnello Queiroz (PT) ? O senador Rollemberg (PSB), pode ser o beneficiário da situação. Skaf cresce A pesquisa de ontem do Ibope mostra Paulo Skaf em crescimento. Está chamando Geraldo Alckmin para a luta no ringue. Alckmin desceu de 50% para 47%. Skaf chega aos 23%. Padilha tem 7%. A continuar a tendência de queda de três pontos de um lado e subida de pontos, de outro, poderemos enxergar um desenho de 40% a 30% em meados de setembro. Se Padilha, com a ajuda de Lula, chegar aos 15%, teremos um segundo turno em SP. Esta é a esperança de Skaf e o pavor de Alckmin. O busílis se chama Padilha. Que patina. Dilma bate A presidente Dilma compara Marina a Collor e Jânio. A ex-senadora dissera, há dias, que vai governar com os melhores de todos os partidos. Uma forma indireta de dizer que passará ao largo das duas Câmaras Congressuais ? Pessoas são importantes, mas governar sem as instituições é um risco. Programas de TV Essa campanha derruba alguns mitos, entre eles o de que um grande espaço na mídia eleitoral é fundamental para o sucesso de uma candidatura. Veja-se o caso de Marina, que não chega aos dois minutos na programação eleitoral. Está nos píncaros da visibilidade. Os programas, ademais, perderam parte de sua essencialidade. Tornaram-se press releases eletrônicos de feitos e eventos. Entraram no poço da descrença. São molduras gráficas e eletrônicas bem feitas, mas sem poder de internalização na cachola dos telespectadores. As mensagens entram por um ouvido e saem por outro. Cuidado ! Ambição desmesurada No meu livro "Marketing Político e Governamental", cito um pensamento do cientista político Robert Lane, em Political Life, que explica como a ambição desmesurada pelo poder funciona como um bumerangue. Seria o caso de alguns políticos brasileiros ? Eis o pensamento de Lane: "A fim de ser bem-sucedida em política, uma pessoa deve ter habilidades interpessoais para estabelecer relações efetivas com outras e não deve deixar-se consumir por impulsos de poder, a ponto de perder o contato com a realidade. A pessoa possuída por um ardente e incontrolável desejo de poder afastará constantemente os que a apoiam, tornando, assim, impossível a conquista do poder".
quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Porandubas nº 411

Não está inscrito na OABAbro com uma historinha dos confins da PB.Em Antenor Navarro, por ocasião de um júri, o juiz da comarca, Nelson Negreiros, viu o réu chegar sem advogado de defesa :- O senhor não tem advogado ?- Tenho, doutor juiz. Meu advogado é Deus.- Meu caro, esse não serve. Não está inscrito na Ordem.E complemento com o grande EinsteinCerta vez, Einstein recebeu uma carta da Miss New Orleans, que confessava : "Prof. Einstein, gostaria de ter um filho com o senhor. A minha justificativa se baseia no fato de que eu, como modelo da beleza, teria um filho com o senhor e, certamente, o garoto teria a minha beleza e a sua inteligência". Einstein respondeu na lata : "Querida Miss New Orleans, o meu receio é que o nosso filho tenha a sua inteligência e a minha beleza".Sinal de derrota"O maior sinal de derrota é quando já não se crê na vitória". (Montecuccoli)Nuvens fixas e móveisE as interrogações explodem por todas as partes. Marina vencerá o pleito ? Já passou Aécio Neves ? No segundo turno, ganha da presidente Dilma ? O que vai acontecer se vier a ganhar ? Tem condições de governar o país ? Bem, nem a mais fantástica bola de cristal será capaz de prever o futuro. A massa de previsibilidade no campo da política é limitada por uma batelada de fatores : perfil dos atores políticos ; recursos e meios para se alcançar o poder ; condições do país no momento eleitoral ; situação social ; movimentação nas ruas ; saturação das velhas regras ; incorporação de novos modelos pela sociedade ; condições das campanhas, etc. Marina está brilhando nos céus em função de movimentação das nuvens móveis, que vão e vêm. Mas as nuvens fixas flagrarão sua boa performance em finais de setembro ?Primeiro reflexoO primeiro reflexo já apareceu : Marina encosta em Dilma segundo a pesquisa Ibope de ontem. Bate na trave com 29%; Dilma caiu para 34%. Aécio ficou em 19%. Significa que resgata seu potencial de 2010 e ainda avança sobre votos da presidente Dilma e até do Aécio. A maior perda é no território da candidata governista. Mas o primeiro reflexo aguenta o tranco de dois contendores com máquinas mais amplas e vigorosas ? A conferir.Marina e significadosMarina Silva carrega consigo uma densa planilha de significados : é o tostão contra o milhão ; a encarnação do novo contra o velho ; assepsia, moralidade, ética, sinceridade, honestidade, rebeldia da juventude, o sol nascente no horizonte poluído da política. Dito isto, a hipótese parece adequada : é o perfil em condições de levar a melhor no pleito deste ano. Certo ? Em termos. Há que analisar outros fatores. Marina tem potencial, mas tem poder ? Poder é soma de meios, recursos, condições, vetores de força. Na política, agrega, ainda, partidos, cabos eleitorais, estruturas estaduais e municipais da administração pública, políticas sociais em curso, a economia e seus derivados: inflação, emprego, conforto. Marina frágilA fragilidade de Marina Silva não se apresenta apenas na estética esquelética ou na fisionomia de uma ex-seringueira atacada por doenças quando jovem. Marina não conta com as estruturas que ainda movimentam o trem da velha política. O Bolsa Família, que agrega cerca de 13 milhões de famílias e mais de 50 milhões de brasileiros, é identificado com os governos Lula/Dilma. O bolso supre o estômago e este é o órgão vital a comandar o processo decisório em eleições. Marina poderá dizer que o Bolsa Família terá continuidade, mas a candidata Dilma ainda leva o troféu de patrocinadora do programa. Marina abomina a velha política. Ora, é sob a bandeira rota da velha política que a campanha se desenvolve.A onda marineiraMarina Silva certamente é a bola da vez. Ela forma a onda marineira que se espraia em todo o território. Mas este consultor tem dúvida se a ex-senadora será capaz de fazer marolas nessa onda até final de setembro. Não terá os volumes de comunicação de Dilma e Aécio, apesar de contar com o clima das ruas, que lhe será inteiramente favorável nesse primeiro momento. Uma campanha é contenda dura, sangrenta, que carece de muita bala. Marina tem arsenal suficiente ? O cenário de declínio de Marina, mais adiante, também deve ser considerado.Emoção dá votos, mas...Emoção produz intenção de voto ? Sem dúvida. Mas a emoção com a morte de Eduardo Campos e a entrada intensamente espetacularizada de Marina no palco eleitoral devem se esvair nas próximas semanas, dando lugar a uma rearrumação das "camadas tectônicas" decorrentes do terremoto político. Este consultor tende a acreditar que a presidente Dilma ainda é a favorita do pleito de outubro, principalmente se não houver traumas na economia. Estamos a um pequeno passo do ponto de quebra da sustentabilidade e confiança da população no governo. A estrela do PT em queda ?Se Dilma ainda é a favorita, o mesmo não se pode dizer do PT. A estrela petista mostra certo declínio. Não despenca acelerada no cosmos da política, porque a estrutura formada ainda a sustenta bem, mas o fato é que a estética do partido e a semântica, que o fazia diferente de outras siglas, anos atrás, começam a mostrar esgarçamento. O PT é o partido com maior identificação com a carga negativa da corrupção. E a voz de Lula, nos finais de programas, cedendo seu apoio e conclamando os eleitores a votarem nos candidatos petistas, não tem mais a conotação forte dos velhos tempos.Em SPA campanha de SP ainda não entrou na velocidade de cruzeiro. Os candidatos ainda estão vivenciando a decolagem, cada qual procurando seu tom, arrumando sua identidade, costurando sua estética. A pletora de candidatos gera dispersão das linguagens, sobrando, ao final dos debates, a sensação de que os atores patinam no entorno de uma Torre de Babel. A pequena audiência dos debates é também responsável pelo jogo empatado entre as performances individuais. Os três principais candidatos expressam abordagens diferenciadas no marketing televisivo.Alckmin, jornalismo na TVGeraldo Alckmin, o candidato tucano, mexe com as pedras no tabuleiro jornalístico. O programa de segurança é cheio de dados de pesquisa, mostra cenários de Nova York, com seus mecanismos tecnológicos de segurança, em clara abordagem jornalística. Alckmin, o narrador, tenta fazer um link entre o que de mais moderno existe em matéria de segurança nas ruas e SP. Mostra dados a seu favor, apesar de se saber que a segurança pública em SP atinge índices altíssimos. Skaf, publicidade na TVJá a abordagem de Paulo Skaf é claramente publicitária. O programa sobre estupro foi um exemplo. Cria emoção, impacta. É perceptível a tentativa de chamar a atenção, envolver o telespectador com dobras emotivas. A sequência de "nãos" de pessoas nas ruas, alguns produzidos apenas com acenos de cabeça, expressa uma dose de teatralização, a demonstrar que os depoimentos acabaram sendo embalados por produção e edição publicitária. Skaf é um perfil diferenciado, encarna, sim, inovação, mas aparece ultrapassando a linha argumentativa do bom senso. É o mais teatral dos candidatos. Mas conseguiu sair dos 16% para 20%.Padilha, emoção e friezaO candidato Alexandre Padilha trabalha com os signos do velho PT : emoção, mudança, esperança, renovação. Lula, ao final, pedindo votos. O fato é que esse discurso já está batido. Desgastado. Não é mais avançado. É, sim, estancado. Por isso, vê-se um Padilha falando quase automaticamente. De maneira distante, fria. A falta d'água em SPAté agora, o pote de Alckmin ainda não mostra sinais de esvaziamento de votos com a falta d'água em SP. Mas, com a água ameaçando faltar nas torneiras, será possível distinguir fontes mais secas de votos no entorno do governador tucano. Mais adiante.Debate na Band IDebate na TV Bandeirantes. Marina, saindo de sua postura humilde, foi dura e firme. Atacou e defendeu-se como uma onça amazônica. Não se acanhou. Bateu forte. Aécio teve uma boa expressão, sempre com um ligeiro sorriso. Dilma enfrentou uma bateria de perguntas críticas e respondeu bem, afora a impressão de que, às vezes, faltava expressão ao final das frases. O debate II O debate de ontem à noite, na TV Bandeirante, certamente foi o primeiro ensaio comparativo entre os perfis dos candidatos. Foi o melhor dos últimos anos. Principalmente os blocos iniciais, incisivos, diretos, sem firulas. Visto por um grupo mais selecionado de telespectadores, particularmente os habitantes do andar do meio da pirâmide, cuja intenção de voto já está praticamente tomada. As margens é que tendem a mudar o voto, correndo em direção aos perfis emotivos. A pesquisa de hoje, que mostra Marina em situação confortável, é o fogo de artifício que faz brilhar seu nome nos céus do território. Mas brilharão até o final da campanha ?Os eleitores se interessam ?O horário, bem tarde, afasta eleitores da telinha. A bateria de lenga-lenga tem funcionado mais como estratégia de alavancagem de marketing das empresas do que efetivo instrumento de avaliação e comparação de propostas de candidatos. Os debates têm oscilado entre índices de 4% a 5%. Pouca audiência . Até mesmo debates como os promovidos pela Rede Globo, de maior audiência, nas proximidades do final de campanha, não geram muito impacto. A saturação do verbo motiva os telespectadores a desligar os aparelhos de TV ou mudar de canal.Leiam de cima para baixo e de baixo para cimaA desmoralização da classe política propicia uma expressão debochada nos mais diferentes segmentos sociais. Vejam a peça a seguir. Trata-se do discurso da campanha e do pós-campanha. A verve traduz, de certa forma, o pensamento social sobre a política e os candidatos. Leiam do começo ao fim e, na sequência, comecem pelo final.Na campanhaNosso partido cumpre o que promete.Só os tolos podem crer queNão lutaremos contra a corrupção.Porque, se há algo certo para nós, é quea honestidade e a transparência são fundamentaispara alcançar nossos ideaisMostraremos que é grande estupidez crer queas máfias continuarão no governo, como sempre.Asseguramos sem dúvida quea justiça social será o alvo de nossa ação.Apesar disso, há idiotas que imaginam quese possa governar com as manchas da velha política.Quando assumirmos o poder, faremos tudo para quese termine com os marajás e os negociatas.Não permitiremos de nenhum modo quenossas crianças morram de fome.Cumpriremos nossos propósitos mesmo queos recursos econômicos do país se esgotemExerceremos o poder até queCompreendam queSomos a nova política.
quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Porandubas nº 410

Abro a coluna de hoje com uma historinha da PB. Dois matutos de Monteiro no Cariri paraibano, cansados da seca e das promessas dos políticos, decidiram tentar a vida em uma cidade grande. Venderam o burro, o jumento e o cavalo e, na esperança de um dia voltar, rumaram para o RJ. Chegando lá, por sorte, arranjaram empregos de servente em uma pequena construção, o salário pequeno mal dava para sobreviver e raramente sobravam trocados para enviar aos familiares na PB. Durante o período do carnaval dois árabes, fazendo turismo no Rio, passaram em frente à obra e viram os paraibanos de enxadas nas mãos, mexendo areia e cimento. O sol estava escaldante e os nordestinos suavam até pela ponta do nariz. Os turistas se aproximaram e, admirados de tanta bravura, perguntaram qual o salário dos dois. - Ganhamos o salário mínimo, uma mixaria. Os árabes perguntaram se não aceitavam morar na Arábia Saudita e trabalhar por lá recebendo salários polpudos. Os paraibanos esclareceram que não seria possível viajar para um lugar tão longe, pois faltava o dinheiro das passagens. Os árabes afirmaram que isto não seria um problema, já que os mesmos estavam de avião particular e daria para levar ambos. Depois do carnaval e após uma prece ao Padim Ciço, os paraibanos embarcaram. Quando o avião estava sobrevoando o deserto do Saara, apresentou uma pane, sendo necessário um pouso não programado. Um dos paraibanos, na porta do avião, olhou em frente e só viu areia : do lado direito, do lado esquerdo e na parte de trás, só areia. Um mundão de areia. Com ar de preocupação, virou-se para o companheiro e gritou : - Ô Severino, nóis tamo lascado. Quando chegar o cimento, oi nóis (e fez aquele gesto famoso). (Enviado por Severino Nunes de Melo) As chances de cada candidata (o) Este consultor aproveita a coluna de hoje para tentar explicar quais as chances e possibilidades de cada candidata (o) à presidência da República, levando em consideração seus pontos fortes e seus pontos fracos. Faço este exercício procurando uma dose de equilíbrio, sem torcer para A ou B. Vamos adiante. Como o eleitor escolhe Mostremos, primeiramente, qual o processo que baliza as escolhas dos eleitores. É comum se dizer que o eleitor escolhe por instinto. A palavra é essa mesma. Mas poucos se dão conta da extensão de seu poder. Expliquemos. O ser humano age por meio de quatro instintos, dois ligados à preservação do indivíduo e dois ancorados na conservação da espécie. Os dois primeiros são : o instinto combativo e o instinto nutritivo. O combativo refere-se à luta do homem para sobreviver, enfrentando a natureza, os dissabores, as adversidades que se apresentam nos múltiplos espaços da vida cotidiana. O impulso nutritivo o joga na procura do alimento, que supre seu corpo. Sem alimento, o homem definha. BO+BA+CO+CA Por isso mesmo, criei a equação que está por trás da decisão do eleitor : BOlso cheio, geladeira cheia, BArriga satisfeita, COração agradecido, CAbeça decidindo votar em quem viabilizou o suprimento de alimentos. Dito isto, poderemos abrir o cenário das candidaturas. Começando com a pergunta : qual o perfil mais próximo à geladeira ? Marina, Dilma ou Aécio ? Dilma, a favorita Se a resposta levar em consideração este pano de fundo, não há dúvida : Dilma Rousseff ainda é a favorita. E onde reside a explicação ? Bolsa Família e outras bolsas. O eleitorado, principalmente o das margens - Nordeste, Norte, Centro Oeste - tende a decidir na direção de quem lhe proporciona esse pacote de benefícios. O que é mais vantajoso ? Apostar no certo ou no incerto ? O eleitor tende a apostar no que lhe parece mais seguro. O que pode ameaçar Dilma ? O bolso mais vazio em outubro. E isso se dará se a inflação de alimentos esvaziar a cesta básica. Inflação e desemprego são as duas maiores ameaças à reeleição da presidente. Aécio sinaliza esperança ? Carrega o senador mineiro uma bagagem de jovialidade, animação, disposição, determinação. Sai de um Estado, MG, que é o segundo maior colégio eleitoral do país : 16 milhões de votos. Fez ali uma boa gestão. Tanto ele como seu sucessor, Antonio Anastasia. Conta com o apoio dos tucanos paulistas, a partir do governador Geraldo Alckmin, que continua exibindo confortáveis índices de intenção de voto : 55%. Conta com o apoio de José Serra, candidato a senador, e de Aloysio Nunes Ferreira, senador, candidato a vice em sua chapa. E com o apoio de Fernando Henrique, prestigiado ex-presidente da República. Aécio terá um voto forte no Sudeste (*SP, MG, RJ). Mas se a economia não cair no despenhadeiro, não conseguirá ultrapassar Dilma. Marina, a emoção completa O eleitor tende a se identificar com a alma sofrida. Dá um voto farto em quem padece, sofre. A morte trágica de Eduardo Campos comoveu e comoverá, por um bom tempo, os corações brasileiros. Marina já tinha um capital eleitoral próprio. Chegou a ter, em abril deste ano, 27% de intenção de voto. Eduardo Campos tinha cerca de 12%. Marina, agora, chega aos 21%. Mas não tirou voto de Aécio e de Dilma, que continuam, segundo a última pesquisa Datafolha, a ter, respectivamente, 20% e 38%. Portanto, Marina puxou votos do cordão dos indecisos, nulos e brancos. Seu eleitorado maior é composto por jovens de classe média e bem escolarizados. As ondas emotivas As ondas emotivas deverão, isso sim, abrir a visibilidade de Marina, que terá dois minutos apenas de TV e rádio na programação eleitoral. Dilma terá mais de 10 minutos e Aécio, 4. Nos spots publicitários - aqueles foguetinhos que se ouvem ao longo do dia - Dilma pipocará. Será uma dose e tanto de comunicação. É razoável supor que, lá para os meados de setembro, as ondas emotivas refluam e o perfil mais denso de Dilma e Aécio aumentem seus cacifes. A não ser que, até lá, novas ondas emotivas sejam criadas para empurrar o voto de coração em Marina, sob o sorriso aberto e os olhos azuis do Eduardo, escancarados em grandes cartazes. As novas ondas ? Sim, ondas formadas pela participação comovida de dona Renata e seus cinco guerreiros, os cinco filhos vestidos com camisa amarela. E a rejeição a Dilma ? Dilma enfrenta quase 40% de rejeição no maior colégio eleitoral do país, SP. Essa é sua grande ameaça. Eliminará a rejeição ? Parcela, sim. A intensa propaganda eleitoral acabará modulando sua imagem, tirando excessos aqui e ali e formando uma composição menos negativa. Se conseguir chegar aos 18% de rejeição, alcançará índice razoável. É o que deve acontecer. E Marina no nordeste ? Pois é, Eduardo Campos registraria um bom crescimento na região nordestina, na esteira da colagem de seu perfil às demandas regionais. Será difícil para Marina garantir a adesão maciça do eleitorado nordestino. Este consultor aposta mais na hipótese de que Dilma acabará consolidando sua imagem na região. E o Triângulo das Bermudas ? SP poderá dar uma boa maioria a Aécio Neves. Urge lembrar que Dilma ainda está na frente neste Estado. Mas a tendência é que Aécio Neves saia de Minas e de SP com uma boa maioria, capaz de diminuir a folgada maioria que Dilma terá no Nordeste. O RJ dividirá bem os votos, eis que os partidos, a partir do PMDB, fazem campanha para Dilma e Aécio. Os marineiros do Rio também formam um bom contingente. PMDB e os Estados Contas da cúpula do PMDB mostram que o partido poderá eleger os governadores dos seguintes Estados : AM, PA, CE, RN, AL, SE, ES, RJ, MS, TO. Com possibilidades, ainda, no PR e em GO. Declaração de Fortaleza Indicados aos cargos de conselheiros e ministros devem antes ser enquadrados na Lei da Ficha Limpa. É o que pedem os presidentes de 34 Tribunais de Contas, que também defendem a criação do Conselho Nacional dos Tribunais de Contas para fiscalizar a atuação de cada Corte no país. A Declaração de Fortaleza, na qual constam 19 diretrizes, é tida como o mais contundente manifesto dos TCUs, sob a égide da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), presidida pelo dinâmico conselheiro Valdecir Pascoal (TCE/PE). Temístocles, o ateniense Temístocles, o altivo ateniense, não era de cacarejar. Convidado para tocar cítara numa festa, o general declinou : "Não sei música, o que sei é fazer de uma pequena vila uma grande cidade". Regra geral, nossos governantes das três esferas Federativas, afinando o tom com o maior dos tocadores, não hesitam em aceitar convites para manejar cítara, clarineta ou trombone. Abandonam o foco. Grande parte prefere trombetear no marketing a fazer de suas cidades e Estados territórios desenvolvidos e civilizados. Muitos se inebriam nas fontes do poder. Esquecem-se do ensinamento de Gogol : "Não é por culpa do espelho que as pessoas têm uma cara errada". É a ruína que o modelo pirotécnico de administrar oferece ao Brasil. Pequenas lições de marketing político Alavancas do discurso I Nesta campanha, esta coluna faz seu fechamento com pequenas lições de marketing. Existem alguns símbolos detonadores e indutores do entusiasmo das massas em, pelo menos, quatro categorias. Eis as quatro alavancas psíquicas : 1. Alavancas de adesão - Discurso voltado para fazer com que a população aceite os programas, associando-se a valores considerados bons. Nesse caso, o candidato precisa demonstrar a relação custo-benefício da proposta ou da promessa. 2. Alavancas de rejeição - Discurso voltado para o combate às coisas ruins (administrações passadas, por exemplo). Aqui, o candidato passa a combater as mazelas de seus adversários, os pontos fracos das administrações, utilizando, para tanto, as denúncias dos meios de comunicação que funcionam como elemento de comprovação do discurso. Alavancas do discurso II 3. Alavancas de autoridade - Abordagem em que o candidato usa a voz da experiência, do conhecimento, da autoridade, para procurar convencer. Sob essa abordagem, entram em questão os valores inerentes à personalidade do ator, suas qualidades pessoais. Quando se trata de figura de alta respeitabilidade, o discurso consegue muita eficácia. 4. Alavancas de conformização - Abordagem orientada para ganhar as massas e que usa, basicamente, os símbolos da unidade, do ideal coletivo, do apelo à solidariedade. É quando o político apela para o sentimento de integração das massas, a solidariedade grupal, o companheirismo, as demandas sociais homogêneas. Verborragia desafinada Os estilos da galinha e da pata servem para comparar os partidos e os políticos. A primeira põe um ovo pequenino, mas cacareja e todo mundo vê, enquanto a segunda põe um ovo maior e ninguém nota. O ovo da pata, segundo os nutricionistas, é mais completo que o da galinha, mas este é o que gera atenção, intenção, desejo e ação - a fórmula AIDA - para estimular seu consumo. E o êxito se deve porque a fêmea do galo sabe alardear seu produto, cumprindo rigorosamente o preceito maquiavélico : "o vulgo só julga aquilo que vê".
quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Porandubas nº 409

Abro a coluna com uma deliciosa historinha contada ontem a este analista político pelo governador Geraldo Alckmin, por ocasião da 25ª edição do Congresso Brasileiro do Aço, que termina hoje no WTC. Alckmin era candidato à prefeitura de Pindamonhangaba, sua cidade. Moço, 24 anos, bem disposto, chegando ao final do curso de Medicina, o candidato gastou muita sola de sapato para distribuir os seus santinhos. Já na reta final da campanha, chegou numa casinha de família pobre, identificou-se, enfrentou a zoeira de um papagaio falador e de galinhas no corredor e foi bater na cozinha, onde uma senhora, rodeada de filhos, aprontava o almoço. Distribuiu seu santinho e gastou muita lábia para convencer a eleitora a votar nele. Agradeceu e, já na porta, a senhora fez o tradicional pedido : - Doutor, e o dinheirinho para as passagens ? O candidato, com um sorriso aberto, pediu para a senhora chegar à calçada e apontou para a seção eleitoral, que ficava logo ali adiante, a um quarteirão da casa. - Dona fulana, a senhora vai votar ali, bem pertinho, naquele grupo escolar. O arremate pegou Geraldo Alckmin de surpresa : - Mas, doutor, nós votemo em Itajubá. Geraldo elegeu-se prefeito de Pindamonhangaba, em 1976, por uma diferença de 67 votos. Poderia ter mais uns votinhos se Itajubá fosse um sítio de Pinda e não a cidade mineira, que faz divisa com SP, onde morreu o ex-presidente da República Wenceslau Braz, aos 98 anos. Ganha Dilma, ganha Aécio Os cenários de vitória e derrota começam a ganhar corpo. A Consultoria Rosenberg Associados faz a previsão : "Só muita torcida contra pode impedir uma pessoa racional de perceber como Dilma é favorita". E bate forte : "Visto de hoje, o cenário mais provável é a continuidade da mediocridade, do descompromisso com a lógica, do mau humor prepotente do poste que se transformou em porrete contra o senso comum". Que linguagem desbocada para uma empresa que faz projeções políticas, hein ? E outra Consultoria, a Macrométrica, usando um método de análise organizado por Nate Silver, editor chefe do site "FiveThirtyEight", chega a outra conclusão. Usando os dados da última pesquisa do Ibope, a Consultoria diz que Aécio Neves conta com uma vantagem de 2 a 3,6 pontos percentuais sobre a presidente Dilma. E agora ? Agora é conferir a economia Este consultor não arreda pé de suas hipóteses. Se a inflação se mantiver sob controle, não afetando o bolso dos consumidores/eleitores, a geladeira continuará cheia, o coração agradecerá e a cabeça acabará decidindo a favor de quem proporciona o bolso cheio. A recíproca é verdadeira. Não acredito que a fumaça, mesmo forte, que sai dos fornos da Petrobras - CPIs, escândalos em série, malas cheias de dinheiro - seja capaz de afetar o quadro eleitoral. Claro, reforça os pontos de vista do eleitor que já tem decisão de votar contra a presidente Dilma. Mas não bate nas margens sociais, afeitas à equação BO+BA+CO+CA (bolso, barriga, coração, cabeça). E a economia ? Os indicadores mostram que a situação é de perigo. O varejo se queixa de grande retração. Mais de 60 mil trabalhadores do comércio varejista foram demitidos nos últimos meses. O setor do aço registra uma retração de mais de 30%. O setor automobilístico, apesar dos incentivos Federais e estaduais, também apresenta forte queda de vendas. A construção civil é um poço de queixas. E assim por diante. Mas o que mais toca de perto o eleitor das margens é a feirinha, o armazém da esquina, as gôndolas de alimentos nos supermercados das periferias. Aumentou o tomate, a cenoura, a alface ? Pumba, a cesta básica acusa o aumento. E lá vem xingamento. Mercado em ebulição A siderurgia brasileira está passando maus momentos. De janeiro a junho deste ano a produção mundial de aço bruto cresceu 2,5% na comparação com igual período do ano passado. Até o final de 2014 a previsão é de que 600 milhões de toneladas excedam a demanda, ainda lenta e distante dos níveis pré-crise mundial. Com siderúrgicas chinesas e europeias a todo vapor, o mercado brasileiro enfrenta dificuldades. Exportar deixa de ser uma opção. Sem solução no curto prazo Marco Polo de Mello Lopes, presidente-executivo do Instituto Aço Brasil, diz que a siderurgia brasileira está sendo corroída. "O mercado interno não cresce como esperado e ainda é bombardeado por importações". Não há solução para o aço excedente e, especialmente no Brasil, a alta carga tributária e custos elevados de energia elétrica, gás natural, mão de obra e câmbio desfavorável deterioram ainda mais a competitividade. Padilha subirá ? Uma questão recorrente em SP : por que Alexandre Padilha, o candidato do PT, não sobe nas pesquisas ? Porque a campanha de TV e rádio só vai começar no próximo dia 19. É o que dizem os petistas. O argumento é apenas razoável. O fato é que os setores médios paulistas expandem sua contrariedade em relação ao PT. Por isso, a rejeição à presidente Dilma ultrapassa os 35%. Esse é um dado da questão. Outro argumento é o de que as margens ainda não entraram no clima de campanha. Ou seja, mais adiante, empurrado por Lula, Padilha subirá, não a ponto de alcançar o nível histórico do PT, mas, ao menos, uns 20%. É a hipótese defendida por este consultor. Alckmin satisfeito Ao ver este consultor se aproximar, o governador Geraldo Alckmin brada alto a palavra-chave que usa em todos os nossos encontros : Po-ran-du-bas. O papo, muito agradável, reunia, ao lado do governador, o presidente do Instituto Aço Brasil (IABr), Benjamim Mário Baptista Filho ; o megaempresário Jorge Gerdau ; o ex-presidente da FIESP, Carlos Eduardo Moreira Ferreira, entre outros. Alckmin, feliz com os seus 54% de intenção de votos, contou causos engraçados da sua vida política, como o que abre esta coluna. Aécio no JN - 1 O senador Aécio Neves (PSDB/MG), primeiro presidenciável entrevistado pelo Jornal Nacional da Rede Globo, respondeu com segurança às perguntas de William Bonner e Patrícia Poeta, mesmo as mais delicadas, como a construção do aeroporto em terras que pertenciam à sua família em Cláudio, interior de Minas. Mas deixou no ar o futuro da economia. Sobre medidas impopulares, como corte de gastos e realinhamento de preços de combustíveis e de energia, garantiu apenas que tomará "medidas necessárias para retomar o crescimento". Quais ? Não detalhou. A menos que isto queira dizer um "tarifaço", palavra que não convém pronunciar antes de eleições. Aécio no JN - 2 Uma boa frase do candidato sobre corrupção : "Condenado não será tratado como herói, como foi no caso do PT, porque deseduca". Para os programas sociais, prometeu manter todos, "transformando-os para melhor". Funciona como um antídoto para beneficiados do Bolsa Família. E encerrou com a promessa de "um novo ciclo de desenvolvimento, com ética e eficiência". No fim, mandou recados para eleitores dos rincões do país, especialmente para o Nordeste, em que tem menos votos. Saldo : poderia ter aproveitado melhor a exposição do Jornal Nacional, caso fosse mais direto sobre seu programa de governo, especialmente na economia. Mas o formato da entrevista não permite voos longos. Campos subirá ? Esta é outra recorrente indagação. Resposta : sem dúvida. Mas alcançará o percentual que Marina Silva, sua candidata a vice-presidente da República, obteve em 2010 ? Eis o dilema. Marina foi o elemento novo que agitou a galera, particularmente os segmentos jovens. Este consultor acredita que ele poderá se situar em um patamar entre 15% a 20% dos votos, ajudando a campanha a entrar no segundo turno. Para tanto, precisa empolgar as galeras jovens, a partir do empurrão de Marina. E aumentar sua cota de votos no Nordeste, onde ainda não se tornou o chamariz da estação. Nessa região, Dilma ganha de galope. "Burrocracia" do bilhete único Você sabia que houve alteração para retirar o primeiro bilhete único e ainda procedimentos para sua renovação ? Pois é, a SPTRANS exige que cada usuário faça seu cadastramento, bastando que conte com essa batelada : computador, disponibilidade de internet, e-mail próprio, impressora e noções medianas de como usar tudo isso. A rota da burocracia abrange cadastro, importação da foto para montagem do formulário impresso, envio ao órgão competente, um posto "próximo" da residência do usuário para recebimento do bilhete único. Imagine-se um trabalhador que jamais teve intimidade com computador e periféricos. O que vai acontecer ? As empresas, que antes dispunham de um setor para providenciar essa batelada, passaram a recusar candidatos que não possuam o bilhete único. Sabem que terão problemas à frente, ou seja, um colaborador que dificilmente terá condições de conseguir atender às normas da SPTRANS. O empecilho provocará embaraços ao próprio pagamento do Vale Transporte. A Classe C irá ao paraíso ? Desse jeito, irá, sim, mas ao inferno. As pernas dos papéis E por falar em "burrocracia", vejam esta historinha (real) dos papéis que andam entre as instantes dos prédios públicos. O cidadão chega à repartição e pede para ver seu processo. Ouve : "Ah, doutor, tem uma pilha enorme na frente do processo do senhor. Vai demorar um tempão até ser despachado. Papel, doutor, não tem pernas". Agastado, o interlocutor reage : "E quanto o senhor quer para pôr dois pés nesse papel"? Tiro e queda. O adjutório (cinquentinha) fez o papel correr rapidinho. 70 anos de história A trajetória do Grupo Rodrimar, fundado em 1944, se confunde com o desenvolvimento do Porto de Santos - o maior da América Latina. Naquela época os irmãos Manoel Rodrigues e Nilo Rodrigues davam o primeiro passo rumo a uma história de sucesso na área de importação e exportação que completa 70 anos. A data será lembrada com uma grande festa na Sala São Paulo para convidados, no dia 21 de agosto. A Orquestra Filarmônica Bachiana, sob a regência do maestro João Carlos Martins, e a dupla Chitãozinho & Xororó serão as atrações da noite. Lições de marketing A) Pacote de macarrão O calcanhar de Aquiles dos candidatos é evitar serem flagrados em dissonância. Isso ocorre geralmente quando um candidato tenta mudar de identidade. O eleitor percebe quando a pessoa torna-se artificial, um mero produto de marketing. E candidato não pode ser trabalhado como se trabalha um sabonete, um pacote de macarrão. B) O segundo turno Costuma-se dizer que o segundo turno é outra campanha. Não o é. Na verdade, trata-se da continuidade da primeira, observando-se essas características. O tempo de programa eleitoral será o mesmo, dando assim chances para uma comparação mais exaustiva e atenta entre perfis e programas. Os 10 minutos que caberão aos dois candidatos serão suficientes para se ter uma avaliação mais completa dos ideários. É bem verdade que a semântica, a mensagem oral, o plano das ideias, deverão ser cobertos pela estética da TV - na estratégia do marketing de embalar os perfis com celofane mais colorido. Portanto, o marketing atuará como ator importante para "vender" os candidatos.
quarta-feira, 30 de julho de 2014

Porandubas nº 408

Tudo é nada Abro a coluna com uma parábola. "Há pessoas que não conseguem perceber o que se passa ao seu redor. Não vêem que não vêem, não sabem que não sabem". Eis o conto. Zé caiu em um poço e está a 10 metros de profundidade. Olhava para os céus e não viu o buraco. Desesperado, começou a escalar as paredes. Sobe um centímetro e escorrega. Passou o dia fazendo tentativas. As energias começaram a faltar. No dia seguinte, alguém que passava pelo lugar ouviu um barulho. Olhou para o fundo do poço. Enxergou o vulto de Zé. Correu e pegou uma corda. Lançou-a no buraco. Concentrado em seu trabalho, esbaforido, cansado, Zé não ouve o grito da pessoa : "pegue a corda, pegue a corda". Surdo, sem perceber a realidade, Zé continua a tarefa de escalar, sem sucesso, as paredes. O homem na beira do posso joga uma pedra. Zé sente a dor e olha para cima, irritado, sem compreender nada. Grita furioso : - O que você quer ? Não vê que estou ocupado ? O desconhecido se surpreende e volta a aconselhar : - Aí tem a corda, pegue-a, que eu puxo. Zé, mais irritado ainda, responde sem olhar para cima : - Não vê que estou ocupado, ó cara. Não tenho tempo para me preocupar com sua corda. E recomeça seu trabalho. Parábola : "Zé não vê que não vê, não sabe que não sabe". Reflita. O mundo está povoado por este tipo de Zé. Campanha morna A campanha ainda está morna. Os candidatos se mexem, tateando, caminhando aqui e ali nas ruas, mostrando receio de não serem bem recebidos. SP tem sido o território mais procurado por abrigar as maiores densidades eleitorais do país e a maior tuba de ressonância. Aécio Neves e Eduardo estão nas ruas. A presidente Dilma não tem o mesmo ritmo em função da liturgia de poder que tem de cumprir, ou seja, a agenda governamental. Mas, logo, logo, estará nas ruas acompanhada de Lula, como se espera. Fumaça no PT Ao que parece, as bandas de Lula e de Dilma ainda não se afinaram. Cada qual desejando ter mais força e poder na estrutura de campanha. Esse é mais um probleminha a ser vencido. O que se pode ver é uma divisão com teor de contundência maior que em campanhas passadas. Se a presidente exibisse índices mais fortes nas pesquisas, certamente o clima seria outro. As querelas internas no PT e entre o PT e partidos aliados podem prejudicar não apenas a candidata, mas os candidatos petistas nos Estados. A conferir. Padilha Quem mais sofre com essas querelas é Alexandre Padilha, que espera a vinda de Lula e Dilma para sua campanha. O candidato está ainda acanhado. Não se vêem grandes caminhadas, movimentação de rua, panfletagem, enfim, o barulho que se ouvia em campanhas passadas. O ritmo é lento. Padilha vai subir, claro, pois o eleitorado petista de carteirinha tem quatro ou cinco vezes mais votos que os atuais 4% que as pesquisas lhe dão. Este consultor chega admitir que ele terá cerca de 20% dos votos, mais adiante. A conferir. Alckmin, o favorito Geraldo Alckmin continua sendo o franco favorito para ser o vitorioso na Batalha de SP. Vamos à leitura : não se trata de um perfil carismático, denso, aliciador de votos. Trata-se de uma pessoa suave, sorridente, diplomata, educado. Isso é suficiente ? Não. Mas Alckmin tem o perfil que polariza com o PT, partido que sofre muito desgaste em SP. Quem quer votar contra o PT escolhe Alckmin ou uma terceira via, no caso, Paulo Skaf. Donde se conclui que as opções a estes candidatos ocorrem na esteira de uma rejeição ao PT. Urge lembrar que o PSDB sofre também o processo de corrosão de material. Skaf tem chances Paulo Skaf é um perfil aguerrido, determinado, lutador. Pode se beneficiar da rejeição ao PT e ao desgaste da floresta tucana em SP. Claro, precisa se fazer mais conhecido e gastar sola de sapato. Ou seja, descobrir o caminho das ruas. Terá o maior tempo de TV na programação eleitoral. Mas um bom programa de TV, sozinho, não ganha campanha. Ele pode ser a vitamina que o eleitorado procura contra a mesmice do PT e do PSDB, que sofrem a corrosão material. A banca banca as campanhas Essa do Santander de fazer cenários mostrando que eventual vitória da presidente Dilma implicaria refluxo na economia e temor dos investidores foi a maior bola fora desse início de jornada eleitoral. Ora, é sabido que a banca - expressão que se usa para abrigar o complexo bancário - tem bancado (com doações) as campanhas eleitorais. E, também ao que se sabe, um analista de um banco não emite interpretação para uso externo sem autorização de seus superiores. O espanhol Santander ensaia um escanteio. Rejeição tem cura ? A presidente Dilma tem cerca de 35% de rejeição. Trata-se de um índice na marca do pênalti. A pergunta : é possível diminuir essa mancha no perfil ? Resposta : sim. Como ? Usando de maneira mais intensa os eixos do marketing : a articulação com a sociedade organizada ; a mobilização das massas nas ruas, o que exige presença forte da candidata nas ruas ; comunicação intensa sobre feitos e ações do governo ; e visibilidade para certos valores : a modéstia (contra a arrogância), a simplicidade, a humildade, gestos simples. A campanha deste ano impregna-se do cheiro das ruas. Tipologia eleitoral Que tipos são os mais comuns em uma campanha ? 1. O continuísta - Candidato à reeleição, máquina a serviço da candidatura, cabos eleitorais multiplicados, esse tipo tem grandes vantagens sobre outros. Particularmente se construiu forte identidade junto à comunidade. Pontos fortes : ações e obras a mostrar. Pontos fracos : mesmice e eventuais denúncias de uso da máquina, etc. 2. O oposicionista - Deve encarnar situação de mudança, troca de peças velhas na máquina administrativa. Para ter sucesso, precisa captar espírito da comunidade, auscultar demandas, fazer um corpo a corpo, deixar-se mostrar, ganhar confiança do eleitor. Pontos fortes : alternativa à velha ordem ; encarnação do espírito do novo. Se for um perfil já conhecido, impregná-lo com o verniz da renovação. Pontos fracos : pouca visibilidade ; estruturas de apoio mais tênues. 3. A terceira via - O candidato da terceira via apresenta-se como perfil para quebrar a polarização entre situação e oposição. Para angariar apoio de todos os lados, carece organizar um discurso adequado às circunstâncias, ouvindo todos os segmentos, buscando uma linha intermediária. Precisa demonstrar que tem melhor programa do que os dois candidatos. Pontos fortes : bom senso, alternativa à polarização acirrada entre grupos, inovação. Pontos fracos : falta de apoios das estruturas. O aeroporto de Claudio A construção do aeroporto na cidade de Claudio, próximo à fazenda de Aécio Neves, não caiu bem em sua imagem. Mesmo com todas as explicações - construção de aeroportos no eixo de 80 km das cidades - o impacto tem sido forte na campanha tucana. A versão que se dá - de uso indébito de recursos públicos - acaba ganhando ênfase. E quanto mais polêmica se forma, mais fumaça se expande nos ares. O aeroporto de Cuba, com financiamento brasileiro, teria agora seu contraponto. Ingratidão "Ingratidão na política é um dos vícios mais degradantes. Os que a praticam podem, até, tentar justificá-la perante os injustiçados. Mas serão, inapelavelmente, jogados no lamaçal onde se escondem os piores elementos da espécie humana". (Barão do Rio Branco) E a água em SP, hein ? O MPF em SP recomendou que o governo de SP apresente urgente projeto de racionamento de águas nas áreas atendidas pelo Sistema Cantareira. Objetivo : evitar um colapso do sistema que abastece 45% da região. Pérolas do Enem -A fé é uma graça através da qual podemos ver o que não vemos. - Os estuários e os deltas foram os primitivos habitantes da Mesopotâmia. - O objetivo da Sociedade Anônima é ter muitas fábricas desconhecidas. - A Previdência Social assegura o direito à enfermidade coletiva. - O ateísmo é uma religião anônima. - A respiração anaeróbica é a respiração sem ar que não deve passar de três minutos. - O calor é a quantidade de calorias armazenadas numa unidade de tempo. - Antes de ser criada a Justiça, todo mundo era injusto. - Caráter sexual secundário são as modificações morfológicas sofridas por um indivíduo após manter relações sexuais. Grandes páginas da história De Gaulle tinha exata noção de que ao político, como ao artista, é necessário o dom moldado pelo ofício. Cercava-se de cuidados com a expressão, ensinando : "os maiores medem cuidadosamente as suas intervenções. Fazem delas uma arte". Tempos grandiosos aqueles em que as plateias se encantavam com a arte dos grandes mestres da palavra. As sentenças continham boas lições e o poder de mobilizar e atrair a atenção das massas. "Não tenho nada a oferecer-vos senão sangue, sacrifício, suor e lágrimas", declamava Churchill para ingleses inebriados com o fervor que o primeiro ministro imprimia à convocação de guerra. "Não pergunte o que seu país pode fazer por você, mas o que você pode fazer por seu país", proclamava o presidente John Kennedy em seu discurso de posse, elevando o orgulho norte-americano. Pobres páginas da história Pouco a pouco, a névoa do tempo tornou esquecidas as mais belas páginas da história. A cortina desceu sobre os palcos do esplendor e a era dos tribunos foi fechando portas, sob o eco da locução de Nietzsche no cume do penhasco nos Alpes de Engadine : "vejo subir a preamar do niilismo". A política apequenou-se. Os atores despiram-se dos mantos litúrgicos que os cobriam de reverência. E assim, os mais altos ideais, torpedeados pelas emboscadas da modernidade política, foram suplantados por interesses mercantilistas. A baixaria toma conta A baixeza se expandiu. Governantes de Nações do primeiro mundo vêem suas imagens embaladas em escândalos e, pasmem, sob acusações de envolvimento em casos sexuais com menores e garotas de programa. É o que se viu com o ex-primeiro ministro Berlusconi, da Itália. Correspondências devassadas pelo WikiLeaks mostram como as potências consideram parceiros e adversários. A uma pauta de preconceitos somam-se digressões sobre o caráter (criticado) de figuras públicas. Por aqui, a corrosão também é intensa. O nosso sistema político, no fluxo da crise que fere a democracia representativa em todo o mundo, é balizado por um conjunto de elementos negativos : fragmentação partidária, desmotivação das bases, pasteurização ideológica, perda de força das casas congressuais e supervalorização dos Executivos. O campo da expressão mostra o esburacado estado da arte política. Frases dos nossos políticos O ex-governador Sérgio Cabral chegou a dizer em tempos idos : "Quem aqui não teve uma namoradinha que precisou abortar ?". Foi numa peroração para cerca de 400 empresários. Lula, em momento de descontração, chamou Pelotas/ES, de "exportadora de veado" ; Maluf, que nunca se livrou do indefectível "estupra, mas não mata" ; Marta Suplicy, quando ministra do turismo, não se conteve e, ante o caos aéreo, saiu-se com o "relaxa e goza" ; e o ex-ministro Ciro Gomes é recordista de frases de péssimo gosto : "Fortaleza virou um puteiro a céu aberto" (criticando a administração petista em 2008). Lições para as campanhas  Hoje, a coluna substitui o conselho aos políticos por pequenas lições de marketing. Questão recorrente nos questionamentos de campanha. Que fatores a influenciam ? Eis alguns : - dinheiro - quando o bolso está vazio, a propensão é votar em candidato da oposição ; a recíproca é verdadeira ; - mobilização nas ruas - o candidato precisa se deixar ver, conhecer, tomar um banho de rua ; - maneira de apresentação dos candidatos - estética - alta prioridade. O primeiro sinal percebido pela cognição é a imagem que o candidato transmite. Sério, alegre, improvisado, informal, formal, artificial, desleixado, mal vestido, empetecado, cara de verdadeiro, cara de mentiroso, falso, atraente, simpático, nervoso, calmo, etc. - programas de governo - propostas viáveis/inviáveis, impactantes ou óbvias - alta prioridade ; - patrocinadores/lideranças políticas - dependendo da região, a influência poderá ser muito alta ou tênue ; - casos escabrosos descobertos no meio da campanha - desastrosos, podem queimar as possibilidades de um candidato ; - organizações da sociedade civil - importantes laços com grupos e comunidades ; - identificação com esportes/futebol - influência relativa ; torcidas a favor podem receber o contraponto de torcidas contrárias ; - apoio de artistas/celebridades - depende do artista e da região. Influência junto ao eleitorado mais inculto.