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Porandubas Políticas

Por dentro da política.

Gaudêncio Torquato
quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Porandubas nº 467

Abro a coluna com uma historinha do ES. Robô do prefeito ? Em tempos idos, na Câmara Municipal de Mimoso do Sul/ES, Luiz Carlos da Silva, líder do PMDB, discutia com Jaime da Rocha Nogueira, líder do PDS, por causa do prefeito Pedro Costa, também do PDS. Luiz Carlos atacava o líder do prefeito : - V. Exa. é um teleguiado, sem personalidade. Só cumpre ordens. - Sou líder. E o líder tem de dizer o que o Executivo pensa. - Critico o comportamento de V. Exa., por ser um homem de recados, robô do prefeito. - Senhor vereador, até agora discutia com V. Exa. porque não me sentia agredido. Agora, V. Exa. vai ter de provar a esta Casa quando é que eu roubei o prefeito. A sessão acabou em tumulto ! A onda cresce A cada semana, a operação Lava Jato vai jogando sua onda sobre mais figuras de relevo. A semana começa com a nova fase da operação Zelotes, essa que desvenda denúncias nas proximidades do CARF, o conselho que julga recursos na Receita Federal. Chamaram atenção a busca e a apreensão de documentos na empresa de Luís Cláudio Lula da Silva, o filho de Lula que tem uma empresa de marketing esportivo. Ou seja, a onda bate nos costados da família do ex-presidente. Ao que se lê, ele continua a execrar esse tipo de ação, considerando-a exagerada. Significa intuir, como lembra Sérgio Moro, que ninguém está imune aos atos jurídicos expedidos pelo aparato da Justiça. A juíza Federal Célia Regina Ody Bernardes foi quem aceitou os argumentos do MPF. Quem também prestou depoimento foi o ex-ministro Gilberto Carvalho sobre o affaire da compra de MPs para favorecer setor automotivo. As instituições funcionam a pleno vapor. Dilma x Lula São conhecidas as manifestações da presidente Dilma sobre eventuais dissensões que teria com Lula, seu mentor. Nunca ninguém será capaz de afastá-los por meio de insinuações malévolas. É o que se depreende da recorrente expressão presidencial. Agora mesmo, ela fez homenagem a Lula por seu 70º aniversário. Mas parece que as coisas não caminham bem entre os dois polos de poder. Luiz Inácio gostaria que a crise fosse enfrentada com menos rigor ao bolso das margens carentes. Para tanto, gostaria de que o ministério da Fazenda fosse gerido por um perfil mais afeito a uma política compensatória e de acesso ao consumo. Joaquim Levy é o oposto dessa receita. Os dois estariam em campos opostos nessa matéria. E também na área do controle da PF. Zelotes A apreensão de documentos pela PF no escritório do filho Luís Cláudio é a pimenta malagueta que queima a língua do ex-presidente Lula. Mas o fato é que as instituições estão funcionando, apesar do questionamento de alguns : "desse jeito" ? Cenários do amanhã Há quem aconselhe Lula a colocar logo seu bloco na rua. Assim, ele teria condições de correr o país desfraldando a bandeira de uma pré-candidatura. Inconvenientes : dá a cara para bater antes do tempo ; a superexposição pode lhe trazer mais dissabores na corrente de uma economia desarrumada e sem perspectivas de melhoria no curto prazo ; que discurso poderia expressar ? Favorável ao governo ? Seria pior a emenda que o soneto. Contra o governo ? Ih, hipótese inimaginável. Lula só tem uma alternativa : esperar que o tempo lhe conceda algum conforto. PT saudações ? Para o PT renascer das cinzas, melhor seria que Lula fosse candidato. Mesmo com uma derrota, Lula ainda possui estoque (em baixa) de carisma ; consegue animar parte das bases desmotivadas ; é o mais conhecido líder nacional. A candidatura de Luiz Inácio poderia refazer o partido, a partir de um número menor de prefeitos eleitos em 2016. Mas há este dado : Lula tem hoje a maior rejeição, segundo o IBOPE (55%). E Dilma sofre a rejeição de 70% dos brasileiros. Consolo : os contendores de Lula estão também acima dos 50% de rejeição. Wagner Jaques Wagner faz o papel de bombeiro, aquele que era exercido pelo vice-presidente Michel Temer quando detinha a missão da articulação política. Fala com todos, da esquerda à direita. O ex-governador da BA tem perfil agregador. Seria o candidato in pectore do ex-presidente Lula, em 2018, caso ele não veja condições para sua própria candidatura. Manente Alex Manente, o jovem deputado Federal do PPS/SP, lidera a corrida para a prefeitura de São Bernardo do Campo. O segundo lugar é do deputado estadual Orlando Morondo, do PSDB, que luta pelo apoio do governador Geraldo Alckmin. Corrida paulista Marta Suplicy deve ser a candidata do PMDB à prefeitura de SP. Conserva um bom recall nas camadas periféricas, que aprovaram com fervor a criação dos CEUS, os centros educacionais. Gabriel Chalita terá dificuldades para emplacar seu nome, pois é muito ligado ao prefeito Fernando Haddad. Aliás, a tendência do PMDB é romper com o prefeito Haddad. O diretório municipal é presidido por Chalita, secretário da Educação do município. Que confa, hein ? Pelo PSDB, João Dória faz um mutirão pelos diretórios da periferia, em aplicada lição de casa. Pesquisas internas mostram que já ultrapassa o pré-candidato, vereador Andrea Matarazzo. Marta e Russomano Marta tem um bom recall. Bem como Celso Russomano. Ambos, porém, são muito rejeitados pelas áreas centrais, onde pontificam as classes médias. Marta não consegue ainda extirpar de sua identidade a marca petista. E Russomano não consegue limpar o borrão populista e demagógico. Se forem candidatos, entrarão com índices respeitáveis na campanha. Mas a projeção é a de que cairão, ao final da reta. A conferir. Campanhas pobres A campanha municipal de 2016 será uma das mais modestas das últimas décadas. Os candidatos que simbolizam a assepsia política deverão ser favoritos. O povo quer mudanças. E está à procura de perfis sérios, não comprometidos com as velhas práticas, com experiência administrativa (não necessariamente na política), vida pessoal ancorada na retidão e no compromisso. Quem vestir esse figurino, pode se apresentar. Atenção, pré-candidatos O escopo do marketing político, ao longo da história, tem se mantido praticamente o mesmo. O que muda são as abordagens e as ferramentas tecnológicas. Atentem. No ano 64 a.C., Quinto Túlio Cícero enviava ao irmão, o grande tribuno e advogado Cícero - protagonista de episódios marcantes por ocasião do fim do sistema republicano e implantação do Império Romano - uma carta que considero o primeiro manual organizado de marketing eleitoral da história. Ali, Quinto Túlio orientava Cícero sobre comportamentos, atitudes, ações e programa de governo para o consulado, que era o pleito disputado, sem esquecer as abordagens psicológicas do discurso, como a lembrança sobre a esperança, este valor tão "marketizado" no Brasil e que se transformou no eixo central do discurso da era lulista. Dizia ele : "três são as coisas que levam os homens a se sentir cativados e dispostos a dar o apoio eleitoral : um favor, uma esperança ou a simpatia espontânea". Quem, quem, quem ? Pergunta recorrente : qual é o perfil que incorpora o sentido do novo, o avanço, a modernização de costumes e práticas da política ? Quem souber, aponte. Os radicais livres, na ponta esquerda do arco ideológico, não têm votos. Marina segura a barra ? Fala-se muito na volta por cima de Marina Silva, que poderia vestir o manto da pureza ética. Marina, porém, transmite a imagem de fragilidade. Sem punch para levar adiante uma campanha pesada, contundente, cheia de curvas e percalços. Teria pouca força para segurar a barra de uma campanha presidencial. Mesmo dispondo da ajuda de amigos(as) poderosos(as). Provisório e permanente A cultura do provisório, por estas plagas, acaba ganhando vestes permanentes. Impostos provisórios tendem a se tornar permanentes. Agora, são as prisões. Uma prisão provisória, feita para tomar depoimentos e evitar influência dos indiciados nas investigações, também ganha ares de permanência. Quem fez esse alerta foi nada mais nada menos que FHC, na entrevista que deu no Roda Viva da TV Cultura desta segunda-feira. Grandes empresários estão presos há mais de 120 dias. Macri pode ganhar ? Se Maurício Macri ganhar o segundo turno na Argentina, a virada da oposição se tornará um marco no processo eleitoral do continente. Macri promete abrir a economia. O governista Daniel Scioli pode até ganhar o segundo turno do dia 22/11. Mas o eleitor, aqui e alhures, está mostrando que o voto sai do coração para subir à cabeça. A racionalidade, o exame crítico, a avaliação, o bom senso começam a balizar a decisão do eleitor em todos os espaços. 3,5% de queda Analistas e consultores projetam queda de até 3,5% no PIB em 2016. Quem ainda diz que o ano eleitoral será melhor que o atual ? O fundo do poço ainda não chegou. Cunha Nos últimos dias, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, ganhou algum fôlego. Enquanto o STF não indiciá-lo, conduzirá uma densa agenda. E mais : não está fora de tom a projeção de que o Conselho de Ética da Câmara entre em ritmo de tartaruga para analisar o pedido de um grupo de parlamentares para tirá-lo da cadeira presidencial. Propaganda negativa A revolução francesa de 1789 pode ser considerada o marco da propaganda agressiva nos termos em que hoje se apresenta. Ali, os jacobinos, insuflados por Robespierre, produziram um manual de combate político, recheado de injúrias, calúnias, gracejos e pilhérias que acendiam os instintos mais primitivos das multidões. Na atualidade, é a nação norte-americana que detém a referência maior da propaganda agressiva, mola da campanha negativa. Este formato, cognominado de mudslinging, apresenta efeitos positivos e negativos. No contexto dos dois grandes partidos que se revezam no poder - democrata e republicano -, diferenças entre perfis e programas são mais nítidas e a polarização sustentada por campanhas combativas ajuda a sociedade a salvaguardar os valores que a guiam, como o amor à verdade, a defesa dos direitos individuais e sociais, a liberdade de expressão, entre outros. Nem sempre a estratégia de bater no adversário gera eficácia. Historinha do PI fechando a coluna Dois vereadores da Arena de Parnaíba/PI. Um, da Arena de Petrônio Portela, o outro da Arena de Alberto Silva. Inimigos políticos. Um, dentista, pôs os dentes na boca do outro. Na primeira sessão, os dois brigaram : - V. Exa. é um desonesto. - Desonesto é você, filho de uma... Devolva meu dente. Pois fui eu que pus. - Eu paguei, seu sacana. - E daí que pagou ? Falar mal de mim, até pode. Com meu dente, não. Partiu pra cima. E arrancou os dentes. Sem anestesia.
quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Porandubas nº 466

O aperitivo inicial vem do PR. Conversa de jardim Manuel Ribas, interventor no PR (1932/1935), depois governador (1935/1937), despachava no palácio, mas gostava de morar em sua casa. Bem cedinho, chega um rapaz e encontra o jardineiro regando o jardim : - Seu Ribas está ? Sou filho de um grande amigo dele. Meu pai me mandou pedir um emprego a ele. Eu podia falar com ele ? - Poder, pode. Mas, e se ele não lhe arrumar o emprego ? - Bem, meu pai me disse que, se ele não arranjasse o emprego, eu mandasse ele à merda. - Olhe, rapaz, passe às quatro da tarde lá no palácio, que é a hora das audiências, e você fala com ele. Às quatro horas, o rapaz estava lá. Deu o nome, esperou, esperou. No salão comprido, sentado atrás da mesa, o jardineiro. Ou seja, o governador. O rapaz ficou branco de surpresa. - O que é que você quer mesmo ? Repetiu a história. "Meu pai me mandou pedir um emprego ao senhor". - E se eu não arranjar o emprego ? - Então, seu Ribas, fica valendo aquela nossa conversa de hoje de manhã, lá no jardim. Troco De Dilma sobre Eduardo Cunha : "lamento que seja um brasileiro" (o caso das contas do presidente da Câmara na Suíça). De Cunha dando o troco : "lamento que seja com o governo brasileiro o maior escândalo de corrupção do mundo". Turbulências A paisagem desta semana aponta para o incremento das turbulências. E os sinais são dados por um conjunto de fatores : 1. As denúncias contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, agora com informações sobre montantes depositados e movimentação de contas, tornam sua situação bastante complicada. Se não tiver nenhum trunfo nas mãos, será tarefa quase impossível se manter no comando da Câmara. 2. Denúncias sobre recursos destinados ao "palestrante" Lula pela Odebrecht e também envolvendo dinheiro entregue a seu filho jogam mais fumaça no território familiar do ex-presidente. 3. Críticas do PT ao ministro Joaquim Levy, que a presidente Dilma garante que não se afastará do governo, deixam-no contrariado e expandem as especulações sobre sua saída. A alternativa de Cunha Restam ao deputado Eduardo Cunha as seguintes alternativas : a. Acolher o mais recente pedido de impeachment, feito pelos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal, agora contendo o argumento de "pedaladas fiscais" cometidas pelo governo Dilma em 2015. Como se sabe, Cunha sempre defendeu a tese de que as pedaladas como argumento para impeachment devem ocorrer no mandato vigente e não no mandato anterior ; b. Negar os pedidos de impeachment que estão em sua gaveta e dar por encerrada essa questão. Para as duas alternativas, quer mais tempo. Ocorre que não pode demorar muito porque o STF pode, a qualquer hora, indiciá-lo. Nessa condição, terá de renunciar à presidência da Câmara. E o Conselho de Ética da Casa se sentirá moralmente pressionado a afastá-lo da presidência. Mas Eduardo Cunha garante que não renunciará. Portas da frente e dos fundos A observação recorrente na esfera política é a de que a aceitação do impeachment por Eduardo Cunha lhe abriria a porta da frente para deixar a presidência da Câmara. Ou seja, mesmo deixando o comando, seria aplaudido por parcela da sociedade. Se não acolher e arquivar os pedidos, estaria saindo da presidência pela porta dos fundos. O que seria mais conveniente para ele ? Qual a decisão do Conselho de Ética ? Seu presidente garante que a tramitação do pedido de afastamento do presidente, feito por 46 parlamentares, será rápida. Cunha, porém, tem força para protelar o julgamento daquela Comissão. A conferir. Quem, quem ? No caso de afastamento, assumirá o vice-presidente, o deputado Waldir Maranhão, do PP do MA. Trata-se de um parlamentar desconhecido. Que, em 30 dias, organizará novas eleições. Quem tem condições e votos para assumir a presidência ? O líder Leonardo Picciani tem força para se eleger ? A mais provável hipótese é a de que lhe faltem apoios. Trata-se de um líder sem grande experiência, só recentemente alçado à condição de estrela, mesmo assim uma estrela sem brilho. Ocorre que os nomes do PMDB com experiência e história, como o deputado pernambucano Jarbas Vasconcelos, tem prestígio, mas não votos. Outros nomes cotados são : Osmar Serráglio, do PR; Lelo Coimbra, do ES; Osmar Terra, do RS; e Edinho Silva, de SP. Miro Teixeira é o mais longevo. Está agora na Rede de Sustentabilidade, de Marina. Teria cacife ? Fogueira cresce O ex-presidente Luis Inácio vê seu nome se aproximar do meio da fogueira. Nestes últimos dias, apareceu a informação : a Odebrecht lhe pagou R$ 4 milhões para fazer palestras. E mais : seu filho, "Lulinha", teria recebido R$ 2 milhões de Fernando Baiano. Fábio Luis está processando o Globo por esta informação. Já outro filho, Luis Claudio, teria recebido pagamento de uma das consultorias suspeitas de atuar pela MP 471. Ou é muita fofoca da mídia, como desabafa o ex-presidente, ou é informação que precisa ser investigada. Nesse ínterim, Sérgio Moro abriu a terceira ação penal contra o maior empresário brasileiro, Marcelo Odebrecht, detido há quatro meses. Classe C Esse analista trabalha com a hipótese de que impeachment da presidente é coisa para as calendas. No caso das pedaladas, não acredita que seja feito um julgamento que possa apeá-la do poder. Se passasse pela Câmara, não passaria pelo Senado. Já no caso do TSE, haveria recursos junto ao próprio Tribunal e, depois, a querela subiria ao STF, onde recursos e embargos levariam a questão para longe. A hipótese que poderia apressar decisões em todas as instâncias seria uma intensa e gigantesca movimentação de ruas. Que puxasse os indignados da classe C, que começam a perder os ganhos obtidos na era Lula, graças ao cobertor estendido pelos programas sociais. VPR Quem conversa com o vice-presidente Michel Temer distingue uma pessoa que observa os fatos, sob todos os ângulos ; ouve mais do que fala ; pondera mais do que acende discussões ; quer ajudar o governo naquilo que possível. Mostra-se disposto a usar suas habilidades de articulador para amainar situações e apaziguar espíritos. Reeleição Sempre que se fala em reeleição, puxa-se o exemplo dos Estados Unidos. Ora, lá, o presidente Roosevelt permaneceu por quase quatro períodos (1933-1945, vindo a falecer ao correr do último) seguidos na presidência. Quando foi escrita, a Constituição norte-americana não restringia mandatos consecutivos. Acontece que os norte-americanos se unem em tempos de crise. Depois da recessão de 1929, elegeram Roosevelt, dando-lhe, depois, mais três mandatos. Após a 2ª Guerra, restringiram a reeleição a apenas um segundo governo, na crença de que o excesso de poder dos governantes é prejudicial. E aqui surgem as diferenças. A força do Estado Nos Estados Unidos, o império da lei funciona. Direitos são respeitados. Aqui, nem sempre. Os tribunais fazem permanente interpretação da legislação. Mais que isso, a força da sociedade é extraordinária, agrupando associações de todos os tipos, que fiscalizam, cobram e diminuem o poder de influência do governo sobre a vida das pessoas. A pujança social é um freio a qualquer iniciativa de totalitarismo. Por aqui o Estado tem a força para expandir a sua sombra deletéria. E é nela que a reeleição se refugia, escondendo um corpo esculpido em mazelas. Financiamento público É ingênuo imaginar que campanha financiada com dinheiro público elimina o aporte de recursos privados e outros meios transferidos ilegalmente para candidaturas majoritárias e proporcionais. Nos EUA, que abrigam eficazes experimentos democráticos, os dois sistemas coexistem, de forma harmônica, podendo os candidatos optar por um deles após avaliarem seu potencial. John McCain preferiu o financiamento público, que lhe permitiu receber US$ 84 milhões, mas Obama, enxergando longe, rejeitou o limite imposto pela lei, objetivando maximizar o potencial da internet. Angariou cerca de US$ 600 milhões, mobilizando milhões de eleitores que agiram como doadores e cabos eleitorais. A veiculação eletrônica contribuiu de maneira significativa para diminuir a influência dos grupos de interesse que circundam a política norte-americana. Mas os lobbies dos grandes grupos - indústria de armamento, fumo, bebidas - são os grandes financiadores de candidatos. Exercício de sedução A presidente é o alvo de um intenso tiroteio social, não apenas midiático (como dizem Lula e outros petistas), bastando ver os míseros 8% da aprovação popular que detém. O discurso de defesa será confrontado com a realidade. A política, como exercício de sedução, será testada. Para cooptar as massas, os atores políticos, principalmente os carismáticos, costumam vestir o manto dos heróis. Lula, por exemplo. O que procura oferecer ? Esperança. Ora, mas a esperança que ele vendeu no passado foi consumida pela dura realidade desses tempos de economia em recessão. Falta grana no bolso para encher a geladeira, pagar o carro, as prestações do fogão novo. O instinto de sobrevivência e o instinto nutritivo, da lição de Pavlov, estão ameaçados. Lula, mesmo querendo parecer um "deus de plantão", poderá cair das nuvens. Subterfúgios, adjetivos, acusações fortes e promessas de um mundo melhor já não terão o efeito que causavam há 10, 15 anos.
quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Porandubas nº 465

Abro a coluna com JK Anos de chumbo. Tempos difíceis, época braba. Falar em Juscelino era, no mínimo, pecado mortal. Mudança das placas dos carros, as chamadas alfanuméricas. A Câmara Municipal de Diamantina oficia ao Contran solicitando as letras JK para as placas dos carros do município, "como uma forma de homenagear o grande estadista John Kennedy". O Contran não atende. Um conterrâneo de Juscelino desabafa : - Esse pessoal do Conselho deve ser republicano, eleitor do Nixon. (Historinha de Zé Abelha) O ciclo da razão O Brasil começa a deixar para trás o ciclo da emoção. A sociedade toma consciência de sua força, da capacidade que tem para mudar, pressionar e agir. Estamos abrindo o ciclo da autogestão técnica. Trata-se de uma aculturação lenta, porém firme, no sentido do predomínio da razão sobre a emoção. O crescimento das cidades e, por consequência, as crescentes demandas sociais ; o surto vertiginoso do discurso crítico, revigorado por pautas mais investigativas e denunciadoras da mídia nacional ; o sentimento de impunidade que gera, por todos os lados, movimentos de revolta e indignação ; e, sobretudo, a extraordinária organicidade social, que aparece na multiplicação das entidades intermediárias, hoje um poderoso foco de pressão sobre o poder público - formam, por assim dizer, a base do processo de mudanças em curso. Teori dá a prática Pois é, de Teori vem a prática para a liturgia do impeachment. Ao conceder a liminar a um recurso impetrado por deputados governistas invalidando o rito definido pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha, para a instalação de um processo de impeachment da presidente Dilma, Teori Zavascki, considerado um ministro garantista (ou seja, que decide rigidamente pela norma constitucional), dá um novo rumo ao imbróglio que mobiliza forças situacionistas e oposicionistas no Congresso. As oposições contavam com uma reclamação em plenário contra o arquivamento de um pedido de impeachment, que seria o rito definido por Cunha. A votação seria por maioria simples. Lei de 1950 Pela liminar de Zavascki (que foi acompanhado pela ministra Rosa Weber em mais duas liminares), um eventual pedido de impeachment deve ser julgado de acordo com a lei 1.079, de 1950, que não prevê a possibilidade de recurso ao plenário caso o pedido de impeachment seja negado. O processo só terá seguimento caso Cunha dê sequência a um dos pedidos de impeachment. A liminar carece ser endossada pelo Plenário. As oposições questionam sob o argumento de que nada impede que o presidente da Câmara aceite ou recuse pedidos de impeachment. Daí a decisão de solicitar rápido pronunciamento do Plenário. A visão de Celso Antônio Celso Antônio Bandeira de Mello é um dos mais renomados juristas brasileiros. Professor de Direito Constitucional, é uma referência no Direito, tendo sido professor de ministros, desembargadores e juízes espalhados por todo o território. Ele e o professor Fábio Comparato dizem que não se pode pedir impeachment com base em pedaladas fiscais. Porque estas exigem apenas maioria simples na Câmara, ao passo que impeachment requer quórum qualificado (dois terços da Câmara ou 342 votos). "São duas coisas completamente diferentes. Qualquer um vê isso, não é preciso muita lucidez para perceber que o que está acontecendo não passa de uma armação ridícula de quem quer ganhar 'no tapetão', como se diz no futebol", argumenta Bandeira de Mello. Julgar antes É viável antecipar pedidos de impeachment enquanto as tais pedaladas fiscais não forem julgadas pelo Congresso ? Celso Antônio e Fábio Konder Comparato argumentam que, para ter efeito, a reprovação do balanço pelo TCU precisa ser analisada pelo Congresso, que pode ou não acatar o entendimento fixado pelo tribunal. Mesmo se houver recusa das contas por deputados e senadores, tal recusa não caracterizaria crime de responsabilidade para justificar o impedimento, dizem eles. O TCU é um órgão de assessoramento ao Congresso e, como tal, apresenta indicações e avaliações das contas para uma decisão pelo Parlamento. Cunha no cunha As liminares têm o efeito de uma cunha na estratégia de Cunha. Ele imaginava dar as cartas nesse processo. Agora, suas cartas precisarão obedecer aos ditames ditados pelo Supremo, mesmo que a interpretação ainda esteja sujeita ao voto do Plenário da Corte. O presidente da Câmara, a cada dia mais acuado, deverá buscar outros modos de ação, que alguns enxergam como "vingança", "retaliação" à Dilma. O que faz uma fera acuada ? Parte para cima de inimigos. Inspira-se na síndrome do touro : pensa com o coração e arremete com a cabeça. O poder é como água 1945. O Brasil inaugura a redemocratização. Hermes Lima, fundador da UDN, deputado constituinte, ex-presidente do STF, foi ao Nordeste conseguir apoio de democratas ilustres para fundar outro partido, o Partido Socialista Brasileiro. Em João Pessoa, procurou Luís de Oliveira : - Luís, o socialismo é como aqueles gramados dos castelos da Inglaterra. Cada geração dá por eles um pouco de si. Um jardineiro planta, o filho cuida, o neto poda. E vai assim, de geração em geração, até que, um século depois, torna-se o que é. - Doutor Hermes, me desculpe, mas não vou entrar não. Gosto muito do socialismo, mas vai demorar muito. Eu quero é o poder. E o poder é como água. A gente tem que beber na hora. Novembro será agosto ? A previsão de muitos analistas é de que o novembro poderá ser o agosto convulsivo do agravamento da crise. Os meados do próximo mês abrem perspectivas de aumento das tensões, com expansão do desemprego, alta da inflação, menos dinheiro no bolso das margens, indignação social subindo alguns graus. Economistas acham que o pior ainda está por vir. Se a presidente atravessar novembro incólume ganhará fôlego para entrar em um dezembro menos desastroso. Mas é preciso colocar no tabuleiro a pedra do imponderável. Até quando Cunha resistirá ? O presidente da Câmara não é um novato em matéria de emboscada política, articulação, estratégia de sobrevivência. Fará tudo e um pouco mais para esticar sua sobrevida. Até quando ? Até quando houver manifestação incisiva da Corte Suprema sobre sua situação. Provas documentais contundentes e que não permitam refutação serão necessárias para um posicionamento decisivo do STF. Teremos o recesso de fim de ano e férias prolongadas do Congresso. Se Cunha atravessar novembro na presidência da Câmara, é provável que passe o Natal na cadeira de presidente da Câmara. PSB na oposição Cristaliza-se a tendência de o PSB passar ao terreno da oposição formal ao governo. Mostra-se crítico à maneira como o país é conduzido e começa a fazer um contundente discurso à política econômica. PSB se prepara para engatar o trem rumo aos anos eleitorais de 2016 e 2018. CIDE aumenta Ante a possibilidade de não contar com a CPMF, o governo cogita aumentar a CIDE sobre combustíveis ainda este ano. A inflação deve avançar mais ainda com essa decisão. A perspectiva é a de chegar ao final do ano beirando os 11%. Dilma segura No Senado, as coisas não são tão ruins para a presidente Dilma quanto na Câmara. Daí a segurança (relativa) da mandatária sobre o apoio que possui na Câmara Alta. Um processo de impeachment não teria a maioria dos senadores. Uma sessão do Congresso com esta finalidade mostraria uma divisão de forças. O PMDB da Câmara garante que conseguiu melhorar o quórum de Dilma na Casa. Será ? A conferir. O silêncio de Michel O VPR, Michel Temer, recolhe-se ao mais profundo silêncio. Que diz muita coisa. O silêncio de quem está disposto a ouvir e cansado de falar. O vice-presidente vê que intensa peroração - de aconselhamento, de alerta, de avisos - não foi bem ouvida. E se ouvida, não provocou reação nos interlocutores. Michel está ciente de seu papel. Prontifica-se a ajudar aqueles que querem ajuda. Oposições sem discurso As oposições ainda não encontraram o eixo de seu discurso. Tirar Dilma por ter cometido pedaladas fiscais não melhora sua imagem. Afinal, o que pregam as oposições em matéria de política econômica, política social em conjuntura de crise, programas para a infraestrutura, etc. Qual é o projeto das oposições para o país ? A agenda Brasil Renan Calheiros elencou um conjunto de projetos que tramitam no Senado e os inseriu na Agenda Brasil. A intenção do presidente do Senado é a de propor saídas para a crise. Mas a Agenda está patinando no meio das curvas que a conjuntura dita nesse momento. Está sendo difícil fazer avançar o programa de audiências e debates. Movimentos dispersos Os movimentos sociais apresentaram-se como as alavancas da sociedade. Desde as grandes mobilizações de 2013, passaram a ser referência da organicidade social, traduzindo demandas, exprimindo a indignação contra a velha política. Volta-se a ter dúvida sobre sua força. Os movimentos estão dispersos, as entidades envolvem-se em uma briga de egos e já não se tem tanta certeza de que reúnem condições de fazer pressão sobre o Parlamento. ONGs Há cerca de 500 mil ONGs no país. Que refletem a ocupação do vazio gerado pelo distanciamento entre a esfera política e o universo social. Indicariam, ainda, nossa inserção no terreno da democracia participativa. Tendência que se expande no mundo ao sabor da crise que solapa a democracia representativa. Municípios de pires na mão Os 5.565 municípios brasileiros atravessam seus anos de vacas magras. A campanha de 2016 será a mais enxuta e desprovida de recursos dos últimos tempos. Os prefeitos andam como Dândis na escuridão. Não dispõem de verbas nem para tocar as ações rotineiras das municipalidades. Sob essa sombria perspectiva, ocorrerão as eleições de 2016. Com muita derrota de candidatos à reeleição. Queda do varejo Mais uma indicação de retração na economia. O comércio varejista do Estado de SP registrou queda real de 6,3% no faturamento em julho deste ano, em relação ao mesmo mês de 2014. No total, o faturamento do setor chegou a R$ 42,8 bilhões, R$ 2,8 bilhões a menos do que o mesmo período do ano passado. A retração foi observada nas 16 regiões do Estado. A vida privada A vida privada dos homens públicos também é objeto da lupa social. Não há mais tolerância para abusos. Principalmente quando há manifestações de corrupção. É claro que o carisma do governante ajuda a aplainar arestas. Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek foram presidentes namoradores, o que não lhes corroeu a fama. Thomas Jefferson, um dos homens mais admirados dos EUA, protagonizou um "escândalo" amoroso, o caso com uma de suas escravas, Sally Hemings, que fora a Paris cuidar da filha mais velha do presidente, na época com nove anos de idade. Já o político inglês John Profumo, que tinha o cargo equivalente ao de ministro da Guerra, um dos heróis do Dia D (desembarque aliado na Normandia durante a 2ª Guerra Mundial), foi protagonista de um grande escândalo : o envolvimento com a modelo Christine Keeler, no começo dos anos 60. FHC foi objeto de forte artilharia midiática. O mesmo ocorreu com Collor. Maluf, idem. Hoje, a crítica é mais devastadora. A rejeição a comportamentos de governantes tem que ver com o espírito do tempo.
quarta-feira, 7 de outubro de 2015

Porandubas nº 464

Abro a coluna com um caso que mostra o estado de espírito dos nossos políticos. Ninguém tem provas Numa festa de aniversário de um correligionário, a dona de casa recebe um político famoso. - Muito prazer conhecer a senhora. É uma honra ser amigo do seu marido - cumprimenta ele. - O prazer é meu, deputado ! Saiba que já ouvi muito falar do senhor ! - É possível, minha senhora, é possível, mas ninguém tem provas ! A grande pergunta A maior interrogação desse ciclo de confluência de crises continua sendo esta : Dilma fica ou sai ? Renuncia ou é afastada por um impeachment ? Tentemos arrumar as pedras no tabuleiro. O leit motiv - o fato concreto - ainda não apareceu nas planilhas das Cortes Judiciais. Hoje, o TCU agendou a decisão sobre as pedaladas fiscais. A tendência é a de desaprovação das contas. Mas esse tribunal exerce apenas a função de indicar ao Parlamento sua avaliação sobre as contas do governo. Não é um órgão julgador, mas um órgão de assessoramento do Congresso. A decisão política caberá, portanto, ao Legislativo. E que rumo este dará ao processo que virá do TCU ? O tabuleiro da Câmara Primeiro, vale lembrar que o presidente da Câmara tem o poder de decidir sobre a agenda a ser submetida ao Plenário. A desaprovação das contas da presidente certamente engrossará o caldo do impeachment. Mas Eduardo Cunha fica entre a cruz e a caldeirinha, submetido que está à investigação da operação Lava Jato, agora com informações do Ministério Público da Suíça de que ele possui contas naquele país e de que o próprio teria sido avisado do congelamento de seu dinheiro. Mexida de pedra no tabuleiro não redundará em dano fatal à presidente, eis que será fácil, neste momento, escapar do xeque. Dilma ganhou fôlego com o remendo ministerial e poderá dispor de 171 votos, base suficiente para escapar da enrascada. Ou seja, o processo só será aberto se contar com 342 dos 513 deputados. Irresponsabilidade A eventual desaprovação das contas da presidente pelo TCU somar-se-á ao contencioso que já chegou à Câmara por meio dos pedidos feitos pelos juristas Hélio Bicudo e Miguel Reale Jr., sob o argumento central de que a presidente cometeu crime de responsabilidade. Passará ? Muito difícil. Porém, se o processo for aberto e aprovado, irá ao Senado, onde precisará de 54 votos, ou 2/3, para seguir adiante. Caso seja aberto, a presidente sairia para se defender, dando lugar ao vice-presidente. O processo seria presidido pelo presidente do STF. Ora, no Senado, a situação da presidente é bem mais confortável para a mandatária. Será muito difícil seguir adiante. O x da questão O respiro da presidente com o recente investimento na frente partidária, particularmente junto ao PMDB, não lhe garante chegar, incólume, ao final do mandato em 2018. Onde está o x da questão ? Nas ruas. Nesse ponto, convém explicar os mecanismos de pressão e os fatores que influenciarão a governabilidade nos próximos tempos. Abrigam coisas como : desemprego crescente ; inflação que pode ultrapassar dois dígitos ; continuidade das investigações da operação Jato, com respingos sobre a imagem de atores centrais ; insatisfação social e mobilização das massas. P.S. A abortada sessão do Congresso, ontem, para analisar os seis vetos restantes do pacotão do ajuste, mostra que nem o presidente da Câmara, apesar de queimado pelo fogo que vem da Suíça, continua dando as cartas. A equação do fundo do poço A confluência de crises - econômica, política, de gestão, ética/moral - ainda não jogou o país no fundo do poço. Mas a distância está encurtando. Basta que a equação BO+BA+CO+CA seja completada : BOlso vazio, BArriga roncando, COração sofrendo, CAbeça indignada. Ou seja, a economia destroçada poderá puxar as massas para as ruas e, assim, provocar a queda das pedrinhas do dominó. Os atores políticos tenderiam a ouvir o clamor das ruas. Os cinturões do governo Dilma terá condições de resgatar seus vetores de peso ? Carlos Matus, especialista chileno em Planejamento Situacional, mostra que uma hipótese como essa só será possível se o governante não ultrapassar o limite de perda de controle sobre a gestão, se a governabilidade não cair abaixo de seu ponto crítico e, ainda, se conseguir reverter o processo de desacumulação de força. Para que estas hipóteses sejam consideradas, é preciso analisar os três cinturões que apertam o corpo do governo : o cinturão político, o cinturão econômico e o cinturão da gestão. Quanto ao primeiro, não há certeza que seja sólido ; quanto ao segundo, todas as análises apontam para a tendência de piora nos números da economia. A propósito, o indicador de emprego da FGV recuou de 64,2 para 62,0 pontos entre agosto e setembro ; já o indicador de desemprego elevou-se 3,5% em relação a agosto, alcançando 92,6 pontos, o maior patamar desde 2007. E quanto ao terceiro, o cinturão da gestão, convenhamos, parece muito torto. Assoviar e chupar cana A política ensina : não é viável combinar sacrifícios econômicos e recessão transitória com crescimento, aumento de emprego e Justiça social. Assoviar e chupar cana ao mesmo tempo é impossível. Quem prega isso ? Lula. Que gostaria de tirar Joaquim Levy e voltar a aplicar a fórmula que adotou em 2008 - acesso ao consumo, dinheiro farto para abrigar as empresas, gastança incontrolável. Dilma aceita, por enquanto, a receita ortodoxa. Mas os sacrifícios a serem impostos poderão desapeá-la do poder. É oportuno lembrar que os efeitos da bula de Levy ainda não foram postos à prova. Supõe-se que o ajuste fiscal, mais adiante, deverá esvaziar os bolsos das massas. Os instintos E quem garante que o povo voltará às ruas ? A resposta é : dependerá do bolso e do estômago. Sergei Tchakhotine, o russo que estudou o nazismo sob a perspectiva da mistificação das massas, pinça os quatro mecanismos que afetam os seres vivos para deles extrair conclusões sobre o comportamento dos indivíduos : impulso combativo e impulso alimentar (dois mecanismos de conservação do indivíduo) e impulso sexual e impulso paternal (dois mecanismos da conservação da espécie). Pois bem, as reações dos seres humanos derivam desses impulsos. Que, segundo Pavlov, estão na base das reações ou dos reflexos inatos das pessoas. Para sobreviver, o indivíduo vai à luta, buscando todos os meios e recursos. O alimento é um deles. E o alimento depende do bolso que, vazio, deverá expandir a indignação social. As massas nas ruas - inclusive contingentes das classes C e D - não constituem, portanto, um ponto fora da curva. A descarga da massa A massa, ensina Elias Canetti em "Massa e Poder", vive em função de sua descarga. Ela passa por um período longo, ganhando densidade, preparando-se para o momento de descarga. O grito espontâneo da massa expressa sentimentos de qualquer espécie. A massa, uma vez formada, quer crescer rapidamente. E o estouro é transição de uma massa fechada para uma massa aberta. Qual é a do Lula, hein ? Luiz Inácio é conhecido pela ambiguidade. É situação, mas parece oposição. Defende a pupila, mas quer a saída de Joaquim Levy do governo. Aprova o ajuste fiscal em público, mas, em particular, o execra. Qual é a de Luiz Inácio ? Chegar às margens de 2018 com um discurso de oposição. Não tem alternativa se não a de voltar a ser candidato, única forma de fazer renascer o PT. Para tanto, conviria aos seus planos ver Dilma fora do Palácio do Planalto. Mas não gostaria vê-la saindo pelas portas do fundo. A imagem de um impeachment bateria nele. Mas uma saída pela via da renúncia - sob argumento de que a presidente precisaria tratar da saúde - cairia bem. E o PT ? Só tem um caminho : voltar à esquerda extrema. No centrão social-democrata será tragado pela constelação partidária. O alerta do TPP O Brasil, mais uma vez, fica para trás. O acordo que reúne 12 países, envolvendo 40% da economia mundial, é um alerta ao lulopetismo, com sua restrita visão focada nas adjacências do Mercosul. O TPP, a Parceria Transpacífico, será uma grande alavanca para o crescimento da economia mundial. Um alerta ao Brasil, que precisa correr atrás de parceiros e acordos, sob pena de perder as grandes oportunidades oferecidas pelas grandes economias mundiais. Faz tempo que o mercado europeu espera por nosso lerdo mercado. A previsão do FMI de que o país terminará o ano como 9ª economia mundial, deixando a 7ª posição, é mau presságio. E o PMDB, hein ? O PMDB é o fiel da balança da governabilidade. Essa imagem tem se expandido nos últimos tempos. Mas para onde a balança penderá nos próximos tempos ? A composição de Dilma com o líder Leonardo Picciani em torno do Ministério não garante todos os votos da bancada. Calcula-se que 22 votos do PMDB votarão com a oposição. O fato é que o partido poderá garantir, no curto prazo, um respiro ao governo. No médio prazo, porém, seu posicionamento estará à reboque da situação da economia. A articulação direta de Dilma com a bancada, passando por cima da cúpula, é um risco. Doravante, os deputados vão querer dialogar diretamente com a mandatária, evitando intermediários. Dilma plantou, Dilma colherá. Espertocracia Machado de Assis, mulato, gago e epilético, um dos mais ilustrados e respeitados cultores do idioma pátrio, conseguiu de modo exemplar unir o erudito ao popular. Em seus irretocáveis escritos, ensinava que a democracia deixa de ser uma coisa sagrada quando se transforma em "espertocracia" - "o governo de todos os feitios e de todas as formas". Não parece o retrato do governo que vemos na parede ? A dislexia de Montoro Fecho a coluna com uma historinha de Franco Montoro. Depois de deixar a esfera governativa e parlamentar, Franco Montoro passou a se dedicar ao Instituto Latino-Americano - ILAM. Na condição de presidente desta entidade, foi a um almoço organizado por um pequeno grupo de professores da USP no restaurante do campus. O ex-governador, como se sabe, tem registrado em sua história muitos casos de dislexia, momentos em que confundia nomes, alhos com bugalhos, motivando risos nas cerimônias. A conversa fluía bem, versando sobre os mais diferentes problemas do país. A certa altura, ele se surpreendeu ao saber que este escriba era potiguar. Mais ainda : tio de Sônia, casada com João Faustino, tucano do melhor naipe e seu dileto amigo. Montoro e dona Lucy foram padrinhos do casamento de uma das filhas de João e Sônia. De repente, lá vem a pergunta : - E como está o Agrário ? Você sabe como ele vai ? Passo a lupa na mente e lamento ignorar a identidade da figura. Mas vou procurar saber, logo, logo. Mudamos de assunto. Mas o Agrário continua a frequentar o meu sistema cognitivo. De repente, Eureka ! Agrário ? Agrário ? Não seria o Urbano ? Tomo a iniciativa : - Governador, será que o senhor não confundiu o Agrário com o Urbano ? - Ah, sim, é claro, é claro. Desculpe. Como vai o Urbano ? Francisco Urbano era presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG. Um potiguar muito conhecido nos universos sindicalista e político. A dislexia do ex-governador paulista havia confundido o espaço rural com a geografia urbana.
quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Porandubas nº 463

Abro a coluna com uma historinha que vivi nos tempos em que coordenava campanhas eleitorais. O toró Os técnicos se esforçavam para instalar os aparelhos e arrumar os grossos cabos. Novembro de 1986. 18 horas na Praça do Marquês, em Teresina. Um toró (como se diz no Nordeste) começa a cair, fazendo a grande festa. Praça lotada. Três mil piauienses pulavam entusiasmados sob a água que caía. Garrafas de cachaça corriam de mão a mão. De repente, um estrondo, seguido de outros. Fogo e fumaça nos cabos. Corre-corre dos técnicos e o aviso : "Acabou o som. Não há condição". Não havia aquele tipo de cabo. Elba Ramalho foi logo atirando : - Está aqui meu contrato. Sem som, não canto. Conversa daqui, conversa dali, aflição por todos os lados. Depois de muita insistência, aceita : - Cantarei uma música, só, e me arranjem um acompanhamento. Apareceu não sei de onde um cara com um banjo. O povão gritava : - Elba, Elba, Elba, cadê a Elba ? "Bate, bate, bate, coração..." A cantora subiu ao palco. A multidão explodiu. O canto e o refrão : Bate, bate, bate, coração ! Bate no meu velho peito. Nem bem terminou a estrofe, Elba parou. Presenciei, ali, uma das maiores aflições de minha vida, um esculacho da cantora : - Seus imbecis, loucos, covardes, miseráveis. Como podem fazer uma coisa dessas ? O que era aquilo ? Por que aquele carão ? Olhei para o meio da multidão. E vi a cena constrangedora : um bêbado abrindo a boca de um jumento, enquanto outro despejava nela uma garrafa de cachaça. Foi o toque que faltava para o anticlímax. Elba xingava a multidão. Apupos. No dia seguinte, Teresina respirava um ar de gozação. O showmício de Freitas Neto (PFL) foi um desastre. Senti o ar pesado. Pesquisas nos davam 3% de maioria sobre Alberto Silva, candidato do PMDB. Perdemos a campanha de 15 de novembro por 1,66%. O desastre virou o clima. Hoje, quando me perguntam sobre o que é fator imponderável em campanha política, respondo sem hesitar : - É um jumento embriagado no PI. Jobim sobe, Lula age Nos últimos dias, o ex-ministro e ex-presidente do STF, Nelson Jobim, subiu alguns passos na escada do Planalto. Passou a ser uma espécie de embaixador informal junto aos membros das altas Cortes no esforço de defender posições do interesse do governo. Jobim saiu do governo Dilma (1º mandato) agastado com a presidente. Teria sido escanteado. Volta, agora, por cima. Trata-se de um ex-parlamentar que conhece bem as casas congressuais, é um estudioso da política e gosta da esfera da articulação. Diz-se que passou a contar, nos bastidores, com a ajuda de Lula, cuja presença em Brasília tem sido intensa nas últimas semanas. Lula anda renovando seu passaporte de articulador dos bastidores. Estará mais uma vez em Brasília esta semana para ajudar a presidente. Arrefecimento O fato é que, nos últimos dias, a tese do impeachment da presidente perdeu peso. O arrefecimento de ânimos se dá no momento em que a presidente, saindo do casulo, decide fazer ela mesma a articulação com parlamentares do PMDB da Câmara, a partir do líder Leonardo Picciani. E coincide com esta ação quase intestina do ex-ministro Nelson Jobim. O fatiamento da operação Lava Jato seria o primeiro grande desafio vencido por Jobim. Se a estratégia do Planalto se firmar, é possível que a presidente consiga atravessar o olho do furacão previsto para novembro. Viabilidade Será viável a estratégia presidencial de usar de todos os meios à disposição da caneta para resgatar vetores de força do governo ? Consideremos : 1. A mandatária decide negociar diretamente com deputados, abrindo um flanco que pode se expandir na esteira de pressões e barganhas ; 2. O grupo que receberá os cargos não tem compromisso com o amanhã. Age em função do hoje, caracterizado por uma economia recessiva, contrariedade de consumidores e forte possibilidade de intensificação dos movimentos de rua ; 3. Com inflação beirando os dois dígitos, extinção de um milhão de postos formais este ano e expansão do desemprego nos próximos meses, a situação do país se agravará ; 4. Sob este risco, será improvável uma lealdade canina à presidente Dilma por parte do grupo peemedebista aquinhoado com nacos do poder. PMDB da cúpula É visível o desconforto da cúpula do PMDB com as negociações empreendidas pela presidente e os novos articuladores - Ricardo Berzoini e Gilles Azevedo - com parlamentares peemedebistas. Os novos "donos do poder", liderados por Picciani, são perfis considerados de escalão inferior. Dos nomes aventados para ocupar cargos de ministros, pelo menos dois teriam se declarado anti-Dilma em passado recente. A cúpula do PMDB é formada por dirigentes de peso. Que, em momento oportuno, farão valer seu cacife no mando partidário. Por isso, a decolagem do grupo que escala o poder na Esplanada dos Ministérios pode ser entendida como "voo de galinha". Terá pouco alcance. Descerá tão rapidamente como subiu. Marta será candidata Marta Suplicy baixa a testa do orgulho e entra no PMDB com um discurso de conciliação. Vem para somar ; ingressa em um partido plural, aberto, esteio da redemocratização nacional, como ela lembrou em discurso. E faz um brinde expressivo a outros eventuais contendores que pretendam disputar, pelo PMDB, a vaga para a prefeitura de SP em 2016. Gabriel Chalita, por exemplo. Ocorre que o Chalita é secretário de Educação do governo Haddad. E parece gostar do que faz. Seria complicado para ele vir a disputar o cargo ao qual o prefeito do PT se habilitará como candidato à reeleição. Por isso, Marta Suplicy, que detém forte recall nas margens sociais, deverá ser a candidata do PMDB à prefeitura. Pedidos de impeachment Eduardo Cunha, o presidente da Câmara, promete ler e avaliar, a partir desta semana, entre 10 a 15 pedidos de impeachment da presidente Dilma. Na visão deste consultor, Cunha tende a arquivar os pedidos. Mas o Plenário poderá pedir que sejam submetidos à sua decisão. Palavra de Cunha : "Esta semana já despacho alguns. Não vou conversar com ninguém, vou despachar alguns, ler pareceres, pedir mais e tomar decisões em função do que está colocado lá". Reforma depois dos vetos As articulações se intensificam sob o clima de incertezas : se arrependimento matasse, Dilma estaria no velório. O acirramento de tensões é tão forte que não permite, a esta altura, divisar quem vai entrar ou quem vai sair por ocasião da propalada reforma ministerial. O PMDB é uma torre de babel. Com as interrogações se acumulando, há quem defenda a reforma ministerial apenas após a votação dos seis vetos pendentes e integrantes do pacote fiscal. A serem votados hoje, a partir de 11h. A reforma seria anunciada na quinta. PT versus PT A Fundação Perseu Abramo apresentou dois livros-documento com sérias críticas ao ajuste fiscal do governo. "Por um Brasil justo e democrático" é uma espécie de ala B do PT contra a ala A. Marcio Pochmann e Luiz Gonzaga Beluzzo, dois economistas da Unicamp, são os inspiradores da obra. Que acusa interesses dos "grandes bancos e fundos de investimento". Mais dólares na economia Que os tempos estão bicudos em termos de arrecadação, todos sabemos. E mais : onde há crise as oportunidades florescem. A equação econômica colocou o Brasil em promoção. Estamos on sale frente às moedas fortalecidas. O turismo interno, frente ao dólar, ficou mais atrativo. Mas além do fator cambial, existem gargalos que travam a vinda destes dólares para cá, como a questão da exigência dos vistos para turistas estrangeiros. Nesta semana, os deputados terão a oportunidade de reverter um pouco essa situação, com a urgência ao PL 2430 de 2003 do pernambucano Carlos Eduardo Cadoca e que pretende destravar esta amarra na entrada de turistas. Seria de grande ajuda para o turismo nacional e, claro, para nossa economia. Que venham os gringos ! PT, destino O PT terá grandes dificuldades para se refazer enquanto partido. A debandada será grande. Em 2016, o partido fará poucos prefeitos. Alternativa : sair pela tangente à esquerda. Tornar-se um partido com forte carga ideológica. Os atuais líderes, com exceção de Lula, sumiriam do mapa petista. PSDB, destino Os tucanos deverão também começar a desenhar com tintas fortes. Seu escopo está esmaecido. É conhecido como o partido de cima do muro, que "não fede nem cheira". Deverá buscar nitidez programática. E explicar o que vem a ser sua social-democracia. PMDB, destino O PMDB continuará a ser dividido em blocos e mandos estaduais. Tende a aglutinar os partidos médios. Também será instado a pisar em território mais programático. O partido tentará fincar pés na área de um programa com forte viés nacionalista. Identificado com classes médias. E com bandeiras regionais e municipais bem nítidas. O municipalismo pode ser um eixo. PSB, destino O PSB deverá incorporar núcleos de centro-esquerda, sendo alternativa a partidos de viés radicalizante. Estará à procura de uma liderança nacional. PSD, destino Terá lugar na ponta-direita do arco ideológico. Pode abrir espaço para as políticas sociais, sendo representante da direita no assistencialismo às margens. Uma novidade. Os outros, destino Devem encontrar caminhos para a fusão, integração, formação de blocos com os grandes partidos. O economista e o empresário Dois homens andavam de balão e se perderam. Decidiram baixar o balão e perguntar para algum transeunte. - Ei, você poderia nos dizer onde estamos ? - Vocês estão em um balão, respondeu o transeunte. - A resposta é correta e absolutamente inútil. Este homem deve ser um economista, comentou um deles no balão. - E você deve ser um empresário, respondeu o transeunte. - Exato. Como você sabe disto ? - Ora, você tem uma excelente visão de onde está. E mesmo assim você não sabe onde está.
quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Porandubas nº 462

Abro a coluna com uma historinha de PE. E fecho com outra uma de AL. Apenas expectorante Reunião de vereadores com o chefe político da região numa pequena cidade de PE. Cada um tinha de falar sobre os problemas do município, reivindicações, sugestões, etc.. Todos falaram alguma coisa, com exceção de um deles, meio acabrunhado no canto da sala. O chefe político cobrou dele a palavra : - E você, amigo, não tem nada a dizer ? O vereador, tonto com a provocação, não teve saída. Respondeu : - Não, doutor, estou apenas expectorante. Abriu a gargalhada dos companheiros espectadores. (Historinha que Geraldo Alckmin me contou.) A reforma de Dilma A presidente Dilma está entre a cruz e a caldeirinha. Precisa entregar alguns ministérios ao PMDB. Mas exigirá aval e integração do partido ao governo. Não será exercício fácil. Primeiro : quais ministérios ? Segundo : quem indicará ? Terceiro : as diversas alas do PMDB serão contempladas ? Vamos aos fatos : o Ministério da Saúde poderá ser entregue à bancada do RJ. O endosso será dado pelo líder Picciani. E as outras bancadas ? A mineira, por exemplo ? E a bancada do PMDB no Senado ? O vice-presidente Michel Temer, Eduardo Cunha, presidente da Câmara, e Renan Calheiros, presidente do Senado, declinaram de indicações. Fizeram muito bem. O dilema da presidente : se correr, o bicho pega ; se ficar, o bicho come. PMDB dividido Seja qual for a fatia que caberá ao PMDB, o fato é que o partido estará dividido. Não adianta capturar o partido com Ministério da Saúde. Que, hoje, é mais um vazio a preencher. Saúde no Brasil está em destroços. Os equipamentos hospitalares estão sucateados. O PMDB tem uma ala que deseja romper com o governo, já ; outra defende rompimento em novembro ; e uma terceira está em cima do muro, a esperar o desempenho da economia. O PMDB tem hoje sete ministérios que, somados, não têm o peso de uma Pasta gorda. Por isso, Dilma tende a fundir Aviação e Portos (novidade), cedendo ainda a Pasta da Saúde ao partido e conservando Turismo, Agricultura e Minas e Energia. Sangue O sangue do corpo do governo continua jorrando. Aos borbotões. Dilma e nenhum dos seus médicos conseguem sustar o fluxo sanguíneo que vaza. O que fazer ? Tentar tampar com a reforma ministerial. Pior será a emenda que o soneto. Fazer reforma em momento de ameaça - decisão sobre vetos presidenciais - é um perigo. Ademais, a corda começa a esgarçar no cabo de guerra que o governo enfrenta com o Congresso. A desaprovação de matérias encaminhadas pelo governo, como a CPMF, quebra a coluna vertebral de Dilma. Renúncia ? Este consultor continua a não acreditar em renúncia. Por conta da índole da presidente. Seu DNA não combina com renúncia. Ocorre que esta palavra passou a ser repetida com frequência nos últimos dias. Até em hostes petistas é repetida. Será ? Comenta-se que até Lula apreciaria um gesto de renúncia para se habilitar ao pleito de 2018 como candidato das oposições. Não pode ventilar isso, ao contrário, promete construir com o povo a muralha de defesa da presidente. Seria um disfarce. Mostra-se, de um lado, solidário, e, de outro, torcedor silencioso por um desenlace que o beneficiaria. Se ela continuar sangrando até 2018, ele, Lula, não teria a mínima chance. As alternativas A cada dia, surgem alternativas : Dilma sai, Dilma fica ; Michel Temer acabaria assumindo e fazendo um pacto nacional ; Michel não assumiria e se afastaria de Dilma. São conjeturas. Este consultor continua apostando na ideia de que a solução - saída/permanência - será dada pelo bolso/barriga das pessoas. Ou seja, pelo aperto mortal que a economia poderá provocar lá para meados de novembro. Povo na rua, barriga roncando, Tribunais decidindo, Congresso votando. Contra Dilma, é claro. E o leit motiv ? Ficará a cargo das Cortes. E se tudo continuar Se as coisas continuarem como estão, teremos : uma economia recessiva corroendo o bolso e inflação subindo ; Dilma sem apoio na base, perdendo todas, mas, sob o manto de orgulho, empurrando o governo com a barriga ; TCU E TSE aprovando pedaladas fiscais e contas de campanha de Dilma ; povo nas ruas, gritaria geral, movimentos grevistas e Dilma achando que o cenário de devastação é apenas miragem ; Lula correndo o país com meia dúzia de gatos pingados ao redor, mas soltando o verbo demagógico ; casas congressuais votando contra e a favor de Dilma, dependendo do projeto ; Joaquim Levy dando lugar a outro, que também não teria condição de avançar ; em dezembro, veríamos um país sem Papais Noéis nas ruas. Um Natal triste e um janeiro sem perspectivas. Um feio desenho. Caindo na real Vamos cair na real ? Essa crise não é coisa corriqueira como os economistas, regra geral, imaginam. Todos eles gostam de dizer : passamos por piores crises. E citam a inflação de 80% ao mês. Lembra-se, Mailson ? Ora, não se trata apenas de uma crise de economia em recessão. Trata-se de uma crise moral, na esteira da maior roubalheira jamais vista, flagrada, denunciada e condenada pelos tribunais. Trata-se de um copo transbordando com as águas da indignação social. Trata-se do flagrante de um partido pego com a boca na botija, com objetivo de construir propinodutos que o levariam a um poder perpétuo. Ora, ora, economistas, não venham querer driblar a crise com números de inflação. Até quando ? Até quando ? Essa crise não terá solução no curto prazo. É uma cadeia de eventos negativos que se imbricam. A crise política continuará, mesmo com reformas cosméticas e prisão de alguns protagonistas do momento. A crise econômica poderá ser debelada com o controle das contas do governo e diminuição do tamanho do Estado. Coisa para quatro a cinco anos. As crises hídrica e energética podem durar um tempo menor. Mas a crise moral não será equacionada da noite para o dia. Não se muda cultura por decreto. A desconfiança, a descrença, a imagem negativa dos atores políticos, essas mazelas continuarão por bem mais tempo. E a Lava Jato ? Todos observam : a operação Java Jato continua a todo vapor. Novas fases se abrem. A última, a Nessum Dorma, chega mais perto de Lula. O procurador Carlos Fernando vê conexão entre mensalão, petrolão e eletronuclear. Todos os dutos de propina saindo de uma fonte só : a Casa Civil do governo Lula. É o que se infere. Mas o ministro Teori Zavascki dividiu a operação. Não vê conexão entre as denúncias sobre recursos que teriam sido repassados para a senadora Gleisi Hoffmann e Lava Jato. Por isso, separou as coisas. Skaf liderando Paulo Skaf, presidente da FIESP, está pouco a pouco vestindo o manto de principal liderança do setor produtivo nacional. Todas as grandes campanhas em defesa da produção e do consumidor são por ele promovidas. Esta última, sobre a CPMF, caiu no gosto do povo. Skaf é uma boa surpresa no estreito território dos líderes nacionais. Mercadante fica Aloísio Mercadante, o chefe da Casa Civil, não cairá. Quanto mais se fala (mal) dele, mais parece prestigiado pela presidente. Mercadante faz ouvidos de mercador. CPMF Se a CPMF passar pelo Congresso, Dilma chegará ao fim do governo. Neste caso, valerá o provérbio : "é mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no reino dos Céus". Pimentel Ouvi, ontem, de um sensível e sensato observador da cena mineira : Fernando Pimentel, governador de MG, desapareceu de cena desde que tomou posse. Só deu as caras quando a esposa dele apareceu envolvida em denúncias de favorecimentos. Para Pimentel, passarinho na muda não apenas não pia como simplesmente desaparece. Pezão O governador Pezão, do PMDB do RJ, é o único a prestar fidelidade absoluta à presidente Dilma. Não se ouve isso nem de governador petista. Até quando durará essa fidelidade ? Delfim Delfim Netto continua com a língua afiada e o cérebro tinindo de lucidez. A entrevista que deu, domingo, ao Estadão, é um primor de análise crítica sobre o governo Dilma. Gilmar Pode-se até discordar do ministro Gilmar Mendes, do STF. Mas é admirável sua coragem. Não se faz de rogado. Diz abertamente o que pensa sobre a roubalheira cometida pelo PT. Ouvi sua peroração na OAB/SP, semana passada, em mesa que fui moderador. Ayres Britto Uma voz de bom senso : Carlos Ayres Britto, ex-presidente do STF. Que perfil de equilíbrio. Que alma poética sob a toga preta do juiz. O melhor ministro ? Outrora, era fácil distinguir os ministros e recitar seus nomes. Hoje, essa tarefa é praticamente impossível. Afinal, recite, leitor, 15 nomes de ministros. E qual o melhor ? Fecho a coluna com uma historinha de AL Sonhando com Deus Era o ano de 2006. A campanha ao governo de AL estava "fervendo". Um candidato muito conhecido no Estado pelas presepadas, cujo nome, por motivos óbvios aqui se omite, liderava as pesquisas. Era considerado imbatível. Último debate eleitoral na TV Gazeta. O apresentador passa a palavra ao mais que provável vencedor : - Candidato, após esta intensa campanha eleitoral, o senhor tem 30 segundos para as considerações finais. Fique à vontade para falar. O candidato abriu o verbo : - Povo de AL, ontem eu tive um sonho. Neste sonho, Deus meu dizia : "doutor (fulano de tal), construa hospitais para o sofrido povo deste Estado". A seguir, o apresentador passou a palavra ao outro candidato. Que usou a verve : - Povo de AL, quem sou eu para disputar uma eleição com um homem que Deus o trata por doutor ? O candidato (citou o nome do fulano ) disse há pouco que falou com Deus e Deus disse : doutor fulano de tal. Ora, se Deus chama o meu adversário de doutor, reconheço que não posso fazer melhor do que ele. Vocês não acham que o adversário (fulano de tal) já se considera nomeado por Deus ? E foi assim que o candidato (fulano de tal), líder absoluto nas pesquisas, conheceu a derrota. Perdeu para a própria arrogância. (Essa historinha foi enviada para a coluna por Manoel Pedrosa).
quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Porandubas nº 461

Abro, hoje, a coluna com uma parábola e um pequeno conto. A parábola "Há pessoas que não conseguem perceber o que se passa ao seu redor. Não veem que não veem, não sabem que não sabem". O conto Maria cai em um poço e está a 10 metros de profundidade. Olha para os céus e não vê o buraco. Desesperada, começa a escalar as paredes. Sobe um centímetro e escorrega. Passa o dia fazendo tentativas. As energias começam a faltar. No dia seguinte, um agricultor que passava pelo lugar ouviu um barulho. Olhou para o fundo do poço. Enxergou o vulto de Maria. Correu e pegou uma corda. Lançou-a no buraco. Concentrado em seu trabalho, esbaforida, cansada, Maria não ouve o grito da pessoa : "pegue a corda, pegue a corda". Surda, sem perceber a realidade, continua a tarefa de escalar, sem sucesso, as paredes. O homem na beira do poço joga uma pedra. Maria sente a dor e olha para cima, irritada, sem compreender nada. Grita furiosa : - O que você quer ? Não vê que estou ocupada ? O desconhecido se surpreende e volta a aconselhar : - Aí tem a corda, minha senhora, pegue a corda que eu puxo. Maria, mais irritada ainda, responde sem olhar para cima : - Não vê que estou ocupada, ó cara. Não tenho tempo para me preocupar com sua corda. E recomeça seu trabalho. Parábola : "Maria não vê que não vê, não sabe que não sabe". Qualquer semelhança com algum político ou governante é mera coincidência. Pacotão Novo pacote de cortes e impostos coloca governo Dilma no canto do ringue. O objetivo é arrecadar 66 bilhões de impostos. Esta alternativa continua a ser questionada pelos setores produtivos. Mais uma vez, veremos a OAB/SP e FIESP liderando uma frente contra a famigerada CPMF, desta feita cotada para cobrar uma alíquota de 0,20% sobre o valor da transição financeira. Só esta alíquota será responsável por 32 bilhões de receita. Mas foi acordado que nada irá para Estados e municípios, o que torna pouco provável a passagem tranquila pelos plenários das casas congressuais. A não ser que a alíquota seja aumentada para atender a súplica de governadores e prefeitos. O resto do dinheiro O resto do dinheiro será tirado do corte no programa Reintegra (créditos tributários aos exportadores) ; redução do PIS/COFINS na área da indústria química ; na limitação de juros sobre capital próprio (TJLP) e no IRPJ, com dedução de valores para SESI, SESC e SEST ; realocação de recursos do Sistema S para cobrir déficit da Previdência. Não se faz omelete sem quebrar ovos. Desta feita, os ovos de uma granja por muito tempo. Haja cocoricó. Cortes Os setores produtivos reagem : será que o governo vai fazer os cortes que se fazem necessários ou fará uma cosmética em cima de alguns programas ? O fato é que o governo se inclina a cortar parcela dos recursos destinados à agricultura familiar, Pronatec, Fies, ProUni, Bolsa Família, Minha Casa, Minha Vida. Ora, mas esses programas não são dirigidos às classes C, D e E, base principal do eleitorado do PT ? Sim. A querela, então, ganhará mais força. Pois o PT vai reagir ao corte de recursos para suas bases. A chiadeira vai engrossar. Petardos de todos os lados vão fazer feridos. CUT contra governo A CUT é um dos braços de sustentação do governo. Ou era. Agora, posiciona-se contra. Vejam. O presidente da Central, Vagner Freitas, o mesmo que disse que, se necessário, recorrerá às armas para defender Dilma, classifica como "lamentável" o pacote de medidas do ajuste fiscal. A CUT promete lutar contra Levy e seu pacote. Tensões Seja qual for o desenlace que aguarda o pacotão de cortes, o fato é que as relações entre governo e esfera política estarão mais acirradas, ao contrário do que se supunha quando a presidente Dilma parecia inaugurar uma fase de articulação política sob seu direto comando. A CPMF tem pequena possibilidade de passar pela Câmara. Mas os deputados poderão se convencer sobre sua absoluta necessidade. As tensões começam nas hostes do próprio PT, que não se conforma com os cortes em programas que considera vitais para sua sobrevivência. Saídas para a crise O mais abrangente e intenso evento na área dos grandes temas nacionais foi realizado pela OAB/SP, em parceria com a TV Cultura, Instituto de Estudos Avançados da USP e Assembleia Legislativa. Grandes expressões nas esferas da política, da economia e das questões sociais debateram, por dois dias, saídas para a crise. Destaques para o ministro Gilmar Mendes, senador Romero Jucá, empresário Jorge Gerdau e Gustavo Junqueira, presidente da Sociedade Rural Brasileira. Os resultados do evento serão reunidos em um livro, a ser entregue aos congressistas. Bola com o Congresso O governo, navegando à deriva, joga a bola para o Congresso chutar. Renan Calheiros, presidente do Senado, se mostra mais acolhedor que Eduardo Cunha, presidente da Câmara, às próximas investidas governamentais na frente do ajuste fiscal. Como o governo vai tentar passar a CPMF pelas casas congressuais se as verbas orçamentárias destinadas aos próprios parlamentares receberão ajustes ? Quero ver esse milagre. Greve de funcionários ? Já se ouve o ruído nas cercanias do funcionalismo público. Uma greve geral do funcionalismo estaria sendo preparada, caso o governo tente sustar o aumento dos quadros públicos. A paralisia geral das estruturas da administração seria a gota d'água para acelerar a próxima mobilização das ruas. Só mesmo a incompetência abrirá mais um buraco nos costados do governo. Pergunta Por que o governo não encontra meios de cortar R$ 30 bilhões em um orçamento de R$ 1,2 trilhão ? Vai e volta O Fundo Partidário, aumentado este ano para R$ 867, 5 milhões, será cortado em 64%. Vai e volta, vem e vai. Barata tonta. Frebraban Há gente, sim, entidades também, que aprovam o novo pacote de tributos e cortes do governo. A Febraban, por exemplo, a Federação dos Bancos. O sistema financeiro vai muito bem, obrigado. A resposta de Michel Ante a pergunta feita ao vice-presidente Michel Temer, em viagem à Rússia, se a presidente Dilma chegaria ao fim do mandato, foi rápido : tem certeza de que ela vai terminar o mandato. Na verdade, ele falaria na Rússia apenas sobre os assuntos tratados com o governo russo. Ante, porém, a pergunta casca de banana, não teve dúvida : respondeu. Imagine-se a especulação caso não respondesse. Nos últimos tempos, o que o vice diz ganha manchete. O rolo da Caixa Mais um rolo em apuração : a CEF teria descumprido a Lei de Responsabilidade Fiscal ao repassar recursos para programas nos ministérios da Cidade e da Agricultura. E ficou à espera do ressarcimento. Uma pedalada fiscal. O MP está investigando. Menos um A Secretaria de Assuntos Estratégicos está com os dias contados para deixar de ser Ministério. Seu titular acaba de pedir demissão : Mangabeira Unger. Que deverá continuar dando palpites como consultor do governo. Pelo menos, fica fácil para Dilma eliminar a Pasta. Petrobras, menos, menos A Petrobras valia há cinco anos cerca de R$ 280 bilhões de dólares. Hoje, vale R$ 28. Queda de grande despenhadeiro. Nova crise ? Murilo Ferreira, presidente da Vale, deixou a presidência do Conselho de Administração da Petrobras. Diz-se que divergia do presidente da petroleira, Aldemir Bendine. Alegou questões de saúde. Realmente, Petrobras é, hoje, sinônimo de dor de cabeça. Exercícios de decalagem Decalagem (com a, isso mesmo, não decolagem) é a distância entre a posição corretamente prevista de um alvo móvel e a posição real de onde os últimos sinais foram recebidos. Assim, para levar em conta a decalagem, o caçador antecipa, dispara à frente da ave em voo ou de um prato de barro ; aponta, não em direção ao próprio alvo, mas a um ponto previsto na trajetória. Em política, um governante deve ter aptidão para prever e antecipar os problemas que vão surgir. O que a presidente Dilma precisa fazer para melhorar sua taxa de decalagem ? A volta de seu Lunga Pérolas que mandaram para a coluna, atribuídas a "Seu" Lunga, o grande frasista e saudoso cearense. Não garanto que sejam dele. 1. A mulher viu Seu Lunga deitado, de olhos fechados, na cama, com a luz apagada e perguntou : - Você tá dormindo ? Ele : - "Não, tô treinando pra morrer". 2. Seu Lunga levou um aparelho eletrônico para a manutenção e o técnico pergunta : - Tá com defeito ? - Ele : - Não, é que ele estava cansado de ficar em casa e eu trouxe ele para passear. 3. Seu Lunga decidiu sair de casa na hora da chuva. A mulher perguntou : - Vai sair nessa chuva ? Ele : - Não, vou sair na próxima. 4. Um amigo ligou para ele, em sua casa, e indagou : - Onde você está ? Ele : - No Polo Norte ! Um furacão levou a minha casa pra essas bandas ! 5. Mais uma vez, a pobre da mulher faz a pergunta : - Você tomou banho ? Ele : - Não, mergulhei no vaso sanitário ! 6. E mais uma. Na frente do elevador do prédio do INSS, alguém pergunta a Seu Lunga : - Vai subir ? Ele : - Não, não, to esperando o INSS descer pra eu fazer minha inscrição no atendimento.
quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Porandubas nº 460

Abro a coluna com uma historinha do RN. Salgar meu pai Historinha do RN, mais precisamente de Macaíba, vizinha à capital, Natal. Em certa administração municipal, constituída em sua grande maioria por pessoas de Natal, um pobre rapaz procurou o gabinete do prefeito com um problema urgente. Era uma sexta-feira. "Meu pai morreu e vim pedir o caixão", suplicou o jovem à secretária natalense da mais fina flor da moderna burocracia. "Hoje não há como atender. O prefeito e todo o pessoal foram a Natal. Volte segunda-feira, está bem?", respondeu a funcionária consciente do dever cumprido. Desolado o rapaz recuou e abriu novamente a porta do gabinete para nova abordagem : "Dona, poderia me arranjar dois reais ?" "Pra quê você quer o dinheiro ?", interrogou a eficiente servidora. "É pra comprar sal grosso, salgar o meu pai até segunda-feira !" Quem conta o "causo" é Valério Mesquita. Michel I Michel Temer é um vice-presidente da República cioso de seus deveres. Trata-se de um perfil sempre alinhado à letra da lei. Educado, equilibrado, tem uma qualidade rara entre os políticos : sabe ouvir. E pondera bastante sobre o que ouve. Costuma concordar com o interlocutor, mesmo que, a seguir, de modo que suave, comece a discordar. Atribui-se a ele a qualidade de "algodão entre cristais". Evita rachaduras, atritos. Dito isso, vale arrematar : não é de seu feitio dar recados com palavras e frases que possam parecer desrespeitosas. Michel II Os episódios em que aparece como pivô e que chegaram a criar certo distanciamento da presidente da República podem ser considerados como eventos comuns à crise. Não se pode negar a gravidade do momento, a necessidade de um ponto de união e a obviedade que nenhum governante tem condições de sustentar por muito tempo uma baixa avaliação, registrada hoje em apenas 7% para a nossa mandatária. Dilma I A presidente é cercada por um grupo de assessores e ministros que não veem como positiva a aliança tática entre PT e PMDB. Sabe-se, por exemplo, que Aloísio Mercadante exerce grande influência sobre a presidente. Mas não faria parte do grupo de Lula. Por isso mesmo, tem sido considerado um entrave na relação entre a presidente e os partidos políticos. Com a saída de Michel Temer da articulação política do varejo, esse papel tende a ser acumulado por Mercadante e, nas planilhas, por Giles Azevedo, assessor de confiança da presidente. Mercadante arrisca-se a aumentar as restrições que a área política tem contra ele. Dilma II Dilma retira parcela do poder dos chefes militares, transferindo algumas decisões - política de pessoal das Armas - para o Ministério da Defesa. Na visão desse analista, trata-se de uma posição que não deve ter agradado às cúpulas militares. A presidente desarruma mais ainda a desorganizada estrutura de mando. Lula Luiz Inácio tem dado muitos conselhos à presidente Dilma, particularmente no que se refere à articulação política. É o que se lê nos jornais. A relação da presidente com o PMDB é crítica. Lula sabe que as crises políticas da contemporaneidade se devem às precárias relações com os partidos, principalmente com o PMDB. O ex-presidente demonstra desejo de ajudar, mas tem papel limitado. Promete correr o país na tentativa de salvar o PT do naufrágio em 2016. E se Dilma sair do governo, Lula poderia viabilizar sua candidatura de oposição "aos governantes que comandam o país" (claro, projeta-se essa frase para 2018). Mercadante O chefe da Casa Civil, Aloísio Mercadante, parece mais talhado para lidar com a feição econômica do que com a feição política. Por isso, se for consolidado como articulador político, poderá ser uma espécie de macaco em um armário de louças. Mercadante teria vontade de viabilizar seu nome para o futuro, como candidato à presidente pelo PT. A ala lulista brecará. O ministro navega nas águas das investigações. O tiroteio contra ele tende a se expandir nas próximas semanas. Levy É patente que o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, perdeu força nas últimas semanas. E quem teria levado parte dessa força perdida ? Nelson Barbosa, o ministro do Planejamento, agora escalado para dar o tom maior da economia. Teria este o apoio de Mercadante. De sua cabeça teria saído a ideia de ressuscitar a CPMF. Na Europa esta semana, Levy tenta convencer empresários que a economia começa a se recuperar. Uma inverdade. A crise econômica terá muito fôlego. Edinho Edinho Silva, o ministro da Secretaria da Comunicação Social, está sendo investigado. Deve entrar na relação do STF e, nessa condição, abre mais um alvo contra o governo. Não é conveniente continuar sendo o porta-voz do Governo. Seria um ato de grandeza se os ministros arrolados na lista da Lava Jato pedissem licença de seus cargos até a conclusão das investigações. Zavascki O ministro Teori Zavascki dará o tom da Lava Jato na orquestra política. Dele dependerão os pedidos de investigação, os despachos para ouvir os indiciados, a reunião de provas, etc. O futuro de muitos políticos estará em suas mãos. Mendes O ministro Gilmar Mendes é visto como o aríete a furar os dutos das contas de campanha da presidente Dilma no TSE. Tem acusado o procurador-Geral da República, Janot, de agir como advogado de defesa da presidente. Ao fazer isso, Mendes ultrapassa o limite da linguagem sóbria que cabe aos membros da mais Alta Corte. Mas a insinuação do ministro Gilmar até provocou uma reação de Janot, que propõe a investigação das contas de campanha da presidente. Ou teria sido coincidência ? Moro O juiz Sérgio Moro continua a fazer seu árduo trabalho na primeira instância, estourando dutos e malhas intestinas que agem nos subterrâneos da administração pública. Nos últimos tempos, Moro tem aparecido em muitos eventos como palestrante. Talvez não seja muito conveniente a super exposição do juiz Moro. Deveria conter mais o verbo. Para não ser engolido pelo Estado-Espetáculo. Haddad O prefeito Fernando Haddad começa a ser identificado como Raddard, o boneco que vai desfilar na campanha de candidatos de oposição em 2016. Calcula-se que os radares de SP vão encher os cofres da municipalidade. Este consultor político ouviu dois números : R$ 500 milhões e R$ 1 bilhão. Leu também que as novas placas nas marginais, mudando a velocidade, foram encomendadas a uma empresa da capital, ao custo, cada, de R$ 1.000. Um possível candidato a vereador em 2016 garante que o preço oferecido a ele, para a confecção do mesmo tipo de placa, é de R$ 80. Marta Marta Suplicy vai lutar com todas as forças para ser a candidata do PMDB à prefeitura de SP em 2016. Tem um grande recall. Ex-prefeita, consegue ainda reunir uma grande bacia de votos nas margens. Teria condições de explorar bem o céu Educação. Mas não tem vivência com o PMDB. Terá de conquistar o partido e evitar a autossuficiência. Marta, diz-se, não se guia por cartilhas de outros. Esse é um busílis a enfrentar. Andrea Andrea Matarazzo parece ter, hoje, o maior número de apoiadores no Colégio eleitoral que escolherá o candidato tucano. Hoje. Amanhã, porém, pode ser ultrapassado por outros contendores, eventuais pré-candidatos, como o esforçado João Doria. João abre apoios por muitos lados. É conhecido pela capacidade de aglutinar. Não é jejuno em política, como se pensa, sendo um tucano dos velhos tempos. Seu pai, de mesmo nome, foi deputado Federal e cassado. Obstinado, não será fácil para os outros passarem a perna nele. Os deputados Federais Bruno Covas e Ricardo Tripoli pensam em um acordo de união entre eles. Doria João Doria é um aglutinador. Um perfil-imã. Liga um com outro, junta grupos, reúne equipes. E tem extrema facilidade com a expressão, seja na interlocução direta, seja na exposição de rádio e TV. Dos pré-candidatos tucanos, é quem melhor desempenha a arte da palavra. Claro, deverá encontrar fortes adversários - Andrea Matarazzo, por exemplo - nas prévias partidárias. Datena Este consultor acredita que José Luiz Datena não deve ser candidato. Até poderia fazer barulho. Mas a candidatura do apresentador de TV seria um ponto muito fora da curva. Campanha exige muito dinheiro. Datena teria mais essa dor de cabeça. Cunha Eduardo Cunha será o mestre-sala da política nas próximas semanas. Vamos acompanhar como o STF agirá no que diz respeito às investigações envolvendo o presidente da Câmara. Uma coisa parece certa : ele não renunciará ao cargo de presidente da Câmara. Na visão deste consultor, ficará até o término da legislatura. Renan O presidente do Senado, Renan Calheiros, poderá ser contemplado com fatia maior na próxima recomposição do Ministério. Um dos nomes que poderiam ser reconduzidos à posição de ministro é o de Vinicius Lajes, ex-ministro do Turismo, muito bem avaliado por seu perfil técnico e capacidade de liderança. Marketing eleitoral À guisa de orientação, este consultor oferece pequenas lições de marketing eleitoral que podem alimentar o planejamento da campanha de 2016. Planejamento A eleição de um candidato depende do momento, das circunstâncias, da temperatura social, dos versos e reversos da economia, do perfil dos adversários, dos debates e combates na arena eleitoral, dos climas regionais, da força da mídia eleitoral (significando tamanho dos programas eleitorais), dos inputs momentâneos (uma crise abrupta, um caso espetaculoso) - enfim, de uma escala de elementos ponderáveis e imponderáveis. Os fatores imprevisíveis abrem as possibilidades. Única verdade : peru não morre de véspera. Viabilidade Carlos Matus, cientista social chileno, em um magistral estudo sobre Estratégias Políticas, demonstra que a viabilidade de um ator na política tem a muito que ver com a estratégia e seus princípios fundamentais. Eis alguns princípios estratégicos : a) Avaliar a situação ; b) Adequar a relação recurso/objetivo ; c) Concentrar-se no foco ; d) Planejar rodeios táticos e explorar a fraqueza do adversário ; e) Economizar recursos ; f) Escolher a trajetória de menor expectativa ; g) Multiplicar os efeitos das decisões ; h) Relacionar estratégias ; i) Escolher diversas possibilidades ; j) Evitar o pior ; k) Não enfrentar o adversário quando ele estiver esperando ; l) Não repetir, de imediato, uma operação fracassada ; m) Não confundir "reduzir a incerteza" com "preferir a certeza" ; n) Não se distrair com detalhes insignificantes ; o) Minimizar a capacidade de retaliação do adversário. Importar modelos Importar modelos é uma prática lastimável. Na campanha presidencial da Argentina de 1999, uma peça produzida por um marqueteiro brasileiro mostrava o candidato governista, Eduardo Duhalde, cabisbaixo, e um locutor dizendo : "Você acha justo o que estão fazendo com ele ?" Para a machista sociedade argentina, um candidato que se apresenta como perdedor é o retrato de uma tragédia. A peça provocou a ira implacável da mulher do candidato, Hilda. A cultura argentina não cultiva tanto a emoção quanto a brasileira. O trabalho, considerado amador, provocou a queda de Duhalde nas pesquisas. Foram torrados US$ 25 milhões em dois meses. Regrinhas para candidatos Primeira orientação para um candidato : procurar saber para onde vai o vento, descobrir o rumo a seguir. Cada município comporta modelagem própria : condições geográficas, proporção entre votos das áreas urbanas e rurais, demandas regionais (bairros), cultura das comunidades, infraestrutura, colchões sociais (confortáveis/desconfortáveis), linguagens comuns, líderes populares, tipos folclóricos, caciques e elites, meios de comunicação, etc. Colocar todos esses ingredientes no liquidificador e extrair o caldo grosso. Bebericar em doses pequenas apurando o gosto. Adicionar pitadas dos elementos que faltam no caldo. Testar essa receita entre agosto e outubro de 2016.
quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Porandubas nº 459

A coluna de hoje está recheada com historinhas do Churchill. E com um "causo" dos idos de 64. D'água ! D'água ! Historinha dos tempos de chumbo ! Newton Coumbre, pernambucano atrevido, passava em frente ao quartel de Obuzes de Olinda, logo depois do golpe de 64, levando uma bomba d'água enrolada em jornal. Dois sentinelas, fuzis em punho, avançaram sobre ele aos tapas e pontapés : - O que é isso ? - D'água ! D'água ! Mandaram jogar o embrulho no chão e levaram-no até o coronel : - O que é que tem no embrulho ? - Uma bomba d'água. - Por que não disse logo e ficou dizendo "d'água" ? - Ora, Coronel, eu fui dizendo só "d'água" e eles me bateram muito ; imagine se eu dissesse "bomba" ; aí teriam me fuzilado. O mês da Pátria Setembro é o mês da Pátria. 7 de setembro se aproxima. O que é uma Pátria ? Vejamos a definição dada por José Ingenieros, o celebrado escritor argentino, em seu memorável O Homem Medíocre : "Os países são expressões geográficas, os Estados são formas de equilíbrio político e uma Pátria, mais que isso, é um sincronismo de espíritos e de corações, uma comunhão de esperanças". Temos motivo para comemorar a Pátria ? Ou estamos ainda longe de enxergar seus pilares morais ? Deixo a pergunta na consciência de cada um. Buraco no orçamento O Orçamento enviado ao Congresso, com 30 bilhões de déficit, ameaça o grau de investimento do país. O governo esperava cobrir esse rombo com uma eventual receita da CPMF. Implodida em tempo. Pois se chegasse às casas legislativas, seria fragorosamente derrotada. Foi um aviso do vice-presidente da República, Michel Temer, que salvou o governo de mais uma derrota. Ele, Michel, nem sabia dessa tratativa desastrosa do Palácio do Planalto. E avisou que não trabalharia a seu favor. Sem essa receita, o Orçamento chegou ao Congresso exibindo um formidável buraco. Mas de que adiantaria cobrir o buraco com uma improvável receita da CPMF ? Ora, ela seria derrotada e o buraco continuaria. Churchill 1 O General Montgomery estava sendo homenageado, pois venceu Von Rommel na batalha da África, na 2ª Guerra Mundial. Discurso do General Montgomery : "Não fumo, não bebo, não prevarico e sou herói." Churchill ouviu o discurso e, com seu eterno charuto, retrucou : "Pois é, eu fumo, bebo, prevarico e sou chefe dele." Aumento da carga ? A Receita apresenta medidas para elevação de carga tributária com o objetivo de arrecadar cerca de R$ 11,2 bilhões em 2016. Entre elas : a revisão nos cálculos do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre Lucro Líquido ; a tributação de bebidas como vinhos e destilados ; o aumento do IOF em operações de crédito do BNDES e a revisão da desoneração do PIS/COFINS de computadores, smartphones e tablets. Atualmente, de tudo o que o indivíduo produz, 35% retornam para os governos estaduais e federal para o pagamento de impostos. Afastamento de Temer O articulador político do governo, Michel Temer, pouco a pouco se afasta dessa tarefa. É conhecida sua índole de harmonizador, pacificador, construtor de consensos. Diz-se dele : é algodão entre vidros. Ocorre que não tem recebido tratamento condigno com suas altas funções. Frequentemente, o Planalto deixa-o à margem de importantes decisões. E, pasmem, cobra dele aprovação para matérias que passaram ao largo de seu conhecimento e aprovação. É fácil deduzir que alguns negam a ele a lealdade que ele devota à presidente. O que fazer ? O que o âmago recomenda : um afastamento lento e gradual. Sem rupturas bruscas nem liturgia espalhafatosa. Essa é a impressão que se tem. Se o governo tinha dificuldades na articulação política, imagine-se agora sem o comando efetivo de Michel Temer nessa frente. Duas bandas O PMDB tem duas bandas, uma que se inclina a se afastar do governo imediatamente, outra que prega um afastamento lento e gradual. A banda que quer se afastar de imediato faz mais barulho, na esteira da desorganização da gestão e da baixíssima aprovação da presidente. Outra, pragmática, que conserva posições na estrutura governativa. Mas, na hora H, mais conveniente ao partido, essas alas tendem a um acordo. Congresso do partido Um exemplo das duas visões do PMDB se dá em relação ao Congresso partidário, marcado inicialmente para 15 de novembro. Seria o momento para o partido apresentar seu Programa ao País, sua proposta de candidaturas no maior número possível de prefeituras e a decisão sobre candidatura própria à presidência em 2018. Mas há uma ala que defende congressos regionais, uma forma de evitar conflitos e dissensões por ocasião de um grande evento nacional. Essas posições ficarão mais claras no semestre em curso. Churchill 2 Telegramas trocados entre o dramaturgo Bernard Shaw e Churchill, seu desafeto. Convite de Bernard Shaw para Churchill : "Tenho o prazer e a honra de convidar digno primeiro-ministro para primeira apresentação de minha peça Pigmaleão. Venha e traga um amigo, se tiver". Resposta de Churchill : "Agradeço ilustre escritor honroso convite. Infelizmente não poderei comparecer à primeira apresentação. Irei à segunda, se houver". A luz de Lula Luiz Inácio continua muito preocupado com o futuro do PT. Quer ser a luz no fim do túnel. Ensaia viagens pelo país como receita para alimentar a militância. O PT fechará esse ciclo político sob a imagem totalmente chamuscada. Lula quer reinventar a sigla. Como ? Refazendo seus rumos e fechando compromissos entre o PT e os movimentos sociais. Logo, deduz-se : para sobreviver, a sigla precisa de resgatar sua imagem perante os bolsões mais críticos e exigentes. Significa um PT reinserido na margem esquerda do arco ideológico. Hoje, circula no centrão desideologizado. Uma sigla como outra qualquer. AMLID A presidente parece uma governanta à procura de um rumo. Não sabe para onde e como caminhar. Perde a articulação política de Michel Temer, começa ela mesma a ouvir as queixas de parlamentares, afundando-se na baixa política, cerca-se de uma corte de áulicos, não sabe de onde tirar mais dinheiro para pagar as contas do governo e continua a expressar uma linguagem confusa. DILMA desenha a imagem de AMLID, o seu contrário, um nome estranho. Churchill 3 Quando Churchill fez 80 anos, um repórter de menos de 30 foi fotografá-lo e disse : - Sir Winston, espero fotografá-lo novamente nos seus 90 anos. Resposta de Churchill : - Por que não ? Você me parece bastante saudável. Barbosa, mais força Nelson Barbosa teria tomado o bastão das mãos de Joaquim Levy. É o que se comenta nesses últimos dias. Expande-se a impressão de que o ministro do Planejamento tem se tornado mais duro e inflexível do que o ministro da Fazenda, ao gosto da presidente Dilma. Tem, assim, entrado na seara do Joaquim. De leve. Minoria ? Perguntam-me : é possível a presidente Dilma governar sem maioria na Câmara dos Deputados ? Respondo : não vejo como. Pedaladas e contas de Campanha As análises das contas da Campanha pelo TSE e das pedaladas fiscais do governo pelo TCU constituem os dois fantasmas que amedrontam a presidente Dilma. Para as pedaladas, sobe o gráfico de desaprovação, enquanto o gráfico das contas de campanha desce. Mas, cada dia sua agonia. Pode ser que, na próxima semana, as coisas se invertam ou fiquem mais desajustadas. Churchill 4 Bate-boca no Parlamento inglês. Aconteceu num dos discursos de Churchill em que estava uma deputada oposicionista, Lady Astor, conhecida pela chatice, que pediu um aparte (sabia-se que Churchill não gostava que interrompessem os seus discursos, mas concedeu a palavra à deputada). E ela disse em alto e bom tom : - Sr. Ministro, se Vossa Excelência fosse o meu marido, eu colocava veneno em seu chá ! Churchill, lentamente, tirou os óculos, seu olhar astuto percorreu toda a plateia e, naquele silêncio em que todos aguardavam, mandou : - Nancy, se eu fosse o seu marido, eu tomaria esse chá com prazer ! Reforma política Espera-se com muita expectativa o relatório do habilidoso senador Romero Jucá (PMDB-RR) sobre a reforma política. Jucá está atento à real politik, à política como ela é. Certamente, deverá cuidar de aspectos que a Câmara dos Deputados deixou ao largo. Trata-se de um dos senadores mais experientes e gabaritados do Senado. Aplausos Se o governo Dilma recebe apupos dos setores produtivos, o vice-presidente da República, Michel Temer, colhe aplausos. Nesta última segunda-feira, durante palestra para uma grande plateia de empresários e executivos, Michel foi aplaudido duas vezes : a primeira, ao dizer que "não há mais espaço para aumento de carga tributária no pais" e a segunda, quando disse que não é possível governar com 33 partidos, criticando o amalgamento das siglas partidárias, que perderam suas doutrinas e ideologias. Aécio na berlinda Ninguém se encontra a salvo da lupa dos controles. O TSE também investiga as contas do senador Aécio Neves na campanha de 2014, quando disputou a presidência. Quem se salvou, por enquanto, foi o senador Antonio Anastasia. Picciani afastado ? Conversa de bastidor : Leonardo Picciani, guindado à liderança do PMDB pelas mãos do ex-líder da bancada e hoje presidente da Câmara, Eduardo Cunha, teria acertado seus cargos na estrutura governativa. Conversou com a presidente Dilma. Diz-se que seria uma traição a Cunha. FHC e o Psol Esta é surpresa : o ex-presidente Fernando Henrique, que sempre foi acossado pelo Psol, recebe a liderança deste partido de extrema-esquerda e promete ajudar a sigla, tentando evitar que a cláusula de barreira alcance seus limites. A durona ex-deputada Luciana Genro liderou a conversa com FHC. No confessionário Numa cidadezinha de Minas, Padre Elesbão estava esgotado de tanto ouvir pecados, ou, como dizia, besteiras. Decidiu moralizar o confessionário. Afixou um papelão na porta da Igreja, dizendo : O Vigário só confessará :2ª feira - As casadas que namoram3ª feira - As viúvas desonestas4ª feira - As donzelas levianas5ª feira - As adúlteras6ª feira - As falsas virgensSábado - As "mulheres da vida"Domingo - As velhas mexeriqueiras O confessionário ficou vazio. Padre Elesbão só assim pode levar vida folgada. Gabava-se : - Freguesia boa é a minha... lá, mulher só se confessa na hora da morte !
quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Porandubas nº 458

Abro a coluna com uma historinha de sapiência Em 5 anos, tudo pode ocorrer Um poderoso sultão, sábio entre os sábios, possuía um camelo muito inteligente. Obedecia a todas as ordens que nem precisavam ser emitidas de viva voz. Faltava-lhe apenas o dom da palavra. Esse detalhe entristecia sobremaneira o sultão. Um dia, decidiu convocar o Grande Conselho e chamou o grão-vizir. - Quero que ensine meu camelo a falar ! - Mas isso é impossível. - Cortem-lhe a cabeça ! Tragam-me o adjunto ! Mesma afirmação de desejo sultanesco, mesma resposta, mesma sentença. A cena repetiu-se diversas vezes e cabeças rolaram. Exasperado o sultão declarou. - Aquele que ensinar meu camelo a falar será meu grão-vizir. Silêncio ! O sultão repetiu a exortação. Eis que surgiu um humilde ajudante de cozinheiro. Disse : -Dá-me, ó incomparável senhor, um prazo de cinco anos, e farei falar teu camelo. Estupefação geral. Seguida do cumprimento da promessa. -Doravante, és meu grão-vizir ! Mas se falhares, sabes o que te espera ! - Bem sei ! Encantado, o jovem fez profunda reverência e saiu correndo para dar a boa notícia à esposa. - Infeliz, acabas de assinar tua condenação. - Não é bem assim, meu bem. Pedi cinco anos. Você sabe que muitas coisas poderão acontecer em cinco anos : morre o camelo, morre o sultão... (Fábula enviada pelo atento Alexandru Solomon. "Nada a ver com o Mensalão, Lava Jato e outras questiúnculas....") O fio das tensões O fio das tensões continua a ser puxado. A acareação entre Aberto Youssef e Paulo Roberto Costa na CPI da Petrobras deixou mais interrogações que certezas. O primeiro garante que depoimentos de novos delatores deverão mostrar se houve ou não propina para a campanha de Dilma. O segundo disse nunca ter tratado desses temas com Lula ou Dilma. Youssef chegou também a dizer que tudo era decidido sob o conhecimento do Palácio do Planalto. O fio continuará a ser puxado. Impeachment muito longe A ideia de impeachment vai se afastando do terreno da probabilidade. A base governista toma fôlego com os 500 milhões de reais que estão sendo distribuídos para atender emendas parlamentares. É oxigênio a vitalizar o corpo do governo Dilma. Eduardo Cunha, por sua vez, não quer ver sua imagem dentro do pacote da vingança. Teme perder em plenário eventual pedido de abertura do processo de impeachment. E desafia o MP a mostrar prova contra ele. Até agora, diz, não se viu um cheque, contracheque, ordem de pagamento, uma prova documental que o envolva. Saídas para a crise I Uma agenda que contemple saídas para a crise começa a ser discutida no Congresso. E na mídia. A TV Cultura, a OAB/SP, o Núcleo de Estudos Estratégicos da USP e Assembleia Legislativa de São Paulo promoverão intenso debate sobre o assunto. Analisemos a questão. A bonança só virá após passar a tempestade. A borrasca atinge principalmente o atlântico da economia. Ora, a calmaria nas águas da economia não virá naturalmente. Depende de fatores externos e internos. Os externos se ligam à conjuntura internacional. Não dependem do nosso controle. Os internos abrigam medidas para conter a gastança e aumentar a poupança interna. A demora dessas medidas prolongará a tempestade. Daí a pressa do ministro Joaquim Levy pela aprovação do pacote fiscal. Ocorre que chegou ao Senado já desidratado. Por isso, a calmaria não virá de imediato. Saídas para a crise II Para complicar a equação, há outro oceano que também está borrascoso. É o oceano índico da política. Suas Excelências, os congressistas, lutam para manter suas reservas eleitorais. Precisam, para tanto, mostrar serviço em suas regiões. Carecem de verbas, recursos para atender compromissos e promessas. Acabam de receber 500 milhões tirados de um orçamento apertado. O que isso significa ? Uma retirada pesada de grana dos cofres do Tesouro, que vai significar mais obstáculo para o ministro Levy cumprir a missão de equilibrar as ondas econômicas. E, agora, como resolver esse aparente impasse ? Saídas para a crise III Uma boa alternativa seria a formação de um pacto pela governabilidade, reunindo Executivo, Legislativo e os setores produtivos. Será inviável qualquer alternativa que não imponha sacrifícios e limites. Os círculos de negócios terão de se conformar com baixa lucratividade no período de vacas magras, os políticos precisam compreender que o ciclo de aperto exige contenção de despesas e menos recursos para atendimento às demandas políticas e o Executivo, em meio às pressões e contrapressões, deverá se esforçar para evitar o naufrágio de sua embarcação. Não será fácil. A política chegou a um curso de intensa polarização. As bandas estão açodadas. Os setores produtivos estão no limite de suas possibilidades. Saídas para a crise IV O pacto pela governabilidade comportaria, necessariamente, um amplo programa de mudanças, a partir das reformas política, eleitoral, fiscal/tributária. O apaziguamento dos contrários, pelo menos no ciclo mais acirrado da crise, é tarefa hercúlea. Como chegar a um consenso em matérias tão polêmicas como sistema de voto, tributos e redistribuição de receitas, guerra fiscal, etc.? Se houver vontade política, tudo se conseguirá. Com repartição de sacrifícios, claro. Quem comandará o processo ? Que perfil terá condições de comandar este processo ? A atual mandatária ? Teria ela condições de fazer voltar a confiança, a auto-estima, a esperança dos brasileiros ? Esse é o imbróglio da toda a questão. A maioria das pessoas acha que ela não teria condições de chefiar um novo projeto para o Brasil. Muitos apontam o vice-presidente da República, Michel Temer, como eventual artífice dessa construção. Mas essa também é uma alternativa complicada, pois exigiria a renúncia da presidente. Este termo não combina com a índole da mandatária. E o impeachment ? Hipótese muito distante. Corajosa, admirada Um dirigente de uma grande empresa brasileira confessa a este escriba : "a presidente Dilma faria um gesto de grandeza cívica caso renunciasse. Não apareceria como derrotada. Emergiria como pessoa corajosa. Melhoraria sua imagem. Reconheceria as dificuldades da conjuntura e a impossibilidade de levar adiante um projeto de reconstrução nacional. Seria aplaudida. Não sairia como derrotada. E até daria chances ao PT de se viabilizar, como partido, às eleições de 2018, com Lula candidato. Esse desenho seria o mais viável e o menos curto para o Brasil refazer o caminho do desenvolvimento". Nome, quem ? As saídas para a crise esbarram, portanto, em um nome. Quem guiará o país nos próximos tempos ? O vice é o nome mais indicado. Mas, por sua índole, não é dado a maquinações, emboscadas, saídas ao arrepio da lei. Trata-se de um professor de Direito Constitucional que preza a lei a ordem. A par da fidelidade. A não ser que seu partido, o PMDB, tome a decisão de se afastar do governo. Essa é outra história. E essa data é mais ou menos consenso, a partir da decisão a ser tomada pelo Congresso do partido em novembro. Nessa ocasião, o PMDB apresentará um projeto ao país e tomará a decisão sobre candidaturas próprias aos pleitos de 2016 e 2018. O grande Rosa Guimarães Rosa, o grande escritor mineiro, prezava o que chamava de 'Relações Exteriores', ou seja, suas relações pessoais com terceiros. O velho Rosa alinhava as normas de sua 'mineirice', dentre as quais Zé Abelha nos brinda com essas : "Combater a expansividade, em todas as suas formas. De uma maneira geral, é preciso guardar silêncio". "Dominar todos os impulsos. Não comunicar notícias, não transmitir novidades". "Never explain, never complain". (Nunca explicar, nunca queixar-se !) "Não ser afirmativo (dogmático) nem demonstrativo (explicativo)". "Não expressar nunca as nossas impressões, especialmente as que resultam das conversações que ouvimos". "Cada exclamação, cada palavra, cada gesto - conservador - aumentam nossas reservas". "Moderar todos os movimentos expressivos e dar apenas mui ligeiras mostras de emoção, surpresa, alegria, descontentamento". Redução de ministérios Reduzir os ministérios de 39 para 29 tem um efeito mais simbólico. Dá ideia de corte de despesas, enxugamento da máquina administrativa. Mas é algo como cobrir um santo e descobrir outro. As estruturas serão unificadas, mas os programas e equipes deverão apenas mudar de status no papel. Por quê ? Ora, os partidos da base não vão querer perder os espaços conseguidos na velha estrutura. Poderemos assistir a uma briga de foice às claras, caso as mudanças sejam feitas. Terceirização Terça-feira, um importante grupo de dirigentes de entidades ligadas à terceirização e ao trabalho temporário foi recebido pelo presidente do Senado, Renan Calheiros. Que teve oportunidade de ouvir sugestões, observações e aspectos polêmicos do projeto 4330, que tramita pelo Senado. Falaram na oportunidade Vander Morales, presidente da Fenaserhtt e do Sindeprestem (Federação Nacional e Sindicato das Empresas de Terceirização e de Trabalho Temporário no Estado de São Paulo) ; Genival Beserra, presidente do Sindeepres (Sindicato dos Empregados em Empresas de Prestação de Serviços a Terceiros) ; Vivien Mello Suruagy, presidente do Sinstal (Sindicato Nacional das Empresas Prestadoras de Serviços em Telecomunicações) ; Jorge Vasquez, coordenador da Câmara de Trabalho Temporário do Sindeprestem ; Amâncio Barker, assessor político do Sindeepres ; José Carlos Teixeira, presidente do Sinserht (Sindicato das Empresas de Prestação de Serviços e Trabalho Temporário no Estado de Minas Gerais) ; Mario César Ribeiro, presidente do Sindeepres (Sindicato das Empresas de Prestação de Serviços no Estado do Espírito Santo). Este consultor/escriba fez a coordenação do Grupo. Desemprego na GSP A taxa de desemprego na região metropolitana de SP aumentou de 13,2% em junho para 13,7% em julho, de acordo com a Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), realizada pela Fundação Seade e pelo Dieese. Foi a sexta alta mensal consecutiva. Em julho do ano passado, o desemprego na região era de 11,4%. No município de SP, o desemprego subiu de 13,5% para 13,8%, enquanto nos demais municípios da Grande SP houve aumento de 12,8% para 13,6%. Ética e razão Uma questão recorrente : o que impulsiona a onda ética que se propaga por quase todas as regiões brasileiras ? Em primeiro lugar, o despertar da racionalidade. O Brasil está deixando para trás o ciclo da emoção. A sociedade toma consciência de sua força, da capacidade que tem para mudar, pressionar e agir. Vivemos em pleno ciclo da autogestão técnica. Trata-se de uma aculturação lenta, porém firme, no sentido do predomínio da razão sobre a emoção. O crescimento das cidades e, por consequência, as crescentes demandas sociais ; o surto vertiginoso do discurso crítico, revigorado por pautas mais investigativas e denunciadoras da mídia nacional ; o sentimento de impunidade que gera, por todos os lados, movimentos de revolta e indignação ; e, sobretudo, a extraordinária organicidade social, que aparece na multiplicação das entidades intermediárias e nos movimentos de rua, hoje um poderoso foco de pressão sobre o poder público - formam, por assim dizer, a base do processo de mudanças em curso. Melhorar o discurso Como melhorar o discurso ? Lubrificando suas alavancas. Há quatro tipos : 1. Alavancas de adesão - Discurso voltado para fazer com que a população aceite os programas, associando-se a valores considerados bons. Nesse caso, o candidato precisa demonstrar a relação custo-benefício da proposta ou da promessa. 2. Alavancas de rejeição - Discurso voltado para o combate a coisas ruins (administrações passadas, por exemplo). Aqui, o candidato passa a combater as mazelas de seus adversários, os pontos fracos das administrações, utilizando, para tanto, as denúncias dos meios de comunicação que funcionam como elemento de comprovação do discurso. 3. Alavancas de autoridade - Abordagem em que o candidato usa a voz da experiência, do conhecimento, da autoridade, para procurar convencer. Sob essa abordagem, entram em questão os valores inerentes à personalidade do ator, suas qualidades pessoais. Quando se trata de figura de alta respeitabilidade, o discurso consegue muita eficácia. 4. Alavancas de conformização - Abordagem orientada para ganhar as massas e que usa, basicamente, os símbolos da unidade, do ideal coletivo, do apelo à solidariedade. É quando o político apela para o sentimento de integração das massas, a solidariedade grupal, o companheirismo, as demandas sociais homogêneas.
quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Porandubas nº 457

Abro a coluna com pitadas de humor, pinçadas dos hilários "causos" narrados pelo amigo Sebastião Nery, em seu Folclore Político. Uni-vos Do escritor Graciliano Ramos ao escritor James Amado (irmão caçula de Jorge Amado) - A Revolução Socialista não foi feita no Brasil por causa do português. Pichavam nos muros o slogan de Marx : - "Trabalhadores do mundo, uni-vos". - Mas quem pichava e quem lia não sabia o que era uni-vos. Nem você, Maria ? Romeu de Avelar, jornalista, escritor, candidatou-se a deputado em Alagoas. Um desastre. Na seção em que votou com a mulher, apareceu apenas um voto. - Mas, Maria, nem você votou em mim ? - Querido, todo dia, no café da manhã, você me dizia que já estava eleito. Para não desperdiçar meu voto, votei no compadre Chiquinho. O jardim Pedro Duarte de Oliveira, chefe de gabinete do deputado Guilherme Palmeira, presidente da Assembleia Legislativa, saiu candidato a vereador em Maceió, pela Arena. Foi fazer comício em um bairro : - Vejo aqui um jardim. Os homens são as plantas. As crianças são as rosas. As mulheres, as trepadeiras. Não acabou. Derrubaram-no do palanque. P. S. Bem feito, queria bancar o machista (Nota da coluna) João Botelho (1908-1976), interventor no PA, ex-deputado estadual e Federal, constituinte em 1946, fazia, ele próprio, o alistamento eleitoral do interior. Foi a Tucuruí. - Caro amigo : o seu nome ? - Pedro. -Pedro ? Nome do apóstolo, fundador da Igreja, discípulo de Cristo. "Pedro, tu és a pedra e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja". Belo nome, belo nome. Pedro de quê ? - Da Silva. - Silva ! O senhor sabe que pertence a uma das famílias mais importante do Brasil ? Não há Estado, cidade, vilarejo, em que não haja um parente seu. Silva, Pedro Silva. Que nome ! -Data do nascimento ? - 7 de setembro de 1930. - O meu dileto amigo nasceu no Dia da Pátria, no ano da grande revolução. É um privilegiado. Pedro Silva do dia 7 de setembro, é demais. Nomes de seu distinto pai e de sua digníssima mãe ? - Meus pais são falecidos, deputado. - Console-se, meu amigo. No dia do Juízo Final, ressuscitaremos todos. E não esqueça de dar seu voto aqui para seu amigo. Marcelo Navarro Este eu conheço. Uma das melhores cabeças de juízes do Brasil. Um estudioso do dever. Um schollar no melhor sentido do termo. Um perfil com pós-doutorado, raro no Brasil. Marcelo Navarro Ribeiro Dantas, desembargador Federal do Tribunal Federal da 5ª região, foi indicado pela presidente Dilma para o STJ. Apoiado pelas Academias e pelos maiores expoentes do Direito e da Justiça no Brasil. Unanimidade entre governadores do Nordeste com os aplausos de partidos políticos. Por seus méritos. A imprensa, sem ir a fundo, vai longo dizendo : indicação de um fulano ou de um beltrano. Errada. Deveria conhecer o intelectual, o preparado Marcelo. Um potiguar que orgulha o universo do Direito e da Justiça. A onda de agosto I Vamos à análise sobre a onda de manifestações de agosto, a terceira, ocorrida domingo passado. Eis o que mostra : 1. A consciência crítica da sociedade, como um todo, se eleva a cada onda ; 2. Não importa a quantidade de pessoas ; o foco, a unidade de ação e o pensamento, agora, passaram a evitar a dispersão ; 3. O evento foi expressivo, mas não estrondoso ou espetacular ; 4. As classes médias continuam dando o maior tom na orquestra social ; 5. SP, como epicentro dos acontecimentos de rua, exerce a função de círculo concêntrico maior, disseminando a estética da mobilização pelos espaços nacionais ; 6. Lula, como um dos três alvos principais - ao lado de Dilma e do PT - foi a grande novidade. A onda de agosto II 7. A corrupção, a velha política, os partidos políticos serviram de pano de fundo para os discursos, ao lado das palavras de ordem pedindo o afastamento da presidente e alvejando Lula e o PT ; 8. O foco do discurso tornou-se mais preciso que as mensagens dispersas de eventos anteriores ; 9. O refluxo quantitativo ocorreu na esteira de uma ação política mais vigorosa, com Dilma correndo regiões do país e passando a conversar com líderes partidários. 10. O trabalho do articulador político, vice-presidente Michel Temer, tem sido fundamental para dar respiro ao governo ; 11. A agenda Brasil, capitaneada pelo presidente do Senado, Renan Calheiros, ajudou Dilma a sair do canto do ringue ; 12. A tese do impeachment se arrefece, também por falta do leit motiv e sob o argumento de que qualquer ato, sem a cobertura da lei, é golpismo. Os caminhos O caminho mais apontado, o do impeachment, fica distante. Sua possibilidade depende de desaprovação das pedaladas fiscais pelo TCU ou pela desaprovação de contas de campanha pelo TSE. Sejamos claros : para que Dilma seja impedida pelo Congresso, é preciso o fator causal. Até o momento, trabalha-se com hipóteses. Vale esclarecer : nada ocorrerá fora da letra constitucional. Driblar a lei seria golpismo, coisa inviável na atual conjuntura. Agirão como indutores do estado social componentes do que chamamos de Produto Nacional Bruto da Infelicidade (PNBInf) : dinheiro curto, carestia de vida, desemprego, serviços urbanos precários, etc. O balão da opinião pública Sob essa paisagem devastada, as manifestações ganham volume e a animosidade social se expande. O fluxo das pedras do dominó seria este : balão da opinião pública inflado pela Lava Jato ; economia estrangulada puxando a insatisfação ; indignação manifesta nas ruas ; força social, como aríete, pressionando Tribunais e empurrando vãos dos Poderes ; Parlamento tomando decisões sob o calor das ruas. Ou, no contraponto, pedras do dominó balançando, mas não caindo. Palácio do Planalto pichado, porém, em pé. Articulação do governo As hipóteses de agastamento se enfraquecem na esteira de forte articulação política sob a esfera do governo. Pode ser que a operação Lava Jato traga mais dados que atinjam diretamente a presidente, Lula e outros. O imponderável está à espreita. Mas, a continuar a onda informativa nos volumes que vemos, a presidente Dilma chegará ao final de seu mandato. Desgastada, mas não impedida. A tese da continuidade é, portanto, a mais provável. Renúncia está fora de seu calendário. A substituição pelo vice presidente Michel Temer também é uma hipótese, sempre vinculada à deterioração das molduras econômica e política. Efeitos Quais os efeitos da mobilização do dia 16 sobre a vida institucional ? Do ponto de vista de resultados imediatos, nada. Os efeitos são indiretos : pressão sobre a esfera política ; pressão sobre os órgãos de controle e o Judiciário (TCU, TSE, MP, etc.) ; consolidação da camada crítica da sociedade sobre a velha política ; aceleração de votação de temáticas urgentes para equacionamento da crise ; oxigenação do clima social. Descendo a ladeira A economia, como sempre lembro, é a locomotiva do trem. Se continuar a agravar o bolso dos consumidores, crescerá a insatisfação. E, com esta, a crise política também entra no atoleiro. Na frente política, o acirramento tem data e hora para acontecer. Nas próximas duas semanas. Nesse ínterim, Rodrigo Janot passará pelo crivo do Senado. E, na sequência, deverá puxar de seu bornal os primeiros políticos da operação Lava Jato : o senador Fernando Collor e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Ambos rechaçarão as denúncias. O verbo subirá ao patamar mais elevado da fervura. O STF abrirá o capítulo político da Lava Jato. O Brasil descortinará a balbúrdia da Torre de Babel. A ajuda de Renan O presidente do Senado, Renan Calheiros, quer resolver a parada das desonerações e fechar o pacote fiscal para ajudar o Governo. "Há um espaço muito grande no Senado Federal no sentido de tirar aquele cadáver insepulto da nossa pauta", afirma. A ideia de Renan é trabalhar com líderes uma estratégia que leve a aprovação da pauta e abrir caminho para a retomada normal dos trabalhos. Sobre o projeto da reforma do PIS/COFINS, lembra que há um esforço para que essa discussão comece. Aguarda a proposta do governo Federal. Contra o impeachment Algumas confederações, a partir da CNI, elaboram um documento contra a ideia do impeachment da presidente Dilma. Defendem o império da ordem. Eduardo e Renan Lauro Jardim, no seu Radar de Veja, registra a diferença entre Eduardo Cunha e Renan Calheiros, na perspectiva de um peemedebista não identificado : Renan Calheiros não tem fígado ; e Eduardo Cunha só tem um órgão, o fígado. Façam suas ilações. Saídas para a crise ? Há diagnósticos a rodo, como se diz no vulgo. Instituições, associações, federações, sindicatos, enfim, entidades de todos os tipos fazem os mais completos apanhados sobre a realidade brasileira. Mas, do ponto de vista de saídas, propostas, alternativas de curto, médio e longo prazos, quais as mais viáveis ? Como operacionalizá-las ? Nessa direção, a TV Cultura de SP, com o apoio da OAB/SP, Centro de Estudos Avançados da USP e da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, realizará uma campanha intitulada "Saídas para a Crise". Constará de uma densa agenda, a se iniciar dia 27 próximo, composta por programas especiais, inclusive dois programas Roda Viva ; debates entre especialistas em seminário de dois dias na sede da OAB ; produção de um documento a ser entregue aos comandos institucionais e, posteriormente, a edição de um livro. Lula não está morto Luiz Inácio está combalido dos tiroteios que vem sofrendo na mídia, principalmente pelos comentaristas de política. Registrou-se, nos últimos dias, um tiro ao alvo ao coração de Lula. Dados sobre suas finanças foram vazados. O Instituto Lula foi atingido por uma bomba caseira. Terá grandes dificuldades de voltar a comandar o país. Seu gogó palanqueiro não está tão afiado como antes. Os círculos concêntricos produzirão marolas no centro do lago, ajudando a desconstruir sua força junto às margens. Mas a política é como Fênix ; seus atores podem ressurgir das cinzas. Lula não está morto. Senador ou deputado, quem sabe, Lula seria o refundador do carcomido PT. Ele pode reaparecer nos cenários do amanhã como o opositor ao status quo. Lula conhece o caráter mutante das massas. A conferir. Debray O filósofo e ex-guerrilheiro francês Regis Debray esteve, semana passada, no Brasil. Vejam o que disse ao jornal O Globo : "Na década de 60, os comunistas tinham certeza que iriam colocar as religiões nos museus. Mas o que vemos nos anos 2000 é justamente o inverso : a religião colocou o comunismo nos museus. O distanciamento da política volta a trazer um sentimento de pertencimento étnico e religioso, que leva à sensação de proteção, autoestima e dignidade que antes era oferecida pelo sistema político. E quanto mais a política se corrói, mais os movimentos religiosos passam a assumir o seu papel - afirma, citando a desintegração dos partidos laicos em países como Iraque, Síria e Índia. - Os netos vão a mesquitas, templos e sinagogas. Os avós não estavam nem aí para isso. Quiseram estatizar o Islã, e agora o Islã está tomando o Estado". PT nas ruas O PT comanda, dia 20, uma manifestação pública em "defesa da democracia". É prudente ? Contará com pouca gente. Mas é um ato para energizar as bases. O PT começou, ontem, a campanha de chamamento com as inserções publicitárias a que tem direito. Vai acirrar o conflito. Correção do FGTS O governo deverá apresentar proposta para um aumento escalonado do FGTS a partir de 2016. "O projeto está na pauta de hoje e está sendo discutido um acordo que dê ganhos ao trabalhador e que se tire as dúvidas que tem sobre o impacto do financiamento social da habitação. Está se tentando chegar um acordo que escalone a entrada, o aumento dos rendimentos das contas do FGTS, a partir de 2016". É o que diz o líder do PMDB, Leonardo Picciani. Perguntas Este consultor tem tentado responder a perguntas complexas. Vejam algumas : a economia encurtará mais o dinheiro no bolso ? A inflação chegará aos dois dígitos ? O governo terá arsenal para batalhar por sua salvação ? Haverá espaço para acomodar a nova base política ? Terá condições de resistir ao tiroteio ? Nos últimos dias, a agenda Brasil abriu um respiro nos pulmões governamentais. Na arena de guerra, prevê-se que o fogo da PGR queimará o comandante da Câmara. Terá, porém, ele condições de resistir caso o STF acolha algum pedido para seu afastamento ? É certo que a luta entre as instâncias de investigação (MP, Judiciário, PF) e a tropa política será longa, ensejando conflitos até as margens eleitorais do amanhã. Quem vencerá ?
quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Porandubas nº 456

Abro a coluna com três historinhas-aperitivo, a primeira em homenagem ao advogado, pelo memorável 11 de Agosto. O advogado O advogado, no leito de morte, pede uma Bíblia e começa a lê-la avidamente. Todos se surpreendem com a conversão daquele homem e perguntam o motivo. O advogado doente responde : "Estou procurando brechas na lei". Mundo doido... É o diabo, o mundo endoidou ! Exclamava Maneco Faustino nas ruas de Limoeiro/CE. E completava : - Veja vosmicê : tá se vendo estrela ao mei dia ; já hai galinha com chifre ; cangaceiro dá esmola pra fazer igreja ; já apareceu bode que dá leite ; chove no CE em agosto. Muié já se senta em cadeira de barbeiro. Pedro Malagueta confirmava : - Tá mesmo, cumpade, o mundo endoidou. Tenho três filha, duas casada e uma solteira : as duas casada nunca tiveram menino ; agora a solteira todos os ano me dá um neto... Que prole... Da BA, vem a historinha. José de Almeida, contador do Banco do Brasil, fazia o cadastro da agência. Um dia, chega Heroíno Pita, fazendeiro. Que respondeu na bucha o formulário : nome, idade, imóveis, renda anual, dívidas. Aí vem a pergunta : - Quantos filhos o sr. tem ? - Oito filhos. - Tudo isso ? O senhor tem uma prole grande. Heroíno, entre sorridente e cabreiro, faz o gesto com as duas mãos : - Não, senhor. É normal. Normal. Lesma e camaleão O que a lesma tem a ver com o camaleão ? Aparentemente, nada, a não ser o fato de que ambos podem se arrastar pelo chão. Estudando mais atentamente as qualidades desses dois animais, vemos que eles têm algo em comum : a capacidade transformativa. O pequeno molusco, sufocado por uma camada de sal, derrete e se transforma em água. O garboso lagarto tem a capacidade mimética de vestir as cores do ambiente em que se instala, saindo do verde das folhas para o marrom dos galhos secos com a maior facilidade. Pois bem : os dois transformistas servem de exemplo a muitos políticos, dentre eles importantes lideranças. Que não são o que dizem ser. Cada dia com sua agonia A constatação é geral : o governo Dilma definha a cada dia. Um torpor parece tomar conta do corpo governativo. A presidente até tem se esforçado para sair do mesmo lugar. Convoca reuniões com ministros, começa a fazer um périplo pelo país, mas e daí ? As conversas não têm dado resultado. Fala-se que Lula deu sugestão de fazer uma reforma ministerial "revolucionária" para recompor a base governista. Reformar com a ideia de diminuir a participação do PT e aumentar a participação de outros partidos. Ora, Ministérios sem recursos e com ministros com restrito poder de decisão ? Rejeição Ocorre que a alta rejeição do governo Dilma não facilita reforma ministerial nem ajuda a estratégia de reorganização da base governista. O corpo parlamentar navega na onda da opinião pública. Não se entusiasma com a ideia de se engajar plenamente na estrutura governamental. O governo, por sua vez, quer garantir a fidelidade de 200 parlamentares, no mínimo. No início da legislatura, esse número era de 360. O próprio PT não se sente confortável para aprovar as linhas do duro pacote fiscal do governo. Afastamento da presidente Não é de todo infundada a versão de que o próprio PT tem interesse no afastamento da Dilma. Com uma reprovação recorde na história da República, a presidente facilitaria o caminho do PT, em 2018, se saísse do cenário. Com Lula comandando o palanque, o partido poderia se aproximar do pleito de 2018 com candidato próprio, ele mesmo, Luiz Inácio, portando o discurso de... pasmem... oposição. Lula poderia bradar : esses que estão governando o país estão nos levando para o beleléu. E tome blábláblá... Poderia comover e convencer as massas. A estratégia é maquiavélica, mas faz parte do jogo do poder. A força das ruas Este analista tende a defender a tese de que qualquer alternativa de afastamento da presidente há de passar, necessariamente, pelas ruas. Só a força do povo tem condições de empurrar o Congresso nessa direção. Claro, se houver um fato concreto, o leit motiv, a justificar posicionamento do Parlamento. Não haverá alternativa fora da letra constitucional. Para tanto, o TCU ou o TSE precisam dar um passo adiante na rota do impedimento, ou seja, desaprovar as contas da presidente. Mas só as ruas poderiam respaldar decisão do corpo parlamentar. Tal possibilidade, hoje, é remota. Na balança daqueles dois Tribunais, o governo não está tão mal das pernas. Dia 16 O dia D será 16 de agosto, domingo. Vamos acompanhar a dimensão da mobilização. O governo fará, antes, eventos para tentar refluir eventual impacto das massas nas ruas. O PT, o MST e a UNE ajudarão na defesa de Dilma. Todos os partidos deverão observar de perto, mas cometerão um erro aqueles que pretendem tirar proveito da situação, como o grupo de Aécio no PSDB. O momento é de avaliação de forças. Pequena lição de política I : os instintos Os comportamentos, as ações e as reações dos seres humanos se prendem a quatro mecanismos básicos, também chamados impulsos ou instintos, dois relativos à conservação do indivíduo (impulsos combativo e alimentar) e dois inerentes à conservação da espécie (impulsos sexual e paternal). A política é, por excelência, o palco para o desempenho dos dois primeiros impulsos, na medida em que se trata de uma luta/competição entre pessoas, que expressam valores, representando situações positivas e negativas, posições ambivalentes entre o bem e o mal, o bom e o ruim. Na linguagem que remonta a nossos ancestrais, os instintos apontam para duas grandes categorias que balizam os homens : a vida e a morte. Pequena lição de política II : o discurso Pois bem, para atender às demandas inerentes aos quatro instintos, o discurso político vale-se de alguns eixos, codificados em vocábulos e símbolos que geram uma quantidade enorme de impressões, chamadas pela ciência da linguagem de engramas. São estes que formam os reflexos condicionados, importantes mecanismos para a tomada de decisões das pessoas. Nossa maquinaria psíquica depende de um complexo conjunto de fatores : o interesse despertado por mensagens, condições físicas, culturais e psicológicas de cada um. Mas os indutores das decisões humanas estão sempre relacionados aos valores do discurso político : segurança/insegurança, equilíbrio, paz, dinheiro no bolso, bem-estar, fome, devastação, perigo, medo do desconhecido, preparo/despreparo, esperanças, incertezas e certezas. Novas eleições A tese de novas eleições se liquidifica a cada dia. Primeiro, porque decisão nessa direção requer a cassação da chapa Dilma/Temer. Segundo, porque esse imbróglio demandaria muito tempo de discussão e recursos, prolongando a decisão nas Cortes. Terceiro, porque a análise de contas da campanha, pelo TSE, debaterá outra questão de vulto : a separação das contas de Dilma das contas de Michel. O fundamento é cristalino : a contabilidade se deu em separado com as campanhas de cada um fazendo prestações de contas isoladas. Cada qual teve sua estrutura. Essa tese tende a ser aceita pelo TSE. Por fim, na hipótese de cassação da chapa - com baixa possibilidade - quem assumiria a presidência seria o presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Que tende a ser denunciado pelo procurador-Geral da República, Rodrigo Janot (a ser reconduzido ao cargo) ou eventual substituto. O STF dará a palavra final. Lula ministro ? A versão está no ar. Luiz Inácio está pensando em aceitar e/ou recusar o convite para assumir um Ministério. Da Defesa ou das Relações Exteriores. Pelo porte de Lula, seu espaço seria bem mais amplo. Do tamanho de um superministro. O problema : Dilma seria seu chefe. Claro, ele procuraria evitar constrangimento. Essa seria uma boa saída ? Sim, como ministro, Lula escaparia ao julgamento em primeira instância. Teria direito a foro privilegiado, caso seja inserido no propinoduto da Petrobras. Comenta-se que está propenso a recusar. Tempos de Collor Nos tempos de Collor, usou-se o expediente de formação de um ministério com grandes nomes. Daria respaldo e credibilidade ao governo. Mesmo assim, a coisa degringolou. Não funcionou. Fernando Collor deixou a presidência. A boa hora de Renan O presidente do Senado, Renan Calheiros, faz a manchete da semana, com sua Agenda Brasil. Trata-se de uma densa pauta de temas que pode levantar a moral do governo. É o que falta à Dilma : substância, densidade, temas sérios, um conjunto de medidas para a retomada do crescimento econômico. Os programas facilitarão o ambiente de negócios, propiciando a volta de investimentos, aumentando a segurança jurídica e a reforma do ICMS, do PIS/COFINS e a legalização da terceirização. Renan abre a pista para a administração caminhar. Oposições e a bola fora Aécio Neves, presidente do PSDB, e o governador tucano, Geraldo Alckmin, dizem que não cabe às oposições mostrar saídas para a crise. Que bola fora. As oposições deveriam, isso sim, mostrar soluções para o país, diretrizes de seu programa econômico e ajustes necessários. Se for o caso, pode, até, criticar a atual administração, sem se furtar a mostrar caminhos a serem seguidos. Todos os partidos, sem exceção, têm a obrigação de apresentar seu ideário. Afinal, a ação política não se restringe a críticas e diagnósticos. Um nó na lei O preso Ramon Hollerbach, condenado no processo do mensalão, pede diminuição da pena por ter concluído, na prisão, o ensino médio, ao fazer a prova do ENEM. O benefício está previsto pelo CNJ. É boa a ideia de incentivar a evolução educacional dos presos. Há um porém nessa história : Hollerbarch tem curso superior, ou seja, já possui registro do ensino médio. Seu advogado alega : ele fez o que lhe recomendaram. Mas o benefício vale para quem já passou por aquela etapa da aprendizagem ? Eis mais um nó a ser desfeito. Aécio, Alckmin e Serra Aécio Neves confirma que disputará novamente a presidência em 2018. Mas o governador Geraldo Alckmin também quer ser candidato. Logo, haverá disputa. Alckmin tem a poderosa máquina do governo de SP. Aécio dispõe da tribuna do Senado e do poderoso comando do partido. A decisão será tomada mais adiante, avaliando-se possibilidades de cada um, intenção de voto, apoios partidários, etc. E José Serra, que faz um bom trabalho no Senado ? Tem uma única chance : ser ministro da Fazenda de um eventual governo comandado pelo vice, Michel Temer, resgatar o Plano de Crescimento do Brasil e se apresentar como o salvador da Pátria. Nesse caso, ganharia a candidatura. A imagem é a de FHC no governo Itamar. Poderia, até, vir a ser o candidato do PMDB. Essas chances são remotas. Jumento e sal Um jumento carregado de sal atravessava um rio. A certa altura escorregou e caiu na água. Então o sal derreteu-se e o jumento, levantando-se mais leve, ficou encantado com o acontecido. Tempos depois, chegando à beira de um rio com um carregamento de esponjas, o jumento pensou que, se ele se deixasse cair outra vez, logo se levantaria mais ligeiro ; por isso resvalou de propósito e caiu dentro do rio. Todavia ocorreu que, tendo-se as esponjas embebidas de água, ele não pôde levantar-se, e morreu afogado ali mesmo. Assim também certos indivíduos não percebem que, por causa das suas próprias astúcias, eles mesmos se precipitam na infelicidade. (Esopo) Uma boa notícia A Nestlé promete contratar quatro mil jovens com menos de 30 anos nos próximos três anos. Para tanto, organizará um amplo programa de treinamento. Projeto que terá impacto sobre 38 mil pessoas. Uma boa notícia no ciclo da recessão que o país atravessa. Estado bárbaro Antes de o leitor terminar de ler este parágrafo, dois cidadãos estarão tombando ou sendo assaltados nos vastos espaços do território nacional, vítimas da bandidagem. De cinco doentes que baixam nos hospitais brasileiros, pelo menos um é vítima de uma "guerra civil" que mata por ano quase 50 mil brasileiros, três vezes mais que nos Estados Unidos, mais gente que os mortos em conflitos étnicos. Em 20 anos, o número de vítimas fatais ultrapassa a casa do milhão, mais que os 750 mil vitimados durante o período colonial da guerra de Angola. O outro ângulo da violência é o do empobrecimento do país. O rombo da Previdência tem a colaboração do cano assassino que aleija multidões, alarga fila de hospitais, multiplica pensões de viúvas e devasta 10% do PIB, dinheiro que poderia estar sendo investido em hospitais, escolas, habitação, transportes, agricultura. Mas esse é o custo do Estado Bárbaro.
quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Porandubas nº 455

Abro a coluna com uma historinha do cacique maranhense Vitorino Freire. Vitorino estava em casa com gripe e muita febre. Recebeu telegrama do Senado (então no Monroe, na Cinelândia, Rio) para ir urgente a uma reunião da Comissão de Finanças, que dependia de sua presença. Lá fora, chovia para valer. Agasalhou-se, pôs suéter, cachecol, capa, chapéu e saiu para pegar um táxi. Não vinha táxi. Entrou numa farmácia para tomar injeção. Quando tirou a capa e o paletó, apareceu o revólver. Ia passando uma rádio-patrulha, viu, parou, chamou : - O senhor é policial, tesoureiro, caixa de banco ?     - Não. - Tem porte de arma ?     - Também não. - Então o senhor vai ter de ir até o comando da polícia. Vitorino entrou na RP e eles tocaram para a cidade. Quando chegou na Cinelândia, falou grosso :     - Para aí que vou saltar. - Não. O senhor vai até o comando.     - Comando coisíssima nenhuma. Vou é para o Senado. Sou o senador Vitorino Freire. -  Por que o senhor não avisou antes ?     - Porque estava precisando de uma carona e não tenho preconceito contra automóveis. Rodou, serve. (Da verve de Sebastião Nery) Reprovação Começo com uma constatação : as três presidentes de Nações latino-americanas reeleitas, Dilma Rousseff (Brasil), Cristina Kirchner (Argentina) e Michelle Bachelet (Chile), estão amargando uma grande desaprovação pelos seus eleitores. A prisão de Dirceu Era prevista. Mesmo assim, a prisão do ex-ministro José Dirceu caiu como uma bomba na segunda-feira. Uma segunda ordem de prisão para uma figura combalida e chegando na casa dos 70 anos é um sofrimento. Dirceu será submetido a depoimentos, investigações, provas, a par de intensa cobertura midiática. Seu irmão também foi preso. Seu braço direito, Bob, idem. Teriam eles condições de suportar o bombardeio que cai sobre suas cabeças ? Dirceu é um experiente político que sabe a importância de qualquer que seja sua manifestação. Mas seu irmão e seu assessor terão bagagem psicológica para suportar o calvário que se abre ? Pior que mensalão ? Já se começa a dizer que Dirceu teria montado as ações no entorno da Petrobras. Muita especulação. Mas o delator Pascowitch, seu amigo, foi quem abriu o bico e contou sobre a entrega de propina ao ex-todo poderoso quadro do PT. Propinas que teriam continuado até 2013. Cada vez se fecha o círculo da propinagem. No meio dele, o PT. Essa 17ª operação Lava Jato, designada de Pixuleco, tem como foco o PT e ex-dirigentes. Um dos procuradores afasta a possibilidade de prisão do ex-presidente Lula. Mas arremata que eles, procuradores, chegarão a todas as pessoas envolvidas. Credenda e Miranda   "A política é o estuário das expectativas e demandas sociais. Duas referências animam seus eixos : os "credenda", coisas a serem acreditadas, a partir do sistema legal, e os "miranda", coisas a serem admiradas, a partir dos símbolos. Daí a inescapável pergunta : o que há para crer na política brasileira e o que há para admirar ? Aos ouvidos chega o eco : nada. As razões para tanto se abrigam em campos múltiplos, mas a origem dos males recentes é a consolidação do PNBC (Produto Nacional Bruto da Corrupção), cuja raiz quadrada se extrai dos números que a esfera privada subtrai da res publica." A frase é minha, do meu livro "Era uma Vez Mil Vezes", pela Editora Topbooks. O modelo Mani Pulite Li, mais de uma vez, o trabalho, muito bom, de Sérgio Fernando Moro, "Considerações sobre a Operação Mani Pulite" (clique aqui), onde traça considerações sobre aquela operação, na Itália, "uma das mais impressionantes cruzadas judiciárias contra a corrupção política e administrativa". Ali está tudo o que o juiz Moro está fazendo. De forma didática, descreve os vetores que conduziram a Mani Pulite e são aplicados por aqui. Vejamos algumas passagens de seu documento. Como começou Começou assim, nas palavras de Moro : "Iniciou-se com a prisão de Mario Chiesa, que devia seu cargo administrativo ao Partido Socialista Italiano e foi preso com propina no bolso, cerca de sete mil liras (US$ 4.000,00), que teria recebido de uma companhia de limpeza. Posteriormente, mais de 15 bilhões de liras teriam sido arrestadas em contas bancárias, imóveis e títulos públicos de sua propriedade. Por volta do final de março de 1992, Chiesa, recolhido na prisão de São Vittore de Milão, começou a confessar". Coragem dos juízes "A coragem de muitos juízes, que ocasionalmente pagaram com suas vidas para a defesa da democracia italiana, era contrastado com as conspirações de uma classe política dividida e a magistratura ganhou uma espécie de legitimidade direta da opinião pública". Não escapa ao juiz Moro o fato de os juízes italianos serem "jovens". Qualquer semelhança com a situação brasileira não é mera coincidência. Amplitude Lembra o juiz paranaense que dois anos após ser deflagrado, "2.993 mandados de prisão haviam sido expedidos ; 6.059 pessoas estavam sob investigação, incluindo 872 empresários, 1.978 administradores locais e 438 parlamentares, dos quais quatro haviam sido primeiros-ministros". A Mani Pulite impressiona pelos números. Uma pista : todos os envolvidos na Lava Jato deverão entrar na roda. Pelo visto, o importante é descobrir as veredas e rotas, com tantos quanto foram capazes de fazer a trajetória da corrupção. Reações O juiz Moro parece precavido/vacinado contra a bateria de reações, a favor ou contra. Ele diz ser ingênuo pensar "que processos criminais eficazes contra figuras poderosas, como autoridades governamentais e empresários, possam ser conduzidos normalmente, sem reações". Crê que a opinião pública, como foi o caso italiano, é essencial para o êxito da ação judicial. Independência Moro elege a independência judiciária como elemento central para tornar possível "o círculo virtuoso" gerado pela operação Mani Pulite. De um lado, ele aponta a progressiva desligitimação de um sistema político corrupto e, de outro, a maior legitimação da magistratura em relação aos políticos profissionais, como condições favoráveis à operação. O nosso desenho é muito parecido com o que se via na Itália. Colaboração A delação premiada, ou nos termos que os juízes preferem usar, a colaboração com a Justiça, incentivada pelos magistrados italianos, foi fundamental. Apesar de ser mal vista por alguns, Moro destaca que a delação premiada não é traição à pátria. Argumenta : "um criminoso que confessa um crime e revela a participação de outros, embora movido por interesses próprios, colabora com a Justiça e com a aplicação das leis de um país. Se as leis forem justas, não há como condenar moralmente a delação ; é condenável nesse caso o silêncio". Imprensa Sérgio Moro lembra que os responsáveis pela Operação Mani Pulite fizeram largo uso da imprensa, ressaltando que "a publicidade conferida às investigações teve o efeito salutar de alertar os investigados em potencial sobre o aumento de informações nas mãos dos magistrados, favorecendo novas confissões e colaborações". Daí a equação : prisões, confissões e publicidade geraram um "circulo virtuoso". Resultados E assim vastos espaços da corrupção foram limpos. Contratos públicos teriam sido feitos com preços 50% menores do que nos anos anteriores. Conclui sua peça, lembrando que "no Brasil, encontram-se presentes várias das condições institucionais necessárias para a realização de uma ação judicial semelhante". Desvendando Moro Como se viu, o juiz Sérgio Fernando Moro contou o que viu, o que pesquisou, o que sentiu. E está fazendo, por aqui, a mesma coisa. O caso vai continuar. Pelo andar da carruagem, por aqui o novelo vai ser puxado pelas laterais, para baixo e... para cima. É a conclusão deste analista. Turismo, ferramenta valiosa Em tempos de economia em retração em quase todo o planeta, o setor de turismo sempre surge como ferramenta valiosa. A indústria "sem chaminé" conta com a vantagem de ser ágil nas repostas e com a estrutura natural já estabelecida em nossas paragens. O ministro Henrique Alves tem agido fortemente para sensibilizar seus pares junto ao governo da importância do setor. No Congresso, o deputado Alex Manente, SP, dá lustro final a um projeto que visa a incentivar o turismo Nacional. Manente tem conduzido com eficiência a Comissão de Turismo da Câmara. E vai bem nas bases. Uma pesquisa recente na intenção de votos mostra o deputado do PPS com boa folga (cerca de 40%) na disputa pela prefeitura de São Bernardo do Campo em SP. Respira-se novo ar pelos lados do ABC paulista. E as crianças ? O deputado João Botelho era candidato a prefeito de Belém, PA. Encontra o cabo eleitoral : - Como vai ? E a diletíssima esposa ? E as crianças ?     - Tudo bem, deputado. A mulher está ótima. Mas, por enquanto, é um menino só. - E eu não sei que é um filho só ? É um menino, certo, mas vale por muitos. Então, como vão os meninos ? Lula Luiz Inácio está calado. Lula calado é uma montanha de expressão. Diz tudo. Postura de silêncio parece não combinar com ele. Vamos assistir na quinta a sua pregação no programa do PT na TV. Casto Brasil "Falam tanto nesse tal de 'custo Brasil', e eu cada vez mais preocupado com o 'casto Brasil'". (Carlos Ayres Britto em Ópera do Silêncio) Panelaço Espera-se um panelaço/buzinaço, na quinta-feira, por volta das 20h30, por ocasião do programa do PT nas emissoras de rádio e TV. Esse barulho deverá ter tanto impacto quanto o anterior e determinará a temperatura das ruas. Imagens As imagens do PT e de José Dirceu estão corroídas. Serão resgatadas ? O PT, como partido, poderá resgatar parcela de sua imagem. Tem militantes aguerridos. Mas a imagem pessoal de Dirceu está estigmatizada. Sua vida política está praticamente encerrada. Mas, como em política, tudo é possível, quem sabe.... ? 23 delatores Há, nesse momento, 23 delatores. Seis ainda são desconhecidos. Seus depoimentos poderão alargar as veredas da Lava Jato. 500 dias A Lava Jato completou 500 dias. A previsão é de que vai se alongar por mais 500. Instituições funcionam Constatação : crise política das mais graves de nossa história ; crise econômica corrói poder de compra do brasileiro e ameaça harmonia social ; crise de confiança chega ao pico da montanha. Mas as instituições funcionam. Essa é a luz no fim do túnel. Descansando e trabalhando ? Depende Fecho a coluna com a lição do cientista político Carlos Matus, ex-ministro do Planejamento do governo Allende, Chile. - A ação não tem um significado absoluto ou igual para todos os atores. A ação tem uma interpretação situacional, e seu significado será ambíguo se não se explicitarem o contexto situacional e a intenção do autor. As ações das pessoas ou dos atores sociais ultrapassam os limites daquilo que eles afirmam fazer. Em outras palavras, a ação é suscetível de várias interpretações situacionais. É bem conhecido, como anedota, o diálogo entre Bernard Shaw e uma vizinha. Shaw arrumava o jardim de sua casa quando uma vizinha, que ia fazer compras, disse-lhe, em tom de pergunta afirmativa. "Trabalhando, Sr. Shaw ?". E ele respondeu : "Não vizinha, estou descansando." Ao voltar das compras, a vizinha notou que Shaw estava sentado em sua cadeira, fumando cachimbo e com o olhar perdido no horizonte. Certa de que, então sim, poderia fazer uma observação de consenso, ela perguntou : "Descansando, Sr. Shaw ?". E ele, distraído, respondeu : "Não, senhora, trabalhando". Esse exemplo mostra como uma ação é suscetível de interpretações opostas. Para Shaw, refletir é trabalhar, e arrumar o jardim é descansar ; para a vizinha, porém, o significado é o oposto. O significado da ação não é único e depende da auto-referência dos atores nela implicados. Essa é uma primeira conclusão.
quarta-feira, 29 de julho de 2015

Porandubas nº 454

Abro a coluna com duas historinhas, da PB e de PE. Da verve de Sebastião Nery. Se as galerias... Flávio Ribeiro, presidente da Assembleia Legislativa da Paraíba (depois foi governador), estava irritado com as galerias, que aplaudiam e vaiavam durante um debate entre o deputado comunista Santa Cruz e o udenista Praxedes Pitanga. De repente, tocou a campainha, pediu silêncio e avisou grave : - Se as galerias continuarem a se manifestar, eu evacuo. Felizmente, as galerias se calaram. Perdão, eu num sabia.... Ramos de Freitas, delegado e arbitrário, entrou para a história de Pernambuco, nos anos 20, como o terror das minorias marginalizadas. Ladrões, prostitutas, gays, desempregados e vadios pobres sofriam horrores nas mãos calvinistas do D. Freitas. Era uma espécie de delegado Padilha de Recife. Quem não trabalhava, apanhava. Quem não tinha carteira profissional, xadrez. Saía pelas ruas, dia e noite, catando gente de arrastão. Uma tarde, chegam à delegacia, presos, dois gays. Dr. Freitas manda buscar a palmatória enorme, grossa como um filé malpassado, para dar uma dúzia de bolos em cada um. Chama o primeiro : - Seu nome ? - Valquíria. - Você não tem vergonha, não ? - Vergonha eu tenho, doutor. Eu não tenho é gosto de mulher. - Vocês dois trabalham ? O que é que vocês são ? - Nós semos homossexual, Dr. Freitas. - Nós semos, não. Nós somos. - Perdão, Dr. Freitas, eu num sabia que o senhor também era. Duas dúzias de bolos em Valquíria. Mês do cachorro... A volta do recesso parlamentar projeta mais sombras na bela estética das conchas côncava e convexa. A Câmara e o Senado abrirão suas portas não com o tapete vermelho, mas com um gigantesco corredor polonês formado pelos contingentes que ocupam as ruas e as redes sociais, expressando suas demandas e posicionamentos. Mas a interrogação fica no ar : como se comportarão deputados e senadores caso haja alguma denúncia formal envolvendo os presidentes das duas casas congressuais ? Comenta-se que essa situação seria deflagrada já neste mês do cachorro... Louco É sabido que o procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, quer "pegar" o presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Comenta-se que essa investida se daria logo na primeira quinzena de agosto. Pode até ser. Mas Cunha não deve se afastar da presidência da Câmara, onde conta com uma larga base de apoios. Explique-se que indiciamento não significa culpa. Haverá, sem dúvida, um discurso contra sua permanência na presidência, como já se ouviu de deputados como Jarbas Vasconcelos, este próprio do PMDB, e Silvio Costa, do PSC, ambos de Pernambuco. Permanecendo Cunha, veremos uma longa batalha jurídica. Que não se encerrará em menos de dois anos. A crise mais profunda A crise se acentuará. Quando se pensava que o pacote fiscal, composto por Joaquim Levy, seria desembrulhado sem estardalhaço, eis que o governo recua, reduz a meta fiscal para 0,15% do PIB, o que fará a crise se prolongar por todo o ano de 2016, quiçá entrando pelo meio de 2017. Sabe-se que paulada forte é que mata a cobra. Mas a cobra gigante da crise terá morte lenta, a pedido do próprio PT, que ouve o clamor das ruas e defende um posicionamento mais suave. Ou seja, muitos querem assoviar e chupar cana ao mesmo tempo. Impossível. O cobertor econômico só aparecerá depois da coroa de espinhos. E a crise política, hein ? Qual o cenário que se desenha para as próximas fases da crise política ? Muito sombrio. A crise política tende a se aprofundar com o envolvimento de importantes perfis do Parlamento nos dutos da Petrobras. O governo, por sua vez, terá sua situação mais complicada. É provável que as investigações batam na porta do ex-presidente Lula. A presidente Dilma terá pela frente o desafio de vencer a batalha contra as "pedaladas" fiscais. Coisa a cargo do TCU. Pode ser que o TSE venha também a pôr o dedo nas contas de sua campanha. Tudo isso entornará o caldo. Saídas Quais as saídas ? Vejamos as hipóteses: 1. Um governo de união nacional, com os partidos se unindo em torno da presidente e garantindo seu mandato até 2018 ; 2. O impedimento e/ou renúncia da presidente, com a ascensão do vice Michel Temer, e consequente instalação de um governo suprapartidário, que atenuará os espíritos e coordenará o processo eleitoral de 2018 ; 3. Prolongamento da crise até 2018, com base situacionista em processo de esfacelamento e base oposicionista vivendo ciclo de expansão e fortalecimento. Projeto do PT em desmoronamento ; 4. Governo consegue aprovar medidas de ajuste, faz agenda positiva, recupera-se do tombo, conserva forte parcela da base situacionista e PT entra em 2018 em condições de disputar pleito. Qual dessas a mais viável ? Lula e FHC Lula lançou um balão de ensaio : gostaria de conversar com FHC. Em um primeiro momento, Fernando Henrique pareceu querer. Disse : se Lula quer conversar comigo, ele tem meus telefones. Num segundo momento, possivelmente pressionado, afirmou : o momento não permite esse tipo de conversa. Como o PT está em maus lençóis, apenas quer o apoio do PSDB. Recusou. Os lideres tucano no Senado e na Câmara, Cássio Cunha Lima e Carlos Sampaio, publicaram nota recusando qualquer tipo de conversação nesse momento. A articulação, claro, só interessa ao PT. Delação de presos ? O advogado criminalista Luiz Flávio Borges D'Urso está propondo um projeto de lei para proibir delação premiada de presos. O projeto conta com o apoio do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e deverá ser apresentado pelo deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP). D'Urso explica : "A lei estabelece que a negociação, que é o cerne da delação premiada, não pode ter a participação do magistrado que, ao depois, deverá homologá-la. O acordo, portanto, deve ser realizado entre o delator e o agente do Estado, vale dizer, o Delegado de Polícia e/ou o representante do Ministério Público, sempre com a presença do Advogado." Delação livre O criminalista arremata : "uma das principais regras a ser observada é a da voluntariedade, pois a delação premiada não pode ser compelida ao delator, que jamais poderá ser forçado a delatar. A voluntariedade está intimamente ligada à origem da delação premiada, pois o delator deve agir movido pelo sentimento de arrependimento ou de colaboração com a Justiça, afastando-se da prática criminosa...... a voluntariedade deve significar que a delação será feita livremente, negociada sem pressões ou ameaças, isto tudo num ambiente de liberdade para decidir." 16ª fase A operação Lava Jato entra na 16ª fase, que a criatividade da PF chama de "Radioatividade", pelo elo com a Eletronuclear. O foco recai sobre pagamentos de propina a funcionários da estatal, responsável pela construção da usina Angra 3, e tem como origem o depoimento do delator Dalton Avancini. Tudo começa de novo : novos detidos, novas apreensões de documentos, liturgia repetida. A cada semana, expande-se a bola de neve. Cada fase dessa operação Lava Jato "canibaliza" a anterior, parecendo ao cidadão uma novela sem fim. A certa altura, não se sabe mais onde começa e termina o rolo dessa fiação. Governadores repartidos Os governadores, convidados pelo Planalto, se reunirão, amanhã, com a presidente para uma análise geral da situação em que vive o país. A presidente colocará em pauta temas candentes : ICMS, guerra fiscal, perdas dos Estados, repatriação de recursos, meta fiscal, crise política e assim por diante. Os governadores deverão defender seus umbigos, antes de olhar para o umbigão da Federação. Será uma reunião mais litúrgico-estética do que de semântica. 2,7 : nota de Dilma Pesquisa feita no almoço do Grupo de Líderes Empresariais (LIDE) com Eduardo Cunha, que juntou cerca de 500 empresários, em São Paulo, segunda feira, foi feita uma pesquisa sobre o governo Dilma. Cada empresário, com uma máquina à mão, deu uma nota. Entre 0 e 10, a média da avaliação foi 2,7, a menor de todos os eventos ocorridos até hoje. A moldura De 1991 até 2014, a arrecadação de impostos cresceu 184%, enquanto a renda subiu apenas 103%. Dá para explicar o Produto Nacional Bruto da Insatisfação. Dória João Dória, jornalista e empresário, surge na cena como mais um pré-candidato à prefeitura de São Paulo, em 2016. João é ligado ao PSDB, mas tem aliados fortes em alguns partidos, como PMDB, DEM, PPS, entre outros. Tem um trunfo nas mangas : a amizade que o une ao governador Geraldo Alckmin. Trata-se de um exímio comunicador. Que domina as técnicas da expressão e da articulação. Deverá enfrentar outros pré-candidatos do tucanato, a partir do vereador Andrea Matarazzo. Política e economia Há duas correntes : uma, que defende a tese de que a crise política arrasta a economia para o buraco ; outra, que argumenta no sentido contrário : a economia é a locomotiva que puxa os carros do trem da política. Este consultor defende esta segunda tese. E sempre lembra a batida equação : BO+BA+CO+CA= BOlso vazio, BArriga roncando, COração indignado, CAbeça revoltada. As ruas são mais agitadas quando a barriga ronca. E as ruas são aríetes a fustigar a representação política. 16 de agosto Vamos conferir a força e o impacto da movimentação das ruas anunciada para dia 16 de agosto. Se o Brasil gritar, em uníssono, o Parlamento ecoará o clamor ; e o Planalto se encolherá de medo. A recíproca é verdadeira. Janot saindo como herói ? O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, sabe que será muito difícil passar pela sabatina - e corredor polonês - do Senado, caso seja nomeado pela presidente Dilma para permanecer no cargo. Por isso mesmo, imbuiu-se da meta : atacar. Pedirá a condenação do presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Não ganhando boa nota no Senado, sairá do cargo como um dos heróis do momento. Ao lado de Sérgio Moro e dos jovens promotores do Paraná. Repente Fecho a coluna com o repente de Augusto Pereira da Silva, Guriatã de Coqueiro : Quando Morre Um Poeta Nordestino "Se um dia morrer José FerreiraLouro Branco e Lourival BatistaMeu irmão, outro grande repentista, Zé Sobrinho, Juvenal e OliveiraJoão Quindingues e Lourival BandeiraJoão Silveira, Xuxú e Celestino, Eu irei a convite do DivinoCantar hinos à santa naturezaO Nordeste soluça de tristezaQuando morre um poeta nordestino". "Se um dia morrer João Adriano, Zé Barbosa também partir para o céuMandarei uma carta para Teteu Para quando ele partir levar meu mano, Se Domingos morrer no fim do ano, Não esqueça de levar Chico Galdino, Já mandei avisar a ConstantinoDisse a Pedro Bandeira em Fortaleza.O Nordeste soluça de tristezaQuando morre um poeta nordestino".
quarta-feira, 22 de julho de 2015

Porandubas nº 453

A morada do doutor Abro a coluna com o mestre Leonardo Mota. Quem entra no "Hotel Roma" de Alagoinhas, na BA, vai com os olhos a uma tabuleta agressiva em que peremptoriamente se adverte : Pagamento adiantado, hóspedes sem bagagens e conferencistas. Também, em PE, o proprietário do hotelzinho de Timbaúba é, com carradas de razão, um espírito prevenido contra conferencistas que correm terras. Notei que se tornou carrancudo comigo quando lhe disseram que eu era conferencista, a pior nação de gente que ele contava em meio à sua freguesia. Supunha o hoteleiro de Timbaúba que eu fosse doutor de doença ou doutor de questão. Por falar em Timbaúba, há na cidade um sobrado, em cuja parte térrea funciona uma loja de modas, liricamente denominada "A Noiva". O andar superior foi adaptado para residência de uma família. Eu não sabia de nada disso quando tendo indagado do major Ulpiano Ventura onde residia o dr. Agrício Silva, juiz de Direito da comarca, recebi esta informação chocante : - O doutô Agriço ? O doutô Agriço está morando em riba d' "A Noiva"... O recesso parlamentar As férias parlamentares exercerão uma função importante no animus animandi dos nossos representantes. Eles voltarão às casas congressuais sob o termômetro das ruas. Em contato com suas bases, sentirão as expectativas, demandas, anseios e urgências do eleitorado. E, é evidente, tentarão de alguma forma compor seu processo decisório com os inputs recebidos. A economia das ruas está apertando o bolso? O bolso tem dinheiro para os gastos? Os gastos têm sofrido com a carestia? O que pensam os eleitores de Dilma e deles? Todo esse caldo alimentará as decisões do corpo parlamentar após o recesso. Sob risco Há cinco milhões de pessoas que vivem em áreas de risco no Brasil. Há planos para administrar os acidentes que podem acontecer nesses espaços ? E por que não existem ? A cunha de Cunha Eduardo Cunha, presidente da Câmara, deve conversar bastante com os quadros parlamentares nestas férias. Não pense que está em relax. Tomou uma decisão pessoal : romper com o governo. Rompimento em termos. Porque o deputado carioca nunca foi, de verdade, um aliado governista. Como comandante de uma casa parlamentar, ele tem prerrogativas que batem no coração do governo : fazer a agenda, por exemplo, decidir sobre as pautas que devem ser votadas. Cunha tem, portanto, sólidas cunhas para fazer pressão. Uma : votar o projeto para repatriação de recursos de brasileiros no exterior. Calcula-se que essa dinheirama some algo como 250 bilhões de dólares. Espera-se que pelo menos uns 40 bilhões voltem em um primeiro momento. Cunha pode colocar uma cunha nisso e dificultar essa votação. Moro e o vazamento Eduardo Cunha reclama do comportamento do juiz Sérgio Moro. Diz que o juiz não tem a prerrogativa de interrogar delatores sobre os políticos. O foro para a área política é o STF. O juiz alega que não tem como fechar a boca dos depoentes. Tem razão. O que se coloca em questão é o vazamento. Pode ele vazar ou não essa informação ? Deixo que a turma do Direito, da primeira à ultima instância, debata o imbróglio. Desperdício Como um país se dá ao luxo de ver 3% de sua safra perdida por causa da péssima condição das estradas ? Como se pode deixar cair no ralo R$ 10 bilhões por ano em razão da calamidade do sistema viário ? A malha viária, de 1,7 milhão de km, tem apenas 165 mil pavimentados e, destes, 80% são classificados como regulares e ruins. Miro viu Miro Teixeira viu como nasceu o mensalão. Do alto do respeito que lhe confere a posição de deputado mais longevo, Miro disse, na FSP de segunda-feira, que participou, como ministro, de uma reunião em janeiro de 2003, com mais três pessoas no Palácio do Planalto : Palocci, ele e mais duas. Quem eram ? Não quis dizer. Mas a dedução é lógica, pois ali se decidiu sobre o mensalão. Miro garante que viu a vertente financeira vencer a vertente política. Inferência : compra de deputados se sobrepondo à articulação política. Por que sua Excelência ficou calado todo esse tempo ? Prisão Outra pergunta que os advogados fazem com frequência : por que os indiciados passam tanto tempo presos ? Depois de seus depoimentos, é necessária a continuidade da prisão ? Eles ameaçam a segurança pública ? Livres, destruiriam provas ? Não poderiam responder em liberdade às acusações ? Ou será que há alguma taxa cobrada pelo Estado-espetáculo para administrar esses casos ? Lula Erga omnes. A lei é para todos. Lula não é imune às investigações. O MPF encontrou indícios de que o ex-presidente praticou tráfico de influência internacional em favor de uma construtora. O MP/DF decidiu instaurar procedimento investigatório. Ora, essa decisão mostra que o Executivo não tem a influência que se imagina para impedir investigações sobre o comandante de honra do petismo. Portanto, é duvidosa a hipótese de que o Executivo tenha influência na apuração de denúncias envolvendo quadros do Parlamento. Fosse assim, os petistas estariam fora da lupa do MP. Pedaladas fiscais Termina o tempo para o governo mandar ao TCU sua resposta sobre as "pedaladas fiscais". O advogado-Geral da União, Luiz Inácio Adams, argumentará que 17 Estados brasileiros já fizeram isso. E o que o governo FHC também o praticou. E alegará que não escapou à Lei de Responsabilidade Fiscal. O TCU contra-argumenta que a intensidade e o volume das atuais pedaladas (governo Dilma) são maiores. É bom lembrar lição do dr. Ulysses : "uma pessoa 99% honesta é 100% desonesta". Errou por um é mesmo que errar por 100. Arrecadar é a ordem Arrecadar, arrecadar, arrecadar. Essa é a palavra de ordem que sai dos gabinetes dos burocratas das administrações estadual e municipal. Vejam essa polêmica decisão da prefeitura paulistana de diminuir a velocidade nas marginais. No perímetro central, a velocidade máxima será de 50 km/hora. A previsão aponta para mais uma chacoalhada nos bolsos dos contribuintes. Diminuir a velocidade por uma questão de segurança ? Balela. E o asfalto ? E os buracos ? E a sinalização ? O presidente da OAB/SP, Marcos da Costa, que entrou com ação para impedir essa arbitrariedade, tem razão : o tema deve ser objeto de consulta à sociedade. Senhores governadores e prefeitos : cuidado com o andor. Não aproveitem o momento para esvaziar mais ainda o bolso dos contribuintes. Kassab calado Gilberto Kassab, o ministro das Cidades, está calado. Quando se recolhe ao silêncio é sinal de que o presidente do PSD e ex-prefeito de SP está trabalhando muito na moita. Está prestes a viabilizar a criação do PL. Com a fusão a seguir, o partido do Kassab será um dos mais largos do país. A conferir. Moro condena e absolve Na primeira sentença contra empreiteiros, o juiz Sérgio Moro impôs pena de mais de 15 anos para acusados. E absolveu o empresário Márcio Andrade Bonilho do crime de corrupção ativa. O criminalista Luiz Flávio Borges D'Urso, o advogado defensor, declara : "Fez-se Justiça nesse processo, uma vez que Márcio, por intermédio da Sanko Sider, realizou uma operação comercial absolutamente regular, com preços de mercado, vendendo e entregando os produtos não tendo qualquer resquício de comportamento criminoso em sua conduta". Identidades Getúlio Vargas é sempre associado ao nacionalismo : "o petróleo é nosso". Juscelino Kubitschek portou a bandeira do desenvolvimentismo. Jânio Quadros ergueu a vassoura da moralização na vida pública. Os governos militares vinculam-se à repressão. José Sarney é o presidente da redemocratização. Fernando Collor de Mello abre as cortinas do impeachment. Itamar e FHC produziram o Plano Real e a estabilidade econômica. Lula foi o presidente da redistribuição de renda e inserção social. Mas o carimbo da corrupção ameaça sujar não apenas sua identidade, mas a do governo Dilma. Marques anistiado Cofundador da ECA/USP, INTERCOM e ORBICOM, Jose Marques de Melo, diretor-titular da Cátedra UNESCO de Comunicação na Universidade Metodista de São Paulo, foi anistiado pela Comissão do Ministério da Justiça encarregada de aplicar a legislação da Anistia política aos cidadãos apenados pela ditadura de 1964. Lúcio França, experimentado profissional na área da anistia, foi o advogado do professor. Marques iniciou sua trajetória intelectual como jornalista, engajando-se no movimento estudantil, no começo dos anos 60, na cidade de Recife. Veio a integrar a equipe do governo Miguel Arraes nas áreas de educação e cultura. Preso e processado pelos golpistas de 1964, migrou para SP, contratado para lecionar na Faculdade de Jornalismo mantida pela Fundação Cásper Líbero e prestando concurso na USP para integrar o corpo docente fundador da Escola de Comunicações Culturais. Perseguição Nas instituições, enfrentou resistências e sofreu perseguições, encabeçando a lista dos professores que o General Ednardo D'Ávila, comandante do II Exército, rotulou como "subversivos", determinando sua defenestração do sistema universitário. Por se tratar de documento sigiloso, os atos dele decorrentes permaneceram inacessíveis (alguns incinerados), na tentativa de assegurar a incolumidade dos funcionários que integravam o "terceiro estágio", atuando como "dedos-duros" nas "assessorias de segurança e informação" dos reitores que abdicaram das prerrogativas da autonomia universitária, nos estertores do regime militar (particularmente no período 1974-1979), quando cresciam em todo o país os clamores pela anistia. Dilma, 7,7% Pesquisa CNT/MDA mostra a presidente Dilma chega ao pior índice de popularidade da série histórica. O governo é considerado de forma positiva somente por 7,7% dos entrevistados. 52,4% dos entrevistados consideram o governo da petista como péssimo, e 18,5% consideram como ruim. Em março, tinha 11% de popularidade. Em relação ao desempenho pessoal de Dilma, somente 15,3% aprovam a gestão dela, contra 79,9% que desaprovam. Desinflação ? Tony Volpon, diretor de Assuntos Internacionais do BC, em encontro com investidores em SP, destaca que a retração no mercado de trabalho e a perspectiva de desaceleração dos preços regulados pelo governo no próximo ano contribuem para dar ao BC a "certeza" de que inflação será levada ao centro da meta de 4,5% em 2016 e que uma combinação de fatores aponta para um forte processo de desinflação. Se ninguém vende e ninguém compra, os preços ficam no mesmo lugar e, com o tempo, tendem a cair. Fecho a coluna com esses tempos de amnésia. O nome da rosa e o do médico Dois desembargadores aposentados, do alto de uma juventude acumulada durante oito décadas e meia, encontram-se no aniversário do neto de um deles. Os desembargadores Amaro Quintal da Rocha e Antônio Vidal de Queiroz, como sói acontecer com amigos que se conheceram no início da idade da razão, foram direto ao assunto que mais os motivava : - Até que enfim, encontrei o médico que curou a minha amnésia, disse Amaro. - Como é mesmo o nome dele ? Perguntou Vidal. - É, é, é, deixe-me ver, é... é... Como é mesmo o nome dele ? Espere aí... é, é... é. O nome, escondido num cantinho do cérebro, relutava em aparecer. Começou a se perturbar. Mas não deixou a onda abatê-lo. - É, é, como se chama... é... é... como se chama mesmo aquela coisa vermelha, amarela, branca, que nasce em um galho cheio de espinhos, aquele assim ? (e foi mostrando o tamanho do galho e o formato da coisa). Vidal matou a charada : - Rosa, o nome é Rosa. Amaro, radiante, grita para a mulher que estava sentada logo adiante : - Rosa, oh, Rosa, como é mesmo o nome daquele médico que curou a minha amnésia ?
quarta-feira, 15 de julho de 2015

Porandubas nº 452

Abro a coluna com PE nos tempos de Agamenon e o RN nos tempos de Aluízio, na verve do mestre Sebastião Nery. Bajulação Agamenon era o interventor. A seca assolava o Nordeste. De repente, começou a chover na região do São Francisco. Um prefeito telegrafou : - Chove copiosamente na região, graças à profícua administração de V. Exa. Agamenon demitiu o prefeito nomeado. Ufa, não aguento esta porcaria Dinarte Mariz era governador e inimigo de Aluízio Alves. Que saiu candidato pela oposição, ganhou. O velho Dida se recusou a passar o cargo. No dia da posse, Dinarte saiu cedo do palácio, entregou as chaves ao porteiro. Todo importante, paletó e gravata, sapato engraxado, o porteiro foi lá para frente e ficou de pé nas escadarias. Esperou uma hora, duas, três, o novo governador não chegava. A mulher mandou chamá-lo para o almoço, nada. Ele ali, de pé, cumprindo patrioticamente seu dever cívico. De repente, à frente da multidão, apareceu Aluízio Alves na esquina. O porteiro suspirou aliviado : - Ainda bem que ele está chegando. Não aguento mais governar esta porcaria. Entregou as chaves e o fugaz poder ! Lava Jato, fase política Ainda não esgotada a fase empresarial, a operação Lava Jato abre a fase política, com a busca e apreensão de documentos nas casas de parlamentares, a começar pelos senadores Fernando Collor e Ciro Nogueira. A entrada na área parlamentar tem o placet dos ministros do STF, Teori Zavascki e Ricardo Lewandowski. Significado : ao bater no Congresso, a operação agita os ânimos políticos, fazendo subir a temperatura em Brasília. A crise chegará às alturas na segunda quinzena de agosto/primeira semana de setembro. Missão divina O juiz Sérgio Moro, de um lado, e os procuradores do MP, de outro, se imbuem de uma "missão divina". Essa é uma das explicações para as fases que estão se desenvolvendo na operação Lava Jato. Como "missionários", entendem que nada os afastará do caminho apontado por Deus. Nada de pressões, nenhuma interferência de poderosos. Irão até o fim, na crença de que terão de passar o Brasil a limpo, doa a quem doer. Imaginam que serão capazes de varrer a sujeira, tirando, até, os vestígios que se escondem por baixo do tapete. O DNA brasileiro será refeito ? Há dúvidas. Vulcão de agosto Haverá condição de se fazer o impeachment da presidente ? Eis uma recorrente questão que se coloca a este consultor. Respondo sempre : a questão será política, mas para se viabilizar, precisa do empuxo de dois motores : o da locomotiva da economia e o do rolo compressor das ruas. Explicando : se a economia arrebentar o bolso dos contribuintes, o povão revoltado, sob a alavanca das classes médias também atingidas, empurrará o Congresso para a beira do impeachment. Criam-se, nesse caso, as condições para se tomar uma decisão de magnitude. E, dessa forma, o vulcão pode dar sinais de erupção já em agosto. Pulso das bases Esses sinais deverão ser visualizados já agora nessa segunda quinzena de julho, quando os parlamentares estarão tomando o pulso de suas bases. O recesso parlamentar que começa em 17, sexta-feira, propiciará um banho de massas. Deputados e senadores vão sentir de perto o que significa inflação das ruas passando da casa dos 10%, o desemprego chegando aos 9%. Só na área da construção civil, há um milhão de desempregados. E a tendência é de acirramento das carências e carestia nos próximos meses. Os grupos - I É possível aferir a seguintes abordagens e posicionamentos políticos : 1) O grupo que deseja mudanças imediatas com a saída de Dilma-Temer ; trata-se da ala aecista do PSDB. Como o senador mineiro, sob o recall da campanha do ano passado, ganharia facilmente de Lula, hoje, defende a saída dos dois ; 2) O grupo lulista do PT, que gostaria de ver Dilma fora do Palácio do Planalto, com Michel Temer assumindo a presidência. Com esse afastamento, seria possível a Lula correr o país, adoçar o gogó, armar palanques por todos os lados e se apresentar, em 2018, como oposicionista contra o marasmo geral. Os grupos - II 3) O grupo tucano ligado a Alckmin, que gostaria de empurrar a presidente ao abismo, porém conservando Temer no comando. Este faria um governo de harmonia nacional e presidiria as eleições de 2018. Alckmin, em 2018, terá melhores condições para disputar a presidência que Aécio Neves ; 4) O grupo tucano ligado ao senador José Serra, que tem interesse em deixar a situação como está até 2018. Serra se aproximaria do PMDB, podendo, até, viabilizar sua candidatura por este partido. As teses Há teses para todos os gostos : a) a primeira defende a responsabilidade de Dilma no caso das "pedaladas fiscais", o que daria ao Congresso a base para o impeachment presidencial ; b) a segunda tese argumenta com o fato de que houve "pedaladas fiscais" em governos anteriores, tanto no ciclo FHC quanto nos mandatos de Lula. Dizer que hoje a situação é mais crítica pelos volumes de recursos transferidos como empréstimo e pelos prazos mais dilatados pode não se sustentar. Dr. Ulysses dizia: uma pessoa 99% honesta é 100% desonesta, porque não existe desonestidade relativa. C) Há o argumento de que recursos de propina para a campanha da Dilma ocorreram no mandato anterior. Mas há o contra-argumento de que eventos ocorridos do mandato anterior não passam para o mandato seguinte. E, por último, há a crença e provas de que recursos desviados de contratos da Petrobras irrigaram campanhas da situação e da oposição. Três fontes do poder Diz Galbraith : "eis as três fontes do poder : a personalidade, a propriedade (a renda disponível) e a organização". Outros Completando o triângulo de Galbraith : "a personalidade, a paixão, a perícia/habilidade, o controle, a posse de recursos, e o domínio do conhecimento científico e tecnológico". A régua Na linha de 0 a 100 km, a operação Lava Jato teria caminhado, até hoje, cerca de 30 km. Ou seja, há 70 km pela frente. Haja estrada. Como a frente política passa por muitas curvas no território do STF, há quem vislumbre os horizontes políticos da operação lá pelas beiradas de 2018. Janot O procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, parece ter um foco : Eduardo Cunha. Mas tem um olho também em outros políticos. Ocorre que deve entrar na lista dos nomes de procuradores que serão submetidos à presidente Dilma no segundo semestre. Se entrar em primeiro lugar, a presidente não terá outra alternativa que a de encaminhar seu nome para aprovação pelo Senado. Donde emerge a pergunta : passará pelo crivo dos senadores ? Este consultor acredita que passará. Oposições sob a lupa As oposições devem se precaver. O pau que bate em Francisco bate também em Chico. Não serão apenas figuras da situação a entrarem no loop do MP e do juiz Sérgio Moro. Há figuras de destaque na oposição que entrarão no ranking. Brasil e os mercados fortes O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Armando Monteiro, falando na abertura do Congresso do Aço, em SP, defendeu a necessidade de o país melhorar a competitividade dos produtos nacionais para que indústria volte a ganhar espaço no mercado doméstico que vem sendo ocupado pelo produto importado. Para ele, o governo está trabalhando para reposicionar o país, aproximando o Brasil de mercados fortes. O Brasil tem de se integrar de maneira mais efetiva aos fluxos de comércio em regiões com maior dinamismo. O foco da política se volta para alguns mercados importantes, como o americano. Acordos Nos Estados Unidos, foram assinados, segundo Monteiro, acordos de convergência de normas técnicas com o objetivo de remover as barreiras não tarifárias aos produtos brasileiros. O México é outro parceiro com o qual o Brasil quer expandir os laços comerciais. Retração de 12,85 no aço O maior evento anual da siderurgia ocorreu esta semana em SP. Dados de impacto. O setor aguarda uma retração de 12, 8% este ano. As perspectivas negativas resultam da perda de ritmo do setor industrial. O presidente-executivo do Instituto do Aço Brasil, Marco Polo de Mello Lopes, definiu o período atual como "o pior da história" do setor siderúrgico brasileiro. Neste ano, o consumo aparente - que compreende as vendas domésticas das siderúrgicas e as importações - deverá somar 22,333 milhões de toneladas, contra 24,638 milhões de toneladas em 2014. Vendas em queda de 15,6% As vendas no mercado interno deverão somar 18,324 milhões de toneladas neste exercício, volume 15,6% inferior ao verificado no ano anterior, quando elas chegaram a 20,738 milhões de toneladas. Segundo Lopes, a situação é preocupante, pois além da economia estagnada e da falta de competitividade do país, o cenário de sobre-oferta de aço no mercado internacional está se agravando. As estimativas são que a sobra de capacidade atinja cerca de 700 milhões de toneladas neste ano. Quase quatro mil postos de trabalho deverão ser extintos. 40 anos no mesmo patamar Conselheiro do Aço Brasil e vice-presidente comercial da Usiminas, Sergio Leite destacou que o Brasil se mantém no mesmo patamar de consumo há 40 anos, mas que existe uma demanda represada na área de infraestrutura. O país precisaria investir entre 4% e 6% do PIB nos próximos 20 anos para reverter a situação atual e proporcionar às indústrias a retomada do crescimento e lembrou que a China investe 13% de seu PIB, o Vietnam 10% e a Índia 6%. Já o CEO da ArcelorMittal Aços Longos Brasil, Jefferson de Paula, chamou a atenção para o momento difícil por que passa a economia brasileira, com a perspectiva de registro do pior PIB desde a década de 70. Fiat Lux Lino Machado, médico e deputado em 1947, criticava na Tribuna da Assembleia o prefeito : - A cidade está abandonada, está às escuras. Fiat Lux ! Jefferson Nunes, todo poderoso chefão político do Interior do Maranhão, partiu para a ironia : - É um absurdo que V.Exa. vá estudar no RJ e volte para cá com esse latim de caixa de fósforo. Esporádico Lino, tempos depois, quis se vingar da ironia do coronel. Alguém foi assassinado no interior do MA. Jefferson Nunes disse que era um caso esporádico. Lino Machado deu o troco ao Fiat Lux : -V. Exa. não sabe o que é esporádico. - Eu sei, sim. V.Exa é médico. Tem 100 clientes. Morrem 99. Salva-se um. É um caso esporádico. Sete pecados capitais dos governantes 1) A insensibilidade 2) A onipotência 3) A crença na força absoluta da grana 4) A rotina 5) A improvisação 6) A bajulação consentida 7) O descompasso com o senso comum.
quarta-feira, 8 de julho de 2015

Porandubas nº 451

Abro a coluna com o grande Barão de Itararé, Aparício Torelly, mestre e glória do humorismo brasileiro. Em 1938, postou-se diante dos juízes do Tribunal de Segurança da ditadura. Com o relato, o amigo Sebastião Nery : - O senhor sabe por que está preso ? - Sei sim. Porque desobedeci a minha mãe. - Não entendi. - Muito simples, doutor juiz. Eu sempre gostei muito de café. Minha mãe reclamava : Meu filho, não tome tanto café que um dia você vai se dar mal. Eu desobedeci e continuei tomando café. No mês passado, estava eu com alguns amigos tomando um cafezinho na Galeria Cruzeiro, chegaram os homens da polícia e me levaram. Minha mãe tinha razão : eu ainda ia me dar mal por causa de café. E me dei. O interrogatório foi encerrado. Clima fervendo O ambiente está turvo. E os sinais da crise se multiplicam. Dilma dará respostas satisfatórias aos ministros do TCU ? Será condenada ? Mas, não há precedentes sobre "pedaladas" fiscais ? Hoje, diz-se, suas contas não seriam aprovadas. Mas, pelo que se sabe, há contas de governos passados que ainda não passaram pelo crivo do TCU. As respostas de Dilma estão sendo preparadas. O fato é que os olhares nacionais estarão atentos à decisão a ser tomada dia 22 de julho. Os ministros do TCU são escolhidos pela via política. As contas no TSE No TSE, a pendenga sobre irregularidades nas contas de campanhas de Dilma e também de Lula abrirá novas frentes de polêmica. O relator, o juiz corregedor Noronha, é quem decidirá. Há delação do Ricardo Pessoa, da UTC, que aponta para recursos encaminhados às campanhas. Mas haverá provas disso ? E se as doações tiverem entrado nas planilhas da formalidade ? Se o TSE desaprovar as contas, a tese é que a chapa Dilma/Temer seria impugnada. Mas é forte o argumento de que as campanhas tiveram caixas separados, o que livraria o vice-presidente de qualquer condenação. Delação continua O sistema de delações continuará aceso ainda por um bom tempo. A conversa é de que a próxima etapa cuidará de cruzar informações e procurar provas, documentos, planilhas, contas em banco etc. Cerveró, o último ex-diretor da Petrobras a ser preso, poderá se transformar na bomba mais aguardada. Ele deve ter provas sobre a compra de Pasadena. Zelada, o ex-diretor da área internacional, também entrará nessa esteira. Políticos Os políticos ganharão um bom tempo para suas defesas. Como dispõem da prerrogativa do foro privilegiado, atravessarão um corredor mais longo. O STF deve querer ver provas, contraprovas, checar depoimentos, acolher os diversos tipos de embargo etc. Essa situação deverá se alongar por mais de ano. A fogueira da política queimará às margens do pleito de 2016, com alguns atores influenciando a eleição de uns e prejudicando a de outros. Alcides "Deus estava irado quando inventou a paixão." "Paraíba : Terra que se fez pequena para não parecer tão grande." (Durante campanha eleitoral) Duas frases de Alcides Carneiro, advogado, poeta, político, um dos maiores oradores da Paraíba. Conexão PT - Lava Jato O longo duto que conecta o mensalão ao petrolão - operação Lava Jato - acaba engolfando todo o petismo, a ponto de merecer de seu inspirador e fundador principal, Luiz Inácio, o mais veemente apelo por uma "volta às origens". A guinada à esquerda que o ex-metalúrgico pretende liderar seria o contraponto à guinada conservadora que se instala no país. Ele sabe, porém, que, antes disso, precisa arrumar as parcerias. Correu à Brasília para tentar segurar as bases junto ao Governo. O calvário depois de 30 anos O lulopetismo passa por sua maior prova depois de três décadas. Poderá até não morrer, mas está na UTI. Sua maior expressão vai para o canto do ringue, tentando se desvencilhar de um adversário portentoso, treinado nas artes, ou melhor, nas letras jurídicas, o juiz do Paraná. Qual o remédio que poderá salvá-lo ? A fórmula medicinal da bula da economia, chamada BO+BA+CO+CA= Bolso, Barriga, Coração, Cabeça. Bolso satisfeito, Barriga cheia, Coração emocionado, Cabeça agradecida. Nesse caso, a médica será sua pupila, dra. Dilma Rousseff. Mas a recuperação não será este ano. Teremos um segundo semestre pior que o primeiro. E, por enquanto, não se enxerga luz no fim do túnel. Lula cai na realidade Nos últimos dias, ouviu-se um Lula mais humilde, dizendo : não podemos fazer nada. Vamos esperar para ver. Não é o caso de pensar que Luiz Inácio desistiu da parada. Ele quer salvar a imagem do PT e animar as bases petistas para os espetáculos eleitorais de 2016 e 2018. Vai tentar salvar o que for possível. Se o PT fizer 400 prefeitos, já será um sucesso. Mas será uma pequena base para a alavancagem da campanha de 2018. Lula só será candidato se divisar possibilidade de vitória. Não se dará ao sacrifício de entrar numa fria. Aécio com menos chance Aécio Neves só tem chances caso a chapa Dilma/Michel seja impugnada. Nesse caso, assume a presidência da República Eduardo Cunha. Uma campanha eleitoral seria organizada para eleição do novo presidente. Aécio, nesse caso, conta com o recall da campanha de 2014, podendo ganhar de Lula, se este for o candidato. Essa moldura deixará o país à beira da convulsão. Será uma campanha nunca vista. Não é o cenário com que contam tucanos como José Serra e Geraldo Alckmin. Para eles, o ideal seria um governo de transição com Michel Temer e eleições pacíficas em 2018. Cenário provável Este analista tende a acreditar que Dilma, depois de muita borrasca, conseguirá segurar o governo. Para tanto, precisa acelerar as medidas do ajuste fiscal e arrefecer a animosidade social. Levy será peça-chave nesse tabuleiro. A baciada maior O PMDB se prepara para ter candidatos no maior número de municípios. Quer fazer a maior baciada de prefeitos em 2016. Dispõe de condições para tanto : o maior número de prefeitos, hoje, o maior número de vereadores e de deputados estaduais ; além da maior bancada de senadores. Essa é a base de lançamento de uma candidatura própria em 2018. Zavascki O ministro Teori Zavascki, da Corte Suprema, está na lupa de todos : políticos, advogados, setores produtivos, mídia. De sua pena sairão as decisões sobre a operação Lava Jato na esfera política. Dilma tranquila A forma física faz bem à mente. A crise explodindo bombas por todos os lados e Dilma dá uma entrevista à Folha de S.Paulo, desafiando seus opositores. Auto-confiante e tranquila. É a Dilma da bicicleta. Contas reprovadas Se as contas de Dilma forem reprovadas no TCU - e tudo indica que serão - o imbróglio vai para o parlamento. Em jogo, o julgamento da responsabilidade sobre as pedaladas. Como será o processo ? O governo conseguirá apoio de sua base para se livrar do afastamento ? Provas, provas, provas Os próximos tempos serão abertos para as provas. Os advogados tentarão provar que as provas a serem apresentadas não terão o caráter comprobatório. Será um fértil tempo para acompanharmos as teses do Direito em nossos tempos contemporâneos. Dupla vitória O TJ/SP rejeitou a queixa-crime movida pelo governador do Acre, Tião Viana, contra a ex-secretária de Justiça de SP, procuradora de Justiça Eloisa Arruda. Ao se pronunciar sobre o envio de milhares de haitianos para a cidade de São Paulo, ela teria dito que o governo do Acre agia como um "coiote". A defesa da ex-secretária foi realizada pelo advogado Luiz Flávio Borges D'Urso, ex-presidente da OAB/SP, sócio do escritório D'Urso e Borges Advogados Associados, que sustentou a decadência da ação. Antes, a ação havia sido proposta por aquele governador, perante o Tribunal do Acre, mas D'Urso sustentou a incompetência absoluta do TJ acreano, alegando que Eloisa teria foro privilegiado em SP. Estratégias do líder Dois casos clássicos demonstram a capacidade estratégica de um líder. O primeiro envolve Alexandre Magno. Quem conseguisse desatar o nó que unia o jugo à lança do carro de Górdio, rei da Frígia, dominaria a Ásia. Muitos tentaram. Foram a Alexandre. Ele tinha duas opções : desatar o nó ou cortá-lo com a espada. Optou pela via mais rápida e certeira com um golpe forte. Sabia que perderia tempo tentando desatá-lo. O segundo caso é o ovo de Colombo. Levaram um ovo para o almirante e pediram que o equilibrasse. Com um pouco de força, Colombo colocou o ovo em posição vertical sobre a mesa. Corrupção, uma pandemia Temos, no Brasil, um formidável aparato contra a corrupção. Todos os buracos podem ser fechados. Vejamos : temos uma lei de responsabilidade fiscal. Temos o art. 37 da CF, que reza sobre a administração pública direta e indireta nas esferas dos Poderes, pregando os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Dispomos do decreto-lei 201/67 que estabelece a responsabilidade de prefeitos e vereadores. Temos a lei 8.027/90 sobre normas de conduta de servidores públicos civis. Há a lei 8.429/92, que regula as sanções aplicáveis aos agentes públicos em casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo e função na administração pública. Todas parecem letras mortas. Por fim, a lei 8.730/93, que trata da obrigatoriedade de declaração de bens e rendas para o exercício do cargo. E mais controles Ao lado do cipoal legal, há, também, instituições respeitadas defendendo a bandeira da moralização. Há o MP, que procura pegar desmandos gerais dos Poderes, fiscalizando o cumprimento das leis. Há as Comissões Parlamentares de Inquérito, sob responsabilidade do Poder Legislativo, instrumento que geralmente acaba contaminado por vieses partidários, servindo de escudo de interesses personalistas. Vale, então, perguntar : se há leis, figuras respeitáveis para torná-las eficazes e até disposição política para se implantar o império da lei e da responsabilidade, por que a corrupção no país se alastra ? Qual a razão deste fenômeno se abrigar, com tanta força, nos domínios de um governo de quem se esperava ser o ícone da ética e da moral ?
quarta-feira, 1 de julho de 2015

Porandubas nº 450

Abro a coluna com a culinária francesa, na esteira da proibição do "foie gras", em São Paulo, pelo prefeito Fernando Haddad. Pulé roti O negro Belarmino era um cozinheiro cheio de pompa e orgulho. Trabalhava no antigo "Hotel de France", em Fortaleza. Quem o azucrinava com sua cor, ele não deixava por menos : "roupa preta é que é roupa de gala". E arrematava : "pinico também é branco". Chegava um cliente, esnobava o francês : "Que tal um puassom ("poisson", peixe) com petipuá ("petit pois", ervilha)" ? Mas nunca conseguiu entender que "poulet rôti" é frango assado e não simplesmente frango. Transferido para a Pensão do Bitu, reclamou ao patrão, logo no primeiro dia, ao passar diante do galinheiro : "seu Bitu, me dê a chave da despensa para eu tirar o milho, pois inté essa hora, os pulê roti estão tudo em jejum". (Historinha narrada por Leonardo Mota, em Sertão Alegre) Cálculo político É possível projetar a viabilidade política de contendores e evitar erros de cálculo político ? Sim. Carlus Matus, o papa do planejamento estratégico situacional, ensina : "Tudo depende de saber jogar, pois um jogador, mesmo tendo boas cartas no jogo de baralho, pode não saber jogar e perder o jogo para outro que recebeu cartas inferiores, mas tem melhor estratégia de jogo". Contendores de 2016 : procurem estrategistas para uma boa orientação. Pensem com a cabeça e arremetam com o coração, evitando a síndrome do touro, que faz exatamente o contrário. Nuvens negras à vista As projeções continuam inundando os espaços midiáticos : o segundo semestre será pior que o primeiro. O cenário continua a mostrar revisão para baixo do PIB não apenas para este ano como para o próximo. E a inflação poderá chegar aos 9%. Significa aperto forte nas camadas mais baixas da pirâmide e refluxo no bolso dos consumidores de classes médias. A classe C, média emergente, sofrerá bastante. E fará emergir sua indignação por temer voltar a um patamar inferior. As nuvens negras abarcam todos os quatro cinturões do governo : político, econômico, social e administrativo. Quatro trimestres A economia pode amargar até quatro trimestres consecutivos de queda do PIB em 2015, na comparação trimestral, tornando a crise atual mais longa do que a de 2009. O crescente pessimismo com a atividade econômica está contaminando também as expectativas para 2016. O boletim Focus, do Banco Central, que reúne projeções de mais de 100 instituições, aponta avanço de 0,5% do PIB no ano que vem, 0,2 ponto percentual a menos do que na semana passada. Analistas já prevêem desempenho negativo no próximo ano. Baixa confiança de empresários e consumidores e piora do mercado de trabalho comprometem a recuperação da economia. Clima mais tenso O clima político, já bastante tenso, tende a se agravar com a relação de mais nomes nas listas da operação Lava Jato. O ar de tensão se agudiza face ao peso dos nomes que entram na lista, a partir da delação premiada do presidente da UTC, Ricardo Pessoa. Com todas as letras, afirmou que propina foi distribuída para campanhas e políticos. Não foi doação oficial. E mostra ter provas à disposição da Justiça. O Congresso chegará ao clímax de expectativas. O Executivo continuará ser foco das delações. Afastamento ? Terá a presidente Dilma condições de tocar a administração com uma bateria continuada de acusações, denúncias e envolvimento de pessoas ao seu redor ? Acrescente-se ao apertado cinturão político a imagem destroçada do governo. Pesquisas que estão sendo feitas por Institutos, esta semana, poderão baixar mais ainda a avaliação positiva do governo, hoje em torno de 10%. Já se discute a pauta do parlamentarismo, apesar de sabermos que o presidencialismo está profundamente impregnado na alma nacional. O impeachment volta a acender os ânimos. Mas este analista acredita que a ideia será rechaçada. A mobilização das ruas As ruas voltarão a ser ocupadas pelos movimentos sociais. Este primeiro semestre serviu para observação de cenários, avaliação de forças, acompanhamento do quadro econômico e planejamento de novas ações. Que virão. O Congresso será cobrado por aquilo que ainda não fez : a reforma política. A guinada conservadora, que tomou conta de pautas e debates, terá um forte contraponto por parte das entidades que trabalham na linha de frente da defesa de igualdade de gêneros. A carestia jogará também os desempregados e os de bolso vazio nas ruas. Estratégias do líder Dois casos clássicos demonstram a capacidade estratégica de um líder. O primeiro envolve Alexandre Magno. Quem conseguisse desatar o nó que unia o jugo à lança do carro de Górdio, rei da Frígia, dominaria a Ásia. Muitos tentaram. Foram a Alexandre. Ele tinha duas opções : desatar o nó ou cortá-lo com a espada. Optou pela via mais rápida e certeira com um golpe forte. Sabia que perderia tempo tentando desatá-lo. O segundo caso é o ovo de Colombo . Levaram um ovo para o almirante e pediram que o equilibrasse. Com um pouco de força, Colombo colocou o ovo em posição vertical sobre a mesa. Agressões entre grupos As agressões entre grupos e núcleos se ampliarão na esteira das crises : econômica, política, moral, de gestão. Os conflitos deverão enfrentar o pulso forte das forças policiais, donde se pode inferir que a violência ampliada desencadeará mais violência. A segurança pública será questionada. As devastações de patrimônios - público e privado - deixarão rastros de sangue. Refluxo produtivo O pacote fiscal/tributário do governo atingirá os setores produtivos, fazendo baixar sua produção, aumentar seu prejuízo e demitir em massa. Aliás, o desemprego, hoje em torno de 8%, pode chegar à casa dos dois dígitos. Nenhum setor se mostra otimista. As projeções de queda atingem todos. Ou seja, as coisas ruins que se registram, hoje, ficarão piores. Esse é um quadro desalentador. O fim da política de desoneração da folha - atenuada apenas para quatro setores - vai pesar sobre o budget das empresas e dos setores de serviços. Povo "Não há povo, com efeito, sem pátria. Mas depende do povo que a pátria seja um vínculo de servidão ou um monumento de liberdade." (Jules Michelet) PT saudações O PT está com o destino selado. Não terá imagem melhorada até as eleições de 2016. Fará uma pequena bancada de prefeitos. Tentará dar uma guinada forte à esquerda, uma espécie de vôo rumo às origens, para renascer das cinzas. Virou o partido da corrupção, por excelência. A cor vermelha, apropriada pela sigla, tornou-se o traço cromático da esperteza e da imoralidade. Lula voltará com vontade para dar um norte ao partido. Mesmo com carisma, em queda, não conseguirá melhorar a imagem do PT no curto prazo. E as novas opções ? Onde estão as novas lideranças ? As novas opções ? Quem pode canalizar a vontade social nesta crise ? Por enquanto, não surgiu nenhum nome alternativo. Aécio Neves desponta na frente, neste momento, por causa do recall que tem da última eleição presidencial. O governador Geraldo Alckmin começa a fazer uma agenda nacional, indo às regiões e tentando se mostrar fora do circuito do Sudeste. José Serra, com seu recall alto, também começa a aparecer nas especulações. Poderia ser o candidato do PMDB à presidência em 2018. Mas o PMDB promete que, na próxima campanha, terá candidatura própria. Impacto da delação O impacto da delação premiada de Ricardo Pessoa foi grande. A segunda fase deverá ser a de amostra de provas. Com elas, o MP e o juiz Sérgio Moro deverão ir em frente abrindo novas fases da Operação. Cresce, no entanto, a insatisfação com a escalada de prisões a mando do juiz. Soltas, figuras exponenciais do empresariado seriam ameaça à ordem social ? Algum traço de celebridade, reconhecimento, espetacularização, efeito pictórico é claramente visível nessas operações da Lava Jato. Lula, Cardozo e PF Lula se queixa do ministro José Eduardo Cardozo por este não controlar a Polícia Federal. Ora, mas a Polícia Federal só age quando é instada, quando recebe ordem para prender alguém. Trata-se de um instrumento do Estado. O ministro não pode desautorizar o juiz e muito menos interferir nas ações rotineiras da PF. Dessa forma, a queixa de Lula perde sentido. PT e PMDB PMDB e PT continuarão fazendo aliança para 2016 ? Pouco provável. O vice-presidente da República, Michel Temer, tem redobrado esforços para conseguir aprovar o pacote fiscal. Ocorre que o PT tem pouco ajudado nessa tarefa. O partido está divido em alas. Algumas não aceitam o PMDB como parceiro central. Por via das dúvidas, o PMDB põe sua lupa para ver até onde vai a ambição do PT. Impossível fazer aliança com um partido que tenta esfaqueá-lo pelas costas. Quatro mães "Quatro mães muito formosas parem quatro filhos muito feios. A verdade pare ódio, a prosperidade, orgulho, a familiaridade, desprezo e a segurança, perigo." (Padre Manuel Bernardes) Arrefecimento das oposições Dois nomes de oposição constaram na lista apresentada por Ricardo Pessoa : o senador Aloysio Nunes Ferreira, do PSDB, e o deputado mineiro Júlio Delgado, do PSB. Esses parlamentares arrefeceram o ânimo das oposições face à lista de pessoas que receberam dinheiro da UTC. Doações ou não, que os órgãos de controle façam a devida investigação. Nêumanne na academia José Nêumanne Pinto, jornalista, poeta e escritor, toma posse, hoje, às 19h, na Academia Paulista de História, em cerimônia a ser presidida pelo presidente a APH, Luiz Gonzaga Bertelli. O evento será na rua Tabapuã, 445, Itaim Bibi. A saudação será feita por este escriba. "Pequena é a parte da vida que vivemos. Pois todo o restante não é vida, mas tempo." (Sêneca) O ataque ao delator O ataque da presidente ao presidente da UTC, Ricardo Pessoa, que fez a delação premiada na operação Lava Jato, foi um ponto completamente fora da curva. Comparar delação premiada, que é um instrumento previsto por lei, com a delação sob tortura nos tempos da ditadura, é confundir conceitos e "torturar" a verdade. E, por cima, lembrar que ninguém gosta do delator Joaquim Silvério dos Reis, da Inconfidência Mineira, é atropelar a história. A presidente deveria se valer de uma assessoria qualificada. Respeite minha palavra Marli Gomes, ativista política de Luziânia (Goiás, 65km de Brasília), convidou as amigas em junho de 1983 para visitar o seu deputado Federal na Câmara. Ao adentrar no Plenário, acesso dos visitantes, Marli viu seu representante a cochilar. Joaquim Roriz, o mais votado pelo MDB de Goiás, retirava o atraso no descanso. Cabeça pendurada, caía em sono profundo com direito a boca aberta. Constrangida, Marli resolveu sentar, esperando uma reação. Ocupava a Tribuna o deputado Gastone Righi, do PTB de São Paulo. Acostumado a discursos acalorados, fazia o representante paulista um comunicado com entonação amena. O deputado Roriz então passou a mão no microfone e solicitou : - Deputado Gastone, o Senhor me concede aparte ? - Nobre deputado Roriz, respeite a minha palavra como respeitei o seu sono. Estou há um bom tempo a cochichar. (Enviado por [email protected])
quarta-feira, 24 de junho de 2015

Porandubas nº 449

Abro a coluna lembrando a campanha para prefeito de SP. Debate Folha/Globo em 11 de novembro de 1985. Fernando Henrique, senador, e o ex-presidente Jânio Quadros. Historinha colecionada por José Luiz Silva em seu Jânio Quadros e os Nordestinos de São Paulo. - Boris Casoy : - Senador, o senhor acredita em Deus ? - FHC : - Essa pergunta, o senhor disse que não me faria. ...estou abrindo uma chance para a crença em Deus. O caso entrou na boca do povo pela poesia de cordel : Dessa vez vou ser sinceroSuporto qualquer defeitoMe venha de qualquer jeitoQue eu apoio e toleroSomente o que eu não queroÉ pensamento baratoNão quero jogar no matoO voto dos sonhos meusSe você não crê em DeusPra mim não é candidato (Coriolano Sérgio) Mas já no dia seguinte, na região do centro de SP - Barão de Itapetininga, 7 de abril, Dom José de Barros, Praça Ramos - escutavam-se os repentistas : "Juro por Nossa SenhoraPor Padre Ciço Romão São Cosme, São Damião,Por Jesus de Pirapora,Santa Mônica, Santa Aurora, E por São Judas Tadeu,São Jó, São Bartolomeu, São Francisco e São GasparNem pense que eu vou votarNum homem que é ateu". Fernando Henrique, que chegou a sentar na cadeira de prefeito, antecipando a votação, perdeu para Jânio. Que teve de espanar a cadeira... Jânio venceu com 39,3% dos votos válidos, contra 35,3% de FHC e 20,7% de Eduardo Suplicy. ____________ Desabafo de Lula A frase surpreendeu : O PT está velho e petista só pensa em cargo. Foi isso que Lula disse, em desabafo, antes de ontem, na esteira de outra crítica feita um pouco antes ao governo, ao lado da autocrítica : "o PT está no volume morto, o governo Dilma está no volume morto e eu mesmo estou no volume morto." Afinal, qual o significado deste desabafo ? Vamos lá : primeiro, um recado à Dilma : cuidado, estamos todos no mesmo barco ; segundo, um recado à militância, algo como : vamos ter de refazer o partido. Temos de resgatar nossas bandeiras. Terceiro : o reconhecimento de que o partido tem errado, mas sempre é hora de reconstruir caminhos. Freud explica É perceptível que a rápida deterioração da economia brasileira minou a confiança de quem produz e de quem consome. Não à toa, a recuperação da confiança é um dos temas mais sensíveis do momento. Calejados, empresários e a população observam, cabreiros, o desenrolar dos erros que se acumularam nos últimos anos. Por isso, assistir o matreiríssimo ex-presidente Lula abrir sem pudor o bico e desancar o governo de sua pupila, expondo sua contrariedade, como tem feito para as mais variadas plateias nos últimos dias, enche nossas cacholas de interrogações. Reconquistar a confiança já é um processo lento, de tal forma que a mãozinha que Lula está dando deixa encafifado até aquele renomado psicanalista austríaco. Nota burra Os senadores do PT, como se quisessem fazer um desagravo ao ex-presidente Lula, produziram uma nota de solidariedade. Acusando todos que são contra o PT de cultivar ódio a ele. Fizeram, mais uma vez, ode ao bolorento refrão : nós e eles. Ora, a separação do Brasil em dois pedaços tem sido feita pelo próprio PT e Lula. E o que disseram sobre as críticas de seu guru ao governo e aos petistas ? Nada, absolutamente nada. Passaram por cima disso. Se estão solidários com Lula, apenas reforçam as acusações que ele faz aos correligionários. Ou seja, dizem que eles, senadores petistas (ou eles são diferentes ?), só querem saber de cargos. Que interpretação outra pode ser feita ? No fundo do poço O PT chegou ao fundo do poço. O governo, em matéria de imagem, sofre as consequências deste ciclo de escândalos. O partido está batendo testa com o PSDB em matéria de prestígio. Antigamente, estava quilômetros à distância de outros. O governo, por sua vez, bate na trave dos 10% de avaliação positiva, só comparável ao governo Collor, por ocasião do impeachment. Pode se recuperar ? Sim, mas não no curto prazo. Portanto, qualquer recuperação poderá surgir lá pelos idos de 2017/2018. Vamos atravessar a campanha municipal de 2016 com o PT em declínio. Efeitos Ante tal perspectiva, o que poderá ocorrer ? Um afastamento de partidos da base do governo, com o PT isolando-se na campanha municipal do próximo ano ; a saída de quadros do partido, principalmente na esfera municipal. Muitos serão tentados a deixar a sigla pela janela aberta de 30 dias, aprovada no âmbito da reforma política. Essa resolução precisa ser votada em segundo turno pela Câmara. 30 dias depois de sancionada, abre-se uma janela para que deputados federais, deputados estaduais e vereadores possam trocar de partido. O texto exclui a possibilidade de que os deputados federais que mudarem de partido tenham portabilidade, ou seja, levem consigo proporcionalmente o tempo de TV e o fundo partidário. Deve ser também ser aprovada pelo Senado em retornar à Câmara para que a reforma se complete. Para valer em 2016, deve ser aprovada até princípio de outubro, um ano antes das eleições. Vacas gordas, vacas magras Não faz muito tempo, o Brasil convivia com o fantasma da sobrecarga no consumo de energia elétrica. Chegamos a importar energia dos hermanos argentinos para minimizar o risco de apagões. Nos três primeiros meses de 2014, a demanda por energia por parte das famílias crescia a um ritmo de 6% e a da indústria acumulava alta 1,3% em 12 meses. Este mês, com o freio de mão puxado, o país registrou, no último domingo, o menor consumo de energia desde 2012. Alguém duvida que os tempos agora são outros ? Tranquilidade para poucos Analistas econômicos já trabalham com a expectativa de que o desemprego chegue, no final do ano, ao patamar de 9%. Quase o dobro da taxa de 5%, quando o IBGE apontava um quadro de pleno emprego no Brasil, em meados do ano passado. A situação se deteriorou de tal forma e em tão pouco tempo, que, no contexto atual, só três setores conseguem respirar aliviados : agronegócio, tecnologia da informação e parte da área da saúde. Essa parada súbita assusta principalmente por estarmos nos referindo a uma economia de 200 milhões de potenciais consumidores. Parceria no meio O PMDB e os partidos de centro esquerda, incluindo o PSDB dos tucanos, abrem a possibilidade de uma parceria em 2016, uma espécie de união de quase todos contra o PT. Se chegarem à conclusão de que esta saída seria absolutamente necessária para dar um fim ao ciclo petista, torna-se bastante viável. Estado-espetáculo A OAB/SP reagiu de maneira contundente contra a invasão do escritório jurídico da Odebrecht, por ocasião da prisão do presidente do Grupo, Marcelo. Há uma lei que criminaliza a invasão de escritórios de advogados. Por esta lei, o sigilo do trabalho dos advogados é inviolável e eles só podem ser objeto de busca e apreensão se acusados diretamente de ilícitos. "Houve, sim, uma violação", diz Airton Martins da Costa, da comissão de direitos e prerrogativas da OAB/SP. Campanha contra corrupção A OAB/SP lançou nesta segunda-feira uma campanha contra a corrupção, com 11 pontos de destaque. O ato contou com a participação do movimento Ministério Público Democrático, representado pelo seu presidente, Roberto Livianu. Compareceu o presidente licenciado da entidade, Marcos da Costa, que se recupera do grave acidente ocorrido há dois meses. Foi muito aplaudido. A vice-presidente em exercício, Ivette Senise Ferreira, explica o fenômeno : "a corrupção retrata a ausência de institucionalização política eficiente e eficaz, sob uma cultura em que os homens públicos subordinam seus papéis a demandas exógenas, ainda mais em um país, como o Brasil, em que o campo de interesses privados invade frequentemente o espaço da res publica, dando vazão ao patrimonialismo, tronco da árvore dos ismos que floresce no terreno da corrupção : familismo, grupismo, mandonismo, nepotismo, caciquismo, neo-coronelismo, fisiologismo". Pontos Entre os pontos que integram a plataforma da Campanha, estão : Criação de Programa Nacional de Combate à Burocracia em todos os níveis da administração pública ; Aprimoramento do aparato legislativo quanto às licitações públicas ; Prioridade, no Parlamento, à tramitação dos projetos de novos Códigos Penal e de Processo Penal ; Redução substancial dos cargos e funções de livre provimento e nomeação ; Vedação, aos ocupantes de cargos eletivos do Poder Legislativo, de afastamento durante o mandato para o exercício de cargos de confiança em outros poderes, sem perda do respectivo mandato ; Autonomia financeira e administrativa dos órgãos de controle interno da administração pública ; Definição de regras claras e procedimentos transparentes para o financiamento de campanhas eleitorais ; Fortalecimento institucional e estrutural das Agências Reguladoras. Incêndio no alemoa A Câmara Municipal de Cubatão instalou Comissão Parlamentar para apurar as condições em que se deram o incêndio no tanque da Ultracargo, em abril último. Para dar assistência à empresa foi contratado Luiz Flávio Borges D'Urso, da D'Urso e Borges Advogados Associados. Duas audiências públicas já foram realizadas e D'Urso assegura que a empresa fez tudo o que estava a seu alcance para controlar o fogo e suas consequências, lembrando que, felizmente, tal desastre não provocou vítimas. Horizontes da Prefeitura-SP O Instituto Paraná de Pesquisas acaba de fazer uma pesquisa para a prefeitura de São Paulo. Um dos cenários é este : o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), ficaria em terceiro lugar, com 13,8% das intenções de voto ; o deputado Federal Celso Russomanno (PRB) lidera a pesquisa, com 40,8%, e a senadora Marta Suplicy, pré-candidata do PSB, aparece na segunda posição, com 18%. Numa lista apresentada para os eleitores com apenas os nomes dos filiados do PSDB, o resultado foi o seguinte : Bruno Covas (18,9%), Aloysio Nunes (18,1%), Ricardo Tripoli (11%), Andrea Matarazzo (9,7%), João Doria (5%) e José Anibal (4,8%). Os eleitores que não sabem registraram 12,3% e nenhum, 20,2%. Testemunho para a história Idos de maio de 1965. Iniciava minha vida jornalística, na Sucursal do Jornal do Brasil, em Recife. Primeira cobertura de peso que o JB me encomendou : acompanhar a caravana da Sudene que iria ao interior do Piauí para assistir o desvio do rio Parnaíba no lugar em que seria construída a Barragem de Boa Esperança. A energia da Barragem iria atender imensa parcela do Nordeste, a partir do Maranhão, Piauí e Ceará. Uma bomba explodiu e as rochas separadas mudaram a vazão do rio, numa cerimônia presidida pelo então marechal presidente Castelo Branco. Sob o intenso medo que batia nos nossos ânimos (os anos duros de chumbo estavam apenas começando), aproximei-me do então ministro Extraordinário de Coordenação dos Organismos Regionais, general Cordeiro de Farias, que se mostrava muito cordato com os jornalistas. A ele me apresentei como jornalista do JB, na época o melhor jornal do país, e me sentindo encorajado narrei este episódio : - General, sou natural de Luis Gomes, RN, fronteira com a Paraíba e o Ceará. A caravana Prestes passou por minha cidade. Meu pai, Gaudêncio, tinha uma loja de tecidos e cereais. Todos os seus produtos foram confiscados em nome da Revolução. Meu pai guardava no cofre uma mensagem de Luis Carlos Prestes comprometendo-se a ressarcir todas as despesas quando a Revolução saísse vitoriosa. O que o jovem quer saber ? O velho general, simpático, recordava-se da passagem por Luis Gomes e também por outra Serra do oeste potiguar, São Miguel. E explicou porque o general Juarez Távora ficara no Ceará, enquanto outros comandantes já se encontravam na Paraíba, lá pelas bandas de Piancó. Animado, lembrei a ele uma historinha que meu pai me contava : - Em um grupinho na frente da loja, conversavam Prestes, Cordeiro e mais duas pessoas. Curioso, aproxime-me para ouvir o que diziam entre si. De repente, o comandante Prestes me vê e pergunta : - O que o jovem curioso quer saber ? - Apressei o passo e sai de fininho. Meu pai era fã entusiasmado da Coluna Prestes.
quarta-feira, 17 de junho de 2015

Porandubas nº 448

Abro a coluna com o coronel Minervino, de Pernambuco.João Minervino Araújo tinha uma das maiores firmas comerciais do Estado. Veio a crise, embananou-se. Um dia, aparece um advogado de Recife para cobrar títulos atrasados. O coronel Minervino ficou uma fera :- Doutor, nunca atrasei um título em toda minha vida. Não sou culpado pela crise, que pegou todo mundo. Volte para o Recife. Quando tiver dinheiro, pago.- É, coronel, estou vendo que o senhor quer ficar em nossa firma como um cliente relapso.- E eu estou vendo, doutor, que o senhor é um advogado muito escalafobético.- O que é escalafobético ?- Sei não, doutor. Só sei que é um palavrão muito forte.Onde estão os movimentos ?A pergunta é recorrente : onde estão os movimentos de rua ? Por que refluíram ? As coisas melhoraram ? Vamos lá. As coisas não melhoraram ; a inflação está beirando os 9% ; o desemprego cresce ; a insatisfação nas margens se alastra. A questão é de oportunidade. Depois de grandes ondas, a tendência é de arrefecimento. Mas os movimentos estão com suas lupas abertas. Olhando, medindo posições, analisando parâmetros, observando. A qualquer hora, as ruas voltarão a ser ocupadas. Impeachment murchou O tema do impeachment murchou. Não apenas porque os partidos de oposição concluíram que a campanha nessa direção não iria vingar. Observa-se certo refluxo nas pressões sobre o governo, o qual, por sua vez, parece sair do canto do ringue. A agenda positiva é desenhada : quase R$ 200 bilhões para obras, programas e projetos em diversas frentes da infraestrutura. Os chineses sinalizaram confiança, aparecendo com R$ 50 bilhões para investimentos. O pacote do ajuste fiscal anda, devagar, mas passará. Sob essa teia - ainda curta - de confiança, la nave va.TensõesO governo continua a enfrentar problemas sérios com a base política que lhe dá apoio. O primeiro nó é com o próprio PT. Que defende o governo Dilma, durante o dia, e o ataca, durante a noite. O PT quer fazer omelete sem quebrar ovos. Parte dele, para ser mais exato. Essa ala acredita que a proposta da era Lula continua a ser atual : facilitar o crédito e o acesso ao consumo. Daí achar que Levy é o demônio que age contra a classe trabalhadora. Se o PT está rachado, imaginem o que os outros partidos pensam. Fazem pressão, cobrança e abrem a locução da crítica. Como querem que o PMDB esteja todo fechado com o governo se o próprio PT está rachado ?ImbrógliosDilma passará por um longo corredor polonês : vai apresentar uma nova fórmula no lugar da regra alternativa ao fator previdenciário. A regra aprovada pelo Congresso - 85/95 - (tempo de contribuição mais a idade da mulher ; tempo de contribuição mais a idade do homem), segundo o ministro Carlos Gabas, levará o sistema previdenciário ao buraco, com o envelhecimento da população. E se as Centrais Sindicais não concordarem com a nova disposição ? Será o grande imbróglio das próximas semanas. Depois, a questão da maioridade. A tendência partidária é a de aprovar a diminuição da maioridade penal para 16 anos. Cunha conseguiu ajustar votação com PSDB, que tinha proposta alternativa. O texto acertado prevê redução da maioridade para os casos de crime hediondo - como estupro e latrocínio -, lesão corporal grave e roubo qualificado (neste caso, quando há sequestro ou participação de dois ou mais criminosos).DesoneraçãoOutro imbróglio será na área das desonerações. Alguns setores produtivos reivindicam que a política de desoneração da folha continue a lhes proteger. O relator, deputado Picciani, tende a escalonar a aplicação da regra para certas áreas.Recado de ZaratustraEm "Assim falou Zaratustra", Nietzsche expressa um pensamento muito apropriado para radiografar o estado de espírito da força social emergente : "novos caminhos sigo, uma nova fala me empolga ; como todos os criadores, cansei-me das velhas línguas. Não quer mais, o meu espírito, caminhar com solas gastas". Um bom recado do profeta Zaratustra aos deputados e senadores.Contas da DilmaAs contas da presidente Dilma, mesmo sob fortes críticas, tendem a ser aprovadas pelo Tribunal de Contas da União. O relator, ministro Augusto Nardes, aponta distorções nas contas de 2014, identificando divergências de R$ 7 bilhões na dívida da União e R$ 1 bilhão no saldo de financiamentos do Tesouro ao BNDES, além de passivos ocultos de R$ 222,5 bilhões por irregularidades no registro das dívidas (as pedaladas fiscais). Em abril deste ano, em Comandatuba, na Bahia, por ocasião do evento do LIDE, o ministro já havia antecipado este ponto de vista a este analista. Mas o TCU teme repercussões muito negativas em caso de desaprovação. Pode ser que fique na opção do puxão de orelhas. Os centros sociaisConsideremos os centros sociais como os conglomerados do meio da pirâmide, as classes médias, que tendem a propagar seu pensamento até as margens. Consideremos três setores de classe média : o A, elevado ; o B, a do meio e a C, a emergente. Quem sofre mais nesse momento é a classe média C. Que começa a perder o poder de compra adquirido há alguns anos. Já não tem disponibilidade para compra fogão, geladeira, carro. O bolso se comprime com a inflação e a subida de preços. A classe média B tem poder crítico forte. É a mais contundente contra o governo e o PT. Acompanha as tendências e está antenada na mídia. A classe média A é crítica, mas atravessa o ciclo da crise à distância.As margensAs margens periféricas sentem o esvaziamento de suas bolsas (pacotes sociais) e bolsos. Sofrem, sobretudo, com a carência e precariedade dos serviços públicos, a partir dos hospitais desmantelados e escolas públicas sem ensino de qualidade. Locupletam os meios urbanos de transporte coletivo, comprimindo-se todo santo dia em vagões de trens e ônibus. Começam a xingar governo e políticos, "tudo farinha do mesmo saco". Esperam as eleições para darem o troco. É o que costumam dizer quando instadas a emitir opinião sobre a situação do país.Como agem as massas ?As pessoas agem de acordo com quatro instintos ou impulsos. O primeiro é o instinto combativo, a necessidade de preservar-se, viver bem ; daí a luta contra as intempéries, os adversários, tudo que seja ameaça à sobrevivência. Se o Estado não lhe dá garantia de uma vida saudável, que vá pro inferno, sugere mentalmente. O segundo é o instinto alimentar, a necessidade de garantir o estômago para sobreviver. Na luta contra a fome, contra a miséria, recorre igualmente ao Estado. Daí o medo do desemprego, da falta de dinheiro. O terceiro é o impulso sexual, que garante a preservação da espécie ; e o quarto, o instinto paternal, é o responsável pelos vínculos da solidariedade, do amor à família, do carinho, da amizade, do companheirismo. Uma crise nos dois primeiros sistemas afeta os dois últimos, amortecendo os valores espirituais. Se não se sentem protegidas, as massas acabam se voltando contra os dirigentes que prometeram protegê-las.PT se recupera até eleições ?É mais viável apostar no declínio eleitoral do PT em 2016 do que em seu sucesso. Teremos ainda um ano e 4 meses até o pleito para prefeito e vereadores. Como 2015 está praticamente perdido em matéria de alento econômico, sobraria a quadra pré-eleitoral de 2016 para eventual recuperação do partido. Tempo curto. Nas capitais e grandes cidades, a formação da opinião é um processo lento. Forma-se um cordão de problemas e estrangulamentos no entorno das administrações. Em São Paulo, o prefeito Fernando Haddad será o alvo de todos os outros candidatos. E uma derrota do PT na maior megalópole impactará a militância. Os administradores municipais de outros partidos também sofrerão as conseqüências do ciclo de vacas magras.Férias coletivas15 das 29 fábricas de automóveis do país pararam ou ainda vão parar neste mês de junho e no próximo mês de julho. É uma faceta da crise. O desemprego na Grande São Paulo está chegando aos 9%. Planos econômicos Caso o ministro Edson Fachin, que tomou posse ontem no STF, se considerar impedido de julgar os planos econômicos das décadas de 80 e 90, faltará quorum na Corte para analisar e decidir sobre o assunto. Outros três ministros já se declararam impedidos : Luiz Fux, Luís Roberto Barroso e Cármen Lúcia.PMDB terá candidatoEm 2018, o PMDB terá candidato à presidência da República. Isso é questão já fechada na cúpula do partido. A orientação, para 2016, é que o partido disponha do maior número de candidatos para todas as cidades, a fim de continuar a liderar o ranking de prefeituras. O que é bastante provável.Andréa se preparaO vereador tucano Andréa Matarazzo já começa a formar sua equipe com vistas ao pleito do próximo ano. Tem o apoio de José Serra e luta para ganhar o placet de Geraldo Alckmin.PDT fica ou vai ?Uma dúvida se espraia : o PDT, comandado por Carlos Lupi, fica ou sai do governo ? O que se sabe é de uma reivindicação dos deputados no sentido de ocupar a vaga do ministro Manoel Dias no Ministério do Trabalho. O PDT tem votado sistematicamente contra o governo.Emoção mata a razãoZeferino era candidato a deputado pela Bahia. Arrebatado, enérgico, espumando de civismo, discorria sobre o sentido da liberdade. Dizia : "o povo livre sabe escolher os seus caminhos, seus governantes, eleger os seus deputados". Para entusiasmar a multidão, levou um passarinho numa gaiola, que deveria ser solto no clímax do discurso. No clímax, tirou o passarinho da gaiola, e com ele na mão direita, lascou o verbo : "a liberdade é o sonho do homem, o desejo de construir seu espaço, sua vida, com orgulho, sem subserviência, sem opressão ; Deus (citar Deus é sempre bom) nos deu a liberdade para fazermos dela o instrumento de nossa dignidade ; quero que todos vocês, hoje, aqui e agora, comprometam-se com o ideal do homem livre. Para simbolizar esse compromisso, vamos aplaudir e soltar esse passarinho, que vai ganhar o céu da liberdade". Ao abrir a mão, o passarinho estava morto. A frustração acabou com a euforia ; as vaias substituíram os aplausos. Um desastre. A emoção, quando não controlada, mata a razão.O bonitinhoJoão Bonitinho era figura popular em Caruaru. Vivia fazendo comício no bar e pregando comunismo na farmácia. Veio 64, Bonitinho foi preso. O delegado começou a apertar Bonitinho :- João, se você não fosse comunista, o que é que você ia ser ?- Capitalista.
quinta-feira, 11 de junho de 2015

Porandubas nº 447

Abro a coluna com a querida cidade de Mossoró, onde estudei no Seminário Santa Terezinha, porta do Oeste do Rio Grande do Norte. Mossoró foi a única cidade do Nordeste que derrotou Lampião, Rei do Cangaço. Eis o caso. Ao passar por Mossoró, no Rio Grande do Norte, Lampião teve um choque com tropas do exército. Na cidade, ferido, um cabo ficou com seu fuzil. Dias depois, aparece uma onça e começa a comer os bezerros na região. O prefeito foi ao cabo, já recuperado : - Precisamos de sua ajuda. A onça está fazendo muito estrago nas criações. Só um fuzil para matar. - Pois não, prefeito. Essa onça morre já, já. - Ótimo, porque ela já matou dois caçadores que tentaram derrubá-la de espingarda. O cabo se assustou, pensou, pensou e olhou para cima, enquanto arrematava : - Bem, seu prefeito. Só tem um problema. Eu sou do exército brasileiro. Sou Federal. Preciso saber primeiro se essa onça é Federal ou estadual. Não quero causar conflito entre os dois governos. A onça era municipal. E continuou a comer os bezerros da região. PT faz frente ampla O PT quer se reinventar. A modelagem que se imagina abriga resgate de velhas bandeiras da esquerda, reagrupamento das bases, reordenação de agendas e posicionamentos mais radicais em escopos temáticos. Uma proposta que será formatada esta semana, por ocasião do 5º Congresso do Partido, em Salvador, é a criação de uma Frente Ampla, que terá como foco a volta de Lula em 2018. É sabido que Lula é esperto nas abordagens que incluem discursos de palanque, criação de rótulos colados aos aríetes oposicionistas, manobras táticas para o PT se livrar do tiroteio midiático. Vejam bem esse nome : Frente Ampla. A Frente é contra ou a favor ? Não mais parece um rótulo de oposição ? Pois é, maneira de Lula querer parecer oposicionista sendo governista. Lula em palanque sob uma bandeira da Frente Ampla parecerá, em 2018, um candidato do PT contra o governo de Dilma Rousseff. A conferir. Quem faz parte A Frente Ampla de Lula será ancorada nas alas Construindo um Novo Brasil, Novo Rumo, PT de Lutas & Massas, com 429 delegados, ou 53,9% dos delegados, cujos nomes mais expressivos são Lula, Dilma, Mercadante e Rui Falcão. Trata-se da ala majoritária. A seguir, aparece o grupo Mensagem ao Partido, com 164 delegados, ou 20,6%, que abriga Tarso Genro, José Eduardo Cardoso e Paulo Teixeira ; em terceiro lugar, situa-se a ala Partido é para Todos, na luta, com 114 delegados, ou 14,3%, que tem Arlindo Chinaglia e Maria do Rosário ; a seguir, a ala A Esperança é Vermelha, com 42 delegados, ou 5,2% ; depois, a ala É pela esquerda que queremos o Brasil, com 27 delegados, somando 3,9% ; e, por último, a ala Constituinte por terra, trabalho e democracia, com 11 delegados, ou 1,38%. A favor do contra A propósito dessa dualidade - favor e contra - há uma historinha do coronel Chico Heraclio, o último dos grandes coronéis nordestinos, que imperava pelas bandas de Limoeiro, em Pernambuco. Perguntavam a ele sobre o eleitor de Recife, que nunca foi as caras da turma apoiada pelo coronel. Do alto de sua sabedoria, tascou : - O eleitor de Recife é muito a favor do contra. O marketing das pedaladas A pergunta tem sido recorrente a este consultor : esse marketing das pedaladas é eficaz, dá resultados ? Claro, a pergunta se refere às pedaladas que a presidente Dilma passou a dar, todos os dias, em sua bicicleta nos arredores do Palácio da Alvorada (não se trata, portanto, das célebres pedaladas fiscais que o governo andou cometendo com as contas do Tesouro). Minha resposta abriga um conjunto de fatores : 1. Ser parecido com uma pessoa comum abre espaço de simpatia e cordialidade ; 2. Quando as pessoas percebem que o passeio de bicicleta é mero instrumento de marketing, anzol para pescar sua atenção, desconfiam e se recolhem ao terreno das críticas ; 3. Quando o bolso do consumidor fica vazio, não há peripécia espetaculosa que dê jeito. O tom crítico A nota crítica ao governo continuará a dar o tom. Por isso, as capas dos jornais com as fotos das pedaladas não suavizam a imagem como o marqueteiro João Santana imagina. Ademais, leitores de jornais e revistas são os mais críticos ao PT e ao governo. Os leitores se lembram do cooper diário que o então presidente Fernando Collor fazia na região da Casa da Dinda, onde morava em Brasília ? Todos os dias, lá estava ele devidamente paramentado e puxando uma batelada de jornalistas que, de goela aberta, tentavam acompanhar seus passos. Depois de alguns dias de curiosidade, a extravagante liturgia, que usava até camisetas com refrões estudados (O Tempo é o Senhor da Razão), tornou-se coisa banal. Mais adiante, veio o estouro da boiada, o escândalo da Elba financiada com dinheiro da corrupção, que saía dos dutos de PC Farias. De repente, tudo desabou. E o marketing exacerbado ficou na história do espetáculo político. PSDB, o que pensa ? O PSDB continua sendo um partido de caciques. De uma galeria de grandes nomes, onde pontuam Fernando Henrique, José Serra, Aécio Neves, Geraldo Alckmin, Aloysio Nunes Ferreira etc. Num segundo plano, estão governadores como Beto Richa, com imagem rente ao chão ; Marconi Perillo, com imagem um pouco acima do chão e outros perfis sem muita expressão. Há a turma de parlamentares e ex-parlamentares, alguns com boa história no partido, como Álvaro Dias, bom porta-voz ; José Anibal, que circula bem na sigla ; Duarte Nogueira, um quadro expressivo ; o próprio líder na Câmara, Carlos Sampaio ; os membros da família Covas, Zuzinha e Bruno, Alberto Goldman, Arnaldo Madeira e Andrea Matarazzo, para citar apenas alguns. Mas o que pensa o partido ? Qual é sua proposta para o país ? Não se sabe. Sabe-se que, por iniciativa dos tucanos, a reeleição foi aprovada no Congresso nos idos da presidência de Fernando Henrique. E, agora, com votos do PSDB, a ideia foi derrotada. Para onde vai ? Qual o destino do PSDB ? Tornar-se um partido médio. A sigla não é popular. Caminha no meio da sociedade, circulando nas cidades grandes e médias. Reúne a nata da política, ou no dizer dos porta-bocas do petismo, a zelite da zelite. Este consultor não consegue distinguir um projeto contendo metas, eixos programáticos, fluxos, modelo de gestão etc. Constata, isso sim, que os tucanos têm entre eles opiniões diferentes sobre os temas em discussão no Congresso Nacional. Afinal, para onde vai a social-democracia no mundo e no Brasil ? Como serão os ajustes entre o território do Estado e o território da iniciativa privada ? Que Estado se faz necessário e que políticas liberais precisam ser expandidas ou encurtadas ? Minha gravata Outra historinha do coronel Chico Heraclio. O promotor, novo na cidade, mandou perguntar a ele se devia condenar ou absolver o réu. Resposta : - Diga ao doutor que procure saber os costumes da terra e as regras do nosso júri, aqui em Limoeiro. Basta ele olhar na minha gravata ; se for verde, é para soltar ; se for vermelha, é para condenar ; e se for amarela, pouco me importa. Ideários, urgente A reforma política é um clamor da sociedade. O estado da política é de devastação. Todos os entes partidários estão amalgamados, imbricados, seja nas formas de operação política, seja na produção do discurso. Qual o ideário dos partidos ? Que correntes doutrinárias seguem ? Como os eleitores distinguem suas diferenças ? Onde começa o território de um e termina o território de outro ? Coisas que ninguém sabe. Transparência Essa é a palavra-chave que abrirá a porta dos vãos da República nos próximos tempos. Clareza. Abertura das redomas. São os sinais alentadores que vemos nos horizontes. Projeções A campanha municipal de 2016 será uma das mais árduas de nossa história : 5.565 municípios ; escassez de recursos financeiros, mesmo que seja aprovado financiamento misto de campanha ; intensa competição entre os atores políticos. PT fará uma bacia pequena de prefeitos, pois não haverá tempo para recuperar antigo prestigio ; PMDB deverá fazer a maior cota ; PSDB terá desempenho médio, com maior baciada em São Paulo ; PSB deverá aumentar sua taxa ; PTB, PP, PRB, PDT e DEM terão participações não tão significativas ; partidos pequenos continuarão medíocres. Moldura dependerá do estágio da economia no segundo semestre do próximo ano. Razão e emoção, escassez e prosperidade estarão circundando os pleitos. Expectativas no congresso Há muita expectativa sobre as pautas congressuais. O Executivo deverá aprovar o pacote fiscal, mesmo com ajustes aqui e ali. Mas os presidentes das duas Casas conseguirão imprimir seu ritmo e sua agenda ? Lava Jato Digamos que, na régua de 100 cm, a Operação Lava Jato alcance nesse momento o meio, 50%. Está, portanto, na metade do caminho. Tem muito centímetro até chegar ao final. Para onde vai a esquerda ? Para onde vão as esquerdas no Brasil ? O escopo, convenhamos, tem perdido charme. Afasta-se do socialismo marxista, inspirado na brilhante análise do velho Karl Marx sobre a formação do capitalismo e a previsão de sua catastrófica evolução. A "violência como parteira da História", dogma apregoado por Engels e que se firmou na segunda metade do século 19, até que tentou fazer escola entre nós, nos idos de 1960, mas foi repelida pela ditadura militar. A redemocratização do país abriu espaço para vastas áreas no canto esquerdo do arco ideológico. A nova argamassa acomodou as estacas do alquebrado socialismo revolucionário e os tijolos do liberalismo político e econômico. E agora, José ? Nem Estado mínimo nem Estado máximo, mas um ente de tamanho adequado. A essa composição se agregaram expressões como "capitalismo de face humana" e "socialismo de feição liberal", tentativa de convergir eficiência econômica com bem-estar social. Qual o nome disso ? Socialdemocracia. A formosa dama chegou ao Brasil em fins dos anos 1980, com interpretação do PSDB, cujos ideólogos escreveram um texto, Os desafios do Brasil, sobre as crises da contemporaneidade, a textura da democracia social na Europa, as estratégias de crescimento e as políticas para o nosso desenvolvimento. Por tentativa e erro, nosso arremedo socialdemocrata entrou no terceiro milênio, ganhou o centro do poder e foi acusado pelo PT e satélites de se curvar ao Consenso de Washington. Até que o PT e sua esquerda alcançaram a alforria e adentraram o Palácio do Planalto. Depois, estouraram o mensalão e o petrolão, fazendo soçobrar as últimas pilastras do socialismo clássico por estas bandas. E agora, José ?
quarta-feira, 3 de junho de 2015

Porandubas nº 446

Abro a coluna com a velha Bahia.O que eu sou ?O caso é verídico. O farmacêutico Claodemiro Suzart, candidato do PTB à prefeitura de Feira de Santana, decidiu fazer o comício de encerramento da campanha na rua do Meio, na zona do meretrício. Jogou o palavrório : "o povo precisa estudar a vida dos candidatos, desde o nascimento deles, os lugares onde nasceram, para saber em quem votar direito. Vejam o caso de Arnold Silva, da UDN, nasceu em Palácio, nunca falou com o povo. O que ele é ?" - Candidato dos ricos - gritava a multidão. - É isso mesmo. Não pode ter o voto de vocês. E Fróes da Mota, candidato do PSD, nunca sentiu o cheiro de povo. Só gosta mesmo é do gado de sua fazenda. O que ele é ? - Candidato dos fazendeiros - delirava a galera. - Isso mesmo. Não pode ter o voto do povo. Já eu, meus amigos, nasci aqui, nesta rua do Meio, a mais popular de Feira de Santana. E eu, meus amigos, o que eu sou ? Lá do fundo da turba, um gaiato soltou a voz : - Filho da puta. O comício acabou ali. Renúncia de BlatterA renúncia de Joseph Blatter à presidência da FIFA mostra, sobretudo, que ele quer evitar o pior : submeter-se ao intenso processo de investigação que cercará o mundo do futebol. O ditado é popular : quem não deve não teme. O renunciante deve temer e muito. Vai presidir uma nova eleição, o que não o eximirá de culpa, se houver, quando o processo investigatório em curso nos EUA chegar ao seu final. A renúncia serve como alerta a todos os presidentes de Confederações Nacionais, sob a crença de que poderemos ter de ver a caída, em série, de algumas (não todas) pedras do dominó.Teixeira indiciadoO indiciamento do ex-cartola Ricardo Teixeira por lavagem de dinheiro, evasão de divisas, falsidade ideológica e falsificação de documento público é uma extensão do esquema mundial de desvios no entorno do futebol. Ele e Marin reforçam a suspeita do sistema que corrói as beiradas do futebol. Reforma no futebolA reforma que se espera no universo do futebol haverá de ser realizada sob a égide de alguns valores, dentre os quais anoto os seguintes : transparência, que é o conceito de comando desse ciclo civilizatório ; participação, que exigirá maior engajamento,envolvimento e colaboração por parte dos parceiros - hoje sem vez - no campo das decisões : representações das comunidades esportivas, jogadores, esferas encarregadas de defesa da sociedade, poder público, com foco na apuração de desvios e monitoramento dos bastidores do esporte ; planejamento racional, de forma a evitar congestionamentos de agendas ; democratização, com abertura das tribunas para a expressão das minorias. São alguns valores. A reforma política A reforma política passará por um segundo turno na Câmara, irá ao Senado e, se este fizer modificações no projeto, voltará para apreciação pelos deputados. A Câmara patinou no debate e gerou o que se chama de reversão de expectativas. Não avançou. Acabou aceitando a continuidade da distorção que significa a coligação proporcional ; vetou a reeleição, mas não decidiu, ainda, sobre o prazo de mandato (4 ou 5 anos) ; aprovou o financiamento misto para as campanhas, deixando em aberto a questão do teto ; e enfiou uma cláusula de barreira, que mais parece um jogo entre amigos : basta ter um representante em uma das casas congressuais para o partido ganhar recursos e ser legitimado. ModificaçõesEspera-se que o Senado aprofunde as modificações. Seu presidente, Renan Calheiros, reconhece que o momento é adequado para avanços. Urge fechar portas escangalhadas, como esta das coligações proporcionais ; urge acabar com o financiamento de pessoa jurídica, empresa privada, que contamina o processo eleitoral, abrindo frestas de negócios ; urge aprovar um modelo majoritário de voto, que eleja os mais votados ; urge diminuir os custos de campanha eleitoral ; urge acabar com os modelos auto-elogiativos das campanhas eleitorais ; urge ter rigor para a criação de partidos, não deixando que siglas sem voto tornem-se mercadorias no mercado eleitoral. O Senado precisa alargar a trilha estreita aberta pela Câmara. Pérolas do Barão de Itararé - Cobra é um animal careca com ondulação permanente. - Tudo seria fácil se não fossem as dificuldades. - Sábio é o homem que chega a ter consciência da sua ignorância. - Há seguramente um prazer em ser louco que só os loucos conhecem. - É mais fácil sustentar dez filhos que um vício. - A esperança é o pão sem manteiga dos desgraçados. - Adolescência é a idade em que o garoto se recusa a acreditar que um dia ficará chato como o pai. - O advogado é um cavalheiro que põe os nossos bens a salvo dos nossos inimigos e os guarda para si. Um traço verde na paisagemHá quem comece a enxergar um traço verde na paisagem seca e devastada. Refiro-me ao empresariado, particularmente aos grupos internacionais com plantas industriais no Brasil, que abre uma primeira expressão de crença no amanhã. Crêem que o Brasil ainda é um bom território para seus investimentos. Acreditam que Joaquim Levy poderá levar a bom termo sua missão. Esperam, contudo, que o Congresso Nacional dê respaldo aos ajustes que estão sendo propostos para a economia. O verde constatado na paisagem está nas roças de 2016. Até o final deste ano, a secura tomará todos os espaços. Prefeitos em 2016A campanha para as prefeituras, em outubro de 2016, será a mais pobre das nossas últimas décadas. Razões : o refluxo na economia ; mesmo que a situação possa mostrar sinais de melhoria no segundo semestre do próximo ano, faltarão recursos ; retração por parte dos doadores : mesmo que seja aprovada a doação de empresas privadas, haverá receio de muitos patrocinadores de ligar seus nomes a partidos. Fiscalização : o sistema de fiscalização e monitoramento de campanhas será mais forte. Racionalidade/enxugamento : as campanhas tendem a racionalizar custos e a diminuir despesas. Discurso : os discursos deverão se inspirar nestes valores : credibilidade, compromisso, prioridades, viabilidade, transparência, agilidade, ação.Campanha de 2018 - I Os horizontes de 2018 estão distantes. Mesmo assim, é possível traçar alguns cenários que deverão balizar as decisões de partidos e as performances dos atores políticos. Cenário branco : partidos e perfis assépticos, limpos, sem máculas, tendem a ser mais prestigiados. Mas qual o grande partido que se apresentará com este manto ? Cenário vermelho : a cor vermelha ficou comprometida com o estágio de deterioração (denúncias, escândalos, desvios), mas o PT e seus satélites (CUT, MST, MTST etc) não abandonarão a cor. Sua performance dependerá do estágio da economia naquele momento. Mesmo assim, será tarefa complexa a do PT se entrar em 2018 com candidato próprio. Cenário azul : este cenário beneficiará, em termos, as alas oposicionistas, principalmente se souberem compor um projeto para o país. Se ficarem apenas no discurso, não serão bafejadas.Campanha de 2018 - IICenário verde : este cenário poderá beneficiar grandes partidos, como o PMDB, caso apresentem perfis que encarnem os valores da inovação, da renovação, das mudanças, todos ancorados na estabilidade econômica. O cenário favorece, ainda, a aglutinação de partidos médios e grandes, que operem nas bandas esquerda e direita do centro. Ou seja, trata-se do cenário adequado aos times que poderão jogar em um grande campo do centrão democrático. Mas o fator de sucesso dessa alternativa será o perfil do candidato a ser lançado. Cenário amarelo : nesse ambiente, haverá a possibilidade de agregação dos pequenos partidos de esquerda se unirem em torno do PT, que se apresentará com um discurso radical, lembrando a antiga origem do ente que nasceu no berço do ABC paulista com o apoio de intelectuais e da igreja progressista.Pérolas do Enem - A fé é uma graça através da qual podemos ver o que não vemos. - Os estuários e os deltas foram os primitivos habitantes da Mesopotâmia. - O objetivo da Sociedade Anônima é ter muitas fábricas desconhecidas. - A Previdência Social assegura o direito à enfermidade coletiva. - O Ateísmo é uma religião anônima. - A respiração anaeróbica é a respiração sem ar que não deve passar de três minutos. - O calor é a quantidade de calorias armazenadas numa unidade de tempo. - Antes de ser criada a Justiça, todo mundo era injusto. - Caráter sexual secundário são as modificações morfológicas sofridas por um indivíduo após manter relações sexuais. Onde estão os Gomes ? Onde está Cid Gomes, o ex-governador do Ceará e ex-ministro da Educação ? Deve estar viajando, como gosta de fazer. Onde está Ciro Gomes, ex-governador do Ceará e ex-ministro da Fazenda e da Integração Nacional ? Nos últimos dias, foi visto jogando dominó em Sobral, Ceará. Voltarão às lides ? São novos. Esperam que o tempo trabalhe para eles ? Hum... Tenho dúvidas. Controle do executivoO presidencialismo brasileiro tem caráter absolutista. Quem está na cadeira da presidência exerce o poder da caneta, que resolve quase tudo. Mas esse pode começa a ser diminuído. Como ? O Congresso abre um ciclo de mudanças com a criação de mecanismos para atenuar o presidencialismo imperial. A bola da vez será a sabatina para aprovação/desaprovação de dirigentes para estatais.Pelé e BlatterNem bem Pelé dá apoio público ao Joseph Blatter, enaltecendo sua experiência, e o cara renuncia à presidência da FIFA. Com a ironia do Romário : Pelé calado é um poeta. Mão na bocaEstá virando costume político tampar a boca com a mão ao falar com o interlocutor ao seu lado. Quer evitar que algum espertinho contrate um especialista em leitura labial. Neste ciclo que exige Transparência Total, tampar a boca é um desrespeito. Pode ser que o figurante queira disfarçar outra coisa... É !Um truque do Padre Vieira O Padre Antônio Vieira, o célebre pregador, escritor, político e diplomata jesuíta, subindo certa vez ao púlpito, iniciou estranhamente o seu sermão exclamando : - Maldito seja o Pai !... Maldito seja o Filho !... Maldito seja o Espírito Santo !... E quando a assistência, horrorizada, pensava que o grande orador houvesse enlouquecido, ele tranquilamente prosseguiu : - Essas, meus irmãos, são as palavras e as frases que se ouvem com mais frequência nas profundezas do inferno. Houve um suspiro de alívio no templo, mas com esse recurso teve Vieira despertada e presa a atenção dos fieis como poucas vezes, por outra via, houvera conseguido. (Narrado por Luis Costa em Leia Comigo)
quarta-feira, 27 de maio de 2015

Porandubas nº 445

Que barbeirinho infeliz... ! Djalma Marinho, deputado estadual de 1947 a 1950 e Federal de 1951 a 1981, era compadre do barbeiro de Nova Cruz, sua cidade natal. Um dia, cortando o cabelo, ouviu o apelo : - Compadre, vi nos jornais que você vai para Roma visitar o papa. Ele é meu ídolo. Olhe aqui a foto dele. Vou lhe fazer um pedido : peça para ele autografar essa foto e escrever uma dedicatória à minha família. Não esqueça. Você é meu maior amigo e não vai me decepcionar. (Foto do Papa com dedicatória era, outrora, a maior honra que uma família nordestina poderia exibir na parede da sala de visitas.) O deputado viajou e encaixou o pedido tresloucado na mala do esquecimento. O tempo passa. Dois meses depois, ao voltar a Nova Cruz e ao sentar na cadeira da barbearia, recebeu a cobrança : - E aí, compadre, o senhor foi a Roma ? Viu o Papa ? E minha foto com a assinatura dele ? E a dedicatória ? - Pois é, compadre. Vi o Papa. Só me lembrei de você. Falei de sua família, de seu trabalho, da admiração que você tem por Sua Santidade. E ele me olhava com aquele olhar de santo. Quando me ajoelhei para tomar a benção, ele olhou para minha cabeça exatamente no momento em que me curvei para beijar o anel e, compadre, me deixou sem ação para pedir a assinatura na foto. Me perguntou muito contrariado : "Senhor deputado, que barbeirinho infeliz fez esse estrago em sua cabeça ?" Você há de compreender, não tive nenhuma condição de fazer o pedido. Não queria comprometer o compadre. Desta vez, olhe bem, compadre, muito cuidado no corte, viu ? O dilema do PT O Partido dos Trabalhadores padece de mais grave crise de sua história. Sua imagem está seriamente corroída pelos episódios do mensalão e da Operação Lava Jato. E, nesse momento, parte do PT renega o governo que, todo tempo, diz que é seu. Três senadores petistas resistem em aprovar as medidas do pacote fiscal proposto pelo governo para sair da crise : Lindbergh Faria, do RJ, Paulo Paim, do RS, e Walter Pinheiro, da BA. Dizem que tem dedo de Lula na influência sobre Lindbergh. Há um grupo, liderado por Lula, que se esforça para o PT voltar às origens e reconquistar os movimentos sociais. Como fazer isso, agora ? De um lado, defende o governo, "que é seu", de outro, critica o governo, com sua política econômica "neoliberal". O que está por trás Na verdade, o PT sente que o poder político se estiola em suas mãos, começa a derreter. Seus teóricos alertam o partido para a necessidade urgente e premente de voltar ao seio dos movimentos sociais. Como fazer a omelete sem quebrar ovos ? Como estender os braços sociais, expandir os programas de assistência num ciclo de carência financeira ? É impossível a qualquer governo ser generoso com as massas sem fazer nenhum sacrifício para arrumar a economia. A era do acesso fácil ao consumo e ao crédito passou. Hoje, aquela política mostra seus efeitos. A dureza demorou, mas chegou. O PT pensa em se eternizar no poder. Quer os louros de grandes vitórias. Em época de escassez. Um contrassenso. Qual o rumo ? O PT deverá passar um bom tempo no fundo do poço, amargando os erros de percurso. Se voltar ao passado, vai ter que enveredar pela arena da luta de classes. Voltará às margens radicais, perdendo núcleos que ganhou nos espaços da esquerda para o centro. O PT precisa ter a consciência das tendências políticas do mundo contemporâneo, sobretudo, da inclinação para uma visão social-democrata. Partidos que querem ser grandes não terão vez se optarem por se afastar dos centros e de suas laterais, à esquerda e à direita. Querer dividir o país em duas bandas - "nós e eles" - como o PT tem feito é um erro de estratégia política. Instila ódios, indignação, repulsa. Lula, o guru, e seus discípulos recorrem constantemente a esse ultrapassado discurso. A dinâmica social Partidos políticos precisam incorporar o espírito do tempo, o clima social, os inputs da economia e a temperatura dos ciclos. A sociedade avança, expande seus níveis de conscientização, amplia os raios de ação, cresce no sentido da racionalidade. O convívio com tecnologias cada vez mais futuristas, a interação entre grupos e comunidades por meio de redes eletrônicas, o sentimento de pertinência em um mundo cada vez mais estreito contribuem para a aquisição de uma nova cultura, de novas formas de pensamento. Socialismo clássico ? Não é possível defender o escopo do socialismo clássico sem ver nisso uma taxa de coisa ultrapassada. Os partidos de massa se foram na névoa do tempo. Hoje, os partidos precisam agregar os novos grupamentos sociais. As classes A, B, C, D e E são povoadas de comunidades que pensam de maneira diferente. As categorias especializadas tomam lugar das massas amalgamadas. O concriz do senador Quando senador pelo Rio Grande do Norte, Agenor Maria (sindicalista rural, falecido em 1997), visitando o município de Grossos, foi interpelado pelo prefeito Raimundo Pereira. - Estamos precisando de uma escola para a comunidade de Pernambuquinho. De pronto, Agenor garantiu-lhe apoio à proposição. Semanas depois, um telegrama traz a boa-nova ao prefeito. - Escola está assegurada. Mande-me o "croqui" (esboço, rascunho da obra). Tomado pelo espírito de gratidão, Raimundo visita Agenor para agradecer o empenho, carregando uma gaiola à mão. Diante do senador, que estranha o acessório, Raimundo vai logo se explicando. - Eu não peguei um concriz como o senhor pediu, mas trouxe esse sabiá. O bichinho canta que é uma beleza ! (Historinha narrada em Só Rindo 2, por Carlos Santos) As visões se clareando Opiniões colhidas e ouvidas aqui a ali mostram certo grau de descontração na economia no terceiro trimestre do ano. O esforço de Joaquim Levy dará resultados, dizem importantes porta-vozes de setores produtivos. O espectro ideológico A formação partidária do amanhã tem condições de abrigar dois grandes partidos de centro-esquerda, dois grandes partidos de centro-direita, dois nas pontas radicais (à esquerda e à direita) e não mais que três a quatro médios e pequenos rastreando os grandes. Limites do bom senso Os partidos de oposição começam a usar o bom senso. Recuam na ideia de pedir o impeachment da presidente Dilma. Fazem bem. Não há motivo para tanto, pelo menos até hoje. Crime de responsabilidade por atos realizados no governo anterior já é tese vencida. A maior parte dos juristas não aceita a hipótese. Urge acompanhar atentamente o desdobramento da Operação Lava Jato. E só mais adiante tomar decisão sobre rumos a seguir. Reforma política Os deputados são pragmáticos. Não votarão matérias que possam, mais adiante, contrariar seus interesses. Por essa razão, não se pode apostar em uma reforma política gorda, densa. Será aprovada uma reforma magra, com um ou outro ponto. Congresso Hoje pela manhã, às 9 horas, estarei palestrando no 18º Congresso Brasileiro de Comunicação Corporativa, promovido por Mega Brasil no Centro de Convenção Rebouças. Discorrerei sobre A Imagem em Tempos de Globalização Corporativa - Defesa da Reputação. Déficit e investimento direto O déficit em conta corrente chegou a US$ 6,9 bilhões em abril, de acordo com Banco Central. O resultado levou o saldo a acumular déficit de US$ 100,2 bilhões nos últimos doze meses, o equivalente a 4,53% do PIB. O valor já considera a nova metodologia de computação da série, divulgada no mês passado. Já o Investimento Direto (IDP) registrou entrada líquida de US$ 5,8 bilhões no mês passado, comparado à entrada de US$ 4,3 bilhões em março. Com isso, nos últimos 12 meses acumulou entrada de US$ 86,1 bilhões, o equivalente a 3,89% do PIB. As entradas de renda fixa e de ações, por sua vez, foram positivas em US$ 3,5 milhões e US$ 3,8 bilhões, respectivamente. Isso demonstra que, de fato, os fluxos de capitais estrangeiros para o Brasil continuam robustos, apesar da forte volatilidade nos mercados brasileiros no início deste ano. (Dados do Departamento de Pesquisas Econômicas do Bradesco). Fusão PTB/DEM Está muito difícil a fusão do DEM com o PTB. A cúpula do PTB quer, mas as bases, não. É o que se infere das posições expressas por líderes. Delações e receios Alguns quadros da política não têm conseguido dormir, ansiosos em ouvir as delações de alguns empresários. Há quem aposte que não haverá novidades. Mas há quem ache que as surpresas estão por vir. 15 partidos O ex-prefeito e atual vereador do RJ, César Maia, acha que "a reforma política que virá tenderá a reduzir esses 28 partidos à metade, uns 15, na eleição de 2018. Nunca as maquininhas de calcular dos parlamentares foram tão usadas, com seus assessores fazendo todo tipo de cálculos, de forma a avaliar quem ganhará ou perderá em cada hipótese. Sendo assim, com a redução das representações partidárias à metade de hoje na Câmara de Deputados, os partidos de representação de 3% ou menos ou desaparecem ou se tornam irrelevantes. Essa é a razão de fundo para que as fusões partidárias sejam estimuladas e venham ao centro do palco para serem efetivadas, discutidas ou mesmo especuladas. Todos precisam estar no grupo intermediário de 7% a 10%, de forma a que sejam relevantes mesmo num efetivo presidencialismo de coalizão." Rima Fecho a Coluna com um grande abraço. Lacerda, governador da Guanabara, candidato à presidência da República, foi a Montes Claros, no norte de Minas, (onde Aécio Neves divisa um pedaço do Nordeste a partir de sua terra mineira). A cidade amanheceu com os muros pichados : "Lacerda rima com m...". No comício, à noite, Lacerda acabou o discurso assim : - Aos meus amigos, deixo um grande abraço. Aos meus adversários, a rima.
quarta-feira, 20 de maio de 2015

Porandubas nº 444

Duas historinhas para abrir o apetite de leitura da Coluna : Juca Peba Desconfiado e matreiro, o coronel Juca Peba não era de muita conversa. Tinha dinheiro, e muito, guardado sob o travesseiro. Até o dia em que inauguraram a Agência do Banco do Brasil, em Cajazeiras. A gerente foi procurar o coronel Juca Peba com o argumento : - Coronel, bote o dinheiro no banco. Vai ser guardado, bem guardado, e vai render juros. Depois de muita conversa, e muitos cafés no varandão da casa, o coronel, ainda desconfiado, foi ao banco. Com 100 contos numa bolsa de couro. Tirou devagar o pacote. Contou. Uma, duas, três vezes. Depositou. Matreiro, ficou na espreita, na calçada, olhando, espiando o movimento do banco. Para ver se aquele troço não era tramóia. A desconfiança aumentou. Entrou no banco. Foi ao Caixa. Ordenou : - Quero os 100 contos que eu botei aqui. Já. Aflito, o bancário foi buscar o dinheiro. O coronel pegou o maço. Conferiu. Uma, duas, três vezes. E devolveu, sob a expressão juramentada : - Eu só queria mesmo conferir. Pode guardar. Quando não tem burro ? Era uma vez.... Viajando pelo interior de Minas, o arquiteto Marcos Vasconcelos encontrou um grupo de trabalhadores abrindo uma estrada : - Esta estrada vai até onde ? - Muito longe, muito longe, doutor. Atravessa o vale, retorce na beirada da serra, quebra pela esquerda, retoma pela direita, desemboca em frente, e vai indo, vai indo, até chegar a Ponte Nova, passando pelos baixios e cabeceiras. - Vocês têm engenheiro, arquiteto, teodolito, instrumentos de medição ? - Num tem não, doutor. Nós tem um burro, que nós manda ir andando, andando. Por onde ele for, aí é o melhor caminho. Nós vai picando, picando. - E quando não tem burro ? - Aí não tem jeito, doutor ; nós chama um engenheiro mesmo. O arquiteto seguiu adiante filosofando sobre as artes da burrice e da engenharia. Cenário político A paisagem é de cor cinza. O ambiente continua tumultuado, sob a expectativa de que os depoimentos na operação Lava Jato acirrarão as tensões na frente política. Há muitas dúvidas a respeito da delação premiada do presidente da UTC, Ricardo Pessoa. Teria provas de envolvimento de nomes mais pesados do que aqueles conhecidos até o momento ? Que provas seriam essas ? Valores depositados em contas pessoais ? Em contas de partidos, as provas são abundantes, mas estes alegam que foram doações que obedeceram aos trâmites legais. Pessoa deixou de fazer a delação em Curitiba para acertar os ponteiros com as autoridades de Brasília. Qual a razão ? Cenário econômico O cenário econômico também não é animador. O desemprego continua se expandindo, principalmente na indústria automobilística, na construção civil e em muitos segmentos de serviços. A perspectiva aponta para a aprovação do pacote econômico do Governo pelo Congresso, porém com reajustes que diminuirão as receitas previstas. A par das MPs 664 e 665, com debate aprofundado sobre o fator previdenciário, o próximo pacote será sobre a desoneração da folha. O governo defende a extinção das desonerações para os setores contemplados. O que significará aumento de impostos. O relator deste assunto, o líder do PMDB, Leonardo Picciani, poderá apresentar proposta alternativa de escalonamento na aplicação dos índices de aumento. Cenário social As movimentações de rua estão em stand by, significando que, a qualquer momento, possam ocupar as ruas. Há um grupo de caminhantes que se dirige a Brasília. Vai pedir o impeachment da presidente Dilma. O PSDB quer fazer um pedido oficial nesse sentido no dia em que os figurantes da caminhada chegarem à Brasília. Os tucanos querem se ancorar num parecer de um jurista de peso para dar seguimento à estratégia. Este analista sente que o movimento pelo impeachment perde força e fôlego. Cenário da gestão A gestão governamental está praticamente patinando. Verbas cortadas, recursos contingenciados ou em vias de contingenciamento, programas aguardando liberação de verbas, corpos administrativos dolentes e em compasso de espera - esses são alguns traços da paisagem no campo da administração pública. Nessa teia esgarçada, a imagem de gerente, que cobria o perfil da presidente Dilma, se desfaz. Por enquanto, o esforço maior é emprestado pelo articulador político, o vice-presidente Michel Temer, que tenta contornar as pressões e contrapressões. Cenário da lama No centro dos lamaçais que são desvendados -corrupção no entorno da Petrobras e noutras esferas - remanesce questão central, aflorada por Norberto Bobbio, no seu clássico "O Futuro da Democracia" : o poder invisível, cuja eliminação constitui promessa não cumprida da democracia. O poder invisível consiste nas ações incontroláveis de grupos que agem nas entranhas da administração pública, dando formato a um duplo sistema de poder, chegando, em certos momentos, a "peitar" a estrutura formal de mando. O poder invisível Há, portanto, uma máfia que age nas sombras da administração, difícil de ser completamente mapeada. Sua origem se localiza nos Estados absolutos, quando as decisões eram tomadas pelos arcana imperii, autoridades ocultas que se amparavam no direito de avocar as grandes decisões políticas, evitando a transparência do poder. Um dos princípios basilares da democracia é o jogo aberto das ideias, o debate, a publicização dos atos governamentais, como forma de controle dos limites do poder estatuído. No absolutismo, o princípio consistia na tese de que é lícito ao Estado o que não é lícito aos cidadãos. As democracias modernas, ditas representativas, conservam mazelas do autoritarismo, entre as quais a capacidade de confundir o interesse geral com o interesse individual ou de grupos, a preservação de oligarquias e a conseqüente extensão de redes invisíveis de poder. Cenário da descrença A descrença nos governantes e nos atores políticos, de modo geral, dá o tom maior do presente. Pesquisas que não chegaram à mídia, do conhecimento deste analista, dão conta de que nunca foi tão alto o desprestigio da área política. Nenhum político conseguiu ultrapassar o índice de 30% na régua da credibilidade. Os números são ruins. GPP Cesar Maia, vereador e ex-prefeito do Rio de Janeiro, sempre nos brinda com dados de pesquisa. Veja esse panorama colhido pelo Instituto GPP na cidade do Rio de Janeiro, com 1200 entrevistados, entre 9 e 10 de maio : a avaliação geral de Dilma : ótimo+bom 7,6%, e ruim+péssimo 71,6% ; quando é feito o cruzamento com a Percepção da Inflação os resultados mudam. Os que acham que a inflação anual é superior a 10% dão a Dilma 4,8% de ótimo + bom e 78% de ruim+péssimo. Os que acham que a inflação está perto de 10% dão a Dilma 6,5% do ótimo+bom e 72,2% de ruim+péssimo. 30% menos Porém, os que acham que a inflação está em 5% ou menos dão a Dilma 23% de ótimo+bom e 46% de ruim+péssimo. Arremata César Maia : "elas por elas, a inflação no Rio está tirando uns 30 pontos da avaliação de Dilma. Na intenção de voto para presidente, Aécio tem 26,8%, Marina 24,9% e Lula 19,4%. Da mesma forma cruzando a percepção da inflação com intenção de voto para presidente entre os que acham que a inflação é maior que 10% Aécio tem 27,9%, Marina 26,5% e Lula despenca para 13,5%. Entre os que acham a inflação está próxima de 10%, Aécio tem 33,9%, Marina 26,5% e Lula 15,6%. Mas entre os que acham que a inflação está em 5% ou menos, Aécio tem 18,1%, Marina 17,1% e Lula dispara, tem 41,4%. De forma geral, o crescimento da inflação tem impactado negativamente em Dilma e Lula. Ou seja, a inflação é um componente significativo da impopularidade de Dilma e Lula". Teori Zavascki Esse é o nome que receberá os holofotes mais fortes nas próximas semanas. Teori vai abrir ou fechar caminhos ; amolecer ou endurecer corações ; ser aplaudido ou execrado. Ou este escriba está lendo errado ? Janot convocado ? Esse escriba não acredita na hipótese de depoimento do procurador da República, Rodrigo Janot, na CPI da Petrobras. Janot tem prerrogativas que o desobrigam dessa convocação. Terceirização Nunca se viu tanta desinformação sobre um projeto legislativo quanto se constata, nesse momento, sobre o PL 4.330/04, que trata da terceirização. Líderes do governo e de alguns partidos dão provas explícitas de que não leram o projeto. Segundo se depreende, os senadores têm uma visão conservadora a respeito do tema. O Brasil do passado puxará a locomotiva para as bordas da Revolução Industrial. P. S. Nenhum país avançado faz distinção entre atividade-fim e atividade-meio. Refresco A China e o Brasil acabam de fazer uma parceria no entorno de grandes investimentos. Serão R$ 53 bilhões para obras de infraestrutura, incluindo a ferrovia para o Pacífico. A corrosão do caráter O cenário nacional está sendo celeremente contaminado pela crise da corrosão do caráter, terrível doença estudada por Richard Sennett, professor de sociologia da Universidade de Nova Iorque, que aponta o ambiente de trabalho do mundo moderno como obstáculo para a formação do caráter e construção do ideal de vida. A degradação do caráter é uma metástase que se propaga em função do acúmulo de mazelas da vida política e institucional do país. Se a crise é de caráter, o é, também, de credibilidade. A crença desmorona porque as instituições e os agentes públicos são pouco críveis. O negócio da política A política é um dos maiores e melhores negócios da Federação. O empreendimento é a conquista do mandato ; o produto político é a intermediação ; e o mercado cobre um território com 27 Estados (com o DF) e nichos de interesses distribuídos em três esferas : federal, estadual e municipal. O negócio da política mexe com cerca de 145 milhões de consumidores, que formam o contingente eleitoral. Para chegar até eles, um candidato gasta, em média, R$ 15 reais por eleitor, quantia que pode ser três a quatro vezes maior, caso o político seja iniciante e rico. Custos Uma campanha para deputado Federal em São Paulo custou, em 2014, entre R$ 2 milhões (custo menor) e R$ 6 milhões (custo médio). Alguns (raros) conseguem chegar ao Parlamento com somas pequenas. A maioria gasta bem mais que a soma dos salários em quatro anos de mandato. A questão é : se a campanha política no Brasil é tão dispendiosa e se os candidatos gastam acima do que ganham, por que se empenham tanto em assumir a espinhosa e sacrificada missão de servir ao povo ? Será que há muito desvio entre o espírito cívico de servir e o sentido prático de se servir ? Tomando o ônibus Fecho a Coluna com muito orgulho de mim mesmo... "Gostaria de dividir minha experiência com você que bebe e mesmo assim dirige. No último sábado à noite bebi não sei quantas taças de vinho. Bebi tanto que fiz uma coisa que nunca havia feito antes : deixei meu carro no estacionamento e peguei um ônibus. Resultado : cheguei em casa são e salvo, sem nenhum incidente. Fiquei muito orgulhoso de mim mesmo, sobretudo porque nunca antes na minha vida tinha dirigido um ônibus". (Enviado pelo amigo Álvaro Lopes)
quarta-feira, 13 de maio de 2015

Porandubas nº 443

Abro a Coluna com duas historinhas das Minas Gerais. Será o Benedito ? Às vésperas da escolha do interventor de Minas Gerais, em 1934, Benedito Valadares se encontrou no Rio de Janeiro com Zé Maria Alkmin : - Se você for o escolhido, me convida para secretário ? - Você está louco, Benedito ? Respondeu um divertido Alkmin. Dias depois, Getúlio Vargas anunciaria a escolha de Benedito, que logo recebeu um telegrama : "Parabéns. Retiro a expressão. Ass. Zé Maria". Zé Maria Alkmin acabou nomeado secretário do Interior. (Historinha mandada por Álvaro Lopes.) Milagre, milagre José Maria Alkmin, a raposa mineira, mestre da arte política, chegava da Europa com cinco garrafas enroladas na pasta. A Alfândega quis saber o que era. - Água milagrosa de Fátima. - Mas tudo isso ? - Lá em Minas o pessoal acredita muito nos milagres da água de Fátima. Não dá para quem quer. - O senhor pode desenrolar ? - Pois não, meu filho. - Mas, deputado, isso é uísque. - Ué, não é que já se deu o milagre ? Vejam, um milagre. (Do amigo Sebastião Nery) Sabatinado Luiz Edson Fachin, indicado por Dilma para o STF, foi sabatinado. Na visão desse analista, saiu-se bem. Foi apertado. Respondeu de maneira educada. Mostrou-se suprapartidário, sempre ressalvando a letra constitucional acima de convicções pessoais. O senador tucano Aloysio Nunes Ferreira foi contundente quanto às questões : empresa ligada ao PT, que criou um site em favor de Fachin ; sua ligação com o PT e o direito social da propriedade (prevalece sobre o direito legal ?). No contraponto, o senador tucano e paranaense, Álvaro Dias, levantou um hino de louvor ao indicado. Chegando ao colo A repetição de respostas de Youssef a respeito de Lula, ao ser indagado se o ex-presidente sabia sobre os dutos de propina no entorno da Petrobras, reforça a convicção de muitos de que o fato era do conhecimento dele. Mesmo dizendo que não tem provas, o doleiro, como é também designado, fala com muita naturalidade sobre o tema, dando a impressão de que esta é uma matéria vencida, já impregnada nas cacholas dos atores políticos. A continuar a marcha das apurações, esta denúncia tem condições de chegar efetivamente ao colo do ex-presidente. Mas a banalização acaba enfraquecendo o impacto. Ciclo da maciota Ao que se infere dos últimos comportamentos dos chefes dos Poderes, abre-se o ciclo da maciota, ou seja, do arrefecimento da animosidade que os distanciava. O senador Renan Calheiros, presidente do Senado, o deputado Eduardo Cunha, presidente da Câmara, e a presidente da República, Dilma Rousseff, teriam aberto um diálogo mais estreito. O momento do país é grave e os atores políticos se imbuem do espírito de integração de propósitos. Portanto, o lema do "quanto pior, melhor" está cedendo lugar ao lema "vamos dar uma chance para o país sair da crise". As oposições As oposições também chegam à conclusão de que não é hora de apostar no pior. Se seus representantes estivessem vivendo momentos de glória junto ao eleitorado, até que poderiam forçar a barra e radicalizar o discurso. Não é o caso. Toda a representação política enfrenta alta taxa de rejeição. Políticos estão no patamar mais em baixo no ranking da imagem. Nesse momento, as imagens dos políticos estão sujas. Pacote fiscal Pelo visto, o pacote fiscal de Joaquim Levy passará pelas duas casas congressuais, ganhando alguns ajustes pontuais. Não deverá ser aprovado em sua totalidade, mas não deverá comprometer seriamente as contas do governo, caso receba algumas mudanças. A MP 664 terá mais dificuldades que a MP 665, particularmente no que concerne às disposições sobre a aposentadoria. O PTB, por exemplo, diz que votará contra qualquer tentativa de mudança no dispositivo sobre aposentados. As próximas eleições As eleições municipais serão balizadas por um conjunto de situações, como : 1. O cinturão econômico : se muito apertado, o bolso vai ficar mais vazio e a barriga roncará ; 2. O cinturão político : a sujeira na imagem dos políticos, com origem nos escândalos e denúncias, abrirá um vácuo entre eleitores e candidatos ; 3. O cinturão social : a precariedade dos serviços públicos empurrará grupos e contingentes ao paredão de pressões. E as pressões abrirão frestas nos vãos das candidaturas. Atenção, prefeitos Prefeito ineficaz não se reelege e não fará o sucessor. Dinheiro até pode mudar o sentido de uma eleição, mas não tem o mesmo peso do passado. Vida limpa, obras focadas para o interesse coletivo, transparência administrativa, enxugamento de estruturas, racionalização de processos, circulação no meio do povo, desburocratização e simplificação de serviços constituem os parâmetros modernos para as administrações. O dinheiro está curto e cada centavo passa a ser valorizado. Ademais, fortalece-se o poder crítico das bases municipais, fator que se percebe na conduta de vereadores conscientes do papel fiscalizador. Para arrematar o quadro, há uma mídia denunciativa, que, mesmo em pequenos municípios, procura bem informar, interpretar e opinar criticamente. Perfis procurados Ante essa moldura, o eleitorado tenderá a procurar perfis que encarnem valores e princípios relacionados às mudanças : gente asséptica, não comprometida com a velha política ; passado limpo, vida decente ; nem muito velho nem muito jovem, revelando alguma experiência na frente de empreendimentos (área pública ou área privada) ; ideias revolucionárias, porém factíveis ; capacidade de liderar equipes ; visão suprapartidária ; boa expressão e apresentação pessoal ; sólida argumentação. Suprapartidarismo A pergunta é recorrente : a polarização política deverá aumentar ou diminuir ? PT e PSDB continuarão a ser os principais motores da polarização ? Tenho respondido a estas questões, como, por exemplo, no programa Ponto a Ponto, da TV Bandeirantes, com Mônica Bergamo e Antônio Lavareda. Meu cenário : arrefecimento da polarização. Os partidos perderam seu escopo doutrinário. Ficaram iguais. Não há diferenças fundamentais entre eles. Querem o poder pelo poder. Por isso, outros atores entrarão em cena como o próprio PMDB, disposto a fazer o maior número de prefeitos em 2016 ; o PSB que se funde com o PPS ; e os partidos médios que poderão ganhar mais força até outubro de 2016. Sob essa teia de hipóteses, PT perderá força e PSDB terá também de renovar seus quadros. As redes, a nova mídia As redes sociais, até que enfim, conseguem alcançar o meio da montanha em matéria de força e prestígio. Até as próximas eleições, chegarão ao cume. Ou seja,seu papel será fundamental nas estratégias de visibilidade de candidatos, integração social, interação com o eleitor, ampliação dos circuitos de amigos, formação de grupos de apoio, fomento ao discurso substantivo etc. Da noite para o dia, as redes tocam, sensibilizam, convocam, mexem com o ânimo das comunidades virtuais. Terceirização Renan Calheiros decidiu que o PL 4.330 passará por quatro Comissões no Senado : Comissão de Constituição e Justiça, Comissão de Assuntos Sociais, Comissão de Assuntos Econômicos e Comissão de Direitos Humanos. A hipótese, por enquanto, é que seja intensamente debatido nas Comissões, devendo, porém, ser destroçado na Comissão de Direitos Humanos, onde a questão ideológica poderá suplantar a racionalidade. Histórias de ontem Em 64 A.C., Cícero disputou o consulado contra Catilina, o general que decidiu enfrentá-lo. Foi uma campanha de vitupérios. Catilina era apoiado pelo proletariado, Cícero pelas elites. Quintos preparou um manual em que recomendava Cícero a ser pródigo nas promessas, pois "os homens preferem uma falsa promessa a uma recusa seca". E sugeria encontrar escândalos na vida de seus rivais. O grande tribuno Cícero venceu Catilina, depois de acusá-lo de corrupto e pervertido. E em célebre discurso, puxou as orelhas do general com a famosa frase : "até quando, Catilina, abusarás de nossa paciência ?" (quousquem tandem, Catilina, abutere patientia nostra ?) Reforma política A cada semana, afunila-se a hipótese de uma reforma política com poucos pontos. Hoje, este analista identifica como os mais prováveis : distritão, para deputados Federais ; distrital misto, para deputados estaduais ; distritinho, para vereadores em cidades acima de 200 mil eleitores. Financiamento misto de campanha, com teto a ser determinado por empresas e recursos públicos nos moldes atuais. E um teto também para campanhas eleitorais. Incômodo As viagens internacionais do ministro Dias Toffoli começam a incomodar. A cadeira vazia no STF recebeu um rechaço na coluna Radar, de Lauro Jardim : "As cadeiras vagas são uma constante. É falta de envergadura à cadeira. É falta de senso de compenetração." PL à vista O Partido Liberal está chegando. Mais um pouco e sairá do forno do TSE. A dúvida é : poderá se fundir a outro ? E abrirá janela para migrantes partidários ? Manifestações Os movimentos sociais organizados estão debatendo seus próximos passos. A perspectiva é de ocupação de ruas a partir do mês de junho. Estão no aguardo das primeiras condenações da operação Lava Jato. Livros Os jornalistas Claudio Tognolli e Malu Magalhaes autografam, amanhã, na Livraria Cultura, Conjunto Nacional, em São Paulo, o livro Bem Vindo ao Inferno (Ed Matrix), que conta a história da estilista Vana Lopes, uma das vítimas do ex-médico Roger Abdelmassih. E no início de junho, Tognolli estará lançando mais um livro, desta feita sobre os desmandos da ABIN (Agência Brasileira de Inteligência). O poder de Deus O marechal Idi Amin Dada, ex-todo poderoso de Uganda, vivia dizendo que conversava com Deus para cumprir fielmente seus mandamentos. Um dia, indagado por um jornalista se tais conversinhas ocorriam com muita frequência, o cara-de-pau não teve papas na língua e soltou : "só quando necessário". A verve do ex-cabo que se transformou em ditador faz escola pelo mundo. No Brasil, o discurso dadadiano ainda pontifica. Numa campanha eleitoral, passeando numa feira com um candidato a prefeito de São Paulo, um jornalista, ao ver um galo, perguntou-lhe, de repente, se seria capaz de fazer o galo cantar, caso eleito. A resposta veio de pronto : "é claro". Vocês, leitores, serão capazes de dizer o nome deste todo poderoso ? A arte de depor Neste ciclo de depoimentos na operação Lava Jato, convém pinçar os ensinamentos de Nicolau Eymerich, frade dominicano espanhol. Ele escreveu, em 1376, o "Manual dos Inquisidores", onde apontava os truques dos hereges para responder sem confessar. Eis alguns : responder às perguntas de maneira ambígua ; responder acrescentando uma condição ; inverter a pergunta ; fingir-se de surpreso ; mudar as palavras da pergunta ; deturpar as palavras ; auto justificar-se ; fingir debilidade física ; simular demência ou idiotice e se dar ares de santidade. A arte de responder Certos políticos se enquadram no catálogo. Alguns exercem a arte de responder o que não foi perguntado e não dizer o que todos querem ouvir. Jânio Quadros era perito na arte de se fazer surpreso. Perguntado por Leon Eliachar, o humorista, qual era seu slogan : 50 anos em 5 ou 5 anos em 60 ? Jânio responde : "50 anos em 5, mais o pagamento dos atrasados". O truque de mudar as palavras é comum. Ao político se pergunta : "o senhor vai dizer tudo o que sabe aos procuradores ?" Resposta : "quem diz a verdade, tem tudo a seu favor. Quem não deve, não teme". O truque de deturpar as palavras é usual. "O sr. acredita que o relatório da Petrobras vai absolvê-lo ?" Possível resposta : "o relatório pode ser uma peça de condenação ou de inocência. Quem me condena é a imprensa, não a petrolífera".
quarta-feira, 6 de maio de 2015

Porandubas nº 442

Três historinhas para abrir o apetite. Nosso negócio Uma historinha de MS. O ministro Mário Henrique Simonsen foi a Campo Grande discutir os problemas econômicos e financeiros de Mato Grosso do Sul. O fazendeiro Fernando Junqueira Franco pediu a palavra :- Senhor ministro, depois que juro virou correção monetária, fazendeiro passou a ser empresário rural e roçar pasto chama-se investimento, nosso negócio acabou se tornando uma merda. Sem pauzinho Uma historinha de MG. Fortunato Pinto Júnior, jornalista e ghost writer, escrevia os discursos de João Almeida, deputado mineiro. Sábio e bom, o doce coronel só não gostava de proparoxítonos :- Tininho, não bota no discurso palavra que tem um pauzinho lá atrás, porque a dentadura cai. 5 minutos de silêncio Uma historinha do RN. A onda de um minuto de silêncio faz parte da liturgia do poder. Surfam nessa onda políticos de todos os espectros. Vereador, então, usa a onda para capturar todos os votos da família do morto. Vejam este caso que ocorreu na Vila São José, bairro periférico de Macaíba/RN. O ex-vereador e candidato Moacir Gomes, ao usar a palavra, inicia a oração rogando aos assistentes do comício um minuto de silêncio pelo falecimento de um morador do bairro. Seu assessor e cabo eleitoral, ao lado, pensando no tamanho da família do falecido, sopra no ouvido de Moacir : - Um minuto é pouco. Peça cinco. Tem muito voto na casa do nosso correligionário !(Historinha de Valério Mesquita.)O desempenho Avalia-se o desempenho de uma administração pela somatória de quatro campos de viabilidade : o político, o econômico, o social e o organizativo. O equilíbrio entre eles é responsável pela fortaleza ou fragilidade das ações programáticas. Este analista abre a primeira nota da Coluna com esta pergunta : em sua opinião, que campo se apresenta em pior situação ? Dá para identificar os furos na imagem do governo Federal ?Colar imagem nas ruasA presidente Dilma Rousseff parece ter encontrado a bússola para repintar a imagem negativa de sua gestão. Proclama que é contra a terceirização. A chefe do governo não faz bem ao assumir esse rumo. Primeiro, a terceirização já existe ; tanto nas áreas privadas quanto nas áreas públicas das instâncias federativas. Segundo, se vetar a terceirização, inviabilizará muitos setores produtivos. Só a Petrobras abriga 360 mil terceirizados. Lula tergiversaNa TV, falando no programa do PT, esta semana, Luiz Inácio endossa a onda contra a terceirização. Diz ele que a terceirização levará os empregados à situação vivida no principio do século XX. Um embuste. Na verdade, todos os terceirizados têm carteira assinada pelas empresas de prestação de serviços ; têm todos, TODOS os direitos trabalhistas e previdenciários. Que estão previstos no PL 4.330/04. Hoje, já é assim. Mas é claro que Lula sabe. Quando ele assumiu, em janeiro de 2003, a Petrobras tinha 120 mil terceirizados. Hoje, tem 360 mil. Essa expansão extraordinária ocorreu quando ? Ora, nas administrações de Lula e Dilma. Conversa de Lula é lamúria pausada para acalentar bovinos, quer dizer, conversa mole pra boi dormir.Na área Federal O amigo José Pastore escreve, em O Estado de S. Paulo de ontem, mais um texto forte defendendo a terceirização. Desta feita, o prestigiado professor e economista é acompanhado do ex-ministro das Minas e Energia, Shigeaki Ueki, e mostra a terceirização na área pública. Levanta, primeiramente, um dado surpreendente : no mundo inteiro, o setor de petróleo terceiriza 2/3 do pessoal, porque a cadeia de produção, refino e distribuição de petróleo é uma das mais longas da industria moderna. Daí a Petrobras se amparar nas tarefas de 360 mil terceirizados. Zé arremata : o que ocorre na Petrobras persiste na Eletrobrás, Banco do Brasil, CEF, BNDES, ECT, hospitais e universidades públicas. O Ministério do Trabalho, o MP da União também o faz. Em 2013, havia 222 mil terceirizados na administração Federal. Dilma e Lula querem apagar esses números. Colar imagem ?Essa tentativa de colar a imagem nas ruas não se sustenta. A terceirização passa por um amplo corredor de mistificação e slogans trombeteados pela CUT e seus satélites. Na verdade, trata-se de um avanço, eis que dará segurança jurídica a 12 milhões de trabalhadores. O que a CUT defende é o aumento de seu Caixa : com a efetivação dos terceirizados, sonha encher as burras com contribuições de novos contingentes que cairão no seu curral. A verdade demora, mas um dia chega. O país não terá condições de sobreviver sem serviços terceirizados. Essa é a verdade.E o que Lula quer ?Lula volta aos palanques com a velha zanga : é bom de briga. Pensando que seu carisma é inesgotável. Não imagina que o país está mudando e muito. O bolso começa a ficar vazio, a barriga começa a roncar, o coração começa a doer e a cabeça começa a ficar indignada. Ora, esse desfazimento da equação BO+BA+CO+CA (Bolso, Barriga, Coração, Cabeça) é fruto do lulopetismo. Ninguém vai acreditar um pingo na lorota de Lula de que o Brasil não está abrindo tempos de recessão e que a crise é um produto da imprensa. Acha-se o faz tudo e o tudo pode na política e nas ruas. Não é bem assim, Luiz Inácio. Esse discurso de "nós e eles" mais parece ronco de leão que começa a perder os dentes. Equívoco de RenanRenan Calheiros é, urge reconhecer, um quadro político dos mais experientes. Não é a toa que preside o Senado mais uma vez. Sabe articular, sabe manobrar a casa, sabe fazer política. Nos últimos tempos, porém, o alagoano parece ter perdido as estribeiras. Como pode entrar nessa onda contra a terceirização ? Ao contrário do que se intui de seu discurso, regular terceirização é um avanço, não atraso. Se Renan deseja colar sua imagem ao sentimento das ruas, não será bem sucedido se usar a esteira da terceirização. A conferir.CNI e FIESPRobson Andrade, presidente da CNI, sumiu. Não deu as caras para bater nessa luta que se trava no entorno da terceirização. Ao contrário de Paulo Skaf, presidente da FIESP, que pilota a defesa do PL 4.330 como fez na campanha em que derrubou a CPMF. A CNI desce a ladeira do prestígio enquanto a FIESP sobe no conceito do empresariado. O momento que atravessa o país não aceita pusilânimes. A liderança exige ousadia, determinação, vontade, persistência, visão empreendedora, amor às grandes causas.Pacote fiscalNão se faz uma omelete sem quebrar os ovos. Não se faz um ajuste fiscal sem sacrifícios. Urge aprovar o pacote fiscal que o ministro Joaquim Levy apresentou ao Congresso. Que se façam nele ajustes que não comprometam sua viga-mestre. Nessa direção trabalha o articulador político do Governo, vice-presidente da República, Michel Temer. Que acaba de pedir ao PT ordem unida em torno do ajuste fiscal. Que história é essa do PT de sair pelas bandas quando a coisa pega em seus costados... ? Se o PT não fecha posição, como outros partidos da base governista o farão ? Um país aproximativo O Brasil é um País aproximativo, costumava dizer o embaixador Gilberto Amado. A precisão, a pontualidade, a clareza não combinam com a índole nacional. Em compensação, sobra generosidade nos elogios, no gosto pela imprecisão e no juízo de valor sobre fatos e pessoas. Por aqui se costuma dizer que fulano está "empurrando com a barriga" ou que há não perigo de as coisas melhorarem. Indagado, o interlocutor garante que trabalha "mais ou menos 40 horas por se¬mana". Para confessar a fé, afirma ser "católico, mas não praticante", concluindo a conversa com um "até logo", que quer dizer "até outro dia". Por ser o território do tempo relativo, não é de admirar que o ano novo só comece após a estafante folgança carnava¬lesca. O país tem usado suas estruturas de consolação para purgar as agruras do cotidiano. Comete o desatino de frequentemente dar o dito pelo não dito e esconder suas tragédias sob o cobertor. É o que estamos vendo nesses inesgotáveis depoimentos da Operação Lava Jato. As oposiçõesAs oposições ainda não encontraram o fio da meada em termos de um projeto alternativo para o país. O que pensam as oposições sobre ajuste fiscal, por exemplo ? Adjetivos suplantam os substantivos. Capas de revistasA capa de Veja, com o juiz Sérgio Moro e o discurso de que a soltura de executivos e empresários pelo STF, não significava fim da esperança, não correspondeu ao conteúdo da reportagem. Na visão deste escriba, o texto mostrou o longo corredor dos recursos e embargos, sob a desesperança de uma condenação no tempo em que muitas penas estarão prescritas. A capa de Época, sobre a "bomba Lula" como lobista, também foi uma reversão de expectativas. O texto parecia fragmentos requentados. PT promete, mas...O PT acaba de prometer expulsar de seus quadros os filiados que sejam condenados pela Justiça. A questão é : a decisão não se aplicará aos atuais condenados ? Falta nexo nesse conto de carochinha.5 bilhõesUm dirigente de um grande grupo empresarial, muito preocupado com as nuvens que divisa nos horizontes, confessa a este analista : no Brasil, nosso radar tem prospectado, nos últimos anos (2012, 2013, 2014), negócios em torno de R$ 70 a R$ 80 bilhões, dos quais ganhamos uma pequena participação. Este ano (2015), nosso radar prospecta negócios (no total) de apenas R$ 5 bilhões. Coisa muito pequena. Imagine o que é disputar um pedaço dessa pequena fatia. O desestímulo é geral na área dos empreendimentos.Política no fundo do poçoOs políticos estão no fundo do poço da imagem. Os atores do Poder Executivo também sofrem rachaduras em suas molduras imagéticas, vítimas que são do ciclo dos escândalos e das denúncias. A presidente Dilma está fragilizada. Seu partido virou símbolo de corrupção. O que fazer numa hora como essa ? Que caminhos restam ? O populismo ? Não há condição para tanto. A sociedade avança na régua da racionalidade e já não compra gato por lebre. Se aparecer alguém para entrar na cena, deve abrigar valores como credibilidade, perfil asséptico, experiência administrativa, ousadia, força de vontade. E visão abrangente sobre o país.O gambá O PT alega que o partido está à vontade e de cabeça erguida para se defender em relação a tentativas de colar em sua imagem a tática do gambá, que espalha mau cheiro para ver se todo mundo fica do mesmo jeito. Pequena observação : gambá não pula de graça no colo de gente limpa. O turco e o canibal Fecho a coluna com uma pequena história. Um turco se encontrou um dia com um canibal. "Sois muito cruéis, pois comeis os cativos que fazeis na guerra", disse o maometano. "E o que fazeis dos vossos ?", indagou o canibal. "Ah, nós os matamos, mas depois que estão mortos não os comemos." Montesquieu assim arremata a passagem contada no livro Meus Pensamentos : "Parece-me que não há povo que não tenha sua crueldade particular."
quarta-feira, 29 de abril de 2015

Porandubas nº 441

Abro a coluna com um pouco de filosofia e um pouco de riso. "O homem é uma ponte e não um ponto de chegada ; cabe-lhe ser feliz de seu meio dia e crepúsculo como caminho para novas auroras." (Nietzsche, em Assim Falou Zaratustra) O coice Sócrates caminhava tranquilo quando um atrevido descomedido deu-lhe um coice. Estranharam alguns a paciência do filósofo, que arguiu : - Pois eu que lhe hei de fazer, depois de dado o coice ? Responderam : - Demandá-lo em juízo pela injúria. Replicou : - Se ele em dar coices confessa ser jumento, quereis que leve um jumento a juízo ? (Dos ensinamentos do Padre Manuel Bernardes) Conjunção rachativa Historinha da Bahia de Todos os Santos. Grande de nome e pequeno de corpo. Magricela, esperto, inteligente, José Antônio Wagner Castro Alves Araújo de Abreu, sobrinho-neto de Castro Alves, herdou o DNA, o talento e a vadiagem existencial do poeta. Não gostava de estudar. No esporte, era bom em tudo. Colega de Sebastião Nery, no primeiro ano do seminário menor, na Bahia, em 1942, na aula de português, o padre Correia lhe perguntou o que era "mas". - É uma conjunção. - Certo, mas que conjunção ? Zé Antônio olhou para um lado, para o outro e respondeu : - Conjunção rachativa, professor. - Não existe isso, Zé Antônio. - Existe, professor. Quando a gente quer falar mal de alguém, sempre diz assim : - Fulano até que é um bom sujeito, mas... E aí racha com ele. Reforma política Por onde começar a reforma política ? Pelo capítulo mais complicado : a modelagem do voto. Eis algumas propostas na mesa do debate : 1. Distritão ; 2. Distritão misto ; 3. Distrital puro ; 4. Distrital misto ; 5. Proporcional misto ; 6. Proporcional misto flexível ; 7. Proporcional misto em dois turnos ; 8. Distrital Proporcional ; 9. Lista fechada. Tem pauta para grandes debates. Mas haverá paciência para se chegar a um mínimo de consenso ? Ajuste fiscal O pacote de ajuste fiscal, embrulhado pelo ministro Joaquim Levy, precisa chegar a um ponto de equilíbrio. Vai ser difícil, pois o empresariado mostrará que a desoneração da folha deu resultados e garantiu maior competitividade das empresas. O governo, por sua vez, reconhece ter cometido um grande equívoco com aquela política. Todos acham importante um programa de ajuste fiscal para que o país resgate a confiança dos investidores e a credibilidade junto aos organismos internacionais. O problema é que ninguém quer ceder. E não se faz omelete sem quebrar ovos. Falta de líderes A crise do atual ciclo escancara a falta de grandes líderes. Basta ver o repúdio que as massas nas ruas exibem aos políticos que sobem nos carros de som usados pelos movimentos sociais. Os líderes partidários agem de maneira muito atrelada aos interesses momentâneos de suas siglas, deixando de lado interesses nacionais. É um fato : as massas estão sem líderes e os líderes que temos não conseguem mobilizar as massas. Destaques Cito alguns nomes que começam a se destacar no Parlamento por sua capacidade de formulação e expressão : Bruno Araújo (PSDB), líder das oposições na Câmara dos Deputados. O pernambucano faz boa articulação, solta o verbo com contundência, é corajoso e é uma das boas revelações da atual safra parlamentar ; o mineiro Julio Delgado (PSB), que encabeça um movimento de independência dos deputados ; o carioca Chico Alencar (PSOL), que sabe ser contundente usando a verve e bom humor ; o senador goiano Ronaldo Caiado (DEM), que atira bem como opositor e tem visão abrangente das questões nacionais ; o senador paraibano (PSDB), Cássio Cunha Lima, tem voz forte ; o senador José Serra (PSDB), com seu alto conhecimento de economia. A lista tem bem mais nomes. Deixarei para outras colunas. O momento O aparente ar de tranquilidade não condiz com o fogo que consome os ânimos. As manifestações vão continuar sob bandeiras mais pontuais. Grupos de 50, 100, 200 pessoas se multiplicam nas grandes e médias cidades, apresentando demandas, fazendo críticas e exigindo posturas proativas dos governantes. Até o prefeito Fernando Haddad foi surpreendido por um grupo de pessoas que entraram em sua sala de aula na USP. Para onde convergirão as pressões e o clamor das ruas ? A hora do Congresso O Congresso será o espaço que abrigará o discurso social. Os parlamentares, por sua vez, terão um momento dos mais adequados para resgatar parcela de sua imagem positiva. Claro, se atenderem às demandas da sociedade por meio da miríade de entidades organizadas. Mas a matriz de onde sairão as respostas para a crise moral que abate o pais é, sem dúvida, a reforma política. Se não for feita, a indignação chegará ao topo da montanha. E 2016 abrirá um ciclo de terra devastada na seara eleitoral. Formol e lentidão O ex-presidente do STF, o amigo Carlos Ayres Brito, costumava dizer : "Tem muito formol nas estantes desses profissionais do Direito (os juízes). O Poder Judiciário, com frequência, se comporta de modo saudosista, com nichos que parecem laborar no passado". Ao que complementa o amigo Roberto Ferrari de Ulhoa Cintra : "Mas não é de hoje que o Judiciário é assim compreendido. Valho-me de Tocqueville, que consegue apresentar maravilhoso quadro que expõe claramente a dicotomia povo-judiciário : "Aos seus {do povo} instintos democráticos, os {juízes} opõem secretamente os seus pensadores aristocráticos ; ao seu amor à novidade, o seu supersticioso respeito a tudo que é antigo ; à imensidade de seus propósitos, as suas vistas estreitas, ao seu desprezo às regras, o seu gosto pelas formas ; e ao seu ardor, o seu hábito de proceder com lentidão". Clima mais limpo ? Nos últimos dias, sentiu-se um clima mais limpo. Dólar baixando, empregos com carteira assinada voltando, grandes investimentos anunciados para São Paulo, Petrobras mostrando seu balanço negativo (o que foi positivo), bandeira branca sendo erguida em alguns ambientes. Vamos esperar pelo 1º de maio. Perfis em evidência Alguns perfis aparecem em destaque na paisagem conturbada da política, a começar pelo vice-presidente da República, Michel Temer, cujo papel de articulador político do Executivo lhe confere extraordinária força. Luiz Inácio Lula da Silva, cuja performance esportiva numa academia é o aviso de que poderá reentrar na arena eleitoral ; Eduardo Paes, prefeito do Rio de Janeiro, que vai usar a escada das Olimpíadas para garimpar nas águas correntes de 2018 ; Paulo Skaf, presidente da Fiesp, que lidera a batalha pela Terceirização e torna-se um dos mais arrojados pilotos da nova leva de políticos ; Geraldo Alckmin, o governador de São Paulo, que começa a minar as chances de Aécio Neves para 2018 ; a senadora Marta Suplicy, que está deixando o PT e embarcando no PSB ; o senador Ronaldo Caiado, que começa a olhar para horizontes mais altos. Voltarei ao assunto. PMDB com candidato Já está decidido : o PMDB terá candidatura própria para a presidência da República em 2018 ; e se esforçará para ter o maior número possível de candidatos a prefeito em 2016. Daí a inferência : mais cedo ou mais tarde, PMDB e PT desconstruirão sua frágil aliança. Paes, Cabral e Pezão Esse trio do Rio de Janeiro tem sérias dificuldades de abrir espaços no território da política. A trindade parece ter feito um pacto : todos por um, um por todos. O problema é a imagem negativa de um é transportada naturalmente para todos. Imprensa Os grandes grupos de mídia passam por um momento de grandes dificuldades. Grandes nomes estão deixando redações. Revistas estão sendo fechadas. A publicidade entra em retração. A crise é sistêmica. PDT sai ou fica ? Carlos Lupi, o todo poderoso comandante do PT, disse com todas as letras : o PT roubou demais e se esgotou. Um senador do PT, Humberto Costa, retrucou : Lupi é boquirroto. Bom, Manoel Dias, ministro do Trabalho por ele indicado, sairá ou ficará ? Ao que tudo indica, tudo será como antes no quartel D'Abrantes. PT e Marta Saindo do PT, Marta Suplicy poderia perder o mandato, caso o partido entrasse na justiça pedindo a vaga. Marta foi sabida : na longa carta que apresentou, deixou explícito o argumento que lhe daria ganho de causa : o PT mudou de eixo, deixou de abrigar o escopo original. Casa própria O financiamento da casa própria passa por grande mudança. Caixa Econômica exigirá entrada de 60% para financiar imóveis com valor acima de R$ 750 mil. O setor está esfriando. E o sonho da casa própria se desmancha. O talento assusta Quando Winston Churchill, bem jovem, acabou de pronunciar seu 1º discurso na Câmara dos Comuns, foi perguntar a um velho parlamentar, amigo de seu pai, o que tinha achado de seu desempenho naquela assembleia de raposas políticas. O velho pôs a mão no ombro de Churchill e cochichou em tom paternal : - Meu jovem, você cometeu um grande erro ; foi demasiado brilhante neste seu primeiro discurso ; e isso é imperdoável. Devia ter começado mais na sombra e gaguejado um pouco. Com a inteligência que demonstrou, hoje, você deve ter feito uns 30 inimigos ; o talento, meu jovem, assusta.
quarta-feira, 15 de abril de 2015

Porandubas nº 440

Brasil do roubo Abro a Coluna com duas historinhas. A primeira é bem adequada a esses tempos de descoberta de roubalheira. Geladeira de graça Um sujeito comprou uma geladeira nova e, para se livrar da velha, colocou-a em frente da casa com o aviso : "De graça. Se quiser, pode levar". A geladeira ficou três dias sem receber um olhar dos passantes. Ele chegou à conclusão : ninguém acredita na oferta. Parecia bom demais pra ser verdade. Mudou o aviso : "geladeira à venda por R$ 50,00". No dia seguinte, a geladeira foi roubada ! (Historinha enviada por Álvaro Lopes). O mel de Frei Damião Fausto Campos sempre passava pela BR-232, entre Serra Talhada e Custódia, em Pernambuco. Na beira da estrada, vendedores ofereciam o melhor mel do mundo, o mais puro. Um dia, resolveu levar uma garrafa. Perguntou : "o mel é puro" ? O vendedor : "o mais puro do mundo". Fausto arrematou : "pois vou levar esse mel para o Frei Damião". O vendedor apressou-se a esclarecer : "doutor, é melhor não levar esse pote. Quem tirou esse mel foi meu irmão e ele gosta de juntar um pouco d'água no mel para render mais. Desculpe. Na próxima vez, o senhor vai levar um mel 100% puro. Agora, só se o senhor quiser levar esse pro senhor. Mas pro Frei Damião, de jeito nenhum". (Historinha enviada por Delmiro Campos, filho de Fausto). Mobilização menor : razões e significados 1. Banalização - Rotina Os movimentos ganharam periodicidade e se repetem em todo o país. Deixaram de ser surpresa. Incorporaram-se ao cotidiano das pessoas. A banalização dos eventos deflagra a sensação de "coisa já vista". Perdem impacto. 2. Proximidade Menos de um mês entre os dois eventos foi um tempo muito curto para motivação de correntes e grupos, atenuando a força da mobilização. O primeiro "canibalizou" o segundo. 3. O foco O foco do discurso sob o empuxo da movimentação - impeachment - não canalizou os interesses gerais, situação traduzida por pesquisas que mostraram um índice muito baixo de crentes e, até, apoiadores da ideia. Na verdade, a corrupção esteve ao lado da saúde como tema de interesse maior dos participantes. Ou seja, o combate à corrupção ganhou destaque nas mobilizações. 4. Retração de Dilma Na mobilização do dia 12, não tivemos a faísca acesa pela presidente Dilma, aquela que ela acendeu no Dia das Mulheres, em março, quando fez um longo discurso desenhando a moldura de um país harmônico e feliz. A presidente contribuiu para acirrar os ânimos sociais. Desta feita, ela estava longe do país. E nos dias anteriores, não se pronunciou sobre o tema. 5. Maturidade Os participantes, em sua maioria, pertenciam à faixa dos cinquentões. Os jovens que encabeçaram a movimentação de junho de 2013 e, de certa forma, acompanharam os pais em 15 de março, tiveram participação menor nesta última mobilização. Significa dizer que o protesto ganhou mais força no segmento amadurecido, que frequenta esse tipo de evento embalado por uma profunda convicção. Nesse ponto, o amadurecimento cívico ganha destaque. 6. Lava Jato como pano de fundo A movimentação ocorreu sob o pano de fundo da maior investigação sobre corrupção no país, que se desenvolve na operação Lava Jato. Os participantes, ao mesmo tempo em que exprimem seu apoio aos atores envolvidos na investigação - MP, Judiciário, Polícia Federal -, sinalizam expectativas no sentido de uma profunda assepsia nos veias do corpo político-governativo, com respectivas condenações dos indiciados. Tal expectativa gera a interpretação : "vamos esperar a conclusão desta operação para darmos a nossa resposta". O adiamento de uma grande mobilização mais adiante. 7. Manutenção do estoque cívico Menos gente nas ruas não significa desinteresse. O momento dita as circunstâncias. Ou seja, não se deve atribuir ao menor número de participantes arrefecimento do civismo. A sociedade está olhando atrás das nuvens. Observa os eventos na área política. E por um algum sinal mais forte para voltar em peso às ruas, a qualquer momento. 8. Disputa organizativa As cinco ou seis organizações que convocaram a mobilização lutam por uma liderança. Apesar do esforço para unificação da agenda, o que se viu nas faixas e cartazes foi uma profusão de temas, não apenas o clamor por impeachment. Ademais, poucos sabem declinar os nomes das organizações e seus líderes. O momento vivido pelo país até dispensa a convocação para as mobilizações por um líder de massas, mas, em termos futuros, os contingentes tendem a se sensibilizar com apelos de lideranças críveis e capazes de interpretar o clima das ruas. Claro, perfis não contaminados pela velha política. 9. Margens ainda distantes A equação BO + BA + CO + CA começa a desmoronar, mas ainda não tem sido capaz de levar as margens para o centro das cidades. BOlso, BArriga, COração, CAbeça ! Bolso vazio é barriga roncando, coração enfurecido, cabeça revoltada ! A inflação ultrapassou os 8%. O bolso apertado e a demissão em massa de trabalhadores dispararão o canhão das margens. Nesse caso, poderemos ver no amanhã movimentos mais densos. 10. Discursos diretos e indiretos A ausência de uma agenda concreta - substantiva - reparte o discurso das mobilizações entre duas partes : as demandas diretas e as indiretas. As demandas diretas dizem respeito aos problemas que afligem as pessoas em seu dia a dia, a partir das frentes de saúde, segurança, educação, transportes. As demandas indiretas, abstratas, abrigam as esferas da política e da gestão, incluindo coisas como impeachment, combate à corrupção. Tais demandas frequentemente transformam-se em slogans e palavras-chave, eis que deixam de apontar o modus operandi das questões levantadas. Impeachment, por exemplo. Que, hoje, não tem a mesma moldura dos tempos de Collor. Como fazer isso, sem um objeto concreto, uma razão clara, uma sólida argumentação técnico-jurídica ? Ainda mais quando se sabe que essa questão se insere em complexa operação política. 11. Copo transbordando Muitos esquecem que temos uma tradição de mobilização. Brasil das ruas é desenvolvimento de uma tendência que nasceu no ciclo da redemocratização. Desde as Diretas Já registramos movimento de ruas, em altos e baixos momentos. Todos os governos, desde o de Sarney, a partir dos meados de 80, conviveram com movimentos sociais nas ruas. No ciclo Lula, os movimentos ganharam impulso a partir da força dada às centrais sindicais. Formou-se um pacto entre Estado e sindicalismo. As ruas foram tomadas de vermelho, passando a sinalizar dois Brasis. O do meio e das pontas, com incentivo do Estado à desorganização social. Portanto, o copo transborda há bastante tempo. Daí a sensação do "eterno retorno" que imanta os ciclos políticos. Baixa um sentimento de inocuidade. "Por que vou a essa mobilização ? Prefiro ficar em casa". 12. Classes médias, certa acomodação As classes médias estão na frente desse exercício de democracia direta. A classe média A, mais alta, também se mobiliza, mas é a classe média B - profissionais liberais, professores, pequenos e médios empresários e comerciante - que se faz mais presente. A classe media C, a emergente, começa a adensar sua participação, na esteira de um bolso que se esvazia sob o recrudescimento da inflação. Os ganhos obtidos - TV de 42 polegadas, carro novo, lazer - se dissipam. Mas as classes médias não tendem a acorrer em massa a todas as mobilizações. Ao contrário dos contingentes profissionais abrigados sob as bandeiras de centrais sindicais, por exemplo. 13. O desemprego, primeiros sinais O que vemos hoje ? O esfacelamento do ciclo de distribuição de renda sob ameaça de desemprego e inflação. O boom das commodities da era Lula se desfaz. Os serviços públicos degringolam. A volta às ruas é um protesto contra o status quo. Centros e margens, cada qual com sua taxa de participação, se movem. O programa de distribuição de renda do lulismo foi um sucesso, mas os 30 milhões que subiram ao andar do meio da pirâmide ameaçam descambar para os degraus da base. Se o desemprego apertar os cintos, os movimentos serão mais cheios. 14. A estética verde-amarelo O que emerge das movimentações sociais dos últimos tempos é o simbolismo acentuado pela estética verde-amarelo que enfeita as ruas. Sob o jogo cromático, podemos claramente perceber que o país está dividido entre duas escalas de cores : a verde-amarela e a vermelha, esta última sinalizando o PT, a CUT, o MST, o MTST, enfim, que, juntas, integram o conjunto de entidades que banalizaram o fenômeno das mobilizações. Portanto, hoje essas cores aparecem esmaecidas diante da apropriação do verde-amarelo pelos setores e organizações que ingressam na corrente contra status quo. Na verdade, o discurso do Nós (os camisas vermelhas) e Eles (os verde-amarelos) acirraram ânimos de muitos grupamentos, a partir dos médios. Que passaram a reagir contra os escândalos : mensalão, petróleo, maracutaias de todos os lados, envolvendo atores políticos de múltiplos partidos. À guisa de conclusão - O grau civilizacional de uma Nação pode ser aferido pela maior ou menor identificação com o sistema do qual faz parte. Assim, para enxergar o perfil do Brasil, basta colocá-lo diante do espelho da civilização ocidental que o reflete. Tomemos emprestadas as duas imagens do Ocidente que o professor Samuel P. Huntington utiliza em seus ensaios. - Na primeira, as nações ocidentais dominam o sistema financeiro internacional, manobram moedas fortes, fornecem a maioria dos bens acabados, controlam o ensino de ponta, realizam as grandes pesquisas científicas, dominam o acesso ao espaço, as comunicações internacionais, a indústria aeroespacial e as rotas marítimas, enfim, compõem a maior clientela do mundo. - Na segunda imagem, distingue-se um conjunto de Nações em crise, com parcela de seu poder político, econômico e militar em declínio. Nesse cenário, apontam-se lento crescimento econômico, alto desemprego, enorme déficit público, baixas taxas de poupança, criminalidade e imensa desigualdade social. Com qual dessas imagens a Nação brasileira mais se parece ?
quarta-feira, 8 de abril de 2015

Porandubas nº 439

Abro com duas historinhas ; uma da Bahia, outra, do Rio de Janeiro. Esperando o aperto de mão O deputado baiano mandou cartão de Natal para uma mulher que morrera há muito tempo. A família, irritada, retribuiu : "Prezado amigo, embora jamais o tenha conhecido durante os meus 78 anos de vida terrena, daqui de além-túmulo, onde me encontro, agradeço o seu gentil cartão de boas-festas, esperando encontrá-lo muito em breve nestes páramos celestiais para um frio aperto de mão. Purgatório, Natal de 2005." O deputado recebeu a resposta. E espera, angustiado e insone, pelo aperto de mão. Casa de tolerância Da verve do Sebastião Nery, mais um registro. A vereadora Lígia Lessa Bastos, da UDN, fazia discurso contra o prefeito Negrão de Lima, enfrentando os apartes dos representantes governamentais. Resolveu não conceder mais apartes. Manoel Blásques insistia, mas dona Lígia se mantinha intransigente. Quando terminou o discurso, Manoel Blásques pediu a palavra pela ordem : - Sr. Presidente, estranho o comportamento da nobre colega Lígia Lessa Bastos, pois esta Casa é reconhecidamente uma Casa de tolerância. Tempos pós-chocolate Passada a comilança de chocolate, na esteira da gula gerada nesses tempos de Páscoa, voltamos ao feijão com o arroz da crise. Mudou algo no horizonte após dias de doçura na boca e paladares satisfeitos ? Pouca coisa, mas algo de relevante surgiu nos últimos dias : a consciência de que alternativas políticas devem ser postas à mesa, sob espíritos desarmados e dispostos a encontrar saídas para a crise. O bloco situacionista deve se convencer que o momento é grave, não permanecendo na atitude tola de navegar nas ondas borrascosas que embalam a presidente Dilma ; as oposições também devem se convencer que um desastre geral as afetará. Todos perdem. O caminho O caminho mais largo é o aberto pelo pacote de ajustes do Joaquim Levy. Não passará in totum pelo Congresso, mas se atravessar os longos corredores das duas casas congressuais fazendo algumas concessões, deverá, mesmo assim, ser a baliza para resgatar a força da economia. O pacote envolve um montante de 110 bilhões de reais. Se Levy conseguir salvar cerca de 80 bilhões, suas metas poderão ser preservadas. Esse é o dever do Parlamento : aprovar medidas para melhorar a economia. Terceirização Ontem, abriu-se o debate sobre Terceirização no país, por meio do PL 4.330/04. Trata-se de um instrumento de modernização. O combate à Terceirização é feito por uma visão retrógrada que integra o PT, a CUT e os movimentos radicais. Que defendem relações do trabalho da época dos conflitos entre capital-trabalho. O mundo do século XXI é outro. O conceito de manufatura não é mais o do século XVIII. A especialização é a ferramenta-mor da produção. Um automóvel é um conjunto de obras especializadas. Cada qual, cada profissional, cada categoria pondo sua força de trabalho na produção dos componentes. Terceirização, como bem acentuam o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, e Vander Morales, presidente da Fenaserhtt e do Sindeprestem, é especialização. Direitos Os especialistas são contratados por empresas que os procuram no mercado, observando suas conveniências de produção. Empresas de prestação de serviços são formadas para ajudar as contratantes. Aos profissionais terceirizados garantem-se TODOS OS DIREITOS trabalhistas. Sem tirar nem por. Há sindicatos formados para agrupar os terceirizados. Que fazem Convenções Coletivas para garantir pisos de cada categoria e outros direitos. O PL 4.330 tem cerca de 80% seus artigos direcionados à defesa dos terceirizados. Falar sobre precarização do trabalho é balela. É slogan de CUT e radicais. É gritaria de quem quer continuar a abarrotar os cofres com os contingentes efetivos. Grana, grana Ora, as Centrais Sindicais preferem trabalhadores efetivos a terceirizados. A razão ? Quanto maiores os contingentes, mais grana nos cofres para os sindicatos dos efetivos que trabalham numa empresa. O que querem as Centrais ? Que uma copeira que trabalha numa metalúrgica, seja metalúrgica e não copeira, fazendo sua contribuição sindical ao sindicato dos metalúrgicos e não ao sindicato de asseio e conservação. Ora, essa copeira será manipulada pelos sindicatos da categoria preponderante para reivindicar o piso de metalúrgica, e mandando para o lixo o piso das copeiras. Ora, as empresas veriam, da noite para o dia, seus cofres estourados. As folhas tornariam insustentável a vida das empresas. Essa é a verdade que se esconde por trás do lero-lero da "precarização do trabalho". PMDB na articulação Será difícil ao PMDB aceitar o convite para comandar a articulação política, por meio da Secretaria de Relações Institucionais, hoje ocupada pelo ministro Pepe Vargas. O convite teria sido feito ao ministro Eliseu Padilha, que comanda a pasta da Aviação Civil. Padilha é um exímio articulador. Mas seria improvável aceitar a missão, que tem o todo poderoso ministro Aloizio Mercadante dando as cartas. CUT, PT e movimentos A ordem de Lula é : vamos para as ruas nos defender da corrupção e enfrentar nossos adversários. A CUT começou sua empreitada ontem. Mais tarde, nessa direção, vão arrumar uma nova designação - Frente de Mobilizações, por exemplo - uma expressão para induzir os incautos a pensar que tal movimento é de oposição ao governo. Lula é hábil nesse tipo de artimanha. Dia 12 As redes sociais convocam uma grande mobilização, dia 12 próximo. Pouco tem se falado sobre o evento. Será que caiu no buraco da banalização ? Minha bola de cristal não permite enxergar êxito ou fracasso no ato. Nesse momento, o país está muito imprevisível. E cercado pelo muro da imponderabilidade. Continuidade Os movimentos sociais deverão, doravante, estabelecer uma agenda mais pontual, com temas e demandas específicas. A conferir. Lava Jato Nos próximos dias, será aberto o ciclo do julgamento dos atores envolvidos na Operação Lava Jato. Os políticos, sob o crivo do STF, serão julgados mais adiante. O Brasil a limpo Não há dúvida. O Brasil a ressurgir, após essa bateria de crises, terá uma fisionomia mais asséptica. As crises apontam para a revitalização de estruturas, métodos e processos. Vaccari João Vaccari Neto, tesoureiro do PT, reluta em pedir licença do cargo. Quanto mais demora, mais deixa o partido em maus lençóis. Nalini O presidente do TJ/SP, desembargador José Renato Nalini, é um craque. Respondeu com tranquilidade e sabedoria a todas as questões que lhe foram remetidas, segunda feira passada, pela bancada do programa Roda Viva, na TV Cultura, da qual participei. Um exemplo de humanista entre os nossos juízes. Forum de Comandatuba Entre 18 a 21 de abril próximo, será realizado o 14º Fórum de Comandatuba, sob o comando do dinâmico empresário e jornalista Joao Doria Jr., presidente do LIDE - Grupo de Líderes Empresariais. Mais de 50% do PIB brasileiro se fará presente, ao lado de grande bancada de senadores, governadores, deputados Federais e prefeitos. Destas feita, o Fórum abrigará um seminário sobre a América Latina, com a participação dos ex-presidentes Fernando Henrique (Brasil), Vicente Fox (México), Luis Alberto Lacalle (Uruguai), Jorge Quiroga (Bolívia) e Álvaro Uribe Vélez (Colômbia). Já o Seminário Brasil debaterá "Medidas para Combater a Crise Institucional e Política do Brasil." Este consultor estará presente. Imagem de Dilma Pergunta recorrente feita a este consultor : com imagem tão negativa (só 12% atribuem ao governo o grau de ótimo/bom), Dilma poderá resgatar a imagem ? Em tese, sim. Tudo vai depender da economia, que é a locomotiva do trem. A economia puxa os carros da inflação, do desemprego, da carestia, da falta e dinheiro no bolso e, na ponta, gera alta do Produto Nacional Bruto da Infelicidade, que é amalgama das angustias, expectativas, alegrias e tristezas. Quando a economia vai melhorar ? Uns sinalizam o ano de 2016. Outros vêem um respiro nos meados do segundo semestre. Pois bem, o resgate de imagem vai depender da economia. Que deixa os políticos mais animados a fazer oposição. Lula Luiz Inácio deve estar com muita dor de cabeça. Ao ver ser PT de ponta-cabeça. Revirado. Identificado com a lama da corrupção. Lula está angustiado. E vendo seu estoque de carisma refluir. Gota a gota, aos pouquinhos. Espelhos rotos No dizer de Jorge Luis Borges, "somos nossa memória, somos esse quimérico museu de formas inconstantes, essa pilha de espelhos rotos". Um monumento de espelhos que, mesmo rotos, conseguem refletir o despertar de uma nova aurora. É assim que vejo o nosso país. Os sete pecados dos governantes Os governantes não gostam de ver seus retratos em preto e branco. Só a cores. Alguns até olham para o espelho, como a madrasta da Branca de Neve, e tascam a pergunta : "espelho, espelho meu, há alguém mais competente do que eu ?". O poder provoca delírios. Daí o primeiro pecado capital. É o pecado da insensibilidade. O pior é que os governantes acabam se achando com a cara de Deus : o segundo pecado capital, o pecado do sentimento da onipotência. Acham que o dinheiro compra tudo. Eis o terceiro pecado capital. O pecado da crença na força absoluta da grana. Não buscam soluções inteligentes e inovadoras para a gestão. Cometem o quarto pecado capital : o pecado da rotina. Daí para o quinto pecado, o salto é pequeno. Não obedecem a uma agenda planejada. Não administram seus tempos de acordo com um sentido de prioridades e lógica. Caem no pecado da improvisação. Cercam-se de "luas-pretas". E aceitam o sexto pecado capital, o pecado da bajulação consentida. Por último, abrem seu inferno particular para comemorar o sétimo pecado capital : o pecado do descompasso com o senso comum.Projeção para inflação
quarta-feira, 1 de abril de 2015

Porandubas nº 438

Abro a Coluna com uma historinha que cai bem na Semana Santa ! I.N.R.I. - Iesus Nazarenus Rex Iudaeorum Conta Leonardo Mota que o mestre Henrique era reputado marceneiro nos sertões de Sergipe. Sua especialidade estava nas "camas francesas a Luís Quinze". Quando o freguês achava que o leito era baixo, recebia a explicação de que a cama era francesa, mas era a "Luís Quatorze" ; se a queixa era contra a excessiva altura, ficava sabendo que aquilo era "cama francesa a Luís Dezesseis..." O mestre Henrique pôs toda a sua ciência no Cruzeiro do patamar da igreja de Aquidabã. No topo do sagrado madeiro, o vigário da freguesia fizera o mestre Henrique colocar uma tabuinha com as letras I.N.R.I., iniciais em latim de Jesus Nazareno Rei dos Judeus, a irônica inscrição latina de que a ruindade de Pilatos se lembrara na ignominiosa sentença de morte do filho de Deus. Decorrido algum tempo, um sertanejo sergipano, intrigado com a significação daquelas quatro letras, perguntou a um seu conhecido : - Que é que quererá dizer aquele negócio de INRI, que tem escrito em riba do Cruzeiro ? - Você não sabe não ? Ali falta é o Q-U-E. Esse QUE não cabeu na tabuinha : aquilo é a assinatura de quem fez, que foi o mestre INRIque... Ufa, Semana Santa A Semana Santa surge como um lenitivo para as dores de cabeça dos atores governativos. A partir da presidente Dilma, que poderá descansar das agruras e pressões a que vem se submetendo nos últimos dias. Nomeação de ministros, divisão de espaços, desmentidos do que foi dito, articulação com o Congresso Nacional, MPs polêmicas - o acervo de questões que mexem com a cabeça presidencial é denso. A Semana Santa é bem-vinda. Turismo Dilma deverá nomear esta semana o novo ministro do Turismo. A questão é : onde colocar o bom ministro Vinicius Lajes ? Vinícius tem sido um dos melhores ministros do governo. Afável, simples, técnico, rápido no gatilho. Sem burocracia. Se sair da Pasta do Turismo, será bem aproveitado em outra área. Henrique Alves ocupará seu lugar. PL 4.330 Felizmente, o país vislumbra um avanço no caminho das relações capital-trabalho : a votação do PL 4.330, que trata da Terceirização de Serviços. O tema tem sido debatido nos últimos 20 anos. As Centrais Sindicais fazem objeção ao projeto. Mas, como se sabe, tudo se resume a uma questão de dinheiro. A tese da Força Sindical é a de que as contribuições sindicais deveriam ser canalizadas junto ao sindicato preponderante, no caso, os sindicatos das empresas tomadoras de serviços. O que faria de uma copeira numa empresa siderúrgica trabalhadora siderúrgica. Claro, reivindicaria a condição e, assim, veria seu salário no teto dos trabalhadores do setor. As Centrais encheriam seus cofres. E a Terceirização iria para o buraco. Deixaria de existir. Essa maluquice tem a objeção dos sindicatos que fazem terceirização e das empresas tomadoras de serviços. Dia de abril Dia 12 será mais um Dia D. As redes sociais estão convocando o povo às ruas. Ouço : veremos o dobro do número de pessoas que compareceram às ruas dia 15 de março. Mais uma vez, tenho duvidas. A banalização desses eventos de massa acaba esmaecendo sua força. Com possibilidade de vermos menos gente nas ruas. Mas o ânimo social exacerbado funciona como contraponto. Portanto, este consultor permanece na dúvida. A prisão de Moro Não. O juiz Sérgio Moro, que aparece como herói nacional, não corre perigo de ser preso. O título acima quer significar a prisão que o juiz defende para os condenados na primeira instância. Ora, a presunção de inocência é um dos pilares básicos do nosso Estado de Direito. Ninguém será condenado até o trânsito em julgado da sentença. O que exige recurso de indiciados até a última instância. E se a Justiça inocentar o indiciado ao final do processo, depois do próprio ter passado bom tempo no xilindró ? O juiz Sérgio Moro abriu grande polêmica com sua tese exposta em artigo em O Estado de São Paulo, de 29 de março. O pacote de Levy Joaquim Levy tem sido um vendedor ambulante de seu pacote fiscal. Ouve as queixas dos setores, algumas com muita zanga, e se mantém em estado fleumático. Fala duro e com convicção. Tem credibilidade. Mas seu pacote deverá receber remendos aqui e ali. Não de modo a desfigurar a embalagem nem de modo a ferir de morte os nichos da produção. In médium virtus. A virtude está no meio. Mas o que será esse tipo de virtude ? A esfera política A esfera política continua olhando de soslaio o Palácio do Planalto. Enquanto a presidente padecer em seu gabinete, as casas congressuais não a enxergarão com simpatia. A economia, como locomotiva do trem, não deve melhorar no curto prazo. Nesse caso, a má vontade dos parlamentares se fará ver em decisões que contrariarão o Planalto. Nem a mudança da articulação política será suficiente para melhorar o clima com o Congresso. Que agirá com independência do Executivo. Enxugamento Sabe-se que a presidente encomendou um estudo sobre o enxugamento da estrutura ministerial. De 39 ministérios, sobrarão quantos ? Uns 25 ? 20 ? Ou continuaremos na casa dos 30% ? Este consultor não acredita que esta hipótese seja adotada em curto prazo. Seria uma baita confusão na Esplanada. O PT reage O PT vive a maior crise desde sua fundação. A sigla é demonizada. Embalada no manto da corrupção. Está no fundo do lamaçal. E decidiu reagir, sob argumentos de Lula, Rui Falcão e outros comandantes reunidos em São Paulo. Tomaram a decisão : vamos reagir ; vamos às ruas ; vamos ao ataque. Porque o ataque é a melhor defesa. Este consultor acredita que a estratégia petista pode se transformar em bumerangue : acirrará os ânimos. Aumentará a tensão nas redes sociais e nas ruas. O PT não pode e não deve aparecer como vestal. Seu traje ético está sujo. Iguala-se a de outros atores políticos. Com a diferença de que, nesse momento, enxerga-se um corpo que queima no meio da fogueira. O despiste Lula deu a ideia para o PT despistar o nome e buscar uma expressão que possa condizer com o discurso das ruas : uma Frente Ampla, como a que foi liderada no Uruguai pelo ex-presidente José Mujica ; ou o modelo chileno de la concertacion. Ou seja, ele quer embalar o PT com uma designação simbólica capaz de traduzir a indignação social, na esteira das ruas. Lula quer ser oposição ao status quo ; ao governo da presidente Dilma, maneira de disfarçar o governismo encarnado pelo PT. Lula é um craque. Quando presidente, subia aos palanques para desancar... seu próprio governo. As massas o aplaudiam nesse papel. Nome para o STF A presidente Dilma se fechou em copas na especulação sobre o nome para ocupar a vaga do ex-ministro Joaquim Barbosa no STF. Faz bem. A decisão é dela. E quanto mais fazem pressão, mais ela fecha os ouvidos. Nalini no Roda Viva Segunda-feira, o presidente do TJ/SP, José Renato Nalini, será o entrevistado do programa Roda Viva, da TV Cultura, um dois mais prestigiados programas da TV brasileira. Estarei na bancada dos entrevistadores. Haitianos O Brasil abriu as portas para o mundo. Cerca de 50.000 haitianos encontraram a rota do Acre para entrar no país. Foram bem acolhidos, receberem documentação e moradia. Mas o governo acreano livra-se da massa haitiana, incentivando sua peregrinação para São Paulo e outras regiões do país. O gesto do governo brasileiro pode, até, parecer digno. Urge lembrar, porém, que temos os nossos desvalidos. Milhões. Chega aos meus ouvidos a pergunta : haitianos e cubanos integrarão os exércitos de Stédile ? Este consultor não acredita. Seria uma afronta. Maioridade penal A CCJ da Câmara dos Deputados aprovou proposta que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos de idade. A Câmara vai criar comissão especial para analisar a PEC. Depois de votada duas vezes no Plenário da Câmara e passar pelo Senado, também em dois turnos, a proposta poderá virar lei. A tramitação da PEC ainda pode ser questionada no STF. Tema causará intensa discussão na sociedade. A conferir ! Quebradeira O Grupo OAS pede recuperação judicial. Uma pedrinha no dominó ? Desemprego Ouvi a pergunta de um grande empresário, semana passada, numa palestra sobre a Conjuntura proferida no Rio de Janeiro : "o desemprego está à vista. Empreiteiras, desempregando cerca de 200 mil ; setor construção civil, parado ; setor automobilístico, começando a desempregar ; outros, em início de processo ; desemprego na Grande São Paulo, chegando aos 10,5%. Alguém do governo está vendo isso ?" Lembrei o poema de Manuel Bandeira, o poema do Beco : "Que importa a paisagem, a Glória, a baía, a linha do horizonte ? - O que eu vejo é o beco." Complementei : mas o beco tem saída. Não sei se à esquerda, à direita ou ao centro. O Brasil banca Recebo uma lista com empréstimos do Brasil, por meio do BNDES, a países amigos : 1 - MOÇAMBIQUE BARRAGEM USD 350.000.000,00 2 - MOÇAMBIQUE CORREDOR DE ONIBUS USD 180.000.000,00 3 - NICARAGUA HIDROELETRICA USD 343.000.000,00 4 - BOLIVIA ESTRADA DA COCA USD 199.000.000,00 5 - VENEZUELA PONTE USD 300.000.000,00 6 - VENEZUELA METRO USD 732.000.000,00 7 - ARGENTINA SOTERRAMENTO USD 1.500.000.000,00 8 - ARGENTINA AQUEDUTO USD 180.000.000,00 9 - PANAMA AUTO PISTA USD 152.800.000,00 10 - PANAMA METRO USD 1.000.000.000,00 11 - PERU HIDROELETRICA USD 320.000.000,00 12 - EQUADOR HIDROELETRICA USD 243.000.000,00 13 - EQUADOR HIDROELETRICA USD 90.000.000,00 14 - CUBA PORTO MARIEL USD 68.200.000,00 15 - MOÇAMBIQUE AEROPORTO USD 125.000.000,00 16 - PERU ABASTECIMENTO DE AGUA NI 17 - URUGUAI GAZEODUTO NI 18 - LUANDA LINHA EXPRESSA NI Total .............................USD 5.783.000.000,00