COLUNAS

  1. Home >
  2. Colunas

Porandubas Políticas

Por dentro da política.

Gaudêncio Torquato
quinta-feira, 3 de agosto de 2017

Porandubas nº 540

Abro a coluna com historinhas de Campos/RJ. Cálculo Perguntaram ao advogado Benedito Rubens por que desistira de lecionar matemática. - Receio estar com um cálculo na vesícula... (350 Causos de Campos e Adjacências - Saulo Pessanha) Ignorinhos Em visita a uma feira no Pavilhão de São Cristóvão, no Rio, Dodozinho gostou muito de um casal de pássaros. Como não conhecia as aves, indagou a origem delas a uma recepcionista. - Ignoro senhor! Na volta a São João da Barra, Dodozinho falou maravilhas da feira e um assessor dele quis saber o que mais o atraiu. -Adorei um casal de ignorinhos! (Saulo Pessanha) Governo avança A cada semana, o governo dá um passo em sua trajetória. Quem apostava que o presidente estaria afastado no começo de agosto saiu perdendo feio. Alguns veículos de comunicação e seus principais colunistas embarcaram na canoa. Ontem, quarta, Michel Temer foi mais uma vez vitorioso. Este analista se inclina a acreditar na hipótese de que o presidente concluirá seu mandato. Sob as reflexões que seguem. Boa articulação O presidente é um hábil articulador político. Consegue maioria nas casas congressuais para obter seguidas vitórias. Ex-presidente da Câmara por três vezes, duas vezes líder do PMDB, partido que presidiu por 15 anos, Michel sabe conduzir conversas, alcançar apoios e formar maioria. Essa identidade tem sido fundamental para se aduzir que usará seu poder de convencimento para fazer sua pauta seguir adiante no Congresso. Quem no lugar? Outra vertente desta reflexão aponta para a questão: quem colocar no lugar de Michel Temer nesse momento de crise? Ora, o país registra melhoria na frente econômica. Inflação caindo, juros na casa de um dígito, curva do desemprego parando com os primeiros números (animadores) de contratações no mercado de trabalho. Tirar o presidente e colocar alguém no lugar seria um ato muito arriscado. Essa é a tese que está por trás do voto favorável ao presidente. Rodrigo Leal Rodrigo Maia, que poderia ser o nome para o lugar de Temer, tem dado mostras de lealdade. E não faz, como alguns dizem, jogo duplo. É claro que pode até ver com agrado a possibilidade de vir a assumir o cargo de presidente, mas as perspectivas de um novo governo, faltando apenas um ano e meio para o final do atual governo, são sombrias. Poderia não ser para Maia um bom negócio, eis que outras posições seriam atraentes, como o Senado, o próprio governo do Rio de Janeiro em 2018 ou, ainda, a volta como deputado Federal, posto que poderia lhe dar novamente a presidência da Câmara. Janot vingativo As denúncias do procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, começam a mexer com a cachola dos parlamentares, que enxergam em sua atitude vingança, ódio exacerbado contra o presidente. Por que Janot não exibe mesmo ímpeto em relação aos protagonistas Luiz Inácio e Dilma Rousseff? Seu tiroteio concentra-se em Temer e Aécio Neves. A imagem de um procurador vingativo se incrusta na mente dos parlamentares. Sentimento geral O presidente é impopular, dizem as pesquisas. Mas o sentimento geral do universo produtivo é o de que Michel Temer está fazendo o país caminhar, com os avanços na esfera das reformas. Por isso, a voz comum é de apoio às medidas que estão sendo tomadas. Não se vê "fora Temer" nem em placas nem na expressão oral. O endosso do empresariado e de fortes conjuntos das profissões liberais só é questionado quando a questão é a de tributos. As entidades de muitos setores se posicionam contra o aumento de impostos, como se viu recentemente por ocasião do aumento de combustíveis. Orgulho do país "Quando alguém pode dizer em qualquer país do mundo, meus pobres são felizes, nem ignorância nem miséria se encontram entre eles, minhas cadeias estão vazias de prisioneiros, minhas ruas de mendigos: os idosos não passam necessidades, os impostos não são opressivos [...] quando essas coisas podem ser ditas, então pode tal país orgulhar-se de sua Constituição e de seu governo" (Os Direitos do Homem -Thomas Paine) O Brasil moderno O que está em jogo, na visão de analistas, é a visão de um país moderno, que deve fazer as reformas fundamentais para estabelecer patamares de alta produtividade e eficácia, e um país com o status quo do passado, cercado pelas mazelas geradas pelo patrimonialismo: mandonismo, grupismo, nepotismo, caciquismo, fisiologismo. Os horizontes descortinam saídas para a maior recessão econômica da história brasileira, herança da era PT. Mas esse partido e outros fazem de conta que a crise começou hoje com o governo Temer. Caradurismo. A visão do país arcaico faz o gosto das oposições. PSDB dividido Os tucanos estão divididos. A banda de "cabeças brancas" (os mais velhos) contra a banda de "cabeças pretas". O partido tem quatro ministros. E a agenda que o presidente Temer está mostrando é praticamente a agenda do PSDB. Sair do governo nesse momento é covardia. Ocorre que certos parlamentares temem perder votos em 2018 caso continuem a fazer parte do governo. O tucano Cássio Cunha Lima diz que quer preservar a posição de seu filho deputado. O tucano Tasso Jereissati quer levar o comando do partido para o Nordeste. Para Geraldo Alckmin, não interessam maremotos e tsunamis. Por isso, a continuidade do governo Temer é a melhor opção para sua candidatura em 2018. Fato: o PSDB é o partido que apresenta, hoje, maior divisão. A caravana de Lula Dia 17 de agosto Lula iniciará suas caravanas pelo país, a começar pelo Nordeste. Entrará pela Bahia e encerrará a jornada nordestina no Maranhão. Passará por cidades grandes e médias. Na região, consegue obter uma média de 45% de intenção de voto. Percorrerá depois as regiões Norte e Centro-Oeste. Como se vê, sua estratégia é a de comer pelas bordas. Das margens para o centro. Mas terá poucas chances de vir a ser candidato. A 2ª instância da Justiça Federal (PR, SC e RS) tende a confirmar a condenação dada pelo juiz Sérgio Moro, de 1ª instância. Reforma política: o poder é do povo Ponto 1: nos termos do parágrafo único do artigo 1º da Constituição, "todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição". Ponto 2: nos termos dos artigos 45 e 46 da Constituição Federal, os deputados Federais representam o povo e os senadores representam os Estados e o Distrito Federal. Ponto 3: os deputados são eleitos pelo sistema proporcional e os senadores, pelo sistema majoritário. Ponto 4: se o povo vota em um candidato e este, com sua bagagem de votos, leva para o Parlamento mais dois ou três de contrabando, esses excedentes ferem o princípio constitucional alinhavado no primeiro item. Reforma política: Distritão Ponto 5: a representação popular, para ganhar respeito e legitimidade, deve se submeter a uma radiografia moral a fim de se conformar aos ditames constitucionais. Ponto 6: o exercício do poder em nome do povo é tese ancorada na hipótese de escolha dos eleitos de acordo com o preenchimento das vagas que cabem a cada Estado. Ponto 7: essa hipótese abriga o voto majoritário, que, adotado na escolha dos representantes do povo, acabaria com a excrescência gerada por coligações proporcionais, pela qual o eleitor vota em um candidato e, alheio à sua vontade, elege mais um, dois ou até mais de três. Portanto, o Distritão é uma boa alternativa. Reforma política: Emenda Lula Outubro está à vista e a reforma política caminha a passos de caranguejo. O relator Vicente Cândido, do PT, acabou retirando a "Emenda Lula", de sua autoria, como é conhecida, aquela que dizia que candidatos não podem ser presos até 8 meses antes da eleição. O próprio Lula teria sugerido a retirada. Ambição desmesurada No meu livro "Marketing Político e Governamental" cito um pensamento do cientista político Robert Lane, em Political Life, que explica como a ambição desmesurada pelo poder funciona como um bumerangue. "A fim de ser bem-sucedida em política, uma pessoa deve ter habilidades interpessoais para estabelecer relações efetivas com outras e não deve deixar-se consumir por impulsos de poder, a ponto de perder o contato com a realidade. A pessoa possuída por um ardente e incontrolável desejo de poder afastará constantemente os que os que a apoiam, tornando, assim, impossível a conquista do poder". PT quer Michel no comando O PT diz uma coisa e faz outra. Na Tribuna, seus líderes pregam o impeachment de Michel Temer. Mas, na surdina, trama pela continuidade, sob a crença de que o presidente "sangrando" conviria mais aos seus desígnios. Mas quem garante este "sangramento" até outubro de 2018? Avaliação melhor Este consultor sempre fala de sua equação: BO+BA+CO+CA= Bolso, Barriga, Coração, Cabeça. Bolso cheio, barriga satisfeita, coração agradecido e cabeça aprovando o comandante da jornada. Ou seja, a democracia do pão sobre a mesa, na esteira de uma economia recuperada, melhorará os padrões de avaliação do governo. Essa hipótese é plausível. Centrão O Centrão, que reúne os partidos médios do Congresso, deverá ser o bloco mais forte dentro da composição das forças governistas. Seus integrantes deram o maior número de votos ao presidente na sessão de ontem. Deverá ser recompensado. - "Quando o efeito é bom...ele sempre justifica a ação" (Maquiavel) Simula e dissimula O cardeal Mazarino, sucessor de Richelieu e preceptor de Luís XIV, o Rei Sol, começa seu tratado Breviário dos Políticos, que versa sobre a arte de operar a política, com um conselho não muito sagrado: "Simula e dissimula". Esta lição de engodo costuma ser submetida ao crivo da população durante as falas de nossos representantes. Na sessão de ontem, essa estratégia foi muito usada. A simulação e a dissimulação - e aqui já é o ensinamento do filósofo inglês Francis Bacon - ocorrem de três formas: a cautelosa, quando uma pessoa impede que a tomem tal qual é; a negativa, quando expressa sinais de que não é o que é; e a positiva, quando finge e pretende ser o que não é. Fecho a coluna com o folclórico Newton Cardoso, das Minas Gerais. Helicóptero Newton Cardoso assumiu o governo de Minas. No dia seguinte, foi ao aeroporto para viajar no helicóptero da administração estadual. Ao tomar conhecimento de que aquele "trem" tinha o nome de seu adversário, foi logo dando bronca no piloto: - Não entro de jeito nenhum nesse trem com o nome do Hélio (Hélio Garcia era o governador anterior). O piloto, constrangido, respondeu: - Mas governador, esse helicóptero é do governo do Estado e não do ex-governador Hélio. Newton não quis saber: - Esse trem agora vai se chamar Newtoncóptero. Falei e tá falado.
quarta-feira, 19 de julho de 2017

Porandubas nº 539

Abro a coluna com pequena reflexão O nome de Deus em vão Deus é sempre a referência de homens que carregam em sua alma a pretensão da onipotência. Franco usava a Providência Divina para se afirmar: "Deus colocou em nossas mãos a vida de nossa Pátria para que a governemos". Não satisfeito, mandou cunhar nas moedas: "Caudilho da Espanha pela graça de Deus". Idi Amin Dada, o cabo que se tornou marechal de Uganda, ditador sanguinário, dizia ao povo que falava com Deus nos sonhos. Um dia, um jornalista faz a inquietante pergunta: "O senhor tem com frequência esses sonhos? Conversa muito com Deus? Lacônico, o cara de pau respondeu: "Só quando necessário". Este analista acredita que o nome de Deus nunca foi tão usado pela esfera política como nesses tempos de crise. Em vão. Recesso parlamentar A tese de que o recesso poderá mudar o comportamento do parlamentar na decisão em plenário sobre a admissibilidade da denúncia contra o presidente da República tem de ser analisada sob alguns ângulos. É verdade que Michel Temer é impopular, segundo constatam pesquisas. Mas o eleitor não faz também boa avaliação dos parlamentares. Pode haver, aqui e ali, um caso de mudança, mas é pouco provável que o corpo parlamentar, em sua grande maioria, mude a decisão de votar a favor do presidente por influência das bases. Reformas Interessante é observar que as reformas encampadas pelo governo conseguem simpatia de núcleos centrais, profissionais liberais, enfim, de fortes conjuntos das classes médias. No médio prazo, com os primeiros resultados a serem dados pelas reformas, é razoável apostar na melhoria da avaliação do governo. A reforma da Previdência poderá ser o calcanhar de Aquiles da administração Federal. Tudo vai depender da travessia da canoa das denúncias pelas ondas da Câmara Federal. Saída para a crise A saída para a crise é a via parlamentarista. Até porque o presidencialismo de cunho imperial já deu o que tinha de dar. A coalizão partidária que caracteriza o nosso sistema começa a ser bastante questionada. Os partidos tomam posição, mas muitos de seus integrantes não cumprem as determinações. Critica-se, por outro lado, o poder de cooptação do Executivo. Por tudo isso, urge mudar a face do disco. Fim de linha O fato é que o sistema parlamentarista abrigaria melhor os elementos tradicionais que amparam o regime republicano: o federalismo, o bicameralismo, o multipartidarismo, o voto uninominal e dois tipos de sistema eleitoral (proporcional e majoritário), que acabam conferindo caráter híbrido à nossa democracia. Morrer jovem Pergunto à tia Rute, 83 anos, espertíssima: - Tem coisa pior do que envelhecer? E ela, curta e grossa: - Tem. Morrer jovem. (Enviado por Álvaro Lopes) Novas bases Mas o parlamentarismo carece de novas bases em nossa política. Não há condições de se estabelecer um regime parlamentarista sob o gigantesco balcão que acolhe 35 partidos. Para a convivência entre os conjuntos da situação e da oposição, o Parlamento carece de um leque de não mais que 7 a 8 partidos. As correntes de pensamento e opinião estariam bem representadas. Ou seja, a vereda parlamentarista deve integrar o largo caminho de uma reforma política. Reforma empacada Mas a reforma política está empacada. O relator, deputado Vicente Cândido (PT-SP) parece meio perdido. Sua última decisão se volta para uma proposta de caráter oportunista, a chamada "emenda Lula", pela qual candidatos não poderão ser presos até 8 meses antes das eleições. A intenção, como se pode perceber, é garantir a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio em outubro de 2018. Os deputados de grandes partidos começam a ensaiar apoio ao distritão, sistema eleitoral que elegeria os mais votados nos Estados. Portanto, sem as caronas proporcionadas pelas coligações proporcionais, encabeçadas por puxadores de votos. PSB encolherá? O PSB é um partido em crise. Desde a morte de Eduardo Campos, seu timoneiro, o partido ficou ao léu, sem saber o rumo a tomar. A cúpula do PSB tem posição contrária ao governo, apesar da líder do partido na Câmara, deputada Tereza Cristina (MS) integrar o grupo aliado ao governo. Fala-se em uma demandada de 10 parlamentares rumo ao DEM ou mesmo ao PMDB. O senador Fernando Bezerra Coelho estaria por trás dessa manobra, que visaria formar uma frente de apoio ao filho, hoje ministro Fernando Coelho Filho, como candidato ao governo de Pernambuco. Jung e o rei africano Jung perguntou, uma vez, a um rei africano: - Qual é a diferença entre o bem e o mal? O rei meditou, meditou e respondeu às gargalhadas: - Quando roubo as mulheres do meu inimigo, isso é bom. E quando ele rouba as minhas, isso é muito ruim. Condenação de Lula Lula se sente bem na posição de condenado pelo juiz Sérgio Moro. Não morreu e nem morrerá por conta disso. Trata-se de um protagonista de primeira linha: detém forte dose de carisma, sendo o líder mais populista do país; possui alta visibilidade; domina bem a expressão de palanque; é capaz de mobilizar largos contingentes; e o PT, ao contrário de outros partidos, abriga aguerrida militância. Por todos esses aspectos, a vida política de Lula não se encerra com a condenação do juiz Moro. Corrida pelo território Lula iniciará nos próximos dias um périplo pelo país a começar pelo Nordeste, onde detém grande popularidade. A estratégia de mobilização centrípeta - das margens para os centros - tem o intuito de expandir o discurso de que as elites, a partir do Poder Judiciário, querem inviabilizar sua candidatura nas eleições de 2018. O eleitorado das regiões menos desenvolvidas tende a se solidarizar com seus ídolos, principalmente quando estes vestem o manto de perseguidos de poderosos. O discurso separatista do "nós" contra "eles", tão do gosto do lulopetismo, voltará a regar as searas carentes. Lula dará prioridade às grandes e médias cidades do interior nordestino. Juntando as oposições As andanças de Lula pelo país terão o objetivo de ressuscitar a imagem do PT, combalido pela crise política e alvo de escândalos de corrupção desde o mensalão; voltar a ser o "pai dos pobres", recolocado no altar das massas; arrumar a militância desordenada e preparar o caminho dos eleitores em direção às urnas. Se for condenado e tiver a candidatura impedida, por volta de julho/agosto de 2018, suas andanças não perderão eficácia. Tornar-se-á vitima, na esteira de uma estratégia que ele sabe desenvolver. Ajudará ainda perfis próximos ao lulismo, ao mesmo tempo em que poderá ser o construtor e fiador de candidatura única das oposições. Sigilo nas contas Mais uma proposta do deputado Vicente Cândido, relator da reforma política, gera polêmica. Ele pretende apresentar a ideia de cobrir de sigilo as doações para campanhas cujo valor seja inferior a 3 salários-mínimos. Calcula-se que deixariam às escondidas 95,55% dos recursos doados na campanha de 2016. Muita coisa. Não passará. A sociedade está de olho atento aos esconderijos. Maia é pragmático Rodrigo Maia não é bobo. Fala a linguagem da real politik. É evidente que não pode deixar de reconhecer suas chances de vir a ocupar a cadeira presidencial no caso da saída do presidente. Urge, porém, acreditar no que diz: não conspira contra Michel Temer. Acompanha os passos de seu contingente parlamentar, abre os ouvidos e a expressão pragmática. O governo deverá passar pelo primeiro grande teste, a primeira denúncia de Janot. E Rodrigo acompanhará essa travessia com largueza de espírito. Sem emboscadas. A conferir. João Almino O embaixador João Almino, potiguar como este consultor, tomará posse dia 28 na Academia Brasileira de Letras, no Rio de Janeiro. João nasceu em Mossoró em 1950, é autor de seis romances, muito apreciados pela crítica (As Cinco Estações do Amor, vencedor do Prêmio Casa de Las Americas, e Cidade Livre, finalista dos Prêmios Jabuti e Portugal-Telecom, entre outros), alguns traduzidos para inglês, francês, espanhol, italiano e outras. É também ensaísta e seus trabalhos são considerados referências para estudiosos de sistemas políticos. O presidente da Academia Norte-Riograndense de Letras, o poeta e escritor Diógenes da Cunha Lima, liderou uma campanha para patrocinar a confecção do fardão. Delações que virão Fala-se muito das delações que virão. E citam-se os possíveis delatores: Eduardo Cunha e Lúcio Funaro. Questões que se colocam: teriam fatos novos a contar? Viriam apoiadas em provas contundentes? Não seriam repetições ao que já foi dito? Daí porque as interrogações continuam a empanar os horizontes. Desemprego começa a ceder Os sinais de que a curva do desemprego começou a ceder e a cair são auspiciosos. O país criou 67,3 mil vagas no 1º semestre. A inflação aponta também para ligeiro declínio. Os juros, esses sim, precisam cair em ritmo mais forte. Os sinais são animadores. Ciro ataca Lula Lê-se que Ciro Gomes, com forte possibilidade de ser o candidato do PDT ao pleito de 2018, ataca Lula, que não teria deixado formar outras lideranças dentro do PT. Não é novidade. Em se tratando de Ciro, metralhadora ambulante, virão tiros para todos os lados. Por isso, é comum se ouvir: como peixe, Ciro morre pela boca. OAB/SP em grande ação O presidente da OAB/SP, Marcos da Costa, se empolga com o conjunto de eventos e ações sob coordenação da entidade. Fará exposições nos espaços da Assembleia Legislativa de São Paulo, do Tribunal de Justiça e do Tribunal Regional do Trabalho. De 27 a 30 de novembro, São Paulo sediará a XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira, que deverá contar com a participação de 40 mil advogados. E serão lançados livros sobre os ex-presidentes da OAB nacional: Mario Sérgio Duarte Garcia, Marcio Thomas Bastos, Roberto Batocchio e Rubens Approbato Machado; e mais dois livros, um sobre Direito de Defesa e outro sobre os 85 anos da OAB/SP, a partir das sub-secções regionais. Em março passado, a Ordem iniciou as comemorações com a inauguração de uma exposição com as principais capas do Jornal do Advogado. Fecho a coluna com São Paulo sonhando com Brasília. Fazendo exame para Brasília Um amigo da coluna esteve recentemente no Palácio dos Bandeirantes. Perguntou-me: - Você viu o que o governador Alckmin mandou fazer? Contou. No Salão Nobre, cravado em madeira, viu o brasão do Estado: uma espada longa cercada por dois modestos ramos de café. Emoldurado pelo dístico: - Pro-Brasilia fiant eximia. (Façam-se as melhores coisas pelo Brasil). Com seu parco conhecimento de latim, traduziu: - Fazendo exame para Brasília.
quarta-feira, 12 de julho de 2017

Porandubas nº 538

Abro a coluna com Tancredo e seus conchavos Conchavo Premido por casuísmos, Tancredo Neves foi obrigado a fundir o seu PP com o MDB de Itamar. Alguns pepistas pularam do barco e protestaram alegando conchavo. Tancredo foi curto e seco: "Conchavo é a identificação de ideias divergentes formando ideias convergentes". Tinha razão. Há curvas que desembocam em retas. O país vive momentos de conchavos na esteira da profunda crise política. Reformas semeadas Seja qual for o desfecho da crise - a permanência ou não do presidente Michel Temer à frente do governo - cristaliza-se na sociedade a irreversibilidade das reformas fundamentais ao desenvolvimento do país. Bateu-se muito nos últimos meses em sua defesa. A reforma trabalhista chega a ser defendida quase todos os dias pelos setores produtivos e pelos grandes jornais. A reforma da Previdência, apesar da polêmica que levanta, também ganha a cada dia mais adeptos. Pode ser que não saia do tamanho com que foi inicialmente proposta. A reforma política, essa, então, virou sinônimo de "urgência" na agenda congressual. Mas divide o Parlamento. A reforma tributária é feita em doses homeopáticas. Portanto, as reformas foram bem plantadas. Só mesmo os perdedores de benefícios as repudiam. Política, conflitos Apenas para lembrar porque a reforma política não anda: o patrimonialismo ainda dá as cartas. Nossa cultura política é secular. Remanescem traços da herança deixada por Dom João III, entre 1534 e 1536, quando criou as 15 capitanias hereditárias e as distribuiu entre os donatários. A confusão entre público e privado vem daí. Os políticos acham que são donos do mandato e dos cargos nas estruturas públicas. Consideram-nos feudos. Complexo de faraó Ao lado da velha cultura patrimonialista, o Brasil também sedia o complexo de faraó. Haja olhos para contemplar a arquitetura faraônica que se espraia pelo país na forma de construções suntuosas, edifícios majestosos, obras de desenhos arrojados e massas volumosas que causam estupefação. O Brasil se habilita a ser o habitat ideal para abrigar o sono eterno dos faraós, fustigados pelo eco da turba que chega às suas tumbas. Se suas majestades só se sentem confortáveis em pharao-onis, termo do velho latim para significar "casa elevada", é isso que encontrarão no Planalto brasiliense, que pode ganhar o título de morada dos faraós no século 21. O fausto, a opulência, o resplendor, a exuberância se elevam nos espaços, sob o ditame inquestionável de que, se a obra foi construída em Brasília, não deve sofrer limites de gastos. Uma das mais resplandecentes foi a sede do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Catacumbas do desperdício Outra faceta bem brasileira é o desperdício. Jogamos fora 50% dos alimentos produzidos (perda estimada em R$ 20 bilhões anuais, o que daria para alimentar 30 milhões de pessoas), 40% da água distribuída, 30% da energia elétrica. Os cálculos foram feitos pelo professor de Engenharia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro José Abrantes, autor do livro "Brasil, o País dos Desperdícios". Há simplesmente um PIB e meio desperdiçado, ou seja, jogam-se no lixo R$ 3,6 trilhões. Se a montanha de riquezas perdidas pudesse ser preservada, o país estaria, há tempos, no ranking mais avançado das potências. Mídia e crise A crise é profunda. A cada dia, novos episódios se juntam ao contencioso existente. Há, porém, muitos vieses a atrapalhar o esforço de leitura dos acontecimentos. A mídia, por exemplo, exagera nas doses informativas. Regra geral, as matérias dos grandes jornais dão o governo como acabado. Já não existe. Nomeiam ministros do governo Rodrigo Maia, fofocam sobre apreciação do presidente da Câmara sobre uns e outros nomes de sua simpatia/antipatia. Mas o fato é que o governo, mesmo no despenhadeiro, ainda dá demonstrações de força. Denúncias seguintes A hipótese tem sentido: o presidente Michel Temer pode vencer a luta da primeira denúncia, ganhando na CCJ e no Plenário, mas terá dificuldades extremas para enfrentar as duas outras denúncias a serem apresentadas pelo procurador Rodrigo Janot. Os parlamentares estarão no recesso em contato com suas bases. E deverão regressar ao ambiente parlamentar sob a influência dos eleitores. O processo de votação - com a identificação pessoal do deputado - é uma barreira para que este perfile ao lado do presidente da República. A imagem do procurador Há uma interpretação sobre o futuro de Janot, registrando-se até eventual inserção na esfera política. Ora, a imagem do procurador não é boa em estratos médios, onde se faz o acompanhamento da crise com mais poder crítico. Sua benevolência com os Batista, dando a eles o perdão por terem delatado o presidente da República, causa intensa indignação. Expande-se a convicção de que ele agiu sozinho, julgando o próprio Joesley e tirando o poder do Judiciário para julgar os cabeças de muitos crimes. Há até um dado que circula pelas redes: Joesley teria escapado de uma pena de 2.000 anos. STF em segundo plano O fato é que a imagem do Judiciário também saiu chamuscada do episódio da delação dos Batista. Praticamente, o STF cumpriu o papel de convalidar a decisão do procurador. Nesse momento, firulas de natureza jurídica - eventual correção mais adiante do perdão a eles concedido - não são compreendidas por parte de boa parcela da sociedade. O ministro Edson Fachin, sob essa mesma leitura, teria sido muito apressado com sua decisão de aprovar os pedidos do PGR. Frente da violência Mais uma vez o Brasil assistiu, ontem, algo inusitado. Senadoras da oposição - Fátima Bezerra, Vanessa Grazziotin e Gleise Hoffmann, Regina Souza e Lídice da Mata - decidiram ocupar a mesa diretora do Senado para evitar a votação da reforma trabalhista. Impedido de sentar-se na cadeira de presidente, o senador Eunício Oliveira ordenou apagar as luzes do ambiente e desligar o som de microfones. O gesto foi designado por elas próprias como um ato democrático. Há quem veja na extravagante ideia das senadoras da oposição um ato violento. P.S. Qualquer senador pode abrir a sessão quando não há quorum. Mas, claro, devem ceder a cadeira de presidente a quem a ocupa por direito. Quando este se fizer presente. Senadores governistas estão tentando um acordo com as rebeldes. Pergunta: e o Conselho de Ética será acionado ou não? Zveiter Mesmo garantindo que seu parecer teria um cunho eminentemente político, o deputado Sergio Zveiter, relator da denúncia contra o presidente da República na CCJ, produziu uma peça com fortes elementos jurídicos. Entrou no mérito, repeliu a tese de que a denúncia era inepta, falou de sua gravidade e dos fortes indícios de participação do presidente na trama. Mas e a prova dos nove, o recebimento da mala com 500 mil reais? Ficou na lateral. Não disse nada. Mariz Antônio Claudio Mariz de Oliveira mostrou porque é um dos mais competentes advogados criminalistas do país. Fez um contundente discurso. Foi veemente. Emotivo. Fez reptos. Desafiou o PGR a mostrar as provas de corrupção. E colocou o conceito de açodamento tanto em Rodrigo Janot quanto no juiz Edson Fachin. Mariz chegou a afirmar que, no país, a anomia impera. Anomia e impunidade No Brasil, corruptos e facínoras, se condenados, ganham o mesmo status perante a lei. Por isso, não é de estranhar a anomia que toma conta do país. Vem de longe. Desde os idos da colônia e do Império, fomos afeitos ao regime de permissividade, apesar da rigidez dos códigos. Tomé de Souza, primeiro governador-Geral, chegou botando banca. Os crimes proliferavam. Avocou a si a imposição da lei, tirando o poder das capitanias. Um índio que assassinara um colono foi amarrado na boca de um canhão. Ordenou o tiro para tupinambás e colonos entrarem nos eixos. Ordenações do reino Em 1553, porém, uma borracha foi passada na criminalidade, com exceção dos crimes de heresia, sodomia, traição e moeda falsa. Depois chegaram as Ordenações do Reino (Afonsinas, Manuelinas e Filipinas), que vigoraram até 1830. De tão severas, a ponto de estabelecerem a pena de morte para a maioria das infrações, espantaram até Frederico, o Grande, da Prússia, que ao ler o Livro das Ordenações, chegou a indagar: "Há ainda gente viva em Portugal?". Os castigos, porém, eram frequentemente perdoados. (Qualquer lembrança de Joesley Batista é mera coincidência). Na época, a regra era impor uma dialética do terror e do perdão para fazer do rei um homem justiceiro e bondoso, como relata Luís Francisco Carvalho Filho num ensaio sobre a impunidade no Brasil nos tempos da colônia e do Império. E assim, entre sustos e panos quentes, o Brasil semeia "a cultura do faz de conta". Fecho a coluna com Jânio e as brigas de galo Galo briguento na panela Jânio Quadros assumiu a presidência da República, proibiu brigas de galo. A ordem era irrecorrível: "Se cantar, terreiro. Se brigar, panela". José Resende de Andrade, delegado em Belo Horizonte, era janista, zeloso e fiel executor da lei. Mandou prender todos os galos de briga da região metropolitana. José Resende levou a galada para os fundos da delegacia, na praça da Liberdade. De madrugada, começou a alvorada cantante. Magalhães Pinto, governador do Estado, dormindo próximo, no Palácio da Liberdade, foi despertado pela orquestra de José Resende, mandou dar um jeito imediato na zoeira. José Resende recebeu a ordem, não discutiu. Matou todos. Um galicídio. Até hoje os amigos o chamam de Zé Cocó, o mata-galo. E ele, muito mineiramente, sorri modesto: "O dever não distingue o canto do infrator".
quarta-feira, 5 de julho de 2017

Porandubas nº 537

Abro a coluna com uma historinha de Mossoró/RN. As mãos limpas de Sócrates Debate na Câmara dos Vereadores de Mossoró. De um lado, Toinho Duarte toma posição, recorrendo a um gesto bíblico para melhor se fazer compreender: - Excelências, como "Sócrates", eu lavo as mãos.... Com seu jeito sarcástico, depois de pedir um aparte o também vereador Lázaro Paiva encurrala-o com um necessário reparo histórico: - Excelência, me desculpe. Quem lavou as mãos não foi Sócrates (filósofo grego), mas sim Pilatos. Sem dar o braço a torcer, Toinho retoma a palavra para a estocada final: - Excelência, o senhor quer bem dizer que Sócrates nunca lavou as mãos, hein? Hein? (Do Livro Só Rindo 2, de Carlos Santos) O melhor e o mais selvagem O homem, em estado de perfeição, ensinava Aristóteles, é o melhor dos animais. Quando, porém, afastado da lei e a da Justiça, é o mais selvagem e impiedoso de todos, pois, destituído de qualidades morais, usa a inteligência e o talento como armas para praticar o mal. É possível vislumbrar no pensamento do grande filósofo grego a inspiração que emoldura a sábia (e poética) observação do então ministro Carlos Ayres Britto, por ocasião da sessão da Suprema Corte que julgou o núcleo político da Ação Penal 470 pelo crime de formação de quadrilha. Deus no céu... Ayres Britto, também poeta, escreveu na ocasião: "Deus no céu e a política na terra. Por quê? Porque a política é o meio pelo qual a sociedade constrói e reconstrói o Estado. A política é o instrumento de concretização dos anseios do povo. É, acima de tudo, a forma pela qual se pode buscar o bem-estar coletivo, a manutenção da ordem e a concepção do progresso". Brasil policial Sensação geral: o Brasil virou uma gigantesca delegacia de polícia. A crise política adentrou na esfera policial. Quase todos os dias vemos prisões, algumas envolvendo políticos, outras levando empresários. A PF cumpre os mandados autorizados por juízes. As operações em sequência avolumam o contencioso da operação Lava Jato. Anteontem foi a vez do ex-ministro Geddel Vieira Lima e do empresário de transportes do Rio de Janeiro, Jacob Batista Filho. Cerco ao governo Cada detenção de políticos, principalmente de ex-ministros, impacta negativamente sobre a imagem do Governo. A impressão é a de que há uma estratégia bem definida para estreitar a margem de articulação governamental. Uma cadeia de impressões se estabelece: os deputados se impressionam com as detenções e fazem raciocínios sobre os efeitos que tais prisões geram no sistema cognitivo dos eleitores. E começam a tomar decisões que garantam sua sobrevivência política. Pensam em 2018. E sob este pano de fundo, vão decidir sobre o pedido de investigação feito pelo STF à Câmara Federal. O efeito do discurso Muita gente se engana com a eficácia do discurso político. Pois bem, o discurso político é uma composição entre a semântica e a estética. O que muitos não sabem é que a eficácia do discurso depende 7% do conteúdo da expressão e 93% da comunicação não verbal. Esse é o resultado de pesquisas que se fazem sobre o tema desde 1960. E vejam só: das comunicações não verbais, 55% provêm de expressões faciais e 38% derivam de elementos paralinguísticos - voz, entonação, gestos, postura, etc. Ou seja, do que se diz, apenas pequena parcela é levada em consideração. O que não se diz, mas se vê, tem muito maior importância. A imagem da mala, a soma de GRPs Projetemos esses dados sobre a mala de dinheiro que o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures carregava ao sair de uma pizzaria. Ganhou status de símbolo maior da corrupção. Imaginem, agora, essa imagem sendo apresentada quase todos os dias pelo Jornal Nacional, da TV Globo. O GRP (Gross rating point), que mede alcance e frequência das campanhas, no caso da imagem da mala, equivale a uma soma dos GRPs de campanhas maciças de produtos de consumo de massa. Ou seja, ocupa todos os lados do cérebro dos telespectadores. É com essa força que a TV Globo conta para despachar o presidente. E a repetição diária das linguagens (diálogos e imagens) acaba plasmando o conceito de "verdade". Bonner Ao encerrar o Jornal Nacional da última segunda-feira, 3, William Bonner se despediu anunciando o título do filme da Tela Quente, que seria transmitido após a novela das 21h. O filme: era Caçada ao Presidente. Bonner mostrou um 'sorriso sarcástico'. Muitos interpretaram o tom como uma indireta a Michel Temer. A corrida A imagem da mala assume outros significados: a corrida do Loures é associada à fuga, despiste, medo de flagrante, ilícito. A repetição dispara sentimentos negativos e comentários jocosos. O elo com o presidente é feito pela oralidade: homem de confiança, amigo, fiel aliado. E dessa forma, os mecanismos da cognição são acionados contra o ex-deputado e, por conseguinte, na autoridade a quem servia. A repetição, sem fatos novos que justifiquem tantos GRPs, acaba fechando o circuito de campanha negativa. A teia da delação Sem terem para onde correr, os envolvidos são lançados na malha da delação. Sob certa dose de coação (e coerção) psíquica, que se extrai dos duros ambientes dos cárceres (salas pequenas, sem ventilação, sem janelas, sem aparelhos sanitários). Ao fundo, a pressão familiar, que funciona como bússola de salvação. A família luta para que pais, filhos e parentes presos voltem para casa. Mesmo com tornozeleiras eletrônicas. Um fim para a crise A crise crônica que consome a esfera política chegará ao fim? Quando? Em que circunstâncias? O fato é que a sociedade clama por uma nova página no dicionário da crise. Quer ver assepsia, compromisso, verdade, transparência, política séria. A saída é a reforma política. Esta, porém, está ameaçada. Pode não sair do papel. Será uma frustração. As mesmas notícias, todos os dias, esgotam o estoque de paciência do telespectador. Que clama por um país que tem de dar um basta ao PNBC, Produto Nacional Bruto da Corrupção. Um livro que vale a pena "TRABALHISTA! E AGORA"? Onde as Empresas Erram. Eis um grande livro para a compreensão do sistema de trabalho e a Justiça do Trabalho no país. O autor é o juiz Marlos Augusto Melek. Um perfil arrojado, que explica, de maneira didática, as distorções na área do mercado. E sem juridiquês. Já está na 3ª edição. Mané Mané era aquele esforçado sujeito que, obcecado pela ideia de escapar do fundo do poço, onde caiu, tornou-se insensível a qualquer ajuda externa. Uma pessoa ouviu um barulho, aproximou-se do poço, jogou uma corda e gritou: "Pegue a corda e saia." Irritado, o bronco respondeu: "Não vê que estou trabalhando? Não quero sua ajuda." Leitor, tem algum Mané ao seu redor? PT vai às ruas por Lula O PT promete grandes mobilizações de rua caso Lula seja condenado pelo juiz Sérgio Moro. O partido admite que políticos de todos os partidos sejam condenados e até presos. Luiz Inácio, porém, é diferente. Não pode ser condenado e jamais preso. O petismo quer convencer o mundo de que não tem nada a ver com a bandalheira que corrói a pátria. Mais delações à vista? Há quem esteja vendo mais delações ali na frente: Lúcio Funaro, Eduardo Cunha e Rodrigo Rocha Loures. O que diriam? Colocariam mais lenha na fogueira? A questão que alimenta tensões entre procuradores e advogados é: e as provas? Pode-se condenar alguém porque foi delatada por outro? Os advogados exigem provas. O verbo de uns e outros é farto. Os juízes é que vão decidir a parada. Credenda e Miranda A política é o estuário das expectativas e demandas sociais. Duas referências animam seus eixos: os "credenda", coisas a serem acreditadas, a partir do sistema legal, e os "miranda", coisas a serem admiradas, a partir dos símbolos. Daí a inescapável pergunta: o que há para crer na política brasileira e o que há para admirar? Aos ouvidos chega o eco: nada. As razões para tanto se abrigam em campos múltiplos, mas a origem dos males recentes é a consolidação do PNBC (Produto Nacional Bruto da Corrupção), cuja raiz quadrada se extrai dos números que a esfera privada subtrai da res publica. Proposta do Sescon O Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis e das Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas no Estado de São Paulo faz interessante proposta na área da reforma trabalhista. Prega que sindicatos, federações e confederações das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais e as centrais sindicais deverão prestar contas, quando solicitadas, ao Tribunal de Contas da União, sobre a aplicação dos recursos provenientes das contribuições de interesse das categorias profissionais ou econômicas, de que trata o art. 149 da Constituição Federal, e de outros recursos públicos que porventura venham a receber. Os recursos O Sescon explica: recursos provenientes de que trata o caput são aqueles advindos das receitas geradas pelos recolhimentos das contribuições sindicais, estabelecidos na forma da lei e que deverão ser aplicadas integralmente nas finalidades estatutárias. E arremata: "Não se aplica à eventual exigência mencionada no caput aos recursos e demais receitas e despesas previstas no Estatuto e não oriundos das Contribuições Sindicais". O ranking do Planalto Protagonistas que poderão (poderão, não deverão) frequentar a planilha eleitoral de 2018: Geraldo Alckmin, João Dória, Luis Inácio, Marina Silva, Jair Bolsonaro, Ciro Gomes, Joaquim Barbosa, Josué Gomes da Silva (empresário, filho do ex-presidente da República, José Alencar), Nelson Jobim, Álvaro Dias, Ronaldo Caiado, Rodrigo Maia, Jarbas Vasconcelos. A galeria tende a ser mais extensa. O gaguinho Em 1976, o candidato da Arena a prefeito de Palmares renunciou. O governador de Pernambuco na época, Moura Cavalcanti, correu lá e pesquisou: "Quem é mais popular na cidade?" Resposta: "O gaguinho. Não fala nada". Foi forçado a assumir a candidatura. Subiu no palanque, endeusado pela oração do governador: "Prefeito não precisa falar. Precisa agir". A multidão, comovida, aplaudia o gaguinho, que apenas gesticulava com o V da vitória. Sem um dizer um A, ganhou. Os gaguinhos não têm mais vez no território eleitoral. Nossa democracia, de claudicante, está melhorando. Tornando-se mais participante.
quarta-feira, 28 de junho de 2017

Porandubas nº 536

Abro a coluna com um "causo" das bandas do Rio Grande. Colcha de retalhos Um grande comício realizava-se na praça Montevidéu, defronte à prefeitura de Porto Alegre. No início, o entusiasmo era enorme; porém, na medida em que os oradores iam se sucedendo, o público começou a demonstrar sinais de cansaço. Aparentemente, nada mais motivava os presentes. Um dos oradores preliminares, em voz comovida, resolveu queimar o último cartucho: - ... porque somos todos filhos de Getúlio Vargas! Ouviu-se então a voz clara de um gozador: - Ih, pronto, já nos chamou de filhos da p... (Anedotário da Rua da Praia 1, Renato Maciel de Sá Junior) Quem vigia? Uma questão central que instiga a teoria do Estado desde os tempos de Platão: "quem vigia o vigilante"? Longe do espelho: 30% O Instituto Datafolha é um dos mais qualificados e prestigiados do mercado. Até porque, pertencente a um grupo jornalístico, sofre menos a crítica que recai sobre outros. O Datafolha acaba de fazer mais uma pesquisa sobre o pleito de 2018. Convenhamos: uma pesquisa a um ano e mais de 3 meses das eleições é um exercício forçado de projeção. O país atravessa o ciclo político mais conturbado de sua contemporaneidade. Na pesquisa, Lula chega a alcançar 30% dos votos. Ora, é mais provável, hoje, que ele não seja candidato. A imagem do PT está no fundo do poço. Por que índice tão elevado? Será que sustentaria esse índice quando o espelho estiver a um palmo da cara? Hipóteses Algumas hipóteses podem explicar o fenômeno Lula: 1.Trata-se do perfil mais carismático da esfera política; 2. Apesar dos processos que ganhou na primeira instância, é bafejado pelo caudal noticioso que recai sobre a figura do presidente da República e do senador Aécio Neves; o tom crítico sobre ele é bem menor do que o bombardeio sofrido por Temer; 3. O PT, nos últimos tempos, elevou sua avaliação positiva, mesmo tendo sido o partido responsável pela catástrofe econômica em que se encontrava o país até pouco tempo (incrível, porém verdadeiro); 4. As margens sociais ainda consideram Luiz Inácio o político que mais as amparou; 5. As classes médias não entraram em cena jogando a pedra no meio do lago; 6. Com a imagem corroída da classe política - todos nivelados ao rés-do-chão - Lula se eleva no balão da visibilidade. Difícil de acreditar É difícil de acreditar na situação: os 13 anos do petismo-lulismo-dilmismo são considerados o ciclo da mais profunda recessão econômica que já ocorreu no país. Por conseguinte, o PT deveria se queimar no fogo na indignação social. Parcela de sua antiga cúpula foi ou está sendo condenada. O próprio Lula, com 6 processos, poderá engrossar a lista. E quem ganha no painel da avaliação para 2018? Ele mesmo, Lula. Pode ser que, mais adiante, a pedra jogada no meio da lagoa pelas classes médias faça marolas e estas cheguem às margens. E a avaliação negativa de Lula acabe desfazendo o mito. O fato é que a inversão de valores dá o tom nesse momento conturbado. Rejeição: 60% Outro ponto a destacar é a alta rejeição que Luiz Inácio recebe: 45% na média nacional, mas ultrapassando os 50% no Sudeste, que agrega 55% do eleitorado brasileiro. Se no Nordeste, conforme apura o Instituto Paraná Pesquisa, de Murilo Hidalgo, alcança 45% (média em algumas capitais), sua rejeição no Sudeste poderá inviabilizá-lo em eventual segundo turno. Claro, se vier a ser candidato. Essa chance é de 30 pontos numa régua de 0 a 100. Em suma, pesquisas nesse momento não devem gerar tanto impacto como o que alguns analistas e jornais querem fazer acreditar. Conflito aberto O presidente do PT do Rio, Washington Quaquá, prega conflito aberto nas ruas, caso Lula seja preso. E assim caminha o Brasil. Todos podem ser presos, menos o ex-presidente. O próprio Lula afirma: "se eu for condenado, não vale a pena ser honesto". Eita, Brasil... Edição, degravação, deturpação Duas centenas de paralisações. É o que constata o Instituto de Criminalística da PF sobre a gravação da conversa entre Joesley Batista e o presidente da República. Mas não houve adulteração, garante o Instituto. Outra perícia encomendada pela Folha de S. Paulo ao Instituto Brasileiro de Peritos confirma as interrupções. A conversa truncada é atribuída ao equipamento. Resumo, falta parte da interlocução. E o gravador foi ao exterior. Teve de ser recambiado. Vamos ver como esse material receberá a interpretação da Justiça. Discurso duro O presidente Michel Temer fez ontem um duro discurso contra as ações do PGR Rodrigo Janot. Referiu-se por diversas vezes à ilação feita pelo procurador sobre o destino da mala de dinheiro recebida pelo ex-deputado Rodrigo Loures. E respondeu com a ilação de que o procurador que auxiliava Janot saiu, deixando a Procuradoria para trabalhar no grupo JBS. Teria ali ganhado milhões e ... quem sabe ... esses recursos poderiam ter sido repartidos com outra pessoa (???). A peroração mostrou um presidente disposto a enfrentar a briga para "honrar a presidência e o homem Michel Temer". Gilmar abre a fala O ministro Gilmar Mendes, do STF, foi duro em entrevista ao jornalista Kennedy Alencar, do SBT. Disse que se for comprovada "ação controlada" entre MP e Joesley para a gravação de conversa com presidente da República, isso poderia levar à anulação da denúncia. O ministro fez ataques aos procuradores Federais. "Vejo com muita desconfiança os vazamentos que se fazem, as manifestações quase que religiosas de alguns tipos do MP, dizendo que não se pode criticar a Lava Jato, que não se pode aprovar uma lei de abuso de autoridade, que não se pode rediscutir o modelo de delação. Isso é extremamente perigoso. Os juízes passaram a ecoar [as acusações do MPF], passaram a ser caixa de ressonância do Ministério Público. Ora, o relator no Supremo não é sócio do MPF, nem pode ser boca de ventríloquo". O embate no STF deve ser acirrado. Escondendo o PT Outra questão que teima continuar sobre a mesa de grandes suspeitas: se o Joesley ganhou do governo do PT, comandado por Lula, bilhões do BNDES para fazer crescer seu grupo, se sua amizade com o ex-presidente era muito intensa, por que tanta sombra sobre ela? Mistérios rondam esse enredo. Há coisas não esclarecidas. E a mídia não tem dado muita trela ao fato. Insondáveis segredos. A propósito, o repórter Rubem Valente, da Folha, mostra a contradição entre a delação de Joesley Batista e a entrevista concedida à revista Época, dia 18 de junho passado. ("Entrevista contradiz depoimento de Joesley sobre contato com Temer" - clique aqui). Não há outro caminho A reforma política emerge com força. Será o único caminho para termos, em 2018, um pleito mais asséptico. O distritão ganha força: serão eleitos os mais votados nos Estados. Urge correr. Para que as novas disposições sejam aprovadas até início de outubro. Um ano antes do pleito. Janela sobre as paredes Escrito em um muro de Montevidéu: As virgens têm muitos Natais, mas nenhuma Noite Boa. Em Buenos Aires: Estou com ome. Já comi o f. Também em Buenos Aires: Ressuscitaremos, ainda que isso nos custe a vida! Em Quito: Quando tínhamos todas as respostas, mudaram as perguntas. No México: Salário mínimo para o presidente, para ver o que ele sente. Em Lima: Não queremos sobreviver. Queremos viver. Em Havana: Tudo é dançável. No Rio de Janeiro: Quem tem medo de viver não nasce. (As palavras andantes - Eduardo Galeano) Recorrentes perguntas Se Michel Temer deixar o governo, que nome teria condições de sucedê-lo? Rodrigo Maia alega que não quer, pois eventual mandato-tampão na presidência inviabilizaria sua candidatura em 2018. Estamos vendo e ouvindo uma barulheira na Torre de Babel. Cada grupo tem seu nome. Não há favoritos. Intensa polêmica acirra ânimos. Outra: eleição direta interessaria a quem? Ao PT de Lula e a Bolsonaro. E seria necessária mudança constitucional. Um parto de urgência. Haveria condição técnica de se fazer eleição direta em curto prazo? E esta? FHC prega antecipação de eleições. A quem interessa esse jogo? Ele tenciona voltar? Ou será que mudou de posição ao ver que a "pinguela" rachou e não permite a "passagem" do Rubicão? A moldura de forças Voltemos ao pleito de 2018. Não há favoritos. Não existe possibilidade de se eleger um perfil com origem nos extremos, seja da extrema-direita ou da extrema-esquerda. A competição poderá até ter cinco a seis candidatos. Mas a disputa será mesmo entre um perfil de centro (com certa inserção no centro-direita e no centro-esquerda) e um perfil mais à esquerda. Partidos e grupos da esquerda tentarão viabilizar sua candidatura. E o centrão tende a fechar posição com um perfil que consiga sair limpo da lama, ser capaz de aglutinar forças de partidos grandes e médios e, sobretudo, que seja bem visto pelo eleitorado das regiões mais populosas. Camões Causídico de fama no princípio do século, Pereira da Cunha notabilizou-se pela palavra apaixonada e eloquente. Quando Júlio de Castilhos morreu, em Porto Alegre, em 24 de outubro de 1903, vários discursaram na hora do enterro. No momento em que o caixão descia à sepultura, Pereira da Cunha destacou-se do grupo e exclamou: - Se houvesse um processo de cristalização da lágrima, o teu ataúde, Júlio, por certo não seria de madeira, nem o teu túmulo de granito! (Do Anedotário da Rua da Praia 1, Renato Maciel de Sá Junior) Crise espera por desfecho O repeteco denunciativo diário está saturando a audiência. A sociedade clama por um desfecho. O Poder Judiciário precisa correr com suas decisões. A sensação geral é a de copo transbordando. Todos os dias, abre-se a cantilena de denúncias, recheadas de versões, meias verdades e até verdades. Mas o bolo começa a gerar indigestão. Parlamentarismo branco A crise mexe com o sistema de governo. O nosso presidencialismo, de cunho absolutista, forte, ancorado no poder da caneta, reparte força com o corpo parlamentar. Inaugura-se um parlamentarismo branco, não de direito, mas de fato. O Executivo, para comandar o processo reformista que vem liderando, convida o Parlamento a dividir responsabilidades e decisões. É razoável que, passada a crise, chegaremos a implantar uma forma mitigada de parlamentarismo. Quem sabe? Menor ímpeto para Justiça do Trabalho A reforma trabalhista insere o Brasil no patamar do século XXI. Novas modalidades de trabalho são estatuídas formalmente. O país avança na trilha da modernização. Diminuirá sensivelmente a informalidade. E a Justiça do Trabalho agirá com menos ímpeto, deixando de ser também um poder legislador. Será possível alterar essa triste realidade: temos no país 73,9 milhões de processos - 1 para cada brasileiro adulto; 4 milhões de novas ações trabalhistas foram abertas no ano passado; 11 mil novas ações trabalhistas surgem por dia. Sob uma fila de 14 milhões de desempregados. Para onde Ronaldo olha? Há dúvidas e suspeitas sobre o posicionamento do ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira. Afinal, ele é contra o projeto de reforma trabalhista? Os setores produtivos falam que há certa empatia/simpatia pairando sobre as cabeças de Paulinho da Força e o ministro. Há um temor que ele, Ronaldo, esteja trabalhando para o governo editar uma MP agregando as teses de Paulinho. Portanto, pode ser que tenhamos de vê-los puxando o cabo de guerra para trás. Inconstitucional? Essa é inacreditável. O PGR, Rodrigo Janot, entrou no STF com um recurso arguindo a inconstitucionalidade da Lei da Terceirização. Que coisa insana. O procurador investe contra a prerrogativa do Parlamento de fazer leis? Só faltava essa: a Procuradoria querendo proibir as funções dos Poderes. Belisco-me para ver se estou acordado. Estou! Deu a louca no Planalto Central. Onde vamos parar? Fecho a coluna com mais um "causo" de outro Rio Grande, o do Norte. O candidato retardado Palanque armado no bairro Pereiros. O comerciante "Chico do Peixe" chega com considerável atraso, ávido por discursar na condição de candidato a vereador em 1996, no município de Mossoró. Favorecido pela escassez de oradores no comício do candidato governista, engenheiro Valtércio Silveira, apoiado pelo prefeito Dix-huit Rosado, Chico é alertado de que também terá direito a discursar. Ufa! Ele já pensava que não teria vez. Abrindo a oratória, Chico do Peixe tenta justificar sua ausência até então, mas mistura semântica com psiquiatria: - Olha, meus amigos, eu estou chegando "retardado"... (Só rindo 2: A política do bom humor do palanque aos bastidores, de Carlos Santos)
quarta-feira, 21 de junho de 2017

Porandubas nº 535

"Seu Lunga" foi personagem constante de nossa coluna em seus primórdios. Hoje, ressuscito essa interessante figura, o rei da ignorância, nos termos do poeta popular Luiz Alves da Silva, em seu folheto de literatura de cordel: "Seu Lunga chegou em casaCom um leite que comprouTinha dez litros no baldeA mulher lhe perguntou:- Ó Lunga, é pra cozinhar?Com isso ele se irritou- Mulher, esse leite eu trouxePra tomar banho com elePegou o balde e depressaDerramou por cima delePassou o dia todinhoCom moscas pousando nele. Um dia Seu Lunga foiFazer compras lá na feiraViu uma galinha gordaDa chamada capoeiraComprou e deu à mulherQue lhe falou prazenteira:- Ó Lunga, é pra matar?Seu Lunga de raiva esturra:-Não mate a bichinha, nãoApenas lhe dê uma surra.Que você ou a galinhaVeio ao mundo pra ser burra". O cenário Vamos à análise política. 1ª derrota: reforma trabalhista O governo tomou um susto com a derrota por 10 a 9 da reforma trabalhista na Comissão de Assuntos Sociais (CAS) do Senado. Estava muito confiante a ponto de não ter feito monitoramento da votação. Conversa de bastidor dá conta de participação do líder do PMDB no Senado, senador Renan Calheiros, que teria trabalhado para derrotar o governo. Renan tem agido como gangorra: sobe e desce, elogia e ataca o governo. Essa derrota pode ser a gota d'água nas relações entre o Palácio do Planalto e o parlamentar alagoano. CCJ e plenário A reforma trabalhista deverá seguir normalmente para a CCJ, que apreciará questões legais e constitucionais do projeto, e após a votação irá ao Plenário. O governo, por meio de seus interlocutores, expressa otimismo, dizendo que a reforma na legislação trabalhista passará positivamente pela CCJ, devendo também ser vitoriosa no plenário do Senado. A conferir. Termômetro da crise Depois de atingir o estado febril de 42º C, a crise aliviou sua intensidade, nos últimos dias, chegando aos 40º. A febre ainda é alta, mas não a ponto de deixar em coma o corpo governamental. A entrevista de Joesley Batista à revista Época está sendo considerada bumerangue, ou seja, voltando-se contra o entrevistado. Sem fatos novos, o homem das carnes caprichou nos adjetivos. E a capa escandalosa de Época permitiu que os leitores chegassem à essa análise: "como um sujeito que confessa uma infinidade de crimes e ter colocado no saco de seus recursos quase dois mil políticos se apresenta-se como inocente, ganhando benesses do procurador-Geral da República?" Exageros jornalísticos É evidente que é de interesse da mídia obter entrevistas exclusivas, principalmente quando se trata de personagens polêmicas que estão no foco dos principais assuntos nacionais. Mas todo cuidado deve ser tomado para evitar excessos. Dizer que o presidente é o quadrilheiro mais perigoso do país é dizer que qualquer grande criminoso já condenado e preso é menos pernicioso. Adjetivação exagerada e superlativos não podem ser usados e abusados pela mídia. Onde estão os limites? Esse tipo jornalismo pode alargar a temporada de irresponsabilidades: acusações baseadas em suposições, frenético jogo acusatório, uso da mídia como arma de combate, etc. Chico Heráclio Chico Heráclio (1885-1974), o poderoso dono do poder nas plagas de Limoeiro/PE, sabia como ninguém interpretar o ânimo dos eleitores. Dominava o voto de cabresto no agreste pernambucano e vizinhanças. Mas não conseguia encher as urnas na capital. Indagado sobre o motivo, a raposa política saiu-se com esta: "o eleitor do Recife é muito a favor do contra". Pois bem, a máxima do último dos coronéis, como era designado, serve para explicar a disposição do eleitorado brasileiro das grandes cidades, no ciclo eleitoral em curso, que deixa ver um cidadão "muito a favor do voto contrário". O rol de qualificações deste eleitor é extenso: indignado, revoltado, saturado, descrente, desesperançoso, cansado. Esse deverá ser o perfil do eleitor em 2018. Kramer alerta Paulo Kramer, o preparado cientista político, faz um alerta a partir de Brasília. Diz ele: "os analistas políticos e econômicos entraram em pânico, provocando um início de incêndio no mercado e na bolsa. Acho que é cedo demais para 'cantar derrota'". Kramer tem razão. Até porque o plenário do Senado, que é soberano, pode vir a aprovar a reforma trabalhista. Em minha régua, a chance de 0 a 10 é de 9. Altos e baixos O fato é que a imagem de um disputado jogo de basquete cai bem na moldura institucional. As oposições ao governo - a partir de protagonistas do MP, PF e Poder Judiciário - fazem cestas, passando à ofensiva, liderando o placar; aí o presidente Michel Temer, de maneira surpreendente, consegue reagir ao jogo, corre em campo e ultrapassa o escore dos adversários. Conta com bons jogadores na esfera parlamentar. Os opositores se valem do bombardeio midiático, liderado pelo grupo de comunicação mais poderoso do país. Avançam. O placar, hoje, situa o presidente com alguns pontos à frente. A derrota da reforma trabalhista na CAS anima os grupos oposicionistas. Mas há ainda muito jogo pela frente. Altos e baixos permeiam a dinâmica das estratégias. Posição do sistema Globo O sistema Globo - Tvs e jornal - tomou posição contra o presidente Michel Temer. A decisão foi estampada em editorial do jornal. E quando uma posição dessa importância ocorre - e de maneira escancarada - o grupo certamente quer fazer valer seu ponto de vista. Daí o bombardeio sobre a figura presidencial. Inferência: o grupo esperava pela renúncia de Michel Temer desde a primeira estocada. Como não ocorreu, a Globo teria decidido intensificar a artilharia. A estratégia para derrubar o presidente acabou na boca de núcleos, como formadores de opinião, profissionais liberais, redes sociais. Um libelo acusatório contra o sistema Globo emerge, ensejando estupor, indignação e protestos. Homologação Hoje, quarta, o STF deverá decidir sobre a validade da delação da JBS. Tudo indica que aprovará a homologação feita pelo ministro Edson Fachin. Afinal uma decisão em contrário deixaria o ministro em maus lençóis. O Supremo julgará recurso do governador de Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja (PSDB), que questiona competência de Fachin para relatar o caso JBS, pois esta investigação não se relacionaria com o caso Petrobras (Lava Jato). Elos e imbricações Os elos se formam: a fortaleza do governo depende da esfera política, a qual, por sua vez, está de olho na recuperação da economia. Os dados positivos da economia e a perspectiva de crescimento do PIB são as vitaminas que animam a classe política e, por conseguinte, integram a base de sustentação do governo. Essa é abordagem exógena. Mas há imbricações internas, endógenas, que funcionam como ameaça ou apoio. Por exemplo: as divisões que existem no interior das bancadas governistas - a partir do PSDB - também funcionam como termômetro da crise. Os "cabeças pretas" do tucanato (os mais jovens) querem deixar o governo; os "cabeças brancas" (os mais velhos) acenam com a permanência. Colar todos esses cacos do vaso governamental tem sido tarefa hercúlea do presidente. Denúncia do Janot Janot deve entrar na próxima semana com mais uma denúncia contra o presidente Michel Temer. E pedirá ao STF investigação para apurar os fatos que deverão ancorar a denúncia. Mas o presidente só pode ser investigado por autorização da Câmara Federal e pelo quorum de 2/3 dos votos: 308. Rodrigo Janot quer ter seu nome na história como o homem que derrubou Michel Temer. Se não houver fato novo, não conseguirá o intento. Coisas encobertas Há muita coisa a ser esclarecida sobre fatos e versões que correm na farta mesa das grandes interrogações: afinal, o ministro Edson Fachin encontrou-se ou não com Joesley Batista em jantar que teria se prolongado pela madrugada? O senador Renan esteve ou não nesse jantar? Por que Rodrigo Janot tem tantos desafetos na PGR e qual é seu desempenho no processo de sua sucessão? Os diálogos gravados entre procuradores o comprometem ou não? Por que Fachin avocou a si a relatoria do caso JBS, ante a versão de que teria sido ajudado pelo grupo em sua campanha para se tornar ministro do Supremo? Caixa dois É muito provável que os casos de políticos implicados no caixa 2 de campanha eleitoral sejam suspensos. O próprio procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, patrocina esta tese. Centenas de políticos, portanto, se veriam livres de processos nessa esfera. Lição de Maquiavel Lafaiete Coutinho, ex-presidente do BB, envia oportuno lembrete: "Para Maquiavel, a empreitada de impor grandes inovações é tão arriscada para os governantes que se eles dependerem da persuasão - não usando a força - fracassarão sempre sem conseguir coisa alguma. As reformas estruturais e a implantação de uma economia de mercado que Collor procurou realizar o tornaram bastante vulnerável. Como ensinava Maquiavel, ele empregou contra si as forças que se beneficiavam da situação anterior e o ceticismo dos que seriam beneficiados por sua reforma, que somente iriam aderir com o sucesso a ser obtido ao final". Fecho a coluna com causos contados por Saulo Pessanha, em seu Anedotário Político. Quatrocentão O paulista Toledo Piza estava lançando uma expressão que se tornaria famosa quando, com empáfia, disse: - Considero-me um paulista quatrocentão e um brasileiro autêntico, pois meus ancestrais, que aqui chegaram em 1.500, construíram São Paulo. Osvaldo Aranha retrucou em cima: - Pois os meus ancestrais, quando os seus chegaram, perguntaram: o que é que esses estrangeiros vieram fazer aqui? Propaganda Falava com um grupo de diplomatas argentinos, quando um deles lhe perguntou por que os brasileiros tinham fama, na Argentina, de gostar de homem, dando preferência aos parceiros do que às próprias mulheres. Osvaldo Aranha respondeu na lata: - Isso é apenas propaganda nossa, para incentivar o turismo que vem do Rio da Prata...
quarta-feira, 14 de junho de 2017

Porandubas nº 534

Abro a coluna com duas historinhas da região de Campos, Rio de Janeiro, da lavra de Saulo Pessanha. Mãos limpas O comício de Rockfeller de Lima era um dos últimos da campanha de 1970, e foi realizado ao lado da Catedral Diocesana, no final da tarde, para aproveitar a saída das pessoas do comércio. O candidato da Arena dava um tom de moralidade à sua fala. - A prefeitura de Campos precisa de um político de mãos limpas e eu sou um político de mãos limpas! Na plateia, alguém gritou: - Você tem mãos limpas porque não mexe com graxa, como eu... Minuto de silêncio Comício do deputado Paulo Feijó, em São Fidélis, nas eleições de 1998. O prefeito Benedito Passarinho pede um minuto de silencio pelo falecimento de uma diretora da sociedade Pestalozzi. Todos se calam. Segundos depois, para espanto geral, Passarinho retoma a palavra. - Vamos ao comício, minha gente! Um minuto de silêncio para políticos em campanha não pode durar mais que cinco segundos... A política como ela é Na política, quase tudo é possível. O quase fica por conta da tese de que a única coisa que um político não faz é lutar contra si mesmo, é suicidar-se. Mesmo essa situação está sujeita a discordâncias. O fato é que, no geral, os protagonistas da política almejam o poder. E fazem tudo (ou quase tudo) para alcançá-lo. Vejam a contradição que flagra os tucanos. O PSDB, anteontem, decidiu permanecer no governo. Mas o presidente interino do partido analisa com o deputado Carlos Sampaio/SP como o partido deve fazer para recorrer da decisão do TSE que decidiu por 4 a 3 pela permanência do presidente Michel Temer na cadeira do Palácio do Planalto. Não é mesmo um contrassenso? O enrosco I O caso é desconfortável. Recordemos. O PSDB recorreu ao TSE sob a alegação de que teria havido abuso econômico por parte da chapa Dilma-Temer em 2014. O TSE absolveu a chapa. Mas o partido, depois de votar pela permanência de seus filiados na base governista, promete recorrer da sentença do TSE. Em suma, o partido quer assoviar e chupar cana ao mesmo tempo. Um exercício complicado. O enrosco II Tasso explica: "É uma incoerência nossa, mas uma incoerência que a História nos colocou. Esse não é o meu governo. Não é o governo dos meus sonhos, não votei em Dilma nem em Temer, mas estamos aí por causa das circunstâncias, mas não vamos fazer nada que rasgue um pedacinho da Constituição... Minha opinião é que tem que recorrer. Continuamos no governo Temer, mas sem renunciar a nossas convicções, que houve corrupção na campanha da chapa". Essa vela a Deus e outra ao diabo é um exercício de prestidigitação. WhatsApp no cordel E até uma velhinhaMais pra lá do que pra cáDisse que é muito nova Ainda não tá gagáE namora pelo WhatsAppE nem canseira lhe dá. Uma noiva tão bonitaNa hora de ser casadaNa hora de dizer o "SIM"Ficou muito perturbadaPorque o WhatsApp tocouFoi atender a chamada. Decisão do TSE I Há uma onda expressiva contra a decisão do TSE. Não se leva em conta no furor que parte de alguns setores - particularmente dos atiradores da oposição - a natureza daquele Tribunal. Trata-se de um colegiado que deve analisar os pleitos eleitorais e não um tribunal penal. À propósito, pinço essas observações de César Maia, arguto observador da cena política. Decisão do TSE II Diz o ex-prefeito do Rio: "Num momento, o relator do caso, ministro Herman Benjamin, reconhece que "o bem jurídico que tutela essas ações (eleitorais) é a legitimidade e a normalidade do processo eleitoral, cuja lisura é elemento indispensável à concretização do valor democrático no regime político brasileiro. (...) Ninguém sai preso daqui, nem com condenação penal". Depois, no entanto, sem qualquer constrangimento, o relator discorre sobre os fatos da ação como se estivesse num tribunal penal e o seu papel fosse condenar criminalmente os réus. A função do TSE é zelar pela lisura do processo eleitoral, avaliando se houve cumprimento do livre exercício do direito de votar e ser votado". Decisão do TSE III E arremata: "Atuar fora da esfera eleitoral é abusivo, já que extrapolaria os limites de competência da Corte. A rigor, passaria a ser um tribunal de exceção. Por isso, ainda que se faça um bonito discurso sobre a importância de a Justiça não ser conivente com a impunidade, a tentativa de levar o TSE para um julgamento além da esfera eleitoral desrespeita o Estado Democrático de Direito e a Constituição". Nordeste violento A escalada de violência aflige as populações, principalmente a nordestina. A região abriga as cidades mais violentas do país. Dos 150 municípios com as maiores taxas de homicídio por arma de fogo no Brasil, 107 (pasmem!) ficam no Nordeste, registrando-se, ainda, que no ranking das capitais, as seis primeiras mais violentas estão na região. Bolsonaro, a aspiração Seguramente este é um dos fatores que contribui para o fortalecimento do nome do deputado carioca Jair Bolsonaro na mente das comunidades. Bolsonaro é a extensão do território da direita conservadora, com suas posições clássicas: bandido bom é bandido morto; a sociedade tem direito ao uso de armas para se defender, etc. Pois bem, semana passada, Bolsonaro foi ovacionado em Natal, Rio Grande do Norte. Uma multidão o aguardava no aeroporto. Mudou-se três vezes a sede para sua palestra por excesso de participantes. "Eu sou ladrão" Nessa esteira de combate à violência com mais violência registra-se o caso do garoto acusado de roubar uma bicicleta de um deficiente físico em São Bernardo do Campo. Tatuaram em sua testa a frase: "eu sou ladrão e vacilão". O pior é que a tatuagem bombou nas redes sociais, recebendo aplausos de muita gente e abrindo intensa polêmica. De um lado, os que condenam a ação dos tatuadores, com o argumento de que impede a ressocialização do garoto (menor). De outro, em face da descrença na segurança pública, estão aqueles que querem fazer Justiça com as próprias mãos. Fora da lista negra O Brasil ficou de fora da lista negra da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que reúne 25 países suspeitos de infringir normas internacionais de proteção ao trabalhador, divulgada no início de junho. Pouco tempo antes da publicação da lista, o deputado Federal Rogério Marinho (PSDB-RN) foi convidado pela chancelaria brasileira da OIT a visitar a sede, em Genebra. Motivo? Como relator da reforma trabalhista, Marinho esclareceu a proposta de modernização em curso no Senado e garantiu que "nenhum direito conquistado pelo trabalhador está em risco". Centrais sindicais, Ministério Público do Trabalho e a Anamatra acusaram o Brasil de quebrar acordo internacional na OIT. Marinho desfez o "equívoco". Reforma trabalhista Passará pelas Comissões de Assuntos Sociais e de Constituição e Justiça. A seguir, irá à Plenário. Na visão deste consultor, será aprovada. Quanto a eventuais vetos, sugeridos pelo relator da matéria no Senado, senador Ricardo Ferraço, serão analisados pela Casa Civil, mas com o termômetro ligado na temperatura da Câmara. Um ponto polêmico diz respeito à manutenção da contribuição sindical compulsória. Pode haver consenso na direção de manutenção provisória, estabelecendo-se um prazo (3 a 5 anos) para ser extinta. A estratégia de Janot Rodrigo Janot quer deixar seu nome na história como o procurador que afastou o presidente da República de seu cargo. É o que se deduz de sua insistência em bombardear o dirigente maior da República. Ele sairá em setembro e luta contra o relógio para dar mais um bote: denunciar o presidente no STF pedindo investigação sobre ele. O Supremo, por sua vez, fará solicitação à Câmara. Onde o governo conta com maioria para evitar a investigação. Por que tanto açodamento por parte de Janot? Vanitas vanitatum, omnia vanitas, diziam os antigos. (Vaidade das vaidades, tudo é vaidade). Tuba de ressonância Este analista de política continua perplexo com o bombardeio midiático com mira sobre a figura do presidente da República. Jornalistas não devem vestir a toga de juízes. Concessões do Estado, como emissoras de rádio e TV, deveriam se pautar pela imparcialidade. Procuradores deveriam evitar o açodamento. Juízes não podem judicializar a política. Os Poderes precisam se inspirar nos conceitos que servem de lume à tríade de Poder, arquitetada pelo barão de Montesquieu: Independência, Autonomia e Harmonia. Reforma política Pelo menos dois instrumentos precisam ser submetidos à decisão do Congresso antes de outubro próximo: a cláusula de barreira e a proibição de coligações proporcionais. Não podemos continuar a manter partidos sem votos e um sistema de votação em que o eleitor escolhe um candidato e acaba elegendo outro, na esteira dos coeficientes eleitorais obtidos nas coligações. WhatsApp no cordel II Até o primo BelizardoEstá no WhatsApp ligadoDe tanto mandar mensagensE ficar tão viciadoQuando vai botar sapatoColoca no pé trocado. O WhatsApp é poderosoSó quando ele é bem usadoÉ um aliado forteIsso tudo foi provadoNão é para ser "brinquedo"Deixar alguém viciado. Fechando a coluna com historinha de japonês: "O jovem pai vai ao pediatra e, bastante aflito, mostra sua criança: - Doutor, meu filho já está com seis meses e não abre os olhos. O médico examinou a criança e virou-se para o pai: - Quem deve abrir os olhos é o senhor, meu amigo, pois esse é filho de japonês.
quarta-feira, 7 de junho de 2017

Porandubas nº 533

Abro a coluna com muita preocupação com o amanhã. A propósito, uma historinha que cai bem. Perspectivas e características Quais as perspectivas que se apresentam ao Brasil em um contexto de crise? Sairemos da crise logo? As reformas passarão? Confesso que temos na frente um oceano e interrogações. Mas uma historinha do amigo Sebastião Nery sobre as perspectivas pode ajudar a responder: Luís Pereira, pintor de parede, dormiu com 200 votos e acordou como deputado Federal. Era suplente de Francisco Julião, líder das Ligas Camponesas, em Pernambuco, cassado pela ditadura. Disseram a ele: prepare umas palavras bonitas para dizer à imprensa. Escolheu alguns termos que gravou bem na cachola. Chegou a Brasília de roupa nova e coração vibrando de alegria. Murilo Melo Filho, colunista da Revista Manchete, logo no aeroporto, jogou a pergunta abrupta: - Deputado, como vê a situação? Nervoso, surpreso, sem saber o que dizer, tascou as duas que considerou as mais apropriadas para os jornalistas: - As perspectivas são piores do que as características. Pois é, a esta altura, tem muito Luís Pereira perorando por aí... Clima geral O clima é de muita expectativa. O Brasil parece assistir a um espetáculo com finais surpreendentes. Há uma imensa torcida pelo expurgo do presidente da República. Há uma grande parcela que torce para o presidente permanecer em seu assento no Palácio do Planalto. E há uma banda que joga um olho para o norte e o outro para o sul. Formação de bandas A primeira banda é composta particularmente pelas oposições, PT, PSOL e centrais sindicais à frente, e, incrível, por boa fatia da mídia. A segunda banda é composta pelos setores produtivos, razoáveis alas de profissionais liberais e parcela de formadores de opinião. O núcleo que divide o olhar é composto por políticos, muitos a favor do presidente, uma parte já desatrelada da base governista e um terceiro grupo em compasso de espera. Analisemos cada uma. Oposições O PT e outros partidos de oposição querem ver Michel Temer fora do Planalto. Mas carregam imensa preocupação. Seu líder maior, Lula da Silva, complica-se, a cada dia, com denúncias contra ele avolumadas, o que o torna muito próximo da República de Curitiba. A recém-eleita presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann, também está implicada na operação Lava Jato. O afundamento do PT não o qualifica como protagonista da ética e da moral. Os grupos sindicais, por sua vez, se posicionam contra o governo por distinguir nele o rolo compressor das reformas. E, como se sabe, o que as centrais querem mesmo é defender as contribuições compulsórias que abarrotam seus cofres. Mídia As oposições contam com o escancarado apoio de parcela importante da mídia, caracterizada por coberturas enviesadas dos veículos do Grupo Globo: TVs, jornal e seus canais eletrônicos nas redes. Aliás, o viés que se percebe na cobertura da crise por parte dos profissionais - repórteres e analistas da Rede Globo - é o mais forte e intenso que se viu na contemporaneidade, ultrapassando, até, a afamada cobertura enviesada do debate Collor X Lula em 1989. Globo I - viés Recordando os dias de ontem. O ex-chefão da Globo, Boni, chegou a admitir: "Colocamos as pastas todas ali com supostas denúncias contra Lula, mas estavam vazias". Pois bem, a cobertura diária da crise toma longos minutos da TV Globo, com repetições do áudio da conversa que Joesley Batista gravou com o presidente Temer. Os comentaristas da Globo News, principalmente no Jornal das 10, emendam o que disseram na noite anterior. O lengalenga não contém fatos novos. É visível o esforço de um ou outro para buscar um ângulo novo, algo que traduza nova situação. O repeteco tornou-se um caso de linguagem tatibitate. Por que a Globo enviesa o noticiário? Globo II - aposta na saída Lauro Jardim foi quem deu o furo, quando vazou parte do conteúdo da gravação. No dia seguinte, percebeu-se que o jacaré havia se transformado em lagartixa: a ajuda financeira ao ex-deputado Eduardo Cunha para se manter calado não foi a grande nota como o Globo anunciava. Nesse trecho, o gravador de Joesley dizia: "Eu tô de bem com o Eduardo". Ao que o presidente retrucou: "tem que manter isso, viu?". Ora, para manter a ideia inicial, o sistema Globo teria optado por manter a denúncia que assumiu, "comprando" as denúncias feitas pelo PGR. É o que explica o viés continuado do noticiário. O jornal O Globo chegou, até, a produzir um editorial, pregando a saída do presidente, antecipando-se à decisão da Justiça. Aliás, a Folha de S.Paulo também fez um editorial na mesma direção. Globo III - furo, acomodação, repetição O furo continua a ser o alvo da mídia. A notícia dada em primeira mão tem um tremendo impacto. Pois bem, pelo tom global, os últimos 15 dias foram dados como fatais. O presidente não resistiria um minuto a mais. Se continua resistindo e, assim, contrariando o noticiário, o tom do dia seguinte se torna ainda mais agudo. Nas entrelinhas ou entreouvidos, as palavras até poderiam ser essas: "não é possível que esteja resistindo; vou dar mais uma porrada, vamos ver se ele resiste a essa". Por outro lado, é visível a acomodação, a ausência de apuração de dados, o que transforma o oba-oba dos comentaristas em algo insosso, inodoro e incolor. Discurso da mesmice. A fúria Comentaristas de outras emissoras também peroram com muita fúria. Cometem a síndrome do touro: pensam com o coração e arremetem com a cabeça, quando deveriam fazer o contrário. Afinal, a cachola serve ao ser pensante. Onde está a racionalidade, a lógica? Interessante é observar que ninguém quer dar a mão à palmatória. Há semanas, a grande maioria dos analistas dava como certa a derrota de Michel Temer no TSE. Agora que começa o julgamento naquela Corte, os mesmos que tinham tirado a fatura da derrota reconhecem (sem pejo) que o presidente poderá obter vitória naquela Corte. Achismo O fato é que a maior parte dos analistas políticos trabalha à base do "achismo", mescla de vaidades, donos da verdade, excesso de confiança em seus sentimentos. Onde estão os grandes intérpretes da política e dos costumes? Foram embora. Não há mais figuras do porte de um Carlos Castelo Branco ou de um Vilas Boas Correa. O que vemos é um desfile de trôpegos da análise, caolhos da verdade, gagos de densidade expressiva. Loteria Mais parece que analistas e comentaristas (observo que ainda há também sérios e honestos) apostaram na loteria da queda de Michel Temer e querem ganhar de qualquer maneira. Há muita curiosidade para vermos como se comportarão alguns "mestres" da análise política caso o presidente suba a montanha e chegue ao final do governo. O que dirão? Atribuirão o fato à ineficiência do Judiciário? Podemos, por outro lado, adivinhar o que fatalmente dirão se o presidente cair: "bem que eu disse, bem que nós antecipamos, vejam só quanto estávamos certos". Setores produtivos Já os setores produtivos estão alinhados ao governo na defesa das reformas, a partir das já realizadas - teto do gasto, na área da educação, na lei da terceirização - e as reformas trabalhista e previdenciária em curso. A marca do governo Temer é o reformismo. Evidentemente, os sinais de mudanças na estrutura do Estado entusiasmam empreendedores e investidores, que vêem o Brasil sair da maior recessão econômica de todos os tempos e abrir novos horizontes, com queda de juros e rígido controle inflacionário. Profissionais liberais, que têm pensamento de vanguarda, identificam-se com tais posições, enxergando no PT e em seus governantes os culpados pelo buraco do qual procura sair o país. Os políticos Quanto aos políticos, o que precisamos observar é o pragmatismo que os inspira. O fato de usarem os dois olhos para enxergar para onde irá a balança quer dizer que pensam, sobretudo, em sua salvação. Apostam no futuro. Se perceberem que a tendência será a de continuidade na gestão, penderão para o lado do governo. A recíproca é verdadeira. E mais: se atentarem para o fato de que Lula, mesmo encarnando o papel de demônio, terá condições de ser candidato em 2018, abrirão para ele os braços. Claro, há grupos que manterão distância do petismo. Vídeo por demanda Um estudo feito pela Nielsen em 60 países mostra que quase 2/3 dos entrevistados assistem a alguma forma de programação de vídeo on demand (VOD), esse sistema que permite ao usuário selecionar filmes e seriados de forma interativa, uma espécie de locadora virtual. Esse hábito de consumo se expande no mundo. 43% das pessoas entrevistadas dizem fazer isso pelo menos uma vez por dia, enquanto na AL, 24% dos assinantes de TV paga afirmam que planejam cancelar seu serviço a favor de um provedor somente online. Mas poucos realmente cancelam seu serviço. As TVs por assinatura ainda têm seu espaço econômico e função social. Brasil analisa Agora, vejamos as implicações por nossas plagas. Lembremos que a AT&T firmou acordo para adquirir a Time Warner por US$ 85,4 bilhões. O que explica isso? Mudanças que ocorrem na produção e distribuição de conteúdo em todo o mundo. No Brasil, esse processo de fusão está em análise no Brasil pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e também nos Estados Unidos. Já foi aprovado em todos os outros mercados internacionais em que as empresas atuam. Ancine é contra A Agência Nacional do Cinema (Ancine) se posicionou contra o negócio, enquanto a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) espera decisão do Cade sobre a fusão AT&T/TW para analisar questões regulatórias. Se o Cade impedir a fusão, a AT&T precisará tomar a decisão de Sofia: vender a Sky ou abrir mão da operação dos canais do Grupo Time Warner no Brasil. O que será pernicioso para o consumidor, pois isso significa retirá-lo da grade de todas as operadoras de TV por assinatura. A saída para os fãs de HBO, Cartoon Network e CNN, entre outros canais, será recorrer ao conteúdo online. Migração para internet A consequência se dará na migração rápida de assinantes de TV paga para a internet, uma vez que os espectadores continuarão consumindo seus conteúdos preferidos, legal ou ilegalmente. O mercado de TV por assinatura corre risco.
quarta-feira, 31 de maio de 2017

Porandubas nº 532

Abro a coluna com um causo, uma historinha dos tempos de chumbo. D'água! D'água! Newton Coumbre, pernambucano atrevido, passava em frente ao quartel de Obuzes de Olinda, logo depois do golpe de 64, levando uma bomba d'água enrolada em jornal. Dois sentinelas, fuzis em punho, avançaram sobre ele, aos tapas e pontapés: - O que é isso? - D'água! D'água! Mandaram jogar o embrulho no chão e levaram-no até o coronel: - O que é que tem no embrulho? - Uma bomba d'água. - Por que não disse logo e ficou dizendo "d'água"? - Coronel, eu dizendo só "d'água" eles me bateram tanto, se dissesse "bomba" teriam me fuzilado. Posse do João João Almino tomará posse na Academia Brasileira de Letras dia 28 de julho próximo. O mossoroense (Mossoró/RN) é primo deste analista político. João será recebido pela acadêmica Ana Maria Machado. Duas vertentes A análise da crise política ganha dos analistas e cientistas políticos duas vertentes: a vertente legal, ancorada no eixo constitucional. Por essa via, tudo o que vier a ser feito deve seguir o trâmite estabelecido pelo livrinho: a CF. Em caso de vacância da presidência, um grupo defende a realização de eleições diretas, que é um rompimento da Carta. Outros chegam a apontar a manifestação ocorrida no Rio de Janeiro, pífia para traduzir a vontade das massas. A via ilegal Uma eleição direta demanda tempo, muito tempo. E para aprovar uma Proposta de Emenda Constitucional abrindo a possibilidade de eleição direta, o quorum é de 308 votos na Câmara, uma impossibilidade nesse momento. Não há condição de ser dar um jeitinho brasileiro. Mais uma vez, as vivandeiras de ocasião aproveitam para traçar os cenários de mais turbulência. Que a lei seja cumprida Está havendo açodamento. Muito açodamento. Muita gente posando de adivinho. Temos leis, Cortes Superiores que estão investigando e vão tomar decisões sobre as denúncias que agitam a República, temos um Congresso que também está funcionando e muita atenção da sociedade sobre os fatos. Portanto, o bom senso aconselha a aguardar o ritmo e os fluxos dos processos em curso. No TSE, abre-se, dia 6 de junho, o processo de cassação da chapa Dilma-Temer com muita especulação sobre rumos a seguir. STF tende a julgar o acordo Já no STF, a tendência será a de o Pleno receber o caso para decidir, ou seja, o acordo de delação pode sair das mãos do ministro Fachin e chegar ao Plenário. A interpretação do ministro Gilmar Mendes vai nessa linha. Ele diz que o juiz deve homologar o acordo. Juiz, nesse caso, não é uma pessoa, individualmente, mas o corpo da Corte. Essa tese pode vingar e já contaria com o apoio tácito do próprio ministro Edson Fachin. Fachin toparia O ministro Fachin tem sido objeto de críticas por ter se valido da ajuda do lobista e delator Ricardo Saud. Foi este que o levou ao gabinete de alguns senadores, quando teve de fazer esse périplo pedindo votos para sua aprovação para entrar no Supremo. O ministro teria ficado envergonhado, diz-se. E que não sabia das peripécias malandras do grupo JBS. Como Fachin, muitos dirão que também não sabiam das irregularidades cometidas pelo grupo. O fato é que a JBS deu ajuda a quase dois mil políticos. STF desaprova Se o caso for ao Pleno e se este decidir não aprovar o acordo de delação premiada, as coisas voltam à estaca zero. Os irmãos Batista voltariam ao Brasil (Wesley, ao que parece, se encontra no país), seriam presos e passariam a responder a processos. Lembre-se que a CVM acaba de abrir processos contra eles pelo fato de terem se aproveitado do momento para ganhar dinheiro: teriam comprado um bilhão de dólares e vendido cerca de R$ 370 milhões de ações. Usando, assim, o recurso do inside information. Consciência social Ondas concêntricas, saindo do meio do lago, chegam até as margens sociais espraiando a consciência de que os irmãos Batista estariam livres, vivendo uma vida de luxo em Nova Iorque, depois de terem abocanhado bilhões do nosso BNDES. A ressonância que puxou essa onda até os confins acaba ajudando o presidente da República, a quem muitos começam a dizer que foi vítima de uma grande armação. Portanto, houve um crime perpetrado por Joesley, a gravação da maior autoridade do país. A combinação com a PGR e a homologação pelo ministro Fachin não podem excluir ou esquecer o delito ocorrido. Mas as provas continuam Também parece certo que se o STF decidir anular o acordo de delação, as provas não seriam descartadas. Poderia, isso sim, ser descartada a gravação, caso se comprove alguma adulteração da fita com edições, cortes, etc. O fato é que processo recomeçará do zero. Julgamento no TSE As coisas estão interconectadas. Vejamos: o TSE, há um mês, tendia a absolver Michel Temer, aceitando a tese de separação de contas entre a titular e o vice. O parecer é do jurista Ives Gandra Martins. Como se sabe, há precedentes. O ex-governador de Roraima, Ottomar Pinto, foi processado sob a alegação de ter usado caixa dois na campanha, etc. No meio do mandato, faleceu. O processo continuou com o vice José de Anchieta Junior. Este foi inocentado sob o argumento de que não teria tomado conhecimento das contas apresentadas por Ottomar. Anchieta foi empossado e governou até o último dia do mandato. De fora para dentro Os tribunais tomam suas decisões com base na interpretação das leis, na apresentação de provas e testemunhas. Quer dizer: o acervo técnico-jurídico é a bússola que orienta os juízes. Certo? Em termos. Sabemos que a decisão do juiz também leva em consideração inputs de natureza política, uma certa camada externa, que agrega fatores político-ambientais. Expliquemos: a melhoria da economia melhora o ânimo social e a estabilidade política do país tem a ver também com essa questão. Em suma, o Produto Nacional Bruto da Felicidade abre portas, facilita, influencia, comanda, dá o tom. Tese: o julgamento do TSE sobre a chapa Dilma-Temer tem um fio ligado à tomada da opinião pública. Anistia geral? Este consultor não aposta na tese por uns engendrada de anistiar ex-presidentes. Significaria um perdão geral? A manobra não será facilmente digerida. Pouquíssima probabilidade de avançar. Há que se explicar melhor essa linha de defesa. Serraglio recusa Osmar Serraglio recusa assumir o Ministério da Transparência. Mais um imbróglio se forma no entorno do governo. Porque a recusa implica perda de foro privilegiado para o então deputado Rodrigo Loures, suplente de Serraglio. Loures, sem foro, poderá aceitar fazer delação premiada. Teria coisas a dizer? Faria isso? Difíceis respostas. Rodrigo era bem próximo ao presidente. E o episódio da mala é um dos mais contundentes do caso JBS. Serraglio não teria sido consultado sobre a troca do Ministério com Torquato Jardim? Algo não confere. Quem no lugar? É possível que para o lugar de Serraglio, seja convidado o deputado João Arruda. Vamos acompanhar. JBS O Grupo JBS continuará sob bombardeio. Dizem que deve ao BNDES, ao Fundo de Garantia, a Fundos da Previdência, tem pendengas com acionistas minoritários, etc. E vai responder a processos na CVM. Difícil enxergar vida tranquila para seus donos. Unicameral ou bicameral? Se houver vacância do cargo de presidente, a eleição indireta, nos termos da CF, será pela Câmara e Senado, juntos ou separados? A lei é clara: será eleito aquele que tiver a maioria dos congressistas. Não pode ser uma votação separada nas duas casas. Desse modo, a Câmara poderia eleger, por exemplo, Rodrigo Maia, e o Senado, Tasso Jereissati. Um nome contra o outro. Seria o caos. Isso não ocorrerá em nenhuma hipótese. Mas se a Câmara tem 513 deputados e o Senado tem apenas 81 senadores, não seria algo discrepante? Sem dúvida. Mas é o que diz o livrinho, a Constituição. Fecho a coluna com a matreirice mineira Pronomes não têm importância Benedito Valadares chegou a Curvelo/MG para visitar a exposição de gado do município. Na hora do discurso, atrapalhou-se: - Quero dizer aos fazendeiros aqui reunidos que já determinei à Caixa Econômica e aos bancos do Estado a concessão de empréstimos agrícolas a prazos curtos e juros longos. Lá do povo, alguém corrigiu: - É o contrário, governador! Empréstimo a prazo longo e juro curto. - Desde que o dinheiro venha, os pronomes não têm importância.
quarta-feira, 24 de maio de 2017

Porandubas nº 531

Ganhando no verbo Nesses tempos de muito verbo de advogado, procurador e juiz, todos fazendo uma grande discussão sobre protagonistas e verbas, abro a coluna com a seguinte historinha. Cosme de Farias foi um grande advogado dos pobres da Bahia. Enveredou também pela política. Foi vereador e deputado estadual por muito tempo. E usava um bom verbo com sua verve. Vejam a historinha. Um ladrão entrou na igreja do Senhor do Bonfim e roubou as esmolas. Cosme de Farias foi para o júri: - Senhores jurados, não houve crime. Houve foi um milagre. Senhor do Bonfim, que não precisa de dinheiro, é que ficou com pena da miséria dele, com mulher e filhos em casa com fome e lhe deu o dinheiro, dizendo assim: - Meu filho, este dinheiro não é meu. Eu não preciso de dinheiro. Este dinheiro foi o povo que trouxe. É do povo com fome. Pode levar o dinheiro. E ele levou. Que crime ele cometeu? Se houve um criminoso, o criminoso é o Senhor do Bonfim, que distribuiu o dinheiro da igreja. Então vão buscá-lo agora lá e o ponham aqui no banco dos réus. E ainda tem mais. Senhor do Bonfim é Deus, não é? Deus pode tudo. Se ele não quisesse que o acusado levasse o dinheiro, tinha impedido. Se não impediu, é porque deixou. Se deixou, não há crime. Cosme de Farias ganhou no verbo. E o réu foi absolvido por ter surrupiado a verba da paróquia. O papel da imprensa Responsabilidade. Esse é o conceito que deveria inspirar a atuação da imprensa tanto no cotidiano quanto em momentos de alta tensão. É o que não se vê nesse instante de pico de crise. Grupos açodados assumem posicionamentos visivelmente enviesados. Dão como coisa certa e liquidada algo que está sendo apurado. Pegam partes de depoimentos, puxam as abordagens que lhe interessam e editam o texto de forma a conduzir a narrativa pela vereda escolhida, induzindo leitores, ouvintes e telespectadores. Não se espera a palavra final dos julgadores. Vieses Alguns veículos não apuram o fato de que o desvio de uma prova para o exterior - seja um documento, um gravador - , poderá desqualificar uma gravação. Não se medem as consequências de eventos. Tomam a decisão de estabelecer uma comunicação vertical, uníssona, homogênea, a ser seguida por seus núcleos de informação e interpretação. A imprensa brasileira vive também seu pico de crise. Só não vê quem está engajado nas trilhas unilaterais das mídias impressa e eletrônica. Não é à toa que as redes sociais avançam. A propósito, o editorial de ontem, do Estadão, A Responsabilidade da Imprensa é uma lição das mais preciosas nesses nossos tempos turbulentos. Horizontes nublados Quem disser que está vendo horizontes abertos, comete um exagero. Há nuvens plúmbeas no horizonte. Não se consegue distinguir se cairá uma sombra ou se o sol voltará a brilhar no entorno do Palácio do Planalto. Tudo vai depender da decisão do STF sobre a continuidade ou suspensão da investigação do presidente da República, a ser tomada depois de perícia da PF no gravador usado por Joesley Batista. Por isso mesmo, a análise da conjuntura, a que se dedica esta coluna, estará sujeita a erros ou a uma das duas hipóteses. Suspensão A suspensão da investigação propiciará um fluxo de oxigênio nos pulmões do governo. E esse fluxo tem como consequência: a) segurar por um tempo a base governista. Esse tempo, por sua vez, poderá estar condicionado aos passos do cronograma da crise; b) com a suspensão, é razoável supor que o governo deverá incrementar os esforços para levar adiante o programa de reformas, a da previdência na Câmara e a trabalhista no Senado; c) a retomada de fôlego também abrirá espaços para intensa negociação política já visando os horizontes de outubro de 2018. Continuidade Já a continuidade do inquérito aumentará a tensão, com previsível afastamento de parceiros partidários da base governista. Se isso ocorrer, será difícil para o presidente Michel Temer assegurar condições de governabilidade. Feridas Qual seja o desfecho da crise, a ampla e intensa negociação política se estenderá pelos próximos meses, sob um pano de fundo com as seguintes matizes: a) contundente debate interpartidário; b) largas feridas abertas pelas delações da Odebrecht e de Joesley, com foco no PGR, Rodrigo Janot, complexo empresarial dos Batista, Rede Globo e instância judiciária encarregada da Lava Jato. Discurso acirrado O acirramento do discurso político, nos últimos dias, exibe profunda cisão entre alas: 1) mercado/setores produtivos/parcela substantiva do PIB demonstram apoio ao governo, principalmente por vê-lo com garantidor do programa de reformas; 2) núcleos oposicionistas, ancorados por centrais sindicais, PT, PSOL, movimentos de esquerda e algumas entidades, defendem a queda do presidente e escolha de um novo comandante para conduzir o país ao pleito de 2018; 3) forte contingente de classes médias, mais tendente a apoiar o governo e exibindo forte rejeição ao lulismo-petismo, que dá sinais de querer ressuscitar Lula; 4) massas periféricas, principalmente da região Nordeste, que ainda guardam o nome de Lula em seu sistema cognitivo; 5) divisões e rachas em frentes de operadores de Direito, principalmente entre advogados e procuradores. Visões em confronto I Nas frentes do Direito e da Justiça, há profunda divisão de pontos de vista, a saber: a) intensa oposição e crítica ao posicionamento do PGR, Rodrigo Janot, a quem se acusa de pressa na solicitação do inquérito contra o presidente. Não poderia ter deixado escapar uma prova essencial ao caso que levanta no STF, o gravador usado por Joesley Batista em sua conversa com o presidente da República. O aparelho, aliás, está de volta ao país. Não poderia Janot ter deixado de avaliar a inteireza da gravação e seus aparelhos. Visões em confronto II Os elementos da gravação deveriam ter sido periciados pela Polícia Federal, que tem a estrutura mais competente e necessária para avaliar a qualidade de gravações e/ou efeitos artificiais nelas inseridos; b) crítica ao ministro Edson Fachin, do STF, que aceitou o pedido de Janot para investigar o presidente, quando deveria ter encaminhado tal solicitação ao plenário da Casa, levando em consideração a gravidade da decisão que iria tomar. Alega-se que tal operação deveria ter sido encaminhada a outro ministro do STF por não ter ligação direta com a Lava Jato; c) críticas de advogados ao comportamento do juiz Sérgio Moro, a quem faltaria a "imparcialidade" necessária para julgar indiciados da Lava Jato; d) divisão de pontos de vista entre ministros de Altas Cortes sobre o modus operandi de alguns de seus pares, denotando incerteza sobre o que virá. O luxo do funeral "O luxo do funeral e a suntuosidade do túmulo não melhoram as condições do morto; satisfazem apenas a vaidade dos vivos". (Dante Veoléci) Perguntas Por que o procurador-Geral da República foi tão apressado em solicitar a investigação sobre a conversa de Joesley com o presidente da República? Por que o ministro Fachin aceitou o acordo da delação em condições consideradas amenas e diferentes do acordo feito por Marcelo Odebrecht? Por que o Grupo Globo faz campanha "escancarada" para derrubar o presidente da República, o que se torna patente com os vieses e as abordagens negativas que seleciona do contencioso? Por que Rodrigo Janot aceitou fazer um acordo com um delator em condições diferentes do acordo feito com a Odebrecht? Regras não claras Há uma Torre de Babel circundando os ambientes institucionais. De repente, descobre-se que há falta de regras para definir rumos (eleição do presidente em caso de vacância, quem pode ser ou não candidato), há falta de uma linguagem homogênea de magistrados sobre determinadas situações e divergências profundas em torno de decisões dadas por juízes. Está ocorrendo anomia, nos termos usados por Fernando Henrique, o tucano-mor, ou ausência de clareza normativa? Vacância O presidente Michel Temer anuncia (em dois pronunciamentos) que não renunciará. O que parece denotar firmeza e convicção de que deve usar os meios a seu alcance para se defender das acusações, a partir de prevaricação - de que teria se omitido ante o depoimento de alguém confessando crimes. Sobram, então, duas alternativas: a) cassação da chapa Dilma-Temer pelo TSE, dia 6 de junho e b) impeachment pelo Congresso. Há uns 10 pedidos de impeachment já encaminhados. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, diz que não dará a eles encaminhamento. E a cassação pelo TSE? Se Rodrigo não colocar os pedidos em pauta, poderá haver recurso e, nesse caso, iriam a voto em plenário. É bem provável que não sejam aprovados, eis que o impeachment carece de votação qualificada (308 votos, no mínimo). Quanto à cassação da chapa pelo TSE, mais uma vez entra na balança o julgamento do STF. Se esta Corte decidir pela suspensão da investigação sobre o presidente, é razoável apostar na hipótese de absolvição, com a tese de separação de contas entre a titular Dilma e o vice Michel. A recíproca é verdadeira. As ruas E a movimentação de rua? São pequenas as possibilidades de agregação de multidões nas ruas pedindo o afastamento do presidente. Esses ajuntamentos continuarão a ocorrer, mas em pequena escala. Não se deve esquecer que os atores que mais se interessam e defendem esta estratégia foram envolvidos por Joesley Batista. Lula e Dilma teriam recebido R$ 150 milhões para a campanha e suas despesas. Na hora H, essa lembrança será acentuada. Mulheres na conversa? O Radar da Veja diz: "em pelo menos um dos trechos editados, a conversa entre Joesley Batista e Michel Temer girou sobre mulheres. O dono da JBS retirou essa parte para se proteger - e, não evidentemente, proteger a relação do presidente com Marcela Temer. Dos 50 minutos de gravação, 38 são conhecidos." A Veja deve ter mandado fazer perícia sobre o diálogo. É o que se infere. Benevolência Há quem acredite que, antes tantas críticas ao acordo benevolente conseguido pelos irmãos Batista, o acordo feito para sua delação pode ser revisto. Tudo pode mudar, acreditam juristas. E a PGR não terá outro caminho senão refazer os termos do acordo. As redes sociais ecoam críticas aos donos do grupo JBS. E clamam por punição mais severa a eles. Afastamento da base Os partidos da base governista vão esperar pela decisão do STF sobre o caso para tomar seu posicionamento: sair ou permanecer na base. A lógica se imporá. Se o STF decidir pela continuação do inquérito, deverão deixar o governo. Na recíproca, ficarão. Sem base, o governo verá estiolada sua condição de governabilidade. Leniência A força tarefa da operação Greenfield informa que as negociações para um eventual acordo de leniência entre o MPF e o Grupo J&F foi retomado. Como se sabe, o MP estipulava multa de mais de R$ 11 bilhões para fazer o acordo; o Grupo oferecia algo em torno de R$ 1 bilhão. Abriram-se novas negociações. Self information? Afinal, teria o grupo J&F operado no mercado financeiro para lucrar com os efeitos da delação premiada fechada por seus donos? O mercado trabalha com a informação de que teriam feito uma operação com compra de dólar (em torno de R$ 1 bilhão), enquanto teriam vendido o equivalente a R$ 327,4 milhões. Ganhar dinheiro assim é uma modalidade que o jurista Modesto Carvalhosa designa de self information. Contabilidade: programa de qualidade O Sescon-SP (Sindicato das Empresas de Contabilidade e Assessoramento no Estado de São Paulo) realiza nesta sexta, 26 de maio, a 12ª edição do evento para entrega da certificação PQEC - Programa de Qualidade de Empresas Contábeis, criado para incentivar a excelência das empresas de serviços contábeis. Nas palavras do presidente da entidade, Márcio Shimomoto, "neste ano de mudanças, superação e desafios, é uma grande satisfação celebrar as conquistas das empresas que contribuem e trabalham diariamente para o desenvolvimento do país". Este ano serão 474 empresas, sendo 103 certificadas também pelo ISO. O evento será no Citybank Hall, em São Paulo, com show do cantor Michel Teló.
quinta-feira, 18 de maio de 2017

Porandubas nº 530

!!! O país entra num gigantesco buraco negro! As revelações das gravações do Joesley Batista abrem horizontes de incertezas! Cenário de caos. Sustar as reformas nesse momento significará imenso retrocesso. Cuidado, apressadinhos Tem um montão de apressadinhos instalando barracas no terreno do pleito de 2018. Este consultor transmite um conselho: devagar com o andor. Cuidado para não colocarem o carro na frente dos bois. Entrem na reza dessa novena. Novena da paciência 1. Uma coisa por vez. Uma caminhada de 1.000 kms começa com um primeiro passo. 2. O tempo é quem dita as razões e baliza as decisões. 3. Peru não morre de véspera. 4. No Brasil de hoje, temos de contar com o Senhor Imponderável, que gosta de nos visitar. 5. A pressa é inimiga da boa decisão. Apressado come cru. 6. Nem sempre a menor distância entre dois pontos é uma reta como na geometria euclidiana. 7. É saudável viver o espírito do tempo, nunca antecipá-lo. 8. A cautela na política é um santo remédio contra sequelas e passos maiores que as pernas. 9. Os dois olhos devem estar muito abertos: um olhando para o norte, outro para o Sul! Amém! I - Mudanças no cenário: contra o status quo Este analista da política tem por hábito aplicar sua lupa sobre a dinâmica social, procurando traços e sinais que apontem na direção de mudanças. Pois bem, é interessante observar uma clara determinação dos maiores grupamentos da sociedade de mudar o status quo na esfera da política. Nessa tendência, integram-se as classes médias de grandes e médias cidades, que formam o maior polo mudancista do país, que agregam profissionais liberais, professores, funcionários públicos, os universos dos setores produtivos - indústria, comércio e serviços, proprietários rurais - e contingentes de jovens. II - Mudanças de cenário: polo conservador Uma parcela dos mudancistas - uma minoria - assume uma postura mais conservadora, juntando-se no entorno de perfis que encarnem o endurecimento de regras e costumes (defesa da família, contra o aborto, combate duro aos criminosos, contra união de pessoas do mesmo gênero, etc.). Bolsonaro aparece nesse pedestal. III - Mudanças de cenário: polo esquerdista Na outra ponta do arco ideológico, um núcleo de esquerda tende a se formar, com posições mais radicais do que as bandeiras históricas e tradicionais até então defendidas pelas esquerdas. A crise que solapa a imagem do petismo impulsiona grupos mais extremados, que tentarão se aproveitar da indignação social para expandir um ideário mais forte contra o liberalismo e seus eixos na economia, na política e nos costumes. IV- Mudanças: polo centrista Distanciando-se dos extremos, largos contingentes se abrigarão no meio da pirâmide social sob a sombra de bandeiras mudancistas, agora sustentadas por vigas com a marca de um social-liberalismo. As forças do mercado darão o tom da tuba de ressonância central, cuja pregação será a flexibilização nas relações do trabalho, a menor dimensão e o menor custo do Estado, com a defesa da meritocracia e a atenuação dos cargos políticos. As reformas na política e a no campo dos tributos continuarão a ser brandidas. Perfis que encarnem esse ideário serão prestigiados. V - Mudanças: democracia participativa Uma questão que permeia todos os grupos e setores é a participação da sociedade no sistema decisório. Identifica-se um movimento centrípeto - das margens para o centro - a denotar intenso interesse de classes sociais e categorias profissionais em participar, de forma mais ativa, do processo político. A democracia participativa, portanto, estará atingindo seu clímax, fenômeno que ensejará intensa mobilização de setores. A crise disparou mecanismos de animação política. A sociedade redescobre a força do voto. Sua capacidade de ditar os rumos políticos da Nação. Esse será um grande ganho, um dos frutos mais saudáveis da crise. VI - Mudanças: o regionalismo O processo político será banhado pelas águas do regionalismo. Essa tendência se alimenta do calor dos embates em torno da questão econômico-tributária. A distritalização do voto ganhará força. Dois cenários, então, se apresentam: a micro-democracia das comunidades organizadas e o poder regional. Colocando-se ambos na panela da pressão política, dá para se imaginar o caldo que tomaremos: disputa acirrada entre regiões, movimentos comunitários reivindicatórios, estiolamento das forças políticas tradicionais, entre outras consequências. A moldura é a ideal para abrigar o parlamentarismo. Não por acaso, o grupo parlamentarista do Congresso se fortalece. Lembrança Pequena lembrança aos apóstolos do marketing à moda antiga: "nenhum homem, por maior esforço que faça, pode acrescentar um palmo à sua altura", diz a Bíblia, e alterar o pequeno modelo que é o corpo humano. Mesmo que alguns ainda acreditem nas artimanhas de um marketing político dos velhos tempos. Palocci, a bola da vez? Todas as atenções se voltam para o todo ex-poderoso mago das Finanças do governo Lula: Antônio Palocci. Ele está em vias de fechar acordo de delação premiada. Mas há um habeas corpus em curso, que pede sua imediata soltura. Não teria mandado sustá-lo. Ou seja, conta com o julgamento do HC e com o fechamento do acordo de delação. O plenário do STF tende a soltá-lo, na esteira de suas últimas decisões. O que não aliviará a dor de cabeça de Palocci pois será julgado mais adiante. Já um acordo com os procuradores poderá ser mais satisfatório. Palocci, o braço direito Lula tinha em Palocci extrema confiança. A ele teria delegado a tarefa de arrumar recursos para as campanhas e operar o dia a dia dos recursos. Fala-se de uma conta de R$ 30 milhões disponibilizados pela Odebrecht para uso de Lula. E Palocci seria o único com autorização para operar tal conta. Palocci vai dizer algo, confirmar hipóteses que circulam? Difícil responder. O fato é que, nesse momento, o apelo familiar deve predominar sobre amizade com A, B ou C. Se for para aliviá-lo de uma pena longa, é mais provável que o ministro diga o que sabe. Ou parte do que sabe. Lula deve supor que o amigo não vá jogá-lo em maus lençóis. Mas se o silêncio significar condenação e o fogo do inferno? Reformas passarão Este consultor continua a acreditar que as reformas passarão no Congresso. O presidente Michel Temer tem feito extraordinário trabalho de articulação. A comunicação governamental melhorou. A consciência sobre a necessidade de aprovação das reformas se expande. Ou vai ou o país irá para o beleléu. A reforma trabalhista passará no Senado sem emendas. Nessa condição, não voltará à Câmara. Se houver ajustes, serão feitos por Medida Provisória. O fato é que demandas e observações feitas por senadores já são contempladas no substitutivo do deputado Rogério Marinho. Muitos não o leram. E pedem o que lá já está. P.S. Esta nota foi produzida antes da bomba atômica que cai sobre o governo. Hoje há muitas dúvidas. Santana e Mônica As delações de João Santana e Mônica Moura, sua mulher, devastam o que sobra na imagem dos ex-presidentes Lula e Dilma. Nota comum dos depoimentos: sabiam de tudo, de propina a caixa 2. E de contas no exterior. Com tantos detalhes, será difícil desfazer a narrativa dos marqueteiros. E essa ideia de bolar um e-mail com o nome Iolanda, nome da esposa falecida do marechal Costa e Silva, só contribui para causar mais polêmica ao estilo vingativo da ex-presidente. Bolsonaro É inimaginável situar o deputado Bolsonaro como forte candidato a presidência da República em 2018. Trata-se de um mero flagrante de um presente cheio de indignação contra os políticos. O pais está se tornando mais racional. E a racionalidade não combina com radicalismos, seja de direita, seja de esquerda. O caminho mais largo será o do centro. Pezão O apartamento do governador Pezão, no Rio, foi invadido. Deus do Céu. Quando a residência da mais alta autoridade de um Estado importante é invadida, o que mais esperar em matéria de segurança? Onde estamos, para onde vamos? Melhoria Os sinais começam a apontar para melhorias. As vendas no varejo aumentando. Juros caindo. Inflação diminuindo. Investidores dão mostras de que acreditam nas reformas. Mas a área do emprego ainda está complicada. Vai demorar mais um pouco até a curva do desemprego diminuir. O novo? Cuidado Fala-se por todos os lados que o novo será o perfil mais desejado e aclamado pelo eleitor. Urge ter cuidado. O novo não se restringe à idade. Diz respeito à postura, comportamento, atitudes. Há muito novo que está caindo de velhice mental. Novo é o compromissado com ideias avançadas, inovadoras, modernas. É aquele que vai à arena lutar contra os velhos costumes e padrões ultrapassados. Saturação Milhões de brasileiros estão saturados de velhas palavras e conceitos. O momento é de alerta. Como Zaratustra, o profeta de Nietzsche, precisamos de uma nova linguagem. Recolhido na montanha e à solidão de sua caverna, Zaratustra acordou, certa manhã, de um sonho, e ao se olhar no espelho trazido por um menino, deu um grito e seu coração ficou alvoroçado, quando constatou o que via: a cara feia e o riso escarninho do diabo. Decidiu agir. Sentia que sua doutrina corria perigo. Reconstruir tudo de novo O joio queria chamar-se trigo. Inimigos poderosos haviam desfigurado seu ideário. Decidiu partir para reconstruir tudo de novo. E correu a precipitar suas palavras para além dos vales, dizendo: "novos caminhos sigo, uma nova fala me empolga: cansei-me das velhas línguas. Não quer mais, o meu espírito, caminhar com solas gastas". (Friedrich W. Nietzsche in "Assim falou Zaratustra"). Arremessou seu dardo, sua palavra, contra os inimigos e valendo-se do apoio dos amigos, fez valer sua velha e selvagem sabedoria.
sexta-feira, 12 de maio de 2017

Porandubas nº 529

Abro a coluna com um "causo" contado por Zé Abelha nas Minas Gerais. Mudou de nome? Mariana, em Minas Gerais, já foi chamada de Roma brasileira. Terra de fé e de velhas igrejas. E cheia de placas com nomes engraçados nas ruas: - Cônego Amando - Armando Pinto Cônego Amando era conhecido pela verve. Um dia, viajando pelo interior do município, uma de suas acompanhantes caiu do cavalo. Rapidamente ficou em pé. Meio sem graça, perguntou ao Cônego: - O senhor viu a minha agilidade? - Minha filha, respondeu, eu até que vi. O que eu não sabia é que tinha mudado de nome. Um pouco maior Peço licença ao leitor por lhe apresentar uma coluna um pouco mais longa. Faço uma análise do depoimento de Lula, com projeções sobre o amanhã. Lula bate Moro? Vamos às hipóteses: Luiz Inácio conseguiu ser tão convincente que deixou o juiz Sérgio Moro no canto do ringue. Tem sentido essa hipótese? Não. Mas a torcida organizada de Lula acha que seu ídolo fez barba, cabelo e bigode. A verdade: o juiz teve a bola na mão e o apito na boca. Esteve sereno. Não se afobou. Conduziu tecnicamente o jogo. As delações de Léo Pinheiro e Renato Duque deram munição às perguntas. Mas o ex-presidente, como se sabe, é um mágico da prestidigitação com palavras. Saiu-se bem. Sem o rompante palanqueiro tão aguardado pela militância. Insistiu que o tríplex nunca foi dele e que nunca recebeu propina. Marisa, a falecida esposa, é quem tinha interesse naquele imóvel. Lula conhece a regra do martelo: bata, bata, bata no mesmo prego e ele acabará fixando-se na parede ou, se quiserem, na cachola das massas. Moro bate lula? O maior líder populista do país foi nocauteado? Também não. Mesmo sem disfarçar o nervosismo, tentou responder a algumas perguntas. Sobrou, mais uma vez, a expressão: não sei, não soube, não sabia. Tentou trazer o juiz para o campo político: "quando o senhor for candidato". Tentou puxar Moro para a intimidade do lar, ao sugerir que o filho não diz ao pai as notas baixas que tirou na Escola; nesse ponto, recebeu uma estocada. Moro garantiu que sabe das notas de seus filhos. Perguntas duras e diretas feitas pelo juiz Moro deixaram Lula nervoso, mas não a ponto de deixarem-no no canto do ringue. O juiz teve o comando do jogo. E pôde apitar toda vez que achou necessário, principalmente quando percebeu que o protagonista saía pelas tabelas ou pelas veredas do sofisma. Um jogo técnico Não houve mocinho nem herói. Viu-se um juiz técnico apurando respostas. Viu-se um Lula nervoso em alguns momentos, mas sob severo rigor da liturgia. Quando procurou escapar do clima solene, chamando procuradores de "você", foi advertido. Para ele, o tratamento foi retilíneo: ex-presidente. É evidente que, pela polarização entre a ala que apoia a Lava Jato e o grupo que escuda Lula, o jogo pode ter sido considerado empatado. Cada lado dirá que ganhou. Aplausos e apupos recíprocos. A mídia massiva dará o tônus do debate, puxando uma brasinha para um lado ou para outro. As redes sociais se dividiram em xingamentos e loas. Ao final do processo, a impressão é a de um Lula ainda muito vivo, porém, alquebrado. Resumo Um momento tenso foi o relato de Lula sobre o encontro com Renato Duque em um hangar em Congonhas. Afinal, por que um ex-presidente quis se encontrar com um ex-diretor da Petrobras? E mais: para saber se ele tinha depósitos em contas no exterior? Ademais, não era amigo dele, Duque. E por que usar João Vaccari, tesoureiro do PT, como intermediário desse encontro? Essas dúvidas certamente se farão presentes no juízo de Sérgio Moro. Atribuir a dona Marisa (que "odiava praia") o interesse pelo tríplex também não caiu bem. E mais: que ela queria fazer investimento com a aquisição do apartamento. As 50 mil pessoas anunciadas pelo PT, que iriam até Curitiba prestigiar o ex-presidente, se restringiram a umas 7 mil pessoas. A batalha campal não ocorreu. A certeza é a de que o caso seguirá seu curso naturalmente. O juiz Sérgio Moro deve aceitar a denúncia, abrir a fase de nova coleta de provas, ouvir mais testemunhas e proferir sua decisão. Que deve ocorrer entre junho e julho. Condenação ou absolvição? Essa é a pergunta recorrente sobre a possibilidade de Luiz Inácio poder ou não ser candidato em 2018. Primeiro, vale lembrar que o veto à eventual candidatura estará circunscrito a uma condenação em 2ª instância. O Tribunal Regional da 4ª região tem dado endosso às condenações proferidas pela 1ª instância do juiz Sérgio Moro. Se essa tendência se confirmar, Moro condenaria Lula e veria sua decisão corroborada pela instância acima. A partir daí, o processo entra no curso natural do Judiciário com os recursos cabíveis e prováveis nas instâncias superiores. Mas, do ponto de vista político, isso não significaria a morte política de Luiz Inácio. Vitimização O fato é que o declarado candidato à presidência da República, Luiz Inácio, já começou a lapidar seu perfil com a argamassa da vitimização. Essa é a carta no pacote discursivo que vai utilizar para se apresentar com sua candidatura de oposição ao pleito de 2018. É uma boa ideia? Não. Este consultor tem essa visão: é melhor para Lula a condição de comandante das oposições, em 2018, do que a de candidato. Por quê? Primeiro, deixaria de ser o alvo do bombardeio; segundo, apareceria em comícios por todo o território, lembrando os feitos de seu governo e levantando o véu da nostalgia. Assim, arregimentaria forças na direção de um candidato de oposição. Lula é um dos poucos quadros com capacidade de unir as oposições e unificar a linguagem. Sua capacidade de sensibilizar as massas - por via da mistificação - puxará para cima o tom emotivo de uma campanha oposicionista, com intensa mobilização da militância. Plantaria a semente de resgate do PT, podendo eleger uma bancada poderosa em 2018. Como candidato, volta a canalizar a polarização no país, com o "Nós e Eles". Dessa feita, o "Nós" (PT, Lula e oposições) tende a perder. Razão x emoção Luiz Inácio, candidato, perderia a condição de favorito. Principalmente levando-se em consideração a retomada do crescimento do país. Formar-se-á gigantesca onda, a partir do centro da pirâmide, cujos efeitos e impactos chegarão às margens. As classes médias, onde se abrigam poderosos núcleos de formação de opinião, a partir dos profissionais liberais, expandirá sua tuba de ressonância. As marolas expressivas impregnarão as correntes, que terão capacidade de furar os bloqueios emotivos das margens. Significa aduzir que Lula terá condições de resgatar seu PT, mas não de torná-lo vitorioso no ranking partidário. Sua força será suficiente para evitar a débâcle total do petismo. Em suma, o volume de racionalidade, a sair das fontes do meio da pirâmide, será superior aos tonéis de emoção que engolfarão as massas periféricas. São Paulo, a fonte principal A fonte principal que jogará a expressão na tuba de ressonância nacional será São Paulo. O mais forte Estado da Federação conta com cerca de 45 milhões de habitantes, ou 22% da população brasileira, 207 milhões. E sua população eleitoral é mais de 32 milhões. O bumbo que se bate em São Paulo é ouvido em todo o país. São Paulo agrega os maiores conjuntos de profissionais liberais, os maiores núcleos de trabalhadores, as maiores classes médias, as maiores densidades em todos os campos populacionais. Por isso, São Paulo terá importância estratégica no quadro eleitoral do país. Os novos Uma ligeira conversa com Murilo Hidalgo, do Instituto Paraná Pesquisas, arremete para algumas conclusões: 1. O perfil do novo ganhará ênfase nas próximas eleições. 2. Alguns nomes (novos e mesmo alguns madurões, porém mais assépticos) aparecem: Josué Gomes da Silva, filho do falecido ex-vice presidente da República, José de Alencar, pode ser um bom nome ao governo de Minas Gerais; no Rio, o senador Romário ou mesmo Bolsonaro, o pai, ao cair na real e constatar ser uma fria sua candidatura à presidência; João Doria em São Paulo, caso Geraldo Alckmin seja candidato à presidência. Ainda no Rio de Janeiro, Armínio Fraga e Bernardinho do vôlei; ACM Neto, na Bahia; Ratinho Junior, no Paraná ou mesmo Deltan Dallagnol; Rui Palmeira, em Alagoas; Paulo Câmara, Mendonça Filho ou Bruno Araújo em Pernambuco; e Hélder Barbalho no Pará. Dirceu solto A decisão do STF de mandar soltar José Dirceu, ex-todo poderoso manda-chuva do PT, traça uma linha divisória no sistema de prisões temporárias de longo prazo, tão bem acolhido pela primeira instância do Judiciário, sob o guarda-chuva protetor do Ministério Público. A 2ª turma do Supremo impôs limites ao tempo dessas prisões, mesmo diante do parecer do relator, ministro Edson Fachin, a elas favorável. A decisão ganhou intensa repercussão no universo dos operadores do Direito em um momento de polarização entre posições, envolvendo principalmente as visões contrárias de advogados e o insistente posicionamento favorável de procuradores e do juiz Sérgio Moro, este comandando os casos mais contundentes da operação Lava Jato. Quem tem razão? Quem tem razão? A 2ª turma do STF ou o MP? A situação deve ser analisada à luz de vários e complexos fatores. Ressalte-se o tom extremamente emotivo com que uns e outros tratam do caso. Um grupo enxerga na decisão de nossa mais alta Corte um golpe frontal contra a operação Lava Jato, enquanto os advogados festejam o ato como gesto de que a Justiça volta ao seu prumo, depois da primeira instância dar guarida a "exageros e aberrações", como alguns chegam a designar as alongadas prisões temporárias. A emoção chama a atenção no meio do turbilhão expressivo que inunda o território da maior investigação sobre corrupção da história brasileira. Mas a emoção acaba encurtando a lógica das partes. Urge tornar a linguagem jurídica mais conceitual e menos pessoal. Os fatos É fato que as prisões temporárias se fazem necessárias para apuração acurada de denúncias e servem de escudo contra eventuais ações de implicados no sentido de destruir provas e obstruir, caso estivessem soltos, as veredas da Justiça. Mas é igualmente fato que as detenções não podem ultrapassar determinado limite de tempo, sob a hipótese de que os detidos não foram ainda julgados e a longa permanência em prisão, sem condenação, pode ser considerada como evidência de injustiça. Portanto, na querela aberta tem faltado bom senso. Os verbos e adjetivos raivosos lançados de um lado contra o outro precisam se despir do manto emocional. Não é politicagem Não é o caso de marcar com feição politiqueira atitude de ministros que concederam a liberdade ao ex-ministro José Dirceu, sendo uma impropriedade distinguir neles a pecha de "traidores da Justiça", ou, de outra forma, jogar sobre o colo da "meninada" do Ministério Público atributos como "procuradores ingênuos, oportunistas, golpistas, despreparados, desprovidos de caráter", entre outros. O fato de magistrados registrarem, em seu passado, um pedaço de história que os liga a protagonistas da política - partidos ou lideranças - não os desabilita ao cumprimento das altas funções para as quais foram escolhidos. Nem mesmo quando tais figurantes assumem papel de vulto nos gigantescos processos em curso, como é o caso da operação Lava Jato. A Corte americana É oportuno lembrar que a escolha de juízes para a mais alta Corte da maior democracia do planeta, a norte-americana, se investe de certo teor político, eis que os perfis costumam ser encaminhados e patrocinados, via de regra, pelos dois maiores partidos, o republicano e o democrata. Mesmo assim, quando há suspeita sobre o voto de determinado ministro, pela ótica de que estará julgando "um amigo, um ex-parceiro de trabalho", ele poderá se considerar impedido de participar do julgamento daquele caso, como tem acontecido em algumas Cortes, principalmente no âmbito do Superior Tribunal de Justiça. A par de questões de natureza ética, que certamente integram o escopo moral dos quadros mais elevados de nossas Cortes, emerge com força a cobertura midiática, feita por grandes veículos da imprensa e pelas mídias sociais. O maior juiz, a OP Há um superpoderoso juiz a julgar os julgadores: a opinião pública. Esta se forma a partir do amálgama das opiniões individuais, constituindo um gigantesco estuário em que desembocam as águas oriundas dos canais e filtros que guardam juízos de valor de classes sociais, grupamentos, setores e movimentos. Juízes que fugirem às regras que balizam sua profissão são jogados no palco midiático, onde ganham apupos, vaias, na esteira de um repertório negativo que marca sua identidade e mancha a imagem. Não terão salvação quando jogados na fogueira acesa pela opinião pública. Só conseguirão limpeza parcial de seus corpos depois de uma temporada no inferno até aportarem no limbo, que, nesse caso, significa o esquecimento dos fatos por parte da sociedade. Cuidado com Narciso Já a "meninada" do MP não pode se refestelar diante de eventuais bombardeios da mídia sobre o arquipélago de políticos e magistrados. É imperioso reconhecer que o espelho de Narciso ilustra paredes de salas de um grupo de procuradores. Não há como deixar de reconhecer que alguns perfis apreciam os adornos de espetáculos espalhafatosos. Preparam atos litúrgicos para falas aguardadas com expectativa, investem-se de "salvadores da Pátria", assumindo a dicotomia: "ou nós ou o caos". Compreende-se o vigor com que fazem denúncias e investigações e é elogiável seu esforço para defender a sociedade contra máfias e teias de larápios que intentam surrupiar os cofres do Estado. O erro, quando há, está na dosagem exagerada. É inescapável a observação que aponta para a espetacularização de suas ações. Em suma, nem lá nem cá.
quarta-feira, 3 de maio de 2017

Porandubas nº 528

Abro a coluna com a verve popular... Saudando presidentes Juscelino Kubitschek, presidente da República, foi ao Ceará com Armando Falcão, ministro da Justiça. Sebastião Nery conta que Falcão, cearense, levou JK a um desafio de cantadores. Um cego estava lá, com sua viola, gemendo rimas. Juscelino chegou, cumprimentou-o. O cego respondeu na hora: - Kubitschek, ai, meu Deus, que nome feio. Dele eu só quero o cheque porque do resto ando cheio. Um ano depois, a mesma cena. Jânio Quadros, presidente, vai a Fortaleza, há um desafio de cantadores. Chega com os óculos grossos e longos bigodes, um cantador o vê, saúda: - Vou louvar o meu patrão que já vem chegando agora. Engoliu a bicicleta e deixou o guidão de fora. Nunca mais ninguém levou presidente para ouvir cantador no Ceará. Soltura de Dirceu A decisão do STF de mandar soltar José Dirceu comandará o discurso político-judicial nas próximas semanas. As prisões temporárias de longa duração fecham um ciclo. Abre-se uma nova jornada de discursos, críticas e apoios, nos conjuntos profissionais organizados: MP, Judiciário, OAB e suas associações. A locução crítica alcança o ápice. Até onde irá? Que estranho, hein? O Datafolha registra que a confiança dos brasileiros aumenta, que expectativas sobre a economia melhoram, que há sinais positivos no horizonte. No outro lado da moeda, mostra dados sobre avaliação negativa do governo Temer, que piora. Fica no ar a dúvida: quem está melhorando a economia? Quem é o artífice da melhoria da confiança? Um extraterrestre? Luis Inácio, com a bateria de denúncias nas costas? Ou o governo tão mal avaliado de Michel Temer? Por que tanta falta de nexo entre as posições registradas pelo Instituto da Folha de São Paulo? O entendimento I Como os analistas da Folha não se deram ao trabalho de analisar esse estranho fenômeno, tentemos fazê-lo. Primeira hipótese para os bons ventos que animam a confiança nacional: Deus, que é brasileiro, é o responsável pelos rumos esperançosos. Segunda hipótese: as centrais sindicais, que comandaram a quebradeira da sexta-feira, dia 28, conseguiram o milagre de recuperar a economia. Terceira hipótese: o PT e os outros partidos da oposição são os verdadeiros responsáveis pelo aumento da taxa de confiança. Quarta hipótese: nenhuma das hipóteses anteriores é adequada. O entendimento II Não vingando nenhuma hipótese anterior, este consultor põe sua colher na sopa de dados incongruentes. A distinta opinião pública - que amalgama as opiniões setoriais e individuais - tende a jogar no colo do governo Temer toda a indignação que expressa sobre a esfera política. Protagonistas - representantes e partidos - são farinha do mesmo saco e estão todos condenados ao fogo do inferno. O governo, no caso, tende a ser associado ao inferno. Corrupção, latrocínio, rapinagem em alta escala, tudo é lançado nas cavernas do governo. Esta é a explicação mais plausível. E por que isso ocorre? Banalização Isso ocorre na esteira do fenômeno da banalização que nivela todos os acontecimentos. Os políticos estão todos no buraco da péssima avaliação. E o governo é visto como guarda-chuva que acolhe a todos. Por quê? Por liderar, hoje, as reformas, ainda não palatáveis à maioria da sociedade. Ou seja, o governo está sendo atacado todos os dias por promover reformas que "tiram direitos trabalhistas". A martelada nas mentiras acaba suplantando a tênue comunicação governamental. E aí o governo assume o papel de bode expiatório das ruindades. O povo ainda não internalizou as lições sobre as vantagens das reformas para a garantia de seu futuro. Inversão de papéis Dá-se, então, uma inversão de papéis. Os mocinhos são os verdadeiros bandidos, os que pregam contra as reformas, os setores que lutam para preservar seu status, os grupos que temem perder privilégios. E os bandidos passam a ser o governo, que lidera as reformas, e aqueles que as defendem. Esse é o pano de fundo que agasalha pesquisas como a feita pelo Datafolha. Previdência na Câmara Hoje, a reforma da Previdência deverá ser aprovada na Comissão Especial da Câmara. Depois, lutará pela urgência da reforma trabalhista no Senado. O líder do governo no Senado, Romero Jucá, está mobilizando as lideranças. Renan Calheiros, líder do PMDB, lutará contra. Renan age como líder da oposição. Diz que reforma não passará pelo Senado da forma como está. Entre os compromissos que assumiu, Renan vai lutar pela permanência da contribuição sindical obrigatória. O kit mercenário As centrais sindicais estão contratando mercenários de quatro empresas de Brasília para duelar em nome de seus interesses. Do pacote constam depredações, pressões contra políticos na Câmara e no Senado, corredores poloneses para agredir quem entra no Congresso e outros aparatos conhecidos. Tudo isso faz parte do kit mercenário e as centrais pagam este preço: - R$ 100 reais por cabeça ao dia; - 4 a 6 horas de trabalho/dia; - os "manifestantes" têm direito a ônibus, camiseta e um lanche. As centrais não levam ninguém de fora para Brasília. Todos os mercenários são arregimentados nas cidades satélites mesmo. Terceirização Entidades patronais se debateram pela terceirização no país durante mais de vinte anos. A atividade se expandiu de forma gigantesca por exigência da dinâmica da economia, como ocorre nos países mais avançados do planeta, e hoje acolhe 13 milhões de trabalhadores em suas mais de 700 mil empresas. Mas é muito estranho: em nenhum momento as centrais sindicais ou os partidos de esquerda apresentaram uma só ideia que fosse para amparar os trabalhadores terceirizados. Ou só os da esquerda são brasileiros? E o trabalhador? Ao final do dia 28 de abril, na chamada greve geral, os manifestantes queimaram oito ônibus no centro do Rio de Janeiro. Era uma forma de protestar contra as reformas empreendidas pelo governo para tentar melhorar a vida dos cidadãos. No dia de ontem, criminosos queimaram mais oito ônibus. Era o seu jeito de protestar contra uma megaoperação da Polícia Militar para acabar com a guerra entre traficantes na Cidade Alta, comunidade em Cordovil, na Zona Norte. Mas, na verdade, as maiores vítimas de manifestantes e criminosos são os trabalhadores, os que mais dependem de transporte público. As chamas e a esperança Enquanto pneus ardiam nas ruas e estradas do país, barricadas eram erguidas e a violência imperava contra os que pretendiam trabalhar na sexta-feira, o Datafolha se preparava para anunciar nova pesquisa, no qual a maioria dos brasileiros está menos pessimista em relação à sua própria situação econômica e a do país. Apesar de entortarem o nariz para a reforma da Previdência, a parcela dos entrevistados que prevê progressos em sua situação pessoal aumentou de 37% para 45%. Os números mostram, ao final, que aumenta cada vez mais a distância entre os manifestantes petistas e os que realmente trabalham no Brasil. Destampatório de ignorância Chegou às mãos deste consultor um vídeo feito com uma pergunta aos manifestantes do dia 28, aquele dedicado à fracassada greve geral. Pergunta do entrevistador: que direitos o trabalhador está perdendo com as reformas? O destampatório é de gargalhar. Respostas: o trabalhador perderá direito ao FGTS; perderá benefícios; não terá direito às férias, 13º salário, perderá o tempo já trabalhado e que conta para a aposentadoria. Alguns gaguejam, outros não sabem o que dizer. Mas observa-se a instrumentalização a que algumas pessoas foram submetidas. Uma carrada de ignorância dentro de toneladas de má-fé. O vídeo circula pelas redes. Comício do Paulinho Paulinho da Força tem o dom de agradar e, ao mesmo tempo, desagradar seus interlocutores. No palanque de sua festa de 1º de maio, quando levou artistas e sorteou carros, desancou as reformas e o governo Temer. Ao fundo, o logotipo da Caixa Econômica Federal, uma das patrocinadoras do evento. Paulinho deve justificar: a Caixa está do nosso lado e contra o governo. O que diz a CEF sobre o verbo solto e destemperado do sujeito que dirige a Força Sindical? O enigma Lula Luis Inácio vai depor dia 10 de maio em Curitiba. Crescem as expectativas. O PT se prepara para lançar sua candidatura à presidência da República logo após seu depoimento ao juiz Sérgio Moro. Já se sabe que Lula vai negar tudo. E aproveitar para se fazer de vítima. Moro, por sua vez, não deve se amedrontar. Há plateias que aplaudem sua conduta. Por isso, 10 de maio poderá ser o início do fim de Lula. Ou abrir o ciclo do eterno retorno: Lula recomeçando sua vida de candidato. Brasil da inclusão digital Amanhã, o satélite geoestacionário brasileiro Ariane será lançado a uma distância de 36 mil quilômetros da Terra a partir da base de Kouru, na Guiana Francesa. Com esse lançamento, o país abre os horizontes da transmissão de dados com uso de equipamento próprio. As telecomunicações serão beneficiadas com 70% do tráfego de dados do satélite, a chamada Banda Ka, e os outros 30% serão destinados às comunicações militares e estratégicas, defesa e segurança nacional, Banda X. Internet nos rincões A iniciativa é uma parceria entre o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) e o Ministério da Defesa, com investimentos estimados em R$ 2,7 bilhões. Os benefícios são muitos, mas a oferta de banda larga em unidades escolares de áreas remotas e também em unidades de saúde pública merece destaque. O satélite foi construído pela Visiona, uma joint venture entre Telebras e Embraer, e seu lançamento é de responsabilidade da empresa aeroespacial francesa Arianespace. Voto facultativo I É mentirosa a tese de que a obrigatoriedade do voto fortalece a instituição política. Fosse assim, os EUA ou os países europeus, considerados territórios que cultivam com vigor as sementes da democracia, adotariam o voto compulsório. O fato de se ter, em algumas eleições americanas, participação de menos de 50% do eleitorado não significa que a democracia ali seja mais frágil que a de nações onde a votação alcança dados expressivos. Na Grã-Bretanha, que adota o sufrágio facultativo, a participação eleitoral pode chegar a 70% nos pleitos para a Câmara dos Comuns, enquanto na França a votação para renovação da Assembleia Nacional alcança cerca de 80% dos eleitores. Não é o voto por obrigação que melhora padrões políticos. A elevação moral e espiritual de um povo decorre dos níveis de desenvolvimento econômico do país e seus reflexos na estrutura educacional. Voto facultativo II Na lista do voto obrigatório estão os territórios da América do Sul, com exceção do Paraguai, enquanto a lista do voto facultativo é integrada por países do Primeiro Mundo, os de língua inglesa e quase todos os da América Central. O voto facultativo, ao contrário do que se pode imaginar, motivará a comunidade política, engajando os grupos mais participativos e vivificando a democracia nos termos apregoados por John Stuart Mill, numa passagem de Considerações sobre o Governo Representativo, quando divide os cidadãos em ativos e passivos. Diz ele: "Os governantes preferem os segundos - pois é mais fácil dominar súditos dóceis ou indiferentes -, mas a democracia necessita dos primeiros. Se devessem prevalecer os cidadãos passivos, os governantes acabariam por transformar seus súditos num bando de ovelhas dedicadas tão somente a pastar capim uma ao lado da outra."
quarta-feira, 26 de abril de 2017

Porandubas nº 527

Abro a coluna com uma historinha hilária de PE. Verbo não "vareia" A Câmara Municipal de Paulista/PE vivia sessão agitada em função da discussão de um projeto enviado pelo prefeito, que pedia crédito para assistência social. Um vereador da oposição combatia de maneira veemente a proposição. A certa altura, disse que "era contra o crédito porque a administração municipal não merecia credibilidade". O líder da bancada governista intervém, afirmando que "o nobre colega não pode jogar pedras no telhado alheio, pois já foi acusado de algumas trampolinagens". - Menas a verdade - retrucou o acusado. Sou homem honesto, de vida limpa. - Vejam, senhores, - disse o líder - o nobre colega, além de um passado nada limpo, ainda por cima é analfabeto, pois, "menas" é verbo, e verbo não "vareia". (Historinha contada pelo jornalista Ivanildo Sampaio). A crise pinga e respinga A crise continua forte. Pingando novos dados, novas revelações, novas pontuações e respingando em velhos e novos atores. Léo Pinheiro, o ex-todo poderoso da OAS, amigo de Lula, confirma: o tríplex era dele. E reúne provas do dito. João Santana e Mônica, sua mulher, confirmam que Dilma sabia da propina e mais, sabia da conta no exterior, onde se depositavam milionários recursos. A Lava Jato põe a público vídeos com delações de todos os executivos da Odebrecht. Um oceano de revelações. Onde tudo isso vai desaguar? Destruir provas? Essa delação do Léo Pinheiro é mesmo uma bomba de alguns megatons: disse que Lula o orientou a destruir provas. Os detalhes da conversa são significativos. Os dois eram amigos. Essa orientação de Lula colará fundo em sua imagem. A salvação de Lula Lula iria depor dia 3 de maio em Curitiba. É o fato mais esperado dos últimos tempos. O ex-presidente está armado até os dentes. Diz que quer olhar Moro de frente. E que vai refutar: o tríplex nunca foi meu. Moro pode adiar o depoimento a pedido da PF e, dizem, também do governo do PR. Querem montar um esquema de segurança mais aparatoso para evitar balbúrdia. Difícil. Vai haver confusão em qualquer data que Luiz Inácio der seu depoimento. Por quê? Porque o petismo e Lula não terão salvação fora do escudo do carisma do ex-metalúrgico. E do barulhaço das ruas. Daí a urgente e premente necessidade do espetáculo armado em torno de Lula. Caravanas de todo o Brasil. Palanque na frente do prédio onde Moro estará fazendo sua interrogação. Lula preso, grande comoção Se Lula for preso, o PT vai vibrar. É o que o partido mais deseja para inflamar as bases. Os petistas querem inundar as ruas com emoção, barulho, quebradeira. O deputado Paulo Pimenta PT-RS, que o diga. Denuncia Moro como "um insano". Diz que o Poder Judiciário "é o mais podre do país". Anuncia uma conflagração social. E diz que irá à luta. Incita a militância. Luiz Inácio sabe que sua condenação em segunda instância acabará sendo uma medida providencial. Pois não teria candidatura. Tornar-se-ia vítima e não se arriscaria a perder como candidato. Moro com a decisão Sérgio Moro deve medir todos os procedimentos. Está colecionando provas. As hipóteses surgem aos borbotões: a) não mandará prender Lula, mas o condenará; b) mandará prender Lula e mostrará um conjunto de provas; c) deixará a condenação a cargo da segunda instância. Qualquer que seja a decisão, será ele a bússola a guiar os próximos passos da trajetória de Lula nos próximos tempos. Façam suas apostas. Este analista faz a sua: deixará a prisão a cargo da segunda instância. Dilma nega, nega, nega A ex-presidente Dilma continua a negar todas as delações que a colocam no circuito da participação. Diz que os marqueteiros João Santana e Mônica Moura mentem, faltam com a verdade. Mesmo? E os detalhes narrados com prontidão por ambos? Será que a senhora Dilma imagina que sua palavra está acima das evidências? Assédio sexual Oito modelos acusam de assédio sexual dois sócios da editora que publica a revista "Playboy" no Brasil, a PBB Entertainment. Os empresários André Luís Sanseverino e Marcos Aurélio de Abreu Rodrigues e Silva teriam prometido oportunidades de trabalho, fama e sucesso em troca de fotos nuas e sexo. É o que conta a reportagem do Fantástico do domingo passado. Os casos de assédio sexual ganham amplitude e visibilidade, graças à coragem de mulheres que sobem ao patamar da igualdade de gêneros e decidem denunciar o machismo que ainda impera em nossa cultura. Sanseverino já fizera trabalhos como fotógrafo para a "Playboy" e Marcos Aurélio é dono de uma empresa de recursos humanos. Há muito lobo por aí disfarçado em pele de ovelha. Greve geral? Há uma greve geral marcada para depois de amanhã. Os organizadores são os mesmos: CUT, mais uma ou outra central sindical, estudantes profissionais da UNE, alguns quadros de uma ou outra organização social, MST e MTST. Com o apoio de meia dúzia de gatos pingados do PSOL e a militância da salsicha, sempre ela a bagunçar o coreto das ruas. Não se sente um animus animandi a liderar o processo. O que quer essa turma do barulho? Puxar o cabo de guerra para as trevas do passado. Ou seja, é contra as reformas que o governo está liderando, necessárias para viabilizar os dias de amanhã. Que Dom Jaime, hein? Este consultor recebe um áudio, onde o arcebispo de Natal, de nome D. Jaime, prega a adesão à greve do dia 28. Conclama seu rebanho a fazer fileiras pela greve. E pinça algumas frases bíblicas para adoçar seu caldeirão cheio de palavras pronunciadas com fervor. Do meu bornal de ex-seminarista, despacho uma lembrancinha ao arcebispo, lembrando outro D. Jaime, de sobrenome de Barros Câmara, primeiro reitor do meu querido Seminário Santa Terezinha, em Mossoró/RN: "Reddite Caesari quod est Caesaris, et Deo quod est Dei". Mateus 22.21 21: Então Jesus lhes disse: "Dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus". Jaime, caríssimo, cuidado com a pregação cutista. E os 98 políticos nomeados? E para onde irão os 98 políticos arrolados nos processos que estão com o ministro Edson Fachin? Ficarão na arquibancada vendo o jogo ser disputado. Muitos escaparão pelos furos do funil. Ou seja, deverão escapar porque são denunciados por envolvimento com caixa dois. Desde 2006, ninguém foi condenado por receber recursos por meio desta modalidade. Muitos casos serão arquivados por falta de provas. E, depois de longa travessia nos corredores do Judiciário, uns poucos deverão ser condenados. É a realidade em que se assenta nossa Justiça. País mais asséptico Mas o país sairá mais asséptico de todas as operações envolvendo corrupção desde o mensalão. Um novo ciclo descortinará horizontes mais claros, menos turbulentos. Não teremos uma renovação radical, como se deseja. Mas, pouco a pouco os mapas políticos ganharão perfis mais sérios e comprometidos com as reais demandas das comunidades. Em todos os espaços, até nos fundões do território. Democracia repartida Há um fenômeno que merece destaque na atualidade: o despertar da consciência cívica. O cidadão sente-se estimulado a usar a arma do voto para combater a bandidagem que impregna razoável parcela da esfera política. Novos núcleos de poder se instalam aqui e alhures, a denotar o nascimento de uma democracia suplementar, exercida pela miríade de entidades que aglutinam núcleos e grupos. Trata-se de um ganho de nosso sistema democrático. Passado "Que o passado esteja diante de nós, vá lá... Mas o passado adiante de nós, sai pra lá". A expressão artística é do poeta Carlos Ayres Britto, ex-presidente do STF. O acordado sobre o legislado Do economista José Márcio Camargo: "o que ficar acertado entre trabalhadores e sindicatos vai se sobrepor à legislação"; este será o eixo da proposta de reforma trabalhista. Afinal quem define quanto custa um trabalhador é a empresa. Valores em ascensão Os novos tempos acolhem um conjunto de valores, do tipo: - a verdade - a mistificação que tem sido a tônica da política passa a dar lugar à verdade, aos fatos verídicos. Está esgotado o ciclo do engodo, da mentira, dos falsos profetas. - mais ação, menos discurso - o cidadão quer ver ação e não mais ouvir lorota. - gestão de resultados - a gestão pública será acompanhada de maneira mais atenta. As promessas de campanha serão cobradas pela mídia e atentamente acompanhadas pelas massas eleitorais. - defesa real e não artifício - os trabalhadores passarão a exigir de suas entidades sindicais defesas mais consistentes de seus direitos e menos artifício, como sorteios, premiações em eventos, lorotas que têm inspirado o peleguismo sindical. - proximidade - os políticos deverão chegar mais perto de suas bases. As comunidades desejam acompanhar mais de perto as administrações municipais. A clássica distância entre o político e o eleitor - só diminuída em ciclos eleitorais - dará lugar a maior proximidade. - qualidade de serviços - as administrações devem trabalhar pela melhoria da qualidade dos serviços públicos, prioridade número um entre as demandas sociais. Confiar na Justiça "Espera-se que uma herança de séculos, a construção de independência das Cortes de Justiça, não seja desprezada por nossos representantes eleitos. Compreende-se a angústia do momento com a divulgação de tantos casos de corrupção. Mas deve-se confiar na atuação da Justiça" (Sérgio Moro em O Globo, de ontem.) Pontos para reflexão Ponto um: nos termos do parágrafo único do artigo 1.º da Constituição, "todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição". Ponto dois: nos termos dos artigos 45 e 46 da Constituição Federal, os deputados Federais representam o povo e os senadores representam os Estados e o Distrito Federal. Ponto três: os deputados são eleitos pelo sistema proporcional e os senadores, pelo sistema majoritário. Ponto quatro: se o povo vota em um candidato e este, com sua bagagem de votos, leva para o Parlamento mais dois ou três de contrabando, esses excedentes ferem o princípio constitucional alinhavado no primeiro item. Ponto cinco: a representação popular, para ganhar respeito e legitimidade, deve se submeter a uma radiografia moral a fim de se conformar aos ditames constitucionais. Ponto seis: o exercício do poder em nome do povo é tese ancorada na hipótese de escolha dos eleitos de acordo com o preenchimento das vagas que cabem a cada Estado. Ponto sete: essa hipótese abriga o voto majoritário, que, adotado na escolha dos representantes do povo, acabaria com a excrescência gerada por coligações proporcionais, pela qual o eleitor vota em um candidato e, alheio à sua vontade, elege mais um, dois ou até mais de três.
quarta-feira, 19 de abril de 2017

Porandubas nº 526

Abro a coluna com uma historinha do Saci-Pererê Fraco, mas cheiroso Nos sertões do Nordeste, caçadores e lenhadores costumam pôr na frincha de uma árvore da mata em que se encontram certa porção de fumo para Santa Clara. A santa, em recompensa, faz com que naquele dia a chuva não lhes estorve o trabalho. Em São Paulo há uma superstição semelhante: - quem sai a caçar, em dia de sexta-feira, tem a obrigação de levar um pedaço de fumo para o Saci-Pererê. De um caipira mentiroso, fértil no relato de inverossímeis proezas venatórias, repete-se que o mesmo contava: - Uma sexta-feira, eu me esqueci de levar o fumo. Estava pensando nisso, quando o Saci apareceu e me exigiu o tal tributo que lhe era devido. Fiquei atrapalhado, mas resolvi ver se enganava o Saci e o matava. Disse a ele: - "Fumo, mesmo, fumo eu não truxe não, mas truxe o cachimbo carregado." Aí, meti-lhe o cano da espingarda na boca e puxei o gatilho. Quando o tiro falou e eu esperava ver o Saci esperneando e morrendo, ele mexeu com as bochechas, como se estivesse enxaguando a boca com os caroços de chumbo e, cuspindo a carga da espingarda, me disse: - O fuminho é fraco, mas é até cheiroso... (Quem conta é Leonardo Mota em Sertão Alegre) Ainda os abalos O impacto da Lista Fachin continua abrindo e fechando as interlocuções. A impressão é a mesma: nunca d'antes na história desse país, como diria Lula, a corrupção foi tão escancarada. O Estado foi abocanhado, fatiado, assaltado, negociado. É certo que a corrupção não é coisa da atualidade. Vem de longe, como lembra o patriarca Emílio Odebrecht, que confessa manter negócios escusos com os governos e políticos desde os idos de 1970. Naturalidade O que mais impressiona nos vídeos que mostram as negociatas é a naturalidade dos depoimentos. A corrupção era tratada como coisa banal, algo generalizado. Só que o tamanho da grana causa perplexidade: quase R$ 4 bilhões de 2006 até 2016. Milhões para um, milhões para outro, envio de propina em sacolas, depósitos em contas no exterior e, pasmem, até uma conta de R$ 40 milhões para uso do ex-presidente Lula, de onde o ex-ministro Antonio Palocci costumava sacar grandes nacos. Cada caso é um caso A lista é longa e será investigada, caso a caso. Dos 98 sob a esfera do STF, 67 são acusados de cometer crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. Os 31 restantes são acusados de crimes de falsidade ideológica eleitoral, o tal do caixa 2, que teriam penas menores. Essa turma confia na tradição. De 2011 até 2016, nenhum político foi condenado por esse crime, o que levou os casos até então existentes à prescrição. Outros 200 casos foram encaminhados a outros foros e instâncias por ausência de foro privilegiado. Prescrição Lembrete: o crime de corrupção prescreve depois de 20 anos para quem é funcionário público e em 16 anos para outros tipos de réus; a lavagem de dinheiro prescreve após 10 anos; e o de caixa 2, em 12 anos. A OAB está sugerindo que o STF conte com uma força-tarefa (juízes auxiliares) - como aconteceu por ocasião do mensalão - para dar conta do recado. O STF julga mais de 100 mil casos por ano. Só o ministro Fachin acumula em seu gabinete 4.206 processos. Cobertura da TV Globo A cobertura da Lava Jato causa mais impacto com a cobertura da mídia eletrônica. O fato de o Jornal Nacional, da TV Globo, ter apresentado uma série de matérias durante toda a semana passada, com depoimentos dos delatores, ampliou a teia negativa que cobre a esfera política. Os políticos implicados foram todos moídos por um imenso rolo compressor da mais forte televisão brasileira. Não adiantou protesto de um ou outro denunciado por meio de notas em defesa. Todos saíram chamuscados. Nivelamento A esfera política tem reagido com indignação à cobertura midiática. Os políticos acusam o nivelamento dos casos. Não tem havido explicações que atenuem os casos do caixa 2 e os casos de propina, o dinheiro recebido e gasto em campanha e o dinheiro recebido e embolsado. O Ministério Público, por sua vez, age para colocar todos os protagonistas no mesmo círculo do inferno. Banalização O bombardeio diário das denúncias, ancorado em depoimento de delatores, acaba banalizando as mensagens. E os efeitos seguem para o mesmo compartimento: "todos os políticos são iguais; a política é uma roubalheira; os políticos não me representam; não vou votar mais naquele salafrário; até fulano está nessa lista?". Essas são as afirmações mais comuns que se extraem do processo de banalização. Até tu, fulano? O PT deve ter observado que a operação Lava Jato não faz parte de um jogo combinado para "pegar Lula". Todos os grandes e médios partidos estão dentro. Os partidos de esquerda, entre eles o PC do B, também passaram a frequentar as listas. Daí o desânimo de certos grupos - e alguns intelectuais - que tinham afinidade com os blocos da esquerda. Esse desânimo se observa até no refluxo dos movimentos de ruas. Afinal, quem sobrou como herói da galera ideológica? Protagonistas de 2018 Quem sobrará na trilha de 2018? O bombardeio sobre Aécio Neves o deixa no recôndito das feridas. Será difícil suportar os efeitos. José Serra, também baleado, ainda tem de enfrentar as dores da coluna. O governador Alckmin foi também citado, mas deverá escapar das bombas. Tem lastro para ser o candidato tucano. Lula está, a cada dia, mais perto da condição de condenado. Bolsonaro é um sinal na extremidade direita. Sem condição de avançar no espaço central. E Ciro Gomes, hein? Esse será retirado de cena pela metralhadora que guarda na boca. Marina Silva também foi citada, mas pode entrar na trilha com sua imagem de santa amazônica. Mas é frágil. Doria? Fica na sala de espera do desenlace. Ronaldo Caiado? Tem limites estreitos. ACM Neto? Figurante com pose de vice. Plebiscito e Constituinte Modesto Carvalhosa, José Carlos Dias e Flávio Bierrenbach são três juristas de alto gabarito, que merecem respeito e crédito. Ante o estado de descalabro a que chegou o país, os três, em artigo nos jornais semana passada propuseram a realização de um plebiscito para que o povo decida, soberanamente, se quer uma Assembleia Constituinte originária e independente, que teria como foco a formação de "novas estruturas para o desenvolvimento sustentável do nosso país, num autêntico Estado Democrático de Direito". A ideia é saudável e vem no momento adequado. O problema: deixaria o país totalmente paralisado. O conjunto de reformas em andamento iria para o beleléu. A ideia A Constituinte seria formada por pessoas sem cargos políticos, ou, até, por uma Assembleia Constituinte formada pelos próprios congressistas. "Esta será a única pergunta a ser formulada na cédula", dizem em seu artigo. Consumidor e convergência digital Dados divulgados recentemente mostram que os brasileiros estão cada vez mais consumindo entretenimento em plataformas diversas. Em 2016, de acordo com dados da Visa Performance Solutions, uma das atividades que mais cresceu no ambiente digital no Brasil foi a de compra de mídia via streaming em serviços como Spotify e Netflix. Fica claro que para um público cada vez mais conectado, não faz sentido nenhum restringir o acesso a músicas, filmes, séries e outros produtos de entretenimento a formatos adotados tradicionalmente, baseados em emissoras e grades de programação rígidas. Isso é coisa do passado. O que se exige agora é o poder de escolher onde, quando e qual o formato mais adequado para atender às necessidades de cada indivíduo. Fórum de Foz O Grupo de Líderes Empresariais - LIDE - promoverá, a partir de amanhã, em Foz de Iguaçu, seu 16º Fórum, o maior evento na área empresarial do país. Criado por João Doria e famoso por reunir anualmente, em abril, o maior núcleo de políticos, governantes e empresários brasileiros, o LIDE é comandado hoje pelo ex-ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, empresário Luiz Fernando Furlan. O tema central será: "Ações necessárias para a retomada do crescimento brasileiro". Previdência A cada dia, cresce a expectativa de aprovação da reforma da Previdência. O presidente Michel Temer tem feito extraordinário esforço para mobilizar sua base no Congresso. As resistências diminuem. O mote de que a reforma vai "acabar com os direitos dos trabalhadores" cai no descrédito. E dá lugar ao conceito de que a reforma previdenciária é necessária para garantir a aposentadoria nos tempos de amanhã. O governo, por seu lado, cedeu em alguns pontos, como na regra de transição, que se tornou mais flexível. Trabalhista A reforma trabalhista está sendo considerada um grande passo para a atualização da obsoleta CLT. As medidas esperadas pelo substitutivo ao PL 6.787/16, cujo relator é o preparado deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), terão reflexo nas seguintes frentes: redução da insegurança jurídica dos empregadores; aumento da produtividade no trabalho; aumento da geração de empregos e oportunidades de trabalho; redução da informalidade e do desemprego; maior oferta de benefícios aos trabalhadores; redução da litigiosidade nas relações de trabalho e maior celeridade nos processos trabalhistas e fortalecimento das redes de produção e aumento de investimentos. Este é um resumo dos impactos, na visão do consultor Emerson Casali. João Doria vai ao Papa Esse prefeito de São Paulo sabe mesmo onde banhar sua imagem. Depois de 100 dias eletrizantes, João vai ao encontro de outros mundos. Foi a Dubai convencer grandes fundos de investimento do petróleo a investir em São Paulo. Mercador ambulante, foi a Seul, na Coreia do Sul, atrair investidores e mostrar São Paulo como porta aberta aos investimentos. E nem bem chega de longa viagem - 28 horas dentro de um avião na volta - vai a Roma pedir a benção ao papa Francisco. Terá audiência com Sua Santidade. João sabe que a benção papal é um grande passaporte para abrir as portas do céu. Gengis Khan Certa ocasião, Gengis Khan foi interrogado por um dos seus companheiros mais antigos e fiéis: "Você é o soberano e é chamado de herói. Quais são as marcas de conquistas e de vitórias que você leva em sua mão?". Gengis Khan lhe respondeu: "Antes de subir ao trono do império, certa vez eu cavalgava por um caminho. Lá encontrei seis homens que se tinham colocado em emboscada junto à cabeça de uma ponte e queriam acabar com a minha vida. Quando me aproximei, puxei minha espada e os ataquei. Eles me inundaram com uma chuva de flechas, mas todas elas erraram o alvo e nenhuma me tocou. Matei todos eles com minha espada e continuei cavalgando sem ter sido ferido. No caminho de regresso, passei junto ao local onde tinha enfrentado aqueles seis homens. Seus seis cavalos vagavam por ali sem dono e eu os levei todos para minha casa". Elias Canetti, em seu clássico Massa e Poder, arremata: Nesta invulnerabilidade numa luta contra seis inimigos de uma só vez, Gengis Khan via a prova mais certa de todas as suas conquistas e de suas vitórias. Lula Pois bem, quem vê Lula se mexer de um lado para outro, preparar as armas para grandes embates nos próximos tempos, acaba chegando à conclusão: Luis Inácio sonha ser Gengis Khan. Fecho a coluna com a sabedoria do Padre Manuel Bernardes O coice do jumento Sócrates caminhava tranquilo quando um atrevido descomedido deu-lhe um coice. Estranharam alguns a paciência do filósofo, que arguiu: - Pois eu que lhe hei de fazer, depois de dado o coice? Responderam: - Demandá-lo em juízo pela injúria. Replicou: - Se ele em dar coices confessa ser jumento, quereis que leve um jumento a juízo? (Padre Manuel Bernardes)
quarta-feira, 12 de abril de 2017

Porandubas nº 525

A coluna de hoje faz a leitura dos impactos da lista do ministro Edson Fachin e descortina alguns cenários no panorama social. Trata-se de uma tentativa de entender o que se passa no Brasil. Deixo o aperitivo do mestre Leonardo Mota para fechar a coluna. Excepcionalmente. A bomba esperada A lista de Fachin é a bomba tão esperada. Coloca no mesmo barco das denúncias e investigações protagonistas de todos os espectros. Os grandes partidos lideram o ranking. A quebra do sigilo, tão clamado, deixa perfis importantes na mesma fogueira. A cúpula do mando partidário no país se faz toda presente. Vamos ver o que pode acontecer. Nivelamento O nivelamento entre os protagonistas tem o condão de gerar uma teia de solidariedade entre eles. Ninguém comemora, ninguém vibra com as dores dos outros. Oposição e situação estão no corredor das acusações. Mas, calma lá. Não se trata de corredor da morte. Os políticos têm o poder de arrumar remédios para curar a grande cicatriz. O primeiro é o alongol, a substância que sai do próprio laboratório do Judiciário. O percurso será longo. Vai correr muito até bater em horizontes que podem chegar além de 2018. Abuso de autoridade Um escudo a ser criado, agora mais rapidamente, será a aprovação da Lei de Abuso de Autoridade. Tem condição de sair logo, logo da farmácia parlamentar. Seria um remédio que teria o condão de atingir partes sensíveis dos corpos do Judiciário e do Ministério Público. Os políticos construirão, dessa forma, um escudo de proteção. Que poderão usar de imediato. Unidade proativa Um dos efeitos da bomba sinaliza para a unidade na ação parlamentar. Ao contrário do que se pode imaginar, os perfis envolvidos podem liderar um movimento por ações conjugadas no Parlamento. Em vez de esvaziamento de plenário - como ocorreu ontem - será viável o esforço para aprovar reformas. O Brasil saindo do buraco será melhor para todos. Haveria refluxo da onda de negatividade. Ou seja, a economia funcionaria como locomotiva do trem da política. O ambiente mais sadio arrefeceria o ânimo punitivo. A tese pode ser polêmica, mas se posiciona na planilha das probabilidades. Governo na liderança A lista de Fachin abre condições para o Executivo ganhar mais força na articulação. Vai ouvir, sugerir, ponderar, acalmar, arguir, convencer suas bases. Portanto, este analista observa que as reformas até podem ganhar impulso e não entrar em arrefecimento. A busca de horizontes mais tranquilos é um forte lume. Banalização Depois do primeiro impacto, a lista de Fachin tende a cair na onda da banalização. Todos iguais perante a fogueira. O horizonte de 2018 está distante. Seria possível a punição de alguns protagonistas até lá? Sim. Mas não se imagine uma grande baciada. Um ou outro. Lula? O forte depoimento de Marcelo Odebrecht, ao destacar os R$ 13 milhões repassados a Lula, deixa o ex-presidente pertinho da condenação. Vai ser muito difícil sair do ringue. SigiloHá casos que continuarão em sigilo. Deve envolver figurantes de altas Cortes do Judiciário. Outros cenários Parte I - Leitura das tendências Uma nova classe Emerge no país uma nova mentalidade, que se incrusta no meio de uma classe média mais baixa, não a clássica que abriga profissionais liberais, o pequeno e médio empresariado, os grupos de formação de opinião etc. O novo modo de pensar e agir se alimenta do pragmatismo, da procura de nichos novos no mercado de trabalho e da vontade férrea de vencer na vida. Contingentes que saíram das margens para a classe C formam o grosso dessa mentalidade. Micropolítica está no foco O interesse desses núcleos é agir em causa própria, cobrar do Estado melhores serviços, fazer a crítica mais ácida aos governos, em suma, ter como foco a micropolítica, a política das demandas prementes e urgentes. Sua preocupação não destaca prioridade para os assuntos mais gerais da sociedade - as reformas, por exemplo -, a não ser que tais mudanças tragam benefícios imediatos para a melhoria de sua vida cotidiana. Este analista não considera esses núcleos como "uma pequena burguesia empreendedora", nos termos usados pelo filósofo Mangabeira Unger na última edição de Época. Longe deles o ranço burguês. Luta de classes? Não Essa abordagem da vida é a mesma confirmada pela pesquisa feita pela Fundação Perseu Abramo, do PT, que mostrou o discurso "Nós e Eles", as elites contra os pobres, completamente fora do propósito da nova mentalidade que se espraia pelos espaços da pirâmide social. A luta de classes torna-se algo démodé, completamente estranha aos interesses da nova classe. Outros aspectos também emergem na análise dos comportamentos sociais. Vejamos. Autogestão técnica Este consultor expressa, há tempos, um fenômeno que tem animado fortes grupamentos de nossa composição social. Designo esse fenômeno de "autogestão técnica", significando a nova identidade que se impregna nas classes sociais, principalmente as que se inserem no meio. Autogestão quer dizer: capacidade de autogerir, autodeterminar, autoescolher, autolocomover-se nos espaços sociais. As pessoas expandem a capacidade de escolher, sozinhas, os caminhos da vida profissional, educacional, cultural, social. Quando falo em identidade, refiro-me ainda à identidade de grupos, categorias, gêneros ("mexeu com uma, mexeu com todas"). O avanço civilizatório, graças, insere a mulher ao patamar dos homens no capítulo da igualdade e dos direitos. "Não vai mais com as outras" O conceito "Maria vai com as outras", politicamente incorreto, cede espaço à nova abordagem: "Marias e Josés sabem o que querem, para onde ir, como agir e que meios usar para atingir suas metas". A tendência que se enxerga é a do aumento das taxas de autonomia na definição dos rumos da vida. Essa tendência tem se avolumado ao longo dos últimos anos, na esteira das denúncias, da corrupção, da lama que se espalha no território da política. Os cidadãos se afastam da esfera política e se abrigam em seus centros de referência e convivência: clubes, grupos, movimentos, núcleos, associações de todos os tipos. Arrefecimento dos grandes polos Resulta dessa tendência o arrefecimento dos tradicionais polos de poder, o poder das mídias tradicionais, o poder dos partidos políticos e, nessa sequência, até o poder das metrópoles sobre espaços menores. Noutra leitura: o poder centrípeto, que sobe das margens para os centros, ganha impulso. Os núcleos organizados passam a fazer política. O poder centrífugo perde força. O sistema de representação clássico - o Parlamento - agora é confrontado/pressionado por ajuntamentos organizados. Que agem como novas fontes de poder. Novos protagonistas No palco do poder, desfilam novos protagonistas: as mídias sociais ganhando espaço no leque de formação de opinião; analistas e intérpretes suplantando os polos difusores de informação; os líderes comunitários, nucleares, empresários e gestores competindo com os perfis da velha política; os bairros ganhando mais projeção que os centros; o jornalismo das grandes redes perdendo espaço para as análises das pequenas redes. Polarização perde força A polarização tradicional entre alas e partidos políticos perde força ante o florescimento do novo empreendedorismo que vem das margens. A tradicional disputa entre o PT ideológico e os partidos que envergam a bandeira social-democrata cede lugar ao grupo que desfralda a bandeira do pragmatismo na esfera das demandas mais urgentes: saúde, educação, segurança, mobilidade urbana, agilidade, transparência, mais ação, menos discurso. Kennedy John Kennedy: "se uma sociedade livre não pode ajudar os muito pobres, não poderá salvar os poucos ricos". Parte II Análise de interesses A CNBB saiu do casulo. Passou a combater, de púlpito, as reformas que o governo está tentando viabilizar, particularmente a reforma da Previdência. A CNBB prega que a reforma previdenciária é coisa do inferno, a castigar os trabalhadores. Os bispos estão atirando fogo contra as mudanças que o país precisa. No pano de fundo, esconde-se o temor de que a reforma ponha um fim às benesses que os credos colocam em seu bornal: imunidades tributárias e otras coisitas mas.... Reforma política Até 2 de outubro, o Congresso terá de definir as mudanças nos campos político e eleitoral, a entrar em vigor no pleito de 2018. Fundo para financiamento de campanha - algo em torno de 4 a 6 bilhões de reais - será alvo do bombardeio social; fim das coligações proporcionais é uma grande possibilidade; cláusula de barreiras para proibir a criação de siglas sem conteúdo doutrinário também se insere nas alternativas prováveis; lista fechada com os nomes de candidatos escolhidos pelas cúpulas partidárias seria uma excrescência. Mas grupos de interesses querem perpetuar seu poder. Distritão Ideia boa é o Distritão, o sistema de voto pelo qual estarão eleitos os mais votados em cada Estado. Seria o voto do eleitor elevado ao máximo de sua funcionalidade. Os nomes mais votados farão a representação. E os puxadores de votos não transfeririam suas votações. Falta vontade política para decidir por este processo. Nossa esperança Mas, como diria o sábio chinês, uma caminhada de mil quilômetros começa com um primeiro passo. E como até nos pântanos nascem lindas flores, a esperança é a de que, no meio do lodo que escorre pelos desvãos institucionais, a reforma política desça do espaço etéreo das intenções para baixar em terra firme, limpando o nosso amanhã de vendilhões da política. Um pouco de poesia Cantemos a poesia de Luiz Enriquez e Sérgio Bardotti, na versão cantada de Chico Buarque: "Deve ter alamedas verdes/a cidade dos meus amores/e, quem dera, os moradores/e o prefeito e os varredores/e os pintores e os vendedores/as senhoras e os senhores/e os guardas e os inspetores/fossem somente crianças." Economia sob alento A economia dá sinais de alento. Inflação em baixa, juros Selic descendo, alento nos investidores, perspectiva razoável que reformas sejam implementadas. Se a economia, a locomotiva, correr bem nos trilhos, o trem da política chegará a seu destino. A tendência é a de acomodação das placas tectônicas das tensões políticas quando a economia ganhar fôlego. Política sob tensão...Mas A política ainda se mantém sob tensão. A Lava Jato abre muitas interrogações, mesmo se considerando a hipótese de que os casos serão julgados sob tempos prolongados. Haverá certa distensão no ar e diluição dos processos. Uma condenação aqui, outra ali acabarão apagando fogueiras muito altas. A decisão sobre a chapa Dilma/Temer no TSE será algo muito distante. Bob Fields Roberto Campos, conhecido também como Bob Fields, exímio na arte de atirar contra a improvisação, dizia: "O Brasil tem a propriedade de, no começo, anedoticamente divertir, depois exasperar e, por fim, desesperançar aqueles que confiam na racionalidade, na procura de causas e efeitos e na sequência do discurso como sujeito-verbo-predicado." Parte III - Pílulas XXIII Conferência dos Advogados São Paulo sediará no final de novembro a maior conferência da advocacia brasileira, este ano na versão XXIII. Estão sendo aguardados mais de 40 mil advogados. O presidente Marcos da Costa, da OAB/SP, teve o apoio de seus colegas das seccionais na escolha de São Paulo. Trata-se de um evento extraordinariamente importante nesse momento de transição na vida política do país. Os advogados estão na linha de frente entre os grupamentos que formam a Opinião Pública. Mentiras O Reino da Mentira foi uma criação do senador Rui Barbosa, nos idos de 1919: "Mentira por tudo, em tudo e por tudo. Mentira na terra, no ar, até no céu. Nos inquéritos. Nas promessas. Nos projetos. Nas reformas. Nos progressos. Nas convicções. Nas transmutações. Nas soluções. Nos homens, nos atos, nas coisas. No rosto, na voz, na postura, no gesto, na palavra, na escrita. Nas responsabilidades. Nos desmentidos." Não é que o Reino da Mentira está na ordem do nosso dia a dia? Napoleão e Sherman É bom recordar as lições de Napoleão. Que dizia: faire son thème em deux façons (fazer as coisas de dois modos). O general William Sherman, que comandou a campanha de devastação durante a Guerra da Secessão norte-americana, também lembrava: "Ponha o inimigo nos cornos de um dilema." Nunca um político deve trabalhar com uma única hipótese. Atenção, protagonistas da política: tenham um plano A, um plano B e um plano C. No mínimo. Com vistas ao futuro. A morada do doutor Pedaços de historinhas do mestre Leonardo Mota. Contadas por ele. Quem entra no "Hotel Roma" de Alagoinhas, na Bahia, vai com os olhos a uma tabuleta agressiva em que peremptoriamente se adverte: Pagamento adiantado: hóspedes sem bagagens e conferencistas Também, em Pernambuco, o proprietário do hotelzinho de Timbaúba é, com carradas de razão, um espírito prevenido contra conferencistas que correm terras. Notei que se tornou carrancudo comigo quando lhe disseram que eu era conferencista, a pior nação de gente que ele contava em meio à sua freguesia. Supunha o hoteleiro de Timbaúba que eu fosse doutor de doença ou doutor de questão. Por falar em Timbaúba. Há ali um sobrado, em cuja parte térrea funciona uma loja de modas, liricamente denominada "A Noiva". O andar superior foi adaptado para residência de uma família. Eu não sabia de nada disso quando tendo indagado do Major Ulpiano Ventura onde residia o dr. Agrício Silva, juiz de Direito da comarca, recebi esta informação chocante: - O doutô Agriço? O doutô Agriço está morando em riba d' "A Noiva"...
quarta-feira, 5 de abril de 2017

Porandubas nº 524

Abro a coluna com o grande Estado do Ceará. Quintino Cunha, famoso advogado e poeta, participava de um júri em Quixeramobim. O promotor berrava na tribuna: - Senhores jurados, estou montado na lei. Quintino pede um aparte: - V. Exª. Tenha cuidado para não cair, porque está montado em um animal que não conhece. O promotor se calou. E outra historinha Está "distituído" O major José Ferreira, cearense dos bons, amigo do padre Cícero, é quem relata: "- Há muito matuto inteligente e sagaz, mas também há muito sujeito burro que se a gente amarrar as mãos dele pra trás das costas, ele não sabe mais qual é o braço direito nem o esquerdo... Eu também conheço matuto que, abrindo a boca, já sabe: ou entra mosca, ou sai besteira." O major continua a conversa: "- Quando foi criado o município de Missão Velha, a escolha do primeiro intendente recaiu num velho honrado, benquisto e prestigioso, mas muitíssimo ignorante. Cabia-lhe o encargo de declarar instituído o município. Um dos "língua" do lugar seria o orador oficial. Ele, o chefe do executivo municipal, deveria dizer simplesmente: "Está instituído o município de Missão Velha!"." Levou quinze dias decorando a frase, e, na ocasião da solenidade, exclamou: "- Está DISTITUÍDO o município de Missão Veia." __________ Entremos na política TSE vai longe Pergunta recorrente: e a cassação da chapa Dilma/Temer pelo TSE vai acontecer? Resposta invariável: SDS - Só Deus Sabe. Mas como ele emprestou a régua a este consultor, vai aqui a projeção: de 0 a 100, a possibilidade de cassação da chapa é 30. Razões: o processo será demorado; com a demora, a tendência é por diluição do caso, amortecimento da questão; a decisão sempre tem dois lados - uma abordagem técnica, jurídica, e uma abordagem política, que leva em conta o clima ambiental. 2º semestre mais ameno O clima do segundo semestre será mais ameno. A economia estará em franco processo de recuperação. A política amainará os ânimos de leões e panteras raivosas. Esse clima pesará sobre a decisão do TSE. Pode ser que a decisão ocorra antes de setembro. É possível. O mais provável é que a decisão do TSE ocorra sob dois novos juízes nomeados pelo presidente Michel. Este consultor tende a acreditar que o governo irá terminar seu mandato até 31 de dezembro de 2018. A conferir. Torcida contrária O PT tende a ficar isolado na moldura partidária. O PSOL quer distância dele. Afinal, precisa adensar o perfil de seus líderes. Tem boas figuras no partido em condição de ascender ao poder mais alto. No Rio, é bem provável que um nome do partido chegue ao governo do Estado. Que está quebrado. O PT vai eleger a senadora Gleisi como presidente. E Gleisi vai ter de rebolar para arrumar um discurso que chegue às classes médias. O PT ainda expressa o bolorento discurso "Nós e Eles". Que uma pesquisa da Fundação Perseu Abramo constatou estar bichado. Mofado. Rodrigo Maia Pode ser um candidato muito bom ao governo do Rio. A opção aos extremos ideológicos. Está se revelando um parlamentar corajoso, determinado, atualizado. E que cumpre promessas. Tem futuro. Seu pai, Cesar Maia, é um dos melhores intérpretes e entendedores dos fenômenos da política em nosso país. Lula candidato O PT luta desesperadamente para colocar Lula na caminhada presidencial. Ele não tem o que perder. A melhor coisa que pode fazer é viabilizar sua candidatura. Será a maneira para arregimentar a militância, animar os quadros partidários e ganhar um escudo contra as armas da Justiça. A melhor coisa que pode ocorrer a Lula é uma prisão. Lula, preso, fará mais que Lula solto. Tentará se vitimizar. A cadeia seria um formidável palanque. Choraria na prisão. Falaria como vítima. Discursaria como injustiçado. Lula preso será um grande candidato. Lula condenado Moro, o juiz que não cai em lorotas, tem uma alternativa embasada de sabedoria. Condena Lula, mas não manda prendê-lo. Ele, evidentemente, ditará impropérios. Mas o juiz fica firme. E a segunda instância confirma a condenação. Ou seja, Moro passaria a bola para cima. Condenado ali, Lula perderia a condição de candidato. Este analista político enxerga também essa alternativa. Como Lula não tem nada a perder, fará o impossível para garantir a sobrevida do PT. Conseguirá. Lula é quem melhor conhece os instintos de nossa gente. O petismo pode ressuscitar O PT está na lona. Tem condições de ressuscitar? Sim. Essa hipótese vale mais para cidades dos confins do território. Nas grandes e médias cidades, expande-se um índice de contrariedade que cola no PT. Que ficou demonizado. Odiado. O que, aliás, dispara tiros contrários. A militância petista reage com raiva. Por isso mesmo, podemos enxergar à distância tonéis de ódio fazendo a polarização entre petistas e os outros. O petismo nas pequenas cidades tem outra coloração. A raiva não impregna os ambientes. Alckmin e Doria Dizem que João Doria começa a trair Alckmin. Uma inverdade. João tem um pacto de lealdade com Geraldo. Conheço João Doria há 3 décadas. Trata-se de um homem sincero. É claro que se trata de um animal político. O plano A dos tucanos é Aécio Neves, que domina a máquina; o plano B é Geraldo Alckmin. E o plano C é Doria. Se Aécio e Alckmin forem bombardeados pela operação Lava Jato e/ou outras, João desponta como solução. E mais: João Doria, candidato, com um bom tempo de televisão, será protagonista importante. Na visão deste consultor, poderá chegar ao Planalto. Não se trata de mera especulação. Seu perfil integra-se ao espírito do tempo. P.S. Tudo que João fizer, estará combinado com Alckmin. Perfis de sucesso Será uma completa renovação. Gente que nunca ninguém viu estará sentado na cadeira de governador. Nunca se viu tanta vontade de mudança nos cenários político e governamental. Por isso, senhoras e senhores, aprontem-se para presenciar a maior mudança na galeria de governantes. Nomes que terão vez: empreendedores/empresários, professores, dirigentes de organizações sociais, mulheres que lideram movimentos, jovens com discurso forte, representantes de setores vitais na sociedade. Governo Temer Michel Temer sairá aplaudido do Palácio do Planalto. Fará as reformas, não todas, mas as principais. A essa altura, em menos de um ano, já pode dizer que fez a reforma principal - que limita os gastos do governo-, a reforma educacional, a reforma das relações do trabalho com a terceirização, que será complementada com o PL da reforma trabalhista. Fará uma reforma da Previdência mais modesta, porém fundamental, para abrir os horizontes do país de amanhã. Michel ainda tentará avançar nas reformas tributária e política. Vai ter seu nome na galeria dos grandes presidentes. A conferir. Serra e Kassab José Serra quer ser candidato ao governo de São Paulo. Seu vice, caso seja candidato, poderá ser o hábil e eficiente Gilberto Kassab, que está fazendo boa administração no Ministério das Comunicações. Paulo Skaf O presidente da Fiesp, Paulo Skaf, desce na escada da política. Foi com muita sede ao pote. Perdeu. Fez uma campanha desastrada. Perdeu a identidade. Nem parecia dirigente da importante Federação das Indústrias de São Paulo, nem político. Rechaçou o PMDB. É bem visto apenas por uma ala do partido. Não incorpora o espírito do tempo. O tempo passou por ele e ele não viu. Mundo novo - I A lei 13.429, sancionada no dia 31 de março pelo presidente Michel Temer, não apenas regulamenta a terceirização no Brasil, mas representa o primeiro passo para uma grande reforma trabalhista. Talvez seus críticos ainda não tenham percebido, mas o país passa a fazer parte de uma grande revolução mundial nas relações do trabalho. Mundo novo - II Ao contrário do que dizem seus opositores, trabalhadores não perderão direito algum com a nova lei. Todos os terceirizados têm carteira assinada como qualquer empregado fixo nas empresas. Depois, a tendência no mercado de trabalho nos países mais avançados é a da prestação de serviço. Que se observe, por exemplo, as áreas de tecnologia, automotiva ou da construção civil. O grito do atraso As infâmias contra a terceirização terminam, por si só, colocando-as no plano do ridículo. A sociedade mudou com as novas tecnologias e fechar os olhos a isso é condená-la ao atraso - aliás, especialidade de sindicalistas e parlamentares chegados. Liberdade para todos A nova ordem nessa revolução do mercado de trabalho é a liberdade para o trabalhador escolher o seu caminho, seja lá qual a forma de contratação. E a palavra liberdade é tudo o que os críticos da terceirização não querem ouvir. A verdade dos fatos Enfim, não custa repetir: - O marco regulatório, além de trazer segurança jurídica, propicia condição de maior longevidade para os contratos. - A rotatividade das pessoas que trabalham na prestação de serviços será reduzida, ampliando a oferta de trabalho, os profissionais especializados e o número de empresas qualificadas. - Empresas com mão de obra qualificada garantirão empregos melhores, salários e rentabilidade maiores. - Todos os direitos trabalhistas continuam garantidos. Ninguém deixará de receber 13º salário, férias, adicional de férias etc. A CLT, ao contrário do que se propaga, continua sendo um parâmetro das relações trabalhistas. Apenas normatizou-se um setor sem regulamentação. - Não haverá mais dúvidas sobre aplicação da terceirização na atividade-fim. Havia entendimentos divergentes e contratos eram rompidos ou deixavam de ser firmados, gerando grande insegurança às empresas prestadoras de serviços. O cenário vai mudar. - Apesar de comprovados benefícios que a nova lei trará para o mercado de trabalho, a terceirização tem sido alvo de insidiosa campanha nos meios de comunicação com o objetivo de confundir a população. - Mentira, versões estapafúrdias, falácia. Com essas armas traiçoeiras, grupos abrigados em algumas centrais sindicais mentem de maneira deslavada. Usam dados falsos, invertem situações e tentam manipular a opinião pública de maneira grotesca. - Seu objetivo é conhecido: continuar enchendo os cofres com os recursos que recebem do Estado e manter o monopólio sobre a classe trabalhadora.
quarta-feira, 29 de março de 2017

Porandubas nº 523

Abro a coluna com uma historinha do médico, líder político e grande figura do meu Estado, Rio Grande do Norte, José Fernandes. Por ocasião das comemorações de seu centenário, foi relançado seu livro de memórias "Nem Todos Calçam 40". Zé Fernandes foi prefeito de Pau dos Ferros por três vezes e deputado estadual por cinco legislaturas. Um burrinho baixinho? José Fernandes de Melo fazia suas campanhas à base de receitas médicas e muita verve. Por onde passava, costumava fazer uma brincadeira com os eleitores. Por ocasião de sua última eleição para prefeito, nos meados da década de 80, comemorando a vitória numa festa no meio do povo, foi insistentemente abordado por uma eleitora, que lhe pedia um burrinho para ajudá-la nas tarefas da roça. O prefeito não perdeu a chance de fazer mais uma de suas brincadeiras. "Que tipo de burrinho a senhora quer? Pode ser um burrinho baixinho, meio gordo, um pouco velho?" A mulher respondeu: "Pode ser, sim, doutor José". E ele: "Pode ser um burrinho que dá muito coice quando chegam perto dele?" A resposta foi afirmativa. O médico, ligeiro, dobrou-se, mãos e joelhos no chão, e arrematou: "Pois está aqui ele, dona Maria, pode montar." A mulher, encabulada, sob as gargalhadas do povo, saiu de fininho. (Zé Fernandes foi casado com minha irmã, Lindalva Torquato Fernandes. Ambos falecidos. Ela foi deputada estadual, prefeita de Pau dos Ferros e ministra do Tribunal de Contas do Estado. Uma mulher admirável. ______________ A história da Terceirização A coluna de hoje conta a história da terceirização no Congresso até se chegar ao PL 4302/98. Retas e curvas, idas e vindas, articulações, audiências no Congresso Nacional, chegada do grupo que luta há 20 anos pelo marco regulatório da terceirização no país. Com muito orgulho, este consultor trilhou essa jornada desde seu início. O início da luta A defesa da terceirização começou lá trás, nos idos da Assembleia Nacional Constituinte de 1987. Na época, o enunciado 256, do TST, classificava de ilegal a prestação de serviços a terceiros. Uma movimentação junto aos deputados constituintes da época liderada pela APREST, a associação que abriu os caminhos da luta, resultou na exclusão de um artigo que proibia a atividade na Constituição. O PL de Carvalho Na Constituinte, o deputado Augusto Carvalho, com origem no Sindicato dos Bancários, liderou o movimento contrário à terceirização. Com a retirada do artigo que proibia a prestação de serviços a terceiros na Constituição, Carvalho propôs um projeto de lei com o mesmo fim: acabar com a terceirização no país. Naquele tempo, os projetos iam primeiro para a CCJ com o propósito de avaliar se o texto proposto era constitucional ou não. O projeto de lei foi aceito. A terceirização estava novamente na mira da proibição. Figura de proa, sempre afinado com o ideário do setor, foi o então deputado José Maria Eymael. Um guerreiro. Temer e Ataliba O projeto foi para a comissão e teve como relator o deputado João Hermann (falecido), de Piracicaba, que proibia, em seu relatório, a terceirização. Portanto, aprovava o projeto de Carvalho, de nº 1.898/89. O setor procurou o deputado Michel Temer, da Comissão de Constituição e Justiça. Que, por sua vez, se amparou em denso parecer jurídico de um colega de escritório de advocacia, o constitucionalista Geraldo Ataliba. Com este parecer, encomendado na época por Amâncio Baker e Ermínio Alves de Lima Neto, então presidente e vice-presidente da APREST, Michel fez um voto em separado que derrotou o relatório. Por unanimidade. O calendário marcava: 23 de novembro de 1989. Foi a segunda grande vitória do setor. Mais um PL contrário Na época, as maiores forças políticas se agrupavam no PMDB. A derrota do PL de Augusto Carvalho significava, de certa forma, a derrota da esquerda que não queria a terceirização. Finda a Constituinte, Carvalho, não satisfeito, entrou com novo projeto proibindo a terceirização. E outros vieram na sequência. Até se chegar ao governo FHC. Acordado sobre o legislado Envergando a bandeira neoliberal, FHC tinha, entre suas propostas, a questão do acordado sobre o legislado. Nascia, sob essa embalagem, o PL 4.302. O contrato por prazo determinado confundia-se com o trabalho temporário, razão pela qual o ministério do Trabalho, atendendo ao pleito dos dirigentes, elaborou o PL 4.302. O Ministério era comandado pelo ministro Paulo de Tarso Paiva e tinha como secretário executivo o hoje senador Antonio Anastasia. Prorrogação do TT Com Anastasia, o setor deu mais um passo adiante. Foi ele o autor do PL 4.302. Conseguiu-se com ele que o contrato de trabalho temporário fosse prorrogado automaticamente via portaria. E mais: ele assumiu o compromisso de enviar ao Congresso modificações na lei 6.019, aumentando o prazo do TT justamente para não haver concorrência com o trabalho por tempo determinado. Essa reivindicação do setor foi atendida. A outra parte do PL incluiu a prestação de serviços a terceiros. Meneguelli O projeto 4.302/98 teve inicialmente como relator o deputado do PT, Jair Meneguelli. João Renato de Vasconcelos Pinheiro, então presidente do Sindeprestem, participou ativamente das discussões do relatório do deputado Meneguelli. O projeto de autoria de Anastasia foi totalmente modificado por Meneguelli em atendimento às exigências feitas pelo movimento sindical, na época representado na Comissão de Trabalho pelos deputados Jair Meneguelli, Paulo Rocha e Chico Vigilante, então presidente do PT e da CUT de Brasília. Um substitutivo foi aprovado na Câmara. Este texto, por sua vez, também foi sensivelmente modificado pelo relatório do Senado, que aprovou outro substitutivo. Quem mais trabalhou nesse relatório foi o senador Moreira Mendes, que tinha como seu braço direito o eficiente João Figueiredo. No Senado No Senado as discussões mais fortes, e que modificaram o substitutivo da Câmara, aconteceram na Comissão de Assuntos Sociais e Econômicos. Tiveram ativa participação o então presidente do TST, ministro Almir Pazzianotto, o presidente do TRT/SP juiz Francisco Antonio de Oliveira, do prof. José Pastore e o então presidente da CUT, João Felício. Através de requerimento do senador Eduardo Suplicy, o ministro do Trabalho Paulo Paiva também foi ouvido na CAS. Vale salientar ainda a participação da senadora Heloisa Helena nos debates, inclusive apresentando várias emendas ao projeto. Mabel O PL volta à Câmara com o substitutivo do Senado. Importante ressaltar que permaneceram intactos os benefícios originais: tratamento de segurança, saúde, insalubridade, atendimento médico e de refeição disponíveis nas instalações da contratante. Na época, foi bater na Comissão de Trabalho, onde teve como relator o então deputado Sandro Mabel. O relatório de Mabel, após acordo com PT, liderado por Paulo Rocha, foi aprovado por unanimidade com apenas uma abstenção, do deputado Paulinho da Força. O acordo foi para liberar a atividade fim, mas com responsabilidade solidária. Em 2003, depois de tomar posse, Lula pediu que a Câmara devolvesse o PL à presidência, eis que era uma iniciativa do Executivo. A Câmara recusou, alegando que, àquela altura, o PL fazia parte da agenda parlamentar. Idas e vindas O PL atravessou um longo corredor legislativo, a partir de muitas audiências públicas, inclusive no TST. Depois de certo tempo, Mabel, deparando-se com muita pressão do movimento sindical e de certos intelectuais de esquerda, decidiu ele mesmo criar um novo projeto, e assim apareceu o PL 4.330, este que se encontra no Senado sob a designação de PLC 30. E que tende a entrar em votação por decisão do presidente Eunício Oliveira, seguindo os trâmites normais. Prometeu não apressar. A Câmara na frente Mas o PL 4.302/98 ganha a preferência do setor. Que foi à luta, com a ajuda de empresários, parlamentares e com a nossa contribuição. As fechadas portas do Poder Executivo, durante todo o ciclo do petismo, foram finalmente abertas. O setor em peso pôde comparecer em reuniões no Palácio do Planalto, em audiências públicas, ganhando o PL adesões e força contando com a estreita colaboração de Ermínio Neto. O deputado Laércio, após intensa negociação política, assumiu como membro da CCJ, o que viabilizou sua indicação como relator do PL 4.302. Contou com o apoio inestimável de Erminio Neto. Grupo de líderes O presidente da Fenasserth e do Sindeprestem, Vander Morales, que esteve na frente de todas as movimentações, desde o início da tramitação do projeto, fez articulações para integrar todos os setores. E assim, Aldo de Ávila Jr., tradicional liderança do setor de Asseio e Conservação, Rui Monteiro, presidente do SEAC/SP e diretor da Febrac, João Diniz, que hoje preside a Cebrasse, e que representa o Sesvesp, deram vigor ao grupo. O forte setor de telecomunicações, representado por Vivien Suruagy, também integra o grupo de líderes. A área laboral também se faz presente, por meio do Sindeepres, capitaneado por Genival Beserra. Seu sindicato é a maior expressão de representação de trabalhadores terceirizados do país, com uma base que chega a 900 mil pessoas. Tive a satisfação de participar de modo intenso desse grupo. Grupo ampliado O grupo inicial composto por empresários e associações do setor passou a ser adensado. Nos últimos tempos, somaram-se ao grupo convidados representantes de importantes confederações/federações, como a CNI, CNC, CNF, CNA, CNS, Febraban, Fiesp, para participar dos eventos que culminaram com a inserção do PL 4.302 na agenda da Câmara. Marinho E assim, na tarde de 22 de março, viu-se coroado o processo de debate e votação de um dos mais importantes projetos para a alavancagem do emprego. Ressaltamos o apoio fundamental da Frente Parlamentar em Defesa do Comércio e Serviços, liderada pelo ativo e preparado deputado Rogério Marinho, hoje relator do projeto de Reforma Trabalhista, central na estratégia de modernização das relações de trabalho. Ministros Dois ministros se envolveram de maneira intensa no ideário dos serviços terceirizados e do trabalho temporário: Eliseu Padilha, da Casa Civil, e Antônio Imbassahy, da Secretaria do Governo. Ambos receberam o grupo de líderes do setor, mantendo contato estreito com seus articuladores. Abriam as portas de seus Ministérios para ouvir sugestões, debater, sugerir. Duas grandes figuras de destaque na articulação política. Maia Firme O último capítulo dessa história foi escrito por Rodrigo Maia! Corajoso, determinado, consciente de seu histórico papel na luta para fazer o Brasil avançar! Foi decisiva sua iniciativa de votar o PL 4302! Por isso, o setor o aplaude em pé! Viva o presidente da Câmara!
quarta-feira, 22 de março de 2017

Porandubas nº 522

Abro a coluna com a raposice de Churchill O primeiro ministro inglês fazia um discurso mordaz quando um aparteador, saltando do lugar para protestar, só conseguiu emitir sons abafados. Churchill observou: - Vossa Excelência não devia deixar crescer uma indignação maior do que a que pode suportar. Em outra ocasião, estava sentado, sacudindo a cabeça de maneira tão vigorosa e perturbadora que o orador gritou, afinal, exasperado: - Quero lembrar ao nobre colega que estou apenas exprimindo minha própria opinião. Ao que Churchill respondeu: - E eu quero lembrar ao nobre orador que estou apenas abanando a minha própria cabeça. ________ Mas o sábio José Maria Alkmin não fica para trás em matéria de raposice política. O mineiro nunca perdia a tirada. O eleitor chegou aflito: - Doutor Alkmin, meu filho nasceu, eu estava desprevenido, não tenho dinheiro para pagar o hospital. A matreira raposa tascou: - Meu caro, se você que sabe há nove meses, estava desprevenido, calcule eu que soube agora. Boicote à carne O Brasil já começa a sofrer as consequências da operação Carne Fraca. China, Europa, Chile e Coreia do Sul já começaram fechar fronteiras à carne brasileira. O baque é impactante, eis que a China, por exemplo, é o maior importador de nossa carne. O episódio começa a ser delimitado. Vai demorar para que os importadores afastem as barreiras. O ministro Maggi, da Agricultura, e os comandantes das entidades do setor pecuário tentam mostrar que o caso não tem a dimensão que está sendo dada. O escarcéu A PF armou imenso aparato para orquestrar o caso. Fez a maior operação de sua história. Vê-se, agora, que menos de 30 pessoas aparecem como suspeitas. E, entre mais de 4 mil fornecedores, pouco mais de 20 empresas estão sendo investigadas. Se o caso não tem a grandeza com que é tratado, por que tanto barulho? Há interesse em desestabilizar o governo? Essa é uma pergunta que desafia gregos e troianos. A carne fatiada Vejamos algumas razões que devem ter inspirado a operação Carne Fraca: 1. O ambiente investigatório por que passa o país; 2. Certa disputa entre PF e Ministério Público, cada qual tentando mostrar sua performance para a sociedade; 3. O escracho por que passam os políticos; 4. A politicagem responsável pela indicação de nomes para comandar setores do Ministério da Agricultura; 5. A autonomia da PF para fazer operações, que vem se tornando mais forte no ciclo da Lava Jato (fazendo com que seu dirigente não dê conta dos fatos a seu superior); 6. O fato de o recém-nomeado ministro da Justiça, Osmar Serraglio, ter tido conversas gravadas; 7. Interesses de grupos em boicotar o atual governo. Rigor Os gigantes do setor de carne, principalmente a JBS e Friboi, em imensos anúncios publicitários, destacam o fato de estarem entre os maiores exportadores de carne do mundo, incluindo os países mais exigentes no quesito controle de qualidade. É certo que se os importadores importam carne brasileira, é porque adotam rigorosos padrões de exigência e controle. As empresas brasileiras, por seu lado, tiveram de investir milhões de dólares para implantar os mais avançados sistemas de apuração de qualidade. Mesmo assim, o Brasil passará por uma quarentena, tempo para apuração das irregularidades. Denúncias O affaire da carne nos traz preciosas lições: a. os controles devem ser bem ajustados; b. deve-se evitar indicação política em áreas vitais e que podem trazer dissabores como a de alimentos; c. o Brasil deve reforçar os padrões de segurança alimentar; d. a transparência será um item a ser rigorosamente cumprido pelas empresas do setor; e. as empresas deverão investir em programas de relações públicas e em eventos que possam demonstrar os seus padrões de segurança e controle. Reforma Trabalhista: 4302/98 Em pauta na Câmara o PL 4302/98, que trata da Terceirização e do Trabalho Temporário. Trata-se de um projeto dos tempos de FHC. Passou pela Câmara, foi ao Senado e voltou para a Câmara. Seu último relator é o deputado Laércio Oliveira, do Solidariedade/SE. Atende as demandas do setor, eis que permite terceirização nas atividades fim e nas atividades meio, abarcando, ainda, as áreas privada e pública. E prevê a responsabilidade subsidiária das empresas. Mesmo que o governo designe Reforma Trabalhista seu Projeto de nº 6787/2016, a ser votado mais adiante, este PL 4302 abre, sim, a reforma trabalhista. Reforma Trabalhista: 6787/16 Já este PL 6787/16 prevê, entre outros mecanismos, a questão do acordado sobre o legislado e a extensão do prazo do Trabalho Temporário. O relator é o corajoso e preparado deputado Rogério Marinho, do PSDB/RN. Que promete aumentar o objeto do projeto, fazendo com que absorva as novas modalidades de trabalho, como o trabalho intermitente, as atividades abertas pelo sistema Uber, entre outros. Deve, ainda, deixar como facultativa e não obrigatória da contribuição sindical. Marinho e Daniel Vilela, este presidente da Comissão, já realizaram 10 audiências públicas. Deve entrar na pauta de votação até maio. Marinho: aparelhamento Um dos pontos mais controversos do PL 6787/16 é a prevalência do acordado sobre o legislado. Marinho pensa que, fortalecendo o conceito de negociação, o empregador terá mais segurança para dialogar com seus empregados e continuar contratando. "Historicamente os acordos têm sido contestados pela Justiça trabalhista. Com isso o mercado de trabalho vai se fechando, pois não há segurança jurídica para garantir que será cumprido o que foi combinado". Além disso, o relator acha que o sistema sindical brasileiro é distorcido. "O aparelhamento do sindicalismo deturpou sua função. O Brasil tem mais de 17 mil sindicatos, enquanto a Inglaterra, berço do movimento sindical, possui 168. A pulverização faz com que percam a representatividade aqueles que de fato sentam para negociar". Reforma Trabalhista: PLC 30 A reforma trabalhista também é objeto do PLC 30, que se encontra no Senado. Este projetou saiu da Câmara como o PL 4330. No Senado, foi todo retalhado pela faca do senador Paulo Paim, do PT/RS. Tira o setor público da terceirização (aliás, o setor que mais problemas apresenta), tira as atividades fim do projeto, desvia as contribuições para os sindicatos predominantes que atuam nas empresas tomadoras de serviços, estabelece a responsabilidade subsidiária, etc. Esse projeto também poderá ser votado. Se assim ocorrer, caberá ao Executivo avaliar os pontos de cada projeto e vetar o que achar inconveniente para o mercado de trabalho. Trabalho temporário Como ficará a questão do trabalho temporário, se os PLs 4302 e 6787 forem aprovados? A pergunta tem sentido, eis que ambos contemplam questões relativas ao trabalho temporário. O relator dá a resposta: se o PL 4302 for aprovado, tende ele a suprimir do 6787 a parte relativa ao TT. A questão pode parecer resolvida. Mas essa modalidade de trabalho já conta com uma lei, a 6.019/74. Que dá todas as diretrizes para o setor. Nesse caso, os setores envolvidos haverão de chegar ao bom senso e propor ao Executivo formas para evitar superposição de normas. Terceirização Já para a terceirização, o marco regulatório haverá de abrir um ciclo de segurança jurídica para o setor. As empresas, hoje, andam sobre o fio da navalha, reguladas por uma súmula do TST, a de número 331, voltada para separar atividades meio (onde pode ser feita a terceirização) de atividades fim (proibidas para efeito de terceirização). Ocorre que a visão que separa as atividades está completamente defasada. O que é atividade fim de uma indústria automobilística, onde centenas de fornecedores fabricam componentes que são encaminhados para uma central montar o automóvel? Essa pergunta sem resposta faz os fiscais do Ministério Público do Trabalho encherem a caneta para multar empresas. E tome multa. A decisão do STF A propósito, o STF deverá pôr sua colher nesse caldeirão, ao votar o caso Cenibra, uma empresa de reflorestamento que questiona a multa de cerca de R$ 1 bilhão por ter, pretensamente, terceirizado uma atividade-fim (corte e plantio de árvores). Há um voto ainda não pronunciado do ministro Luiz Fux, enquanto o ministro Barroso prepara seu parecer sobre um caso congênere que lhe chegou às mãos. Saindo da Idade Média Ufa, se o projeto da terceirização for aprovado nos termos expressos pelo relator Laércio Oliveira, o país estará dando um imenso passo na direção da modernidade. Sai da Idade Média para a modernidade do século XXI. E ainda veremos o enquadramento de grupos de fiscais acostumados a pendurar faturas sobre os vãos dos empreendimentos. DNA da corrupção I Costumo dizer em minhas palestras: o DNA das 15 capitanias hereditárias em que o Brasil foi dividido, entre 1534 e 1536, por D. João III, se faz presente hoje nas 27 unidades federativas e nos 35 partidos políticos. Esses funcionários que aprovavam ilícitos no Ministério da Agricultura, causando danos irreparáveis ao país, traduzem a invasão do espaço público pelo interesse privado, coisa que remonta à Colônia. DNA da corrupção II O sistema montado para evitar desmandos na administração pública não funciona? Esse é o outro lado da moeda. O aparato contra a corrupção é exemplar. Procura-se tapar todos os buracos. Avançamos com a Lei de Responsabilidade Fiscal. Instrumentos anteriores nem são lembrados, a partir da Constituição. O art. 37 reza sobre a administração pública direta e indireta nas esferas dos Poderes, pregando os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Coisa bonita de ler. DNA da corrupção III O decreto-lei 201/67 estabelece a responsabilidade de prefeitos e vereadores. Quem se lembra dele? A lei 8.027/90 expõe normas de conduta de servidores públicos civis. Poucos a conhecem. A lei 8.429/92 regula as sanções aplicáveis aos agentes públicos em casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo e função na administração pública. É letra morta. E a lei 8.730/93 trata da obrigatoriedade de declaração de bens e rendas para o exercício do cargo. DNA da corrupção IV Ao lado do cipoal legal, há, também, nomes respeitados defendendo a bandeira da moralização. Há o Ministério Público, que funciona como o quarto Poder no país, procurando pegar desmandos gerais dos Poderes, fiscalizando o cumprimento das leis e, claro, fazendo muito teatro. Há Comissões Parlamentares de Inquérito, sob responsabilidade do Poder Legislativo, instrumento que geralmente acaba contaminado por vieses partidários. Vale perguntar: se há leis, figuras respeitáveis para torná-las eficazes e até disposição política para se implantar o império da lei e da responsabilidade, por que a corrupção no país continua forte no Brasil? É mesmo uma questão de DNA?
quarta-feira, 15 de março de 2017

Porandubas nº 521

Abro a coluna com um dos fundadores da velha UDN. O poder é como a água 1945. O Brasil inaugura a redemocratização. Hermes Lima, fundador da UDN, deputado constituinte, ex-presidente do STF, foi ao Nordeste conseguir apoio de democratas ilustres para fundar outro partido, o Partido Socialista Brasileiro. Em João Pessoa, procurou Luís de Oliveira: - Luís, o socialismo é como aqueles gramados dos castelos da Inglaterra. Cada geração dá por eles um pouco de si. Um jardineiro planta, o filho cuida, o neto poda. E vai assim, de geração em geração, até que, um século depois, torna-se o que é. - Doutor Hermes, me desculpe, mas não vou entrar não. Gosto muito do socialismo, mas vai demorar muito. Eu quero é o poder. E o poder é como água. A gente tem que beber na hora. (Da verve do amigo Sebastião Nery). Escola para quê? O presidente Dutra tinha um auxiliar capixaba, oficial do Exército, gago. Quando Dutra dava uma ordem, ele ficava mais gago ainda. Resolveu dar um jeito de curar a gagueira. Soube que o Méier tinha uma escola para gagos, tocou para lá. O endereço que levou não coincidia. Procurou no bairro todo, nada. Foi ao português da esquina, desses de bigode e tamanco, cara de quem desceu na praça Mauá: - O sesenhor popopodia me inininformar se aaaqui temtem uma escola para gagagago? - Mas o senhor já fala gago tão bem, para que quer escola? (Do acervo do imperdível Sebastião Nery). Lista de Janot O procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, encaminhou ao STF 83 pedidos de inquérito e outros 211 para instâncias inferiores, que abrigariam cerca de 400 nomes. É o que se diz. O STF deve ficar com os nomes que têm foro privilegiado e devolver à 1ª instância os outros. Há um clima de expectativas no Planalto Central. Quanto maior... A tese que ganha corpo é a de que quanto maior o número de envolvidos, melhor para todos. Porque os efeitos se distribuiriam horizontalmente, os impactos sobre alguns nomes seriam diluídos e amortecidos, e, acima de tudo, porque a montanha de nomes demandaria oitivas e oitivas, provas e contraprovas, fazendo rolar a lista de Janot quilômetros à distância. Abertura de sigilo Ganha corpo a quebra de sigilo dos casos que chegarão ao STF nos próximos dias, talvez ainda esta semana. A decisão será do ministro Edson Fachin. A classe política defende a abertura das informações sob o argumento de que, sabendo onde e como estão arrolados, os envolvidos já começariam a prover suas defesas. Com isso, seriam evitados vazamentos, que tendem a ser mais sensacionalistas e a provocar celeuma nos ambientes da representação e do governo. Janot desperta ira Janot começa a despertar ira entre seus pares pela sinalização de que gostaria de ganhar mais um mandato na Procuradoria. Há gente na fila que quer tomar seu lugar. A permanência de Janot dependerá de suas próximas decisões? Essa é a pergunta que se apresenta na esfera política. Deixemos a resposta ao crivo dos leitores. Congresso inerte? Como as Casas congressuais reagirão à lista de Janot? A tese mais comentada é a de que tenderiam a certa inércia, mostrando desinteresse do corpo parlamentar para as matérias que constam da agenda. Seria isso muito ruim para o Executivo. Os parlamentares gostariam mesmo de agir em sua defesa, o que apontaria para uma pauta que contemplasse seus interesses, como, por exemplo, a anistia ao Caixa 2. DNA da cultura A propósito, nos últimos dias tem sido fortalecida a ideia de que o Caixa 2 faz parte do DNA da política nacional. Cresce o número de importantes fontes que deixam o Caixa 2 suavizado. Trata-se de uma ilegalidade, afirmam, mas não necessariamente é o cofre da corrupção. Gilmar Mendes, ministro do STF, e José Eduardo Cardozo, ex-ministro da Justiça e ex-advogado da ex-presidente Dilma, são duas ilustres figuras que expressam essa visão. Se a tese vingar, parcela ponderável da classe política sairá do caldeirão fervendo para a panela de água morna. Repatriação O Senado aprovou o novo projeto de repatriação de recursos. Ele deverá trazer uma boa bolada de dinheiro, algo entre R$ 15 a R$ 20 bilhões. Continuam as restrições à repatriação de recursos de familiares de políticos. A sequência das reformas A agenda do Executivo está fechada com esta sequência: primeiro, a PEC do Teto (aprovada); segundo, a reforma educacional com foco no segundo grau (aprovada); terceira, o primeiro momento da reforma trabalhista, com a votação na Câmara do PL 4302 (especialização de serviços/terceirização) e votação do PLC 30 no Senado (mesmo teor). Na Câmara, o presidente Rodrigo Maia quer colocar em pauta dia 21 de março; no Senado, a votação seria logo depois. Na quarta etapa, a segunda parte da reforma trabalhista (PL 6787/16), que tem relatoria do deputado Rogério Marinho. Trata de coisas como o acordado prevalece sobre o legislado e estende os prazos do Trabalho Temporário. A montanha Na quinta etapa, os congressistas subirão ao pico da montanha, escalando a Reforma da Previdência. Que será a mais complicada e a que mais recebe críticas da sociedade. Pelo andar da carruagem, o governo deverá ceder em alguns pontos para que o Congresso aprove a reforma possível, não a ideal. A base governista começa a ser instrumentalizada com dados e informações de modo a compreender o corpo das propostas. Essa reforma deverá entrar em pauta em junho ou mesmo julho, antes do recesso. Serão essas as reformas do primeiro semestre. A grita nas ruas As ruas certamente se encherão de gente e a grita contra algumas reformas dará o tom ambiental das próximas semanas. As Centrais Sindicais continuarão a fazer barulho. Mas já não possuem o vigor de antigamente. Ademais, nem todas pensam de maneira homogênea. Os ruídos poderão fazer efeito em alguns ouvidos, mas a lógica que orienta as decisões sobre o difícil momento em que vive o país acabará empurrando o conjunto político para a decisão de fazer as reformas. A cobertura midiática É visível a divisão entre os jornalistas que acompanham as cenas política e econômica. Há, visivelmente, alguns grupos ditando a expressão: 1) o colunismo político, que assume um posicionamento contrário ao governo, enchendo seus espaços com críticas e denúncias; 2) o colunismo econômico, onde economistas dividem com jornalistas os campos da expressão, ambos, porém, expressando simpatia e apoio às medidas para resgatar a economia; 3) o colunismo partidário, ocupado por um grupo de profissionais e de meios que tomam partido sob o viés partidário; grupo engordado por alguns intelectuais que fazem questão de frequentar listas de apoio; 4) mídias sociais, onde militantes e simpatizantes abrem intensa querela em torno de perfis que admiram e/ou combatem. O voto no mais próximo O eleitor aumenta sua desconfiança na política e em seus protagonistas. É o que se infere das pesquisas. E que impacto isso terá nas urnas? Muito. O eleitor tenderá a votar em que está mais próximo dele. A proximidade é, portanto, um vetor a sinalizar tendências. O sistema de voto estará entre essas modalidades: voto em lista fechada e definida pelo partido; sistema misto, com parte de candidatos de uma lista fechada e parte aberta; distritão, em que cada Estado será um distrito, devendo se eleger os mais votados. Fundo O Parlamento mostra vontade de abrir um novo fundo partidário, formado com recursos do Estado. A cada real ofertado pela iniciativa privada, haveria correspondência da mesma quantia proveniente de recursos públicos. O objetivo é formar um fundo de R$ 4 a R$ 6 bilhões. Dará muita polêmica essa proposta. E o pior é que o Fundo Partidário continuaria normalmente. Lula a jato Lula é rápido e rasteiro nas respostas aos juízes da Lava Jato: é "quase" vítima de um massacre, quer que a Lava Jato vá fundo nas investigações, não tem nada a temer. Ontem, delações apontavam para R$ 23 milhões sendo destinados a ele. Vitimização - eis o escudo de Luís Inácio. Doria, um obstinado João Doria é um obstinado. Queria ser prefeito. Poucos acreditavam. Elegeu-se. Disse que iria governar na rua. E está indo. Prometeu acabar com as filas na saúde. Ainda não conseguiu, mas está dando passos avançados. João quer registrar seu nome na história da política como gestor. Podem anotar: vai conseguir. Candidatura em 2018? Minha velha mãe sempre diz: meu filho, nunca diga - desta água não beberei. Michel, o confessionário Como o presidente Michel Temer alcança tantas vitórias no Congresso? Com sua habilidade de ouvidor. Trata-se de um perfil afeito aos ouvidos da política. Os parlamentares conversam com ele como se estivessem no confessionário. E depois de dois padres nossos e três ave-marias, saem muito satisfeitos. Michel Temer é um exímio articulador político. Política como espetáculo I O discurso estético tem muito a ver com os recursos teatrais. Com efeito, a teatralização é imanente à política. Os atores políticos contemporâneos procuram aperfeiçoar sua performance com recursos técnicos da mídia eletrônica e do teatro. Hitler treinava a voz e os gestos. Mussolini, com sua voz de bronze e máscara imperial, espelhava-se em D'Annunzio, guerreiro-tribuno. A história antiga é cheia de exemplos que mostram os governantes posando de ator, alguns com feições de comediantes, outros encarnando o perfil de estadistas. Luís XIV, conta Schwartzenberg, fazia exibição de danças. O marechal Pétain tomava aulas de dicção para diminuir a timidez. O próprio De Gaulle dizia que "os maiores medem cuidadosamente as suas intervenções, fazendo delas uma arte". Política como espetáculo II A política está cada vez mais espetacularizada. Os políticos transformam-se em vedetes, procurando, por todos os meios, suprir a falta de carisma. E se inserem no olimpo da cultura de massas, de que nos fala o sociólogo francês Edgar Morin (Cultura de Massas no século XX). A mídia transforma os olimpianos em vedetes da atualidade, investindo-os de um papel mitológico, mergulhando em suas vidas privadas, extraindo delas a substância humana que propicia os fenômenos psicológicos da projeção e da identificação. Quanto mais alto o cargo, mais espaço na mídia, mais projeção ganha na mente dos espectadores. O charme pessoal de alguns gera um gigantesco processo de identificação. O presidente Kennedy era um exemplo de olimpiano charmoso. Política como espetáculo III O vedetismo do poder pode ser explicado pela psicologia. As pessoas percebem no ator político situações afetivas que lhe são próprias. Identificam-se com ele. E se satisfazem. Trata-se do fenômeno de autovalorização por meio de um herói interposto. Freud também explica: "A maioria das pessoas experimenta a imperiosa necessidade de admirar uma autoridade, perante a qual possa inclinar-se e pela qual seja dominada e por vezes maltratada". De outra forma, as pessoas querem acreditar no que vêem, confiando, assim, nos perfis inventados, que procuram representar a realidade. Muitas vezes, têm dificuldades em distinguir o real do falso. Os atores políticos, interpretando intuitivamente essa situação, observando o mundo ao redor, espelham o cotidiano em seus hábitos, modos de agir e até nas vestimentas. Usam a técnica da realidade espelhada. Getulianas Getúlio Vargas caprichava nas frases. Eis algumas de sua verve: - Eu não sou um oportunista. Sou um homem das oportunidades. Se um cavalo passar encilhado na minha frente, eu monto. - A Constituição é como as virgens. Foi feita para ser violada. (p.s. hoje, uma frase politicamente incorreta) - Quem não aguenta o trote, não monta o burro. - Inimigos não sei se os tenho. Mas, se os tiver, não serão jamais tão inimigos que não possam vir a ser amigos. - A metade dos meus homens de governo não é capaz de nada e a outra metade é capaz de tudo. - Quase sempre é fácil encontrar a verdade. Difícil é, uma vez encontrada, não fugir dela. - Eu sempre desconfiei muito daqueles que nunca me pediram nada. Geralmente os que sentam à mesa sem apetite são os que mais comem. - Os políticos olham muito o passado, se esquecem do presente e, principalmente, do futuro. Mas é perigoso este cacoete, pois quem muito olha para trás acaba torcendo o pescoço.
quarta-feira, 8 de março de 2017

Porandubas nº 520

Abro a coluna com mais um "causo" das Minas Gerais. Lei da Gravidade A Lei da Gravidade, de vez em quando, dá dor de cabeça aos mineiros. E a lei da gravidez, essa, nem se fala. Na Câmara Municipal de Caeté, terra da família Pinheiro, de onde saíram dois governadores, discutia-se o abastecimento de água para a cidade. O engenheiro enviado pelo governador Israel Pinheiro deu as explicações técnicas aos vereadores, buscando justificar a dificuldade da captação: a água lá em baixo e a cidade, lá em cima. Seria necessário um bombeamento que custaria milhões e, sinceramente, achava o problema de difícil solução a curto prazo, conforme desejavam: - Mas, doutor - pergunta o líder do prefeito - qual é o problema mesmo? - O problema mesmo - responde o engenheiro - está ligado à Lei da Gravidade. - Isso não é problema - diz o líder - nós vamos ao doutor Israel e ele, com uma penada só, revoga essa danada de lei que, no mínimo, deve ter sido votada pela oposição, visando perseguir o PSD. Quiproquó e status quo Há uma densa corrente de vieses, erros, versões erráticas circulando nas mídias, seja a tradicional (jornais, revistas, rádio e TV), sejam as mídias sociais na internet. Alguns colunistas, mais que análises e leituras racionais, estão praticando exercícios de tiro ao alvo. A começar pela evidente disposição de misturar alhos com bugalhos, uma coisa com outra, doações oficiais de recursos às campanhas com caixa 2, caixa 3, caixa 4, propinas, etc. O status quo do país abriga um gigantesco quiproquó. As delações Os analistas tiram conclusões a partir das delações feitas. O novelo foi puxado e os nomes aparecem em sequência, de A a Z, envolvendo partidos de todos os naipes. Uma doação oficial feita a um partido deixa de ser coisa legal para se transformar em suspeita. Os protagonistas - candidatos nas campanhas, eleitos, derrotados, partidos grandes, médios e pequenos - são amalgamados. Todos se transformam em farinha do mesmo saco. Provas e contraprovas O que se vê é uma paisagem de terra arrasada. A operação Lava Jato, que sucede na apuração de escândalos o mensalão, passou a adensar a indignação social. As denúncias se sucedem. Um nome puxa outro. Um processo de banalização dos fatos tem o condão de nivelar todas as abordagens. Não há ninguém que se salve. Ora, estamos na fase das delações. Cada caso, porém, terá de exibir provas, contraprovas, oitivas de um lado e de outro. Ocorre que o viés midiático é de pedido de condenação quando não de prejulgamento. Um exemplo: se o TSE não condenar fulano, estará se matando. Ora, esse tipo de análise é torcida. É um prejulgamento. É um tiro na cabeça dos ministros que julgarão os casos. Calma, pessoal Deixem, senhores analistas, que os juízes cumpram o rito da Justiça. Podem cobrar pressa, claro. Mas não atirem na cabeça dos magistrados. Esperemos que as Cortes cumpram a sua missão, sob os valores republicanos da ordem, da disciplina, da independência, do zelo, da dignidade. Não queiram, senhores comentaristas, substituir os juízes. Doações Os partidos políticos, por sua vez, precisam comprovar as doações recebidas. Quanto à origem dos recursos, uma grande interrogação invade os ambientes dos interrogatórios: os receptores precisam saber de onde o dinheiro saiu? De alguma obra ou projeto? Mesmo se comprovarem a entrada oficial de recursos - com a declaração ao TSE - ainda assim podem ser jogados nos caldeirões do caixa 2 ou das propinas? O ritmo da economia Há uma visível corrida entre a economia e a política. O resgate da economia acontece de forma lenta. O acirramento da crise política ocorre de forma mais acelerada. As tensões se desenvolvem ao ritmo das investigações. No caso do TSE, ao que parece o ministro Herman Benjamin quer correr de maneira acelerada a quilometragem à sua disposição: uns 100 km até outubro, data em que sairá. Se a economia der sinais de grande vigor no segundo semestre, a decisão de Herman deverá ter impacto menor. A recíproca é verdadeira. 1ª instância Mais uma interrogação se instala na República de Curitiba. A decisão do juiz Sérgio Moro de ouvir Lula em princípios de maio acelerará seu julgamento na 1ª instância? Condenado, Lula receberá o mesmo veredito na 2ª instância? A paisagem começa a exibir a cor vermelha do PT em vídeos que tentam iniciar a pré-campanha de Lula como candidato a presidente em 2018. No Nordeste, circula um vídeo muito emotivo embalando a volta de Lula, presidente. Que funciona como escudo. As massas estão sendo cooptadas para formar uma muralha de defesa de Luiz Inácio. Debate sobre ética Simulemos um debate sobre ética na política entre parlamentares e o senador Rui Barbosa. O mestre lhes diria: "Não há nem pode haver aliança entre a política e os meus interesses privados. A política é e será sempre a inimiga da minha prosperidade profissional". O parlamentar poderia retrucar: "Ética é fidelidade aos amigos". Outro arremataria: "Aos amigos, pão, aos inimigos, pau". O velho Rui, no troco, lembraria trecho do discurso de 26/12/1901, que bem poderia servir de conselho a muitos dos nossos representantes: "Vespasiano dizia que, para um imperador, decência é morrer de pé, decência é cumprir bem o seu papel". Reforma eleitoral A esfera política deverá sair da sombra e agir à luz do dia. Espera-se que as regras para o jogo eleitoral de 2018 sejam definidas logo, logo. Essas regras abrigariam, entre outros instrumentos, a cláusula de barreira, o fim das coligações proporcionais, a anistia ao caixa 2 e a formação de um fundo para financiamento dos candidatos. Esse pacote tem de ser aprovado até outubro, um ano antes da eleição. Seria mais uma montanha de dinheiro a sair dos cofres públicos. O fundo partidário continuaria imexível. Rodrigo Maia O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, é considerado um grande articulador. O sucesso da agenda do Executivo dependerá muito dele. Que tem tido coragem de enfrentar o embate na Casa que preside. Rodrigo é um nome do amanhã. E tem todas as condições para pleitear a candidatura ao governo do Rio de Janeiro em 2018. João Doria O prefeito de São Paulo continua na rota da boa avaliação. Doria tem feito o que prometeu. Trata-se de um administrador zeloso, cobrador, controlador. Está atento ao que se passa ao redor. Começa a frequentar as listas de candidatáveis no páreo de 2018. Mas é uma pessoa leal. Jamais trairá seu patrocinador e amigo Geraldo Alckmin, que será seu candidato a presidente da República. Governo do Estado Em compensação, Alckmin poderá puxar João Doria como candidato ao governo do Estado. João diz que seu único objetivo é prefeitar os quatro anos para os quais foi eleito. Mas uma das regras da política é: não existe regra imutável na política. Se o povo pedir, JD sairá a galope pelos prados governamentais de São Paulo. Aécio Neves Aécio Neves domina a máquina do PSDB. Mas é alvo da operação Lava Jato. Resistirá? Caso resista, será difícil tirá-lo da liça. Nesse caso, Alckmin teria de se habilitar em outra legenda. Serra continuará como carta importante do baralho. Saiu do Ministério, mas estará no Senado. E ajudou Aloysio Nunes Ferreira a ser ministro. Este, por sua vez, estará mais alinhado a Aécio do que a Alckmin. E Serra, caso se recupere, pode ser candidato ao governo, com Kassab na chapa como vice ou como candidato ao Senado. O PIB da corrupção O Brasil abriga, segundo pesquisa da Transparência Internacional, 26% do dinheiro movimentado pela corrupção no mundo. Há quem calcule que o Produto Nacional Bruto da Corrupção alcance metade do nosso PIB. Cidadania ativa No clássico "Considerações sobre o Governo Representativo", o filósofo inglês John Stuart Mill classifica os cidadãos em ativos e passivos, esclarecendo que os governantes preferem os segundos, por ser mais fácil dominar súditos ou pessoas indiferentes, mas a democracia necessita dos primeiros. E aduz: "os súditos podem ser transformados em um bando de ovelhas que se dedicam tão somente a pastar uma ao lado da outra". Norberto Bobbio arremata a ideia com este sarcasmo: "e as ovelhas não reclamam nem mesmo quando o capim é escasso". A imagem calha bem nesses tempos turbulentos que o Brasil atravessa. Primeiro, pela constatação de que se expandem no território os grupamentos de cidadãos ativos. Um intenso processo de conscientização social se espraia por todas as camadas, inclusive as que habitam os porões da miséria. A era digital A era digital nos traz um mundo interligado. Se jornais e revistas tinham como caixa de ressonância as colunas de leitores, hoje as redes sociais se prestam a ser gigantescas tribunas para comentários, análises, posicionamentos e opiniões. Os efeitos se fazem ver na extensão da conscientização crítica, no controle das tarefas de governantes, nas demandas de grupamentos, em suma, em amplo controle da representação política e dos próprios Poderes constituídos. O fato de um alto ministro da mais alta Corte do país, o Supremo Tribunal Federal, poder ser criticado logo após proferir um voto, era algo inimaginável anos atrás. Agora, a mais alta autoridade pode acompanhar tudo que se diz sobre ela nas redes sociais. Equação F+C+M+R em mudança Trata-se de uma mudança no fluxo informacional: as fontes, antigamente muito limitadas, se multiplicam por todos os espaços. Cada internauta pode ser fonte de informação e análise. Ou seja, a antiga equação da comunicação - F+C+M+R (Fontes, Canais, Mensagens, Receptores) - ganha nova leitura: as fontes encontram na rede tecnológica um leito natural para manifestar expressão, condição que só poucos continuam a ter na mídia tradicional (jornais, revistas, rádio e TV).
quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

Porandubas nº 519

Abro a coluna com uma historinha de Tancredo Neves Durante a campanha pelas Diretas Já, em 1983/84, o jornal Folha de S.Paulo transformou o assunto em sua bandeira, até com uma fitinha verde-amarela no alto da primeira página. Noticiário e editoriais davam como garantida a vitória da emenda que devolvia ao país as eleições diretas para presidente da República, depois de 20 anos de ditadura - a emenda Dante de Oliveira. O jornal cantava a vitória e abria fotos do povo nas praças. A contagem a favor só crescia. Seu concorrente o Estado de S. Paulo era mais sóbrio e cauteloso e tinha lá seus motivos. Um deles, um informante especial em Brasília. Ao ser questionado sobre a contagem da Folha, que dava mais de cem votos a favor da emenda, o informante deu uma boa risada ao telefone e completou assim a conversa : - Meu filho, fique tranquilo, eles não sabem contar. Era Tancredo Neves. Delenda Politica Est "A política deve ser destruída". Delenda Politica Est. "A política é lama". "A política é corrupção". "Os políticos são bandidos". "Os políticos devem ser enxotados das nossas instituições". Este analista político chama a atenção para estes conceitos que se espraiam pelo território, invadindo o sistema cognitivo de pessoas de todas as classes sociais. Trata-se de um sentimento que se generaliza no país. Nunca assisti, em minha trajetória profissional, tanta execração à política e a seus participantes. Pois bem, temos de dar um basta a essa enviesada abordagem. Pois a política é e sempre será instrumento em prol do desenvolvimento da sociedade. Política : o bem comum Em sua obra intitulada Política, Aristóteles insere no conceito de política tudo o que se refere à cidade, por consequência, tudo o que é urbano, civil, público, social. A ciência política abrange o conjunto de atividades que, de alguma maneira, referem-se a polis, ao Estado. Os fins que se pretende alcançar pela ação dos políticos têm como alvo os interesses dos grupos que formam a comunidade : o bem-estar, a paz, o convívio harmonioso, a ordem pública, a prosperidade, o desenvolvimento. A política constitui, portanto, um conjunto de meios e formas a serviço do bem comum. P. S. Uma observação relevante : os integrantes da política precisam colaborar para evitar a degradação do conceito. Bom senso e linguagem adequada ajudam. A demonização da política Infelizmente, a política é associada ao mal, à corrupção, ao caos. Daí a demonização que passa a conotar o conceito. Ou seja, a política e seus protagonistas são identificados com o demônio. E por que isso ocorre ? Porque os desvios, ilegalidades, contrafações que permeiam a vida pública acabam puxando o conceito para o terreno do mal. A operação Lava Jato, o maior processo de investigação de corrupção em nossa história republicana, fará bem enorme ao país. Mas até chegarmos ao estado de limpeza ética, os integrantes da política serão levados ao cadafalso. Não se pode, portanto, confundir a política com atitudes, costumes e ações de alguns de seus protagonistas. Delenda Carthago Est O senador romano Catão, o Antigo, como era conhecido, plasmou o célebre ditado : Ceterum censeo Cartago delendam esse : "Quanto ao resto, penso que Cartago deve ser destruída". Assim também usada : Delenda Carthago est. O senador havia sido embaixador em Cartago e teve oportunidade de observar o extraordinário renascimento econômico da cidade. De volta à Roma, passou a declamar o mesmo final para seus discursos : Cartago deve ser destruída. Não podia a cidade competir com Roma. A ideia fixa : destruir E Cartago, ao final da III Guerra Púnica, em 146 a.C, foi arrasada. Roma voltou a imperar sobre o mar mediterrâneo. O refrão de Catão, o Antigo, parece se voltar contra nossa política. A ideia fixa na mente dos brasileiros é : a política e seus atores devem ser destruídos. Antes que seja tarde, temos de recolocar a política em seu berço. Sob pena de fecharmos os horizontes de nossa democracia. O reflexo de fim Em seu ensaio Reflexo de Fim, Pavlov explica : se uma pessoa quer atingir um objetivo, por não se contentar com a situação em que vive, procura algo melhor, mais atraente e, vendo que isso é impossível, cria um ideal, o seu Pássaro Azul. Essa é a origem dos mitos. Os brasileiros, no meio da crise, guardam escondidinho o seu passarinho azulado. Viés político de ministros do STF Pode um ministro do STF ter pertencido a algum partido político ? A pergunta volta à mesa do debate na esteira da nomeação de Alexandre de Moraes para ocupar um assento em nossa mais alta Corte. Pois bem : nada impede que o nomeado tenha sido filiado a ente partidário ou ter prestado serviços a partidos como advogados. A propósito, são conhecidas as ligações dos ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Luiz Edson Fachin com partidos no passado. É bom lembrar : antes da condição de ministro, um juiz porta a condição de cidadão. O que pode e não pode Mas um ministro que teve ligação com um ente partidário, em sua vida profissional, não poderá exercer o múnus nas Cortes para julgar causas de antigos clientes. Isso não é concebível. E mais : um magistrado, seja qual for seu porte, não pode se recolher como ermitão, a ponto de se isolar da comunidade política. Portanto, não deve causar estranheza o fato de um ministro das Cortes conversar com governantes ou participantes da frente política. Infelizmente, essa prática passou a ser também demonizada pela mídia brasileira. Hipocrisia. E falar fora dos autos ? É evidente que um juiz não pode se pronunciar fora dos autos sobre casos que esteja julgando. Mas nada os impede de proclamar, como cidadãos, suas visões sobre as temáticas que se inserem na agenda nacional. Fica claro que não podem expressar, de antemão, opiniões sobre temas que entrarão, mais adiante, em sua planilha de decisões. Porém, não são proibidos de manifestar seu pensamento sobre assuntos que impactam a vida social. Reformas : ou vai ou racha O governo Michel Temer está plenamente convencido de que deve avançar no caminho das reformas. Sabe que não haverá, mais adiante, condições para levar a cabo a empreitada de fazer a reforma previdenciária, a reforma trabalhista, a reforma tributária e mesmo a reforma do pacto federativo. Ou agora ou...nunca ! Temer sabe que a avaliação melhor da administração que comanda só ocorrerá lá por volta de meados de 2018. Quer passar para a história como o presidente da era das reformas. 68 anos de Sescon/SP O Sindicato das Empresas de Contabilidade e de Assessoramento no Estado de São Paulo (Sescon/SP) celebrou 68 anos de atuação em solenidade no Clube Monte Líbano, em São Paulo, na sexta-feira, 17/2. O presidente da entidade, Marcio Massao Shimomoto, fez retrospectiva do primeiro ano de gestão e reconheceu ter sido um período difícil, mas de grande aprendizado : "Com superação conseguimos nos reinventar, buscar alternativas diversificadas, experimentar coisas diferentes, desafiar o desconhecido e quebrar paradigmas com inovação e criatividade". Participaram do evento empresários e lideranças políticas, como o vice-prefeito de São Paulo, Bruno Covas, e o secretário da Fazenda, Hélcio Tokeshi. O IVA e a CPMF O governo já ensaia uma proposta sobre reforma tributária. É de autoria do deputado Luiz Carlos Hauly, do PSDB do Paraná. Abriga a criação do IVA - Imposto sobre Valor Agregado e a recriação da CPMF. O IVA também consta das sugestões a serem encaminhadas, dia 7 de março, ao presidente da República pelo Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, o Conselhão. As sugestões causarão polêmica, eis que a criação de novo imposto é tudo que a sociedade não quer ouvir. A burocracia A burocracia compromete o crescimento econômico, donde se pode constatar, de um modo geral, que o tamanho da economia informal está na razão inversa ao grau de desenvolvimento de um país. Uma regulação abundante e estrita não garante a priori melhor qualidade da produção, mas serve de pretexto para a interpretação dos dispositivos que, resultando no impasse burocrático, abrem caminhos para formas variadas de corrupção. O Brasil ainda mantém sólidas as amarras tecidas desde 1930, na esteira da formação de um pacto social voltado para a criação e operacionalização de um Estado com forte teor intervencionista. Conselhão ativo Há muito entusiasmo nos participantes do Conselhão, o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. A voz comum é : "agora, podemos falar, dar sugestões, debater, analisar. Nos tempos de Dilma, apenas ela falava e nós éramos obrigados a ouvir". O governo Temer inverteu o fluxo da expressão. A sociedade fala, o governo ouve. Por isso, os participantes do Conselhão dão elevado quorum às reuniões. Pesos pesados se fazem presentes, como Roberto Setubal, Luiz Trabuco, Jorge Gerdau, Luiza Trajano, Eduardo Eugenio Gouvêa Vieira, Roberto Rodrigues etc. Dia 7 de março, 15 sugestões do Conselhão serão apresentadas ao presidente Michel Temer no Palácio do Planalto. Efeitos das crises sobre a imagem Qual o efeito da crise sobre a imagem do Grupo Odebrecht ? Esta é uma recorrente pergunta que me fazem. Vejam bem. Os efeitos das crises sobre as Organizações/Grupos obedecem a uma escala que vai de 1 a 5 graus :  Muito graves/muito relevantes : peso 5  Graves/relevantes - peso : 4  Intensidade média - peso : 3  Suaves - peso : 2  Muito suaves - peso : 1 Os impactos se fazem sentir sobre os dois patrimônios que uma Organização/Grupo detém : a) Patrimônio tangível - composto pela estrutura física/equipamentos/domínio tecnológico. Patrimônio atingido plenamente ou em parte por eventos tempestivos (catástrofes, fenômenos naturais, incêndios etc) ; b) Patrimônio intangível - composto pela identidade, imagem e marca das Organizações, de seus produtos e serviços. O patrimônio intangível, objeto de longos anos de investimento de uma Organização em sua identidade e no conceito de seus produtos e serviços, é, muitas vezes, incalculável. Esse patrimônio junta aspectos da história de um Grupo, seus processos, condutas e práticas, enfim, conhecimento. Algumas marcas no mercado atingem um valor bem mais alto que o valor do patrimônio tangível. Tirem suas conclusões sobre a pergunta que abre esta nota. Tancredo e a esquerda Fecho a coluna novamente com o matreiro Tancredo Depois de eleito presidente da República pelo Colégio Eleitoral, em eleição indireta, Tancredo Neves começou a ser pressionado para empunhar algumas causas do PT - aliás, partido que se omitiu naquela eleição ; mas não se sabe se já era aliado de Paulo Maluf na ocasião, em 1985. A pressão chegou a tal ponto que Tancredo teve de ser duro, à sua maneira : - Não adianta empurrar, para a esquerda eu não vou.
quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Porandubas nº 518

Mata o bicho, sô Abro a coluna com a mineirice de Zé Abelha O monsenhor Aristides Rocha, mineirinho astuto, fazia política no velho PSD e odiava udenistas. Ainda jovem, monsenhor foi celebrar missa em uma paróquia onde o sacristão apreciava uma boa aguardente. Um dia, o sacristão, seguindo o ritual, sobe o degrau do altar com a pequena bandeja e as garrafinhas de vinho e água, e não vê uma pequena barata circulando entre as peças do altar. Monsenhor interrompe o seu latim e, de olho na bandeja, diz baixinho ao sacristão : - Mata o bicho... O sacristão não entende a ordem. Atônito, fica olhando para o jovem padre, que repete a ordem, agora com mais energia : - Mata o bicho, sô ! Ordem dada, ordem executada. O sacristão não se faz de rogado. Diante dos fieis que lotam a capela, ele pega a garrafinha e, num gole só, sorve todo o vinho da santa missa. No interior de Minas, "matar o bicho" é dar uma boa bebericada. (Do livro de Zé Abelha, A Mineirice). Sem blindagem Há muita leitura errada circulando por aí. Essa versão de que o presidente Michel Temer procura blindar ministros não se sustenta. Primeiro, porque a mídia cumpre papel fiscalizador. Segundo, porque a operação Lava Jato é irreversível. Não tem caminho de volta. O presidente acaba de sustentar a posição de que o governo não fará blindagem de nomes. Uma coisa é ser citado. Outra coisa é alguém virar réu. Não se segurará no governo. Citação Há mais de 100 nomes citados nas delações dos 77 executivos da Odebrecht. Serão todos réus ? Difícil acreditar nessa hipótese. Há muito disse-que-disse ou ouviu dizer nos relatos. Parcela ponderável dos citados ficará fora da operação. Os partidos, por sua vez, preparam farta documentação para demonstrar que receberam financiamentos legais dos doadores. A conferir. O cabo de guerra A imagem que se tem do país é a de um cabo de guerra. Dois grupos puxam os dois lados do cabo. Ora, um grupo avança e faz com que o outro perca alguns passos ; ora, outro grupo avança, vencendo o opositor. A impressão é a de que o grupo que puxa o Brasil para frente está ganhando a parada. Quem faz parte desses grupos ? Vejamos. O Brasil para a frente O grupo que puxa o país para adiante deixa ver alguns tipos : a) setores produtivos - empresariado que torce para a recuperação da economia ; b) classes médias, principalmente extratos do grupamento de profissionais liberais ; c) frentes políticas - representação política, particularmente os integrantes da base governista ; d) grupamentos de setores de serviços ; e) núcleos de trabalhadores que se engajam em grandes empresas ; f) núcleos da intelligentzia não cooptados pelo corporativismo da era lulopetista. O Brasil para trás O grupamento que puxa o país para trás é composto basicamente por : 1) militância petista e contingente que perdeu a sombra (ou as tetas) do Estado ; 2) grupos encastelados em algumas Centrais sindicais ; 3) parcela do funcionalismo Federal, principalmente as massas funcionais das universidades (a nordestina, principalmente) ; 4) setores da intelligentzia, ainda engajados na velha luta de classes ; 5) massas sob manobra do sindicalismo pelego ; 6) contingentes dispersos dos movimentos de rua. O discurso político Costumo bater nesta tecla. Muita gente se engana com a eficácia do discurso político. Pois bem, o discurso político é uma composição entre a semântica e a estética. O que muitos não sabem é que a eficácia do discurso depende 7% do conteúdo da expressão e 93% da comunicação não verbal. Esse é o resultado de pesquisas que se fazem sobre o tema desde 1960. E vejam só : das comunicações não verbais, 55% provêm de expressões faciais e 38% derivam de elementos paralinguísticos - voz, entonação, gestos, postura, etc. Ou seja, do que se diz, apenas pequena parcela é levada em consideração. O que não se diz, mas se vê, tem muito maior importância. O motim O motim que tomou conta das polícias militar e civil do Espírito Santo constitui uma grande ameaça. Imagine-se se a ideia pega. O dominó veria as pedrinhas caindo em outros Estados da Federação. O caos social se instalaria rapidamente. E seria muito complexa a tarefa de administrar uma conflagração geral. As Forças Armadas não estão preparadas para enfrentar um conflito com tal dimensão. Essas Forças Nacionais funcionam como um calmante passageiro. O equilíbrio político O desafio do governo Federal é o de conseguir administrar as pressões da frente política e, ao mesmo tempo, trazê-la para formar a base de apoio no Congresso. O governo teria, teoricamente, quase 400 deputados integrantes de sua base. Mas espera contar com uns 280 na hora da verdade. Um pouco mais para lá, um pouco mais para cá. O fato é que conta com o voto para fazer aprovar a reforma da Previdência e a Modernização da Legislação Trabalhista. Precarizar, verbo mofado As Centrais Sindicais se acostumaram a declinar o verbo "precarizar". Qualquer menção que se faça à modernização na legislação do trabalho, o slogan vem logo : "isso é precarização". Quando se pede para que o autor do verbo mofado decline um caso de precarização, ele fica titubeando. Não sabe o que dizer. Pois bem, a terceirização de serviços especializados não tirará um direito sequer dos trabalhadores. Que terão seu marco regulatório assegurando todos os direitos e benefícios previstos por lei. Terceirização Afinal, qual será o projeto a ser discutido e aprovado ? O PLC 30, que está no Senado depois de ter passado pela Câmara, ou o PL 4.302, que já passou pela Câmara, foi aprovado no Senado e está novamente na Câmara ? Os presidentes do Senado, Eunício Oliveira, da Câmara, Rodrigo Maia, e o novo articulador político do governo, ministro Antônio Imbassahy, vão conversar. Na visão deste analista, o PL 4.302 terá prioridade. Está pronto para receber a última votação. Espera-se que, depois de mais de duas décadas, a terceirização ganhe seu marco regulatório. Hoje, emprega cerca de 13 milhões de trabalhadores. Oxigenação Empresários do setor de serviços estão esperançosos quanto à modernização trabalhista. O momento vivido pelo Brasil é oportuno para revisão de leis. Infelizmente o Brasil alcançou a marca de 12 milhões de desempregados e a informalidade cresce a galope. Imposto sindical O deputado Rogério Marinho (PSDB-RN) tem grandes ideias para enxertar no seu relatório sobre o PL do Executivo que trata da Modernização da Legislação Trabalhista, que abriga a questão do acordado sobre o legislado e a extensão do trabalho temporário. Pretende, por exemplo, inserir outras modalidades de trabalho, como o trabalho intermitente, e a extinção do imposto sindical. A respeito desse último ponto, há muita expectativa sobre o que dirão as Centrais Sindicais. Na teoria, algumas, como a CUT, condenam esse imposto. A hora da verdade está chegando. A conferir. Lula vai pra onde ? Há duas vertentes que expressam visões sobre a posição que assumirá Lula nos próximos tempos : a) a primeira garante que Lula, agora sem a companheira Marisa Letícia, está disposto a correr o país e a reacender as velas da esperança popular. Essa vertente defende sua candidatura à presidência ; b) o segundo grupo acha que Lula não terá, doravante, ânimo para encampar grandes desafios, entre eles, uma candidatura em 2018. O que se sabe é que Luiz Inácio não está morto. Tem vez e voz no PT. E está muito certo quando lembra ao Partido que não deve se restringir ao "Fora, Temer". Defende que o PT tenha um novo projeto de país. Hartung, o rígido O motim da polícia do Espírito Santo atraiu as atenções para a expressão e as atitudes do governador Paulo Hartung. Que foi duro ao pregar penas duras aos insubordinados. Chegou a defender a expulsão de mais de 700 policiais. Disse que não negociaria com amotinados. Hartung é um economista que está governando com um olho nos cofres e uma resolução : não gastar o que não tem. Deve melhorar as contas do Espírito Santo. Por enquanto, ficará ainda no PMDB. Depois de uma licença para extrair um tumor maligno, voltou à ativa. Bons ventos na economia Indicadores econômicos divulgados recentemente reavivaram o ânimo da classe empresarial brasileira. A começar pela inflação de 0,38% em janeiro, o mais baixo índice para o mês segundo o IBGE, o país começa a vislumbrar um ambiente melhor a partir de 2017. É esperar para ver. Melhor no 2º trimestre A queda continuada da inflação resultará no aumento real da renda da população, o que reativará o consumo e, por consequência, a economia. O primeiro semestre, prevêem os analistas econômicos, será de estabilização. No segundo trimestre projeções indicam algum crescimento. O Índice de Confiança do Consumidor (ICC) subiu de 73,1 pontos para 79,3 pontos - a maior alta desde janeiro de 2006. Três historinhas Fecho a coluna com três historinhas. - Condenado à morte por corromper a juventude, Sócrates, o filósofo, recusou a oferta para fugir de Atenas sob o argumento de que seu compromisso com a polis não lhe permitia transgredir as regras. Os gregos cultivavam o respeito à lei. - Lúcio Júnio Bruto, fundador da República Romana, libertou seu povo da tirania de Tarquínio, derrubando a monarquia. Mais tarde, executou os próprios filhos por conspirarem contra o novo regime. Pregava o poeta Horácio : "Doce e digno é morrer pela Pátria". - Outro romano, rico e matreiro, conta Maquiavel no Livro III sobre os discursos de Tito Lívio, deu comida aos pobres por ocasião de uma epidemia de fome e, por esse ato, foi executado por seus concidadãos. O argumento: pretendia tornar-se um tirano. Os romanos prezavam mais a liberdade do que o bem-estar social. Quem se sairia melhor ? Os relatos sugerem a seguinte pergunta : qual dos três personagens se sairia melhor caso o enredo ocorresse dentro do cenário da política contemporânea ? O terceiro, sem dúvida. Não seria executado por alimentar a plebe, mas glorificado, mesmo que por trás da distribuição de alimentos escondesse a intenção de alongar um projeto de poder. Essa é a hipótese mais provável em países, como o Brasil, de forte tradição patrimonialista e com imensas parcelas marginalizadas e carentes.
quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Porandubas nº 517

Alexandre na 25ª hora Por que Alexandre Moraes foi escolhido ministro do STF pelo presidente Michel Temer ? Pelo que se intuía, o perfil mais adequado deveria vestir o manto técnico. Ou seja, não seria aconselhável um nome que pudesse ser colocado nos vãos suspeitos da política. E Alexandre, que já foi do PMDB, hoje é do PSDB. Por que, então, foi escolhido, quando se sabe que o presidente teria optado, até pouco tempo atrás, por um nome técnico ? Resposta : porque o fator político prevaleceu. E por quê isso ocorreu ? Risco por risco... Michel Temer é um renomado constitucionalista. Conhece bem o universo jurídico. Portanto, sabe avaliar os perfis que bateram em sua mesa. Político, domina também as engrenagens do poder. Sabe das conveniências e inconveniências que recaem sobre A, B, C, D e etc. É uma pessoa cordata. Gosta mais de ouvir do que de falar. Portanto, com esse amplo cobertor de identidade, não careceria de força persuasiva para convencê-lo sobre as vantagens de um e de outro. Daí a conclusão : a decisão foi exclusivamente do presidente. Se alguém defendia Alexandre, não foi essa interferência que empurrou Michel para a tomada de decisões. Foi a análise de risco : qualquer nome escolhido seria sujeito a pancadas. "Risco por risco, vou no rumo Alexandre." Pode ter pensado assim o presidente. O momento conturbado O momento está bastante conturbado. E vai ficar ainda mais confuso quando começarem a aparecer os nomes de envolvidos na Lava Jato. 77 delações devem apontar para mais de 100 nomes. Vai ser uma grande balbúrdia. Uma Torre de Babel. Nesse momento, urge que os governantes tenham interlocutores com os quais possam conversar. Estribados na amizade. Sem censura. Sem receios. Ora, um ministro de perfil técnico poderia provocar constrangimento na interlocução. Enquanto um ministro de talhe político pode facilitar a conversa. Estamos usando o termo interlocução. Não confundir com facilitação. Amizade Michel Temer deve ter pensado. A escolha de um ministro do STJ, Mauro Campbell, por exemplo, seria aplaudida. Por alguns. Não por todos. Os não escolhidos poderiam não gostar e querelas entre eles continuariam. Quer dizer, as divergências certamente não seriam sustadas. Portanto, a decisão de cunho político pode ter sido a mais conveniente. O presidente conhece Alexandre de longa data. São amigos. Melhor colocar um amigo do que um perfil com o qual não teria afinidade. Essas ilações são calcadas, portanto, em conveniências ditadas pelas circunstâncias. E as decisões de Alexandre ? Na hora em que o ministro Alexandre de Moraes começar a decidir será mais policiado do que os decretos do presidente Trump. Meio mundo estará de olho nele. Trata-se de um sujeito preparado. É autor de livro consagrado sobre Direito Constitucional. Não se espere decisão contaminada pela cola da amizade. Se isso ocorrer, será de forma muito sutil. Vai haver querela ? Sim. As oposições vão querer enxergar pelo em ovo. Fazem o papel. A mídia também vai fazer fortes críticas. Com o tempo, as camadas tectônicas do terremoto alexandrino serão acomodadas. E as críticas irão se arrefecer. O que sobrará ? Imagens borradas Vai sobrar coisa ruim para quem ? Para Alexandre Moraes, sem dúvida. Por um bom tempo, será considerado ministro a serviço do presidente Michel Temer. Para este, sobrarão manchas na imagem. A borrasca que se vê nas redes sociais leva sujeira para a imagem do governo. Mas essas imagens poderão ser aliviadas com os resultados positivos que o governo espera colher na seara da economia. Se a situação do país melhorar, as críticas contra Michel Temer e seu governo entrarão pelo ralo. Não ficarão na superfície. Portanto, com a economia estará a resposta final do processo. MP e Judiciário O Ministério Público e o Judiciário, principalmente a primeira instância, estarão de olho em Alexandre, que será o revisor da Lava Jato no Plenário. Mas o revisor tem papel limitado. Pode fazer suas considerações - cortes e acréscimos - mas a palavra final estará no Pleno. Ou seja, Alexandre Moraes não terá voz de comando do processo. Será uma voz intermediária. Pronomes sem importância... Matreirice mineira. Benedito Valadares chegou a Curvelo/MG para visitar a exposição de gado do município. Na hora do discurso, atrapalhou-se : - Quero dizer aos fazendeiros aqui reunidos que já determinei à Caixa Econômica e aos bancos do Estado a concessão de empréstimos agrícolas a prazos curtos e juros longos. Lá do povo, alguém corrigiu : - É o contrário, governador ! Empréstimo a prazo longo e juro curto. E assim replicou Benedito: - Desde que o dinheiro venha, os pronomes não têm importância. Rezek I Perguntei ao ministro Francisco Rezek, que participou do Plenário do STF em duas ocasiões, se acreditava na prisão de uma carrada de políticos envolvidos na Lava Jato. Disse que acreditava. Porque o Brasil está mudando. E foi enfático. No Programa Roda Viva desta última segunda-feira, Rezek falou sobre o Supremo, Lava Jato, a política e o que vai mudar. Convidado por Fernando Collor para ser ministro das Relações Exteriores, aceitou. Rezek II Para tanto, teve que renunciar ao STF. Vejam bem : renunciou, não tirou licença. Com a renúncia, perdia tudo a que tem direito um ministro do STF. Mais tarde, voltou a ser indicado. E foi para o Supremo novamente. Saiu, depois, com todos os direitos de aposentado. Ganhou um mandato de nove anos na Corte Internacional de Justiça, em Haia. Francisco Rezek é um craque. Lula afável Este analista teve oportunidade de ouvir Lula durante a visita que lhe fez no Hospital Sírio-Libanês o presidente Michel Temer, que foi dar o seu abraço de solidariedade pela morte de sua companheira, Marisa Letícia. Choroso, muito abalado, Lula foi muito afável : dispôs-se a conversar todas as vezes em que fosse convidado por Michel ; lembrou o compromisso que os ex-presidentes da República firmaram quando acompanharam a presidente Dilma ao velório de Nelson Mandela. O compromisso : trocarem ideias periodicamente. Mas isso nunca aconteceu. Foram à África do Sul - Dilma, Lula, Fernando Henrique, José Sarney e Fernando Collor. Precisamos trabalhar O brigadeiro Eduardo Gomes fazia no largo da Carioca (centro do Rio de Janeiro) seu primeiro comício da campanha presidencial de 1945. A multidão o ouvia em silêncio : - Brasileiros, precisamos trabalhar ! Do meio do povo, uma voz poderosa gritou : - Já começou a perseguição ! Bagunça geral. O comício quase acabou. Rogério Marinho O deputado Rogério Marinho, do PSDB/RN, foi escolhido pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia, relator do projeto encaminhado pelo governo para modernizar a legislação trabalhista. O parlamentar tem um grande desafio pela frente. Fazer o país avançar e quebrar os elos que o mantém atrelado à carroça do passado. Marinho pensa em puxar o PL 4.302, que trata da Terceirização e do Trabalho Temporário, para integrar o corpo da tarefa que lhe cabe como relator. Trata-se de um dos mais qualificados e respeitados membros do Parlamento Nacional. O Brasil estará antenado ao esforço do deputado. Cármen, simplicidade A presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, é uma grande figura, que continua a surpreender pela simplicidade. Foi ver o pai numa cidadezinha do interior de Minas Gerais. Chegou de avião numa cidade, parou e alugou um modesto carro. Mas se deu "ao luxo" de ir numa cafeteria para comer uma coxinha. A foto de Cármen Lucia, em pé, comendo a coxinha é a moldura da grandeza que não requer palácios e muito menos sofisticação. Essa ministra merece os nossos respeitos. E aplausos. Gilmar sob tiroteio Pelo fato de ter ido ao Palácio Jaburu e mantido uma conversa com o presidente Michel Temer, o ministro Gilmar Mendes está sendo bombardeado. A mídia acha que, pelo fato de ser ministro da Suprema Corte, Gilmar deveria ter postura de asceta, recolher-se ao silêncio dos mosteiros ou se submeter ao mais rígido controle da expressão. Esquece que ministros também são cidadãos. Como tal, não são pessoas reclusas e têm direito à expressão. Urge analisar, isso sim, seus votos na rotina da Corte. Pelo que se sabe, não há motivo para escândalos. Acórdão em São Paulo Com a inserção mais profunda dos tucanos no governo Temer, abre-se um ciclo de conversações sobre o futuro dos principais protagonistas do PSDB e do PMDB, a partir de São Paulo. José Serra voltou a se animar com a perspectiva de ser candidato ao governo do Estado numa aliança entre os tucanos e os peemedebistas. Alckmin teria a opção de ser candidato à presidência da República pelo PSB de seu vice, Márcio França. Deixaria a vaga do PSDB para Aécio Neves. Candidatos a senador em São Paulo : Marta Suplicy e Paulo Skaf. Questão : e Aloysio Nunes Ferreira ? Pode tomar o lugar do Skaf. Barão de Itararé Fecho a coluna com o Barão de Itararé : - O casamento é uma tragédia em dois atos : um civil e um religioso. - A alma humana, como os bolsos da batina de padre, tem mistérios insondáveis. - Tudo é relativo : o tempo que dura um minuto depende de que lado da porta do banheiro você está. - Nunca desista do seu sonho. Se acabou numa padaria, procure em outra ! - Devo tanto que, se eu chamar alguém de "meu bem", o banco toma ! - Viva cada dia como se fosse o último. Um dia você acerta. - Tempo é dinheiro. Paguemos, portanto, as nossas dívidas com o tempo. - As duas cobras que estão no anel do médico significam que o médico cobra duas vezes : se cura, cobra ; e se mata, cobra.
quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

Porandubas nº 516

Abro com uma pequena lição de sabedoria. O sábio estava quieto em seu canto. Uma pessoa chegou junto dele e travou a seguinte conversa :- Mestre, qual é o grande segredo da felicidade ?- Não discutir com gente idiota.- Não acho que seja esse o grande segredo.- Tem razão.SP 1º cenárioEm Brasília, começa a surgir a primeira moldura política para 2018 em São Paulo. Aliança PMDB/PSDB. Sob essa hipótese, a chapa seria : Serra para o governo do Estado ; Marta e Skaf para Senado. Isso teria como pano de fundo chapa Federal : Temer para presidente e Aécio Neves como vice. Condição, é claro : sucesso absoluto do governo Temer. Outros partidos, como o PSD, formariam a aliança. Vamos acompanhar ! E Alckmin ?Resta ao governador a alternativa de ser candidato à presidência pelo PSB do vice Marcio França. Que seria candidato a governador de Alckmin. Lava Jato a jatoA operação Lava Jato caminhará célere, ao contrário do que gostaria a frente política. A presidente do STF, Cármen Lúcia, homologou as delações de 77 executivos da Odebrecht, incluindo a de seu ex-presidente Marcelo. O caminho para a escolha do relator está totalmente desobstruído. As investigações entram na fase propriamente política da operação, suscitando dúvidas e muita inquietação. A bola, agora, está com o procurador Rodrigo Janot, que prosseguirá com as investigações. Vai examinar as provas e cada delação. A escolha do relatorTudo leva a crer que o ministro Edson Fachin irá para a segunda turma do Supremo Tribunal Federal, à qual pertencia Teori Zavascki. E a escolha do relator da Lava Jato sairia desta turma. Porém, o encaminhamento para sorteio no Plenário ainda não está descartado. A conferir.  Barão- Os homens nascem iguais, mas no dia seguinte já são diferentes.- Dize-me com quem andas e eu te direi se vou contigo.- A forca é o mais desagradável dos instrumentos de corda.A miríade de citadosA inquietação continua : quantos nomes aparecerão na relação de envolvidos ? 50, 100, 150, 200 ? Os políticos, a essa altura, preferem a alternativa : quanto mais nomes, melhor. Afinal, é mais complexa a tarefa de punir um conjunto avantajado de políticos do que um número reduzido. A banalização dos casos acabaria atenuando o impacto. A identidade das doaçõesOs políticos trabalham, ainda, com a ideia de falta de clareza quanto aos recursos que teriam sido a eles destinados. Os partidos poderiam, por exemplo, comprovar a entrada legal de recursos. Parcela dos recebimentos também poderia ser considerada "Caixa dois". Tende-se a considerar essa modalidade de financiamento de campanha com parte do "DNA" da política. A horizontalização da prática, se essa for a via principal das doações, causaria menor impacto do que a propina, que embute jogadas pesadas no vasto campo de tramóias, corrupção e interesses negociados.VazamentosPressões e contrapressões circundarão essa fase de investigações da Lava Jato. A inferência emerge naturalmente : haverá vazão de informação. Há alas que se interessam em adiantar o assunto. A mídia abrirá imenso espaço para o destampatório. Documentos sigilosos chegarão às redações. Essas conclusões decorrem do que vimos até o momento. Em todas as fases da Lava Jato, vazamentos ocorreram. Vingança, mentiras, verdadeAlguns nomes que começam a aparecer na lista da delação dos 77 executivos da Odebrecht já expressam as primeiras respostas : uns dizem ser mentirosa a delação ; outros falam em vingança por não terem atendido os pleitos de delatores na época em que os fatos ocorreram ; e um terceiro grupo tende a aceitar a ideia de que houve realmente a doação para a campanha, mas os recursos foram devidamente assinalados nas planilhas entregues aos Tribunais Eleitorais. Onde estará a verdade ?Eike e o simbolismoEike Batista, que já foi considerado o homem mais rico do Brasil e um dos 30 maiores bilionários do planeta, está preso numa cela comum do presídio Bangu 9, no Rio de Janeiro. De cabeça raspada, o empresário desce dos píncaros da glória para o porão profundo dos cárceres brasileiros. A liturgia da prisão será escancarada. O simbolismo reforça a ideia de que nossa Justiça funciona. Todos são iguais perante a lei. Será a lição repetida de maneira exaustiva. P.S. 1. O detalhe chama atenção : por não ter curso superior, Eike está trancafiado em cela comum. A prisão jamais deve ter passado por sua cabeça. P.S. 2 Eike disse : "Lava Jato está passando o Brasil a limpo".Tudo como dantes ?Tudo como dantes no quartel de Abrantes. O ditado quer dizer : nada mudou. Tudo é como antes. No caso do Brasil, podemos garantir que nada será como antes. O processo eleitoral, por exemplo. Não veremos, como já ocorreu na última eleição, dinheiro saindo pelo ladrão. Antes, havia propina, caixa dois, recursos abundantes jorrando sobre as campanhas. A Lava Jato está limpando a grande área do campo da política. A históriaE de onde vem o ditado ? Napoleão ordena a Portugal fechar portos aos navios ingleses. D. João, o príncipe regente, resiste, adia. Napoleão manda que seu general Jean Junot leve 28 mil homens para Portugal. Junot invade Abrantes e aí instala seu quartel-general. Faz-se Duque d'Abrantes. Assume a Regência em nome de Napoleão. A resistência é enorme. A 6 de agosto de 1808, o general inglês Arthur Wellesley (futuro Duque de Wellington) desembarca na baía dos Vagos e inicia reação aos franceses. Portugal se livra da ocupação, mas suas riquezas acabam indo para a França. D. João volta e deixa o filho no Brasil para construir a Nação. Mas no quartel de Abrantes, tudo estava como dantes, nas mãos dos franceses. A inoperância formou o provérbio.Maia reeleitoRodrigo Maia será reeleito presidente da Câmara. E o STF não questionará sua eleição. Deixará que a situação seja equacionada pela própria Casa legislativa. Esta é a leitura que se faz do processo, a se realizar, hoje, quarta-feira, no primeiro dia de atividades parlamentares após o recesso.PT por dentroO PT tinha tomado a decisão de apoiar a candidatura de Rodrigo Maia. E quiçá a candidatura do senador Eunício Oliveira para a presidência do Senado. O Diretório Nacional, por meio do presidente Rui Falcão, havia endossado a posição. Até o ex-presidente Luis Inácio fora consultado. Mas a reação da base partidária provocou uma reviravolta. PT por foraO PT anuncia que retirou o apoio aos nomes de Maia e Eunício, que estão na base do que os petistas continuam a chamar de "governo golpista". E assim o PT corre o risco de não participar da mesa diretora das duas Casas. Observação : a se confirmar a decisão do PT, seus deputados perderão vagas nas Comissões Técnicas. Espaço ideal para fazer oposição ao governo. Acerto ou burrice ?O pior já passouExpande-se a crença de que "o pior já passou" em matéria de recessão da economia. Os índices melhoram nas áreas da inflação e dos juros. Na frente do desemprego, os dados são ainda crescentes. Mas os setores produtivos, por meio de suas lideranças, se mostram mais otimistas. O varejo reage bem. E a confiança no futuro se amplia. Os projetos do governo são muito bem recebidos. Por mais empregos - IEmbora toda a ênfase sobre o mercado de trabalho seja dada aos mais de 12 milhões de desocupados, não se pode esquecer o outro lado da moeda nessa área no governo de Michel Temer : o fechamento de vagas já foi reduzido em um terço quando comparado ao mesmo período Dilma do ano anterior. De maio a dezembro de 2015 (era Dilma), foram fechadas 1.438 milhão de vagas. De maio a dezembro de 2016, o número caiu para 960 mil - redução de 33,19%. Ou seja, o desemprego já não cresce tanto quanto no tempo do PT. Por mais empregos - IIMas o fechamento de vagas pode ser reduzido à metade ainda este ano, comparado ao ano anterior, caso o país gere 61 mil vagas de janeiro a abril, o que é provável. Para que a tendência se mantenha é necessário manter o ambiente de confiança, avançando com as reformas previdenciária e trabalhista ; regulamentar a terceirização e o trabalho intermitente, com grande potencial de formalização do trabalho ; evitar reformas tributárias que só prejudicariam setores que mais empregam, como mudanças no PIS/COFINS ; recuperar empresas por meio de Refis ; e, por fim, continuar na trajetória de queda dos juros e ampliação do crédito. Previdência, o maior desafioO foco do governo nos próximos tempos é a reforma da Previdência. Haverá amplo e intenso debate. O projeto tem algumas gorduras que podem ser queimadas. Tempo de contribuição, por exemplo. Ou a idade de aposentadoria para as mulheres, de 65 anos para 62 ou 63, por exemplo. O governo espera que, ao final do semestre, a Previdência passe pelo Congresso. Terá, então, enfrentado seu maior desafio. Os projetos restantes seriam puxados pelo arranque da Previdência.O novo ministroO presidente Michel Temer está meditando sobre o nome do novo ministro do STF. Há pressões de todos os lados. Ele está tranquilo. É da área jurídica e conhece os potenciais e qualidades de muitos entre os nomes que aparecem. Não se submeterá a pressões. Na hora certa, escolherá o nome. Um registro deve ser feito : alguns nomes de grande peso têm sido simplesmente detonados pela mídia, na esteira de versões, meias verdades e mentiras. Há muita sordidez no ar. Trump enrascadoNão se pode dizer que Donald Trump começou com o pé direito no comando da maior potência mundial. As medidas do bilionário são de arrepiar. Duras, restritivas aos imigrantes, irrigadas por acentuado conservadorismo. As resistências crescem até nas hostes do partido republicano. Trump ainda não caiu na realpolitik. Isolar os EUA do mundo globalizado será suicídio. Polêmico, autoritário, autossuficiente, o todo poderoso presidente norte-americano poderá cair do cavalo mais adiante. Claro, se continuar a caminhar pelos caminhos da extravagância. E ainda por cima, persistem as insinuações e suspeitas de que a Rússia de Putin engendrou um ataque cibernético aos EUA por ocasião das eleições. Que teriam prejudicado a candidata Hillary Clinton. BarãoFecho com o sábio Barão de Itararé.Frases - O uísque é uma cachaça metida a besta.- O que se leva desta vida é a vida que a gente leva.- A criança diz o que faz, o velho diz o que fez e o idiota o que vai fazer.- O tambor faz muito barulho, mas é vazio por dentro.- Genro é um homem casado com uma mulher, cuja mãe se mete em tudo.- Neurastenia é doença de gente rica. Pobre neurastênico é malcriado.- Sábio é o homem que chega a ter consciência da sua ignorância.- Não é triste mudar de ideias, triste é não ter ideias para mudar.- Mantenha a cabeça fria, se quiser ideias frescas.
quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Porandubas nº 514

Depois de alguns dias, voltamos com Porandubas. Deixamos os "causos" da política, desta feita com o folclórico ex-governador Newton Cardoso, mais adiante, no fecho. A crise da segurança I A segurança pública desafia os Poderes do Estado. O que se vê é a extensão da crise endêmica que o país assiste, há muito tempo, no devastado território dos cárceres. Espaços com imensas limitações, esses depósitos de presos são artifícios que não dão suporte efetivo à segurança pública. Suas populações são superdimensionadas. Tornaram-se escritórios centrais dos chefões e chefetes de facções. O diagnóstico do vasto arsenal de violência já é conhecido. Resta agir. Cortar as veias econômicas dos grupos. Saber lidar com as informações dos cárceres. Separar os participantes. Julgar 250 mil presos que esperam decisão da Justiça. A crise da segurança II Não são apenas recursos financeiros que estão no cerne do problema. Claro, os cárceres precisam ser mais robustos, seguros, tecnologicamente equipados. Mas falta coordenação entre as forças de segurança, os aparatos estaduais e as equipes de inteligência. O que temos, hoje, é um ninho de serpentes guardado numa casca de ovo. Basta uma leve bicada para furar a casca. Os Poderes Executivo, Legislativo, Judiciário e entidades da sociedade organizada devem manter permanente mobilização no entorno da questão. Forças armadas O governo federal disponibilizou as Forças Armadas para operar nas prisões. Os governos estaduais devem fazer a solicitação. Trata-se de uma medida mais forte. Mas a integração dos órgãos de inteligência é fundamental para eficácia operacional do sistema de segurança. Maia versus Arantes Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Jovair Arantes (PTB-GO) estão em plena campanha para a presidência da Câmara na próxima legislatura. Rogério Rosso (PSD-DF) está desistindo do pleito. O ministro Gilberto Kassab teve influência nessa decisão. Jovair quer entrar pelos vãos do Centrão. Mas o bloco parece não ter a mesma força dos tempos de Eduardo Cunha. Hoje, os números favorecem Maia. Mas Arantes é determinado. O governo se mantém equidistante, mas há quem veja cabos eleitorais governistas trabalhando com fôlego para Maia. O pior já passou ? Henrique Meirelles diz que o "pior na economia já passou". Com a inflação em queda e a taxa Selic diminuindo, a fala do ministro ganha certo vigor. Mas o desemprego continua alto e sem dar sinais de entrar em descenso. O economista Francisco Lopes, diretor da Macrométrica, sai da linha do pessimismo para proclamar : país vai crescer 1,4% (na média) este ano. Ufa, conseguiu Guilherme Boulos, o raivoso comandante do MTST, lutou, lutou, até que conseguiu : foi preso por incitação à violência durante uma ação de reintegração de posse em São Mateus, região de São Paulo. Boulos agora vai vestir o manto de mártir. Poderá dizer que foi preso ilegalmente. Discurso de palanque. Janot sai ou fica ? Rodrigo Janot, o procurador-geral da República, cujo mandato termina em setembro, vai tentar ser reconduzido ao cargo. Sofrerá resistência de um grupo de procuradores. Mas não é improvável sua recondução. O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, José Robalinho Cavalcanti, foi procurado por um grupo de pré-candidatos para tratar do cronograma da campanha. Pela Constituição, cabe ao presidente da República nomear o procurador-geral para mandato de dois anos, sendo possível a recondução ao cargo. Não há limite para reconduções. Davos O Fórum de Davos foi aberto ontem pelo presidente chinês Xi Jinping. Uma bela oportunidade para a China se apresentar na estampa de líder da economia mundial. Meta que pretende atingir nos próximos anos. Dos EUA participam o vice-presidente Joe Biden e o secretário de Estado, John Kerry. Donald Trump entra, sexta-feira, no cenário mundial como a maior incógnita dos tempos de globalização. Sua aprovação, às vésperas da posse, baixou para 40%. Cabral e o risco Há quem continue a sinalizar perigo para Sérgio Cabral, preso em Bangu I. Ali estariam criminosos que mandou prender. Mas as autoridades do Rio garantem não haver ameaça de presos chegarem ao espaço onde se encontram o ex-governador e sua mulher. Otimismo A confiança dos executivos brasileiros na melhora de seus negócios ao longo dos próximos 12 meses mais do que dobrou em comparação com o início do ano passado. É o que registra a 20ª pesquisa anual da consultoria PwC, que coloca o Brasil como vice-campeão em confiança no mundo. Para 57% dos executivos do país ouvidos no levantamento, a perspectiva é de aumento das receitas em suas empresas ao longo de 2017. Lula no comando Não há outro nome : Lula vai voltar a presidir o PT. E nessa condição, voltará a fazer seu tour pelo Brasil. Para recuperar a confiança do povo no governo. É o que diz na maior cara de pau, tentando apagar da história o maior rombo das contas públicas já feito no país pelo ciclo de 13 anos do PT no poder. Inserção tucana É certo que os tucanos terão maior inserção na estrutura governamental. Isso já está acertado. Aécio ganha mais força. O deputado Antônio Imbassahy (PSDB-BA) será o secretário do governo, encarregado da articulação política. Um perfil qualificado. Alexandre O ministro Alexandre de Moraes é considerado uma pessoa que fala muito. E, às vezes, diz coisas inconvenientes. Muitos querem vê-lo distante do Ministério. Será difícil, porém, afastá-lo do cargo nesse momento em que lidera as novas disposições governamentais. Ademais, vale lembrar que Alexandre é um tucano muito próximo a Geraldo Alckmin. Que olha com certa desconfiança os avanços de Aécio Neves na estrutura governativa. Soares e Tiradentes Ao retornar de Portugal, onde compareceu ao enterro do ex-presidente e ex-primeiro ministro de Portugal, Mário Soares, o presidente Michel Temer conta que certa vez foi visitá-lo. Ao chegar à Fundação onde o ex-dirigente socialista trabalhava, surpreendeu-se com um busto de Tiradentes na entrada. Veio logo a explicação do próprio Soares : - Trata-se de minha homenagem a um brasileiro injustiçado pelos portugueses. Minha maneira de reparar o terrível erro cometido por nosso país. Abram uma porteira Delfim Netto é um dos melhores interlocutores de Michel Temer e um assíduo frequentador dos almoços de sexta-feira no escritório do presidente em São Paulo. Ao lado de conselhos, relata com graça fatos e feitos do passado. Em 1972, foi ao Nordeste com o então presidente Médici. A seca devastava a região, com dois milhões de nordestinos trabalhando em obras. Quando viu aquela cena - milhares de pessoas nas estradas empoeiradas - Médici esbravejou para ministros e assessores : - Abram uma porteira para esse povo sair. Abram logo uma porteira. E assim surgiu a Transamazônica. A monumental estrada que puxou milhares de nordestinos para a região. Fugindo da seca. Nessa época o Brasil crescia 12% ao ano. (em 1973, o crescimento foi de 14%). O que motivou Médici a proclamar : - A economia está bem. Mas o povo vai mal. Churchill Em 1940, entre o dramático episódio da Retirada de Dunquerque e a épica Batalha da Inglaterra, Churchill realizou um memorável discurso no Parlamento Britânico. Andrew Roberts diz em seu livro Tempestade da guerra - Uma nova história da Segunda Guerra Mundial : após proferir este discurso, e enquanto ainda era intensamente ovacionado, Churchill sentou-se ao lado do ministro conservador Walter Elliot e cochichou preocupado com a possibilidade de os alemães atravessarem o Canal da Mancha : "Não sei como vamos combatê-los - creio que teremos de quebrar suas cabeças com garrafas - as vazias, é claro". A beleza dos arcos Aplausos ao prefeito João Doria por decidir limpar as horrorosas pinturas (que mais parecem carrancas) na praça dos Artesãos Calabreses, mais conhecida pelos "Arcos de Jânio". A carranca de Hugo Chávez mais parece uma assombração. Se aquilo é arte...bom, deixemos de lado a controvérsia. Lembremos : o ex-prefeito Fernando Haddad, pedalando na ciclovia do bolivarianismo, permitiu a grafitagem na região. Arrebentou a estética dos arcos construídos entre 1875 e 1877 por imigrantes italianos que viviam na região. Jânio abriu os arcos A história registra que a região degradou-se com casarões construídos há décadas. Transformaram-se em cortiços. Em 1987, o então prefeito Jânio Quadros determinou a desapropriação e demolição de casas na rua da Assembleia, quando foram redescobertos os arcos. A bela iluminação amarela voltou a destacar a estética do monumento. Que Haddad destruiu. João Doria vai resgatar a beleza do lugar com seu projeto Cidade Linda. Descriminalização A descriminalização das drogas pode ocorrer nos próximos tempos. Basta que o STF conclua a votação já iniciada. O caso está pendente de um pedido de vista do ministro Teori Zavascki. Três ministros já proferiram seus votos : Luís Roberto Barroso votou pela descriminalização por uso limitado de até 25 gramas de maconha ; Edson Fachin votou pela descriminalização do uso da maconha, enquanto Gilmar Mendes votou pela descriminalização do uso de todas as drogas. Tempos duros O Brasil é outro. Esse é o mais forte sinal que deveria inspirar a administração pública. Prefeitos e governadores, com suas estruturas e assessorias, devem se programar para um longo período de vacas magras. Urge fechar a gastança. E aprofundar a poupança. Cortes precisam ser feitos em todos os lados, áreas e setores. Preservem-se os programas essenciais, mas lâmina forte nas coisas supérfluas. Cinco conceitos do momento O momento do país está a exigir dos gestores atenção redobrada para alguns princípios e conceitos. a. Coragem e Ousadia - Os gestores deverão ser corajosos. Para enfrentar pressões e não se sujeitar às contrapressões. Arremeter na direção do que precisa ser feito. "Somente aqueles que se arriscam a ir longe, saberão aonde podem chegar" (T.S. Elliot) b. Racionalidade - Conferir às questões, ações e programas sua verdadeira dimensão. Nem menor, nem maior. Sob esse critério, há muito o que enxugar, a cortar, a diminuir. O bom senso é a medida do correto e do justo. c. Tempestividade - Urge dar respostas imediatas às demandas. Sem delongas. Sem curvas. Tornar mais retos os caminhos da administração. d. Transparência - Clareza de propósitos e de operações resgatará a confiança das massas e a credibilidade dos gestores. e. Planejamento - Organizar os planos e programas com um roteiro de começo, meio e fim. Não é hora para improvisos. Mesmo as ações tempestivas - que precisam ser desenvolvidas imediatamente - hão de se respaldar no planejamento. PT na máquina Quadros do PT se escondem em esconderijos da estrutura governamental. Muitos disfarçam suas identidades. Fala-se que alguns ocupam até altos cargos como vice-presidências de bancos estatais. Fala-se que 25 mil petistas estavam alojados na máquina, dos quais uns 5 mil ainda permanecem atrelados às tetas do Estado. Newtão Fecho a Coluna com o folclórico ex-governador mineiro Newton Cardoso, um poço de histórias hilárias. Tomo emprestadas algumas contadas pelo amigo Sebastião Nery. Como se sabe, Newton Cardoso foi prefeito de Contagem, deputado federal, governador, vice-governador de Minas Gerais e, hoje, é representado na Câmara por seu filho, que tem o mesmo nome do pai. Os adversários lhe atribuem velhas gafes que a UDN atribuía a Benedito Valadares : 1. Dona Dezinha : "Se eu soubesse que meu filho Newton ia ser importante e virar governador de Minas, eu tinha botado ele para estudar de pequeno." 2. Preocupado com as notícias de que o leite estava contaminado, Newton pegou um pastel e começou a mexer dentro da xícara. "Por que você está fazendo isso ?" "Para pasteurizar o leite." 3. Newton no palanque : "Minas sempre se preocupou mais com a criação de bovinos e equinos. Agora, eu vou cuidar também da criação de porquinos." 4. Newton, numa entrevista : "Precisamos acabar com a fila do IMPS." O assessor lhe fala : "Não é IMPS, é INPS." "Nada disso. Desde lá de Brumado que eu aprendi que antes de P e B se usa M." 5. Comício em Betim : "O problema de Minas é falta de fé. Vamos juntar minha fé, sua fé, nossas fezes, para salvar Minas."
quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

Porandubas nº 513

2106, o ano decisivo 2016 passará para a história como o ano que marca o princípio de uma nova era. O mais importante ciclo da investigação no país. O ano em que o Judiciário atinge o clímax de sua ação. O ano do ativismo judicial. O ano em que os jovens procuradores do Ministério Público mostraram ao país que estão dispostos a passar uma lupa sobre a corrupção. O ano em que foram presos grandes perfis das esferas política e empresarial. O ano em que um juiz, Sérgio Moro, foi alçado ao patamar de herói. O ano em que o ex-maior partido de esquerda perdeu seu manto de vestal e vê seu ícone, Lula, tragado pela chama de denúncias. Um ano e tanto. 2017-2018 Serão dois anos de passagem. Servirão de ponte entre o hoje e o amanhã. Lembrados como os tempos em que a sociedade participativa se fez mais presente na construção do edifício ético. Fazer o dever As pesquisas atestam impopularidade do governo Temer. É um fato. O governo herdou a maior recessão da história brasileira. O maior rombo nas contas públicas. O país assiste, perplexo, à maior investigação sobre a maior propinagem de nossa história. Ora, querer que o governo tire, de repente, o Brasil da zona do inferno para as glórias do céu é querer milagre. O governo tem de fazer seu dever : medidas duras, sérias, que possam aliviar a carga que pesa sobre a Nação. E tem feito É só olhar para a planilha. O governo aprovou no Congresso a PEC do teto dos gastos, que segurará as despesas da administração pública. Aprovou a Lei das Estatais, que dará maior transparência e controle ao aparelho do Estado. Diminuiu gastos. Inflação está em queda. Juros começam descer, mesmo que lentamente. Recursos sob controle. Petrobras sendo reorganizada. Lei do Pré-Sal abrindo a exploração para a iniciativa privada. Vai encampar a reforma da Previdência. E modernizar a legislação trabalhista. Não é pouca coisa. O fim do mundo Pergunta geral : se as primeiras delações já provocam tsunamis, imagine-se o que poderá ocorrer com a infinidade de delatores da Odebrecht ? Este analista tem a seguinte leitura : provas e contra-provas não serão consensuais. Vai haver muita polêmica. Recursos vão se multiplicar. E as condenações vão aparecer, sim, mas bem adiante. Não se vê esse processo concluído nos próximos meses. TSE vai cassar chapa ? Mais uma pergunta recorrente. O TSE tende a fazer o julgamento das denúncias sobre recursos para a campanha Dilma/Temer nos primeiros meses de 2017. O processo será demorado. Vai esperar, inclusive, por depoimentos da Lava Jato. No primeiro semestre, sairão dois ministros do TSE e entrarão dois novos nomes. A serem nomeados pelo presidente da República. Será pouco provável a cassação da chapa. O pano de fundo será a economia. A recuperação das camadas econômicas dará força ao presidente. E essa fortaleza, se for construída, protegerá Michel Temer. Ambiente de dúvidas O ambiente continua tomado por muitas dúvidas. O governo irá até o fim ? Será afastado ? O governo deverá ir até o final do mandato. Vale lembrar, em primeiro lugar, que o presidente só pode ser objeto de ação penal por ato ocorrido em sua gestão. Portanto, quaisquer eventuais denúncias que recaiam sobre a figura do presidente e que levem em conta situações passadas não serão empecilho para tirar Michel Temer do assento presidencial. Renúncia não faz parte da índole de Michel. Ademais, ele está na linha correta : adotando a cartilha de mudanças por que o Brasil clama. Caiado, oportunista ? O senador Ronaldo Caiado foi picado pela mosca azul. Quer, porque quer, tirar o presidente Michel Temer. Para que ? Para pavimentar sua candidatura à presidência da República. Acha-se como paladino da política e desfralda a bandeira da renúncia presidencial. Para que ? Para aparecer no cenário. Para atrair o brilho midiático. Caiado perde grande oportunidade de ficar calado. MP do Trabalho Governo prepara edição de uma MP com vistas à abertura do mercado de trabalho. Abrigaria coisas como o programa de proteção ao emprego ; a representação dos trabalhadores no local do trabalho ; o negociado como força de lei ; o trabalho temporário ; o trabalho em tempo parcial e o contrato intermitente. Mas as Centrais estão pondo obstáculos à MP. Essas entidades, como é sabido, deixaram há muito tempo de se preocupar com o mundo real de trabalho. Seu foco de interesses é um só : aumentar o caixa e o cofre. E continuar atreladas nas tetas do Estado. Refluxo natalino Fim de ano chegando, ânimos mais cordatos, harmonia doméstica, convívio e festas. Animosidade arrefece. Brasil pausa para fazer sua grande reflexão. Diagnósticos. Planejamento. Compromissos para 2017. Régua de 2017 O Brasil tem condições de segurar a peteca em 2017 ? Tudo indica que os índices de melhora na economia comecem a se apresentar a partir de maio de 2017. Se em outubro, as coisas estiverem razoáveis, inverte-se a curva de impopularidade do governo. A conferir. Geraldo aposta errado Geraldo Alckmin faz uma aposta errada. Estaria se afastando do governo Michel Temer sob a crença da crescente impopularidade da administração Federal. É uma aposta arriscada. Pois em 2018, a economia poderá dar sinais de grande vitalidade. Se isso ocorrer, Aécio será beneficiado. Apostando no governo, deve aprofundar a inserção do PSDB no governo Temer. Alckmin no PSB Se assim ocorrer, Aécio ganhará a disputa entre os tucanos, habilitando-se a ser o candidato do partido no pleito de 2018. Alckmin terá a alternativa de sair para o PSB do vice-governador Márcio França. Há muita água a correr por baixo da ponte. Estados falidos Os Estados estão de pires na mão. Suas dívidas serão renegociadas. Mas os governadores sofrerão por um bom tempo. Não haverá exceção. Tempos bicudos favorecerão candidatos de oposição. Perfis em crescimento Outsiders - Empresários sem experiência política, profissionais liberais de boa imagem. Arriscam-se a cometer despautérios. Roberto Justus : "vamos tirar o Brasil das mãos dos políticos". Religiosos - Líderes messiânicos de discurso populista. Não a ponto de escalarem o topo da montanha. Radicais - Protagonistas localizados nas extremidades do arco ideológico. Crescimento, porém limitado. Assépticos - Perfis não contaminados pelo vírus da velha política. Marina Silva, por exemplo. Mas ela é limitada. Regionalistas - Pessoas identificadas com as comunidades locais/regionais. De vôos curtos. Juízes - Figurantes do Judiciário. Que poderão ser um fiasco na política. Joaquim Barbosa, por exemplo. Bolsonaro Terá, sim, algum crescimento, mas não tem estofo, densidade, essência, para chegar ao cume da montanha. Um radical de estatura mediana. Personalidades da coluna 1. Executivo da Medicina : Claudio Lottenberg - Amil/ UnitedHealth 2. Novidade na Política : João Doria - Novo prefeito de São Paulo 3. Novidade no Jornalismo : Jornalista Willian Corrêa - TV Cultura 4. Voz sempre bem ouvida : Empresário Jorge Gerdau 5. Articulista de peso : Advogado Ives Gandra Martins 6. Exemplo de Ação Social : Orquestra Sinfônica Heliópolis do Instituto Baccarelli 7. Liderança na Advocacia : Marcos da Costa, presidente da OAB/SP 8. Um jornalista que comenta bem : Gerson Camarotti, Globo News 9. Governador que não perde uma piada : Geraldo Alckmin 10. Colunista de bons bastidores : Natuza Nery, do Painel da Folha 11. Editor de Política : César Felício, do Valor Econômico 12. Médico sistêmico : Cardiologista Américo Tângari Jr., Hospital Beneficência Portuguesa 13. Análise política : Fernando Mitre, TV Bandeirantes 14. A cara de São Paulo : José Paulo de Andrade, Rádio Bandeirantes 15. Conselheiro do Trabalho : José Pastore - FEA-USP 16. Ministros de boa safra : Bruno Araujo (Cidades) e Mendonça Filho (Educação) 17. Um século de vida : Chiquita Torquato, minha mãe, que fez 100 anos 18. Um editor da pesada : José Mário Pereira, da TopBooks 19. O guru da economia : Delfim Netto 20. A voz do Varejo : Flávio Rocha, empresário e presidente do Grupo Riachuelo 21. Articulador da política : Michel Temer, presidente da República ______________ Fechando a coluna com o finado Manoel O lendário Valdetário Carneiro contribuiu para os causos de Caraúbas/RN. Ia ele em sua pick up na zona rural de Apodi. Próximo à cidade, um senhor meio alquebrado pelos anos acenou pedindo carona. Valdetário prontamente o atendeu, abrindo a porta. Já aboletado e no conforto do ar condicionado, começou a puxar conversa : - O senhor vai pro Apodí ? - Vou sim -, respondeu Valdetário, vou tratar de negócios no banco. O carona resolveu dar uma de conselheiro : - O senhor tenha cuidado. Se vai tirar dinheiro no banco e andando nesse carrão, aqui por essas bandas, tenha cuidado pois há gente perigosa por aí. Tem um tal de Valdetário Carneiro, homem de muita fama que pode ser um grande risco, principalmente pra quem é de fora. Valdetário riu da situação e até agradeceu : - Obrigado, eu vou ficar atento. Em seguida devolveu a pergunta : - E o senhor não tem medo de estar sozinho nessa beira de estrada ? E se de repente lhe aparece o tal do Valdetário Carneiro ? - Ele que venha -, completou o carona com valentia de quem se sente em confortável distância do perigo. E acrescentou : "- Um homem nasceu pro outro." Chegados ao destino, o carona já ia descendo quando resolveu fazer mais uma pergunta. - Obrigado por tudo, senhor. Vá com Deus. Mas como é mesmo o seu nome ? Com toda naturalidade Valdetário respondeu : - Eu sou Valdetário Carneiro. E o senhor como se chama ? Branco como algodão, suando pelos poros, com as pernas trêmulas e a voz embargada, o carona mal conseguiu balbuciar : - Eu sou o finado Manoel.
quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Porandubas nº 512

Este consultor político abre a coluna com uma constatação : em três décadas de análise política, nunca viu um quadro político-institucional tão danificado. A crise chega ao pico da montanha. Em vez de procurarem jogar água fria na fogueira, os protagonistas da crise mais jogam lenha. O incêndio sobe para os lados e para o alto. Para onde vamos : S D S (Só Deus Sabe) Teste da democracia A crise é monumental. Abrange os Três Poderes. O afastamento do senador Renan Calheiros do comando da Câmara Alta por uma liminar acirra as tensões entre os Poderes Legislativo e Judiciário. O ministro Marco Aurélio, que acolheu a liminar, sabe que o país vive momentos de extrema dificuldade. E tem consciência de que a decisão de tirar Renan da cadeira de presidente do Senado gera consequências sobre a tessitura institucional. Este episódio certamente arremata a ideia de que o Brasil está vivendo o maior teste de sua democracia na contemporaneidade. Piora do quadro O governo Michel Temer elegeu a PEC do Teto de Gastos como o primeiro grande desafio a enfrentar. A PEC passou pela Câmara, venceu a primeira batalha no Senado e espera receber a segunda aprovação dia 13 dezembro. Mas o imponderável surgiu. O vice-presidente do Senado, senador Jorge Vianna, do PT do Acre, está propenso a trilhar a vontade de seu partido e inviabilizar a votação da PEC. Se isso ocorrer, o governo colecionará grande derrota. O acordo de líderes seria, nesse caso, revogado pela força das prerrogativas que cabem ao presidente da Casa : escolher os temas da pauta. Senado contra Judiciário O plenário do STF deverá dar endosso à liminar concedida pelo ministro Marco Aurélio. Afinal de contas, a interpretação que ele dá parece correta. Lembre-se de que já há seis votos na Corte a favor da tese de que, na condição de réu, Renan não pode permanecer na linha de sucessão do presidente da República. Se o ministro Toffoli não tivesse pedido vistas do processo, a decisão já teria sido tomada. A questão que se coloca é : pode um ministro do STF afastar o presidente de um Poder antes mesmo da decisão final da Corte sobre a matéria, mesmo que os votos já obtidos no processo de votação (interrompido por um pedido de vista) mostrem que a tese do afastamento será vencedora ? Mesa contra O imbróglio assume proporções incalculáveis. A Mesa do Senado decidiu não acatar a decisão "monocrática" do ministro Marco Aurélio. Essa hipótese, até pela manhã, era inimaginável. Mas ocorreu. A crise institucional está instalada. O texto da Mesa diz que o acórdão sobre a decisão do Supremo que tornou Renan réu ainda não foi publicado e que a Constituição assegura o direito de "ampla defesa". E agora ? Diz mais : a "Constituição estabelece a observância do princípio da independência e harmonia entre os Poderes e direito privativo dos parlamentares de escolherem os seus dirigentes". Alegam os integrantes da Mesa Diretora do Senado que os "efeitos" da decisão de Marco Aurélio "impactam gravemente o funcionamento das atividades legislativas", impedindo a votação de medidas que teriam como objetivo "contornar a grave crise econômica sem precedente que o país enfrenta". Uma das medidas é a PEC do Teto. Qual será a saída ? Uma decisão urgente pelo Plenário do STF sobre a liminar de Marco Aurélio. Endossada, Renan não terá alternativa : deve deixar o comando do Senado. Retaliação Poderá haver retaliação mais adiante contra o STF, acusado por muitos por exagerar no que se chama de ativismo judicial ? Sim. Mas essa retaliação, nesse momento, se apresenta pouco provável em função do clima tenso que toma conta do meio social. O povo dá as costas à política. Recrimina padrões, atitudes e comportamentos de grande parcela dos atores políticos. Sob essa teia de indignação, é improvável que o Senado paute o projeto que trata do abuso de autoridades. Se essa proposta caminhar, as ruas estarão cheias de gente execrando publicamente a representação política. Beco estreito A alternativa menos danosa ao país nesse momento seria a votação em segundo turno da PEC do Teto no dia 13 de dezembro, com a anuência do presidente Jorge Vianna para a pauta já aprovada por líderes partidários. Outra alternativa seria a retirada de pauta do projeto voltado para coibir o abuso de autoridades. Nesse momento, repetimos, qualquer iniciativa nessa direção será considera uma ação contra a operação Lava Jato, ou seja, uma estratégia para evitar as investigações que estão sendo feitas pelos procuradores de Curitiba e pelo juiz Sérgio Moro. O beco da saída é muito estreito. Momento inadequado Ninguém está acima da lei. Portanto, urge atualizar a lei de abuso de autoridade, que é da década de 60. Mas esse não é o momento. Mexer nesse vespeiro agora é se submeter a picadas e beliscadas de imensas proporções. Treme na alma Renan sobre Marco Aurélio : "Ele parece tremer na alma quando ouve falar em acabar com supersalário". Gilmar x Marco Aurélio O ministro Gilmar Mendes atira no colega Marco Aurélio. Diz que ele é um "caso de reconhecimento de inimputabilidade ou de impeachment". Vai além com o dito jocoso : "No Nordeste se diz que não se corre atrás de doido porque não se sabe para onde ele vai". Comentou, ainda, que "não se afasta o presidente de um poder por iniciativa individual e com base em um pedido de um partido político apenas, independentemente da sua representatividade". E chegou a chamar de "indecente" a decisão de Marco Aurélio. Prisão de Renan ? Renan Calheiros poderá ser preso ? Vejam. O descumprimento da decisão do ministro Marco Aurélio é de responsabilidade da Mesa Diretora. A possibilidade de prisão de Renan é, desse modo, muito remota. Não foi ele, sozinho, a tomar a decisão de não aceitar o afastamento da presidência do Senado. Nós e eles Se na época do petismo, o slogan era - Nós e Eles -, que mostrava os petistas como os mocinhos e os não petistas como bandidos, hoje o slogan é resgatado : o Nós, nesse caso, é o território que abriga a sociedade organizada e Eles, os políticos e seus padrões. Endeusamento Os guardiões sociais de Curitiba precisam se conscientizar de que são simples mortais. Passam alguns a impressão de que se consideram semideuses, heróis da Pátria, salvadores da sociedade. Urge ter cuidado. Imaginem, agora, um desses "heróis" de Curitiba vestindo o manto político. Teria grande possibilidade de ser bem sucedido. E se Sérgio Moro decidir ser candidato a presidente ? Felizmente, ele já anunciou que a política partidária não é a seara dele. Vianna Jorge Vianna, mesmo considerado um moderado, tende a criar dificuldades ao governo. Já chegou a dizer que o impeachment de Dilma e a chegada de Michel Temer ao assento presidencial foram "um golpe". Quem considera o presidente "golpista" certamente irá sacar armas contra ele. Rui dá as ordens Rui Falcão, presidente do PT, reuniu-se com os senadores da sigla. E ditou a orientação : fazer a pauta que interessa ao PT. Luta insana contra o governo. País à beira do despenhadeiro. Sob empurrão dos petistas. Reforma da Previdência O governo encaminhou ontem a Reforma da Previdência, abrindo um ciclo de audiências e debates. As Centrais Sindicais dizem que são contra. Os pontos ainda estão sendo explicitados. Os partidos de oposição se manifestam contra "as perdas" que a reforma trará para os trabalhadores. Quais ? Que pontos defendem os deputados de oposição e as Centrais ? Até parece que os críticos não lêem por completo a proposta. Quando auditar a marca ? Nos ciclos de crise A crise propicia muitas oportunidades. Entre elas, a oportunidade de checar a imagem das organizações. Esse é um momento adequado para se realizar uma auditoria de marca. Que pode ser desenvolvida com os seguintes objetivos : - identificar as mudanças que ocorrem ou que podem ocorrer na estrutura de mercado necessárias para se manter a dinâmica da interação consumidor-marca ; - avaliar a estratégia adotada pelas marcas concorrentes e seu papel como fonte de construção do valor de marca ; - analisar o ambiente interno da empresa face às suas perspectivas externas ; - avaliar a estratégia de marca, identificar os candidatos potenciais a estratégias específicas e seus possíveis efeitos sobre a estratégia global da empresa ; - adotar uma perspectiva a longo prazo de marketing, centrada na construção e manutenção do valor de marca. (O conselho deste escriba se ancora na lição de Mauro Calixta Tavares, autor de A Força da Marca). Fecho a coluna com o sempre lembrado Rui Barbosa Ato vil A historinha é conhecida e, por ser muito boa, merece um repeteco. Rui Barbosa, o Águia de Haia, chegava em sua casa, à noitinha, quando ouviu um barulho vindo do quintal. Chegando lá, viu um ladrão tentando levar seus patos de criação. Aproximou-se vagarosamente do indivíduo e, surpreendendo-o, ao tentar pular o muro com seus amados patos, passou-lhe um pito : - Oh, bucéfalo anacrônico ! Não o interpelo pelo valor intrínseco dos bípedes palmípedes, mas sim pelo ato vil e sorrateiro de profanares o recôndito da minha habitação, levando meus ovíparos à sorrelfa e à socapa. Se fazes isso por necessidade, transijo ; mas se é para zombares de minha elevada prosopopéia de cidadão digno e honrado, dar-te-ei com minha bengala fosfórica bem no alto da sua sinagoga, e o farei com tal ímpeto que te reduzirei à quinquagésima potência que o vulgo denomina nada. E o ladrão, perplexo e confuso, com um fio de voz, perguntou : - Doutor, eu levo ou deixo os patos ?
quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Porandubas nº 511

Abro a coluna com uma homenagem à Chapecoense. Um grupo de jovens cheios de alegria, entusiasmo e vontade. Sonhos desfeitos em um átimo de segundo. Famílias padecendo grande dor. Um belo empreendimento que desmorona. A imagem de uma equipe que percorreu rápido os caminhos da glória. A imagem da vida que se esvai em um grande momento de seu fluxo. Parodiando o poeta Carlos Ayres Britto : "A morada de Deus tem muitas portas, sem dúvida. A mais larga de todas é a música". Complemento : E a mais cheia de entusiasmo é a do futebol. Viva a Chapecoense ! Que renascerá pela vontade de seus torcedores. Calero O ex-ministro da Cultura, Marcelo Calero, pode ter sido aconselhado a gravar as conversas que teve com o ex-secretário do governo, Geddel Vieira Lima, ministro Eliseu Padilha, o advogado da Casa Civil, Gustavo do Vale Rocha e o próprio presidente Michel Temer. Ele chegou a dizer que foi orientado por amigos da Polícia Federal. Um ministro gravando seu presidente é algo inusitado, completamente fora de propósito. Ou ele tinha um propósito ? Portando um argumento de defesa, Calero alega que não gravou a conversa no gabinete presidencial, mas por telefone. O diplomata distingue gravação por telefone de gravação em comunicação direta. Qual a diferença ? Chicana Marcelo Calero acusou o presidente da República de propor chicana, manobra jurídica, para ajudar Geddel Vieira Lima no caso do embargo do prédio La Vue, em Salvador, feito pelo Iphan Nacional. Mas o que mostrou o conteúdo da conversa ? Conteúdo O conteúdo mostrou uma conversa meramente protocolar, não havendo absolutamente nada que poderia comprometer o presidente. Não se viu nenhum "enquadramento" conforme o diplomata (?) atestou. Vamos esperar pelo teor de outras gravações. Calero quis repartir a responsabilidade pela gravação com amigos da Polícia Federal. Inadmissível esse tipo de aconselhamento. Gravar conversas com o presidente da República ? Banalização A banalização de recursos excepcionais escancara o modus operandi que invade os vãos da República : a banalização de gravações, de acusações a esmo, do disse-que-disse, de versões estapafúrdias. A delação é vigoroso instrumento para se apurar a corrupção. Até aí tudo bem. Mas de tanto se recorrer ao recurso, virou moeda de troca. Com tanto destampatório, as penas serão aliviadas. Corruptos acabarão ganhando punições menos severas. As gravações, da mesma forma, se multiplicam. Estamos em pleno território do Big Brother. A desconfiança se alastra. O medo se instala nos ânimos. Heróis de araque Gravadores de conversas são endeusados por pessoas alijadas do poder. É possível, até, que esse Calero volte à política sob o mote da coragem de ter gravado o presidente. Ele já foi candidato a deputado Federal pelo PSDB do Rio de Janeiro. Teve votação pífia. Em 2018, quem sabe, poderá até se apresentar ao eleitorado tendo um gravador como símbolo-versão Juruna do século XXI. Posando de herói, com embalos musicais de amigos artistas, lutará para ascender ao patamar da política. Claro, essa projeção não leva em conta a hipótese de vermos um país com menos ódio e mais harmonizado em 2018. Situação em que Calero será demonizado. Boulos medalhado ? Cada vez mais se compreende menos. Guilherme Boulos recebeu medalha do mérito legislativo, prestigiado pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Como se sabe, ele comanda o MTST, braço radical da esquerda que se vangloria de depredar prédios públicos e patrimônio privado. A homenagem ocorreu ontem, um dia depois do vandalismo que assolou Brasília, quando sete Ministérios foram depredados. Até a catedral foi pichada. Será que não estamos fazendo inversão de papéis no Brasil ? O mal não está sendo considerado um bem e vice-versa ? Mocinhos e bandidos não fazem papel trocado ? A escalada ética A política continua cercada de lama por todos os lados, mas são inegáveis as flores que nascem aqui e ali, sob os cuidados atentos de uma gente de fé que junta forças e motivação para deixar o conforto de sua casa e sair às ruas em combate à corrupção, dando-se as mãos, erguendo faixas, ecoando palavras de ordem, clamando por decência. Há uma chama iluminando parcela considerável da consciência social. Ou, para usar outra imagem, um rastilho de pólvora se infiltra em numerosos espaços, pronto para receber o fósforo da explosão. A escalada ética que se descortina neste instante é emoldurada, de um lado, pela limpeza na administração pública clamada pela sociedade e, de outro, pela resistência de bolsões no Parlamento contrários às mudanças. Redes sociais A mobilização social pela moralização de costumes e práticas na política ganha volume ao impulso das redes sociais, sendo este, aliás, um fenômeno que se amolda ao modo de pensar e agir das correntes da sociedade. O fato é que milhões de internautas usam cotidianamente as redes tecnológicas da comunicação, configurando-se como poderoso núcleo irradiador de informações e visões e, como tal, funcionando como pulmões a oxigenar o coração da opinião pública. Não há mais como deixá-los à margem do processo comunicacional brasileiro. Doravante deverão ser avaliados sob o prisma da articulação e da mobilização, sendo demonstração cabal de seu poderio a mobilização de contingentes. Abuso de autoridade A Câmara aprovou a lei contendo as medidas contra a corrupção. O eixo do projeto original foi preservado. A bancada do PDT propôs emenda ao pacote no sentido de criminalizar o abuso de autoridade para magistrados e membros do Ministério Público. A proposta prevê crime de responsabilidade para juízes, desembargadores e procuradores. As coisas retiradas Os deputados rejeitaram a proposta que previa acordos de leniência (espécie de delação premiada em que empresas reconhecem crimes em troca de redução de punição) ; retirou-se, ainda, o trecho sobre enriquecimento ilícito de funcionários públicos ; caiu, ainda, a figura do "reportante do bem", pessoa que denunciaria crimes de corrupção em qualquer órgão, público ou não, recebendo uma recompensa em dinheiro ; foram retiradas as mudanças para dificultar a ocorrência da prescrição de penas ; rejeitou-se a proposta de "confisco alargado" ; também caíram os acordos entre defesa e acusação, no caso de crimes menos graves. Os deputados rejeitaram, ainda, pontos do relatório que previam a responsabilização dos partidos políticos e a suspensão do registro da legenda por crime grave. A querela O ambiente está eivado de indignação, raiva e dissensão. Movimentos ocuparam a Espanada dos Ministérios, ontem, em Brasília para protestar contra a anistia ao caixa 2 e a PEC do teto dos gastos. O presidente da República, Michel Temer, o presidente do Senado, Renan Calheiros e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, já haviam anunciado que não deixarão passar essa anistia. Temer prometeu vetar esse dispositivo caso fosse aprovado pelo Congresso. O fato é que a polarização que se adensa tem como pano de fundo o afastamento da presidente Dilma. O que está em jogo Grupos inconformados querem dar o troco e pedem impeachment do presidente Temer. As militâncias do PT, do PSOL, da CUT, MTST, MST e da UNE se agrupam e vão às ruas para clamar contra coisas que, na verdade, nem sabem o que significa. Decoram slogans e refrãos para mostrar que a PEC do Teto, medida altamente moralizadora, vai empobrecer o povo, tirar recursos da educação e da saúde. Lorota. O fato é que os desempoderados (que perderam poder), sob um clima de incertezas e uma economia claudicante (herança petista), fazem uma revanche. Juros e a economia Os setores produtivos estão menos otimistas que há um mês. Temem que a crise política atrapalhe o cronograma das reformas. Nesse caso, o ajuste da economia será mais demorado. A previsão de crescimento do PIB em 1,5% cai. Empresários de porte confessam à coluna : enquanto os juros continuarem em alta escala, não haverá reação da produção. Delação do fim de mundo Crescem as expectativas em relação à delação do fim de mundo. Comenta-se que Marcelo Odebrecht teria feito exigências e observações que ainda estão sendo negociadas. Há, ainda, desacordo sobre as multas a serem pagas pelo Grupo. A previsão é que o acordo seja fechado na próxima semana. PEC passa O senado aprovou por 61 votos a PEC do Teto dos Gastos. A segunda votação está prevista para 13 de dezembro. Será o maior tento do governo Temer. Renúncia coletiva Os procuradores da Lava Jato ameaçam renunciar caso a proposta de abuso de autoridade, do projeto anticorrupção aprovado, ontem, pelos deputados, seja sancionada pelo presidente Michel Temer. "Nós somos funcionários públicos, temos uma carreira no Estado e não estaremos mais protegidos pela lei. Se nós acusarmos, nós poderemos ser acusados. Nós podemos responder inclusive pelo nosso patrimônio. Não é possível em nenhum Estado de Direito que não se protejam promotores e procuradores contra os próprios acusados. Nossa proposta é de renunciar coletivamente caso essa proposta venha a ser sancionada pelo presidente", garante o porta voz do grupo, Carlos Fernando dos Santos. Legislativo x MP/Judiciário Na verdade, o que há uma luta esganiçada entre os Poderes Legislativo e Judiciário e que arrasta também o Ministério Público. O Parlamento quer recuperar sua força. Nos últimos tempos, perdeu prestígio. O Judiciário, por sua vez, ganhou força e tem a simpatia da sociedade. Os buracos infraconstitucionais, produzidos pela CF de 88, deram muita força ao STF. Em sua missão de interpretar a Constituição, acabou legislando em muitas matérias. O MP, revigorado pelo apoio social, assumiu o compromisso de passar o Brasil a limpo. Junta-se ao Judiciário e à Policia Federal nessa tarefa. O ambiente está tenso. Cada ente defendendo posições irredutíveis. A opinião pública está acesa. Nesse momento, pende para o Judiciário e para o MP. Ética na política Vamos imaginar um debate sobre ética na política entre parlamentares e o senador Rui Barbosa. O mestre lhes diria : "Não há nem pode haver aliança entre a política e os meus interesses privados. A política é e será sempre a inimiga da minha prosperidade profissional". O parlamentar poderia retrucar : "Ética é fidelidade aos amigos". Outro arremataria : "Aos amigos, pão, aos inimigos, pau". O velho Rui, no troco, lembraria trecho do discurso de 26/12/1901, que bem poderia servir de conselho a muitos dos nossos representantes : "Vespasiano dizia que, para um imperador, decência é morrer de pé, decência é cumprir bem o seu papel". Fecho a coluna com a historinha do peru E assim nasceu o peru Minhas homenagens aos leitores com a historinha do peru (que será servido neste Natal), enviada pelo amigo Eduardo Nascimento, que não perde a oportunidade para exercitar sua verve : Há um conto japonês milenar que é mais ou menos assim : "Em uma planície, viviam um urubu e um pavão. Um dia, o pavão começou a expressar certa angústia : - Sou a ave mais bonita do mundo animal, tenho uma plumagem colorida e exuberante, porém nem voar eu posso, de modo a mostrar a minha incomparável beleza. Feliz é o urubu que é livre para voar para onde o vento o levar. O urubu, por sua vez, também refletia no alto de uma árvore : - Que infeliz ave sou eu, a mais feia de todo o reino animal ; e ainda tenho que voar e ser visto por todos. Quem me dera ser belo e vistoso tal qual aquele pavão. E aí as duas aves, pensando sobre suas conveniências e inconveniências, tiveram uma brilhante ideia : deveriam se juntar para realizar um cruzamento. O fruto que desse cruzamento surgiria seria uma ave esplendorosa, magnífica, um descendente que iria combinar o voo tão aerodinâmico do urubu com a graciosidade e elegância do pavão. Cruzaram-se. E daí... nasceu o peru ! Que é feio pra cacete e não voa. Moral da história, senhoras e senhores : se a coisa está ruim, não invente. Gambiarra não funciona.
quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Porandubas nº 510

Abro a coluna com o panorama político. As apreciadas historinhas do nosso folclore político estão no final. Conselhão ativo O governo decidiu retomar as atividades do Conselho de Desenvolvimento e Social, o chamado Conselhão. Trocou nomes, dando mais pluralidade e representação ao órgão. Nomes de peso como Jorge Paulo Lemann, Jorge Gerdau, Roberto Setúbal, Roberto Rodrigues sentam, lado a lado, com sindicalistas, como José Calixto, da NCST-Nova Central, ou intelectuais como Helena Nader, presidente da XBPC. O Conselhão agora terá voz e vez : escolhe temas, define prioridades, cobra políticas, dá ideias. Diferentemente do passado, quando servia apenas de audiência passiva. Temas para 2017 As sete oficinas de trabalho criadas escolheram os temas que balizarão os debates de 2017, tais como a desburocratização e a modernização do Estado, a produtividade e a competitividade, emprego e renda, entre outros. Os participantes sugeriram, por ocasião do primeiro encontro, segunda-feira, que o governo avance nas reformas. E que seja identificado como "Governo das Reformas". Calero x Geddel Nas conversas de bastidores, em Brasília, a hipótese ganhou consenso : Marcelo Calero queria um motivo para deixar o Ministério da Cultura do governo Temer. Geddel Vieira Lima, ministro da Secretaria do Governo, chegou mesmo a falar com ele, mas não a ponto de fazer pressão para liberação da obra do prédio, em Salvador, onde comprara um apartamento. Foi apresentada ao ex-ministro a sugestão : ficar ou sair depois de ouvido parecer da Comissão de Ética da Presidência. Mas ele não aceitou aquela sugestão. Decidiu não esperar. Tende a ser candidato a deputado em 2018. Paisagem fosca Os sinais no horizonte começavam a ser claros. Mas, de repente, tornaram-se foscos. Uma névoa pesada cobre o amanhã. As projeções sobre o desempenho da economia mostram recuo de alguns índices, a partir da queda de 0,6% do PIB no segundo semestre. Comparada à igual período de 2015, a queda do PIB foi de 3,8%. Com o resultado, o PIB acumula - nos primeiros seis meses do ano - retração de 4,6%, comparativamente aos seis primeiros meses de 2015. Os dados das Contas Nacionais Trimestrais foram divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e indicam, no acumulado dos quatro trimestres terminados no segundo trimestre de 2016, decréscimo (-4,9%) em relação aos quatro trimestres anteriores. Em valores correntes, o PIB no segundo trimestre de 2016 alcançou R$ 1,5 trilhão. Frente política Na frente política, o governo deverá aprovar a PEC do Teto dos Gastos no Senado, em votação de segundo turno, marcada para dia 13 de dezembro. Quanto à reforma da Previdência, a intenção do governo é de apresentar sua proposta de reforma ainda este ano. Mas, diante das tensões que se acumulam na área política (Calero x Geddel), é bem possível que a reforma previdenciária seja inserida na agenda do Parlamento apenas na próxima legislatura. Delação do fim de mundo Até amanhã deverá estar concluído o acordo de delação de mais de 50 executivos da Odebrecht. Será a "delação do fim de mundo". O juiz Sérgio Moro faz votos para que o "Brasil sobreviva". As delações do Grupo que faturou 125 bilhões de reais em 2015 reuniram 400 advogados. Especialização no PL 4302 O PL 4302, que trata da especialização de serviços, tende a ser o foco do governo e do setor de serviços terceirizados. Tem competente e denso parecer do deputado Laércio Oliveira/SD-SE. Esse projeto, aprovado pela Câmara, foi ao Senado, onde recebeu emendas, voltando, então, à Câmara. Já o PLC 30, que também trata da terceirização e está no Senado, ganhou um relatório desastrado do senador Paulo Paim. Rejeitado pelo setor. O marco regulatório da terceirização aguarda aprovação pelo Congresso há três décadas. O setor é regulado pela extravagante súmula 331, do TST, defasada no tempo. Confiança em expectativa A confiança no amanhã é um vetor que anima parcela forte do setor produtivo. Mas essa confiança está na balança que, ora pende para a esquerda, ora cai pela direita. Em certos momentos se equilibra no meio. A expectativa é que o Brasil comece a se recuperar em 2017. Os investidores prestam atenção no confiômetro. Sigilo de conversa O advogado Fernando Augusto Fernandes esclarece que a conversa gravada e veiculada na mídia entre um advogado e o ex-governador Garotinho não foi com ele. E alerta que a comunicação entre advogados e clientes está sob sigilo de acordo com a lei 8906/94. O levantamento de sigilo pelo juiz e o fornecimento de informações à imprensa estão fora dos objetivos da lei. Por isso, quando isso ocorre comete-se um crime na forma do art.10 da lei 9296/94. O advogado diz que o juiz que abriu o sigilo de conversa com o ex-governador responderá por este ato. Fernando, admirado A propósito, Fernando Fernandes é um dos maiores criminalistas do país. Acaba de ser eleito um dos mais admirados advogados. Seu escritório - Fernando Fernandes Advogados - está também na relação dos principais do país. Abuso de autoridade A lei de abuso de autoridade está na pauta do Senado e recebe prioridade para votação nos próximos dias. A questão é polêmica. De um lado, uma parcela forte de pensamento enxerga na lei uma tentativa de quebrar o poder de juízes e membros do Ministério Público. Uma espécie de tiroteio contra a Lava Jato. De outra parte, advogados e políticos que consideram extravagantes e arbitrárias ações de integrantes do Judiciário e do MP. Uma coisa é certa : a lei precisa chegar a um bom termo. Sem prejudicar as funções dos protagonistas que operam o Direito. Nem lá, nem cá. Rubens Approbato Minhas homenagens póstumas a uma das maiores figuras com quem tive a honra de trabalhar : Rubens Approbato Machado. Portador de grandes virtudes : seriedade, dignidade, respeito pelo próximo, lealdade, amizade, ampla visão da vida, conhecimento das leis e dos meandros do Direito, coragem, simplicidade. Rubens, um homem magnânimo. Um grande caráter. A ele posso atribuir a expressão de José Ingenieros, o magistral escritor argentino : "Os caracteres excelentes ascendem à própria dignidade, nadando contra todas as correntes baixas, a cujo refluxo resistem com energia. É fácil distingui-los imediatamente em face de outros, pois não se desvanecem nessa névoa moral em que aqueles se descoloram. Sua personalidade é toda brilho e aresta : firmeza e luz como cristal de rocha". Estados falidos A situação dos Estados é de falência. Quebrados, sem recursos, muitos terão dificuldades de pagar salários de fim de ano aos servidores. Anos de desorganização financeira, empréstimos externos, dívidas se acumulando e sendo postergadas, falta de planejamento, obras faraônicas são alguns dos fatores que deixam os Estados em pleno despenhadeiro. A repartição de recursos repatriados será a salvação passageira. Mas esses recursos, parcos, são uma gota d'água no deserto de carências. Roberto Freire O novo ministro da Cultura, Roberto Freire, é o quinto pernambucano no Ministério do governo Temer. Freire é um quadro dos mais qualificados da política. Presidente do PPS, será um braço mais à esquerda do corpo governamental. Bons ministros Os ministros Bruno Araújo, Helder Barbalho, Mendonça Filho e Gilberto Kassab, das Cidades, da Integração Nacional, da Educação e da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, respectivamente, são muito bem avaliados pelo Palácio do Planalto. Costumam ser citados como exemplos de quadros proativos, eficientes e diligentes. Neymar sob denúncia MP da Espanha pede dois anos de prisão para Neymar. Motivo : corrupção nos contratos. Quem acreditará nisso ? Mas a acusação pode redundar em pesada multa. Fecho a coluna com as historinhas do nosso folclore político. Um par de chifres No velório de Jânio (1992), apareceu um homem aos prantos. Jurava que, muitos anos antes, estava no alto de um prédio disposto a se matar quando Jânio, então um jovem vereador, gritou : - Não faça bobagem. Ele explicou que ia pular porque a esposa o traíra. Jânio dissuadiu o suicida : - O que tua mulher te arrumou foi um par de chifres, não um par de asas. Desça daí já ! Salvou o homem. Perspectivas e características Quais as perspectivas que se apresentam ao Brasil em um contexto de crise ? Confesso que não sei responder. Mas uma historinha do Sebastião Nery sobre perspectivas pode ajudar a responder : Luís Pereira, pintor de parede, dormiu com 200 votos e acordou como deputado Federal. Era suplente de Francisco Julião, líder das Ligas Camponesas, em Pernambuco, cassado pela ditadura. Chegou a Brasília de roupa nova e coração vibrando de alegria. Murilo Melo Filho melou o jogo, logo no aeroporto, com a pergunta abrupta : - Deputado, como vai a situação ? Confuso, nervoso, surpreso, sem saber o que dizer, tascou : - As perspectivas são piores do que as características. Pois é, a esta altura, tem muito Luís Pereira perorando por aí...