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Porandubas Políticas

Por dentro da política.

Gaudêncio Torquato
quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

Porandubas nº 557

Abro a coluna com uma historinha do Rio de Janeiro. Lugar de almirante Sandra Cavalcanti era deputada da Arena, foi ao interventor Faria Lima: - Almirante, tenho três reivindicações do partido para tratar com o senhor. - Pois não, deputada. - A primeira é a transferência de um fiscal do Estado para a capital. Ele está no interior, mas é um funcionário antigo e já merece uma posição melhor. - Deputada, lugar de fiscal é na fiscalização. Qual é a segunda reivindicação? - É um gari doente, governador. Não pode ficar tomando chuva. Queríamos levá-lo para a sede da Comlurb, mas o Marcos Tamoyo não concorda. O senhor podia falar com ele? - Deputada, lugar de gari é na rua. Qual é a terceira? - Uma professora de Campo Grande. Por problemas de família, precisa vir para a Secretaria. - Lugar de professora é na escola, deputada. Só isso? - Só, governador. Muito obrigada, até logo. E antes que me esqueça: lugar de almirante é no navio. E foi embora. (Da verve de Sebastião Nery). Previdência e olhos cegos Muitos deputados Federais estão de olhos vendados. Cegos por obtusa visão sobre a reforma da Previdência. Imaginam que se votarem contra a reforma, ganharão o aplauso das ruas. Ledo engano. Pois bem, a eleição para eles seria mais fácil se o clima econômico fosse positivo. Mais dinheiro no bolso, mais harmonia social, mais felicidade propiciariam mais concordância com o status quo. E mais aceitação do quadro político. A recíproca é verdadeira. Logo, a reforma da Previdência seria uma alavanca para levantar o ânimo de investidores e do mercado. Ajudaria a formar o ambiente positivo. Tumulto e indignação A recíproca: falta de grana no bolso, carências, tumulto na economia gerarão maior dose de indignação. O que redundará em maior distância entre eleitor e candidato. Ou seja, o ambiente negativo será muito ruim para os candidatos. A aprovação da reforma da Previdência funcionaria como alavanca de empuxo. PIB da felicidade Qualquer aumento no Produto Nacional Bruto da Felicidade, que tem seu motor na economia, ajudaria o candidato. Lorota essa ideia de reforma da Previdência é ruim para o povão. Ela acabará, isso sim, com privilégios de quem recebe aposentadoria de 30, 40 mil reais, servidores públicos de modo geral, incluindo os políticos. Logo, candidatos que são contra a reforma, na verdade estão defendendo privilégios de marajás. Caindo do cavalo Só mesmo incautos, bestuntos e radicais das oposições cairão nessa de achar que a reforma será ruim para o Brasil. Sem reforma, vai faltar mais adiante dinheiro para pagar as aposentadorias. Nessa hora, os bestuntos vão reconhecer: puxa vida, cai em mais uma lorota do D. Luiz Primeiro e Único e sua Corte de áulicos. A queda do cavalo será fatal para a carreira política de alguns. A conferir. A mentira Um estudo recente feito pelo consultor do Senado, Fernando Nery, analisou o comportamento dos eleitores em 1998. Pois bem, quem votou a favor das mudanças do INSS (idade mínima) propostas pelo governo FHC teve melhor resultado nas eleições: 72% dos candidatos favoráveis se elegeram e apenas a metade dos que foram contrários conseguiu um novo mandato. Portanto, é lorota essa ideia de jerico - de quem vota a favor da reforma da Previdência perde voto. Trata-se, isso sim, de defesa de privilégios. Faltam muitos votos Falta um bom número de votos - cerca de 40 ou mais - para se alcançar os 308 necessários. Mesmo fechando questão, alguns partidos verão parcela de seus integrantes votando contra. Os partidos não deverão punir os quadros contrários à reforma da Previdência. Logo, a janela continuará aberta a votos contrários à orientação das siglas. Em fevereiro? Difícil Aqueles que enxergam fevereiro como mês mais propício para votar a reforma da Previdência podem estar cometendo um erro de análise. Quanto mais próxima a decisão do pleito, mais difícil será a aprovação. Ano eleitoral fecha a possibilidade. É mais lógico imaginar votação após o pleito. Nesse caso, os deputados eleitos estariam mais dispostos a decidir favoravelmente. Muitos daqueles que se posicionaram contra a reforma não voltarão à Câmara. A conferir. Eunício sentou sobre MP A perplexidade é geral: por que o senador Eunício Oliveira sentou sobre a MP da Reforma Trabalhista? Por que o presidente do Senado não deu vazão ao processo de discussão e decisão sobre a MP? A Comissão da MP nem ainda foi formada. Qual o interesse em dar por vencida esta Medida? 24 de fevereiro é o prazo final para sua aprovação/desaprovação. Com a protelação, entraríamos no mês de abril. Prazos Como é sabido, uma Medida Provisória produz efeitos imediatos, mas depende de aprovação do Congresso Nacional para transformação definitiva em lei. Seu prazo de vigência é de 60 dias, prorrogáveis uma vez por igual período. Se não for aprovada no prazo de 45 dias, contados da sua publicação, a MP tranca a pauta de votações da Casa em que se encontrar (Câmara ou Senado) até que seja votada. Neste caso, a Câmara só pode votar alguns tipos de proposição em sessão extraordinária. Comissão mista Ao chegar ao Congresso Nacional, é criada uma comissão mista, formada por deputados e senadores, para aprovar um parecer sobre a Medida Provisória. Depois, o texto segue para o Plenário da Câmara e, em seguida, para o Plenário do Senado. Se a Câmara ou o Senado rejeitar a MP ou se ela perder a eficácia, os parlamentares têm que editar um decreto legislativo para disciplinar os efeitos jurídicos gerados durante sua vigência. Se o conteúdo de uma Medida Provisória for alterado, ela passa a tramitar como projeto de lei de conversão. Alckmin lidera em SP Geraldo Alckmin (PSDB), com 23,7%, lidera intenções de voto para presidente no Estado de São Paulo, de acordo com levantamento do Instituto Paraná Pesquisas. Em segundo, Jair Bolsonaro (PSC), aparece com 19,9%, empatado com Lula (PT), que está em terceiro, com 19,4%. A quarta colocação é de Marina Silva (Rede), com 9,6%. E, em quinto, Ciro Gomes (PDT), com 4,6%. Em sexto, o senador Álvaro Dias (PV-PR), com 3%, seguido pelo ministro da Fazenda Henrique Meirelles, com 1%. 14% dos eleitores responderam nenhum, e 3,9% não sabem ou não quiseram responder. O exemplo de Maomé Maomé levou o povo a acreditar que poderia atrair uma montanha. E que, do cume, faria preces a favor dos observantes da sua lei. O povo reuniu-se; Maomé chamou pela montanha, várias vezes; e como a montanha ficasse quieta, não se deu por vencido, mas disse: "Se a montanha não quer vir ter com Maomé, Maomé irá ter com a montanha". Dessa forma, os homens que prometeram grandes prodígios e falharam sem vergonha (porque nisso está a perfeição da audácia), passam por cima de tudo, dão meia-volta e realizam o seu feito. (Francis Bacon em seus Ensaios) Melhoria no ambiente É visível a melhoria geral no ambiente, resultado dos dados positivos da economia. Os supermercados estão bem mais cheios do que no mesmo período do ano passado. A par do varejo, a indústria e o setor de serviços ganham índices de expansão. O ambiente está mais descontraído e os eventos de final de ano, organizados pelos setores, exibem conversas mais animadoras, recheadas de esperança. Alckmin e as barreiras Geraldo Alckmin foi escolhido presidente do PSDB, mas terá barreiras altas pela frente. A primeira será buscar a harmonia de um partido muito dividido. Ala Serra, Ala Aécio, Ala FHC, Ala Alckmin, Ala Arthur Vigílio, entre outras. Os tucanos se bicam desde sua fundação. Trata-se de um partido de muitos caciques, que disputam poder. A segunda barreira é atrair parcerias, a partir do DEM e do PMDB. Necessárias para Geraldo ganhar preciosos minutos na mídia eleitoral. Ocorre que os dois partidos pensam em lançar candidatos ou a apoiar um perfil que venha de encontro aos entes que formam o centrão. Quantidade não resolve tudo Nem sempre quantidade ganha a guerra. O armênio Tigrane, instalado sobre uma colina com 400 mil homens, viu avançar o exército romano, que contava apenas com 14 mil soldados. Tigrane, galhofeiro, gritou: "Para embaixada é muito, para combate é pouco". Antes do pôr do sol, o pequeno exército romano infligiu uma derrota e enorme carnificina ao gigantesco exército armênio. A criatividade é, ainda, a arma que vence pela surpresa. Discurso tucano A terceira barreira diz respeito ao perfil do governador, que é um conciliador por natureza. Educado, fino no trato. Mas o Brasil, nesse momento, está precisando de uma expressão forte, capaz de canalizar as vozes de indignação que se espalham a torto e a direito. O perfil, nesse momento, lembra o de Mário Covas, o espanhol esquentado que apreciava dar um murro na mesa e fazer calar adversários. Geraldo Alckmin carece de um discurso mais forte. No PMDB, há um grupo ainda muito ressentido com Alckmin e, no DEM, a parceria tradicional fica distante. Lula sai pelos cantos Quanto mais apanha, mais Lula foge pelos cantos. Não entra em luta corporal. Prefere dar cotoveladas à distância. É desse modo que Lula está se comportando nessa fase de pré-campanha. Diz que a Lava Jato está jogando o Rio de Janeiro no atoleiro; diz que a Petrobras está sendo espoliada, esquecendo que foi no ciclo petista que a maior empresa pública do país perdeu essa condição, sendo nocauteada pela corrupção; faz-se de vítima, quando é a Justiça que o condena; diz que o desemprego é culpa do Michel Temer, quando foi o ciclo petista que produziu 13 milhões de desempregados. E ainda tem artista que vai ao palco aplaudir o embuste. Violência O Brasil está despontando como um dos países mais violentos do mundo. Em 15 anos, matou o equivalente à população de uma Lisboa e meia (786 mil pessoas), mais que os habitantes de Frankfurt, na Alemanha. Os 28 países da União Europeia mataram menos. E na guerra da Síria, foram mortos 331 mil. Nos atentados terroristas do século XXI, 238 mil. Fecho a coluna com Borges. Epílogo "Um homem se propõe a tarefa de desenhar o mundo. Ao longo dos anos, povoa um espaço com imagens de províncias, de reinos, de montanhas, de baías, de naus, de ilhas, de peixes, de moradas, de instrumentos, de astros, de cavalos e de pessoas. Pouco antes de morrer, descobre que esse paciente labirinto de linhas traça a imagem de seu rosto". (Jorge Luis Borges)
quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

Porandubas nº 556

Abro a coluna com historinha da Paraíba. Em diagonal Severino Cabral foi prefeito de Campina Grande/PB, vice-governador, chefe político de muitos votos. E conhecido pelas tiradas engraçadas. Uma tarde, no Rio, andava pela avenida Rio Branco. Resolvendo passar para o outro lado, meteu-se na frente dos carros, fora do sinal. O guarda gritou: - Cidadão, não pode ir por aí. É proibido atravessar em diagonal. Severino Cabral voltou: - Você não conhece roupa não, ignorante? Isto não é "diagonal". É "tropical maracanã". Atravessou em diagonal com seu tropical maracanã. Outra de Campina Grande Num comício em Campina Grande/PB, Alcides Carneiro falava e foi aparteado por um popular. - "Campina Grande é de Argemiro!" De imediato respondeu: - "Campina, és muito grande para pertenceres a um só homem..." Maia candidato Rodrigo Maia é uma boa surpresa do atual momento político. Guindado à presidência da Câmara em um momento de intensa crise política, Rodrigo tem se saído melhor que o figurino. Graças a ele, o Executivo tem conseguido avançar com sua coleção de reformas: teto dos gastos, reforma educacional, reforma trabalhista, lei da terceirização, mini-reforma política. E em curso, a reforma da Previdência, para a qual o presidente da Câmara tem dedicado grande esforço. Homenagem na Cebrasse Rodrigo foi homenageado nesta segunda-feira com o Prêmio Cebrasse Personalidade Política do Ano. Tive oportunidade de fazer breve saudação aos homenageados. No caso de Rodrigo, puxei algumas características de seu perfil: liderança, diálogo com todos os partidos e líderes, capacidade de mobilização, firmeza, coragem de fazer uma agenda avançada. Dessa forma, tem se tornado grande protagonista do momento político. Falei mais: por essas qualidades, gabaritava-se a entrar no figurino de 2018 como candidato das forças do centro, combinando bem com o perfil a defender o legado do atual governo. A resposta de Maia Pois bem, ao discursar agradecendo a comenda da Central Brasileira de Serviços, Maia fez um denso discurso: traçou a herança maldita da era lulo-petista, puxou a orelha de candidatos que evitam votar reformas impopulares - sem analisar o bem do país -, comprometeu-se com as reformas, mostrou conhecimento de causa sobre as ameaças que pairam sobre a previdência, conclamou os empresários a se unir em torno da agenda reformista. Enfim, fez uma peroração de candidato. Minha conclusão: se o cavalo passar encilhado na frente, ele monta. No lugar de Meirelles Se a economia for resgatada e os resultados baterem no bolso do consumidor, a lógica apontaria para o perfil responsável pelo crescimento do Produto Nacional Bruto da Felicidade: Henrique Meirelles. Acho até possível que o governo esteja trabalhando com essa hipótese. Mas, convenhamos: o ministro é pesado como uma carreta. Tem fala arrastada, como se tivesse dificuldade de concluir o raciocínio; não consegue puxar aplausos em suas lentas perorações; não tem um pingo de carisma. A economia recuperada até poderia funcionar com sua sombra ou alavanca. Mas funcionará melhor se compor o discurso de alguém mais jovem, flexível, hábil na articulação, leve e solto. Rodrigo Maia entra bem nesse traje. Por isso mesmo, pode vir a ser um bom candidato. Aventura? Não é bem assim Rodrigo acha muito cedo para uma "aventura" como uma candidatura presidencial, ele que não teria votos para se eleger governador de seu Estado, o Rio de Janeiro. Este é seu raciocínio. Ora, o pai dele, César Maia, um perito em ciência política, sabe muito que não se pode comparar os pleitos. O pleito estadual tem suas nuances. O pleito Federal ocorre ao sabor de circunstâncias, parcerias partidárias, tempo de mídia eleitoral e muito simbolismo. O que representa o candidato: o passado ou o futuro, qual sua agenda, qual tem sido seu papel na crise. Dilma foi eleita em 2010 sem nunca ter tido voto em campanhas anteriores. Eliot Cheguei, até, a lembrar ao Rodrigo Maia a lição do poeta T.S. Eliot: "somente aqueles que se arriscam a ir longe demais, sabem até onde podem chegar". Quem não arrisca, permanece no mesmo lugar. Os extremos se sustentam? A indagação é recorrente: as extremidades na campanha eleitoral de 2018 darão o tom? Este consultor analisa o caso assim: até o momento de ampla visibilidade dos principais protagonistas, a tendência é a de manutenção de elevado grau de polarização entre os extremos, à direita e à esquerda, no caso Bolsonaro e Lula. Depois a tendência é a de espraiamento das ideias e dos perfis com arrefecimento dos radicalismos e reforço de posições centrais. O candidato do centro poderá ser a alternativa contra os radicais. O candidato do centro Geraldo Alckmin entra no traje de candidato do centro? Sim. Mas falta a Geraldo a firmeza, a determinação, a coragem de ousar. Trata-se de uma figura simpática, incapaz, porém, de matar uma mosca, como se diz na linguagem das ruas. Geraldo ainda pega em seus ombros a tibieza de um partido repartido. O PSDB é um ente muito fracionado em alas, grupos, caciques. O murismo - subir no muro - faz parte da identidade tucana. Ele poderia dar uns murros sobre a mesa, como fazia Mário Covas, seu amigo e tutor. Procura-se um candidato Essa é a lógica que correrá nas margens do pleito: procura-se um candidato de centro, enérgico, líder, com boa fluência e grande discurso. Descartam-se os nomes que já estão na pré-campanha: Marina, Ciro, etc. Geraldo apresenta os vieses acima mostrados. Meirelles? Tem os problemas acima expostos. Rodrigo Maia? Combina com o momento. Mas a política é cheia de coisas imponderáveis. A posição de Lula A anunciada antecipação do voto do relator do caso Lula (tríplex), João Pedro Gebran Neto, da 2ª instância, é um forte indicativo de que o processo poderá ser julgado em março ou abril de 2018. O voto de Gebran foi enviado ao revisor dos processos da Lava Jato, desembargador Leandro Paulsen, que produzirá seu voto e fará seu encaminhamento ao 3º integrante da turma, desembargador Victor Luis dos Santos Laus. Viabilidade? Os três poderão aumentar ou diminuir a condenação feita pelo juiz Sérgio Moro. Se a decisão for unânime, caberá apenas um recurso, o embargo de declaração. Já um único voto divergente poderá ensejar um embargo infringente. Nesse caso, o processo é feito na 4ª seção, que reúne as 7ª e 8ª turmas, num total de seis desembargadores. Esses embargos atravessarão longos corredores. A decisão não é repentina. Este consultor acredita que Lula poderá viabilizar sua candidatura. E se não for candidato, fará um grande barulho. Protagonista O trem da economia mostra que a locomotiva ainda está lenta, mas caminha nos trilhos. E se o ritmo continuar o mesmo, teremos alguns avanços já no primeiro trimestre de 2018. Significa dizer que o conforto social poderá melhorar e, assim, influenciar o ânimo dos eleitores. Sob esse ângulo, o presidente Michel Temer poderá ganhar protagonismo às vésperas das eleições. A conferir. Judiciário menos turbulento O Poder Judiciário navegou em mares borrascosos. Discordâncias entre ministros do STF têm sido interpretadas como a existência de 11 tribunais naquela Corte. As decisões individuais quebram a harmonia no ambiente. Daí a hipótese que ganha corpo: os ministros se conscientizam da necessidade de união e decisões menos monocráticas. A sociedade quer ver um tribunal com menos turbulência. Renovação será alta? Fala-se que a renovação parlamentar em 2018 atingirá índices muito altos. O argumento é o de que a sociedade virou as costas para a política e, nessa esteira, fará grande renovação. A hipótese é razoável, mas esbarra num problema: e onde estão os novos nomes? O que se vê, em toda a eleição, é a volta dos quadros tradicionais ou de seus parentes. A renovação pode não ser a que se espera. Reprovação dos governos As eleições de outubro de 2018 ocorrerão sob o ciclo da maior reprovação de governos estaduais da contemporaneidade. A crise econômica corroeu as imagens de governadores. E bate forte nos redutos comandados por famílias tradicionais. Ambição desmesurada No meu livro Marketing Político e Governamental cito um pensamento do cientista político Robert Lane, em Political Life, que explica como a ambição desmesurada pelo poder funciona como um bumerangue. "A fim de ser bem-sucedida em política, uma pessoa deve ter habilidades interpessoais para estabelecer relações efetivas com outras e não deve deixar-se consumir por impulsos de poder, a ponto de perder o contato com a realidade. A pessoa possuída por um ardente e incontrolável desejo de poder afastará constantemente os que a apoiam, tornando, assim, impossível a conquista do poder". Prêmio Cebrasse - I A festa anual de entrega de prêmios da Cebrasse foi um sucesso. Além de Rodrigo Maia, receberam o Prêmio Destaque Legislativo a senadora Ana Amélia (PP-RS) e os deputados Rogério Marinho (PSDB-RN), relator da reforma trabalhista, Laércio Oliveira (SD-SE) e Walter Ihoshi (PSD-SP), além de personalidades nas áreas empresariais, sociais e jornalísticas. Prêmio Cebrasse - II Maria Cristina Frias, responsável pela coluna "Mercado Aberto" da Folha de S. Paulo, recebeu o prêmio Destaque Mídia Impressa e Ricardo Taira, editor-chefe da TV Cultura, o de Destaque Mídia Tevê. O presidente da Cebrasse, João Diniz, agradeceu a participação de todos nesta nova fase da economia brasileira, em especial no setor de serviços. Fecho a coluna com uma historinha do Rio Grande do Norte. O passarinho de Agenor Quando senador pelo Rio Grande do Norte, Agenor Maria (sindicalista rural, falecido em 1997), visitando o município de Grossos, foi interpelado pelo prefeito Raimundo Pereira. "Estamos precisando de uma escola para a comunidade de Pernambuquinho". De pronto, Agenor garantiu-lhe apoio à proposição. Semanas depois, um telegrama traz a boa-nova ao prefeito. "Escola está assegurada. Mande-me o croqui". Tomado pelo espírito de gratidão, Raimundo visita Agenor para agradecer o empenho, carregando uma gaiola à mão. Diante do senador, que estranha o acessório, Raimundo vai logo se explicando. "Eu não peguei um concriz como o senhor pediu, mas trouxe esse sabiá. O bichinho canta que é uma beleza!" (Historinha narrada em Só Rindo 2, por Carlos Santos, a quem, desde já, agradeço pela remessa dos dois livros que contam "causos" do Rio Grande do Norte).
quarta-feira, 29 de novembro de 2017

Porandubas nº 555

Suavemente... José Maria Alkmin (sem o C do Alckmin de São Paulo), o sábio das Minas Gerais, foi advogado de um crime bárbaro. No júri, conseguiu oito anos para o réu. Recorreu. Novo júri, 30 anos. O réu ficou desesperado: - A culpa foi do senhor, dr. Alkmin. Eu pedi para não recorrer. Agora vou passar 30 anos na cadeia. - Calma, meu filho, não é bem assim. Nada é como a gente pensa da primeira vez. Primeiro, não são 30, são 15. Se você se comportar bem, cumpre só 15. Depois, esses 15 são feitos de dias e noites. Quando a gente está dormindo tanto faz estar solto como preso. Então, não são 15 anos, são 7 e meio. E, por último, meu filho, você não vai cumprir esses 7 anos e meio de uma vez só. Vai ser dia a dia, dia a dia. Suavemente. (Sebastião Nery conta a historinha em seu Folclore Político). Conferência da Advocacia O maior evento da Advocacia brasileira. É a XXIII Conferência Nacional da Advocacia, que se realiza em São Paulo, no Anhembi, após quase 50 anos do último evento na nossa metrópole. Cerca de 30 mil inscritos. Presenças de figuras expressivas da operação do Direito, a partir da presidente do STF, ministra Cármen Lúcia e dos ministros do Supremo, Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes, além do ministro Emmanoel Pereira, vice-presidente do TST, representando a Corte. O presidente da OAB/SP, Marcos da Costa, fez peroração destacando a história de lutas da Ordem e as bandeiras levantadas pelos advogados, a partir das prerrogativas profissionais. Huck desafoga o meio A decisão do empresário-animador Luciano de desistir de candidatura presidencial em 2018, sonho de alguns partidos, desafoga o meio do espectro ideológico. Como se sabe, nas pontas, dois cavalos de corrida já abriram o páreo: Lula e Bolsonaro. No centro, Geraldo Alckmin prepara-se para ser protagonista de proa. Esse espaço ainda pode ser disputado por Marina Silva, Ciro Gomes, o senador Álvaro Dias, o outsider Joaquim Barbosa, eventualmente Henrique Meirelles e outros que tendem a adensar o grupo. O fato é que Huck era, até a última segunda, o nome mais ventilado. Com sua saída, Alckmin terá a candidatura vitaminada. Checando as possibilidades O problema que Geraldo Alckmin enfrentará é a conhecida tendência do PSDB de subir ao muro. Trata-se de um partido cercado de indefinições. E muita vaidade. De muitos caciques. Digamos que o governador de São Paulo tenha condições de unir as duas alas em briga: a do senador Tasso Jereissati e a do governador Marconi Perillo. Mesmo assim, grande desconfiança paira sobre o próprio governador. Ele trabalhou nos bastidores pela saída dos tucanos do governo Temer. E ficou na moita em matéria de posicionamento da bancada sobre a reforma da Previdência. Teria ficado mudo. Como disporia ele de condições para lutar por uma aliança com o PMDB? Minutos essenciais O PMDB disporá do maior tempo de TV e rádio na programação eleitoral. Esse espaço será vital para a massificação do nome dos candidatos e de suas propostas. O partido, mesmo execrado, é cobiçado para fazer alianças. Não se sabe quais serão seus passos: uma ala do partido defende candidatura própria; outra ala pensa em fazer aliança com um candidato do centro, podendo até ser Geraldo Alckmin. Se a economia ganhar muito fôlego, haverá pressão para que o próprio Michel seja o candidato. O fato é que o PMDB se esforçará para unir todos os partidos que integram o centrão, a partir do DEM, que possui um nome de grande potencial: Rodrigo Maia, o presidente da Câmara. A economia ditará o rumo A economia ditará o rumo a ser seguido. Por isso, não serão fechados acordos antes de maio/junho. Até lá se verá para onde irá a locomotiva econômica. Descarte-se qualquer aceno do PMDB em relação a Marina, Ciro, Joaquim Barbosa, Bolsonaro, Manuela D'Ávila, Álvaro Dias e outros. E Lula? Pois é, o PMDB pragmático será capaz de apoiar eventual candidatura de Lula, como já acenaram Renan Calheiros, em Alagoas, e até Ciro Nogueira, presidente do PP, no Piauí. Lula tem um exército de eleitores no Nordeste. E se a posição do PMDB nacional fechar questão contra eventuais apoios regionais a Lula? Esse será mais um pomo de discórdia. Ninguém tem provas... Numa festa, a dona de casa recebe um político famoso. - Muito prazer! - diz ele. - O prazer é meu! Saiba que já ouvi muito falar do senhor! - É possível, minha senhora, mas ninguém tem provas. Maia subindo Rodrigo Maia está se saindo muito bem como presidente da Câmara. Articula bem, conversa com gregos e troianos, sabe lidar com correligionários e opositores. Poderia ser o nome de consenso entre os partidos do meio. Mas Rodrigo receia arriscar-se. Prefere uma candidatura certa a deputado Federal que a vaga possibilidade de ganhar o assento presidencial. E o governo do Rio de Janeiro? Na situação em que se encontra o Rio, não será interessante sentar na cadeira de governador. Como presidente da Câmara, teria mais força e visibilidade. Mas o pai, o vereador César Maia, até veste bem o figurino de candidato. Seria uma boa composição. Michel quer pacificar Já a intenção de Michel Temer é a de ser reconhecido como o presidente das reformas e o dirigente que pacificou o país, após o terremoto da era petista. Não cogita candidatura presidencial, até porque quer atuar como magistrado na busca do entendimento e do consenso entre os partidos do centro. E se a economia bombar em 2018? Essa é uma recorrente pergunta. Os correligionários poderiam fazer enorme pressão para jogá-lo na corrida. Mesmo assim, seria pouco provável que aceitasse. Mas como a política é a arte do imprevisível, tudo pode acontecer. Barbosa Joaquim Barbosa parece muito envaidecido com a possibilidade de vestir o manto de candidato a presidente. Mas, à moda Huck, deve rejeitar a hipótese. Enfrenta problema de coluna - que lhe causa dores - e hoje está confortável no papel de ex-presidente do STF, paparicado em todos os lugares. Deixar essa situação de conforto e optar pela luta política poderia ser má opção. Este consultor não aposta na candidatura de Joaquim Barbosa. Marina, a Santa Marina Silva continua etérea, cercada por ares puros e éticos. Mas ainda assim, não teria estrutura - porte, tamanho, fortaleza, tempo de TV, etc. - para sustentar uma campanha pesada. A impressão é a de que lhe faltaria oxigênio para chegar aos últimos 500 metros da corrida. Por isso, poderá ser uma candidata respeitada e admirada, com boa bacia de votos, particularmente de segmentos jovens. Mas sem chance de sentar na cadeira presidencial. Ciro, o Canhão Trata-se de um sujeito preparado, falante, destemido. Mas diz o que pensa e um pouco mais. E essa condição lhe subtrai muito voto. Ciro sofre da síndrome do touro: pensa com o coração e ataca com a cabeça. Por isso, se sairá bem nos debates eleitorais entre candidatos, mas será visto com desconfiança por parte de parcela ponderável da sociedade. Fará bonito no Nordeste, onde circula com desenvoltura. Álvaro e Manuela O senador Álvaro Dias tem imagem muito regional. Confina-se no Paraná. E seu novo partido, o Podemos, não terá cacife para "poder" alçá-lo a um patamar elevado nas pesquisas. Quanto a Manuela D'Ávila, trata-se de perfil simpático. Encarna o poder jovem. Mas seu PC do B é limitado. Sua imagem também é muito regional (RS). E Meirelles, hein? Henrique Meirelles teria chances? Primeiro, vale dizer que o homem é pesado. Não tem um pingo de carisma. Fala de maneira arrastada, como se estivesse com dificuldade de concluir o pensamento. Mas vai que a economia dê um enorme salto... Se isso ocorrer, poderá surgir na frente dele um cavalo corredor. Milagres acontecem. E, na política, o imponderável nos faz visita de tempos em tempos. Bolsonaro emplaca? Tudo é possível. Meu amigo Lavareda, perito nas pesquisas e um grande pesquisador da "alma brasileira", acentua que "o posicionamento dele é bom". Concordo que o deputado Jair Bolsonaro se aproveita das circunstâncias. Do Brasil que clama por ordem, disciplina, autoridade. Bolsonaro encarna esse espírito. Só que precisamos verificar o que irá ocorrer: terá tempo disponível de mídia para massificar sua pregação? Não será canibalizado por protagonistas com maior poder midiático? Não será destroçado em debates? Terá tranquilidade suficiente para responder às inquietantes indagações que certamente lhe serão feitas? Lula e seu bolsão Seja ou não candidato, Lula terá bom quinhão de votos. Poderá ajudar candidatos majoritários em alguns Estados. Se for condenado em 2ª instância, abrirá a polêmica: "não querem deixar que seja candidato". A novela Lula terá muitos capítulos por todo o ano de 2018. O PT continuará na linha do ataque. E suas bandeiras vermelhas tenderão a amimar os exércitos contrários. As batalhas não serão poucas. O poder midiático A campanha de 2018 será ainda balizada por eventos da Lava Jato. Quer dizer, eventuais competidores poderão ter seus nomes ventilados, aqui e acolá, ao sabor das investigações e consequentes denúncias. Por isso, é possível que tenhamos altos e baixos nas intenções de voto. A corrida eleitoral, cheia de tropeços, poderá até desestabilizar grandes protagonistas. Os desfechos serão imprevisíveis. Baixo astral Os atores do circo eleitoral estarão submetidos, ainda, à avaliação dos eleitores. Governadores mal avaliados deverão perder a reeleição, a não ser que os adversários façam parte da velha política; senadores e deputados, da mesma forma, serão vistos como continuidade ao tradicional sistema. Candidaturas novas terão melhores condições de desempenho. O discurso será importante: o que prometer e como viabilizar as promessas. Pesquisa qualitativa Para conhecer bem o que pensa o eleitor, a indicação é a pesquisa qualitativa. Grupos bem escolhidos e representativos do colégio eleitoral poderão mostrar o que pensam, como pensam, expectativas, anseios, angústias, indignação, esperanças. Os candidatos precisam mergulhar fundo na consciência coletiva. Peru não morre de véspera A eleição de um candidato depende do momento, das circunstâncias, da temperatura social, dos versos e reversos da economia, do perfil dos adversários, dos debates e combates na arena eleitoral, dos climas regionais, da força da mídia eleitoral (significando tamanho dos programas eleitorais), dos inputs momentâneos (uma crise abrupta, um caso espetaculoso) - enfim, de uma escala de elementos ponderáveis e imponderáveis. Os fatores imprevisíveis abrem as possibilidades. Única verdade: peru não morre de véspera. A viabilidade de candidatos Carlos Matus, cientista social chileno, em um magistral estudo sobre Estratégias Políticas, demonstra que a viabilidade de um ator na política tem a muito que ver com a estratégia e seus princípios fundamentais. Eis alguns princípios estratégicos: a) Avaliar a situação; b) Adequar a relação recurso/objetivo; c) Concentrar-se no foco; d) Planejar rodeios táticos e explorar a fraqueza do adversário; e) Economizar recursos; f) Escolher a trajetória de menor expectativa; g) Multiplicar os efeitos das decisões; h) Relacionar estratégias; i) Escolher diversas possibilidades; j) Evitar o pior; k) Não enfrentar o adversário quando ele estiver esperando; l) Não repetir, de imediato, uma operação fracassada; m) Não confundir "reduzir a incerteza" com "preferir a certeza"; n) Não se distrair com detalhes insignificantes; o) Minimizar a capacidade de retaliação do adversário. Fecho a coluna com uma historinha de Tenório Cavalcanti. Armado de admiração Tenório Cavalcanti, udenista e adversário político de Vargas, foi ao Catete numa comissão de deputados. Andava nas manchetes dos jornais por causa de suas estripulias em Caxias, na base da "Lourdinha" (metralhadora) e da capa preta. Getúlio o cumprimentou, olhou bem para o volume do revólver embaixo do braço esquerdo, sob o paletó: - Deputado, o senhor está armado? Tenório ficou vermelho, mas não perdeu o bote: - Sim, presidente, armado de admiração por V. Excelência.
quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Porandubas nº 554

Abro a coluna com uma historinha cheia de graça que presenciei e que envolve o grande e saudoso governador Franco Montoro. Agrário e urbano Franco Montoro ficou famoso pela troca de nomes que fazia. Há muitas histórias envolvendo essa modalidade de dislexia ou dislogia. Uma delas ocorreu comigo, no restaurante dos professores no campus da USP. Montoro havia sido convidado por um grupo de professores para fazer uma palestra sobre o Brasil e a América Latina, dentro do fórum de debates que desenvolvia na Fundação que criou e dirigiu. Certo momento, ao falar do RN, meu Estado, ele passou a se referir a nomes de amigos comuns e conhecidos. Foi quando, de repente, depois de vários acertos, ele me pega de surpresa com a indagação: "E o Agrário, como vai o Agrário"? Respondi: "Agrário, governador, não sei quem é, não me lembro...". Comecei a mapear os nomes de pessoas famosas. Aí lembrei-me de um nome: Urbano. E repus a pergunta: "Por acaso, governador, não é Urbano, Francisco Urbano"? Era. Na época, Urbano dirigia a Contag - Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura. Daí a confusão. Em respeito ao grande homem público, contive a risada! A política avança A articulação política ganha volume à medida que os protagonistas - partidos e lideranças - veem aproximar-se o tempo de grandes decisões voltadas ao pleito de 2018. Alguns movimentos deixam ver passos e sinais. À direita, sobe o tom da candidatura Bolsonaro, que abre um leque de conversações com lideranças e faz peregrinação em alguns países (até nos EUA) tentando se mostrar ao mundo. À esquerda, Lula se apresenta como o eixo que gira a máquina petista e seu entorno, o PC do B, o PSOL, parcela do PSB e outras pequenas fatias. No centro, a movimentação tem dois grandes articuladores, o presidente Michel Temer e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Cada área está querendo ver além do horizonte. À direita O deputado Bolsonaro começa a se desfazer de adjetivos que o tornam canhão amedrontador. E ensaia um discurso liberal como forma de agradar ao mercado. Mas suas peripécias discursivas não serão esquecidas. Negocia entrada no Patriota, que faz uma limpeza de área nos Estados para colocar nomes confiáveis e comprometidos com o deputado. Como é, hoje, o único nome com grande visibilidade na direita, torna-se o principal bastião contra Lula. Doria perde essa condição em face da quase certeza que Alckmin deverá ser o candidato do PSDB. À esquerda Luiz Inácio é um caixeiro-viajante. Corre o mundo. Faz-se presente aqui e ali, inclusive em atos de lançamento de candidaturas de outros partidos. Foi assim que se fez presente no Congresso do PC do B, em Brasília, quando foi lançado o nome da deputada estadual Manuela D'Ávila à presidência da República. Manuela fez, naquele evento, a defesa de Lula, dizendo que é condenado sem provas. O objetivo fica claro: união de PT e PC do B em eventual segundo turno. O PSOL, por sua vez, mapeia os quadros para decidir se sai com Lula ou com candidatura própria. A questão esbarra na hipótese: se o candidato for um parlamentar (Chico Alencar, Marcelo Freixo ou outro), enfrentará a ameaça de perder a condição de deputado em 2018. Afinal, este partido não tem capital eleitoral para eleger um presidente. No centro Os partidos do centro precisarão de muito esforço de seus articuladores para chegar a um consenso. A ideia que passa pelas cabeças de suas lideranças é a de formar um amplo espaço central, acolhendo PMDB, DEM, PP, PTB, PRB, Podemos, etc. - e escolher um nome capaz de aglutinar no centro pedaços da esquerda e da direita. Esse perfil canalizaria os esperados bons feitos do governo, a partir da economia com números saudáveis - inflação de 2,5%, Selic de 7%, emprego crescendo, setores primário, secundário e terciário com bons dados de crescimento, PIB podendo chegar a 1,5. Quem será o nome? PSDB com dificuldades O PSDB caminha na direção de Geraldo Alckmin. Mas entrará com força diminuída no pleito. A pendenga aberta por Tasso Jereissati e os cabeças-pretas (deputados mais jovens) contra o governo deixa sequelas. Há visível contrariedade de peemedebistas e outros partidos da base em relação aos tucanos, sob a hipótese, que ganha corpo, de que o PSDB não será apoiado pelo PMDB e outros. Nesse caso, preciosos minutos de rádio e televisão seriam perdidos pelo PSDB, arrefecendo a visibilidade de seu candidato na campanha. Alckmin não saiu bem na fita do afastamento do PSDB do governo. E Doria? João Doria se afasta um pouco da guerrilha que se trava hoje entre grupos tucanos para se dedicar com mais afinco à administração. Foi criticado pelas viagens que fez aos Estados. Mesmo assim continua a ser um player forte no campo eleitoral. Trata-se de um perfil determinado. Se perceber que tem chances, não se descarta a possibilidade de sair como candidato por outras siglas, a partir do próprio PMDB. João mantém excelente relacionamento com o presidente Temer. O recuo de hoje, portanto, faz parte do jogo. Fala-se, ainda, da possibilidade de vir a ser candidato a vice na chapa de Geraldo Alckmin ou ao governo do Estado. Este consultor descarta essas alternativas, eis que será praticamente impossível uma chapa puro-sangue paulista ou uma candidatura ao governo de SP, coisa que aumentaria o racha na floresta tucana. E Huck? Luciano Huck está sendo paparicado por alguns partidos, a partir do PPS comandado por Roberto Freire. Poderá ser uma candidatura viável em 2018? Sim. Na política, tudo é possível, principalmente levando-se em consideração a indignação social contra os políticos tradicionais. Acontece que os palanques eleitorais são bem diferentes dos palcos de animação de programas de auditório. E se Huck não dispuser de tempo de TV para massificar suas ideias? Este consultor não acredita na viabilidade político-eleitoral do empresário Luciano Huck. Mas deixa no ar a famosa lição: em política, tudo é possível. E Moro? Pois é, o Instituto Paraná Pesquisas acaba de mostrar uma pesquisa dando conta do bom potencial do juiz Sérgio Moro. Teria ele melhores condições de que Huck, mais precisamente 35,5%, caso fosse o candidato. A mesma pesquisa diz que pouco mais da metade dos brasileiros votaria em um candidato estreante na política. Voltando a Lula Lula fará das tripas coração para tentar viabilizar sua candidatura. Usará todas as brechas possíveis para conseguir sua meta, a partir da sinalização de que só uma condenação transitada em julgado, na terceira instância, o impediria de seguir o caminho. Seja qual for o desenlace, Lula será o principal semeador na roça eleitoral das esquerdas. É exímio em palanque, dá nó em ponta de faca. Vai atribuir o desemprego ao atual governo. E queimará as reformas do governo Temer, mesmo diante de números que mostram o Brasil entrando nos trilhos. Este consultor tende a acreditar que Luis Inácio deverá esquentar o clima eleitoral, seja como candidato seja como fogueteiro. Voltando ao centro Os partidos do centro chegarão ao consenso em torno de um nome ou tendem a ir à luta com seus quadros? Esse é o x da questão. Unidos, poderão ir longe; desunidos, abrirão espaço para a chegada ao segundo turno do candidato da esquerda ou o candidato da direita. A hipótese do candidato da esquerda chegar ao segundo turno é mais provável que a chegada de um candidato da direita. Mais viável seria a chegada do candidato do centro. Claro, caso os partidos do bloco não se dividam. Temer e Maia O presidente Michel Temer e o presidente Rodrigo Maia estão afinados. Temer ouve muito Maia, que teria endossado o nome de Alexandre Baldy para o Ministério das Cidades. A hipótese também é viável: sob apoio do presidente da Câmara, é possível se chegar aos 308 votos necessários para a aprovação da reforma da Previdência na primeira quinzena de dezembro. Caso aprovada, ganharia o aplauso do mercado. Em 2018, (Eunício quer votar apenas em março) seria votada no Senado. Se os dados da economia mostrarem boa recuperação do país, certamente a tendência dos senadores seria de aprovação da matéria. E se isso ocorrer, o presidente da República será um grande eleitor no pleito de 7 de outubro. Imbróglio está no ar O TRF da 2ª região mandou prender novamente o presidente da Alerj, Jorge Picciani, e mais os dois deputados do PMDB que estavam presos. O imbróglio está no ar. O que acontecerá? E se a Assembleia voltar a contrariar a Justiça? E se o caso bater no STF? Diz-se que não está fora de cogitação intervenção na Casa Legislativa. O fato é que a brecha aberta pelo STF no caso Aécio Neves está produzindo denso contencioso. A palavra final será a da nossa mais Alta Corte. A força do Nordeste O Sudeste concentra mais da metade do eleitorado brasileiro. Geraldo Alckmin confia muito na boa avaliação dos paulistas ao seu governo. Só São Paulo tem 35 milhões de eleitores. Mas o Rio e Minas Gerais serão dois polos fortes de oposição. Dito isso, surge o voto nordestino. Será decisivo. O NE tem 27% dos votos do país. Daí a busca frenética do nome do vice na região. Alckmin procura um nome do Nordeste. Quem? Um quadro de respeito é o deputado Jarbas Vasconcelos, do PMDB de Pernambuco. A questão é: como o PMDB encararia esta escolha? O deputado tem lastro e história. AT&T/Times Warner O Departamento de Justiça dos EUA ajuizou ação na segunda-feira para anular a compra pela AT&T da Time Warner, dona dos estúdios Warner Bros e das redes de TV HBO e CNN. O movimento foi classificado como incomum por especialistas do setor, uma vez que o acordo entre as duas empresas, de US$ 85 bilhões, foi anunciado há mais de ano. A AT&T é operadora de telefonia e provedora de TV a cabo e internet móvel e fixa. No Brasil, tem participação na TV por assinatura Sky. O governo argumenta que o contrato viola leis antitruste, pois a AT&T poderia "usar o controle sobre a programação popular da Time Warner para causar danos à concorrência ... e resultar em oferta de conteúdo menos inovador e contas mais altas para as famílias americanas". Na nota, o estilo rompante e ameaçador de Trump. Fecho a coluna com uma historinha de Morro Agudo/SP. Tape os ouvidos Em Morro Agudo, a 80 quilômetros de Ribeirão Preto/SP, havia um comerciante de muito prestígio, mas analfabeto (verdade). Tinha um empregado que lia as coisas para ele. Um dia, o comerciante brigou com a mulher, separaram-se, contrataram advogados, foram para a Justiça. Certo dia, chegou uma carta da mulher com inúmeras folhas, passando a limpo (ou a sujo) os longos anos de vida em comum. Ele não poderia pedir ao empregado para ler. Tinha vergonha. Chamou seu melhor amigo: - Você pode ler esta carta para mim? Mas você vai me fazer um favor. Eu sei que ela vem falando tudo, contando tudo. Então você leia alto para mim, mas, se quiser continuar meu amigo, tape os ouvidos.
quarta-feira, 8 de novembro de 2017

Porandubas nº 553

Abro a coluna com a Paraíba do grande José Américo. Cancelando chuvas A seca era medonha. A Paraíba em desespero, o governador aflito. Um dia, caiu uma chuva fininha no município de Monteiro. Inácio Feitosa, o prefeito, correu ao telégrafo: "Governador José Américo: chuvas torrenciais cobriram todo município de Monteiro. População exultante: Saudações, Feitosa". Os comerciantes da cidade, quando souberam do telegrama, ficaram desesperados. O município não ia mais receber ajuda. Ainda mais porque a mensagem era falsa e apressada. Feitosa correu de novo ao telégrafo: "Governador José Américo: cancelo chuvas. População continua aflita. Feitosa, prefeito". O clima político A tensão pode ter diminuído com o fechamento da porta da 2ª denúncia contra o presidente, mas o ambiente parlamentar ainda é cheio de interrogações. E de muita pressão. Dúvidas: o governo terá forças para levar adiante a agenda reformista? Conseguirá ter suficiente número de votos para aprovar a reforma da Previdência? E a simplificação tributária? A pressão está alta. Partidos do centro querem ver tucanos fora da base e tomar seu lugar. PMDB, inclusive, faz pressão. O presidente ouve muita gente no confessionário do Planalto. PSDB, taquara rachada O tom é, como se diz no vulgo, de taquara rachada. Meio agudo, meio grave. E muito sustenido. (Desculpem os musicólogos se este escriba cometeu heresia com a partitura). O fato é que o tucanato continua sem saber que rumo tomar. Parte quer sair logo do governo, parte quer ficar até abril, prazo de desincompatibilização de ministros que serão candidatos nas eleições de outubro. A impressão é de que a saída será antecipada. O desgaste para a imagem do governo com as trapalhadas do PSDB já foi contabilizada. O que mais está em jogo? Imagens dos candidatos O que está em jogo é a imagem de candidatos. Imaginam que permanecer na máquina faria um dano a suas imagens. Ora, os tucanos não vão melhorar sua imagem com saída antecipada. Já estão depreciados sob esse prisma. O guru do partido, FHC, quer ver logo a saída. Alckmin, idem. Mas essa posição não atenuará a posição dúbia do partido. O eleitorado sabe quem é quem. E acompanha até as maquinações de efeito eleitoreiro. É evidente que o partido manteve um cordão umbilical com o governo. Constatar que a protelação da saída ligaria o PSDB ao peemedebismo, como escreveu Fernando Henrique, é sandice. Execrar agora a aliança com o PMDB é burrice. Que santidade FHC está querendo apregoar? As chances de Alckmin Se Geraldo Alckmin acha que vai ganhar mais votos com o afastamento dos tucanos do governo Temer cometerá um desatino. A real politik, governador, se ancora em parcerias entre siglas. Se não por identificação ideológica - eis que todas nadam no pântano da desideologização -, pelo menos por conveniência. Afinal, os bons minutos que o PMDB e outras execradas siglas possuem serão vitais para a massificação do discurso de candidatos. O PMDB não vai deixar seus minutos migrarem com facilidade. Detalhemos essa questão. Tempo de TV O tempo de TV e rádio será fundamental na campanha de 2018. Mais que em campanhas anteriores. Por uma simples razão: a campanha será mais curta - 35 dias de mídia e não mais 45 -, recursos financeiros também bem mais curtos, eleitorado desconfiado e indignado, expectativa por um discurso convincente. Partamos de um exemplo: João Doria, em São Paulo, fez o maior leque de alianças partidárias dos últimos tempos. Teve um tempo longo de rádio e TV para expor suas propostas. Ganhou muita visibilidade. E deixou seu opositor para trás em matéria de articulação com as massas. Articulação e mobilização A campanha de 2018 vai se amparar, além do eixo da comunicação, nos eixos da articulação e da mobilização. O primeiro diz respeito aos contatos, parcerias e efetivos vínculos que os candidatos deverão estabelecer com entidades organizadas, líderes comunitários, bases políticas nas regiões e bairros, etc. Já a mobilização diz respeito aos contatos diretos com o povo. Se o candidato em campanhas passadas chegava a gastar sola ou borracha de dois pares de sapatos, deve se preparar para gastar quatro pares. Vai ter muita andança. O eleitor indignado vai querer ver o candidato - olho no olho, ombro a ombro, testa a testa, mão na mão, porta a porta, casa a casa. Campanha mais direta Candidatos não são sabonete ou pacote de macarrão. Não adianta fazer uma bela campanha de marketing televisivo, com a fosforescência de luzes e efeitos cinematográficos. O eleitor está desconfiado de tantas promessas. Quer sentir a alma do candidato. E não apenas sua voz pelo rádio ou TV. Quer conferir o grau de verdade. E isso será objeto da maior proximidade entre candidato e eleitor. Os valores pessoais serão checados. Mas o projeto, a ideia central, as propostas, enfim, deverão ganhar substância. Programas devem ser oportunos, diretos, objetivos, de forma a atender aos reclamos mais urgentes das populações, dos Estados e regiões. Um bom candidato Em 2018, o eleitor buscará um candidato com as seguintes qualidades: experiência, honestidade; vida limpa e passado decente; assepsia; equilíbrio/ponderação; preparo; coragem/determinação; autoridade (não confundir com autoritarismo). Há uma saturação de perfis antigos, que usam as esteiras da velha política. O eleitor quer ver perfis mais identificados com suas grandes demandas: segurança, saúde, educação, melhoria das condições de vida nas regiões, nos bairros, nas ruas. Quem apresentar propostas mais condizentes com as necessidades do eleitor terá melhores condições de ser escolhido. E o medo? Lula e Bolsonaro passam Lula e Bolsonaro aparecem hoje como finalistas das eleições de 2018. Este consultor político não acredita nesta hipótese que tem sido defendida por analistas de todos os espectros. Por quê? Primeiro, porque um deve ser impedido pela Justiça e o outro, porque, além de ser considerado um perigo radical, deverá ser engolfado pela avalanche de discursos de outros. Bolsonaro terá muito pouco tempo de mídia. Não resistirá. E Lula, mesmo que garanta sua condição de candidato, passa hoje mais medo do que esperança. Em 2002, expressava esperança. Hoje é a extensão do medo. Principalmente junto aos bolsões médios, que funcionam como os clarinetes e trompetes da orquestra. Esperança Essa é a virtude mais ansiada pelos conjuntos eleitorais. Das margens carentes aos grupamentos mais altos da pirâmide social. Os pobres esperam que seu candidato abra as portas da esperança, sob a ilusão de que ele trará progresso, encherá seu bolso de dinheiro, garantirá a educação de seus filhos, comida barata, transporte ligeiro. Enfim, a felicidade está atrás da porta que o candidato promete abrir. Já as classes médias querem ver políticas mais ajustadas ao estado do país e que se reflitam em segurança, harmonia social, melhoria dos serviços públicos, conforto. O candidato que mais se identificar com estas expectativas e políticas será escolhido no momento do voto. (É claro que haverá sempre bolsões tradicionais que votarão de "cabresto"). Segurança O país está tomado pela violência, que se espraia por todo o território. Por isso, o discurso da segurança será bem acolhido. Mas as promessas vãs e banais - bandido bom é bandido morto, bandido irá para a cadeia - não conseguirão convencer. Propostas devem ser demonstradas quanto à viabilidade. O discurso exigirá comprovação sobre a aplicação das ideias. Onde estarão os recursos? De onde virão? Maná não cai do céu. Quem desejar ser crível, precisa comprovar aquilo que dirá. Rio de Janeiro O Rio de Janeiro é um caso sério. Garantir segurança no Rio de Janeiro parecerá tarefa para um semi-deus. Como? As Unidades de Polícia Pacificadora estão enfrentando problemas. No Rio, o furo é mais em cima. Conluio de corrupção. O ministro Torquato Jardim pôs o dedo na ferida. Lula perdoa Lula está dizendo que "perdoa" os golpistas. Pragmático, acena a aliança com Renan Calheiros, em Alagoas, e Eunício Oliveira, no Ceará. A Democracia Socialista (DS) reage. Combate essa formação. Gleisi, a presidente do PT, acena com parcerias de esquerda, o que faz fechando o olho direito, que reabre para ver Lula entrando de soslaio pela banda direita. Eita, PT. A invasão chinesa Os chineses iniciaram a invasão no Brasil. De janeiro a outubro deste ano, movimentaram cerca de US$ 10,84 bilhões - mais de R$ 35 bilhões. As aquisições chinesas saltaram de 6, no ano passado, para 17. E vão subir muito. Em 2018, espera-se uma enxurrada de recursos. Pelo menos 10 grandes empresas demonstram interesse em investir em áreas como energias renováveis, ferrovias, portos, mineração, papel e celulose e até em telecomunicações. Reforma trabalhista Sábado, 11, entrarão em vigor os dispositivos aprovados na reforma trabalhista. Parcela de juízes do trabalho e membros do Ministério Público do Trabalho prometem não cumprir a nova legislação. Seria um caso clássico de desobediência civil, que baterá inevitavelmente nos Tribunais Superiores. Só estes poderão sustar os "violadores" da lei. Só mesmo no Brasil pode-se constatar a aberração de um juiz - o servidor por excelência para fazer cumprir a lei - desobedecer o estatuto legal. Neil Ferreira Um nome que fez história na propaganda brasileira. Um dos mais criativos publicitários. Um contador de belas histórias. Um gozador. Um grande papo. Um crítico feroz da política e de seus protagonistas. Um amigo. Deu-nos adeus, ontem. Que Deus o acolha. Fecho a coluna com uma historinha do Paraná. Conversando no jardim Manuel Ribas, interventor no Paraná (1932/1935), depois governador (1935/1937), despachava no palácio, mas gostava de morar em sua casa. Bem cedinho, chega um rapaz e encontra o jardineiro regando o jardim: - Seu Ribas está? Sou filho de um grande amigo dele. Meu pai me mandou pedir um emprego a ele. Eu podia falar com ele? - Poder, pode. Mas, e se ele não lhe arrumar o emprego? - Bem, meu pai me disse que, se ele não arranjasse o emprego, eu mandasse ele à merda. - Olhe, rapaz, passe às 4 da tarde lá no palácio, que é a hora das audiências, e você fala com ele. Às 4 horas, o rapaz estava lá. Deu o nome, esperou, esperou. No salão comprido, sentado atrás da mesa, o jardineiro. Ou seja, o governador. O rapaz ficou branco de surpresa. - O que é que você quer mesmo? Repetiu a história. "Meu pai me mandou pedir um emprego ao senhor". - E se eu não arranjar o emprego? - Então, seu Ribas, fica valendo aquela nossa conversa de hoje de manhã, lá no jardim.
quarta-feira, 1 de novembro de 2017

Porandubas nº 552

Ronaldo Cunha Lima Abro a coluna com engraçadas historinhas envolvendo o poeta, historiador, ex-senador, ex-deputado e ex-governador da Paraíba, Ronaldo Cunha Lima, figura sempre bem lembrada nos causos de política. Quem conta é Diógenes da Cunha Lima, o grande poeta e escritor, seu primo e presidente da Academia Norte-Rio-Grandense de Letras em seu livro sobre "Ronaldo Cunha Lima, um nordestino de todo canto". O nome é Glauce Quando lhes nasceu a filha, a princesa da casa, "A doce paz que me aquieta" foi sugerido o belo nome Raquel. Ronaldo nega. Queria Glauce. E atacou com a caricatura da fala do nordestino: - Quando ela pedir alguma coisa e não souberem bem o que é, vão dizer : Qué qui Raqué qué? Bondade Na "Convenção dos Cunha Lima", em Pirangi, mostro a Ronaldo o brasão familiar com o lema que inventei: A bondade vence. Ele acrescenta: - A Bondade vence, mas é melhor quando... Convence. O verso alheio Um escritor carioca, laureado, em roda de admiradores, fala sobre suas desventuras em Recife. Ronaldo não gostou da apresentação: - Este aqui é um nordestino. Que veio advogar no Rio é poeta sonetista. O escritor, com ares superiores, proclama: - Soneto é a minha pátria. Hoje mesmo, pela manhã, fiz este soneto. E recita. Ronaldo contesta: - Não pode ser. Só se lhe baixou um espírito, foi psicografado. Conheço este soneto desde menino. Penso que é de um velho poeta português. - Que história é essa? - Posso provar, diz Ronaldo. E recita os 14 versos. Depois, sorrindo, explica que decorou o poema na hora, ao ouvir a leitura. Lula e Bolsonaro Leio e pasmo: Bolsa cai e dólar sobe por causa de pesquisa do Ibope, que mostra Lula, com 35%, e Bolsonaro, 13%. O mercado estaria reagindo negativamente ao quadro apresentado. O pior é constatar que analistas e comentaristas entram na onda dessas pesquisas que não retratam o que efetivamente ocorrerá no país em outubro de 2018. A partir da possibilidade de Lula vir a se candidatar, tudo gira em torno de uma grande interrogação. Condenação na 2ª instância A maioria das projeções, hoje, aponta para eventual condenação de Lula na 2ª instância. Mas, se não houver consenso na Turma em que será julgado, a candidatura de Lula será levada adiante, na esteira de uma interpretação ensejada pelo STJ, a de que nesses casos, recursos (de embargos infringentes) podem ser apresentados. Portanto, a tese de que só poderá ser impedido após sentença transitada em julgado continua sendo defendida. As circunstâncias Aceitemos, portanto, a hipótese da candidatura Lula. Terá ele adversários e um repertório pesado de denúncias e acusações o espera. O legado que o PT deixou no país não passará em brancas nuvens. O país deverá continuar a recuperar seus níveis de emprego, a inflação deve continuar seu controle e os juros tendem a permanecer em índice de queda. Lula aguentará? Difícil responder, mas a lógica dos tempos eleitorais indica que as circunstâncias do momento determinarão sua posição no ranking. BO+BA+CO+CA A economia puxará o trem da política. Logo, a velha equação que sempre lembro dará o tom: Bolso com dinheiro, Barriga satisfeita, Coração Agradecido, Cabeça tende a votar com os patrocinadores da boa situação. A recíproca é verdadeira. Lula será, claro, uma vedete no Nordeste, onde o eleitorado, mesmo sob bombardeio sobre ele, o admira, considerando-o o Pai dos Pobres. Mas o Sudeste, com o maior bolsão eleitoral do país, pode funcionar como a pedra jogada no lago. Ondas concêntricas se formarão até chegar às margens. O Sudeste, nesse caso, será a tuba de ressonância eleitoral. Transferência Lula terá condições de transferir sua votação caso seja impossibilitado de ser candidato? Pouco provável. Apenas uma parcela de seus eleitores poderia seguir sua recomendação. A parcela mais engajada e contrita e restrita ao Norte, Nordeste e Centro-Oeste. A campanha será realizada sob um novena de palavrórios contra a roubalheira e contra a bandidagem na política. Poucos escaparão ao bombardeio. Será um verdadeiro tiro ao alvo. Bolsonaro Este deputado, ao contrário das projeções de alguns analistas políticos, não terá chances de chegar ao segundo turno. As galeras que hoje lhe fazem festa nos aeroportos não conseguirão ter votos suficientes para torná-lo altamente competitivo. Há uma tendência de querer ver um candidato de direita para se contrapor a Lula, mas será pouco provável uma escapada das massas pela banda direita. Da mesma forma que Lula, a identidade de Bolsonaro será exposta e seu despreparo será evidenciado. Perfil do centro Este consultor insiste em manter sua visão de que o país examinará a moldura de perfis, mas, na reta final, tenderá a adotar a linha do meio. In médium, virtus - a virtude está no meio. Não há nomes a citar nesse momento. Mas os valores da harmonia, do equilíbrio, do bom senso, do apaziguamento de ânimos, da pacificação do país devem compor o discurso ansiado pela comunidade. Paz e não guerra continuada - essa seria a bandeira hasteada no coração nacional. Outsiders? A eleição de um outsider não é coisa fora de propósito no contexto da política pós-sociedade industrial, onde se amontoam as mazelas que corroem as democracias, como a desideologização, o declínio dos partidos, o declínio dos parlamentos, o declínio das oposições, a personalização do poder, a ascensão das tecnoestruturas e o aparecimento de novos circuitos de representação, como associações, sindicatos, federações, núcleos, grupos, movimentos de toda a ordem. O deslocamento da política tradicional para outros espaços é uma realidade aqui e alhures. Cacareco O momento e as circunstâncias induzem a comportamentos inusuais da base política, como a eleição de um Cacareco. Lembremos: em 1959, com a morte de Getúlio Vargas, sob o governo de Adhemar de Barros, em São Paulo, o eleitorado indignava-se contra vereadores paulistanos. Na campanha, apareceu o rinoceronte Cacareco (na verdade uma fêmea), vindo do Rio emprestado para abrilhantar a inauguração do zoológico. O empréstimo era por seis meses. Passado o tempo, os paulistanos fizeram um movimento para que o animal de 230 quilos aqui ficasse. Um movimento decidiu pela candidatura de Cacareco a vereador com este slogan: "vale quanto pesa". Um matreiro candidato saiu à rua carregando uma onça, apostando no slogan: "eleitor inteligente vota no amigo da onça". 100 mil votos Na época o voto era num pedaço de papel que o eleitor colocava em envelope recebido do mesário. Gráficas imprimiram milhares de cédulas com o nome do bicho. Cacareco recebeu 100 mil votos, quando o candidato mais votado naquele ano não ultrapassou 110 mil votos. Infelizmente, Cacareco não pode comemorar. Foi devolvido ao zoológico do Rio, vindo a morrer poucos anos depois, antes de completar 10 anos. (O coração não resistiu a tanta emoção). A revista Time acabou dando ênfase à frase de um eleitor: "é melhor eleger um rinoceronte do que um asno". Um perigo A revolta do eleitorado se faz ver na frase comum em todos os rincões: "todo político é ladrão". Infelizmente, o país corre esse risco, que o levaria a uma crise de proporções inimagináveis, porquanto um Huck ou outra celebridade não teria condição de "pôr o guizo no gato", administrar a complexidade da nossa política: 35 partidos, sistema bicameral com duas casas congressuais, presidencialismo de coalizão, etc. Teria de se submeter ao DNA de uma cultura, cujas raízes estão fincadas nas roças do fisiologismo, do nepotismo, do grupismo, do coronelismo. Nem Marina Silva, com roupagem ética, ou mesmo Ciro Gomes, com sua metralhadora expressiva, resistiriam ao poder de mando da nossa representação, 513 na Câmara e 81 no Senado. Nomes fora da política terão condições de administrar um país com sua crise política crônica. Rodrigo Maia A CEBRASSE - Central Brasileira de Serviços homenageará Rodrigo Maia, presidente da Câmara, com o Título de Personalidade Política do Ano, graças ao seu empenho e ao seu comando na esfera parlamentar, principalmente por ocasião da aprovação da Lei da Terceirização e da Reforma Trabalhista. Rodrigo foi, inquestionavelmente, figura de primeira grandeza na aprovação de projetos importantes para o país. Graças a ele, a agenda do Executivo conseguiu caminhar bem. Merece todas as homenagens. Será no dia 4/12, no Buffet Dell'Orso à rua Tuim, 1.041 - Moema, na capital paulista. O almoço reunirá 200 empresários dos setores de serviços. Meirelles O ministro Henrique Meirelles diz achar "interessante" uma candidatura a vice-presidente da República. Se a economia efetivamente se recuperar bem, vale a pena trocar a declaração: "serei candidato à presidência da República". Meirelles só pensa nisso. E o PSD do ministro Gilberto Kassab alimenta a ideia. Justiça trabalhista Deve esbarrar no STF a disposição do MPT e alguns juízes de não cumprirem as disposições emanadas na Reforma Trabalhista e na Lei da Terceirização. A Anamatra, Associação dos Magistrados do Trabalho, pilota a contrariedade. O ministro Ives Gandra Filho acredita que o enquadramento de juízes e procuradores deve ser feito pelo cabresto do Supremo. A conferir.
quarta-feira, 18 de outubro de 2017

Porandubas nº 551

Uma historinha da terra do ministro Carlos Ayres Britto, Sergipe. Mamãe, pode morrer tranquila Fernando Leite, filho do senador Júlio Leite, presidia a Assembleia de Sergipe quando Seixas Dória era governador. Seixas teve de ir ao Rio enquanto o vice-governador Celso Carvalho estava no Rio Grande do Norte assistindo ao enterro da sogra. Assumiu o governo o presidente da Assembleia por dois dias. Fernando Leite mandou telegramas a todas as embaixadas comunicando ao mundo sua governança. Orgulhoso, como bom filho, telegrafou à mãe, internada e gravemente enferma em hospital do Rio: - Mamãe, pode morrer tranquila. Seu filho é governador. Beijos, Fernando. Mais um atrito Mais um atrito entre o presidente da Câmara Rodrigo Maia e o governo foi administrado. Rodrigo defendeu a "harmonia" entre os Poderes e afirmou que agirá com imparcialidade no processo de tramitação da segunda denúncia contra o presidente Michel Temer na Casa. Garante que o episódio sobre a divulgação dos vídeos da delação do operador Lúcio Funaro está superado. "Não há nada por trás da minha imparcialidade que seja pra ajudar ou atrapalhar o presidente Michel Temer". O fato é que há poderosas forças fazendo pressão para inflar o balão de tensões. Entre essas forças, um poderoso grupo de mídia. Voto aberto no Senado O ministro Alexandre de Moraes, do STF, decidiu nesta terça-feira, 17, que o Senado deve fazer votação aberta para decidir sobre o afastamento de Aécio Neves. Foi o que se cumpriu. O voto aberto tirou votos favoráveis ao tucano mineiro. Jader, Anastasia, Jucá e Renan fizeram discursos importantes. O resultado era imprevisível ante a manifestação prévia de 30 senadores, que se manifestaram contra Aécio, o qual ganhou com 44 votos a favor e 26 contra. Derrubada a decisão da 1ª Turma do STF. Vetores de força para 2018 Mesmo nebuloso, o tempo em que desenvolverá o pleito de 2018 já permite inferir sobre alguns eixos que calibrarão as campanhas eleitorais. Tentemos explicitá-los: - proposições substantivas - o discurso será substantivo, recheado de propostas densas, factíveis, com foco na aplicação imediata; - inovação, vigor, assepsia - esses três conceitos andarão juntos. O eleitor tende a querer ver um perfil sem máculas, sem passado sujo, asséptico. Isso não quer dizer que empresários, fora da política, ou profissionais liberais, apenas pelo fato de se apresentarem como novidade, terão sucesso. Precisam mostrar experiência; - representatividade - os perfis deverão ter uma clara representação das parcelas/setores/segmentos que formam a sociedade. A tendência à distritalização ou à categorização profissional estará em destaque. Perfis hão de preencher os nichos sociais ou regionais; - a verdade, centralidade - o discurso político sempre fica no contorno, com os perfis tentando prometer coisas, dourar a pílula com imagens espetaculares, ou seja, engabelando a audiência por meio de recursos estéticos. Desta feita, o eleitor vai dispensar a lábia; - força no indivíduo - o pleito praticamente nivelará os partidos, com exceção para aqueles entes encravados nas pontas do arco ideológico. As siglas do meio tendem a se misturar na geleia partidária. Por isso, o pleito de 2018 acentuará o peso do individualismo. Maior participação Na esteira das grandes mudanças que se operam na vida institucional, sob o signo das investigações de escândalos, a sociedade vai aproveitar o momento para sair da tradicional linha de conforto. Significa que vai se empenhar para analisar perfis, analisar propostas, revisar pontos de vista. Perderá mais tempo na observação da política. Acompanhará mais de perto o desenrolar do pleito. Execração de perfis e siglas Veremos uma campanha de execração de figuras carimbadas da velha política. O esculacho partirá principalmente das classes médias e, dentre estas, dos profissionais liberais - médicos, engenheiros, professores, empresários, economistas, etc. Esses polos de crítica e influência terão importância capital na organização de nomes e seleção de quadros que saírem candidatos por partidos. Grandes comunicadores Voltar-se-á a prestigiar os bons mocinhos que aparecem nos picos de programas de grande audiência, como Luciano Huck, com quem identificam-se milhares de jovens de áreas centrais e periféricas. Os comunicadores, face a um pleito mais franciscano (de poucos recursos financeiros) voltarão a ser prestigiados e a ser chamados para integrar a lista de candidatos. Os mais ricos As campanhas eleitorais de 2018 privilegiarão as identidades pessoais, beneficiando candidatos com maiores recursos, aqueles que têm melhores condições de bancar a liturgia do espetáculo político. O pleito, mais franciscano, será uma corrida de obstáculo. Muita sola de sapato será gasta. Marketing de valores O marketing eleitoral de 2018 terá como foco forças e valores dos protagonistas, a partir da questão da honestidade. Compromissos, propósitos, propostas para a micropolítica (educação, saúde, mobilidade urbana, segurança, creches, moradia) liderarão as planilhas programáticas. Pausa...para um riso. Filosofia de Vitorino Vitorino Freire, ex-manda chuva que filosofava sobre o Maranhão: - Quando o pasto pega fogo, preá cai no brejo. - O risco que corre o pau, corre o machado. - Não quero que ajudem meu roçado. Só quero que os bois do vizinho não entrem nele. - O Sarney não conhece o tamanho do meu roçado. De um lado da cerca eu grito e ele não ouve do outro lado. - Política no Maranhão é um Bumba meu boi que não sai sem mim. São Paulo, o emblema do país São Paulo será o fator emblemático do país. Como o Estado com a maior população e a maior densidade eleitoral, São Paulo é, por excelência, o laboratório das experiências nacionais. Por isso mesmo, tende a disseminar pelo território os ideários e os tipos de discurso que ganharão ênfase em 2018. São Paulo abriga uma exemplar coleção da gente brasileira. A teoria do 1/3 Este consultor continua a pôr fé em sua resumida equação para a disputa presidencial de 2018: 30% para a direita, 30% para a esquerda e 30% para o centro. Sobram 10%, que deverão correr pelo arco ideológico, sendo mais provável a fixação da maior parte nos espaços do centro, que deverá atrair parcelas à direita e à esquerda. Poderes desbalanceados A constatação de que a representação política se apequena a olhos vistos é mais surpreendente quando se atenta para a equação tripartite do barão de Montesquieu. Resgatemos sua argumentação. O Poder Legislativo é formado por representantes do povo soberano; por conseguinte, a lei constitui um produto direto da democracia representativa. E os juízes? Nada mais são, segundo o autor de O Espírito das Leis, "senão a boca que pronuncia as palavras da lei, seres inanimados que não podem moderar-lhe a força nem o vigor". Resulta como paradigma liberal do Estado de Direito a submissão do Judiciário à lei e, nesse caso, sob o abrigo do Parlamento, já que este Poder exprime a vontade geral. A interpenetração Ao longo do tempo, as funções típicas dos Poderes foram se distinguindo de funções atípicas, passando a dominar, cada um, escopos delimitados nos campos Legislativo, Administrativo e Judiciário. Nem por isso a invasão do espaço de um Poder por outro deixa de ocorrer. Quando há espaços não preenchidos por falta de legislação, a invasão ocorre. A justificativa é que a intromissão se faz por necessidade de se preservar a vida institucional. E é nesse ponto que o Poder Legislativo amortece sua força. Acanhado, parecendo submisso, permite que outros Poderes avancem sobre seu território. Direitos sociais Como pano de fundo do definhamento, registra-se uma inversão na cronologia da cidadania: os direitos sociais chegaram para os brasileiros antes que os direitos políticos. E isso contribuiu para a formação de um Executivo forte. Desde Getúlio Vargas, na década de 30, o povo sente-se mais atraído por um Estado de longos braços protetores - sob um regime presidencialista e centralizador - do que por uma representação sem força, de baixo conceito e pouca confiabilidade. Hoje, apenas 3% dos brasileiros acham que os parlamentares merecem confiança. Igualdade social Cada homem, no fundo de seu coração, tem direito de julgar-se inteiramente igual aos outros homens. Depois de reconhecer este direito, em seu tratado sobre a igualdade, Voltaire retrata o cozinheiro do cardeal filosofando sobre as diferenças entre as classes do gênero humano: "sou um homem como o cardeal; nasci chorando como ele, e ele morrerá como eu. Temos as mesmas funções animais. Se os turcos conquistarem Roma e se eu vier a ser cardeal e o cardeal vier a ser cozinheiro, eu o tomarei a meu serviço". Leitura na campanha política Nosso partido cumpre o que promete. Só os tolos podem crer que. não lutaremos contra a corrupção. Porque, se há algo certo para nós, é que a honestidade e a transparência são fundamentais para alcançar nossos ideais Mostraremos que é grande estupidez crer que as máfias continuarão no governo, como sempre. Asseguramos sem dúvida que a justiça social será o alvo de nossa ação. Apesar disso, há idiotas que imaginam que se possa governar com as manchas da velha política. Quando assumirmos o poder, faremos tudo para que se termine com os marajás e as negociatas. Não permitiremos de nenhum modo que nossas crianças morram de fome. Cumpriremos nossos propósitos mesmo que os recursos econômicos do país se esgotem. Exerceremos o poder até que Compreendam que Somos a nova política. ________________ Leitura depois da campanha política. *Depois de eleito (leiam de baixo para cima).
quarta-feira, 11 de outubro de 2017

Porandubas nº 550

Abro a coluna com uma historinha da Paraíba. Sinceridade e sagacidade Zé Cavalcanti, ex-deputado paraibano, conta em seu livro A Política e os Políticos, que um coronel do sertão, ao passar o comando de seus domínios para o filho, aconselhou: - Meu rapaz, se queres ser bem sucedido na política, cultiva estas duas verdades: a sinceridade e a sagacidade. - O que é sinceridade, meu pai? - É manter a palavra empenhada, custe o que custar. - E o que é sagacidade? - É nunca empenhar a palavra, custe o que custar. O relatório de Bonifácio - I O deputado Bonifácio de Andrada (PSDB-MG) apresentou ontem o relatório em que recomenda à Câmara barrar a tramitação da denúncia criminal contra o presidente Michel Temer e os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral). Bonifácio fez fortes críticas ao Ministério Público, ao dizer que ele "comanda a Polícia Federal, mancomunado com o Judiciário, causando um desequilíbrio entre os Poderes e se tornando um novo poder". O relatório de Bonifácio - II O relator afirmou que o Ministério Público exerce uma atuação policialesca com o apoio "do noticiário jornalístico que fortalece essas atuações espetacularizadas pelos meios de comunicação". Para ele, Judiciário, Ministério Público e Polícia Federal têm tido um poder exacerbado, eivado de abusos, em detrimento do Legislativo e do Executivo. A votação da CCJ deve ficar para a semana que vem, podendo ir a plenário na semana do dia 25. E assim o governo espera mais uma vitória, até mais fácil do que na primeira denúncia. Homenagem a Mariz Antônio Claudio Mariz de Oliveira, que brilha na galeria dos advogados criminalistas do país, recebeu bela homenagem da classe, anteontem, em evento de desagravo organizado pela seccional paulista da Ordem e que teve como orador principal o jurista Técio Lins e Silva, representante do IAB - Instituto dos Advogados Brasileiros, a mais antiga entidade da Advocacia. Ali se ouviu um conjunto de perorações sobre a vida de Mariz, com destaque para sua bravura desde os tempos duros do arbítrio, e um painel sobre a importância da Advocacia. Alguns significados merecem destaque. Tempos nebulosos Fez-se na sessão de desagravo ampla radiografia desses nossos tormentosos tempos. Tempos de desrespeito aos advogados, a partir da invasão de seus escritórios; tempos de mídia servindo como arauto de uma cultura punitiva, como bem salientou o homenageado Mariz; tempos em que a mídia, de maneira irresponsável e espetaculosa, noticia "fatos que chegam às redações" sem conferir o teor de verdade; tempos em que os advogados são confundidos com a clientela; tempos em que a letra da lei é jogada no lixo, puxando "interpretações" que emergem ao sabor de fluxos e ondas com impacto na mídia; tempos de judicialização da política. Advocacia nos anos de chumbo Técio Lins e Silva lembrou os tempos da ditadura, quando a advocacia teve papel fundamental na defesa dos direitos humanos. Mostrou como em nossos estranhos tempos, o arbítrio dá sinais de volta, com o ardor punitivo, na esteira de certo "conluio" entre mídia, juízes e procuradores. A indignação é geral na classe com as invasões de escritórios, o acesso ao sagrado sigilo que resguarda a interlocução do advogado e clientes; as manchetes bombásticas que, a título de informação, acabam mais adiante desmentidas ou corrigidas em parte. O desleixo e a imprudência povoam a divulgação de "fatos". Mariz e a cultura punitiva Mariz, com a verve sempre muito bem certeira, mostrou o abandono da apuração de "fatos" pela mídia. A sociedade tem o direito de ser informada. E a imprensa exerce o dever de transmitir as informações que apura, sem acréscimos, elipses ou versões estapafúrdias, de forma a aparelhar o cidadão com a moldura informativa que o ajudará a formar opinião abalizada sobre os acontecimentos. A expressão do grande criminalista foi um chamamento à razão. Os juízes, por sua vez, não podem fazer letras mortas das leis. Ou produzir julgamentos sob a inspiração de manchetes espetaculosas, que servem para irradiar uma "cultura punitiva" no país. Se assim age, a mídia se transforma em arauto dessa cultura, quando deveria apurar fundamentos verdadeiros. Tempos de ontem e de hoje A impressão é a de que, nos tempos de ontem, mesmo os mais duros, havia mais respeito pelo exercício da advocacia. Hoje, advogados não são apenas considerados "longa manus" da ilicitude que se espraia no país, como são acusados de ganhos exorbitantes, de servirem apenas aos ricos, esquecendo os acusadores que a advocacia pro bono coloca exércitos de advogados na ajuda às causas de pessoas sem posse. Observação ao pé do ouvido: entre os porta-vozes dos "extraordinários ganhos dos advogados", estão âncoras de TV, cujos salários, pela grandeza, assombram crentes e descrentes. A responsabilidade da mídia Este consultor passou três décadas dentro de salas de aula, a partir de 1968, ministrando disciplinas de jornalismo (informativo, interpretativo, opinativo, empresarial, etc.) em algumas escolas de comunicação, entre as quais a ECA-USP e a Cásper Líbero. O eixo da responsabilidade social da imprensa ganhava sempre destaque nos cursos de graduação e pós-graduação. Pois bem, urge constatar que, naquela época, a apuração de fatos se regia por acurado rigor. Hoje, a pressa nas redações - ante a rapidez das redes eletrônicas - acaba amortecendo a apuração completa de informações. A crise da democracia representativa acabou puxando a política para o fundo do poço. E o jornalismo acabou correndo atrás. Mídia detesta felicidade Mariz fez um contraponto interessante, ao mostrar que a mídia prefere notícias escandalosas, negativas, bombásticas a fatos positivos. E arrematou, cáustico: a mídia não gosta da felicidade, só de coisas ruins. Observação: o principal telejornal do país virou uma imensa galeria de fatos policiais/policialescos. Sob o signo da condenação ou da morte. Espetáculo Na verdade, a informação nesses nossos plúmbeos tempos acaba sendo envelopada com os adereços do Estado-Espetáculo. E os profissionais do espetáculo, da política e, mais recentemente, da mídia compartilham frequentemente as mesmas atitudes e os mesmos vezos. Como diz Roger-Gérard Schwartzenberg: "como se o show business de desdobrasse em um pol'business", e nosso acréscimo, vemos também a mídia'business. Os cidadãos acabam saindo de sua condição de leitores para a condição de espectadores. Degradação A política vem se transformando em talk-show. Juízes e políticos se acostumaram a exibir suas performances nas TVs de suas casas de trabalho. Os discursos se atropelam. A democracia se afasta de seus valores centrais. O tom das mensagens busca uma abordagem "euforizante", ou seja, capaz de produzir euforia, catarse, espetáculo. Gérard é duro com os artistas do espetáculo, estejam eles na política, na mídia ou no Judiciário. Diz: "Calígula, o imperador, fez cônsul o seu cavalo. Mas a história recente tem também seus casos de desequilíbrio mental". Narcisismo Sobra, ainda, aos protagonistas do Estado moderno a propensão para o desejo de se transformarem em Narcisos. O mito diz que o belo Narciso desdenhou o amor da ninfa Eco. Que morreu de desespero e seus lamentos ainda hoje soam nas florestas. Os deuses puniram Narciso. Condenaram-no a se apaixonar pela própria imagem. Por isso, tomou-se de amores pela imagem, contemplando-a nas águas transparentes de sua fonte. Ficou obcecado pela paixão do reflexo. Definhando até morrer. A mídia não seria, para muitos, o espelho de Narciso? Que parece, parece. Descrença O velho Rousseau era um descrente da representação política. Para ele, uma abstração. O filósofo, defensor do ideal da soberania popular, dizia que "toda lei que o povo não tenha ratificado diretamente é nula, não é uma lei". E arrematava: "o povo pensa ser livre, mas está enganado, pois só o é durante a eleição dos membros do Parlamento, assim que são eleitos, ele é escravo". Como explicar o fundo? A reforma política produziu uma reversão de expectativas. Ganhou poucos adereços, entre os quais o fim das coligações proporcionais e a cláusula de barreira. As coligações vão durar um pouco mais, até 2020. Mas um estatuto vai gerar muitas críticas: o fundo de campanhas. Como justificar um fundo de quase R$ 2 bilhões para financiar o pleito de 2018? Será difícil explicar ao eleitor. Que vê escândalos por todos os lados. E dinheirama jogada fora com projetos que não lhe farão bem. História Nicolas Eymerich, um frade, produziu "O Manual dos Inquisidores em 1376". O Manual mostra os dez truques do inquisidor para neutralizar os truques dos hereges, na verdade um conjunto de manipulações, pressões, ameaças, promessas, benevolências, enfim, um completo arsenal de violência psíquica contra os réus. (A escolha desse roteiro tem o propósito de mostrar como alguns políticos usam artifícios semelhantes em seu discurso cotidiano.). 1. O primeiro consiste em responder de maneira ambígua. 2. O segundo truque consiste em responder acrescentando uma condição. 3. O terceiro truque consiste em inverter a pergunta. 4. O quarto truque consiste em se fingir de surpreso. 5. O quinto truque consiste em mudar as palavras da pergunta. 6. O sexto truque consiste numa clara deturpação das palavras. 7. O sétimo truque consiste numa autojustificação. 8. O oitavo truque consiste em fingir uma súbita debilidade física. 9. O nono truque consiste em simular idiotice ou demência. 10. O décimo truque consiste em se dar ares de santidade. Nossos mestres Uma vez, perguntei a Roberto Campos, ministro do Planejamento do presidente Castelo Branco, se sua estratégia não era a de pulverizar as verbas que, na época, em 1965, o governo tinha para aplicar na região Nordeste. O conceito de pulverização era a distribuição das verbas, de maneira franciscana, um pouquinho a cada Estado, uma migalha, o que poderia não gerar os resultados desejados. Contestador, dialético, Bob Fields (como era conhecido), pegou o foca (eu mesmo) de surpresa: "O que o senhor entende por pulverização?". Fiquei calado. Jânio Quadros era perito na arte de se fazer de surpreso. Perguntado por Leon Eliachar se o oval da Esso é mesmo oval ou aval, Jânio se toma de surpresa e arremete: "Sugiro-lhe, amistosamente, uma consulta a qualquer psicanalista. O Brasil é tão mencionado nesse seu questionário quanto a Esso". Foi uma tremenda gozação. E diante da pergunta: "Qual será seu slogan, 50 anos em 5 ou 5 anos em 60?". Jânio não hesita: "50 anos em 5, mais o pagamento dos atrasados". O truque de mudar as palavras das perguntas é muito comum no meio político. Ao político, é perguntado algo assim: "O senhor vai dizer tudo que sabe aos procuradores?". E ele responde: "Quem diz a verdade tem tudo a seu favor. Quem não deve não teme". O truque de deturpar as palavras é usual. Exemplo: "O senhor acredita que o relatório do BNDES não vai condená-lo?". Resposta: "O relatório pode ser uma peça de condenação ou de inocência. Se não comprova nada sobre minha pessoa, sou inocente. Quem me condena não é o Banco. É a imprensa". Fecho a coluna com tiradas mineiras. Mineirice Frases de Augusto Zenun, de Campestre, sul de Minas - político, industrial, filósofo e, antes de tudo, udenista ortodoxo da linha bilaqueana (Bilac Pinto, o Bilacão, seu dileto amigo). Sempre infernou a vida de seus adversários, com as suas atitudes destemidas e sua natural mineirice. "Quando estamos no governo, todo adversário que quer se encaixar, diz ser técnico". "O preço do voto de um eleitor mentiroso é sempre o mais caro". "Há um fato na política que a torna bastante interessante: o choque dos falsos políticos com os políticos falsos". "Político é dividido em duas partes. Uma trabalha para ser eleito. A outra trabalha para conseguir um cargo público se for derrotado". "Muita campanha eleitoral se parece com sauna: depois do calorão vem uma ducha fria". (De A Mineirice, de José Flávio Abelha)
quarta-feira, 4 de outubro de 2017

Porandubas nº 549

Abro a coluna com uma historinha de Arandu/SP Empregando o plural Arandu, em São Paulo, começou sua história como pequeno povoado, no bairro do Barreiro, no município de Avaré. Em 1898, um pedaço de uma fazenda leiteira da região foi doado para a construção de uma capela. Elevado a distrito de Avaré/SP, em 1944, recebeu na ocasião a atual denominação. Em 1964, conquistou a emancipação política. No primeiro comício, os candidatos a prefeito exibiam seus verbos. Dentre eles, o matuto José Ferezin. Subiu ao palanque e mandou brasa: - "Povo de Arandu, vô botá água encanada, asfaltá as rua, iluminá as praça, dá mantimento nas escola...". Ao lado, um assessor cochichou: - Zé, emprega o plural. O palanqueiro emendou: - Vô dá emprego pro prural, pro pai do prural e pra mãe do prural, pois no meu governo não terá desemprego. (Historinha enviada por Marcio Assis) Bom senso Prevaleceu o bom senso! Por ampla maioria, venceu a tese de adiamento da questão do afastamento do senador Aécio Neves! Ficou para o dia 17. Recado dado: se o STF confirmar no dia 11 que a palavra final sobre o afastamento é do Judiciário, terá a visão contrária do Senado no dia 17. O senado recuou hoje para ganhar mais adiante! O perfil da vitória Que perfil encarna com mais força a possibilidade de vitória em 2018? Tento arriscar: o perfil que exprimir confiança, credibilidade, respeito, experiência, equilíbrio, capacidade de colocar o Brasil nos trilhos. Passado limpo e vida decente. De onde virá esse perfil? Arrisco: do centro. Alguém que possa agregar entre 40% a 50% dos votos. As extremidades direita e esquerda deverão abrigar, cada qual, 20%. Vão sobrar entre 10% e 20% distribuídos em duas bandas: centro-direita e centro-esquerda. O centro terá força de atração para puxar aqueles índices e ganhar o pleito. Este consultor deixa ao leitor a escolha ou indicação do perfil com alguns dos valores e qualidades apontadas. De quem é a última palavra? A tensão entre os Poderes Legislativo e Judiciário atinge um grau de fervura. A questão central é: a última palavra para afastar um parlamentar pertence à Suprema Corte ou ao Congresso? Vamos à hipótese que, mesmo absurda, fundamenta-se na lógica: se o STF tem poder para afastar um parlamentar, pode afastar todos, 81 senadores e 513 deputados. Nossa democracia vestiria o manto da "judiocracia", sistema plasmado sob obra e graça do Poder Judiciário. Uma excrescência. Judicialização É comum ouvir-se nas rodas políticas o comentário de que os magistrados usurpam funções legislativas. As tensões entre os Poderes se acirram na esteira da própria "judicialização" das relações sociais, fenômeno que se expressa tanto em democracias incipientes quanto em modelos consolidados, como os europeus e o norte-americano, nos quais os mais variados temas envolvendo políticos batem nas portas do Judiciário. O fato é que a tese da judicialização ganha força. E o STF começa a receber fortes críticas de todos os lados. Montesquieu abandonado Montesquieu ponderava que juízes significavam a boca que pronuncia as palavras da lei, entes que não podem aumentar ou enfraquecer seu vigor. O tripé dos Poderes alinhava-se numa reta, embora o Legislativo ainda tivesse maior projeção. Com o advento do Welfare State, o Executivo passou a intervir de maneira forte para expandir a rede de proteção social. Passou, inclusive, a legislar, fato hoje medido entre nós pelas medidas provisórias e leis do Executivo. A crise, que se agudiza desde os tempos do mensalão, causa efervescência entre Poderes. STF em condição superior E nesses tempos de descrédito, o Judiciário, como intérprete da letra constitucional, aumenta sua força. Ao decidir se os Poderes Executivo e Legislativo, partidos e outros entes agem de acordo com a Constituição, o STF acaba definindo as regras da política na vida nacional, elevando o Judiciário a um patamar superior. Os textos legais, por seu lado, férteis em ambiguidade, propiciam condições para a instalação de um processo de judicialização da vida social. Disputas multiplicaram-se nas esferas pública e privada. A visibilidade dos tribunais se intensifica e seus membros passam a dar interpretação política aos conflitos. Ativismo do MP O MP, por sua vez, desenvolve forte ativismo. Promotores e procuradores de Justiça abrem espaço para um arsenal de ações civis públicas, reforçando a ideia de que é o quarto Poder. Lidera investigações na operação Lava Jato. Ganha proeminência. Órgãos governamentais usam-no para acionar outros órgãos públicos. O contencioso político-jurídico se adensa. Daí a esperada reação das casas congressuais. A lei de abuso de autoridade voltará ao centro de debates. O fato é que a crise entre os Poderes tende a se estender por um bom tempo, apesar dos esforços de seus presidentes para tentar amainar as tensões. Moro e o fim da Lava Jato O juiz Sérgio Moro está começando a enxergar o fim da Lava Jato. Não se trata de lamento. Parece imbuído da ideia de que o processo deve ter um fim e o país precisa inaugurar um novo ciclo regrado pelo resgate dos legítimos valores republicanos. Partindo de Moro, a hipótese de que a operação Lava Jato está chegando ao final sugere que, da parte que lhe toca, tentará apressar decisões. "Os barões da corrupção", na acepção dele, não terão mais vez. Tudo indica que Luiz Inácio deverá ser condenado em segunda instância e assim, será impedido de concorrer ao pleito de 2018. Lula em 1º lugar Vejamos a pesquisa Datafolha. Um amontoado de aparentes contradições. Lula domina todos os cenários, liderando a disputa de outubro de 2018. Ao mesmo tempo, a maioria da população apoia sua detenção. Quer vê-lo preso. Coisa estranha. Será que Lula é mesmo favorito? Este consultor tende a acreditar que não resistirá ao bumbo midiático de acusações, contradições e versões que recairão sobre seu perfil nos próximos tempos. Diminuiria a intenção de voto sobre ele e aumentaria a rejeição. Lula lidera, hoje, porque o tiroteio eleitoral está longe de ocorrer. Imagem do governo Da mesma forma, há questões que também precisam ser analisadas e que dizem respeito à imagem do governo. Como se explica que o presidente tem apenas 3% de avaliação positiva (ótimo e bom) e a maioria da população deseja que caminhe até o fim do mandato? Há algo estranho nessa equação. A economia se recupera, a inflação chegará este ano ao menor índice dos últimos tempos (entre 2,5% e 3%), os juros podendo chegar a 7% e o PIB voltando a crescer. O Bolsa Família foi aumentado. Houve liberação do FGTS e o PASEP injetará bilhões no consumo. Portanto, o estômago das margens não reclama. Mas a insatisfação com o governo é o tom das pesquisas. Coração na cabeça Se quiserem galgar os degraus mais altos do poder, vale apreender a lição de Kennedy: "guardem o coração na cabeça". Será o bumbo? Será que a imagem negativa se dá por conta do bumbo batido pela TV Globo todos os dias? Michel Temer estaria canalizando os dutos de lama que circundam a operação Lava Jato? O fato é que a comunicação do governo não tem conseguido repor índices positivos. É a observação que se faz por todos os lados. As tubas de ressonância da banda negativa abafam qualquer clarinete que tente tocar a música governamental. É um rio Amazonas engolindo um riachinho de águas rasas. A tragédia americana Os Estados Unidos voltam às manchetes mundiais com sua bandeira pingando sangue. No maior espaço das liberdades democráticas, a violência chega aos borbotões. Las Vegas é o flagrante do horror. O que explica um aposentado milionário atacar uma multidão com armas de alto calibre, matar 59 pessoas e ferir 530? Só há uma resposta: o germe da violência que se propaga nos corpos das Nações, particularmente as democráticas, e onde o direito de um cidadão possuir uma arma é sagrado. O popularismo As administrações popularistas expandem-se pelo desempenho de atores que enxergam a política como negócio, e não como missão. O compromisso fundamental é com a eleição e a lógica que movimenta o negócio é a conquista do poder para usufruto próprio. Assim, o país caminha para trás, somando seus PIBs negativos: o do popularismo funcional, o da irresponsabilidade administrativa, o do desperdício e o da corrupção. Demagogos Os popularistas continuam a eleger o povo como referência principal do discurso, mas pregam a conciliação de classes. Saindo daí, emergem as contradições. Na fala, assumem o discurso libertário de Gandhi; nas aparências, a pompa de Luís XIV, o rei Sol. Só que a fala de Gandhi desaparece no calor da luta eleitoral. Nesse momento, aparece a expressão pérfida de Maquiavel para a preservação do território do Príncipe, na sombra da lição "deves parecer clemente, fiel, humano, íntegro, religioso e sê-lo, mas com a condição de estares com o ânimo disposto a tornar-te o contrário". O paradigma do caos O professor Samuel P. Huntington assim descreve o paradigma do caos: "A lei e a ordem são o primeiro pré-requisito da Civilização e em grande parte do mundo elas parecem estar evaporando. Quebra no mundo inteiro da lei e da ordem, Estados fracassados e anarquia crescente, onda global de criminalidade, máfias transnacionais e cartéis de drogas, declínio na confiança e na solidariedade social, violência étnica, religiosa e civilizacional e a lei do revólver predominam em grande parte do mundo". Seria esse retrato a explicação para a extrema violência? Taxa de governismo Os números pró-governo na CCJ da Câmara estão em torno de 61%, enquanto no Plenário chegam a 79%. Pesquisa feita pelo Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV. Fachin está isolado? Lê-se que o ministro Edson Fachin está meio isolado no STF? Ou será que essa posição não reflete mais o desejo de uns? O que se observa também ali é um acentuado "espírito de corpo". Fux contundente O ministro Luiz Fux fechou questão: "por força da Constituição, o único poder que pode proferir decisões finais é o Poder Judiciário". Falou e disse. Mantega sob mira O ex-ministro da Fazenda, Guido Mantega, teve rejeitado o acordo que impedia sua prisão. Pode ser um dos próximos alvos da 10ª vara Federal de Brasília. Ética ou aética? As pesquisas indicam: eleitores querem candidatos limpos, assépticos, passado limpo, vida decente. Pergunta: quer dizer que os velhos caciques serão rejeitados? Em minha vida de analista político, há três décadas, arrisco a dizer: continuarão a ser eleitos. Principalmente os mais próximos às comunidades e aos distritos. Mudar uma cultura é desafio para mais de uma geração. Retrato do Brasil A pergunta emerge naturalmente: por que não há no Brasil planejamento de longo prazo? O Brasil cultiva o gosto pelo instantâneo, pelo provisório. Prefere-se administrar o varejo e não o atacado. É mais vantajoso apagar incêndios que preveni-los. Coisas planejadas com muita antecedência parecem não combinar com a alma lúdica brasileira, brincalhona, irreverente. Se não fosse obrigado a enfrentar o batente para sobreviver, o brasileiro adoraria passar o ano inteiro na folia. Oswald de Andrade traduziu, um dia, tal estado de espírito ao versejar: "quando dá uma vontade louca de trabalhar, eu sento quietinho num canto, e espero a vontade passar". Fecho a coluna com conselhos aos pré-candidatos de 2018. Conselho aos pré-candidatos Já é hora de começar a correr para cima, para baixo e para os lados. Atentem para alguns princípios orientadores na busca do voto: 1. Procurem expressar a característica mais importante de sua identidade - o foco. 2. Não esqueçam que o eleitor deseja travar conhecimento com o personagem. Circular no meio da massa é importante. 3. Façam grande esforço para multiplicar presença em vários locais - a onipresença é um valor insuperável. Planejar eventos rápidos em lugares e cidades diferentes em um mesmo dia. Pacote de macarrão Esse é o calcanhar de Aquiles de pré-candidatos e candidatos. Evitar serem flagrados em dissonância. E isso ocorre geralmente quando um candidato é instado a mudar de identidade. O eleitor percebe quando a pessoa torna-se artificial, um mero produto de marketing. E candidato não pode ser trabalhado como se trabalha um sabonete, um pacote de macarrão.
quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Porandubas nº 548

Abro a coluna com uma deliciosa historinha mineira Lei da Gravidade? Ah, de âmbito Federal A Lei da Gravidade, de vez em quando, dá dor de cabeça aos mineiros. E a lei da gravidez, essa, nem se fala. Na Câmara Municipal de Caeté, terra da família Pinheiro, de onde saíram dois governadores, discutia-se o abastecimento de água para a cidade. O engenheiro enviado pelo governador Israel Pinheiro deu as explicações técnicas aos vereadores, buscando justificar a dificuldade da captação: a água lá embaixo e a cidade, lá em cima. Seria necessário um bombeamento que custaria milhões e, sinceramente, achava o problema de difícil solução a curto prazo, conforme desejavam: - Mas, doutor - pergunta o líder do prefeito - qual é o problema mesmo? - O problema mesmo - responde o engenheiro - está ligado à Lei da Gravidade. - Isso não é problema - diz o líder - nós vamos ao doutor Israel e ele, com uma penada só, revoga essa danada de lei que, no mínimo, deve ter sido votada pela oposição, visando perseguir o PSD. O líder da oposição, em aparte, contesta o líder do prefeito e informa à edilidade, em tom de deboche, que "o governador Israel nada pode fazer, visto ser a Lei da Gravidade de âmbito Federal". E está encerrada a sessão. (A historinha é de José Flávio Abelha, em seu livro A Mineirice). Primavera meio nebulosa A primavera é a mais bela estação do ano. Há uma explosão de cores nos parques, jardins e alamedas. Mas há algo fora de tom: a impressão é de que, por enquanto, esta explosão ainda não chegou. O amarelo e o roxo dos ipês não estão tão intensos como em anos passados. Será que o clima vivido pelo país é motivo para essa primavera meio nebulosa? O fato é que essa 2ª denúncia contra o presidente Michel Temer e dois ministros deixa o ambiente político mais tenso. A perspectiva é a de que, mais uma vez, a Câmara vetará o pedido de investigação contra Temer. Dessa feita, até com uma votação mais expressiva que a primeira. Mas o país perde o passo e confunde o compasso. Passo e compasso Explico. Há uma agenda de reformas posta sobre a mesa política. A economia começa a respirar. O oxigênio chega aos poucos nos poros da indústria, do comércio e dos serviços. O varejo dá sinais de vitalidade. O consumo toma fôlego. O agronegócio está bombando. A confiança de investidores cresce. A inflação desce. Os juros, idem. O PIB volta a ter aumento nas projeções de institutos. Mas o passo do país fica mais devagar. A denúncia de Janot é uma espécie de trava no compasso entre avanço e estática, andar e parar. Esse final de setembro transmite tal sensação. Nuvens ainda plúmbeas teimam em obscurecer o azul do horizonte. Ensaios presidenciais Enquanto a pauta fica travada para exame da 2ª denúncia contra o presidente, pré-candidatos ensaiam movimentos eleitoreiros. Geraldo Alckmin, o governador paulista, decidiu se movimentar após ver os passos acelerados de seu pupilo João Doria. Alckmin tem na testa o carimbo do poder paulista. Carece de feição mais nacional. Doria está aqui, ali e acolá. É o mais onipresente dos protagonistas. O excesso de andanças pode lhe dar visibilidade, mas causará canseira. Esgotamento. Marina é quase uma reclusa. Bolsonaro conta com militância aguerrida e simpatizantes nas redes. A maior interrogação A maior interrogação diz respeito a Lula. Será candidato? Na visão deste consultor, pela régua de 0 a 100, a possibilidade de emplacar uma candidatura é apenas de 20. Ganhou a sétima denúncia e já tem uma condenação em primeira instância. Vai ser muito difícil passar incólume pela segunda instância. O TRF da 4ª região se mostra muito duro. Vejam o que fez com José Dirceu: aumentou a pena de prisão para 30 anos. Sobram Fernando Haddad e Jaques Wagner. O ex-prefeito parece não ter apetite. E o ex-governador da Bahia possui uma identidade inferior ao tamanho de uma candidatura presidencial. O palrador O PDT irá de Ciro Gomes. Atrairia a esquerda se Lula não for candidato? Não. Poderia, isso sim, ter votação ampliada no Nordeste. Ciro é um canhão ambulante. Atira sem medir as consequências. Com seu arsenal linguístico, criará desconfiança junto ao eleitorado. Urge reconhecer, porém, que se trata de um perfil preparado. Em debates, consegue boa performance. Podemos ou não podemos? Álvaro Dias ensaia ser candidato pelo PODEMOS, esse partido com um nome bronzeado de marketing. Quem imaginou o nome, deve ter pensado no recado: "hei, leitor amigo, com você junto podemos alcançar a vitória". Ora, de tão óbvia, a asserção cairá no descrédito. Por isso, senador Álvaro, é bem provável que seu PODEMOS não vá muito longe. Conforme-se com a rejeição dos milhões que poderão não seguir seus passos. As grandes mudanças Hora de lembrar um preceito da ciência política: as grandes mudanças da História são produzidas quando os favorecidos e apaniguados do poder não têm a capacidade para transformá-lo em força, enquanto os que dispõem de pequeno poderio aproveitam essa capacidade ao máximo para convertê-la em força crescente. Mulheres As mulheres deverão fazer uma baciada de representantes maior que a de 2014. Estão muito organizadas. E os escândalos têm preservado a condição feminina. A contaminação do vírus da velha política abarca mais o gênero masculino. Juízes e procuradores Os juízes e procuradores estão na crista da onda, puxados pela carruagem de Curitiba. Daí a inferência: terão boa oportunidade caso alguns representantes do Judiciário e do Ministério Público decidam ser candidatos em 2018. Serão vistos como alavanca moral no panorama geral da política. Seria interessante ver alguns procuradores vivendo a real politik. Enfrentariam a dura realidade imposta por nossa cultura política. Rocinha O Rio de Janeiro vive a síndrome de Sísifo, aquele condenado pelos deuses a levar uma pedra sobre os ombros para depositá-la no cume da montanha. Quando está prestes a conseguir o feito, eis que a pedra cai e rola ao sopé da montanha. Sísifo volta para tentar novamente. Tentativa que durará por toda a eternidade. Quando imaginamos que o Rio está pacificado, o tiroteio volta intenso com facções criminosas se digladiando e matando inocentes com balas perdidas. O Rio de Janeiro continua lindo... e cada vez mais perigoso. Manipulação Em 1922, Walter Lippmann, o famoso jornalista norte-americano, fazia o alerta: "Fabricar consentimento, pela velha arte da manipulação da opinião pública, não morreu com a democracia, como se supunha". 26 recibos A defesa de Lula apresentou 26 recibos de aluguel da cobertura vizinha ao apartamento dele. Dentre esses, dois com datas inexistentes. Assinados por Glaucos da Costamarques, proprietário do imóvel e primo do pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula. Glaucos diz que só recebeu a partir de novembro de 2015. Afinal, a assinatura é dele ou não? E se ele confirmar que assinou, mas não recebeu? Onde está a verdade? Rebelião das costureiras O Rio Grande do Norte acaba de presenciar um feito histórico: trabalhadores fazendo uma grande mobilização em defesa de uma empresa, a Guararapes, e mostrando-se revoltados contra o Ministério Público do Trabalho, que está multando a empresa em R$ 38 milhões. A razão? O MPT está vetando as facções de costura (microempresas da área têxtil) que produzem peças adquiridas pela Guararapes. Pró-Sertão Trata-se de um projeto chamado Pró-Sertão que dá guarida a cinco mil trabalhadores. O MPT criminaliza a Guararapes, exigindo que essa mão de obra seja incorporada ao quadro efetivo da empresa. Ou seja, o MPT despreza a Lei da Terceirização e joga a Reforma Trabalhista no lixo. Os trabalhadores esperam que a Justiça do Trabalho preserve seus empregos. As facções também chegam a vender seus produtos para outras empresas. Mas o MPT diz que há subordinação das costureiras à Guararapes, daí a exigência para sua incorporação ao quadro de funcionários do grupo. Até quando vamos conviver com essa visão retrógrada? O Brasil de Campos Roberto Campos, exímio na arte de atirar contra a improvisação, narra: "O Brasil tem a propriedade de, no começo, anedoticamente divertir, depois exasperar e, por fim, desesperançar aqueles que confiam na racionalidade, na procura de causas e efeitos e na sequência do discurso como sujeito-verbo-predicado". Cabral, fim de linha Sérgio Cabral Filho parecia predestinado a chegar ao ápice da política. Tinha o talhe adequado para o alto cargo de presidente da República. Governador do charmoso Estado do Rio de Janeiro, jovial, bom trânsito na esfera política, filho de um grande brasileiro, também de nome Sérgio Cabral, renomado nome das artes e da música popular brasileira, Cabral Filho era um perfil dos mais elevados do PMDB. Preso e condenado a 45 anos de prisão - a pena mais pesada da Lava Jato - acaba de ter seus imóveis postos a leilão, somando um total de R$ 44 milhões. Na política, tudo é possível. Até a ressurreição de mortos. No caso de Cabral, a volta à cena seria um verdadeiro milagre. CPI da JBS A CPI da JBS está se apresentando como oportunidade para alguns deputados darem resposta a seus acusadores. Não pode ter esse viés sob pena de cair na desmoralização. Pleito à moda antiga O pleito de 2018 poderá ocorrer dentro das velhas regras. O que será um desastre. Havia muita expectativa em torno da reforma política. Que poderá se limitar a detalhes, sem grande significação. Os dois instrumentos mais badalados - cláusula de barreira e fim das coligações proporcionais - ameaçam não passar pelo crivo dos deputados. Temos poucos dias pela frente para aprová-los. Mas o interesse parece concentrado no fundão para financiar as campanhas. Um sonho Colombo aferrava-se à obsessão de que poderia chegar ao Oriente pelo caminho do Ocidente. O pensamento não lhe dava trégua. Esta foi a diferença entre Colombo e os seus contemporâneos. Estava convencido. Queria partir. Mas seria forçado a esperar muito. Enquanto aguardava, falava do sonho. D. João II, rei de Portugal, interessou-se pelo assunto e submeteu o projeto de Colombo a uma junta de sábios. Estes condenaram a ideia. Quando morreu a esposa, Colombo gastou a maior parte de suas economias com o enterro. E foi para a Espanha. Esperou, esperou Fernando e Isabel, empenhados em dispendiosa guerra com os mouros, deram apenas meio ouvido à proposta do genovês. A rainha, entretanto, foi simpática a ele. Concedeu-lhe uma pensão, enquanto a junta de notáveis do Reino estudava o assunto. Depois de dois anos, a pensão foi suspensa. Foi obrigado a se manter sem ajuda durante os oito anos seguintes com a venda de livros e de mapas que confeccionava. Seus cabelos ficaram brancos. Foi atacado pelo artritismo. Mas nunca desesperou. E, um dia, realizou seu sonho. Fecho a coluna com Tancredo Conchavo Premido pelos casuísmos, Tancredo Neves foi obrigado a fundir o seu PP com o MDB de Itamar. Alguns pepistas pularam do barco e protestaram alegando conchavo. Tancredo foi curto e seco: "Conchavo é a identificação de ideias divergentes formando ideias convergentes". Tinha razão. Há curvas que desembocam em retas.
quarta-feira, 20 de setembro de 2017

Porandubas nº 547

Abro a coluna com uma historinha da Paraíba. Silêncio, silêncio Flávio Ribeiro, presidente da Assembleia Legislativa (depois foi governador do Estado), estava irritado com as galerias, que aplaudiram e vaiavam durante um debate entre o deputado comunista Santa Cruz e o udenista Praxedes Pitanga. Tocou a campainha, pediu silêncio, insistiu no pedido e avisou, grave e feroz: - Se as galerias continuarem a se manifestar, eu evacuo. Felizmente, as galerias se calaram. A era Dodge Raquel Dodge abre um novo tempo na Procuradoria-Geral da República. Será uma era mais focada no equilíbrio, na distensão institucional, o que não significará leniência no cumprimento das funções da PGR. Dodge, ao que sabe, não concordava com o estilo rompante-avassalador de Rodrigo Janot. Vai agir de modo mais harmônico, abrindo diálogo com as esferas política e governativa, analisando com maior profundidade os casos sob sua órbita. E dará força à descentralização das atividades. Calmaria até certo ponto É evidente que os tempos de calmaria poderão, eventualmente, desaparecer ante a probabilidade de emergirem novos escândalos, bombas e explosões às voltas da operação Lava Jato. Mas não se pense que a Lava Jato será desativada ou mesmo entrar em ritmo mais lerdo. É certo que as investigações e decisões do Judiciário deverão continuar ao longo do ano eleitoral. E quais seriam as consequências sobre os protagonistas da política? Impactos eleitorais Os impactos da operação Lava Jato sobre a política e as eleições começarão com o afastamento de alguns nomes do páreo. Candidatos - proporcionais e majoritários - sairão da corrida, com alguns fechando sua carreira política. Condenações poderão ocorrer às vésperas do pleito, o que elevaria o grau de tensão e a animosidade entre contendores e acusadores/julgadores. Mas algo será muito positivo: teremos uma eleição mais asséptica e menos contaminada pelo vírus da velha política. Tendências É bastante provável a hipótese de que a população gostaria de ver o país navegar em águas tranquilas, sem os solavancos desses tempos borrascosos. Desde o mensalão, na era Lula, o país vem atravessando turbulências. A ser verdade, abre-se grande chance para o país acolher um perfil que expresse equilíbrio, harmonia, pacificação. Mas a essa figura se cobrará posição enérgica em relação a atos ilícitos, à corrupção, à bandalheira. Sua missão: pôr ordem na casa, sem estardalhaço. Eis o sentido que deverá nortear as expectativas dos eleitores. Polarização, sim, com cuidado Haverá intensa polarização entre alas da direita e grupos da esquerda. Como é sabido, três pessoas de posições radicais, à esquerda, fazem mais barulho que um batalhão de perfis localizados nos espaços centrais e mesmo à direita do arco ideológico. Esses terão de reagir às provocações que, inevitavelmente, surgirão das tubas e das turbas da esquerda. PSOL e PT devem fazer composição, (se não no primeiro turno), provavelmente no segundo, para enfrentar o candidato do centro, que procurará atrair a parceria da direita. A polarização se estabelecerá. É pouco provável que, após a hecatombe do ciclo petista (Lula/Dilma), incluindo os escândalos do mensalão e do petrolão, vejamos um candidato de esquerda chegando ao pódio. Lindbergh delirando Lê-se que o senador Lindbergh Farias, do PT, está dizendo que seu partido fará um boicote às eleições, caso Lula seja impedido pela Justiça de ser candidato. Trata-se de bobagem. Ou puro delírio. Basta anotar que, ao não participar do processo eleitoral, o PT estaria assinando seu atestado de óbito. Não seria votado em lugar nenhum. Mas como se sabe que a fala do jovem cacique é lorota, podemos inferir que, na verdade, ele joga com as palavras, fazendo pressão sobre os juízes da segunda instância. Que decidirão sobre o destino de Lula. O fato é que o PT elegerá uma bancada bem menor, algo entre 45 a 50 deputados. PSOL O PSOL tem condições de expandir bem sua bancada em 2018. Seus representantes ganham muita visibilidade. Estão sempre na mídia massiva. E o partido tende a abocanhar boa parcela dos eleitores que, até então, têm votado no PT. É até possível que seja um competidor forte na disputa pelo governo do Rio de Janeiro. Alessandro Molon e Chico Alencar são os emblemas do partido. Partidos do centro Já os partidos de centro serão beneficiados pelo clima eleitoral de 2018. Puxarão as correntes que evitarão as margens radicais. PMDB, PSDB, PSD E DEM, por suas estruturas mais capilares, tendem a fazer uma boa safra de votos nas regiões mais distantes, onde está sediado o eleitorado tradicional e conservador. Reversão de expectativas A reforma política está indo para o brejo. Depois de muitos conchavos, a Comissão Especial que dela tratava chega a final melancólico, reconhecendo que o jacaré virará lagartixa. Há ainda condições de ser aprovada a cláusula de barreira, que imporá uma percentagem mínima de votos em um determinado número de Estados para que um partido político possa existir. E, possivelmente, o fim das coligações proporcionais. Mas o corpo parlamentar não se mostra animado com a possibilidade de fazer vingar já para 2018 esses dois estatutos. Palocci expulso Antonio Palocci, que já foi o candidato in pectore de Lula à presidência da República, será expulso do PT. Decisão que não amenizará a situação de Luiz Inácio, às voltas com a Justiça. Palocci se mostra muito auto-confiante. Sua delação premiada, em negociação com o MP, será o ponto final para o futuro de Lula. O ex-todo poderoso ministro da Fazenda certamente deve ter provas sobre o que anda dizendo do ex-presidente da República. PF x MPF Na era Dodge, espera-se que as tensões e conflitos entre a Polícia Federal e o Ministério Público sejam amainados. Haverá espaço para uma recíproca colaboração. É o que se espera. Temer atravessando a barreira As inferências são praticamente as mesmas entre colunistas e comentaristas: o presidente Michel Temer atravessará mais uma vez a barreira que o ex-procurador Janot construiu contra ele. O STF deve encaminhar para a Câmara a segunda denúncia, mas esta, como a primeira, não será aceita pelos deputados. Infere-se que o presidente terá mais votos favoráveis do que os 263 obtidos por ocasião da votação sobre a primeira denúncia. Como alguns partidos entraram no pacote de Janot, é razoável imaginar que tendem a reforçar sua fortaleza corporativa. E impedir o andamento da denúncia feita pelo ex-procurador. MPT elimina empregos na crise O Grupo Guararapes, com matriz em Natal, no Rio Grande do Norte, e dono das Lojas Riachuelo, tem sido o alvo de uma caçada empreendida pelo Ministério Público do Trabalho há quase dez anos, segundo executivos da companhia. Na ação mais recente, a procuradora do MPT, Ileana Mousinho, apontou supostas irregularidades nas facções de costura terceirizadas contratadas pelo grupo e solicita o pagamento de R$ 37 milhões em indenizações. Com isso, a empregabilidade da população está sob ameaça. "Deixe o ódio de lado e nos deixe trabalhar" O setor têxtil tem potencial para transformar a realidade socioeconômica do RN, mas encontra no MPT um impeditivo. Flávio Rocha, CEO do Grupo Guararapes, tem usado as redes sociais para esclarecer os fatos e denunciar a procuradora por perseguição. Ileana, segundo Rocha, "envia sistematicamente denúncias infundadas a todas as delegacias do Ministério, com exigências absurdas". O Grupo Guararapes já chegou a empregar 20 mil pessoas, agora são oito mil trabalhadores diretos. Estado pró-emprego O empresário não está sozinho na luta pelo emprego potiguar. Autoridades, associações, líderes sindicais e trabalhadores fazem coro por todo Rio Grande do Norte e promovem manifestações contra o Ministério Público do Trabalho e em favor do emprego. Uma grande mobilização está sendo organizada para o próximo dia 21, às 15h30, em frente à sede do Ministério Público do Trabalho, em Natal/RN. O que está por trás Esta querela, é forçoso reconhecer, ultrapassa as fronteiras do RN. Trata-se, na verdade, de uma vingança do Ministério Público do Trabalho contra dois instrumentos que acabam de ser aprovados e fazem parte do arsenal da modernização das relações capital-trabalho no Brasil: a reforma trabalhista e a lei da terceirização. O MPT já disse que irá lutar contra essas duas frentes aprovadas no Congresso e sancionadas pelo Executivo. Pelo jeito, não se conformam com a terceirização das atividades meio e fim das empresas. Vai multar, dando vazão a uma estratégia de retaliação e confronto. Até os Tribunais Superiores darem um basta aos impulsos e rompantes do MPT, muito estrago será feito. Ministros do STJ, ministros do STF, até onde o país vai aguentar a guerra que dinossauros querem travar contra a ordem normativa? Fecho a coluna com uma historinha da Bahia. Filho inepto Velhos tempos. Tempos de deboche e criatividade. O deputado Luís Viana Neto estava na tribuna da Câmara: - Filho e neto de governadores da Bahia... Lá embaixo, o deputado Francisco Studart (MDB/RJ) gritou: - Não apoiado! - Senhor deputado, sou filho e neto de governadores da Bahia. - Perdão, excelência. Entendi mal. Entendi: "Filho inepto de governadores da Bahia"... Risadas gerais em plenário.
quarta-feira, 13 de setembro de 2017

Porandubas nº 546

Denúncias e canibalização Freyre com y Abro a coluna com uma historinha vivida por este consultor. Idos de 1962, Recife. Os concluintes do científico no Colégio Americano Batista escolheram como paraninfo o sociólogo Gilberto Freyre, que também fizera seus estudos secundários no CAB. Como orador da turma, coordenei a visita à Apipucos para entrega do convite da formatura. Subimos a escadaria da bela mansão e fomos muito bem acolhidos por dona Madalena, a companheira do grande pernambucano. Não faltou o afamado licor de jenipapo, de que tanto falava o escritor. Depois de uns minutos, aparece Gilberto Freyre. Ouviu com atenção os nomes de cada componente da comitiva. Entregue, cerimoniosamente, o convite da formatura. Lá estava escrito: "Ao escritor e sociólogo Gilberto Freire". Pegou o documento, leu o nome do destinatário, mas não abriu o envelope. E foi logo me dizendo: - Meu filho, meu pai, Alfredo, quando recebia uma correspondência grafada com Freire, sem y, ele não a abria, devolvendo-a com uma mensagem anexada onde se lia: -Meu Freyre é com y. Por favor, faça a correção e me volte a remeter. Vou aceitar o convite. Mas voltem depois dessa correção. Ouvimos o puxão de orelha, surpresos, porém agradecidos. Afinal, aceitara o convite, mesmo tendo uma agenda (nacional e internacional) lotada. Uma semana depois, tomamos outro licor. Na companhia do Freyre com y. (P.S.) Nosso paraninfo fez um dos mais densos discursos que ouvi. Fato ressaltado na mídia. Mesmo tendo "voado" um pouco nas passagens mais filosóficas. Canibalização Mais uma denúncia contra Lula veio à tona. Desta feita, uma denúncia de corrupção passiva, ainda do tempo em que era presidente. A questão é: essas denúncias vão surgindo, periodicamente, contra um ou outro personagem. E o leitor acaba se confundindo, não conseguindo diferenciar uma de outra denúncia. Ocorre um processo de canibalização: a última "come" a anterior ou as anteriores, de forma a adensar a capa de sujeira que veste o político. Luiz Inácio já é réu pela 5ª vez. Poucos, muito poucos, conseguem recitar os casos em que ele foi denunciado. De terço na mão Este consultor gosta de ver detalhes, essas pequenas coisas que acompanham o cotidiano dos protagonistas da política. Que surpresa verificar, por exemplo, que Joesley Batista, ao ser levado preso para Brasília, levava um terço entre os dedos. Sim, um terço de reza. Não o de contas aritméticas. Quer dizer, o empresário devia aproveitar a aflição para rogar ao céu ou à santa de predileção. Agora, vejam que coisa menos harmônica ou santificada: pensar numa reza contrita de Joesley e reler os termos chulos que usou na conversa com seu assessor, Ricardo Saud, quando disse, por exemplo, que tinha contratado mulher e gay como parte de suas ações "estratégicas". (aspas por conta do consultor) Ficção Joesley confessa ter feito contrato fictício com escritório do sócio do advogado José Eduardo Cardozo, Marco Aurélio. A quem repassava somas mensais entre R$ 70 a R$ 80 mil. Quebra de tijolo Mais um tijolo caindo no prédio dos Batista, a JBS. A homologação do acordo de leniência do Grupo cai por terra por decisão da Justiça Federal. Efeito dominó. Aplausos da bolsa? A Bolsa de Valores ultrapassou a casa dos 74 mil pontos. Analistas fazem conexão da alta com a prisão de Joesley. Será? Se for, significa aplausos do mercado ao ato. Brasil acompanha atento a escalada da Justiça. E Miller, hein? O ex-procurador Marcello Miller conseguiu se livrar do pedido de prisão feito pelo PGR Rodrigo Janot. O que não o livrará de eventual condenação mais adiante se for comprovado o favorecimento à JBS ainda na condição de membro do MP. O caso será investigado. Afinal, ele teria orientado ou não Joesley a gravar a conversa com o presidente Temer? Saiu do MP e cumpriu a quarentena para exercer a atividade de advogado do grupo JBS? Essas questões serão analisadas nos próximos dias. Por quê? Recebo do grande advogado, mestre dos mestres, Ives Gandra Martins, esta perturbadora pergunta: "Por que a seletividade da prisão de Joesley e não de Marcelo Miller? Será por ser ex-procurador?". Excesso de confiança As conversas entre Joesley Batista e Ricardo Saud mostram uma faceta pouco recomendável a um empresário: a maneira debochada com que trata autoridades e instituições; a tendência de igualar todos, sem exceção, jogando-os no meio do conhecido dito: todos são farinha do mesmo saco; a crença no poder do dinheiro, que compra tudo, incluindo o caráter; o uso vexatório (vergonhoso) da Língua Portuguesa, com erros de concordância dos mais primários; a facilidade com que furaram a liturgia do poder, usando, para tanto, o vil metal. Calmaria e borrascas Os próximos tempos intermediarão calmarias e borrascas. A calmaria será fruto do grau de previsibilidade que a política sugere, algo sensível às bolsas de valores, cujas altas ocorrem na onda de projeções positivas para as marés da política. Mas como esta gera fatos imponderáveis, é razoável supor que os próximos tempos poderão nos trazer mais borrascas. A calmaria aponta: presidente atravessando a onda de segunda denúncia feita por Janot; continuidade de melhoria dos índices econômicos; continuidade de votação e aprovação da agenda de reformas no Legislativo, entre outras situações. Borrasca: divulgação de novos áudios com fatos "gravíssimos" revelados; delações premiadas de alguns personagens que estão presos. Palocci e o PT O ex-ministro Antonio Palocci é "uma das pessoas mais inteligentes do país". Quem disse isso há tempos foi o ex-presidente Lula. Pois bem: agora, para Luiz Inácio e a cúpula do PT, Palocci mentiu em seu depoimento ao juiz Sérgio Moro. Quem ouviu o testemunho pode atestar: a conversa tinha roteiro, começo, meio e fim; respondeu tranquilamente a todas as perguntas do juiz; não demonstrou nervosismo ou falta de conhecimento de quem poderia estar inventando coisas; enfim, foi convincente. Este depoimento será fatal para o ex-presidente Luiz Inácio. A ser lembrado muitas vezes nos tempos eleitorais que se avizinha. Reflexão de Chaparro O prof. Manuel Chaparro, conhecido pela seriedade de suas análises e reflexões, insere em seu blog esta interessante observação: "Ao rotularem Antonio Palocci de "traidor", os partidários de Lula cometem aquilo que nas ciências da linguagem é chamado de ato falho. Chamar Palocci de "traidor" é dar-lhe tratamento e qualificação de cúmplice nos crimes que agora delata. Trata-se, portanto, de um ato falho. E ato falho, nos saberes de Lacan, é discurso veraz, o discurso perfeito. No caso, um discurso que, em vez de desmentir, ratifica a veracidade das revelações. Assino embaixo. PSDB no governo Quem apostava na saída dos tucanos do governo pode se conformar com a ideia de que cresce a tendência de ficarem até o final. Depois da escaramuça organizada pelos "cabeças pretas" (os deputados mais jovens), sob certa influência do senador "cabeça branca" Tasso Jereissati, fortalece-se a tese da permanência sob o influxo da melhoria dos índices da economia. Tática? Conceito do momento O momento é adequado para se iniciar o planejamento de estratégias e táticas com vistas ao amanhã. Vejamos o que é tática. No futebol, quando o atacante joga a bola para trás, recuando-a para seu próprio campo de defesa, parece realizar um movimento covarde. Às vezes, é apupado. Muitos acham que a jogada não tem lógica. Mas essa bola recuada pode abrir espaços, deslocar o adversário, obrigá-lo a avançar de maneira descuidada e abrir a defesa. Pois bem, tal manobra pode gerar uma sequência de ações que culminarão com um gol. Essa é uma operação também chamada de OP. O gol é uma operação OP, de caráter terminal. E é construído por jogadas intermediárias. A tática é ferramenta de vitória. Na guerra "Prepare iscas para atrair o inimigo. Finja desorganização e esmague-o. Se ele está protegido em todos os pontos, esteja preparado para isso. Se ele tem forças superiores, evite-o. Se o seu adversário é de temperamento irascível, procure irritá-lo. Finja estar fraco e ele se tornará arrogante. Se ele estiver tranquilo, não lhe dê sossego. Se suas forças estão unidas, separe-as. Ataque-o onde ele se mostrar despreparado, apareça quando não estiver sendo esperado". (Sun Tzu) Mais lições As lições de táticas e estratégias dos clássicos da política e das guerras parecem não merecer nenhuma consideração por parte de nossos atores políticos, empresariais, policiais e outros que adoram as luzes do palco. Lembremos mais alguns conselhos de Sun Tzu: a) "Quando em região difícil, não acampe. Em regiões onde se cruzam boas estradas, una-se aos seus aliados. Não se demore em posições perigosamente isoladas. Em situação de cerco, deve recorrer a estratagemas. Numa posição desesperada, deve lutar. Há estradas que não devem ser percorridas e cidades que não devem ser sitiadas". b) "Não marche, a não ser que veja alguma vantagem; não use suas tropas, a menos que haja alguma coisa a ser ganha; não lute, a menos que a posição seja crítica. Nenhum dirigente deve colocar tropas em campo apenas para satisfazer seu humor; nenhum general deve travar uma batalha apenas para se vangloriar. A ira pode, no devido tempo, transformar-se em alegria; o aborrecimento pode ser seguido de contentamento. Porém, um reino que tenha sido destruído jamais poderá tornar a existir, nem os mortos podem ser ressuscitados". Marta candidata? Marta Suplicy pode sair candidata do PMDB em São Paulo. A depender das pesquisas lá para os meados de março/abril. Paulo Skaf deve lutar, e muito, para voltar a ser candidato. Teria a preferência da cúpula do partido. Mas a real politik é quem ditará as conveniências. Marta poderá ter apelo mais forte. Este consultor ouviu de gente influente: a senadora cisca para fora e consegue atrair eleitores. Skaf cisca para dentro e se isola. Só acredita no que a boca fala. Já Marta ouve. Fecho a coluna com este diálogo. Pequena aula de política O dialogo é muito conhecido. Merece ser lembrado pela oportunidade do tema. Diálogo entre Colbert e Mazarino, durante o reinado de Luís XIV, na peça teatral Le Diable Rouge, de Antoine Rault: Colbert: Para arranjar dinheiro, há um momento em que enganar o contribuinte já não é possível. Eu gostaria, senhor superintendente, que me explicasse como é possível continuar a gastar quando já se está endividado até o pescoço. Mazarino: Um simples mortal, claro, quando está coberto de dívidas, vai parar à prisão. Mas o Estado é diferente! Não se pode mandar o Estado para a prisão. Então, ele continua a endividar-se. Todos os Estados o fazem! Colbert: Ah, sim? Mas como faremos isso, se já criamos todos os impostos imagináveis? Mazarino: Criando outros. Colbert: Mas já não podemos lançar mais impostos sobre os pobres. Mazarino: Sim, é impossível. Colbert: E sobre os ricos? Mazarino: Os ricos também não. Eles parariam de gastar. E um rico que gasta faz viver centenas de pobres. Colbert: Então como faremos? Mazarino: Colbert! Tu pensas como um queijo, um penico de doente! Há uma quantidade enorme de pessoas entre os ricos e os pobres: as que trabalham sonhando enriquecer e temendo empobrecer. É sobre essas que devemos lançar mais impostos. Cada vez mais, sempre mais! Quanto mais lhes tirarmos, mais elas trabalharão para compensar o que lhes tiramos. Formam um reservatório inesgotável. É a classe média!
quarta-feira, 6 de setembro de 2017

Porandubas nº 545

Abro a coluna com uma historinha de Zeca Boca de Bacia, da Paraíba. Ficar bom Zeca Boca de Bacia era a alegria do povo em Campina Grande/PB. Personagem folclórico, amigos de políticos. Dava assessoria informal a Ronaldo Cunha Lima e a seu filho Cássio, prestes a ganhar o mandato de senador. Quando Zeca abria a boca, a galera caía na risada. Certa vez, numa de suas internações na clínica Santa Clara, em Campina Grande, a enfermeira foi logo perguntando: - Zeca, qual o seu plano (de saúde)? E ele: - Ficar bom! Outra vez, Zeca pegou um táxi em Brasília para ir à casa de Ronaldo Cunha Lima. Em frente à casa do poeta, o taxista cobrou R$ 15. Zeca só tinha R$ 10. Sem acordo, disparou: - Então, amigo, dê cinco reais de ré! O bambu flexível O procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, produziu essa frase que ecoou forte nas entranhas políticas: "enquanto houver bambu, vai ter flecha". Referia-se às flechadas contra o presidente Michel Temer. Pois bem, uma das características do bambu é sua flexibilidade. Não quebra ao vento forte. Curva-se, dobra, vai lá e vem cá, mas não quebra. Não é que uma perigosa flecha de bambu vira bumerangue, voltando-se contra o atirador? As omissões de Joesley Batista na delação que fez à PGR ameaçam revisar ou mesmo anular o destampatório. É o que diz o próprio Janot em tensa entrevista aos meios de comunicação. O procurador Miller Pois não é que o ex-procurador Marcelo Miller, braço direito de Janot, estava por trás de toda a armação para gravar a conversa de Joesley com Michel Temer? Pois não é que esse mesmo procurador deixou a PGR para trabalhar como advogado da JBS? Pois não é que as gravações entregues por Joesley à PGR supostamente revelam fatos "gravíssimos" envolvendo Miller e até integrantes do STF? O caso entra na curva e gera uma reviravolta. Consequências A Polícia Federal desempenhou tarefa brilhante. Ao pegar as fitas, degravou o que nelas estava apagado. O relatório chegou às mãos do ministro Edson Fachin, que o reenviou à PGR. Tomando conhecimento desse grave fato, o próprio Joesley procurou corrigir a omissão - não ter entregado todo o conjunto das gravações - e mandou as gravações para a PGR. Janot ouviu as conversas que, segundo ele, têm teor "gravíssimo" e sinaliza para a anulação dos benefícios concedidos aos irmãos Batista e ao delator Ricardo Saud, entre outros. Joesley teria feito outras gravações sem saber que as conversas eram gravadas. Poderá ver rompido o escudo em que se abrigou. Observação: o nível das conversas é muito baixo. Choca o imenso desrespeito às instituições. Frente política Janot garante que os fatos narrados, mesmo "gravíssimos", não invalidam as provas. Donde surge um contencioso de complexa teia jurídica: como achar que as provas são qualificadas se os delatores são desqualificados? Como considerar que as provas continuam válidas se as operações maquinadas poderão ser consideradas criminosas? O fato é que a delação de Joesley tende a receber forte veto da classe política, inviabilizando impactos que poderiam ocorrer diante de uma segunda denúncia, que cairia certamente nas sombras da suspeição. A impressão é que a casa de Janot desmoronou. Será difícil reconstruí-la rapidamente, antes de 17/9, quando ele deixa a PGR. A economia É evidente que uma nova denúncia nas semanas que antecedem a saída de Janot da PGR ganhará fosforescência midiática. Mas a suspeição será fortíssima. A imprensa torce por confusão. A economia, por outro lado, tende a funcionar como colchão de amortecimento de eventual nova denúncia: jornais anunciando fim da recessão, melhoria nos índices de emprego, inflação e juros caindo, confiança de investidores aumentando. Malas de dinheiro Mais de 10 malas e caixas com pacotes de notas de R$ 100 e R$ 50. Nunca este consultor viu tanta mala de dinheiro. A PF fez uma blitz em apartamento que, se lê, seria usado por Geddel. Onde isso vai parar, gente? O vai-e-vem das reformas A cada semana, as reformas ganham suspiros diferentes: um, de frustração; outro, de alívio. Vejamos a reforma política. Vai ou não vai? Depende. Se for aprovado o fundão - que jorrará dinheiro nas campanhas de 2018 - é possível que vejamos aprovados dois estatutos: o fim das coligações proporcionais e a instalação de cláusula de desempenho. Para complicar, o tempo se estreita. Esta semana da Pátria adia a questão para a outra. Impedimentos O que impede a votação de uma reforma política? A vontade da maioria de defender o status quo. Os atuais parlamentares temem perder as condições que têm para enfrentar uma campanha. Com o fim do financiamento empresarial privado, os representantes querem uma compensação. Será difícil, nesse momento, aprovar a volta de doações empresariais. De onde viria o dinheiro de campanha? Resolvida esta questão, seria possível aprovar os estatutos acima citados. Cláusula de barreira Os pequenos partidos lutam contra a cláusula de barreira. O relatório da deputada Shéridan (PSDB-RR) prevê o desempenho mínimo de 1,5% dos votos em 9 Estado, chegando a 3% anos depois, lá para 2030. Muito pouco, diz-se. Há emendas que defendem um mínimo de 2,5% de votos em 14 Estados, já em 2018. Quanto às coligações proporcionais, há maior aceitação sobre sua extinção. Previdência desidratada Já a reforma da Previdência era um jacaré imenso que, a cada dia, se aproxima do tamanho de uma lagartixa. Se for adiante, poderemos ver uma reforma desidratada, restrita à questão da idade para a aposentadoria (65 anos) para os homens, um pouco menos, (63), para as mulheres e a uma regra de transição, que abrigará os atuais contingentes prestes a completar o tempo atualmente exigido. O país quebra Sem as reformas da Previdência e das carreiras do funcionalismo público, o país entrará profundamente no brejo da quebradeira. As despesas obrigatórias irão ultrapassar os 100% do Orçamento já em 2022. As despesas nas frentes dos investimentos, hoje muito pequenas, serão reduzidas gradualmente, passando de 8,2% em 2017 para 2,1% em 2021 e chegando à casa negativa em 2022, quando será de 1,4%. Darão lugar às despesas obrigatórias. Urgente Daí a urgência de uma reforma da Previdência. Se a meta for deixada para o próximo presidente, é razoável supor que esse fardo pesará sobre seus ombros, na confirmação da hipótese de que a crise terá continuidade. O futuro seria muito sombrio. O papel do atual presidente é o de abrir o caminho para que o próximo governo navegue com tranquilidade, evitando as borrascas que ameaçam afundar o barco. Tensão entre Alckmin e Doria É evidente que o governador Geraldo Alckmin lidera a fila dos pré-candidatos tucanos à presidência em 2018. É forte a ligação entre ele e João Doria. Este consultor tem acompanhado de perto as vidas políticas de ambos e testemunhado o respeito e o carinho que os unem. Mas a política tem regras próprias, entre elas a conveniência, a oportunidade, a noção adequada do tempo. João garante que não disputará prévias com Alckmin. E não o fará. O governador tem preferência na lista do PSDB. Pesquisas Mas João Doria nem por isso abandonará a perspectiva de vir a ser candidato à Presidência. Ora, ele tem convite de, pelo menos, quatro partidos, entre os quais o PMDB e o DEM. Tudo vai depender das pesquisas. Se conseguir subir a ponto de ter um bem posicionado índice no ranking - algo entre 12% a 15%, por exemplo - lá pelos meados de março/abril de 2018, e se Alckmin estiver em posição muito abaixo, João, é bem provável, irá adiante. Se Alckmin ganhar números parecidos, João desistiria. Não se descarte a possibilidade de João vir a ser candidato por outra sigla, mesmo que ele se considere tucano de coração. A política é um empreendimento aberto. O momento Façamos, agora, outra leitura. Vamos ter na campanha candidatos de campanhas anteriores, entre eles, o próprio Geraldo Alckmin, Marina Silva, Lula ou Fernando Haddad, Bolsonaro, etc. João Doria procura desenhar seu perfil como o anti-Lula, por excelência, sem o viés radical de um Bolsonaro, por exemplo. Que leitura fará o eleitorado? A imagem de novidade Um perfil novo, mais asséptico, com fluência, boa estampa. Ou seja, Doria seria um destaque entre os candidatos de jornadas anteriores, já vistas. Com um tempo razoável de TV e rádio e com a capacidade que tem de manobrar nos eixos das mídias sociais, o prefeito de São Paulo teria alta competitividade. Claro, esta é uma leitura de hoje. Amanhã, os tempos poderão ser desfavoráveis a ele. Ou... até mais favoráveis. Perfis nos Estados A campanha de 2018 será uma das mais difíceis para candidatos que encarnem a manutenção do status quo e do continuísmo. Estados quebrados, funcionalismo revoltado, serviços precários, principalmente nas áreas de saúde e educação, violência galopante, clima de déjà vue ("já vi e ouvi as falsas promessas") comporão a argamassa conceitual de muitos candidatos. Portanto, novas identidades estarão sendo buscadas pelo eleitor. Exceção: candidatos muito bem (repetimos, muito bem) avaliados pela população. Daí a pergunta: você conhece alguém, caro leitor/eleitor? Eleitor mais crítico A cada pleito, a racionalidade cresce na mente do eleitor. E seus efeitos se fazem sentir na crítica mais ácida aos governantes, nas exigências de qualidade dos serviços públicos, nas cobranças e lembranças de promessas não cumpridas. Esse tom mais apurado em relação à política é bem forte nos estratos médios. Que vão empurrando para as margens sua taxa de indignação. A força do distrito Mesmo sem a aprovação do voto distrital, é razoável apostar na hipótese de um voto mais local em 2018. Ou seja, candidatos que representem as localidades, bairros e regiões deverão ser bem contemplados, mais que os perfis gerais, aqueles que tendem a ganhar votos em todo o Estado. A distritalização da política é um fenômeno que se consolida na esteira da crise. Os eleitores querem votar em pessoas que conheçam bem, em representantes que defendam as causas de regiões e grupamentos. Campanhas menos fosforescentes Já as campanhas eleitorais serão menos fosforescentes: menos cinematográficas, com menos firulas e enfeites midiáticos e mais voltadas para coisas e causas reais, concretas, assimiláveis pelo eleitor. O marketing elevará os discursos e deixará com menor efeito na forma de espetáculo. Menos dinheiro nas campanhas redundará em mais sola de sapato para os candidatos. Pé na rua, mão a mão. Fusão Time Warner e At&T no Chile A Fiscalía Nacional Económica do Chile (FNE, o órgão chileno de defesa da concorrência) aprovou a aquisição da Time Warner pela AT&T. "A fusão entre as empresas combinará conteúdo de qualidade e infraestrutura para entrega deste conteúdo no dispositivo que o consumidor escolher", garante David McAtee, vice-presidente executivo sênior e conselheiro geral da AT&T. A FNE aprovou a fusão com condições comportamentais para endereçar questões específicas relacionadas a concorrência identificadas durante a análise da operação. 17 autorizações A aprovação não exige a venda ou desinvestimento de quaisquer ativos da AT&T ou da Time Warner. Com o aval do Chile, a fusão entre AT&T e Time Warner recebeu aprovação de 17 autoridades de defesa da concorrência que analisaram a transação em todo o mundo. "Ficamos satisfeitos com o cuidadoso trabalho realizado pela FNE para analisar e aprovar essa fusão com base nos seus benefícios para a competição no Chile e, mais importante, para os consumidores chilenos", arremata McAtee. Além dos EUA, só falta o Brasil. Fecho a coluna com uma historinha do Maranhão. Por onde começar? O desembargador Deoclides Mourão, tio do poeta Gerardo Mello Mourão, fez acordo com Urbano Santos para governador do Maranhão. Eleito, Urbano não cumpriu nada. Deoclides Mourão mandou-lhe uma carta: - Senhor governador, diz o povo que o homem se pega pela palavra, o boi pelo chifre e a vaca pelo rabo. Supondo não ter V. Exa. nenhum desses acessórios, não sei por onde começar.
quarta-feira, 30 de agosto de 2017

Porandubas nº 544

Mineirice Abro a coluna com a mineirice em ação. 31 de março de 1964. Benedito Valadares se encontra com José Maria Alkmin e Olavo Drummond no aeroporto de Belo Horizonte: - Alkmin, para onde você vai? - Para Brasília. - Para Brasília, ah, sim, muito bem, para Brasília. Os três saem andando para o cafezinho, enquanto Benedito cochicha no ouvido de Drummond: - O Alkmin está dizendo que vai para Brasília para eu pensar que ele vai para o Rio. Mas ele vai mesmo é para Brasília. Esse tipo de artimanha é chamado de engano de segundo grau. Quer significar: engano meu interlocutor, dizendo-lhe a verdade para tirar proveito da sua desconfiança. Essa malandragem vem de longe. Conta-se que a historinha é judia e expressa com humor o refinamento a que leva o esconderijo de informações. Um interlocutor encontra-se com outro na rodoviária na antiga União Soviética: - Para onde o amigo está indo? - Para Minsk. - "Quer me enganar, hein? Você quer me fazer acreditar que vai a Minsk para que eu pense que vai a Moscou. Pois bem, acontece que você vai mesmo a Minsk". Campanha nas ruas A campanha presidencial de 2018 começa a ganhar as ruas. Deixemos as firulas de lado. O fato é que pré-candidatos ensaiam seus primeiros passos, ao participar de caravanas, fazer viagens pelas regiões, aceitando convites de entidades, mobilizando militância e grupos de simpatizantes, etc.. Nomes aos bois: Lula corre pelos 9 Estados do Nordeste; João Doria recebe títulos de cidadania e homenagens em grandes cidades; Jair Bolsonaro não fica atrás e corre para abraçar correligionários; Geraldo Alckmin, o mais discreto, também se movimenta. Marina, Ciro Gomes estão à espera de convites. Nos limites da lei? Afinal, pode-se começar a campanha de 2018 a essa altura? Campanha pedindo votos? Não. Mas campanha disfarçada sob a capa de visita às regiões, conversas com lideranças, encontros com o povo, isso pode. É o que garante a lei e o que dizem os juízes. É evidente que, mesmo não pedindo voto do eleitor, os pré-candidatos fazem campanha. Mostram-se por inteiro, discursam, fazem conclamações ao civismo pátrio, exaltam valores e virtudes da boa política e chegam, até, a fustigar eventuais adversários. Linha tênue A linha entre o permissível e o proibido é tênue. Pouco se distingue uma coisa de outra. Visitar regiões, fazer comício em cenas abertas ou fechadas - nas ruas ou em ambientes restritos - significa fazer o principal exercício da atividade eleitoral: apresentar-se à população, expressar ideias e discorrer sobre problemas brasileiros, a partir da análise dos vetores que estão na agenda política: gestão, emprego/desemprego, resgate do poder de compra do consumidor, ética/moral, corrupção, reformas (trabalhista, previdenciária, tributária, política, etc.). A caravana de Lula Luiz Inácio decidiu começar pelo Nordeste, a região onde continua a ter grande prestígio. Escolheu cidades grandes e médias para fazer seu périplo. Abriu intensa polêmica entre correligionários e adversários. Passam pelas redes sociais vídeos sobre suas andanças, dando conta de entreveros da caminhada - pequenas plateias, desorganização, etc.. Parcela desse material é fake, ou seja, são vídeos feitos por adversários. Inversão de discurso Digamos, porém, que a caravana não repita o sucesso de antigas jornadas. Mesmo assim, a perambulação é importante na estratégia de colocar o bonde nos trilhos. No fundo, Lula está avisando que é candidato. Matreiro como é, inverte os eixos do discurso, escondendo que o descalabro que afundou o país ocorreu nos idos do petismo no poder. Se for candidato, será muito difícil que assegure os 30% (históricos) de intenção de voto do voto do petismo. Na régua de 0 a 100 deste consultor, a chance de ser candidato chega apenas na casa dos 30. Doria aproveita bem João Doria também entra na paisagem ao aceitar parte das centenas de convites que lhe chegam. Como é um perfil não tão conhecido, aproveita para se mostrar - com sua densa experiência na vida empresarial, passagens importantes pela administração pública, valores da gestão moderna etc.. João encarna a novidade, um perfil asséptico na política, a estampa que entusiasma grupamentos centrais. Seu desafio é chegar às margens sociais, de forma que a mensagem seja percebida por todo o território. Constrói também parte de sua identidade como o anti-Lula. Prefeito da maior cidade do país, desperta curiosidade. Hoje, chance de João Doria ser candidato pela régua de 0 a 100 deste consultor: 40. Prévias com Geraldo, não Mas a candidatura de João Doria pode ficar apenas na intenção de seus simpatizantes. Ele tem dito e repetido a este consultor que não disputará prévias com Geraldo Alckmin, seu amigo e tutor. Hoje, João tem vida própria. Mas respeita o amigo. Não disputará com ele. Geraldo defende as prévias e, segundo os caciques tucanos, a partir de Tasso Jereissati, tem a preferência do partido. Hoje, contaria com a maioria do colégio eleitoral das prévias. Hoje, chance de Geraldo Alckmin ser candidato pela régua de 0 a 100 deste consultor: 60. A razão de João Por que, então, João continua a pavimentar caminho em direção ao Planalto? Por confiar no feeling: se as pesquisas derem a ele considerável percentagem de intenção de voto, deixando outro pré-candidato muito atrás (Geraldo, por exemplo), apostará em sua indicação pelo PSDB. Quem sabe, até o próprio Alckmin não faria o gesto de levá-lo até o pódio da candidatura? Em política, tudo é possível. Até mudança de partido. E o governo de SP? Essa alternativa é desconsiderada por João Doria. Há outros pré-candidatos, a partir do vice-governador Marcio França, voz forte no PSB, que tentará se viabilizar como candidato em São Paulo com o apoio de Geraldo, e levar, em contrapartida, os socialistas na direção da candidatura do tucano. Os paulistanos, por seu lado, até compreenderiam a saída de João Doria para uma disputa presidencial (a crise do país seria o pano de fundo), mas certamente não gostariam que o prefeito deixasse o cargo para disputar posto mais alto no próprio Estado. Seria oportunismo. Crítica que possivelmente ganharia suavidade no caso da opção pela presidência da República. Bolsonaro, o discurso radical Jair Bolsonaro, de seu lado, também se movimenta. Foi ao Nordeste, onde ganhou calorosos aplausos de simpatizantes, sendo recebido de forma entusiástica em aeroportos. Procura radicalizar o discurso, internalizando o sentimento da população que se indigna contra a violência nas ruas. As mortes violentas se expandem. Bolsonaro é a porta de entrada em tempos duros: militarismo nas escolas, nas ruas, guerra total às esquerdas. Não se espere dele, porém, voo longo. Seu teto terá entre 10% a 12% de votos. Reforma política A reforma política ameaça gerar uma reversão de expectativas. Pelo andar da carruagem, pouca coisa avançará. E a Câmara, sob a regência de André Fufuca, terá dificuldade de votar temas complicados. Mesmo com Rodrigo Maia exercendo monitoramento, a partir do Palácio do Planalto. Janot prepara o espetáculo Rodrigo Janot, sob a fosforescência midiática, prepara os atos finais de sua gestão na PGR. Promete uma 2ª denúncia de peso contra o presidente da República. Que, na visão deste consultor, não terá o impacto da primeira. Janot entra por completo no saguão do Estado-Espetáculo. Lava Jato nas eleições A operação Lava Jato driblará as pressões e suas águas correrão agitadas pelas veredas eleitorais de 2018. Vai afinar discursos, adensar críticas contra candidatos, gerar intensos debates. O resultado será um processo de "canibalização recíproca", com as críticas de um lado e de outro se chocando e passando ao eleitor o conceito de que todos os candidatos estão no lamaçal. A conferir. Tipos de candidatos 1. O continuista - Candidato à reeleição, máquina a serviço da candidatura, cabos eleitorais multiplicados, o continuista poderá ter vantagens sobre adversários, se, claro, houver realizado um bom governo. Particularmente se construiu forte identidade junto à comunidade. E se não tiver contas a pagar na operação Lava Jato. Pontos fortes: assepsia, ações e obras a mostrar. Pontos fracos: governo fraco, mesmice e denúncias de corrupção. 2. O oposicionista - Se encarnar situação de mudança, troca de peças velhas na máquina administrativa, terá sucesso. Para tanto, precisa absorver o espírito da comunidade, interpretar demandas, fazer intenso corpo a corpo, deixar-se mostrar, ganhar confiança do eleitor. Usar bem as redes sociais. Pontos fortes: alternativa à velha ordem; encarnação do espírito do novo. Quando se tratar de perfil já conhecido, todo esforço se fará necessário para vestir o manto da renovação. Pontos fracos: fraca visibilidade; tênues estruturas de apoio; ausência de ideias. 3. A terceira via - O candidato da terceira via tem a vantagem de poder quebrar a polarização entre situação e oposição. Para angariar apoio de todos os lados, carece organizar um discurso moderado, ouvindo todos os segmentos, buscando uma linha intermediária. Demonstrar possuir um grande programa de trabalho. Pontos fortes: bom senso, equilíbrio, experiência, alternativa à polarização acirrada entre grupos, inovação. Ponto fraco: eventual falta de apoio de estruturas e lideranças. Discurso duro O desembargador Fábio Prieto, que já presidiu o TRF da 3ª região, tomou posse, sexta-feira passada, no TRE/SP. Fez o mais duro discurso que este consultor já ouviu da boca de um membro do Judiciário sobre os desvios do sistema de Justiça no Brasil. Destaco algumas passagens: Mazelas - "O patrimonialismo, o clientelismo, o assembleísmo corporativo, o desperdício de dinheiro público, o pouco caso com a independência funcional dos juízes, a preguiça premiada, a burocratização, a demagogia e a falta de decoro - são estes velhos males que a Reforma do Judiciário tem contribuído para reforçar". Sindicalização da magistratura - Denunciou com palavras fortes a sindicalização da magistratura. - "O exercício de mandato classista, em associações privadas de juízes, foi vulgarizado e também justificou milhares de faltas ao serviço. Ninguém sabe quantas são as associações de juízes. Como foi ampliado o número de entidades ou de seus diretores. - Muitas destas associações de juízes passaram a atuar como verdadeiros sindicatos, prática vedada aos magistrados, agentes do poder estatal." Quatro conselhos - "Somados os quatro conselhos de Justiça, o Brasil deve ter um dos maiores e mais caros sistemas de controle e fiscalização judiciária do mundo. Com tal fragmentação, os órgãos são necessariamente disfuncionais. As decisões são contraditórias e inconciliáveis. A composição dos conselhos é vulnerável ao corporativismo." "Seu Lunga" Por insistentes pedidos, "Seu Lunga" faz uma visita à coluna. Respostas do mestre a perguntas idiotas 1. De olhos fechados, na cama, ele se depara com a pergunta da mulher: Você tá dormindo? - Não, tô treinando pra morrer! 2. Seu Lunga leva um aparelho eletrônico para manutenção e o técnico pergunta: - Tá com defeito? - Não, é que ele estava cansado de ficar em casa e eu o trouxe para passear. 3. Está chovendo e aí a pessoa pergunta para Seu Lunga: - Vai sair nessa chuva? - Não, vou sair na próxima. 4. Seu Lunga acabou de levantar, aí a mulher pergunta: - Acordou? - Não. Estou sonâmbulo! 5. Um amigo liga para a casa do Seu Lunga e pergunta: - Onde você está? - No Pólo Norte! Um furacão levou a minha casa pra lá!
quarta-feira, 23 de agosto de 2017

Porandubas nº 543

Abro a coluna com o confessionário de padre Elesbão Contar pecados Numa cidadezinha de Minas, Padre Elesbão estava esgotado de tanto ouvir pecados, ou, como dizia, besteiras. Decidiu moralizar o confessionário. Afixou um papelão na porta da Igreja, dizendo: O Vigário só confessará: 2ª-feira - As casadas que namoram 3ª-feira - As viúvas desonestas 4ª-feira - As donzelas levianas 5ª-feira - As adúlteras 6ª-feira - As falsas virgens Sábado - As "mulheres da vida" Domingo - As velhas mexeriqueiras O confessionário ficou vazio. Padre Elesbão só assim pode levar vida folgada. Gabava-se: - Freguesia boa é a minha! Mulher lá só se confessa na hora da morte! (Leonardo Mota em seu livro Sertão Alegre) Parte I - Pequena reflexão Fake news As Redes Sociais expandem as notícias falsas. Na semana passada, este consultor foi vítima de uma delas: a que dava conta de um suposto alinhamento da TV Globo com Lula e o PT, mensagem em um áudio falso atribuído ao diretor do Fantástico, Luiz Nascimento. Que, em boa hora, fez enérgico desmentido. Fonte crível A fonte que me enviou o áudio é crível. Ele teria recebido a mensagem de um amigo da própria TV Globo. Por isso, caí na rede falsa, mesmo levando em consideração o absurdo: um grupo de comunicação, cuja família proprietária é considerada trincheira avançada do ideário liberal e do mundo dos negócios privados fazendo aliança com Lula, o ícone das esquerdas? Inimaginável. A falsidade O fato é que as redes carecem de instrumentos para conter a teia de maldades, mentiras, calúnias e difamação. Constato em um estudo feito por um grupo da Associação de Especialistas em Políticas Públicas de São Paulo, em texto assinado pelo jornalista Alexandre Aprá, diretor do blog Isso é Notícia, que há um conjunto de sites especializados nessas tramoias. Urge denunciar a malandragem escondida nesses biombos eletrônicos, alguns bem remunerados por grupos, setores e frentes políticas. A quem serve essa teia criminosa? Estado-Espetáculo Este consultor joga a primeira hipótese sobre o adensamento das fake news: elas são produto do Estado-Espetáculo. Que é a passarela para atores de todos os tipos - política, negócios, artes e entretenimento - alcançarem visibilidade e fama. Esses perfis se esforçam para aparecer e viabilizar seus interesses, objetivando alçar voo e chegar ao Olimpo da cultura de massas. O Olimpo Na figura de Edgar Morin, o Olimpo é o habitat de celebridades de todos os tipos - reis, rainhas, jogadores de futebol, artistas e, claro, políticos - com seus adornos de divindades. Nós, que habitamos o duro terreno dos mortais, corremos ansiosos para abraçar os olimpianos, fazer com eles selfies e exibi-las nas redes, mostrando nossa aproximação com eles. Exageros, mentiras e falsidades são produto do Estado-Espetáculo, que é também o Estado-Midiático. O prazer do escândalo O fato negativo exerce intensa atração. A carga de conflitos que carrega dispara mecanismos de aproximação e engajamento. Desperta curiosidade, principalmente quando o teor informativo aparece coberto pelo manto do escândalo. Quando os protagonistas são pessoas ou entidades de renome, o poder de atrair a atenção e o interesse dos receptores é bem maior. Esta é a segunda hipótese para explicar o acolhimento de falsas notícias. Ser de oposição O fato negativo gera mais impacto que o fato positivo. A Bolsa de Valores despencou 20 pontos. O baque afeta meio mundo. Ontem, ultrapassou a casa dos 70 mil pontos na esteira do anúncio de que a Eletrobrás poderá ser privatizada. O impacto é menor. As fake news pertencem ao campo negativo. No jornalismo também é assim. Corroborando a lição do saudoso Millôr Fernandes: "jornalismo é oposição. O resto é armazém de secos e molhados". A banalização do mal Na moldura tecnológica dos meios de comunicação, as redes eletrônicas ganham projeção graças a princípios e vetores que as caracterizam: propiciam tempestividade às informações transmitidas, de modo que o universo receptor tem acesso imediato às mensagens; garantem visibilidade aos autores e fontes; inserem seus criadores no Olimpo da cultura de massas, conferindo-lhes a aura da fama e o pedestal da visibilidade. Insensibilização Todos esses fenômenos ocorrem em um ambiente social locupletado de denúncias e maldades. Quer dizer, o meio e o tempo/circunstâncias alavancam a proliferação de falsidades. O mal é coisa corriqueira, tão comum, tão rotineiro que deixa os receptores insensíveis aos danos que provoca. As pessoas são cobertas por uma camada impermeável, que acaba amortecendo o impacto das maldades. Aspiração de ser o primeiro O sonho de povoar o Olimpo da cultura de massas, com informações bombásticas que gerem estupor, impacto, abalos, confere às fontes de notas falsas singular identidade: o status de "primeiros" do ranking informativo das redes. O escândalo, o inusitado, o pitoresco, a notícia que causa espanto contribuem para marcar as fontes com a identidade de pioneirismo, da "pessoa que sabe tudo", ponta de lança da teia comunicativa das redes. Alternativas de combate A malha de situações acima pode explicar em parte o fenômeno das fake news, mas não as justifica. Urge combatê-las de frente. Como? Denunciando falsidades; exigindo rápidas providências dos acolhedores tecnológicos para retirá-las das redes; fazendo intensa articulação junto aos usuários para não servirem de meios de passagem de conteúdo falso; conferindo a natureza e a origem das informações, a partir da identificação das mensagens originais e seus balões de ar putrefato. Aqui e alhures As fake news não prosperam apenas por nossas bandas. Na campanha eleitoral norte-americana, alimentaram o noticiário contra Hillary Clinton, tendo um "mentiroso", um jovem de 22 anos, ganhado milhares de dólares com a criação de um site para difamar a candidata democrata. O próprio Trump é conhecido pelas fake news que fabrica. De acordo com uma pesquisa realizada pelo PolitiFact, desde que anunciou sua candidatura à presidência, em junho de 2015, 69% das declarações de Trump foram falsas, e apenas 4% completamente verdadeiras. Como presidente, Trump teve suas falas ainda mais analisadas. Tem sido farta a pauta de notícias falsas nos 100 dias de seu governo. Coisa velha Notícia falsa, em suma, é coisa muito antiga. Ainda no século VI a.C, o historiador Procópio espalhava notícias falsas em Roma sobre o Imperador Justiniano. Juntou essas notícias secretamente num volume chamado Anedocta, que só permitiu ser conhecido após sua morte. É o que conta o jornalista Carlos Eduardo Lins da Silva em artigo (Pós-Fato) na revista de Jornalismo ESPM (Edição Brasileira da Columbia Journalism Review), edição de jan/junho deste ano. Pasquim O escritor Pietro Aretino tentou manipular a eleição do papa que sucederia Leão X em 1522. Não adiantou, narra Carlos Eduardo, pois o escolhido foi Adriano VI, e não Giulio de Medici, para quem Aretino trabalhava. Aretino colava suas informações falsas sob o busto de um personagem conhecido como Pasquino na praça Navona, daí derivando "pasquim" como veículo de informações falsas ou sensacionalistas. Mais tarde vieram os canards na França, os tablóides na Inglaterra e os jornais sensacionalistas em todos os países, incluindo o Brasil. Enfim, manipulação dos fatos é coisa velha Parte II - Análise da conjuntura Normalização Espraia-se o sentimento de que nuvens estão se dissipando e deixando ver horizontes mais limpos. O pior já teria passado. Novas denúncias por parte do PGR contra o presidente Michel Temer não teriam o impacto obtido pela primeira. A indústria dá sinais de alento. A inflação tende a chegar aos 3,5%. A taxa Selic deverá beirar os 7,5% ao final do ano. O PIB deve crescer 0,34 e 2% em 2018. A liberação das contas inativas do FGTS e a safra agrícola recorde impulsionam a reação do mercado. Crescem vendas no varejo e o faturamento do setor de serviços sobe. Régua de 0 a 100 Minha régua de 0 a 100 marca os seguintes números para as reformas: Reforma Política - Fundo partidário de R$ 3,6 bilhões - 20 - Fundo partidário de R$ 2 bilhões - 60 - Cláusula de barreira com 1,5% dos votos nacionais para deputados Federais - 80 - Distritão - 60 -Semi-Distritão - Voto majoritário e voto contado para a legenda - 70 - Fim das coligações proporcionais - 90 - Parlamentarismo - 30 Panorama eleitoral João Doria saiu na frente com sua arrancada de viagens pelo Nordeste, Sul e Sudeste. Lula elege como foco o Nordeste. Passará por um bloco de grandes e médias cidades. Sua estratégia é comer pelas bordas. Das margens para o centro. Ciro Gomes começa a engrossar a voz. Marina está quase desaparecida. Bolsonaro é uma metralhadora ambulante. Atira para todos os lados. Mas seus tiros não são de longo alcance. Têm efeito limitado. Alckmin está contido. Espera o amanhã. Muito comedido, não quer apressar o passo. França em São Paulo Marcio França, o vice-governador de São Paulo, começa a articular apoios. Quer ser o candidato de Alckmin (PSDB) e de outros partidos de centro ao governo. Tem razão em acreditar que João Doria não disputará o cargo. João só tem interesse pela candidatura presidencial. É isso mesmo que ele pretende. Se não conseguir ser candidato a presidente, será o principal cabo eleitoral de Alckmin. Ou toparia sair candidato por outro partido? O tempo e suas circunstâncias darão a resposta. Skaf fora É possível que Paulo Skaf, presidente reeleito mais uma vez para presidir a FIESP, queira ser novamente candidato ao governo de São Paulo pelo PMDB. Se não houver nome mais denso, poderá ser ele. Mas seu passo será curto. Skaf não tem jeito para a política partidária. Faltam-lhe feeling, tino, capacidade de ver o amanhã. Marta Marta Suplicy é sempre um perfil à disposição. Poderá ser o trunfo do PMDB para São Paulo. Tem bom recall. Fecho a coluna com os conselhos do grande filósofo alemão, Arthur Schopenhauer. Schopenhauer Quer convencer alguém? Eis alguns estratagemas dos 38 que ele apresenta em A Arte de Ter Razão. Nº 1. Leve a proposição do seu oponente além dos seus limites naturais; exagere-a. Quanto mais geral a declaração do seu oponente se torna, mais objeções você pode encontrar contra ela. Nº 2. Use significados diferentes das palavras do seu oponente para refutar a argumentação dele. Exemplo: a pessoa diz: "Você não entende os mistérios da filosofia de Kant". A pessoa B replica: "Ah, se é de mistérios que estamos falando, não tenho como participar dessa conversa". Nº 3. Ignore a proposição do seu oponente, destinada a referir-se a alguma coisa em particular. Ao invés disso, compreenda-a num sentido muito diverso, e em seguida refute-a. Ataque algo diferente do que foi dito. Nº 4. Oculte a sua conclusão do seu oponente até o último momento. Semeie suas premissas aqui e ali durante a conversa. Faça com que o seu oponente concorde com elas em nenhuma ordem definida. Por essa rota oblíqua você oculta o seu objetivo até que tenha obtido do oponente todas as admissões necessárias para atingir o seu objetivo. Nº 5. Use as crenças do seu oponente contra ele. Se o seu oponente recusa-se a aceitar as suas premissas, use as próprias premissas dele em seu favor. Por exemplo, se o seu oponente é membro de uma organização ou seita religiosa a que você não pertence, você pode empregar as opiniões declaradas desse grupo contra o oponente.
quarta-feira, 16 de agosto de 2017

Porandubas nº 542

Abro a coluna com o padre Aneiko. Quer ver? Padre Aneiko, deputado estadual pelo PDC, vinha do Paraguai. Na fronteira de Foz do Iguaçu, encontrou-se com duas amigas, que lhe pediram para passar com uns perfumes de contrabando. Arrumou no cinturão, embaixo da batina. Na Alfândega, o fiscal pergunta: - Alguma mercadoria, padre? -Não. - E aí embaixo da batina? - O que tem aqui embaixo é dessas duas moças. Quer ver? O fiscal não quis. Chutômetro I Tem sido comum, nesses tempos esfumaçados, a sinalização sobre o amanhã. Com farta distribuição de chutes. A Consultoria Eurasia se apresenta como campeã de projeções furadas, fato que o Drive Premium, de Fernando Rodrigues, muito bem registrou na edição noturna de segunda-feira. Em maio, projetou em 70% as chances de Michel Temer ser derrubado. Em 13 de agosto, a probabilidade de permanecer passou para os 70%. Chutômetro II Nessa linha de adivinhação, aponta João Doria com mais chances de vir a ser o candidato tucano na eleição presidencial de 2018. Ora, João até pode ser o candidato, mas o governador Alckmin tem a maior força no PSDB. P.S. Pelo que se sabe, a Eurasia não possui estrutura em Brasília. Mas frequenta com assiduidade os espaços midiáticos. Os motores sociais Nosso roteiro, hoje, é de um passeio pela organização da sociedade. O clamor das ruas A última década incrementou a organicidade social. A miríade de entidades - associações de todos os tipos, sindicatos, federações, confederações, clubes e movimentos - passou a agir como tuba de ressonância social, expressando demandas, expectativas, anseios, enfim, o pensamento de classes, grupos, setores, categorias profissionais. Uma alta dose de autonomia orienta ações e movimentações do conglomerado organizativo. Vale lembrar que o Brasil contabiliza, hoje, mais de 500 mil Organizações Não Governamentais. Sindicalismo O sindicalismo se expandiu na esteira da defesa de interesses de trabalhadores e empregadores de novos nichos produtivos. São 16.491 sindicatos, dos quais 11.257 de trabalhadores e cerca de 5 mil sindicatos de empregadores. O Ministério do Trabalho e Emprego facilitou a explosão do sindicalismo, havendo, inclusive, suspeição sobre a emissão de cartas sindicais pela Secretaria de Relações do Trabalho daquele Ministério. O corporativismo, como se pode aduzir, ganhou volume. Federações e Confederações também se expandiram dando vazão ao sistema confederativo. Por trás de tudo, interesses financeiros. Centrais sindicais como exemplo. Bancários e metalúrgicos Continuam a compor a linha de frente das movimentações de trabalhadores, mas seu poder arrefece na esteira da organicidade social, onde outros grupamentos tomam pé. CUT e Força Sindical estão na frente das movimentações, a primeira exibindo o clássico discurso que faz liga com o PT e a segunda central, sob o comando de Paulinho, puxando o cordão da manutenção de benesses históricas. Comerciários O universo do comércio tem sua representação trabalhadora por meio da UGT, comandada por Ricardo Patah, que tem avolumado a Central a ponto de ela se posicionar na linha de frente de fortes representações. Patah exerce bom diálogo com entidades patronais do comércio. Associativismo Outra vertente da organicidade social se fez ver por meio da multiplicação de associações, estas com finalidade política e institucional, eis que não integram o sistema confederativo. As associações desenvolvem intensa articulação política junto aos Poderes constituídos, eis que suas pautas abrigam temas gerais. Muitos setores criam associações voltadas exclusivamente para a articulação política. Direitos e cidadania Desde a Constituição Cidadã de 1988, toma corpo a vertente de defesa dos Direitos Humanos, com foco principalmente na proteção e defesa das minorias (étnicas, raciais, de gênero, transgêneros, etc.). Parcela ponderável dessa agenda bateu nos tribunais, chegando à Suprema Corte, que tem decidido sobre matérias polêmicas, como as questões da união homoafetiva, cotas raciais, células-tronco, mensalão, proibição de financiamento privado de campanhas, prisão depois do julgamento em segunda instância. OAB na vanguarda A Ordem dos Advogados do Brasil tem exercido papel preponderante na defesa dos Direitos Humanos e da elevação da Cidadania. Sempre na vanguarda. No passado, sua ação era mais intensa, principalmente nos idos da redemocratização. Mas continua forte, a partir das campanhas que desfralda, como os recentes movimentos Combate à Corrupção e em prol da Reforma Política, sob a égide da seccional paulista da OAB. Jornalistas O meio jornalístico confere repercussão aos fatos sócio-políticos. Analistas, colunistas/comentaristas têm se engajado com fervor na cobertura do lamaçal que inunda o terreno da política, desde os tempos do mensalão. Ocorre que muitas análises abrigam forte viés ideológico, com jornalistas desempenhando o papel de guerreiros e militantes. Tem faltado bom senso na análise política e sobrado engajamento. Igrejas O forte eixo das igrejas/credos passou a abrigar protagonistas da política, a ponto de patrocinar a candidatura de participantes a comandos importantes, como a prefeitura do Rio de Janeiro, hoje dirigida por um membro da Igreja Universal. A bancada religiosa se expande. A religião entra forte no terreno da política. A competição entre credos sai dos grandes centros e chega aos fundões do território. A CNBB arrefeceu seu discurso político. Militares Os militares, mesmo recolhidos aos quartéis, acompanham com atenção a dinâmica da política. Vez ou outra, ouve-se uma voz militar em defesa da instituição democrática. Grande preocupação da caserna é com a carência de recursos que ameaça inviabilizar ações e programas das Forças Armadas. Em seus circuitos internos, os chefes militares sempre compartilham impressões sobre os rumos da política e do país. Mulheres As mulheres têm ganho suas batalhas por direitos iguais aos homens, constituindo assim gigantesco vetor de força. O gênero feminino tem alargado a fronteira dos direitos, sem dúvida. Por sua força, merecem um destaque no leque organizacional. As mulheres fazem crescer a participação em praticamente todas as áreas dos empreendimentos. No Congresso, infelizmente, sua presença ainda é muito pequena. Profissionais liberais Os profissionais liberais ocupam uma das mais fortes trincheiras nos espaços da pirâmide social, o do meio, onde estão as classes médias. Possuem voz e vez, assumindo o papel de contundentes porta-vozes da tuba de ressonância. Médicos, engenheiros, profissionais do universo da comunicação, comerciantes, integrantes dos círculos de negócios, enfim, quadros de praticamente toda a malha social do meio da sociedade se fazem representar por meio de suas entidades. Exercem papel privilegiado de observadores e críticos da paisagem político-social. Atentos à cena, desfraldam a bandeira dos avanços. E são contrários aos radicalismos. Estudantes Como é sabido, há um bom tempo que a estudantada deixou de participar massivamente da movimentação social. Sua representação tem diminuído em função da carga ideológica que dá o tom de entidades estudantis, como UNE, onde toma assento um grupo radical. Os estudantes participaram de modo intenso das grandes manifestações de 2013, motivados pelo aumento das tarifas de transporte público. O setor estudantil é dividido. E não tem exercido com força o papel que deveria ter na teia organizativa. Indústria Atua pela via de suas representações, sindicatos, federações, confederações. Carece de grandes lideranças. Tem papel mais destacado na luta contra impostos. CNI, FIESP e entidades congêneres perderam parcela da força protagonista do passado. E seus líderes têm sido contaminados pelo vírus da política partidária. O motor de arranque da representação industrial é o Sistema S. Hoje, sujeito a bombardeios. Ruralistas Eis um grupamento com voz e vez, principalmente o setor do agronegócio. Firma-se bem no terreno institucional, a ponto de contar, hoje, com uma das maiores bancadas no Congresso Nacional. O agronegócio ganha fama e força graças à fabulosa contribuição dada ao PIB. Consegue ter imenso poder junto ao Executivo, sendo agraciado com o atendimento de suas demandas. Serviços A novidade na moldura das organizações é a participação de setores de serviços. Que ganham força nesse ciclo, a partir de sua liderança na composição do PIB nacional, que lidera com sua participação de mais de 60%. Grandes setores, como bancos e turismo, agora contam com nichos de considerável poder de pressão, como os setores da terceirização e do trabalho temporário, que acompanham com atenção as grandes mudanças no mercado de trabalho. Os grandes centros A movimentação social tem nos grandes centros o seu motor de arranque. Se o discurso de qualquer setor do leque organizativo emergir de um grande centro, certamente terá assegurada sua capilaridade, ou seja, a capacidade de se espraiar pelo território. Os grandes centros funcionam como a pedra jogada no meio da lagoa. Forma ondas que, de maneira concêntrica, rolam até as margens. Cidades médias As cidades médias funcionam como extensões dos braços das grandes cidades. Repetem o que vem de cima e passam para as localidades menores. Cria-se, assim, gigantesca teia de barulhos. A imagem é a de um terremoto, cujas camadas de terra sofrem maior impacto no epicentro, sendo mais arrefecidas nas lonjuras. Mas os tremores aparecem a quilômetros de distância do maior impacto. O balão da opinião pública A formação do pensamento nacional deriva de um processo que agrega formadores de opinião, passa pelas lideranças de entidades, atravessa o campo de difusores aberto nos grandes espaços das classes médias, entra na tuba de ressonância dos meios de comunicação, que difundem as mensagens das áreas centrais para as áreas periféricas. A repetição A repetição das mensagens pelas mídias é fator de impulso da recepção e internalização das mensagens. Ou seja, nem sempre os fatos que se ouvem, se veem e se percebem são internalizados. Por internalização, entende-se o processo de cognição/compreensão das mensagens. Como é sabido, parcela considerável das mensagens midiáticas se perde por não entrar e descer pela cuca das pessoas. Pílulas - Luiz Inácio começará dia 17 seu périplo pelo Nordeste. Maneira inteligente de iniciar pré-candidatura. - Aécio Neves ainda tem forças no PSDB. Não morreu. - Raquel Dodge não vai arrefecer a ação da PGR. Mas vai ter diálogo mais estreito com o poder político. - Rodrigo Maia é um nome em ascensão. Trata-se de exímio articulador. E cumpre palavra. - Governo Temer poderá fazer ligeira mexida no Ministério. - ACM Neto pode figurar como vice na chapa de 2018 à presidência, caso o DEM não tenha um nome na cabeça de chapa. - Gleisi Hoffmann está saindo muito radical no figurino de presidente do PT. Sua imagem é ruim. - Dilma pode sair candidata a senadora pelo RS. Falou-se até em vir a ser candidata por um Estado do Nordeste. Seria algo incongruente. E de alto risco. - Joesley Batista poderá receber alguma punição. A partir de uma mudança de postura do STF sobre o acordo com ele feito. De 0 a 10, a chance é 7. - Alckmin terá contra ele o fato de não possuir grandes ligações com outras regiões do país. Concentrou-se no Sudeste. - Ciro Gomes começa a perder por excessos verbais. Marina Silva não terá o desempenho da última eleição. Bolsonaro pode ficar com 7% a 10% de intenção de voto. Se for candidato. Fecho a coluna com Carlos Lacerda Rima Lacerda, governador da Guanabara, candidato à presidência da República, foi a Montes Claros, no norte de Minas. A cidade amanheceu com os muros pichados: "Lacerda rima com m...". No comício, à noite, Lacerda acabou o discurso assim: - Aos meus amigos, deixo um grande abraço. Aos meus adversários, a rima.
quarta-feira, 9 de agosto de 2017

Porandubas nº 541

Abro a coluna com a querida Mossoró/RN. Tortura diocesana Convidado especial para evento comemorativo do centenário do Colégio Diocesano Santa Luzia em Mossoró, o ex-governador Lavoisier Maia boceja, mas segura o sono e a impaciência ante a série de discursos. Quando o professor João Batista Cascudo Rodrigues inicia relato sobre a história do Diocesano, Lavoisier quase capitula. O hábito de oratórias de longo curso, lavra de Cascudo, se confirma. - "Ele ainda está em 1927. Até chegar aos 100 anos...", angustia-se. Terminando o discurso de Cascudo, um balé de alunos do colégio desliza no local, entremeado pelo texto "Os artigos poéticos vão sendo reproduzidos, com pausas e o serpentear de bailarinos e bailarinas". Virando-se para o lado, Lavoisier cochicha: - "Diga-me uma coisa, esse estatuto tem quantos artigos mesmo"? - São 100, governador - exagera o interlocutor. - Ah, meu Deus, querem me matar! (Carlos Santos, Só Rindo 2) Saturação O ar está saturado. A observação, comum em ambientes contaminados por fumaça ou gás, é aqui transportada para o espaço político. As pessoas não aguentam mais as baterias de escândalos, denúncias, malfeitos e desvios de toda a ordem, envolvendo políticos, governantes, empresários e burocratas. Mais: estão saturadas com as cavalares coberturas jornalísticas dando conta do quadro político. A população quer virar a página. Mesmice O efeito causado pelas doses sempre elevadas e continuadas de denúncias sinaliza cansaço pela mesmice. O telespectador associa a denúncia do dia ao escândalo da noite anterior. Desse modo as mensagens entram na conta do déjà vu, coisa vista e registrada. A banalização informativa canibaliza a novidade. A semântica da crise aponta: a teia de corrupção é um novelo sem fim. É razoável acreditar na hipótese de que o jogo político está servindo a uns, aqueles que se esforçam para aumentar sua visibilidade midiática. O ócio "Deveriam ter posto a ociosidade contínua entre as penas do inferno; parece-me que, ao contrário, a puseram entre as alegrias do Paraíso". (Montesquieu) Janot Rodrigo Janot, o procurador-Geral, tenta elevar as tensões com sua estratégia de fazer denúncias continuadas. Sua imagem adentra o compartimento dos vingadores. Mostra-se disposto a pegar de qualquer jeito o presidente Michel Temer. Calibra o tempo para jogar mais bombas. Ou flechas como prefere chamar seus tiros. Nos meados de setembro, sai da PGR. Diz-se que gozará a aposentadoria. Outros acham que será alvo de processos. Desqualificado? O ministro Gilmar Mendes, conhecido por não ter papas na língua, diz abertamente que Janot presta um desserviço à Justiça. E que o STF está refém de seus atos. Chega até a dar "adeus" ao procurador, desejando a ele boa viagem. Segunda-feira, disse que o PGR é mais desqualificado da história e sem preparo jurídico nem emocional. Janot deu ampla entrevista a um grande jornal prometendo continuar na trincheira de guerra. O estudo "O estudo foi para mim o soberano remédio contra os desgostos da vida, e não tive jamais uma tristeza que uma hora de leitura não me tenha tirado". (Montesquieu) Terá consequências? As novas flechadas que Janot atirará contra Temer ameaçam não ter o mesmo impacto que as primeiras. A Câmara já não teria receio de continuar a votar a favor do presidente, passando a entender novas denúncias contra ele como uma "guerra pessoal" do PGR. Por outro lado, os parlamentares pretendem construir uma fortaleza de defesa: são alvos permanentes da PGR. Terão sucesso? A Lava Jato vai continuar. Reformas O continuado tiroteio contra a figura presidencial pode atrasar o cronograma de reformas. Mas a pergunta persiste: arrefecerá a mobilização dos representantes? A sensação é a de que urge encontrar saídas para a crise. Sob essa leitura, grande parcela da Câmara defende a sustentação do governo, sob a expectativa de que a planilha reformista poderá ser a alternativa para o país voltar a respirar ares sadios. Justiça "Uma coisa não é justa porque é lei; mas deve ser lei porque é justa". (Montesquieu) Viabilidade O que seria viável, hoje, em matéria de reformas? Vamos lá: a reforma previdenciária deverá abrigar dispositivo que trata da transição do sistema velho para o sistema novo. A questão da idade deverá receber leve alteração. Será possível sua tramitação e aprovação em setembro? Rodrigo Maia diz que sim. O governo contaria com os votos do PSDB - que promete votar em peso na reforma da Previdência -, dos ausentes (19) e até das abstenções. Não seria impossível alcançar o quorum de 308. A reforma política deve contemplar apenas dois aspectos: uma cláusula de barreira mais leve e o fim das coligações proporcionais. É razoável contar com essas duas decisões. Tributária Na área dos tributos, é possível fazer-se alguma simplificação, principalmente no sentido de evitar a continuação da guerra fiscal entre Estados. Buscar, porém, meios para aumentar impostos é meta arriscada. O país está no limite de sua alta carga tributária. O setor de serviços se queixa da Fazenda, que quer usá-lo como alvo para seus próximos tiros. Crueldade "Um turco se encontrou um dia com um canibal. 'Sois muito cruéis', disse o maometano, acrescentando: 'comeis os cativos que fazeis na guerra'. 'E o que fazeis dos vossos'?, replicou o canibal. 'Ah, nós os matamos. Mas, depois que estão mortos, não os comemos'. "Parece-me que não há povo que não tenha sua crueldade particular". (Montesquieu) Por amor Neymar garante que não foi o dinheiro que o levou ao PSG a abandonar o Barcelona. Este analista da política mete aqui o bedelho na área esportiva, da qual pouco entende: foi por amor... ao dinheiro. Claro, 222 milhões de euros, mais de R$ 820 milhões. As melhores leis Sólon, o legislador grego, perguntado se as leis que outorgara aos atenienses eram as melhores, respondeu: "Dei-lhes as melhores que eles podiam suportar". É o caso de indagar: e no Brasil? Os nossos legisladores dirão que as leis até são boas, mas difíceis de aplicar. Temos a sensação de que o país navega nas ondas da impunidade. Renan na oposição Renan Calheiros saiu da liderança do PMDB no Senado para se agregar ao exército da oposição. 75% dos alagoanos querem que ele seja oposição. Que já tem dois senadores peemedebistas: Roberto Requião e Kátia Abreu. Renan acena apoio a Lula em 2018. Mas Heloisa Helena está na cola dele. Renan conta com o apoio de Lula. Terá? Lula será candidato? Kátia saindo Kátia Abreu estaria preparando as malas para deixar o PMDB. Deverá escolher um partido menor. Onde ela possa ser também cacique, não mera figurante. Veto à política? E o voto? O eleitorado, ante a bateria de escândalos, dá um veto à política e aos seus protagonistas. Donde emerge a questão: votará em quem? Pois bem, alguns perfis novos terão preferência do eleitorado, principalmente em cidades grandes e médias. Mas o eleitor do Brasil profundo continuará a dar o voto aos amigos ou aos caciques de ontem e de hoje. A conferir. Pesquisa O Instituto Paraná Pesquisa, dirigido por Murilo Hidalgo, fez abrangente pesquisa sobre as tendências do eleitorado. Nas próximas eleições para deputado, o eleitorado, em sua grande maioria (63,2%) tende a votar em um nome que não tenha exercido cargo público, ou seja, novo na política, enquanto 16,9% apontam que votarão em quem já seja ou tenha sido deputado Federal. Na hora H Uma coisa é o eleitor responder a uma pergunta de pesquisa muito tempo antes da eleição. Outra é o voto na hora H. O eleitorado costuma sinalizar desejos e expectativas. Mas acaba votando frequentemente nos nomes tradicionais. Culto ao presidencialismo Nossa cultura política exerce grande atração pelo presidencialismo. Presidente disso, presidente daquilo...é uma expressão onipresente. Em 1980, no final do Campeonato Brasileiro, o Flamengo ganhou por 3 a 2 do Atlético Mineiro, em polêmica partida disputada no Maracanã. O árbitro expulsou três jogadores do Atlético, a bagunça tomou o campo e agitou os nervos. No fim, transtornado com o "resultado roubado", Elias Kalil, então presidente do Atlético, exclamou aos berros: "Vou apelar para o presidente da República, João Figueiredo! Vou falar pra ele de presidente para presidente"! Talvez tenha chegado a hora de experimentarmos novamente o parlamentarismo. Doria e Alckmin João Doria e Geraldo Alckmin são irmãos. João, o mais novo, tem sido fiel aliado de Geraldo. Há um acordo tácito entre eles. Quem tiver melhores condições - índice de votos - nas pesquisas terá a preferência. Mesmo assim, João acredita que Alckmin deverá ser o candidato tucano à presidência em 2018. Cada qual com seu tempo. Mas uma coisa é certa: se as circunstâncias assim o determinarem, João Doria partirá para a luta. Até porque o prefeito de São Paulo sabe costurar tecidos desfiados, como este exibido pelo PSDB, um partido muito dividido. Polarização O PT não tem jeito. Está no centro da crise política, desde os pecuniários idos do mensalão. É vidraça todo tempo. O governo do PT abriu o maior rombo das contas públicas no país. Abriu a maior recessão econômica da história brasileira. Separou o Brasil de alto a baixo, com sua visão do "Nós e Eles". Mas sua militância vai às ruas para pedir honestidade e ética. Ganha o Prêmio de Caradurismo. Começa a querer polarizar a luta política. Parte para as agressões. Será difícil elevar a bandeira da polarização face a outras candidaturas que aparecerão no cenário. Ou seja, não teremos apenas PT x PSDB. Gleisi conturbada A presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann, parece conturbada. Ou perturbada? Faz elogios ao governo de Nicolás Maduro, que ganha ares de ditador. O petismo todo bate palmas às loucuras do ex-caminheiro que sucedeu a Chávez. O que dizer da repressão venezuelana? O que dizer de um país cuja população passa fome? O que dizer de um território sem liberdades? Deputados? A propósito, Gleisi e o senador Lindbergh anunciam que serão candidatos a deputado, não mais a senadores. Por quê? Medo de derrota? Ou vão tentar ficar sob o abrigo do foro privilegiado como deputados? Impostos Os brasileiros já pagaram R$ 1,3 trilhão em impostos nesse ano. Fecho a coluna com Mossoró/RN. Um preso, um solto À saída de solenidade ao lado da candidata a prefeito de Mossoró, deputada estadual Larissa Rosado (PSB), o então secretário-Geral do PT José Eduardo Cardozo é abordado pelo popular "Paulo Doido". - Ei, me dê um real. Ponderado, o petista justifica-se: -Amigo, eu não posso lhe dar dinheiro, se não a gente vai preso. Mostrando-se mais sensato, Paulo contra-ataca: -Eu sou doido, não vou preso não; quem vai preso é você!
quinta-feira, 3 de agosto de 2017

Porandubas nº 540

Abro a coluna com historinhas de Campos/RJ. Cálculo Perguntaram ao advogado Benedito Rubens por que desistira de lecionar matemática. - Receio estar com um cálculo na vesícula... (350 Causos de Campos e Adjacências - Saulo Pessanha) Ignorinhos Em visita a uma feira no Pavilhão de São Cristóvão, no Rio, Dodozinho gostou muito de um casal de pássaros. Como não conhecia as aves, indagou a origem delas a uma recepcionista. - Ignoro senhor! Na volta a São João da Barra, Dodozinho falou maravilhas da feira e um assessor dele quis saber o que mais o atraiu. -Adorei um casal de ignorinhos! (Saulo Pessanha) Governo avança A cada semana, o governo dá um passo em sua trajetória. Quem apostava que o presidente estaria afastado no começo de agosto saiu perdendo feio. Alguns veículos de comunicação e seus principais colunistas embarcaram na canoa. Ontem, quarta, Michel Temer foi mais uma vez vitorioso. Este analista se inclina a acreditar na hipótese de que o presidente concluirá seu mandato. Sob as reflexões que seguem. Boa articulação O presidente é um hábil articulador político. Consegue maioria nas casas congressuais para obter seguidas vitórias. Ex-presidente da Câmara por três vezes, duas vezes líder do PMDB, partido que presidiu por 15 anos, Michel sabe conduzir conversas, alcançar apoios e formar maioria. Essa identidade tem sido fundamental para se aduzir que usará seu poder de convencimento para fazer sua pauta seguir adiante no Congresso. Quem no lugar? Outra vertente desta reflexão aponta para a questão: quem colocar no lugar de Michel Temer nesse momento de crise? Ora, o país registra melhoria na frente econômica. Inflação caindo, juros na casa de um dígito, curva do desemprego parando com os primeiros números (animadores) de contratações no mercado de trabalho. Tirar o presidente e colocar alguém no lugar seria um ato muito arriscado. Essa é a tese que está por trás do voto favorável ao presidente. Rodrigo Leal Rodrigo Maia, que poderia ser o nome para o lugar de Temer, tem dado mostras de lealdade. E não faz, como alguns dizem, jogo duplo. É claro que pode até ver com agrado a possibilidade de vir a assumir o cargo de presidente, mas as perspectivas de um novo governo, faltando apenas um ano e meio para o final do atual governo, são sombrias. Poderia não ser para Maia um bom negócio, eis que outras posições seriam atraentes, como o Senado, o próprio governo do Rio de Janeiro em 2018 ou, ainda, a volta como deputado Federal, posto que poderia lhe dar novamente a presidência da Câmara. Janot vingativo As denúncias do procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, começam a mexer com a cachola dos parlamentares, que enxergam em sua atitude vingança, ódio exacerbado contra o presidente. Por que Janot não exibe mesmo ímpeto em relação aos protagonistas Luiz Inácio e Dilma Rousseff? Seu tiroteio concentra-se em Temer e Aécio Neves. A imagem de um procurador vingativo se incrusta na mente dos parlamentares. Sentimento geral O presidente é impopular, dizem as pesquisas. Mas o sentimento geral do universo produtivo é o de que Michel Temer está fazendo o país caminhar, com os avanços na esfera das reformas. Por isso, a voz comum é de apoio às medidas que estão sendo tomadas. Não se vê "fora Temer" nem em placas nem na expressão oral. O endosso do empresariado e de fortes conjuntos das profissões liberais só é questionado quando a questão é a de tributos. As entidades de muitos setores se posicionam contra o aumento de impostos, como se viu recentemente por ocasião do aumento de combustíveis. Orgulho do país "Quando alguém pode dizer em qualquer país do mundo, meus pobres são felizes, nem ignorância nem miséria se encontram entre eles, minhas cadeias estão vazias de prisioneiros, minhas ruas de mendigos: os idosos não passam necessidades, os impostos não são opressivos [...] quando essas coisas podem ser ditas, então pode tal país orgulhar-se de sua Constituição e de seu governo" (Os Direitos do Homem -Thomas Paine) O Brasil moderno O que está em jogo, na visão de analistas, é a visão de um país moderno, que deve fazer as reformas fundamentais para estabelecer patamares de alta produtividade e eficácia, e um país com o status quo do passado, cercado pelas mazelas geradas pelo patrimonialismo: mandonismo, grupismo, nepotismo, caciquismo, fisiologismo. Os horizontes descortinam saídas para a maior recessão econômica da história brasileira, herança da era PT. Mas esse partido e outros fazem de conta que a crise começou hoje com o governo Temer. Caradurismo. A visão do país arcaico faz o gosto das oposições. PSDB dividido Os tucanos estão divididos. A banda de "cabeças brancas" (os mais velhos) contra a banda de "cabeças pretas". O partido tem quatro ministros. E a agenda que o presidente Temer está mostrando é praticamente a agenda do PSDB. Sair do governo nesse momento é covardia. Ocorre que certos parlamentares temem perder votos em 2018 caso continuem a fazer parte do governo. O tucano Cássio Cunha Lima diz que quer preservar a posição de seu filho deputado. O tucano Tasso Jereissati quer levar o comando do partido para o Nordeste. Para Geraldo Alckmin, não interessam maremotos e tsunamis. Por isso, a continuidade do governo Temer é a melhor opção para sua candidatura em 2018. Fato: o PSDB é o partido que apresenta, hoje, maior divisão. A caravana de Lula Dia 17 de agosto Lula iniciará suas caravanas pelo país, a começar pelo Nordeste. Entrará pela Bahia e encerrará a jornada nordestina no Maranhão. Passará por cidades grandes e médias. Na região, consegue obter uma média de 45% de intenção de voto. Percorrerá depois as regiões Norte e Centro-Oeste. Como se vê, sua estratégia é a de comer pelas bordas. Das margens para o centro. Mas terá poucas chances de vir a ser candidato. A 2ª instância da Justiça Federal (PR, SC e RS) tende a confirmar a condenação dada pelo juiz Sérgio Moro, de 1ª instância. Reforma política: o poder é do povo Ponto 1: nos termos do parágrafo único do artigo 1º da Constituição, "todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição". Ponto 2: nos termos dos artigos 45 e 46 da Constituição Federal, os deputados Federais representam o povo e os senadores representam os Estados e o Distrito Federal. Ponto 3: os deputados são eleitos pelo sistema proporcional e os senadores, pelo sistema majoritário. Ponto 4: se o povo vota em um candidato e este, com sua bagagem de votos, leva para o Parlamento mais dois ou três de contrabando, esses excedentes ferem o princípio constitucional alinhavado no primeiro item. Reforma política: Distritão Ponto 5: a representação popular, para ganhar respeito e legitimidade, deve se submeter a uma radiografia moral a fim de se conformar aos ditames constitucionais. Ponto 6: o exercício do poder em nome do povo é tese ancorada na hipótese de escolha dos eleitos de acordo com o preenchimento das vagas que cabem a cada Estado. Ponto 7: essa hipótese abriga o voto majoritário, que, adotado na escolha dos representantes do povo, acabaria com a excrescência gerada por coligações proporcionais, pela qual o eleitor vota em um candidato e, alheio à sua vontade, elege mais um, dois ou até mais de três. Portanto, o Distritão é uma boa alternativa. Reforma política: Emenda Lula Outubro está à vista e a reforma política caminha a passos de caranguejo. O relator Vicente Cândido, do PT, acabou retirando a "Emenda Lula", de sua autoria, como é conhecida, aquela que dizia que candidatos não podem ser presos até 8 meses antes da eleição. O próprio Lula teria sugerido a retirada. Ambição desmesurada No meu livro "Marketing Político e Governamental" cito um pensamento do cientista político Robert Lane, em Political Life, que explica como a ambição desmesurada pelo poder funciona como um bumerangue. "A fim de ser bem-sucedida em política, uma pessoa deve ter habilidades interpessoais para estabelecer relações efetivas com outras e não deve deixar-se consumir por impulsos de poder, a ponto de perder o contato com a realidade. A pessoa possuída por um ardente e incontrolável desejo de poder afastará constantemente os que os que a apoiam, tornando, assim, impossível a conquista do poder". PT quer Michel no comando O PT diz uma coisa e faz outra. Na Tribuna, seus líderes pregam o impeachment de Michel Temer. Mas, na surdina, trama pela continuidade, sob a crença de que o presidente "sangrando" conviria mais aos seus desígnios. Mas quem garante este "sangramento" até outubro de 2018? Avaliação melhor Este consultor sempre fala de sua equação: BO+BA+CO+CA= Bolso, Barriga, Coração, Cabeça. Bolso cheio, barriga satisfeita, coração agradecido e cabeça aprovando o comandante da jornada. Ou seja, a democracia do pão sobre a mesa, na esteira de uma economia recuperada, melhorará os padrões de avaliação do governo. Essa hipótese é plausível. Centrão O Centrão, que reúne os partidos médios do Congresso, deverá ser o bloco mais forte dentro da composição das forças governistas. Seus integrantes deram o maior número de votos ao presidente na sessão de ontem. Deverá ser recompensado. - "Quando o efeito é bom...ele sempre justifica a ação" (Maquiavel) Simula e dissimula O cardeal Mazarino, sucessor de Richelieu e preceptor de Luís XIV, o Rei Sol, começa seu tratado Breviário dos Políticos, que versa sobre a arte de operar a política, com um conselho não muito sagrado: "Simula e dissimula". Esta lição de engodo costuma ser submetida ao crivo da população durante as falas de nossos representantes. Na sessão de ontem, essa estratégia foi muito usada. A simulação e a dissimulação - e aqui já é o ensinamento do filósofo inglês Francis Bacon - ocorrem de três formas: a cautelosa, quando uma pessoa impede que a tomem tal qual é; a negativa, quando expressa sinais de que não é o que é; e a positiva, quando finge e pretende ser o que não é. Fecho a coluna com o folclórico Newton Cardoso, das Minas Gerais. Helicóptero Newton Cardoso assumiu o governo de Minas. No dia seguinte, foi ao aeroporto para viajar no helicóptero da administração estadual. Ao tomar conhecimento de que aquele "trem" tinha o nome de seu adversário, foi logo dando bronca no piloto: - Não entro de jeito nenhum nesse trem com o nome do Hélio (Hélio Garcia era o governador anterior). O piloto, constrangido, respondeu: - Mas governador, esse helicóptero é do governo do Estado e não do ex-governador Hélio. Newton não quis saber: - Esse trem agora vai se chamar Newtoncóptero. Falei e tá falado.
quarta-feira, 19 de julho de 2017

Porandubas nº 539

Abro a coluna com pequena reflexão O nome de Deus em vão Deus é sempre a referência de homens que carregam em sua alma a pretensão da onipotência. Franco usava a Providência Divina para se afirmar: "Deus colocou em nossas mãos a vida de nossa Pátria para que a governemos". Não satisfeito, mandou cunhar nas moedas: "Caudilho da Espanha pela graça de Deus". Idi Amin Dada, o cabo que se tornou marechal de Uganda, ditador sanguinário, dizia ao povo que falava com Deus nos sonhos. Um dia, um jornalista faz a inquietante pergunta: "O senhor tem com frequência esses sonhos? Conversa muito com Deus? Lacônico, o cara de pau respondeu: "Só quando necessário". Este analista acredita que o nome de Deus nunca foi tão usado pela esfera política como nesses tempos de crise. Em vão. Recesso parlamentar A tese de que o recesso poderá mudar o comportamento do parlamentar na decisão em plenário sobre a admissibilidade da denúncia contra o presidente da República tem de ser analisada sob alguns ângulos. É verdade que Michel Temer é impopular, segundo constatam pesquisas. Mas o eleitor não faz também boa avaliação dos parlamentares. Pode haver, aqui e ali, um caso de mudança, mas é pouco provável que o corpo parlamentar, em sua grande maioria, mude a decisão de votar a favor do presidente por influência das bases. Reformas Interessante é observar que as reformas encampadas pelo governo conseguem simpatia de núcleos centrais, profissionais liberais, enfim, de fortes conjuntos das classes médias. No médio prazo, com os primeiros resultados a serem dados pelas reformas, é razoável apostar na melhoria da avaliação do governo. A reforma da Previdência poderá ser o calcanhar de Aquiles da administração Federal. Tudo vai depender da travessia da canoa das denúncias pelas ondas da Câmara Federal. Saída para a crise A saída para a crise é a via parlamentarista. Até porque o presidencialismo de cunho imperial já deu o que tinha de dar. A coalizão partidária que caracteriza o nosso sistema começa a ser bastante questionada. Os partidos tomam posição, mas muitos de seus integrantes não cumprem as determinações. Critica-se, por outro lado, o poder de cooptação do Executivo. Por tudo isso, urge mudar a face do disco. Fim de linha O fato é que o sistema parlamentarista abrigaria melhor os elementos tradicionais que amparam o regime republicano: o federalismo, o bicameralismo, o multipartidarismo, o voto uninominal e dois tipos de sistema eleitoral (proporcional e majoritário), que acabam conferindo caráter híbrido à nossa democracia. Morrer jovem Pergunto à tia Rute, 83 anos, espertíssima: - Tem coisa pior do que envelhecer? E ela, curta e grossa: - Tem. Morrer jovem. (Enviado por Álvaro Lopes) Novas bases Mas o parlamentarismo carece de novas bases em nossa política. Não há condições de se estabelecer um regime parlamentarista sob o gigantesco balcão que acolhe 35 partidos. Para a convivência entre os conjuntos da situação e da oposição, o Parlamento carece de um leque de não mais que 7 a 8 partidos. As correntes de pensamento e opinião estariam bem representadas. Ou seja, a vereda parlamentarista deve integrar o largo caminho de uma reforma política. Reforma empacada Mas a reforma política está empacada. O relator, deputado Vicente Cândido (PT-SP) parece meio perdido. Sua última decisão se volta para uma proposta de caráter oportunista, a chamada "emenda Lula", pela qual candidatos não poderão ser presos até 8 meses antes das eleições. A intenção, como se pode perceber, é garantir a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio em outubro de 2018. Os deputados de grandes partidos começam a ensaiar apoio ao distritão, sistema eleitoral que elegeria os mais votados nos Estados. Portanto, sem as caronas proporcionadas pelas coligações proporcionais, encabeçadas por puxadores de votos. PSB encolherá? O PSB é um partido em crise. Desde a morte de Eduardo Campos, seu timoneiro, o partido ficou ao léu, sem saber o rumo a tomar. A cúpula do PSB tem posição contrária ao governo, apesar da líder do partido na Câmara, deputada Tereza Cristina (MS) integrar o grupo aliado ao governo. Fala-se em uma demandada de 10 parlamentares rumo ao DEM ou mesmo ao PMDB. O senador Fernando Bezerra Coelho estaria por trás dessa manobra, que visaria formar uma frente de apoio ao filho, hoje ministro Fernando Coelho Filho, como candidato ao governo de Pernambuco. Jung e o rei africano Jung perguntou, uma vez, a um rei africano: - Qual é a diferença entre o bem e o mal? O rei meditou, meditou e respondeu às gargalhadas: - Quando roubo as mulheres do meu inimigo, isso é bom. E quando ele rouba as minhas, isso é muito ruim. Condenação de Lula Lula se sente bem na posição de condenado pelo juiz Sérgio Moro. Não morreu e nem morrerá por conta disso. Trata-se de um protagonista de primeira linha: detém forte dose de carisma, sendo o líder mais populista do país; possui alta visibilidade; domina bem a expressão de palanque; é capaz de mobilizar largos contingentes; e o PT, ao contrário de outros partidos, abriga aguerrida militância. Por todos esses aspectos, a vida política de Lula não se encerra com a condenação do juiz Moro. Corrida pelo território Lula iniciará nos próximos dias um périplo pelo país a começar pelo Nordeste, onde detém grande popularidade. A estratégia de mobilização centrípeta - das margens para os centros - tem o intuito de expandir o discurso de que as elites, a partir do Poder Judiciário, querem inviabilizar sua candidatura nas eleições de 2018. O eleitorado das regiões menos desenvolvidas tende a se solidarizar com seus ídolos, principalmente quando estes vestem o manto de perseguidos de poderosos. O discurso separatista do "nós" contra "eles", tão do gosto do lulopetismo, voltará a regar as searas carentes. Lula dará prioridade às grandes e médias cidades do interior nordestino. Juntando as oposições As andanças de Lula pelo país terão o objetivo de ressuscitar a imagem do PT, combalido pela crise política e alvo de escândalos de corrupção desde o mensalão; voltar a ser o "pai dos pobres", recolocado no altar das massas; arrumar a militância desordenada e preparar o caminho dos eleitores em direção às urnas. Se for condenado e tiver a candidatura impedida, por volta de julho/agosto de 2018, suas andanças não perderão eficácia. Tornar-se-á vitima, na esteira de uma estratégia que ele sabe desenvolver. Ajudará ainda perfis próximos ao lulismo, ao mesmo tempo em que poderá ser o construtor e fiador de candidatura única das oposições. Sigilo nas contas Mais uma proposta do deputado Vicente Cândido, relator da reforma política, gera polêmica. Ele pretende apresentar a ideia de cobrir de sigilo as doações para campanhas cujo valor seja inferior a 3 salários-mínimos. Calcula-se que deixariam às escondidas 95,55% dos recursos doados na campanha de 2016. Muita coisa. Não passará. A sociedade está de olho atento aos esconderijos. Maia é pragmático Rodrigo Maia não é bobo. Fala a linguagem da real politik. É evidente que não pode deixar de reconhecer suas chances de vir a ocupar a cadeira presidencial no caso da saída do presidente. Urge, porém, acreditar no que diz: não conspira contra Michel Temer. Acompanha os passos de seu contingente parlamentar, abre os ouvidos e a expressão pragmática. O governo deverá passar pelo primeiro grande teste, a primeira denúncia de Janot. E Rodrigo acompanhará essa travessia com largueza de espírito. Sem emboscadas. A conferir. João Almino O embaixador João Almino, potiguar como este consultor, tomará posse dia 28 na Academia Brasileira de Letras, no Rio de Janeiro. João nasceu em Mossoró em 1950, é autor de seis romances, muito apreciados pela crítica (As Cinco Estações do Amor, vencedor do Prêmio Casa de Las Americas, e Cidade Livre, finalista dos Prêmios Jabuti e Portugal-Telecom, entre outros), alguns traduzidos para inglês, francês, espanhol, italiano e outras. É também ensaísta e seus trabalhos são considerados referências para estudiosos de sistemas políticos. O presidente da Academia Norte-Riograndense de Letras, o poeta e escritor Diógenes da Cunha Lima, liderou uma campanha para patrocinar a confecção do fardão. Delações que virão Fala-se muito das delações que virão. E citam-se os possíveis delatores: Eduardo Cunha e Lúcio Funaro. Questões que se colocam: teriam fatos novos a contar? Viriam apoiadas em provas contundentes? Não seriam repetições ao que já foi dito? Daí porque as interrogações continuam a empanar os horizontes. Desemprego começa a ceder Os sinais de que a curva do desemprego começou a ceder e a cair são auspiciosos. O país criou 67,3 mil vagas no 1º semestre. A inflação aponta também para ligeiro declínio. Os juros, esses sim, precisam cair em ritmo mais forte. Os sinais são animadores. Ciro ataca Lula Lê-se que Ciro Gomes, com forte possibilidade de ser o candidato do PDT ao pleito de 2018, ataca Lula, que não teria deixado formar outras lideranças dentro do PT. Não é novidade. Em se tratando de Ciro, metralhadora ambulante, virão tiros para todos os lados. Por isso, é comum se ouvir: como peixe, Ciro morre pela boca. OAB/SP em grande ação O presidente da OAB/SP, Marcos da Costa, se empolga com o conjunto de eventos e ações sob coordenação da entidade. Fará exposições nos espaços da Assembleia Legislativa de São Paulo, do Tribunal de Justiça e do Tribunal Regional do Trabalho. De 27 a 30 de novembro, São Paulo sediará a XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira, que deverá contar com a participação de 40 mil advogados. E serão lançados livros sobre os ex-presidentes da OAB nacional: Mario Sérgio Duarte Garcia, Marcio Thomas Bastos, Roberto Batocchio e Rubens Approbato Machado; e mais dois livros, um sobre Direito de Defesa e outro sobre os 85 anos da OAB/SP, a partir das sub-secções regionais. Em março passado, a Ordem iniciou as comemorações com a inauguração de uma exposição com as principais capas do Jornal do Advogado. Fecho a coluna com São Paulo sonhando com Brasília. Fazendo exame para Brasília Um amigo da coluna esteve recentemente no Palácio dos Bandeirantes. Perguntou-me: - Você viu o que o governador Alckmin mandou fazer? Contou. No Salão Nobre, cravado em madeira, viu o brasão do Estado: uma espada longa cercada por dois modestos ramos de café. Emoldurado pelo dístico: - Pro-Brasilia fiant eximia. (Façam-se as melhores coisas pelo Brasil). Com seu parco conhecimento de latim, traduziu: - Fazendo exame para Brasília.
quarta-feira, 12 de julho de 2017

Porandubas nº 538

Abro a coluna com Tancredo e seus conchavos Conchavo Premido por casuísmos, Tancredo Neves foi obrigado a fundir o seu PP com o MDB de Itamar. Alguns pepistas pularam do barco e protestaram alegando conchavo. Tancredo foi curto e seco: "Conchavo é a identificação de ideias divergentes formando ideias convergentes". Tinha razão. Há curvas que desembocam em retas. O país vive momentos de conchavos na esteira da profunda crise política. Reformas semeadas Seja qual for o desfecho da crise - a permanência ou não do presidente Michel Temer à frente do governo - cristaliza-se na sociedade a irreversibilidade das reformas fundamentais ao desenvolvimento do país. Bateu-se muito nos últimos meses em sua defesa. A reforma trabalhista chega a ser defendida quase todos os dias pelos setores produtivos e pelos grandes jornais. A reforma da Previdência, apesar da polêmica que levanta, também ganha a cada dia mais adeptos. Pode ser que não saia do tamanho com que foi inicialmente proposta. A reforma política, essa, então, virou sinônimo de "urgência" na agenda congressual. Mas divide o Parlamento. A reforma tributária é feita em doses homeopáticas. Portanto, as reformas foram bem plantadas. Só mesmo os perdedores de benefícios as repudiam. Política, conflitos Apenas para lembrar porque a reforma política não anda: o patrimonialismo ainda dá as cartas. Nossa cultura política é secular. Remanescem traços da herança deixada por Dom João III, entre 1534 e 1536, quando criou as 15 capitanias hereditárias e as distribuiu entre os donatários. A confusão entre público e privado vem daí. Os políticos acham que são donos do mandato e dos cargos nas estruturas públicas. Consideram-nos feudos. Complexo de faraó Ao lado da velha cultura patrimonialista, o Brasil também sedia o complexo de faraó. Haja olhos para contemplar a arquitetura faraônica que se espraia pelo país na forma de construções suntuosas, edifícios majestosos, obras de desenhos arrojados e massas volumosas que causam estupefação. O Brasil se habilita a ser o habitat ideal para abrigar o sono eterno dos faraós, fustigados pelo eco da turba que chega às suas tumbas. Se suas majestades só se sentem confortáveis em pharao-onis, termo do velho latim para significar "casa elevada", é isso que encontrarão no Planalto brasiliense, que pode ganhar o título de morada dos faraós no século 21. O fausto, a opulência, o resplendor, a exuberância se elevam nos espaços, sob o ditame inquestionável de que, se a obra foi construída em Brasília, não deve sofrer limites de gastos. Uma das mais resplandecentes foi a sede do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Catacumbas do desperdício Outra faceta bem brasileira é o desperdício. Jogamos fora 50% dos alimentos produzidos (perda estimada em R$ 20 bilhões anuais, o que daria para alimentar 30 milhões de pessoas), 40% da água distribuída, 30% da energia elétrica. Os cálculos foram feitos pelo professor de Engenharia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro José Abrantes, autor do livro "Brasil, o País dos Desperdícios". Há simplesmente um PIB e meio desperdiçado, ou seja, jogam-se no lixo R$ 3,6 trilhões. Se a montanha de riquezas perdidas pudesse ser preservada, o país estaria, há tempos, no ranking mais avançado das potências. Mídia e crise A crise é profunda. A cada dia, novos episódios se juntam ao contencioso existente. Há, porém, muitos vieses a atrapalhar o esforço de leitura dos acontecimentos. A mídia, por exemplo, exagera nas doses informativas. Regra geral, as matérias dos grandes jornais dão o governo como acabado. Já não existe. Nomeiam ministros do governo Rodrigo Maia, fofocam sobre apreciação do presidente da Câmara sobre uns e outros nomes de sua simpatia/antipatia. Mas o fato é que o governo, mesmo no despenhadeiro, ainda dá demonstrações de força. Denúncias seguintes A hipótese tem sentido: o presidente Michel Temer pode vencer a luta da primeira denúncia, ganhando na CCJ e no Plenário, mas terá dificuldades extremas para enfrentar as duas outras denúncias a serem apresentadas pelo procurador Rodrigo Janot. Os parlamentares estarão no recesso em contato com suas bases. E deverão regressar ao ambiente parlamentar sob a influência dos eleitores. O processo de votação - com a identificação pessoal do deputado - é uma barreira para que este perfile ao lado do presidente da República. A imagem do procurador Há uma interpretação sobre o futuro de Janot, registrando-se até eventual inserção na esfera política. Ora, a imagem do procurador não é boa em estratos médios, onde se faz o acompanhamento da crise com mais poder crítico. Sua benevolência com os Batista, dando a eles o perdão por terem delatado o presidente da República, causa intensa indignação. Expande-se a convicção de que ele agiu sozinho, julgando o próprio Joesley e tirando o poder do Judiciário para julgar os cabeças de muitos crimes. Há até um dado que circula pelas redes: Joesley teria escapado de uma pena de 2.000 anos. STF em segundo plano O fato é que a imagem do Judiciário também saiu chamuscada do episódio da delação dos Batista. Praticamente, o STF cumpriu o papel de convalidar a decisão do procurador. Nesse momento, firulas de natureza jurídica - eventual correção mais adiante do perdão a eles concedido - não são compreendidas por parte de boa parcela da sociedade. O ministro Edson Fachin, sob essa mesma leitura, teria sido muito apressado com sua decisão de aprovar os pedidos do PGR. Frente da violência Mais uma vez o Brasil assistiu, ontem, algo inusitado. Senadoras da oposição - Fátima Bezerra, Vanessa Grazziotin e Gleise Hoffmann, Regina Souza e Lídice da Mata - decidiram ocupar a mesa diretora do Senado para evitar a votação da reforma trabalhista. Impedido de sentar-se na cadeira de presidente, o senador Eunício Oliveira ordenou apagar as luzes do ambiente e desligar o som de microfones. O gesto foi designado por elas próprias como um ato democrático. Há quem veja na extravagante ideia das senadoras da oposição um ato violento. P.S. Qualquer senador pode abrir a sessão quando não há quorum. Mas, claro, devem ceder a cadeira de presidente a quem a ocupa por direito. Quando este se fizer presente. Senadores governistas estão tentando um acordo com as rebeldes. Pergunta: e o Conselho de Ética será acionado ou não? Zveiter Mesmo garantindo que seu parecer teria um cunho eminentemente político, o deputado Sergio Zveiter, relator da denúncia contra o presidente da República na CCJ, produziu uma peça com fortes elementos jurídicos. Entrou no mérito, repeliu a tese de que a denúncia era inepta, falou de sua gravidade e dos fortes indícios de participação do presidente na trama. Mas e a prova dos nove, o recebimento da mala com 500 mil reais? Ficou na lateral. Não disse nada. Mariz Antônio Claudio Mariz de Oliveira mostrou porque é um dos mais competentes advogados criminalistas do país. Fez um contundente discurso. Foi veemente. Emotivo. Fez reptos. Desafiou o PGR a mostrar as provas de corrupção. E colocou o conceito de açodamento tanto em Rodrigo Janot quanto no juiz Edson Fachin. Mariz chegou a afirmar que, no país, a anomia impera. Anomia e impunidade No Brasil, corruptos e facínoras, se condenados, ganham o mesmo status perante a lei. Por isso, não é de estranhar a anomia que toma conta do país. Vem de longe. Desde os idos da colônia e do Império, fomos afeitos ao regime de permissividade, apesar da rigidez dos códigos. Tomé de Souza, primeiro governador-Geral, chegou botando banca. Os crimes proliferavam. Avocou a si a imposição da lei, tirando o poder das capitanias. Um índio que assassinara um colono foi amarrado na boca de um canhão. Ordenou o tiro para tupinambás e colonos entrarem nos eixos. Ordenações do reino Em 1553, porém, uma borracha foi passada na criminalidade, com exceção dos crimes de heresia, sodomia, traição e moeda falsa. Depois chegaram as Ordenações do Reino (Afonsinas, Manuelinas e Filipinas), que vigoraram até 1830. De tão severas, a ponto de estabelecerem a pena de morte para a maioria das infrações, espantaram até Frederico, o Grande, da Prússia, que ao ler o Livro das Ordenações, chegou a indagar: "Há ainda gente viva em Portugal?". Os castigos, porém, eram frequentemente perdoados. (Qualquer lembrança de Joesley Batista é mera coincidência). Na época, a regra era impor uma dialética do terror e do perdão para fazer do rei um homem justiceiro e bondoso, como relata Luís Francisco Carvalho Filho num ensaio sobre a impunidade no Brasil nos tempos da colônia e do Império. E assim, entre sustos e panos quentes, o Brasil semeia "a cultura do faz de conta". Fecho a coluna com Jânio e as brigas de galo Galo briguento na panela Jânio Quadros assumiu a presidência da República, proibiu brigas de galo. A ordem era irrecorrível: "Se cantar, terreiro. Se brigar, panela". José Resende de Andrade, delegado em Belo Horizonte, era janista, zeloso e fiel executor da lei. Mandou prender todos os galos de briga da região metropolitana. José Resende levou a galada para os fundos da delegacia, na praça da Liberdade. De madrugada, começou a alvorada cantante. Magalhães Pinto, governador do Estado, dormindo próximo, no Palácio da Liberdade, foi despertado pela orquestra de José Resende, mandou dar um jeito imediato na zoeira. José Resende recebeu a ordem, não discutiu. Matou todos. Um galicídio. Até hoje os amigos o chamam de Zé Cocó, o mata-galo. E ele, muito mineiramente, sorri modesto: "O dever não distingue o canto do infrator".
quarta-feira, 5 de julho de 2017

Porandubas nº 537

Abro a coluna com uma historinha de Mossoró/RN. As mãos limpas de Sócrates Debate na Câmara dos Vereadores de Mossoró. De um lado, Toinho Duarte toma posição, recorrendo a um gesto bíblico para melhor se fazer compreender: - Excelências, como "Sócrates", eu lavo as mãos.... Com seu jeito sarcástico, depois de pedir um aparte o também vereador Lázaro Paiva encurrala-o com um necessário reparo histórico: - Excelência, me desculpe. Quem lavou as mãos não foi Sócrates (filósofo grego), mas sim Pilatos. Sem dar o braço a torcer, Toinho retoma a palavra para a estocada final: - Excelência, o senhor quer bem dizer que Sócrates nunca lavou as mãos, hein? Hein? (Do Livro Só Rindo 2, de Carlos Santos) O melhor e o mais selvagem O homem, em estado de perfeição, ensinava Aristóteles, é o melhor dos animais. Quando, porém, afastado da lei e a da Justiça, é o mais selvagem e impiedoso de todos, pois, destituído de qualidades morais, usa a inteligência e o talento como armas para praticar o mal. É possível vislumbrar no pensamento do grande filósofo grego a inspiração que emoldura a sábia (e poética) observação do então ministro Carlos Ayres Britto, por ocasião da sessão da Suprema Corte que julgou o núcleo político da Ação Penal 470 pelo crime de formação de quadrilha. Deus no céu... Ayres Britto, também poeta, escreveu na ocasião: "Deus no céu e a política na terra. Por quê? Porque a política é o meio pelo qual a sociedade constrói e reconstrói o Estado. A política é o instrumento de concretização dos anseios do povo. É, acima de tudo, a forma pela qual se pode buscar o bem-estar coletivo, a manutenção da ordem e a concepção do progresso". Brasil policial Sensação geral: o Brasil virou uma gigantesca delegacia de polícia. A crise política adentrou na esfera policial. Quase todos os dias vemos prisões, algumas envolvendo políticos, outras levando empresários. A PF cumpre os mandados autorizados por juízes. As operações em sequência avolumam o contencioso da operação Lava Jato. Anteontem foi a vez do ex-ministro Geddel Vieira Lima e do empresário de transportes do Rio de Janeiro, Jacob Batista Filho. Cerco ao governo Cada detenção de políticos, principalmente de ex-ministros, impacta negativamente sobre a imagem do Governo. A impressão é a de que há uma estratégia bem definida para estreitar a margem de articulação governamental. Uma cadeia de impressões se estabelece: os deputados se impressionam com as detenções e fazem raciocínios sobre os efeitos que tais prisões geram no sistema cognitivo dos eleitores. E começam a tomar decisões que garantam sua sobrevivência política. Pensam em 2018. E sob este pano de fundo, vão decidir sobre o pedido de investigação feito pelo STF à Câmara Federal. O efeito do discurso Muita gente se engana com a eficácia do discurso político. Pois bem, o discurso político é uma composição entre a semântica e a estética. O que muitos não sabem é que a eficácia do discurso depende 7% do conteúdo da expressão e 93% da comunicação não verbal. Esse é o resultado de pesquisas que se fazem sobre o tema desde 1960. E vejam só: das comunicações não verbais, 55% provêm de expressões faciais e 38% derivam de elementos paralinguísticos - voz, entonação, gestos, postura, etc. Ou seja, do que se diz, apenas pequena parcela é levada em consideração. O que não se diz, mas se vê, tem muito maior importância. A imagem da mala, a soma de GRPs Projetemos esses dados sobre a mala de dinheiro que o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures carregava ao sair de uma pizzaria. Ganhou status de símbolo maior da corrupção. Imaginem, agora, essa imagem sendo apresentada quase todos os dias pelo Jornal Nacional, da TV Globo. O GRP (Gross rating point), que mede alcance e frequência das campanhas, no caso da imagem da mala, equivale a uma soma dos GRPs de campanhas maciças de produtos de consumo de massa. Ou seja, ocupa todos os lados do cérebro dos telespectadores. É com essa força que a TV Globo conta para despachar o presidente. E a repetição diária das linguagens (diálogos e imagens) acaba plasmando o conceito de "verdade". Bonner Ao encerrar o Jornal Nacional da última segunda-feira, 3, William Bonner se despediu anunciando o título do filme da Tela Quente, que seria transmitido após a novela das 21h. O filme: era Caçada ao Presidente. Bonner mostrou um 'sorriso sarcástico'. Muitos interpretaram o tom como uma indireta a Michel Temer. A corrida A imagem da mala assume outros significados: a corrida do Loures é associada à fuga, despiste, medo de flagrante, ilícito. A repetição dispara sentimentos negativos e comentários jocosos. O elo com o presidente é feito pela oralidade: homem de confiança, amigo, fiel aliado. E dessa forma, os mecanismos da cognição são acionados contra o ex-deputado e, por conseguinte, na autoridade a quem servia. A repetição, sem fatos novos que justifiquem tantos GRPs, acaba fechando o circuito de campanha negativa. A teia da delação Sem terem para onde correr, os envolvidos são lançados na malha da delação. Sob certa dose de coação (e coerção) psíquica, que se extrai dos duros ambientes dos cárceres (salas pequenas, sem ventilação, sem janelas, sem aparelhos sanitários). Ao fundo, a pressão familiar, que funciona como bússola de salvação. A família luta para que pais, filhos e parentes presos voltem para casa. Mesmo com tornozeleiras eletrônicas. Um fim para a crise A crise crônica que consome a esfera política chegará ao fim? Quando? Em que circunstâncias? O fato é que a sociedade clama por uma nova página no dicionário da crise. Quer ver assepsia, compromisso, verdade, transparência, política séria. A saída é a reforma política. Esta, porém, está ameaçada. Pode não sair do papel. Será uma frustração. As mesmas notícias, todos os dias, esgotam o estoque de paciência do telespectador. Que clama por um país que tem de dar um basta ao PNBC, Produto Nacional Bruto da Corrupção. Um livro que vale a pena "TRABALHISTA! E AGORA"? Onde as Empresas Erram. Eis um grande livro para a compreensão do sistema de trabalho e a Justiça do Trabalho no país. O autor é o juiz Marlos Augusto Melek. Um perfil arrojado, que explica, de maneira didática, as distorções na área do mercado. E sem juridiquês. Já está na 3ª edição. Mané Mané era aquele esforçado sujeito que, obcecado pela ideia de escapar do fundo do poço, onde caiu, tornou-se insensível a qualquer ajuda externa. Uma pessoa ouviu um barulho, aproximou-se do poço, jogou uma corda e gritou: "Pegue a corda e saia." Irritado, o bronco respondeu: "Não vê que estou trabalhando? Não quero sua ajuda." Leitor, tem algum Mané ao seu redor? PT vai às ruas por Lula O PT promete grandes mobilizações de rua caso Lula seja condenado pelo juiz Sérgio Moro. O partido admite que políticos de todos os partidos sejam condenados e até presos. Luiz Inácio, porém, é diferente. Não pode ser condenado e jamais preso. O petismo quer convencer o mundo de que não tem nada a ver com a bandalheira que corrói a pátria. Mais delações à vista? Há quem esteja vendo mais delações ali na frente: Lúcio Funaro, Eduardo Cunha e Rodrigo Rocha Loures. O que diriam? Colocariam mais lenha na fogueira? A questão que alimenta tensões entre procuradores e advogados é: e as provas? Pode-se condenar alguém porque foi delatada por outro? Os advogados exigem provas. O verbo de uns e outros é farto. Os juízes é que vão decidir a parada. Credenda e Miranda A política é o estuário das expectativas e demandas sociais. Duas referências animam seus eixos: os "credenda", coisas a serem acreditadas, a partir do sistema legal, e os "miranda", coisas a serem admiradas, a partir dos símbolos. Daí a inescapável pergunta: o que há para crer na política brasileira e o que há para admirar? Aos ouvidos chega o eco: nada. As razões para tanto se abrigam em campos múltiplos, mas a origem dos males recentes é a consolidação do PNBC (Produto Nacional Bruto da Corrupção), cuja raiz quadrada se extrai dos números que a esfera privada subtrai da res publica. Proposta do Sescon O Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis e das Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas no Estado de São Paulo faz interessante proposta na área da reforma trabalhista. Prega que sindicatos, federações e confederações das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais e as centrais sindicais deverão prestar contas, quando solicitadas, ao Tribunal de Contas da União, sobre a aplicação dos recursos provenientes das contribuições de interesse das categorias profissionais ou econômicas, de que trata o art. 149 da Constituição Federal, e de outros recursos públicos que porventura venham a receber. Os recursos O Sescon explica: recursos provenientes de que trata o caput são aqueles advindos das receitas geradas pelos recolhimentos das contribuições sindicais, estabelecidos na forma da lei e que deverão ser aplicadas integralmente nas finalidades estatutárias. E arremata: "Não se aplica à eventual exigência mencionada no caput aos recursos e demais receitas e despesas previstas no Estatuto e não oriundos das Contribuições Sindicais". O ranking do Planalto Protagonistas que poderão (poderão, não deverão) frequentar a planilha eleitoral de 2018: Geraldo Alckmin, João Dória, Luis Inácio, Marina Silva, Jair Bolsonaro, Ciro Gomes, Joaquim Barbosa, Josué Gomes da Silva (empresário, filho do ex-presidente da República, José Alencar), Nelson Jobim, Álvaro Dias, Ronaldo Caiado, Rodrigo Maia, Jarbas Vasconcelos. A galeria tende a ser mais extensa. O gaguinho Em 1976, o candidato da Arena a prefeito de Palmares renunciou. O governador de Pernambuco na época, Moura Cavalcanti, correu lá e pesquisou: "Quem é mais popular na cidade?" Resposta: "O gaguinho. Não fala nada". Foi forçado a assumir a candidatura. Subiu no palanque, endeusado pela oração do governador: "Prefeito não precisa falar. Precisa agir". A multidão, comovida, aplaudia o gaguinho, que apenas gesticulava com o V da vitória. Sem um dizer um A, ganhou. Os gaguinhos não têm mais vez no território eleitoral. Nossa democracia, de claudicante, está melhorando. Tornando-se mais participante.
quarta-feira, 28 de junho de 2017

Porandubas nº 536

Abro a coluna com um "causo" das bandas do Rio Grande. Colcha de retalhos Um grande comício realizava-se na praça Montevidéu, defronte à prefeitura de Porto Alegre. No início, o entusiasmo era enorme; porém, na medida em que os oradores iam se sucedendo, o público começou a demonstrar sinais de cansaço. Aparentemente, nada mais motivava os presentes. Um dos oradores preliminares, em voz comovida, resolveu queimar o último cartucho: - ... porque somos todos filhos de Getúlio Vargas! Ouviu-se então a voz clara de um gozador: - Ih, pronto, já nos chamou de filhos da p... (Anedotário da Rua da Praia 1, Renato Maciel de Sá Junior) Quem vigia? Uma questão central que instiga a teoria do Estado desde os tempos de Platão: "quem vigia o vigilante"? Longe do espelho: 30% O Instituto Datafolha é um dos mais qualificados e prestigiados do mercado. Até porque, pertencente a um grupo jornalístico, sofre menos a crítica que recai sobre outros. O Datafolha acaba de fazer mais uma pesquisa sobre o pleito de 2018. Convenhamos: uma pesquisa a um ano e mais de 3 meses das eleições é um exercício forçado de projeção. O país atravessa o ciclo político mais conturbado de sua contemporaneidade. Na pesquisa, Lula chega a alcançar 30% dos votos. Ora, é mais provável, hoje, que ele não seja candidato. A imagem do PT está no fundo do poço. Por que índice tão elevado? Será que sustentaria esse índice quando o espelho estiver a um palmo da cara? Hipóteses Algumas hipóteses podem explicar o fenômeno Lula: 1.Trata-se do perfil mais carismático da esfera política; 2. Apesar dos processos que ganhou na primeira instância, é bafejado pelo caudal noticioso que recai sobre a figura do presidente da República e do senador Aécio Neves; o tom crítico sobre ele é bem menor do que o bombardeio sofrido por Temer; 3. O PT, nos últimos tempos, elevou sua avaliação positiva, mesmo tendo sido o partido responsável pela catástrofe econômica em que se encontrava o país até pouco tempo (incrível, porém verdadeiro); 4. As margens sociais ainda consideram Luiz Inácio o político que mais as amparou; 5. As classes médias não entraram em cena jogando a pedra no meio do lago; 6. Com a imagem corroída da classe política - todos nivelados ao rés-do-chão - Lula se eleva no balão da visibilidade. Difícil de acreditar É difícil de acreditar na situação: os 13 anos do petismo-lulismo-dilmismo são considerados o ciclo da mais profunda recessão econômica que já ocorreu no país. Por conseguinte, o PT deveria se queimar no fogo na indignação social. Parcela de sua antiga cúpula foi ou está sendo condenada. O próprio Lula, com 6 processos, poderá engrossar a lista. E quem ganha no painel da avaliação para 2018? Ele mesmo, Lula. Pode ser que, mais adiante, a pedra jogada no meio da lagoa pelas classes médias faça marolas e estas cheguem às margens. E a avaliação negativa de Lula acabe desfazendo o mito. O fato é que a inversão de valores dá o tom nesse momento conturbado. Rejeição: 60% Outro ponto a destacar é a alta rejeição que Luiz Inácio recebe: 45% na média nacional, mas ultrapassando os 50% no Sudeste, que agrega 55% do eleitorado brasileiro. Se no Nordeste, conforme apura o Instituto Paraná Pesquisa, de Murilo Hidalgo, alcança 45% (média em algumas capitais), sua rejeição no Sudeste poderá inviabilizá-lo em eventual segundo turno. Claro, se vier a ser candidato. Essa chance é de 30 pontos numa régua de 0 a 100. Em suma, pesquisas nesse momento não devem gerar tanto impacto como o que alguns analistas e jornais querem fazer acreditar. Conflito aberto O presidente do PT do Rio, Washington Quaquá, prega conflito aberto nas ruas, caso Lula seja preso. E assim caminha o Brasil. Todos podem ser presos, menos o ex-presidente. O próprio Lula afirma: "se eu for condenado, não vale a pena ser honesto". Eita, Brasil... Edição, degravação, deturpação Duas centenas de paralisações. É o que constata o Instituto de Criminalística da PF sobre a gravação da conversa entre Joesley Batista e o presidente da República. Mas não houve adulteração, garante o Instituto. Outra perícia encomendada pela Folha de S. Paulo ao Instituto Brasileiro de Peritos confirma as interrupções. A conversa truncada é atribuída ao equipamento. Resumo, falta parte da interlocução. E o gravador foi ao exterior. Teve de ser recambiado. Vamos ver como esse material receberá a interpretação da Justiça. Discurso duro O presidente Michel Temer fez ontem um duro discurso contra as ações do PGR Rodrigo Janot. Referiu-se por diversas vezes à ilação feita pelo procurador sobre o destino da mala de dinheiro recebida pelo ex-deputado Rodrigo Loures. E respondeu com a ilação de que o procurador que auxiliava Janot saiu, deixando a Procuradoria para trabalhar no grupo JBS. Teria ali ganhado milhões e ... quem sabe ... esses recursos poderiam ter sido repartidos com outra pessoa (???). A peroração mostrou um presidente disposto a enfrentar a briga para "honrar a presidência e o homem Michel Temer". Gilmar abre a fala O ministro Gilmar Mendes, do STF, foi duro em entrevista ao jornalista Kennedy Alencar, do SBT. Disse que se for comprovada "ação controlada" entre MP e Joesley para a gravação de conversa com presidente da República, isso poderia levar à anulação da denúncia. O ministro fez ataques aos procuradores Federais. "Vejo com muita desconfiança os vazamentos que se fazem, as manifestações quase que religiosas de alguns tipos do MP, dizendo que não se pode criticar a Lava Jato, que não se pode aprovar uma lei de abuso de autoridade, que não se pode rediscutir o modelo de delação. Isso é extremamente perigoso. Os juízes passaram a ecoar [as acusações do MPF], passaram a ser caixa de ressonância do Ministério Público. Ora, o relator no Supremo não é sócio do MPF, nem pode ser boca de ventríloquo". O embate no STF deve ser acirrado. Escondendo o PT Outra questão que teima continuar sobre a mesa de grandes suspeitas: se o Joesley ganhou do governo do PT, comandado por Lula, bilhões do BNDES para fazer crescer seu grupo, se sua amizade com o ex-presidente era muito intensa, por que tanta sombra sobre ela? Mistérios rondam esse enredo. Há coisas não esclarecidas. E a mídia não tem dado muita trela ao fato. Insondáveis segredos. A propósito, o repórter Rubem Valente, da Folha, mostra a contradição entre a delação de Joesley Batista e a entrevista concedida à revista Época, dia 18 de junho passado. ("Entrevista contradiz depoimento de Joesley sobre contato com Temer" - clique aqui). Não há outro caminho A reforma política emerge com força. Será o único caminho para termos, em 2018, um pleito mais asséptico. O distritão ganha força: serão eleitos os mais votados nos Estados. Urge correr. Para que as novas disposições sejam aprovadas até início de outubro. Um ano antes do pleito. Janela sobre as paredes Escrito em um muro de Montevidéu: As virgens têm muitos Natais, mas nenhuma Noite Boa. Em Buenos Aires: Estou com ome. Já comi o f. Também em Buenos Aires: Ressuscitaremos, ainda que isso nos custe a vida! Em Quito: Quando tínhamos todas as respostas, mudaram as perguntas. No México: Salário mínimo para o presidente, para ver o que ele sente. Em Lima: Não queremos sobreviver. Queremos viver. Em Havana: Tudo é dançável. No Rio de Janeiro: Quem tem medo de viver não nasce. (As palavras andantes - Eduardo Galeano) Recorrentes perguntas Se Michel Temer deixar o governo, que nome teria condições de sucedê-lo? Rodrigo Maia alega que não quer, pois eventual mandato-tampão na presidência inviabilizaria sua candidatura em 2018. Estamos vendo e ouvindo uma barulheira na Torre de Babel. Cada grupo tem seu nome. Não há favoritos. Intensa polêmica acirra ânimos. Outra: eleição direta interessaria a quem? Ao PT de Lula e a Bolsonaro. E seria necessária mudança constitucional. Um parto de urgência. Haveria condição técnica de se fazer eleição direta em curto prazo? E esta? FHC prega antecipação de eleições. A quem interessa esse jogo? Ele tenciona voltar? Ou será que mudou de posição ao ver que a "pinguela" rachou e não permite a "passagem" do Rubicão? A moldura de forças Voltemos ao pleito de 2018. Não há favoritos. Não existe possibilidade de se eleger um perfil com origem nos extremos, seja da extrema-direita ou da extrema-esquerda. A competição poderá até ter cinco a seis candidatos. Mas a disputa será mesmo entre um perfil de centro (com certa inserção no centro-direita e no centro-esquerda) e um perfil mais à esquerda. Partidos e grupos da esquerda tentarão viabilizar sua candidatura. E o centrão tende a fechar posição com um perfil que consiga sair limpo da lama, ser capaz de aglutinar forças de partidos grandes e médios e, sobretudo, que seja bem visto pelo eleitorado das regiões mais populosas. Camões Causídico de fama no princípio do século, Pereira da Cunha notabilizou-se pela palavra apaixonada e eloquente. Quando Júlio de Castilhos morreu, em Porto Alegre, em 24 de outubro de 1903, vários discursaram na hora do enterro. No momento em que o caixão descia à sepultura, Pereira da Cunha destacou-se do grupo e exclamou: - Se houvesse um processo de cristalização da lágrima, o teu ataúde, Júlio, por certo não seria de madeira, nem o teu túmulo de granito! (Do Anedotário da Rua da Praia 1, Renato Maciel de Sá Junior) Crise espera por desfecho O repeteco denunciativo diário está saturando a audiência. A sociedade clama por um desfecho. O Poder Judiciário precisa correr com suas decisões. A sensação geral é a de copo transbordando. Todos os dias, abre-se a cantilena de denúncias, recheadas de versões, meias verdades e até verdades. Mas o bolo começa a gerar indigestão. Parlamentarismo branco A crise mexe com o sistema de governo. O nosso presidencialismo, de cunho absolutista, forte, ancorado no poder da caneta, reparte força com o corpo parlamentar. Inaugura-se um parlamentarismo branco, não de direito, mas de fato. O Executivo, para comandar o processo reformista que vem liderando, convida o Parlamento a dividir responsabilidades e decisões. É razoável que, passada a crise, chegaremos a implantar uma forma mitigada de parlamentarismo. Quem sabe? Menor ímpeto para Justiça do Trabalho A reforma trabalhista insere o Brasil no patamar do século XXI. Novas modalidades de trabalho são estatuídas formalmente. O país avança na trilha da modernização. Diminuirá sensivelmente a informalidade. E a Justiça do Trabalho agirá com menos ímpeto, deixando de ser também um poder legislador. Será possível alterar essa triste realidade: temos no país 73,9 milhões de processos - 1 para cada brasileiro adulto; 4 milhões de novas ações trabalhistas foram abertas no ano passado; 11 mil novas ações trabalhistas surgem por dia. Sob uma fila de 14 milhões de desempregados. Para onde Ronaldo olha? Há dúvidas e suspeitas sobre o posicionamento do ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira. Afinal, ele é contra o projeto de reforma trabalhista? Os setores produtivos falam que há certa empatia/simpatia pairando sobre as cabeças de Paulinho da Força e o ministro. Há um temor que ele, Ronaldo, esteja trabalhando para o governo editar uma MP agregando as teses de Paulinho. Portanto, pode ser que tenhamos de vê-los puxando o cabo de guerra para trás. Inconstitucional? Essa é inacreditável. O PGR, Rodrigo Janot, entrou no STF com um recurso arguindo a inconstitucionalidade da Lei da Terceirização. Que coisa insana. O procurador investe contra a prerrogativa do Parlamento de fazer leis? Só faltava essa: a Procuradoria querendo proibir as funções dos Poderes. Belisco-me para ver se estou acordado. Estou! Deu a louca no Planalto Central. Onde vamos parar? Fecho a coluna com mais um "causo" de outro Rio Grande, o do Norte. O candidato retardado Palanque armado no bairro Pereiros. O comerciante "Chico do Peixe" chega com considerável atraso, ávido por discursar na condição de candidato a vereador em 1996, no município de Mossoró. Favorecido pela escassez de oradores no comício do candidato governista, engenheiro Valtércio Silveira, apoiado pelo prefeito Dix-huit Rosado, Chico é alertado de que também terá direito a discursar. Ufa! Ele já pensava que não teria vez. Abrindo a oratória, Chico do Peixe tenta justificar sua ausência até então, mas mistura semântica com psiquiatria: - Olha, meus amigos, eu estou chegando "retardado"... (Só rindo 2: A política do bom humor do palanque aos bastidores, de Carlos Santos)
quarta-feira, 21 de junho de 2017

Porandubas nº 535

"Seu Lunga" foi personagem constante de nossa coluna em seus primórdios. Hoje, ressuscito essa interessante figura, o rei da ignorância, nos termos do poeta popular Luiz Alves da Silva, em seu folheto de literatura de cordel: "Seu Lunga chegou em casaCom um leite que comprouTinha dez litros no baldeA mulher lhe perguntou:- Ó Lunga, é pra cozinhar?Com isso ele se irritou- Mulher, esse leite eu trouxePra tomar banho com elePegou o balde e depressaDerramou por cima delePassou o dia todinhoCom moscas pousando nele. Um dia Seu Lunga foiFazer compras lá na feiraViu uma galinha gordaDa chamada capoeiraComprou e deu à mulherQue lhe falou prazenteira:- Ó Lunga, é pra matar?Seu Lunga de raiva esturra:-Não mate a bichinha, nãoApenas lhe dê uma surra.Que você ou a galinhaVeio ao mundo pra ser burra". O cenário Vamos à análise política. 1ª derrota: reforma trabalhista O governo tomou um susto com a derrota por 10 a 9 da reforma trabalhista na Comissão de Assuntos Sociais (CAS) do Senado. Estava muito confiante a ponto de não ter feito monitoramento da votação. Conversa de bastidor dá conta de participação do líder do PMDB no Senado, senador Renan Calheiros, que teria trabalhado para derrotar o governo. Renan tem agido como gangorra: sobe e desce, elogia e ataca o governo. Essa derrota pode ser a gota d'água nas relações entre o Palácio do Planalto e o parlamentar alagoano. CCJ e plenário A reforma trabalhista deverá seguir normalmente para a CCJ, que apreciará questões legais e constitucionais do projeto, e após a votação irá ao Plenário. O governo, por meio de seus interlocutores, expressa otimismo, dizendo que a reforma na legislação trabalhista passará positivamente pela CCJ, devendo também ser vitoriosa no plenário do Senado. A conferir. Termômetro da crise Depois de atingir o estado febril de 42º C, a crise aliviou sua intensidade, nos últimos dias, chegando aos 40º. A febre ainda é alta, mas não a ponto de deixar em coma o corpo governamental. A entrevista de Joesley Batista à revista Época está sendo considerada bumerangue, ou seja, voltando-se contra o entrevistado. Sem fatos novos, o homem das carnes caprichou nos adjetivos. E a capa escandalosa de Época permitiu que os leitores chegassem à essa análise: "como um sujeito que confessa uma infinidade de crimes e ter colocado no saco de seus recursos quase dois mil políticos se apresenta-se como inocente, ganhando benesses do procurador-Geral da República?" Exageros jornalísticos É evidente que é de interesse da mídia obter entrevistas exclusivas, principalmente quando se trata de personagens polêmicas que estão no foco dos principais assuntos nacionais. Mas todo cuidado deve ser tomado para evitar excessos. Dizer que o presidente é o quadrilheiro mais perigoso do país é dizer que qualquer grande criminoso já condenado e preso é menos pernicioso. Adjetivação exagerada e superlativos não podem ser usados e abusados pela mídia. Onde estão os limites? Esse tipo jornalismo pode alargar a temporada de irresponsabilidades: acusações baseadas em suposições, frenético jogo acusatório, uso da mídia como arma de combate, etc. Chico Heráclio Chico Heráclio (1885-1974), o poderoso dono do poder nas plagas de Limoeiro/PE, sabia como ninguém interpretar o ânimo dos eleitores. Dominava o voto de cabresto no agreste pernambucano e vizinhanças. Mas não conseguia encher as urnas na capital. Indagado sobre o motivo, a raposa política saiu-se com esta: "o eleitor do Recife é muito a favor do contra". Pois bem, a máxima do último dos coronéis, como era designado, serve para explicar a disposição do eleitorado brasileiro das grandes cidades, no ciclo eleitoral em curso, que deixa ver um cidadão "muito a favor do voto contrário". O rol de qualificações deste eleitor é extenso: indignado, revoltado, saturado, descrente, desesperançoso, cansado. Esse deverá ser o perfil do eleitor em 2018. Kramer alerta Paulo Kramer, o preparado cientista político, faz um alerta a partir de Brasília. Diz ele: "os analistas políticos e econômicos entraram em pânico, provocando um início de incêndio no mercado e na bolsa. Acho que é cedo demais para 'cantar derrota'". Kramer tem razão. Até porque o plenário do Senado, que é soberano, pode vir a aprovar a reforma trabalhista. Em minha régua, a chance de 0 a 10 é de 9. Altos e baixos O fato é que a imagem de um disputado jogo de basquete cai bem na moldura institucional. As oposições ao governo - a partir de protagonistas do MP, PF e Poder Judiciário - fazem cestas, passando à ofensiva, liderando o placar; aí o presidente Michel Temer, de maneira surpreendente, consegue reagir ao jogo, corre em campo e ultrapassa o escore dos adversários. Conta com bons jogadores na esfera parlamentar. Os opositores se valem do bombardeio midiático, liderado pelo grupo de comunicação mais poderoso do país. Avançam. O placar, hoje, situa o presidente com alguns pontos à frente. A derrota da reforma trabalhista na CAS anima os grupos oposicionistas. Mas há ainda muito jogo pela frente. Altos e baixos permeiam a dinâmica das estratégias. Posição do sistema Globo O sistema Globo - Tvs e jornal - tomou posição contra o presidente Michel Temer. A decisão foi estampada em editorial do jornal. E quando uma posição dessa importância ocorre - e de maneira escancarada - o grupo certamente quer fazer valer seu ponto de vista. Daí o bombardeio sobre a figura presidencial. Inferência: o grupo esperava pela renúncia de Michel Temer desde a primeira estocada. Como não ocorreu, a Globo teria decidido intensificar a artilharia. A estratégia para derrubar o presidente acabou na boca de núcleos, como formadores de opinião, profissionais liberais, redes sociais. Um libelo acusatório contra o sistema Globo emerge, ensejando estupor, indignação e protestos. Homologação Hoje, quarta, o STF deverá decidir sobre a validade da delação da JBS. Tudo indica que aprovará a homologação feita pelo ministro Edson Fachin. Afinal uma decisão em contrário deixaria o ministro em maus lençóis. O Supremo julgará recurso do governador de Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja (PSDB), que questiona competência de Fachin para relatar o caso JBS, pois esta investigação não se relacionaria com o caso Petrobras (Lava Jato). Elos e imbricações Os elos se formam: a fortaleza do governo depende da esfera política, a qual, por sua vez, está de olho na recuperação da economia. Os dados positivos da economia e a perspectiva de crescimento do PIB são as vitaminas que animam a classe política e, por conseguinte, integram a base de sustentação do governo. Essa é abordagem exógena. Mas há imbricações internas, endógenas, que funcionam como ameaça ou apoio. Por exemplo: as divisões que existem no interior das bancadas governistas - a partir do PSDB - também funcionam como termômetro da crise. Os "cabeças pretas" do tucanato (os mais jovens) querem deixar o governo; os "cabeças brancas" (os mais velhos) acenam com a permanência. Colar todos esses cacos do vaso governamental tem sido tarefa hercúlea do presidente. Denúncia do Janot Janot deve entrar na próxima semana com mais uma denúncia contra o presidente Michel Temer. E pedirá ao STF investigação para apurar os fatos que deverão ancorar a denúncia. Mas o presidente só pode ser investigado por autorização da Câmara Federal e pelo quorum de 2/3 dos votos: 308. Rodrigo Janot quer ter seu nome na história como o homem que derrubou Michel Temer. Se não houver fato novo, não conseguirá o intento. Coisas encobertas Há muita coisa a ser esclarecida sobre fatos e versões que correm na farta mesa das grandes interrogações: afinal, o ministro Edson Fachin encontrou-se ou não com Joesley Batista em jantar que teria se prolongado pela madrugada? O senador Renan esteve ou não nesse jantar? Por que Rodrigo Janot tem tantos desafetos na PGR e qual é seu desempenho no processo de sua sucessão? Os diálogos gravados entre procuradores o comprometem ou não? Por que Fachin avocou a si a relatoria do caso JBS, ante a versão de que teria sido ajudado pelo grupo em sua campanha para se tornar ministro do Supremo? Caixa dois É muito provável que os casos de políticos implicados no caixa 2 de campanha eleitoral sejam suspensos. O próprio procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, patrocina esta tese. Centenas de políticos, portanto, se veriam livres de processos nessa esfera. Lição de Maquiavel Lafaiete Coutinho, ex-presidente do BB, envia oportuno lembrete: "Para Maquiavel, a empreitada de impor grandes inovações é tão arriscada para os governantes que se eles dependerem da persuasão - não usando a força - fracassarão sempre sem conseguir coisa alguma. As reformas estruturais e a implantação de uma economia de mercado que Collor procurou realizar o tornaram bastante vulnerável. Como ensinava Maquiavel, ele empregou contra si as forças que se beneficiavam da situação anterior e o ceticismo dos que seriam beneficiados por sua reforma, que somente iriam aderir com o sucesso a ser obtido ao final". Fecho a coluna com causos contados por Saulo Pessanha, em seu Anedotário Político. Quatrocentão O paulista Toledo Piza estava lançando uma expressão que se tornaria famosa quando, com empáfia, disse: - Considero-me um paulista quatrocentão e um brasileiro autêntico, pois meus ancestrais, que aqui chegaram em 1.500, construíram São Paulo. Osvaldo Aranha retrucou em cima: - Pois os meus ancestrais, quando os seus chegaram, perguntaram: o que é que esses estrangeiros vieram fazer aqui? Propaganda Falava com um grupo de diplomatas argentinos, quando um deles lhe perguntou por que os brasileiros tinham fama, na Argentina, de gostar de homem, dando preferência aos parceiros do que às próprias mulheres. Osvaldo Aranha respondeu na lata: - Isso é apenas propaganda nossa, para incentivar o turismo que vem do Rio da Prata...
quarta-feira, 14 de junho de 2017

Porandubas nº 534

Abro a coluna com duas historinhas da região de Campos, Rio de Janeiro, da lavra de Saulo Pessanha. Mãos limpas O comício de Rockfeller de Lima era um dos últimos da campanha de 1970, e foi realizado ao lado da Catedral Diocesana, no final da tarde, para aproveitar a saída das pessoas do comércio. O candidato da Arena dava um tom de moralidade à sua fala. - A prefeitura de Campos precisa de um político de mãos limpas e eu sou um político de mãos limpas! Na plateia, alguém gritou: - Você tem mãos limpas porque não mexe com graxa, como eu... Minuto de silêncio Comício do deputado Paulo Feijó, em São Fidélis, nas eleições de 1998. O prefeito Benedito Passarinho pede um minuto de silencio pelo falecimento de uma diretora da sociedade Pestalozzi. Todos se calam. Segundos depois, para espanto geral, Passarinho retoma a palavra. - Vamos ao comício, minha gente! Um minuto de silêncio para políticos em campanha não pode durar mais que cinco segundos... A política como ela é Na política, quase tudo é possível. O quase fica por conta da tese de que a única coisa que um político não faz é lutar contra si mesmo, é suicidar-se. Mesmo essa situação está sujeita a discordâncias. O fato é que, no geral, os protagonistas da política almejam o poder. E fazem tudo (ou quase tudo) para alcançá-lo. Vejam a contradição que flagra os tucanos. O PSDB, anteontem, decidiu permanecer no governo. Mas o presidente interino do partido analisa com o deputado Carlos Sampaio/SP como o partido deve fazer para recorrer da decisão do TSE que decidiu por 4 a 3 pela permanência do presidente Michel Temer na cadeira do Palácio do Planalto. Não é mesmo um contrassenso? O enrosco I O caso é desconfortável. Recordemos. O PSDB recorreu ao TSE sob a alegação de que teria havido abuso econômico por parte da chapa Dilma-Temer em 2014. O TSE absolveu a chapa. Mas o partido, depois de votar pela permanência de seus filiados na base governista, promete recorrer da sentença do TSE. Em suma, o partido quer assoviar e chupar cana ao mesmo tempo. Um exercício complicado. O enrosco II Tasso explica: "É uma incoerência nossa, mas uma incoerência que a História nos colocou. Esse não é o meu governo. Não é o governo dos meus sonhos, não votei em Dilma nem em Temer, mas estamos aí por causa das circunstâncias, mas não vamos fazer nada que rasgue um pedacinho da Constituição... Minha opinião é que tem que recorrer. Continuamos no governo Temer, mas sem renunciar a nossas convicções, que houve corrupção na campanha da chapa". Essa vela a Deus e outra ao diabo é um exercício de prestidigitação. WhatsApp no cordel E até uma velhinhaMais pra lá do que pra cáDisse que é muito nova Ainda não tá gagáE namora pelo WhatsAppE nem canseira lhe dá. Uma noiva tão bonitaNa hora de ser casadaNa hora de dizer o "SIM"Ficou muito perturbadaPorque o WhatsApp tocouFoi atender a chamada. Decisão do TSE I Há uma onda expressiva contra a decisão do TSE. Não se leva em conta no furor que parte de alguns setores - particularmente dos atiradores da oposição - a natureza daquele Tribunal. Trata-se de um colegiado que deve analisar os pleitos eleitorais e não um tribunal penal. À propósito, pinço essas observações de César Maia, arguto observador da cena política. Decisão do TSE II Diz o ex-prefeito do Rio: "Num momento, o relator do caso, ministro Herman Benjamin, reconhece que "o bem jurídico que tutela essas ações (eleitorais) é a legitimidade e a normalidade do processo eleitoral, cuja lisura é elemento indispensável à concretização do valor democrático no regime político brasileiro. (...) Ninguém sai preso daqui, nem com condenação penal". Depois, no entanto, sem qualquer constrangimento, o relator discorre sobre os fatos da ação como se estivesse num tribunal penal e o seu papel fosse condenar criminalmente os réus. A função do TSE é zelar pela lisura do processo eleitoral, avaliando se houve cumprimento do livre exercício do direito de votar e ser votado". Decisão do TSE III E arremata: "Atuar fora da esfera eleitoral é abusivo, já que extrapolaria os limites de competência da Corte. A rigor, passaria a ser um tribunal de exceção. Por isso, ainda que se faça um bonito discurso sobre a importância de a Justiça não ser conivente com a impunidade, a tentativa de levar o TSE para um julgamento além da esfera eleitoral desrespeita o Estado Democrático de Direito e a Constituição". Nordeste violento A escalada de violência aflige as populações, principalmente a nordestina. A região abriga as cidades mais violentas do país. Dos 150 municípios com as maiores taxas de homicídio por arma de fogo no Brasil, 107 (pasmem!) ficam no Nordeste, registrando-se, ainda, que no ranking das capitais, as seis primeiras mais violentas estão na região. Bolsonaro, a aspiração Seguramente este é um dos fatores que contribui para o fortalecimento do nome do deputado carioca Jair Bolsonaro na mente das comunidades. Bolsonaro é a extensão do território da direita conservadora, com suas posições clássicas: bandido bom é bandido morto; a sociedade tem direito ao uso de armas para se defender, etc. Pois bem, semana passada, Bolsonaro foi ovacionado em Natal, Rio Grande do Norte. Uma multidão o aguardava no aeroporto. Mudou-se três vezes a sede para sua palestra por excesso de participantes. "Eu sou ladrão" Nessa esteira de combate à violência com mais violência registra-se o caso do garoto acusado de roubar uma bicicleta de um deficiente físico em São Bernardo do Campo. Tatuaram em sua testa a frase: "eu sou ladrão e vacilão". O pior é que a tatuagem bombou nas redes sociais, recebendo aplausos de muita gente e abrindo intensa polêmica. De um lado, os que condenam a ação dos tatuadores, com o argumento de que impede a ressocialização do garoto (menor). De outro, em face da descrença na segurança pública, estão aqueles que querem fazer Justiça com as próprias mãos. Fora da lista negra O Brasil ficou de fora da lista negra da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que reúne 25 países suspeitos de infringir normas internacionais de proteção ao trabalhador, divulgada no início de junho. Pouco tempo antes da publicação da lista, o deputado Federal Rogério Marinho (PSDB-RN) foi convidado pela chancelaria brasileira da OIT a visitar a sede, em Genebra. Motivo? Como relator da reforma trabalhista, Marinho esclareceu a proposta de modernização em curso no Senado e garantiu que "nenhum direito conquistado pelo trabalhador está em risco". Centrais sindicais, Ministério Público do Trabalho e a Anamatra acusaram o Brasil de quebrar acordo internacional na OIT. Marinho desfez o "equívoco". Reforma trabalhista Passará pelas Comissões de Assuntos Sociais e de Constituição e Justiça. A seguir, irá à Plenário. Na visão deste consultor, será aprovada. Quanto a eventuais vetos, sugeridos pelo relator da matéria no Senado, senador Ricardo Ferraço, serão analisados pela Casa Civil, mas com o termômetro ligado na temperatura da Câmara. Um ponto polêmico diz respeito à manutenção da contribuição sindical compulsória. Pode haver consenso na direção de manutenção provisória, estabelecendo-se um prazo (3 a 5 anos) para ser extinta. A estratégia de Janot Rodrigo Janot quer deixar seu nome na história como o procurador que afastou o presidente da República de seu cargo. É o que se deduz de sua insistência em bombardear o dirigente maior da República. Ele sairá em setembro e luta contra o relógio para dar mais um bote: denunciar o presidente no STF pedindo investigação sobre ele. O Supremo, por sua vez, fará solicitação à Câmara. Onde o governo conta com maioria para evitar a investigação. Por que tanto açodamento por parte de Janot? Vanitas vanitatum, omnia vanitas, diziam os antigos. (Vaidade das vaidades, tudo é vaidade). Tuba de ressonância Este analista de política continua perplexo com o bombardeio midiático com mira sobre a figura do presidente da República. Jornalistas não devem vestir a toga de juízes. Concessões do Estado, como emissoras de rádio e TV, deveriam se pautar pela imparcialidade. Procuradores deveriam evitar o açodamento. Juízes não podem judicializar a política. Os Poderes precisam se inspirar nos conceitos que servem de lume à tríade de Poder, arquitetada pelo barão de Montesquieu: Independência, Autonomia e Harmonia. Reforma política Pelo menos dois instrumentos precisam ser submetidos à decisão do Congresso antes de outubro próximo: a cláusula de barreira e a proibição de coligações proporcionais. Não podemos continuar a manter partidos sem votos e um sistema de votação em que o eleitor escolhe um candidato e acaba elegendo outro, na esteira dos coeficientes eleitorais obtidos nas coligações. WhatsApp no cordel II Até o primo BelizardoEstá no WhatsApp ligadoDe tanto mandar mensagensE ficar tão viciadoQuando vai botar sapatoColoca no pé trocado. O WhatsApp é poderosoSó quando ele é bem usadoÉ um aliado forteIsso tudo foi provadoNão é para ser "brinquedo"Deixar alguém viciado. Fechando a coluna com historinha de japonês: "O jovem pai vai ao pediatra e, bastante aflito, mostra sua criança: - Doutor, meu filho já está com seis meses e não abre os olhos. O médico examinou a criança e virou-se para o pai: - Quem deve abrir os olhos é o senhor, meu amigo, pois esse é filho de japonês.
quarta-feira, 7 de junho de 2017

Porandubas nº 533

Abro a coluna com muita preocupação com o amanhã. A propósito, uma historinha que cai bem. Perspectivas e características Quais as perspectivas que se apresentam ao Brasil em um contexto de crise? Sairemos da crise logo? As reformas passarão? Confesso que temos na frente um oceano e interrogações. Mas uma historinha do amigo Sebastião Nery sobre as perspectivas pode ajudar a responder: Luís Pereira, pintor de parede, dormiu com 200 votos e acordou como deputado Federal. Era suplente de Francisco Julião, líder das Ligas Camponesas, em Pernambuco, cassado pela ditadura. Disseram a ele: prepare umas palavras bonitas para dizer à imprensa. Escolheu alguns termos que gravou bem na cachola. Chegou a Brasília de roupa nova e coração vibrando de alegria. Murilo Melo Filho, colunista da Revista Manchete, logo no aeroporto, jogou a pergunta abrupta: - Deputado, como vê a situação? Nervoso, surpreso, sem saber o que dizer, tascou as duas que considerou as mais apropriadas para os jornalistas: - As perspectivas são piores do que as características. Pois é, a esta altura, tem muito Luís Pereira perorando por aí... Clima geral O clima é de muita expectativa. O Brasil parece assistir a um espetáculo com finais surpreendentes. Há uma imensa torcida pelo expurgo do presidente da República. Há uma grande parcela que torce para o presidente permanecer em seu assento no Palácio do Planalto. E há uma banda que joga um olho para o norte e o outro para o sul. Formação de bandas A primeira banda é composta particularmente pelas oposições, PT, PSOL e centrais sindicais à frente, e, incrível, por boa fatia da mídia. A segunda banda é composta pelos setores produtivos, razoáveis alas de profissionais liberais e parcela de formadores de opinião. O núcleo que divide o olhar é composto por políticos, muitos a favor do presidente, uma parte já desatrelada da base governista e um terceiro grupo em compasso de espera. Analisemos cada uma. Oposições O PT e outros partidos de oposição querem ver Michel Temer fora do Planalto. Mas carregam imensa preocupação. Seu líder maior, Lula da Silva, complica-se, a cada dia, com denúncias contra ele avolumadas, o que o torna muito próximo da República de Curitiba. A recém-eleita presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann, também está implicada na operação Lava Jato. O afundamento do PT não o qualifica como protagonista da ética e da moral. Os grupos sindicais, por sua vez, se posicionam contra o governo por distinguir nele o rolo compressor das reformas. E, como se sabe, o que as centrais querem mesmo é defender as contribuições compulsórias que abarrotam seus cofres. Mídia As oposições contam com o escancarado apoio de parcela importante da mídia, caracterizada por coberturas enviesadas dos veículos do Grupo Globo: TVs, jornal e seus canais eletrônicos nas redes. Aliás, o viés que se percebe na cobertura da crise por parte dos profissionais - repórteres e analistas da Rede Globo - é o mais forte e intenso que se viu na contemporaneidade, ultrapassando, até, a afamada cobertura enviesada do debate Collor X Lula em 1989. Globo I - viés Recordando os dias de ontem. O ex-chefão da Globo, Boni, chegou a admitir: "Colocamos as pastas todas ali com supostas denúncias contra Lula, mas estavam vazias". Pois bem, a cobertura diária da crise toma longos minutos da TV Globo, com repetições do áudio da conversa que Joesley Batista gravou com o presidente Temer. Os comentaristas da Globo News, principalmente no Jornal das 10, emendam o que disseram na noite anterior. O lengalenga não contém fatos novos. É visível o esforço de um ou outro para buscar um ângulo novo, algo que traduza nova situação. O repeteco tornou-se um caso de linguagem tatibitate. Por que a Globo enviesa o noticiário? Globo II - aposta na saída Lauro Jardim foi quem deu o furo, quando vazou parte do conteúdo da gravação. No dia seguinte, percebeu-se que o jacaré havia se transformado em lagartixa: a ajuda financeira ao ex-deputado Eduardo Cunha para se manter calado não foi a grande nota como o Globo anunciava. Nesse trecho, o gravador de Joesley dizia: "Eu tô de bem com o Eduardo". Ao que o presidente retrucou: "tem que manter isso, viu?". Ora, para manter a ideia inicial, o sistema Globo teria optado por manter a denúncia que assumiu, "comprando" as denúncias feitas pelo PGR. É o que explica o viés continuado do noticiário. O jornal O Globo chegou, até, a produzir um editorial, pregando a saída do presidente, antecipando-se à decisão da Justiça. Aliás, a Folha de S.Paulo também fez um editorial na mesma direção. Globo III - furo, acomodação, repetição O furo continua a ser o alvo da mídia. A notícia dada em primeira mão tem um tremendo impacto. Pois bem, pelo tom global, os últimos 15 dias foram dados como fatais. O presidente não resistiria um minuto a mais. Se continua resistindo e, assim, contrariando o noticiário, o tom do dia seguinte se torna ainda mais agudo. Nas entrelinhas ou entreouvidos, as palavras até poderiam ser essas: "não é possível que esteja resistindo; vou dar mais uma porrada, vamos ver se ele resiste a essa". Por outro lado, é visível a acomodação, a ausência de apuração de dados, o que transforma o oba-oba dos comentaristas em algo insosso, inodoro e incolor. Discurso da mesmice. A fúria Comentaristas de outras emissoras também peroram com muita fúria. Cometem a síndrome do touro: pensam com o coração e arremetem com a cabeça, quando deveriam fazer o contrário. Afinal, a cachola serve ao ser pensante. Onde está a racionalidade, a lógica? Interessante é observar que ninguém quer dar a mão à palmatória. Há semanas, a grande maioria dos analistas dava como certa a derrota de Michel Temer no TSE. Agora que começa o julgamento naquela Corte, os mesmos que tinham tirado a fatura da derrota reconhecem (sem pejo) que o presidente poderá obter vitória naquela Corte. Achismo O fato é que a maior parte dos analistas políticos trabalha à base do "achismo", mescla de vaidades, donos da verdade, excesso de confiança em seus sentimentos. Onde estão os grandes intérpretes da política e dos costumes? Foram embora. Não há mais figuras do porte de um Carlos Castelo Branco ou de um Vilas Boas Correa. O que vemos é um desfile de trôpegos da análise, caolhos da verdade, gagos de densidade expressiva. Loteria Mais parece que analistas e comentaristas (observo que ainda há também sérios e honestos) apostaram na loteria da queda de Michel Temer e querem ganhar de qualquer maneira. Há muita curiosidade para vermos como se comportarão alguns "mestres" da análise política caso o presidente suba a montanha e chegue ao final do governo. O que dirão? Atribuirão o fato à ineficiência do Judiciário? Podemos, por outro lado, adivinhar o que fatalmente dirão se o presidente cair: "bem que eu disse, bem que nós antecipamos, vejam só quanto estávamos certos". Setores produtivos Já os setores produtivos estão alinhados ao governo na defesa das reformas, a partir das já realizadas - teto do gasto, na área da educação, na lei da terceirização - e as reformas trabalhista e previdenciária em curso. A marca do governo Temer é o reformismo. Evidentemente, os sinais de mudanças na estrutura do Estado entusiasmam empreendedores e investidores, que vêem o Brasil sair da maior recessão econômica de todos os tempos e abrir novos horizontes, com queda de juros e rígido controle inflacionário. Profissionais liberais, que têm pensamento de vanguarda, identificam-se com tais posições, enxergando no PT e em seus governantes os culpados pelo buraco do qual procura sair o país. Os políticos Quanto aos políticos, o que precisamos observar é o pragmatismo que os inspira. O fato de usarem os dois olhos para enxergar para onde irá a balança quer dizer que pensam, sobretudo, em sua salvação. Apostam no futuro. Se perceberem que a tendência será a de continuidade na gestão, penderão para o lado do governo. A recíproca é verdadeira. E mais: se atentarem para o fato de que Lula, mesmo encarnando o papel de demônio, terá condições de ser candidato em 2018, abrirão para ele os braços. Claro, há grupos que manterão distância do petismo. Vídeo por demanda Um estudo feito pela Nielsen em 60 países mostra que quase 2/3 dos entrevistados assistem a alguma forma de programação de vídeo on demand (VOD), esse sistema que permite ao usuário selecionar filmes e seriados de forma interativa, uma espécie de locadora virtual. Esse hábito de consumo se expande no mundo. 43% das pessoas entrevistadas dizem fazer isso pelo menos uma vez por dia, enquanto na AL, 24% dos assinantes de TV paga afirmam que planejam cancelar seu serviço a favor de um provedor somente online. Mas poucos realmente cancelam seu serviço. As TVs por assinatura ainda têm seu espaço econômico e função social. Brasil analisa Agora, vejamos as implicações por nossas plagas. Lembremos que a AT&T firmou acordo para adquirir a Time Warner por US$ 85,4 bilhões. O que explica isso? Mudanças que ocorrem na produção e distribuição de conteúdo em todo o mundo. No Brasil, esse processo de fusão está em análise no Brasil pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e também nos Estados Unidos. Já foi aprovado em todos os outros mercados internacionais em que as empresas atuam. Ancine é contra A Agência Nacional do Cinema (Ancine) se posicionou contra o negócio, enquanto a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) espera decisão do Cade sobre a fusão AT&T/TW para analisar questões regulatórias. Se o Cade impedir a fusão, a AT&T precisará tomar a decisão de Sofia: vender a Sky ou abrir mão da operação dos canais do Grupo Time Warner no Brasil. O que será pernicioso para o consumidor, pois isso significa retirá-lo da grade de todas as operadoras de TV por assinatura. A saída para os fãs de HBO, Cartoon Network e CNN, entre outros canais, será recorrer ao conteúdo online. Migração para internet A consequência se dará na migração rápida de assinantes de TV paga para a internet, uma vez que os espectadores continuarão consumindo seus conteúdos preferidos, legal ou ilegalmente. O mercado de TV por assinatura corre risco.
quarta-feira, 31 de maio de 2017

Porandubas nº 532

Abro a coluna com um causo, uma historinha dos tempos de chumbo. D'água! D'água! Newton Coumbre, pernambucano atrevido, passava em frente ao quartel de Obuzes de Olinda, logo depois do golpe de 64, levando uma bomba d'água enrolada em jornal. Dois sentinelas, fuzis em punho, avançaram sobre ele, aos tapas e pontapés: - O que é isso? - D'água! D'água! Mandaram jogar o embrulho no chão e levaram-no até o coronel: - O que é que tem no embrulho? - Uma bomba d'água. - Por que não disse logo e ficou dizendo "d'água"? - Coronel, eu dizendo só "d'água" eles me bateram tanto, se dissesse "bomba" teriam me fuzilado. Posse do João João Almino tomará posse na Academia Brasileira de Letras dia 28 de julho próximo. O mossoroense (Mossoró/RN) é primo deste analista político. João será recebido pela acadêmica Ana Maria Machado. Duas vertentes A análise da crise política ganha dos analistas e cientistas políticos duas vertentes: a vertente legal, ancorada no eixo constitucional. Por essa via, tudo o que vier a ser feito deve seguir o trâmite estabelecido pelo livrinho: a CF. Em caso de vacância da presidência, um grupo defende a realização de eleições diretas, que é um rompimento da Carta. Outros chegam a apontar a manifestação ocorrida no Rio de Janeiro, pífia para traduzir a vontade das massas. A via ilegal Uma eleição direta demanda tempo, muito tempo. E para aprovar uma Proposta de Emenda Constitucional abrindo a possibilidade de eleição direta, o quorum é de 308 votos na Câmara, uma impossibilidade nesse momento. Não há condição de ser dar um jeitinho brasileiro. Mais uma vez, as vivandeiras de ocasião aproveitam para traçar os cenários de mais turbulência. Que a lei seja cumprida Está havendo açodamento. Muito açodamento. Muita gente posando de adivinho. Temos leis, Cortes Superiores que estão investigando e vão tomar decisões sobre as denúncias que agitam a República, temos um Congresso que também está funcionando e muita atenção da sociedade sobre os fatos. Portanto, o bom senso aconselha a aguardar o ritmo e os fluxos dos processos em curso. No TSE, abre-se, dia 6 de junho, o processo de cassação da chapa Dilma-Temer com muita especulação sobre rumos a seguir. STF tende a julgar o acordo Já no STF, a tendência será a de o Pleno receber o caso para decidir, ou seja, o acordo de delação pode sair das mãos do ministro Fachin e chegar ao Plenário. A interpretação do ministro Gilmar Mendes vai nessa linha. Ele diz que o juiz deve homologar o acordo. Juiz, nesse caso, não é uma pessoa, individualmente, mas o corpo da Corte. Essa tese pode vingar e já contaria com o apoio tácito do próprio ministro Edson Fachin. Fachin toparia O ministro Fachin tem sido objeto de críticas por ter se valido da ajuda do lobista e delator Ricardo Saud. Foi este que o levou ao gabinete de alguns senadores, quando teve de fazer esse périplo pedindo votos para sua aprovação para entrar no Supremo. O ministro teria ficado envergonhado, diz-se. E que não sabia das peripécias malandras do grupo JBS. Como Fachin, muitos dirão que também não sabiam das irregularidades cometidas pelo grupo. O fato é que a JBS deu ajuda a quase dois mil políticos. STF desaprova Se o caso for ao Pleno e se este decidir não aprovar o acordo de delação premiada, as coisas voltam à estaca zero. Os irmãos Batista voltariam ao Brasil (Wesley, ao que parece, se encontra no país), seriam presos e passariam a responder a processos. Lembre-se que a CVM acaba de abrir processos contra eles pelo fato de terem se aproveitado do momento para ganhar dinheiro: teriam comprado um bilhão de dólares e vendido cerca de R$ 370 milhões de ações. Usando, assim, o recurso do inside information. Consciência social Ondas concêntricas, saindo do meio do lago, chegam até as margens sociais espraiando a consciência de que os irmãos Batista estariam livres, vivendo uma vida de luxo em Nova Iorque, depois de terem abocanhado bilhões do nosso BNDES. A ressonância que puxou essa onda até os confins acaba ajudando o presidente da República, a quem muitos começam a dizer que foi vítima de uma grande armação. Portanto, houve um crime perpetrado por Joesley, a gravação da maior autoridade do país. A combinação com a PGR e a homologação pelo ministro Fachin não podem excluir ou esquecer o delito ocorrido. Mas as provas continuam Também parece certo que se o STF decidir anular o acordo de delação, as provas não seriam descartadas. Poderia, isso sim, ser descartada a gravação, caso se comprove alguma adulteração da fita com edições, cortes, etc. O fato é que processo recomeçará do zero. Julgamento no TSE As coisas estão interconectadas. Vejamos: o TSE, há um mês, tendia a absolver Michel Temer, aceitando a tese de separação de contas entre a titular e o vice. O parecer é do jurista Ives Gandra Martins. Como se sabe, há precedentes. O ex-governador de Roraima, Ottomar Pinto, foi processado sob a alegação de ter usado caixa dois na campanha, etc. No meio do mandato, faleceu. O processo continuou com o vice José de Anchieta Junior. Este foi inocentado sob o argumento de que não teria tomado conhecimento das contas apresentadas por Ottomar. Anchieta foi empossado e governou até o último dia do mandato. De fora para dentro Os tribunais tomam suas decisões com base na interpretação das leis, na apresentação de provas e testemunhas. Quer dizer: o acervo técnico-jurídico é a bússola que orienta os juízes. Certo? Em termos. Sabemos que a decisão do juiz também leva em consideração inputs de natureza política, uma certa camada externa, que agrega fatores político-ambientais. Expliquemos: a melhoria da economia melhora o ânimo social e a estabilidade política do país tem a ver também com essa questão. Em suma, o Produto Nacional Bruto da Felicidade abre portas, facilita, influencia, comanda, dá o tom. Tese: o julgamento do TSE sobre a chapa Dilma-Temer tem um fio ligado à tomada da opinião pública. Anistia geral? Este consultor não aposta na tese por uns engendrada de anistiar ex-presidentes. Significaria um perdão geral? A manobra não será facilmente digerida. Pouquíssima probabilidade de avançar. Há que se explicar melhor essa linha de defesa. Serraglio recusa Osmar Serraglio recusa assumir o Ministério da Transparência. Mais um imbróglio se forma no entorno do governo. Porque a recusa implica perda de foro privilegiado para o então deputado Rodrigo Loures, suplente de Serraglio. Loures, sem foro, poderá aceitar fazer delação premiada. Teria coisas a dizer? Faria isso? Difíceis respostas. Rodrigo era bem próximo ao presidente. E o episódio da mala é um dos mais contundentes do caso JBS. Serraglio não teria sido consultado sobre a troca do Ministério com Torquato Jardim? Algo não confere. Quem no lugar? É possível que para o lugar de Serraglio, seja convidado o deputado João Arruda. Vamos acompanhar. JBS O Grupo JBS continuará sob bombardeio. Dizem que deve ao BNDES, ao Fundo de Garantia, a Fundos da Previdência, tem pendengas com acionistas minoritários, etc. E vai responder a processos na CVM. Difícil enxergar vida tranquila para seus donos. Unicameral ou bicameral? Se houver vacância do cargo de presidente, a eleição indireta, nos termos da CF, será pela Câmara e Senado, juntos ou separados? A lei é clara: será eleito aquele que tiver a maioria dos congressistas. Não pode ser uma votação separada nas duas casas. Desse modo, a Câmara poderia eleger, por exemplo, Rodrigo Maia, e o Senado, Tasso Jereissati. Um nome contra o outro. Seria o caos. Isso não ocorrerá em nenhuma hipótese. Mas se a Câmara tem 513 deputados e o Senado tem apenas 81 senadores, não seria algo discrepante? Sem dúvida. Mas é o que diz o livrinho, a Constituição. Fecho a coluna com a matreirice mineira Pronomes não têm importância Benedito Valadares chegou a Curvelo/MG para visitar a exposição de gado do município. Na hora do discurso, atrapalhou-se: - Quero dizer aos fazendeiros aqui reunidos que já determinei à Caixa Econômica e aos bancos do Estado a concessão de empréstimos agrícolas a prazos curtos e juros longos. Lá do povo, alguém corrigiu: - É o contrário, governador! Empréstimo a prazo longo e juro curto. - Desde que o dinheiro venha, os pronomes não têm importância.
quarta-feira, 24 de maio de 2017

Porandubas nº 531

Ganhando no verbo Nesses tempos de muito verbo de advogado, procurador e juiz, todos fazendo uma grande discussão sobre protagonistas e verbas, abro a coluna com a seguinte historinha. Cosme de Farias foi um grande advogado dos pobres da Bahia. Enveredou também pela política. Foi vereador e deputado estadual por muito tempo. E usava um bom verbo com sua verve. Vejam a historinha. Um ladrão entrou na igreja do Senhor do Bonfim e roubou as esmolas. Cosme de Farias foi para o júri: - Senhores jurados, não houve crime. Houve foi um milagre. Senhor do Bonfim, que não precisa de dinheiro, é que ficou com pena da miséria dele, com mulher e filhos em casa com fome e lhe deu o dinheiro, dizendo assim: - Meu filho, este dinheiro não é meu. Eu não preciso de dinheiro. Este dinheiro foi o povo que trouxe. É do povo com fome. Pode levar o dinheiro. E ele levou. Que crime ele cometeu? Se houve um criminoso, o criminoso é o Senhor do Bonfim, que distribuiu o dinheiro da igreja. Então vão buscá-lo agora lá e o ponham aqui no banco dos réus. E ainda tem mais. Senhor do Bonfim é Deus, não é? Deus pode tudo. Se ele não quisesse que o acusado levasse o dinheiro, tinha impedido. Se não impediu, é porque deixou. Se deixou, não há crime. Cosme de Farias ganhou no verbo. E o réu foi absolvido por ter surrupiado a verba da paróquia. O papel da imprensa Responsabilidade. Esse é o conceito que deveria inspirar a atuação da imprensa tanto no cotidiano quanto em momentos de alta tensão. É o que não se vê nesse instante de pico de crise. Grupos açodados assumem posicionamentos visivelmente enviesados. Dão como coisa certa e liquidada algo que está sendo apurado. Pegam partes de depoimentos, puxam as abordagens que lhe interessam e editam o texto de forma a conduzir a narrativa pela vereda escolhida, induzindo leitores, ouvintes e telespectadores. Não se espera a palavra final dos julgadores. Vieses Alguns veículos não apuram o fato de que o desvio de uma prova para o exterior - seja um documento, um gravador - , poderá desqualificar uma gravação. Não se medem as consequências de eventos. Tomam a decisão de estabelecer uma comunicação vertical, uníssona, homogênea, a ser seguida por seus núcleos de informação e interpretação. A imprensa brasileira vive também seu pico de crise. Só não vê quem está engajado nas trilhas unilaterais das mídias impressa e eletrônica. Não é à toa que as redes sociais avançam. A propósito, o editorial de ontem, do Estadão, A Responsabilidade da Imprensa é uma lição das mais preciosas nesses nossos tempos turbulentos. Horizontes nublados Quem disser que está vendo horizontes abertos, comete um exagero. Há nuvens plúmbeas no horizonte. Não se consegue distinguir se cairá uma sombra ou se o sol voltará a brilhar no entorno do Palácio do Planalto. Tudo vai depender da decisão do STF sobre a continuidade ou suspensão da investigação do presidente da República, a ser tomada depois de perícia da PF no gravador usado por Joesley Batista. Por isso mesmo, a análise da conjuntura, a que se dedica esta coluna, estará sujeita a erros ou a uma das duas hipóteses. Suspensão A suspensão da investigação propiciará um fluxo de oxigênio nos pulmões do governo. E esse fluxo tem como consequência: a) segurar por um tempo a base governista. Esse tempo, por sua vez, poderá estar condicionado aos passos do cronograma da crise; b) com a suspensão, é razoável supor que o governo deverá incrementar os esforços para levar adiante o programa de reformas, a da previdência na Câmara e a trabalhista no Senado; c) a retomada de fôlego também abrirá espaços para intensa negociação política já visando os horizontes de outubro de 2018. Continuidade Já a continuidade do inquérito aumentará a tensão, com previsível afastamento de parceiros partidários da base governista. Se isso ocorrer, será difícil para o presidente Michel Temer assegurar condições de governabilidade. Feridas Qual seja o desfecho da crise, a ampla e intensa negociação política se estenderá pelos próximos meses, sob um pano de fundo com as seguintes matizes: a) contundente debate interpartidário; b) largas feridas abertas pelas delações da Odebrecht e de Joesley, com foco no PGR, Rodrigo Janot, complexo empresarial dos Batista, Rede Globo e instância judiciária encarregada da Lava Jato. Discurso acirrado O acirramento do discurso político, nos últimos dias, exibe profunda cisão entre alas: 1) mercado/setores produtivos/parcela substantiva do PIB demonstram apoio ao governo, principalmente por vê-lo com garantidor do programa de reformas; 2) núcleos oposicionistas, ancorados por centrais sindicais, PT, PSOL, movimentos de esquerda e algumas entidades, defendem a queda do presidente e escolha de um novo comandante para conduzir o país ao pleito de 2018; 3) forte contingente de classes médias, mais tendente a apoiar o governo e exibindo forte rejeição ao lulismo-petismo, que dá sinais de querer ressuscitar Lula; 4) massas periféricas, principalmente da região Nordeste, que ainda guardam o nome de Lula em seu sistema cognitivo; 5) divisões e rachas em frentes de operadores de Direito, principalmente entre advogados e procuradores. Visões em confronto I Nas frentes do Direito e da Justiça, há profunda divisão de pontos de vista, a saber: a) intensa oposição e crítica ao posicionamento do PGR, Rodrigo Janot, a quem se acusa de pressa na solicitação do inquérito contra o presidente. Não poderia ter deixado escapar uma prova essencial ao caso que levanta no STF, o gravador usado por Joesley Batista em sua conversa com o presidente da República. O aparelho, aliás, está de volta ao país. Não poderia Janot ter deixado de avaliar a inteireza da gravação e seus aparelhos. Visões em confronto II Os elementos da gravação deveriam ter sido periciados pela Polícia Federal, que tem a estrutura mais competente e necessária para avaliar a qualidade de gravações e/ou efeitos artificiais nelas inseridos; b) crítica ao ministro Edson Fachin, do STF, que aceitou o pedido de Janot para investigar o presidente, quando deveria ter encaminhado tal solicitação ao plenário da Casa, levando em consideração a gravidade da decisão que iria tomar. Alega-se que tal operação deveria ter sido encaminhada a outro ministro do STF por não ter ligação direta com a Lava Jato; c) críticas de advogados ao comportamento do juiz Sérgio Moro, a quem faltaria a "imparcialidade" necessária para julgar indiciados da Lava Jato; d) divisão de pontos de vista entre ministros de Altas Cortes sobre o modus operandi de alguns de seus pares, denotando incerteza sobre o que virá. O luxo do funeral "O luxo do funeral e a suntuosidade do túmulo não melhoram as condições do morto; satisfazem apenas a vaidade dos vivos". (Dante Veoléci) Perguntas Por que o procurador-Geral da República foi tão apressado em solicitar a investigação sobre a conversa de Joesley com o presidente da República? Por que o ministro Fachin aceitou o acordo da delação em condições consideradas amenas e diferentes do acordo feito por Marcelo Odebrecht? Por que o Grupo Globo faz campanha "escancarada" para derrubar o presidente da República, o que se torna patente com os vieses e as abordagens negativas que seleciona do contencioso? Por que Rodrigo Janot aceitou fazer um acordo com um delator em condições diferentes do acordo feito com a Odebrecht? Regras não claras Há uma Torre de Babel circundando os ambientes institucionais. De repente, descobre-se que há falta de regras para definir rumos (eleição do presidente em caso de vacância, quem pode ser ou não candidato), há falta de uma linguagem homogênea de magistrados sobre determinadas situações e divergências profundas em torno de decisões dadas por juízes. Está ocorrendo anomia, nos termos usados por Fernando Henrique, o tucano-mor, ou ausência de clareza normativa? Vacância O presidente Michel Temer anuncia (em dois pronunciamentos) que não renunciará. O que parece denotar firmeza e convicção de que deve usar os meios a seu alcance para se defender das acusações, a partir de prevaricação - de que teria se omitido ante o depoimento de alguém confessando crimes. Sobram, então, duas alternativas: a) cassação da chapa Dilma-Temer pelo TSE, dia 6 de junho e b) impeachment pelo Congresso. Há uns 10 pedidos de impeachment já encaminhados. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, diz que não dará a eles encaminhamento. E a cassação pelo TSE? Se Rodrigo não colocar os pedidos em pauta, poderá haver recurso e, nesse caso, iriam a voto em plenário. É bem provável que não sejam aprovados, eis que o impeachment carece de votação qualificada (308 votos, no mínimo). Quanto à cassação da chapa pelo TSE, mais uma vez entra na balança o julgamento do STF. Se esta Corte decidir pela suspensão da investigação sobre o presidente, é razoável apostar na hipótese de absolvição, com a tese de separação de contas entre a titular Dilma e o vice Michel. A recíproca é verdadeira. As ruas E a movimentação de rua? São pequenas as possibilidades de agregação de multidões nas ruas pedindo o afastamento do presidente. Esses ajuntamentos continuarão a ocorrer, mas em pequena escala. Não se deve esquecer que os atores que mais se interessam e defendem esta estratégia foram envolvidos por Joesley Batista. Lula e Dilma teriam recebido R$ 150 milhões para a campanha e suas despesas. Na hora H, essa lembrança será acentuada. Mulheres na conversa? O Radar da Veja diz: "em pelo menos um dos trechos editados, a conversa entre Joesley Batista e Michel Temer girou sobre mulheres. O dono da JBS retirou essa parte para se proteger - e, não evidentemente, proteger a relação do presidente com Marcela Temer. Dos 50 minutos de gravação, 38 são conhecidos." A Veja deve ter mandado fazer perícia sobre o diálogo. É o que se infere. Benevolência Há quem acredite que, antes tantas críticas ao acordo benevolente conseguido pelos irmãos Batista, o acordo feito para sua delação pode ser revisto. Tudo pode mudar, acreditam juristas. E a PGR não terá outro caminho senão refazer os termos do acordo. As redes sociais ecoam críticas aos donos do grupo JBS. E clamam por punição mais severa a eles. Afastamento da base Os partidos da base governista vão esperar pela decisão do STF sobre o caso para tomar seu posicionamento: sair ou permanecer na base. A lógica se imporá. Se o STF decidir pela continuação do inquérito, deverão deixar o governo. Na recíproca, ficarão. Sem base, o governo verá estiolada sua condição de governabilidade. Leniência A força tarefa da operação Greenfield informa que as negociações para um eventual acordo de leniência entre o MPF e o Grupo J&F foi retomado. Como se sabe, o MP estipulava multa de mais de R$ 11 bilhões para fazer o acordo; o Grupo oferecia algo em torno de R$ 1 bilhão. Abriram-se novas negociações. Self information? Afinal, teria o grupo J&F operado no mercado financeiro para lucrar com os efeitos da delação premiada fechada por seus donos? O mercado trabalha com a informação de que teriam feito uma operação com compra de dólar (em torno de R$ 1 bilhão), enquanto teriam vendido o equivalente a R$ 327,4 milhões. Ganhar dinheiro assim é uma modalidade que o jurista Modesto Carvalhosa designa de self information. Contabilidade: programa de qualidade O Sescon-SP (Sindicato das Empresas de Contabilidade e Assessoramento no Estado de São Paulo) realiza nesta sexta, 26 de maio, a 12ª edição do evento para entrega da certificação PQEC - Programa de Qualidade de Empresas Contábeis, criado para incentivar a excelência das empresas de serviços contábeis. Nas palavras do presidente da entidade, Márcio Shimomoto, "neste ano de mudanças, superação e desafios, é uma grande satisfação celebrar as conquistas das empresas que contribuem e trabalham diariamente para o desenvolvimento do país". Este ano serão 474 empresas, sendo 103 certificadas também pelo ISO. O evento será no Citybank Hall, em São Paulo, com show do cantor Michel Teló.
quinta-feira, 18 de maio de 2017

Porandubas nº 530

!!! O país entra num gigantesco buraco negro! As revelações das gravações do Joesley Batista abrem horizontes de incertezas! Cenário de caos. Sustar as reformas nesse momento significará imenso retrocesso. Cuidado, apressadinhos Tem um montão de apressadinhos instalando barracas no terreno do pleito de 2018. Este consultor transmite um conselho: devagar com o andor. Cuidado para não colocarem o carro na frente dos bois. Entrem na reza dessa novena. Novena da paciência 1. Uma coisa por vez. Uma caminhada de 1.000 kms começa com um primeiro passo. 2. O tempo é quem dita as razões e baliza as decisões. 3. Peru não morre de véspera. 4. No Brasil de hoje, temos de contar com o Senhor Imponderável, que gosta de nos visitar. 5. A pressa é inimiga da boa decisão. Apressado come cru. 6. Nem sempre a menor distância entre dois pontos é uma reta como na geometria euclidiana. 7. É saudável viver o espírito do tempo, nunca antecipá-lo. 8. A cautela na política é um santo remédio contra sequelas e passos maiores que as pernas. 9. Os dois olhos devem estar muito abertos: um olhando para o norte, outro para o Sul! Amém! I - Mudanças no cenário: contra o status quo Este analista da política tem por hábito aplicar sua lupa sobre a dinâmica social, procurando traços e sinais que apontem na direção de mudanças. Pois bem, é interessante observar uma clara determinação dos maiores grupamentos da sociedade de mudar o status quo na esfera da política. Nessa tendência, integram-se as classes médias de grandes e médias cidades, que formam o maior polo mudancista do país, que agregam profissionais liberais, professores, funcionários públicos, os universos dos setores produtivos - indústria, comércio e serviços, proprietários rurais - e contingentes de jovens. II - Mudanças de cenário: polo conservador Uma parcela dos mudancistas - uma minoria - assume uma postura mais conservadora, juntando-se no entorno de perfis que encarnem o endurecimento de regras e costumes (defesa da família, contra o aborto, combate duro aos criminosos, contra união de pessoas do mesmo gênero, etc.). Bolsonaro aparece nesse pedestal. III - Mudanças de cenário: polo esquerdista Na outra ponta do arco ideológico, um núcleo de esquerda tende a se formar, com posições mais radicais do que as bandeiras históricas e tradicionais até então defendidas pelas esquerdas. A crise que solapa a imagem do petismo impulsiona grupos mais extremados, que tentarão se aproveitar da indignação social para expandir um ideário mais forte contra o liberalismo e seus eixos na economia, na política e nos costumes. IV- Mudanças: polo centrista Distanciando-se dos extremos, largos contingentes se abrigarão no meio da pirâmide social sob a sombra de bandeiras mudancistas, agora sustentadas por vigas com a marca de um social-liberalismo. As forças do mercado darão o tom da tuba de ressonância central, cuja pregação será a flexibilização nas relações do trabalho, a menor dimensão e o menor custo do Estado, com a defesa da meritocracia e a atenuação dos cargos políticos. As reformas na política e a no campo dos tributos continuarão a ser brandidas. Perfis que encarnem esse ideário serão prestigiados. V - Mudanças: democracia participativa Uma questão que permeia todos os grupos e setores é a participação da sociedade no sistema decisório. Identifica-se um movimento centrípeto - das margens para o centro - a denotar intenso interesse de classes sociais e categorias profissionais em participar, de forma mais ativa, do processo político. A democracia participativa, portanto, estará atingindo seu clímax, fenômeno que ensejará intensa mobilização de setores. A crise disparou mecanismos de animação política. A sociedade redescobre a força do voto. Sua capacidade de ditar os rumos políticos da Nação. Esse será um grande ganho, um dos frutos mais saudáveis da crise. VI - Mudanças: o regionalismo O processo político será banhado pelas águas do regionalismo. Essa tendência se alimenta do calor dos embates em torno da questão econômico-tributária. A distritalização do voto ganhará força. Dois cenários, então, se apresentam: a micro-democracia das comunidades organizadas e o poder regional. Colocando-se ambos na panela da pressão política, dá para se imaginar o caldo que tomaremos: disputa acirrada entre regiões, movimentos comunitários reivindicatórios, estiolamento das forças políticas tradicionais, entre outras consequências. A moldura é a ideal para abrigar o parlamentarismo. Não por acaso, o grupo parlamentarista do Congresso se fortalece. Lembrança Pequena lembrança aos apóstolos do marketing à moda antiga: "nenhum homem, por maior esforço que faça, pode acrescentar um palmo à sua altura", diz a Bíblia, e alterar o pequeno modelo que é o corpo humano. Mesmo que alguns ainda acreditem nas artimanhas de um marketing político dos velhos tempos. Palocci, a bola da vez? Todas as atenções se voltam para o todo ex-poderoso mago das Finanças do governo Lula: Antônio Palocci. Ele está em vias de fechar acordo de delação premiada. Mas há um habeas corpus em curso, que pede sua imediata soltura. Não teria mandado sustá-lo. Ou seja, conta com o julgamento do HC e com o fechamento do acordo de delação. O plenário do STF tende a soltá-lo, na esteira de suas últimas decisões. O que não aliviará a dor de cabeça de Palocci pois será julgado mais adiante. Já um acordo com os procuradores poderá ser mais satisfatório. Palocci, o braço direito Lula tinha em Palocci extrema confiança. A ele teria delegado a tarefa de arrumar recursos para as campanhas e operar o dia a dia dos recursos. Fala-se de uma conta de R$ 30 milhões disponibilizados pela Odebrecht para uso de Lula. E Palocci seria o único com autorização para operar tal conta. Palocci vai dizer algo, confirmar hipóteses que circulam? Difícil responder. O fato é que, nesse momento, o apelo familiar deve predominar sobre amizade com A, B ou C. Se for para aliviá-lo de uma pena longa, é mais provável que o ministro diga o que sabe. Ou parte do que sabe. Lula deve supor que o amigo não vá jogá-lo em maus lençóis. Mas se o silêncio significar condenação e o fogo do inferno? Reformas passarão Este consultor continua a acreditar que as reformas passarão no Congresso. O presidente Michel Temer tem feito extraordinário trabalho de articulação. A comunicação governamental melhorou. A consciência sobre a necessidade de aprovação das reformas se expande. Ou vai ou o país irá para o beleléu. A reforma trabalhista passará no Senado sem emendas. Nessa condição, não voltará à Câmara. Se houver ajustes, serão feitos por Medida Provisória. O fato é que demandas e observações feitas por senadores já são contempladas no substitutivo do deputado Rogério Marinho. Muitos não o leram. E pedem o que lá já está. P.S. Esta nota foi produzida antes da bomba atômica que cai sobre o governo. Hoje há muitas dúvidas. Santana e Mônica As delações de João Santana e Mônica Moura, sua mulher, devastam o que sobra na imagem dos ex-presidentes Lula e Dilma. Nota comum dos depoimentos: sabiam de tudo, de propina a caixa 2. E de contas no exterior. Com tantos detalhes, será difícil desfazer a narrativa dos marqueteiros. E essa ideia de bolar um e-mail com o nome Iolanda, nome da esposa falecida do marechal Costa e Silva, só contribui para causar mais polêmica ao estilo vingativo da ex-presidente. Bolsonaro É inimaginável situar o deputado Bolsonaro como forte candidato a presidência da República em 2018. Trata-se de um mero flagrante de um presente cheio de indignação contra os políticos. O pais está se tornando mais racional. E a racionalidade não combina com radicalismos, seja de direita, seja de esquerda. O caminho mais largo será o do centro. Pezão O apartamento do governador Pezão, no Rio, foi invadido. Deus do Céu. Quando a residência da mais alta autoridade de um Estado importante é invadida, o que mais esperar em matéria de segurança? Onde estamos, para onde vamos? Melhoria Os sinais começam a apontar para melhorias. As vendas no varejo aumentando. Juros caindo. Inflação diminuindo. Investidores dão mostras de que acreditam nas reformas. Mas a área do emprego ainda está complicada. Vai demorar mais um pouco até a curva do desemprego diminuir. O novo? Cuidado Fala-se por todos os lados que o novo será o perfil mais desejado e aclamado pelo eleitor. Urge ter cuidado. O novo não se restringe à idade. Diz respeito à postura, comportamento, atitudes. Há muito novo que está caindo de velhice mental. Novo é o compromissado com ideias avançadas, inovadoras, modernas. É aquele que vai à arena lutar contra os velhos costumes e padrões ultrapassados. Saturação Milhões de brasileiros estão saturados de velhas palavras e conceitos. O momento é de alerta. Como Zaratustra, o profeta de Nietzsche, precisamos de uma nova linguagem. Recolhido na montanha e à solidão de sua caverna, Zaratustra acordou, certa manhã, de um sonho, e ao se olhar no espelho trazido por um menino, deu um grito e seu coração ficou alvoroçado, quando constatou o que via: a cara feia e o riso escarninho do diabo. Decidiu agir. Sentia que sua doutrina corria perigo. Reconstruir tudo de novo O joio queria chamar-se trigo. Inimigos poderosos haviam desfigurado seu ideário. Decidiu partir para reconstruir tudo de novo. E correu a precipitar suas palavras para além dos vales, dizendo: "novos caminhos sigo, uma nova fala me empolga: cansei-me das velhas línguas. Não quer mais, o meu espírito, caminhar com solas gastas". (Friedrich W. Nietzsche in "Assim falou Zaratustra"). Arremessou seu dardo, sua palavra, contra os inimigos e valendo-se do apoio dos amigos, fez valer sua velha e selvagem sabedoria.
sexta-feira, 12 de maio de 2017

Porandubas nº 529

Abro a coluna com um "causo" contado por Zé Abelha nas Minas Gerais. Mudou de nome? Mariana, em Minas Gerais, já foi chamada de Roma brasileira. Terra de fé e de velhas igrejas. E cheia de placas com nomes engraçados nas ruas: - Cônego Amando - Armando Pinto Cônego Amando era conhecido pela verve. Um dia, viajando pelo interior do município, uma de suas acompanhantes caiu do cavalo. Rapidamente ficou em pé. Meio sem graça, perguntou ao Cônego: - O senhor viu a minha agilidade? - Minha filha, respondeu, eu até que vi. O que eu não sabia é que tinha mudado de nome. Um pouco maior Peço licença ao leitor por lhe apresentar uma coluna um pouco mais longa. Faço uma análise do depoimento de Lula, com projeções sobre o amanhã. Lula bate Moro? Vamos às hipóteses: Luiz Inácio conseguiu ser tão convincente que deixou o juiz Sérgio Moro no canto do ringue. Tem sentido essa hipótese? Não. Mas a torcida organizada de Lula acha que seu ídolo fez barba, cabelo e bigode. A verdade: o juiz teve a bola na mão e o apito na boca. Esteve sereno. Não se afobou. Conduziu tecnicamente o jogo. As delações de Léo Pinheiro e Renato Duque deram munição às perguntas. Mas o ex-presidente, como se sabe, é um mágico da prestidigitação com palavras. Saiu-se bem. Sem o rompante palanqueiro tão aguardado pela militância. Insistiu que o tríplex nunca foi dele e que nunca recebeu propina. Marisa, a falecida esposa, é quem tinha interesse naquele imóvel. Lula conhece a regra do martelo: bata, bata, bata no mesmo prego e ele acabará fixando-se na parede ou, se quiserem, na cachola das massas. Moro bate lula? O maior líder populista do país foi nocauteado? Também não. Mesmo sem disfarçar o nervosismo, tentou responder a algumas perguntas. Sobrou, mais uma vez, a expressão: não sei, não soube, não sabia. Tentou trazer o juiz para o campo político: "quando o senhor for candidato". Tentou puxar Moro para a intimidade do lar, ao sugerir que o filho não diz ao pai as notas baixas que tirou na Escola; nesse ponto, recebeu uma estocada. Moro garantiu que sabe das notas de seus filhos. Perguntas duras e diretas feitas pelo juiz Moro deixaram Lula nervoso, mas não a ponto de deixarem-no no canto do ringue. O juiz teve o comando do jogo. E pôde apitar toda vez que achou necessário, principalmente quando percebeu que o protagonista saía pelas tabelas ou pelas veredas do sofisma. Um jogo técnico Não houve mocinho nem herói. Viu-se um juiz técnico apurando respostas. Viu-se um Lula nervoso em alguns momentos, mas sob severo rigor da liturgia. Quando procurou escapar do clima solene, chamando procuradores de "você", foi advertido. Para ele, o tratamento foi retilíneo: ex-presidente. É evidente que, pela polarização entre a ala que apoia a Lava Jato e o grupo que escuda Lula, o jogo pode ter sido considerado empatado. Cada lado dirá que ganhou. Aplausos e apupos recíprocos. A mídia massiva dará o tônus do debate, puxando uma brasinha para um lado ou para outro. As redes sociais se dividiram em xingamentos e loas. Ao final do processo, a impressão é a de um Lula ainda muito vivo, porém, alquebrado. Resumo Um momento tenso foi o relato de Lula sobre o encontro com Renato Duque em um hangar em Congonhas. Afinal, por que um ex-presidente quis se encontrar com um ex-diretor da Petrobras? E mais: para saber se ele tinha depósitos em contas no exterior? Ademais, não era amigo dele, Duque. E por que usar João Vaccari, tesoureiro do PT, como intermediário desse encontro? Essas dúvidas certamente se farão presentes no juízo de Sérgio Moro. Atribuir a dona Marisa (que "odiava praia") o interesse pelo tríplex também não caiu bem. E mais: que ela queria fazer investimento com a aquisição do apartamento. As 50 mil pessoas anunciadas pelo PT, que iriam até Curitiba prestigiar o ex-presidente, se restringiram a umas 7 mil pessoas. A batalha campal não ocorreu. A certeza é a de que o caso seguirá seu curso naturalmente. O juiz Sérgio Moro deve aceitar a denúncia, abrir a fase de nova coleta de provas, ouvir mais testemunhas e proferir sua decisão. Que deve ocorrer entre junho e julho. Condenação ou absolvição? Essa é a pergunta recorrente sobre a possibilidade de Luiz Inácio poder ou não ser candidato em 2018. Primeiro, vale lembrar que o veto à eventual candidatura estará circunscrito a uma condenação em 2ª instância. O Tribunal Regional da 4ª região tem dado endosso às condenações proferidas pela 1ª instância do juiz Sérgio Moro. Se essa tendência se confirmar, Moro condenaria Lula e veria sua decisão corroborada pela instância acima. A partir daí, o processo entra no curso natural do Judiciário com os recursos cabíveis e prováveis nas instâncias superiores. Mas, do ponto de vista político, isso não significaria a morte política de Luiz Inácio. Vitimização O fato é que o declarado candidato à presidência da República, Luiz Inácio, já começou a lapidar seu perfil com a argamassa da vitimização. Essa é a carta no pacote discursivo que vai utilizar para se apresentar com sua candidatura de oposição ao pleito de 2018. É uma boa ideia? Não. Este consultor tem essa visão: é melhor para Lula a condição de comandante das oposições, em 2018, do que a de candidato. Por quê? Primeiro, deixaria de ser o alvo do bombardeio; segundo, apareceria em comícios por todo o território, lembrando os feitos de seu governo e levantando o véu da nostalgia. Assim, arregimentaria forças na direção de um candidato de oposição. Lula é um dos poucos quadros com capacidade de unir as oposições e unificar a linguagem. Sua capacidade de sensibilizar as massas - por via da mistificação - puxará para cima o tom emotivo de uma campanha oposicionista, com intensa mobilização da militância. Plantaria a semente de resgate do PT, podendo eleger uma bancada poderosa em 2018. Como candidato, volta a canalizar a polarização no país, com o "Nós e Eles". Dessa feita, o "Nós" (PT, Lula e oposições) tende a perder. Razão x emoção Luiz Inácio, candidato, perderia a condição de favorito. Principalmente levando-se em consideração a retomada do crescimento do país. Formar-se-á gigantesca onda, a partir do centro da pirâmide, cujos efeitos e impactos chegarão às margens. As classes médias, onde se abrigam poderosos núcleos de formação de opinião, a partir dos profissionais liberais, expandirá sua tuba de ressonância. As marolas expressivas impregnarão as correntes, que terão capacidade de furar os bloqueios emotivos das margens. Significa aduzir que Lula terá condições de resgatar seu PT, mas não de torná-lo vitorioso no ranking partidário. Sua força será suficiente para evitar a débâcle total do petismo. Em suma, o volume de racionalidade, a sair das fontes do meio da pirâmide, será superior aos tonéis de emoção que engolfarão as massas periféricas. São Paulo, a fonte principal A fonte principal que jogará a expressão na tuba de ressonância nacional será São Paulo. O mais forte Estado da Federação conta com cerca de 45 milhões de habitantes, ou 22% da população brasileira, 207 milhões. E sua população eleitoral é mais de 32 milhões. O bumbo que se bate em São Paulo é ouvido em todo o país. São Paulo agrega os maiores conjuntos de profissionais liberais, os maiores núcleos de trabalhadores, as maiores classes médias, as maiores densidades em todos os campos populacionais. Por isso, São Paulo terá importância estratégica no quadro eleitoral do país. Os novos Uma ligeira conversa com Murilo Hidalgo, do Instituto Paraná Pesquisas, arremete para algumas conclusões: 1. O perfil do novo ganhará ênfase nas próximas eleições. 2. Alguns nomes (novos e mesmo alguns madurões, porém mais assépticos) aparecem: Josué Gomes da Silva, filho do falecido ex-vice presidente da República, José de Alencar, pode ser um bom nome ao governo de Minas Gerais; no Rio, o senador Romário ou mesmo Bolsonaro, o pai, ao cair na real e constatar ser uma fria sua candidatura à presidência; João Doria em São Paulo, caso Geraldo Alckmin seja candidato à presidência. Ainda no Rio de Janeiro, Armínio Fraga e Bernardinho do vôlei; ACM Neto, na Bahia; Ratinho Junior, no Paraná ou mesmo Deltan Dallagnol; Rui Palmeira, em Alagoas; Paulo Câmara, Mendonça Filho ou Bruno Araújo em Pernambuco; e Hélder Barbalho no Pará. Dirceu solto A decisão do STF de mandar soltar José Dirceu, ex-todo poderoso manda-chuva do PT, traça uma linha divisória no sistema de prisões temporárias de longo prazo, tão bem acolhido pela primeira instância do Judiciário, sob o guarda-chuva protetor do Ministério Público. A 2ª turma do Supremo impôs limites ao tempo dessas prisões, mesmo diante do parecer do relator, ministro Edson Fachin, a elas favorável. A decisão ganhou intensa repercussão no universo dos operadores do Direito em um momento de polarização entre posições, envolvendo principalmente as visões contrárias de advogados e o insistente posicionamento favorável de procuradores e do juiz Sérgio Moro, este comandando os casos mais contundentes da operação Lava Jato. Quem tem razão? Quem tem razão? A 2ª turma do STF ou o MP? A situação deve ser analisada à luz de vários e complexos fatores. Ressalte-se o tom extremamente emotivo com que uns e outros tratam do caso. Um grupo enxerga na decisão de nossa mais alta Corte um golpe frontal contra a operação Lava Jato, enquanto os advogados festejam o ato como gesto de que a Justiça volta ao seu prumo, depois da primeira instância dar guarida a "exageros e aberrações", como alguns chegam a designar as alongadas prisões temporárias. A emoção chama a atenção no meio do turbilhão expressivo que inunda o território da maior investigação sobre corrupção da história brasileira. Mas a emoção acaba encurtando a lógica das partes. Urge tornar a linguagem jurídica mais conceitual e menos pessoal. Os fatos É fato que as prisões temporárias se fazem necessárias para apuração acurada de denúncias e servem de escudo contra eventuais ações de implicados no sentido de destruir provas e obstruir, caso estivessem soltos, as veredas da Justiça. Mas é igualmente fato que as detenções não podem ultrapassar determinado limite de tempo, sob a hipótese de que os detidos não foram ainda julgados e a longa permanência em prisão, sem condenação, pode ser considerada como evidência de injustiça. Portanto, na querela aberta tem faltado bom senso. Os verbos e adjetivos raivosos lançados de um lado contra o outro precisam se despir do manto emocional. Não é politicagem Não é o caso de marcar com feição politiqueira atitude de ministros que concederam a liberdade ao ex-ministro José Dirceu, sendo uma impropriedade distinguir neles a pecha de "traidores da Justiça", ou, de outra forma, jogar sobre o colo da "meninada" do Ministério Público atributos como "procuradores ingênuos, oportunistas, golpistas, despreparados, desprovidos de caráter", entre outros. O fato de magistrados registrarem, em seu passado, um pedaço de história que os liga a protagonistas da política - partidos ou lideranças - não os desabilita ao cumprimento das altas funções para as quais foram escolhidos. Nem mesmo quando tais figurantes assumem papel de vulto nos gigantescos processos em curso, como é o caso da operação Lava Jato. A Corte americana É oportuno lembrar que a escolha de juízes para a mais alta Corte da maior democracia do planeta, a norte-americana, se investe de certo teor político, eis que os perfis costumam ser encaminhados e patrocinados, via de regra, pelos dois maiores partidos, o republicano e o democrata. Mesmo assim, quando há suspeita sobre o voto de determinado ministro, pela ótica de que estará julgando "um amigo, um ex-parceiro de trabalho", ele poderá se considerar impedido de participar do julgamento daquele caso, como tem acontecido em algumas Cortes, principalmente no âmbito do Superior Tribunal de Justiça. A par de questões de natureza ética, que certamente integram o escopo moral dos quadros mais elevados de nossas Cortes, emerge com força a cobertura midiática, feita por grandes veículos da imprensa e pelas mídias sociais. O maior juiz, a OP Há um superpoderoso juiz a julgar os julgadores: a opinião pública. Esta se forma a partir do amálgama das opiniões individuais, constituindo um gigantesco estuário em que desembocam as águas oriundas dos canais e filtros que guardam juízos de valor de classes sociais, grupamentos, setores e movimentos. Juízes que fugirem às regras que balizam sua profissão são jogados no palco midiático, onde ganham apupos, vaias, na esteira de um repertório negativo que marca sua identidade e mancha a imagem. Não terão salvação quando jogados na fogueira acesa pela opinião pública. Só conseguirão limpeza parcial de seus corpos depois de uma temporada no inferno até aportarem no limbo, que, nesse caso, significa o esquecimento dos fatos por parte da sociedade. Cuidado com Narciso Já a "meninada" do MP não pode se refestelar diante de eventuais bombardeios da mídia sobre o arquipélago de políticos e magistrados. É imperioso reconhecer que o espelho de Narciso ilustra paredes de salas de um grupo de procuradores. Não há como deixar de reconhecer que alguns perfis apreciam os adornos de espetáculos espalhafatosos. Preparam atos litúrgicos para falas aguardadas com expectativa, investem-se de "salvadores da Pátria", assumindo a dicotomia: "ou nós ou o caos". Compreende-se o vigor com que fazem denúncias e investigações e é elogiável seu esforço para defender a sociedade contra máfias e teias de larápios que intentam surrupiar os cofres do Estado. O erro, quando há, está na dosagem exagerada. É inescapável a observação que aponta para a espetacularização de suas ações. Em suma, nem lá nem cá.
quarta-feira, 3 de maio de 2017

Porandubas nº 528

Abro a coluna com a verve popular... Saudando presidentes Juscelino Kubitschek, presidente da República, foi ao Ceará com Armando Falcão, ministro da Justiça. Sebastião Nery conta que Falcão, cearense, levou JK a um desafio de cantadores. Um cego estava lá, com sua viola, gemendo rimas. Juscelino chegou, cumprimentou-o. O cego respondeu na hora: - Kubitschek, ai, meu Deus, que nome feio. Dele eu só quero o cheque porque do resto ando cheio. Um ano depois, a mesma cena. Jânio Quadros, presidente, vai a Fortaleza, há um desafio de cantadores. Chega com os óculos grossos e longos bigodes, um cantador o vê, saúda: - Vou louvar o meu patrão que já vem chegando agora. Engoliu a bicicleta e deixou o guidão de fora. Nunca mais ninguém levou presidente para ouvir cantador no Ceará. Soltura de Dirceu A decisão do STF de mandar soltar José Dirceu comandará o discurso político-judicial nas próximas semanas. As prisões temporárias de longa duração fecham um ciclo. Abre-se uma nova jornada de discursos, críticas e apoios, nos conjuntos profissionais organizados: MP, Judiciário, OAB e suas associações. A locução crítica alcança o ápice. Até onde irá? Que estranho, hein? O Datafolha registra que a confiança dos brasileiros aumenta, que expectativas sobre a economia melhoram, que há sinais positivos no horizonte. No outro lado da moeda, mostra dados sobre avaliação negativa do governo Temer, que piora. Fica no ar a dúvida: quem está melhorando a economia? Quem é o artífice da melhoria da confiança? Um extraterrestre? Luis Inácio, com a bateria de denúncias nas costas? Ou o governo tão mal avaliado de Michel Temer? Por que tanta falta de nexo entre as posições registradas pelo Instituto da Folha de São Paulo? O entendimento I Como os analistas da Folha não se deram ao trabalho de analisar esse estranho fenômeno, tentemos fazê-lo. Primeira hipótese para os bons ventos que animam a confiança nacional: Deus, que é brasileiro, é o responsável pelos rumos esperançosos. Segunda hipótese: as centrais sindicais, que comandaram a quebradeira da sexta-feira, dia 28, conseguiram o milagre de recuperar a economia. Terceira hipótese: o PT e os outros partidos da oposição são os verdadeiros responsáveis pelo aumento da taxa de confiança. Quarta hipótese: nenhuma das hipóteses anteriores é adequada. O entendimento II Não vingando nenhuma hipótese anterior, este consultor põe sua colher na sopa de dados incongruentes. A distinta opinião pública - que amalgama as opiniões setoriais e individuais - tende a jogar no colo do governo Temer toda a indignação que expressa sobre a esfera política. Protagonistas - representantes e partidos - são farinha do mesmo saco e estão todos condenados ao fogo do inferno. O governo, no caso, tende a ser associado ao inferno. Corrupção, latrocínio, rapinagem em alta escala, tudo é lançado nas cavernas do governo. Esta é a explicação mais plausível. E por que isso ocorre? Banalização Isso ocorre na esteira do fenômeno da banalização que nivela todos os acontecimentos. Os políticos estão todos no buraco da péssima avaliação. E o governo é visto como guarda-chuva que acolhe a todos. Por quê? Por liderar, hoje, as reformas, ainda não palatáveis à maioria da sociedade. Ou seja, o governo está sendo atacado todos os dias por promover reformas que "tiram direitos trabalhistas". A martelada nas mentiras acaba suplantando a tênue comunicação governamental. E aí o governo assume o papel de bode expiatório das ruindades. O povo ainda não internalizou as lições sobre as vantagens das reformas para a garantia de seu futuro. Inversão de papéis Dá-se, então, uma inversão de papéis. Os mocinhos são os verdadeiros bandidos, os que pregam contra as reformas, os setores que lutam para preservar seu status, os grupos que temem perder privilégios. E os bandidos passam a ser o governo, que lidera as reformas, e aqueles que as defendem. Esse é o pano de fundo que agasalha pesquisas como a feita pelo Datafolha. Previdência na Câmara Hoje, a reforma da Previdência deverá ser aprovada na Comissão Especial da Câmara. Depois, lutará pela urgência da reforma trabalhista no Senado. O líder do governo no Senado, Romero Jucá, está mobilizando as lideranças. Renan Calheiros, líder do PMDB, lutará contra. Renan age como líder da oposição. Diz que reforma não passará pelo Senado da forma como está. Entre os compromissos que assumiu, Renan vai lutar pela permanência da contribuição sindical obrigatória. O kit mercenário As centrais sindicais estão contratando mercenários de quatro empresas de Brasília para duelar em nome de seus interesses. Do pacote constam depredações, pressões contra políticos na Câmara e no Senado, corredores poloneses para agredir quem entra no Congresso e outros aparatos conhecidos. Tudo isso faz parte do kit mercenário e as centrais pagam este preço: - R$ 100 reais por cabeça ao dia; - 4 a 6 horas de trabalho/dia; - os "manifestantes" têm direito a ônibus, camiseta e um lanche. As centrais não levam ninguém de fora para Brasília. Todos os mercenários são arregimentados nas cidades satélites mesmo. Terceirização Entidades patronais se debateram pela terceirização no país durante mais de vinte anos. A atividade se expandiu de forma gigantesca por exigência da dinâmica da economia, como ocorre nos países mais avançados do planeta, e hoje acolhe 13 milhões de trabalhadores em suas mais de 700 mil empresas. Mas é muito estranho: em nenhum momento as centrais sindicais ou os partidos de esquerda apresentaram uma só ideia que fosse para amparar os trabalhadores terceirizados. Ou só os da esquerda são brasileiros? E o trabalhador? Ao final do dia 28 de abril, na chamada greve geral, os manifestantes queimaram oito ônibus no centro do Rio de Janeiro. Era uma forma de protestar contra as reformas empreendidas pelo governo para tentar melhorar a vida dos cidadãos. No dia de ontem, criminosos queimaram mais oito ônibus. Era o seu jeito de protestar contra uma megaoperação da Polícia Militar para acabar com a guerra entre traficantes na Cidade Alta, comunidade em Cordovil, na Zona Norte. Mas, na verdade, as maiores vítimas de manifestantes e criminosos são os trabalhadores, os que mais dependem de transporte público. As chamas e a esperança Enquanto pneus ardiam nas ruas e estradas do país, barricadas eram erguidas e a violência imperava contra os que pretendiam trabalhar na sexta-feira, o Datafolha se preparava para anunciar nova pesquisa, no qual a maioria dos brasileiros está menos pessimista em relação à sua própria situação econômica e a do país. Apesar de entortarem o nariz para a reforma da Previdência, a parcela dos entrevistados que prevê progressos em sua situação pessoal aumentou de 37% para 45%. Os números mostram, ao final, que aumenta cada vez mais a distância entre os manifestantes petistas e os que realmente trabalham no Brasil. Destampatório de ignorância Chegou às mãos deste consultor um vídeo feito com uma pergunta aos manifestantes do dia 28, aquele dedicado à fracassada greve geral. Pergunta do entrevistador: que direitos o trabalhador está perdendo com as reformas? O destampatório é de gargalhar. Respostas: o trabalhador perderá direito ao FGTS; perderá benefícios; não terá direito às férias, 13º salário, perderá o tempo já trabalhado e que conta para a aposentadoria. Alguns gaguejam, outros não sabem o que dizer. Mas observa-se a instrumentalização a que algumas pessoas foram submetidas. Uma carrada de ignorância dentro de toneladas de má-fé. O vídeo circula pelas redes. Comício do Paulinho Paulinho da Força tem o dom de agradar e, ao mesmo tempo, desagradar seus interlocutores. No palanque de sua festa de 1º de maio, quando levou artistas e sorteou carros, desancou as reformas e o governo Temer. Ao fundo, o logotipo da Caixa Econômica Federal, uma das patrocinadoras do evento. Paulinho deve justificar: a Caixa está do nosso lado e contra o governo. O que diz a CEF sobre o verbo solto e destemperado do sujeito que dirige a Força Sindical? O enigma Lula Luis Inácio vai depor dia 10 de maio em Curitiba. Crescem as expectativas. O PT se prepara para lançar sua candidatura à presidência da República logo após seu depoimento ao juiz Sérgio Moro. Já se sabe que Lula vai negar tudo. E aproveitar para se fazer de vítima. Moro, por sua vez, não deve se amedrontar. Há plateias que aplaudem sua conduta. Por isso, 10 de maio poderá ser o início do fim de Lula. Ou abrir o ciclo do eterno retorno: Lula recomeçando sua vida de candidato. Brasil da inclusão digital Amanhã, o satélite geoestacionário brasileiro Ariane será lançado a uma distância de 36 mil quilômetros da Terra a partir da base de Kouru, na Guiana Francesa. Com esse lançamento, o país abre os horizontes da transmissão de dados com uso de equipamento próprio. As telecomunicações serão beneficiadas com 70% do tráfego de dados do satélite, a chamada Banda Ka, e os outros 30% serão destinados às comunicações militares e estratégicas, defesa e segurança nacional, Banda X. Internet nos rincões A iniciativa é uma parceria entre o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) e o Ministério da Defesa, com investimentos estimados em R$ 2,7 bilhões. Os benefícios são muitos, mas a oferta de banda larga em unidades escolares de áreas remotas e também em unidades de saúde pública merece destaque. O satélite foi construído pela Visiona, uma joint venture entre Telebras e Embraer, e seu lançamento é de responsabilidade da empresa aeroespacial francesa Arianespace. Voto facultativo I É mentirosa a tese de que a obrigatoriedade do voto fortalece a instituição política. Fosse assim, os EUA ou os países europeus, considerados territórios que cultivam com vigor as sementes da democracia, adotariam o voto compulsório. O fato de se ter, em algumas eleições americanas, participação de menos de 50% do eleitorado não significa que a democracia ali seja mais frágil que a de nações onde a votação alcança dados expressivos. Na Grã-Bretanha, que adota o sufrágio facultativo, a participação eleitoral pode chegar a 70% nos pleitos para a Câmara dos Comuns, enquanto na França a votação para renovação da Assembleia Nacional alcança cerca de 80% dos eleitores. Não é o voto por obrigação que melhora padrões políticos. A elevação moral e espiritual de um povo decorre dos níveis de desenvolvimento econômico do país e seus reflexos na estrutura educacional. Voto facultativo II Na lista do voto obrigatório estão os territórios da América do Sul, com exceção do Paraguai, enquanto a lista do voto facultativo é integrada por países do Primeiro Mundo, os de língua inglesa e quase todos os da América Central. O voto facultativo, ao contrário do que se pode imaginar, motivará a comunidade política, engajando os grupos mais participativos e vivificando a democracia nos termos apregoados por John Stuart Mill, numa passagem de Considerações sobre o Governo Representativo, quando divide os cidadãos em ativos e passivos. Diz ele: "Os governantes preferem os segundos - pois é mais fácil dominar súditos dóceis ou indiferentes -, mas a democracia necessita dos primeiros. Se devessem prevalecer os cidadãos passivos, os governantes acabariam por transformar seus súditos num bando de ovelhas dedicadas tão somente a pastar capim uma ao lado da outra."