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Observatório da Arbitragem

Artigos sobre arbitragem, visando a divulgação do instituto e decisões dos Tribunais.

Olavo Augusto Vianna Alves Ferreira e Marcelo Bonizzi
Não é raro que surjam situações de urgência antes da instauração da arbitragem, aí incluída a necessidade de produção antecipada de prova, mas tudo indica que o TJ/SP não tem sido favorável a conceder liminares em situações assim. Conforme decisões abaixo transcritas, este Tribunal tem exigido que a urgência seja amplamente comprovada, talvez de forma muito mais intensa do que nas situações em que não haveria posterior instauração de arbitragem entre as partes, ou seja, nas hipóteses em que o litígio seria solucionado pela Justiça Comum. Se esta premissa estiver correta e se levarmos em consideração que o acesso aos tribunais superiores para obtenção da tutela de urgência seria muito difícil ou quase impossível em situações assim, a principal consequência dessa postura excessivamente restritiva do TJ/SP implicaria em denegação de tutela jurisdicional, isto é, exigir que a urgência (ou mesmo as demais hipóteses de concessão da tutela de urgência) seja muito intensa ou extremamente evidente para concessão de liminar é praticamente o mesmo que denegar essa tutela. Vale lembrar, nesse ponto, o princípio da proporcionalidade, que, para além de possuir raiz constitucional, foi explicitamente mencionado no art. 8º do CPC atual, como reforço dessa garantia constitucional. Seria desproporcional submeter as partes a exigências dessa natureza. Em resumo, embora evidentemente não existam pesquisas empíricas sobre o tema, recomenda-se às partes que necessitarem de tutela de urgência nesse contexto que ponham em destaque em suas petições a efetiva importância da concessão de liminar antes da instauração da arbitragem, caso contrário as chances de obtenção dessa medida jurisdicional provavelmente serão pequenas. "Requerimento de tutela cautelar pré arbitral - decisão que indeferiu a pretensão - Inconformismo da requerente - Não acolhimento - Pretensão de imediata desconsideração do voto proferido pela sócia-ré, em assembleia-geral extraordinária, para fins de aprovação do aumento de capital social da companhia - Ausência dos requisitos legais, para a concessão da medida de urgência (art. 22-A, da lei 9.307/96) - Aparentemente, as justificativas apresentadas na declaração de voto não são infundadas - A constatação de que os sócios aportaram recursos financeiros, para honrar as obrigações da companhia, mitiga a alegada situação de urgência, para imediato aumento de capital - O cerne do litígio será submetido ao procedimento arbitral - decisão mantida - recurso desprovido" (AI 2169160-57.2021.8.26.0000, Rel. Grava Brazil, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, j. em 28/9/21). "PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVA CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES QUE PRÊVE CLÁUSULA DE CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM - EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO - ARTS. 485, VII, CPC - Antes de instituída a arbitragem, cabe ao Poder Judiciário analisar os pedidos de medida cautelar ou de urgência art. 22-A da lei 9.307/96 No caso em apreço, não se vislumbra situação de urgência, o que afasta a possibilidade de apreciação do litígio pelo Poder Judiciário - Atendimento dos requisitos da lei 9.307/96 - Extinção do processo, sem julgamento do mérito, que fica mantida - RECURSO DESPROVIDO" (Apelação Cível 1016776-28.2018.8.26.0002, rel. Sérgio Shimura, 2ª Câmara reservada de Direito Empresarial, j. em 06/10/20). "Tutela de urgência requerida em caráter antecedente ao ajuizamento de procedimento arbitral Indeferimento Pleito formulado por acionistas minoritários, fundado no art. 22-A da lei 9.307/96 Operações de compra antecipada de passagens aéreas. Alegada violação à legislação vigente e ao estatuto social da controlada, além de abuso de poder de controle e conflito de interesses Pedido tendente a que, além de ser obstada a reprodução de outras aquisições similares àquelas já contratadas, seja impedida a continuidade da execução de negócios já celebrados, com o imediato desfazimento dos efeitos já propagados pelos negócios celebrados, sobretudo com a reversão da atribuição de montantes muito relevantes de dinheiro - Probabilidade do direito invocado e perigo de dano não vislumbrados em juízo de cognição sumária Dano reverso potencializado - Ausentes requisitos previstos no art. 300 do CPC/15 Decisão mantida Recurso desprovido" (AI 2209410-69.2020.8.26.0000, rel. Fortes Barbosa, 1ª câmara Reservada de Direito Empresarial, j. em 24/2/21). Apelação - Ação de tutela antecipada de urgência pré-arbitral - Sentença de procedência - Nulidade inexistente - Sentença devidamente fundamentada - Condenação da ré à obrigação de fazer consistente em garantir o Juízo de ação anulatória fiscal (proc. 5008763-49.2019.4.03.6100), em substituição ao depósito judicial realizado pela autora, no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de multa diária - Controvérsia relacionada a contrato de compra e venda de participação societária com cláusula compromissória - Matéria sujeita, ao menos em tese, à arbitragem, respeitada a competência dos árbitros a serem nomeados para pronunciarem-se definitivamente sobre o tema (Lei 9.307/96, arts. 8º e 20) - Ausência de periculum in mora ou situação de urgência a justificar a excepcional intervenção do Poder Judiciário (Lei 9.307/96, art. 22- A; CPC, art. 300) - Precedentes das Câmaras Reservadas de Direito Empresarial - Inexistência, ademais, de notícia de requerimento de instauração de arbitragem, embora há muito decorrido o trintídio legal (Lei 9.307/96, art. 22- A, par. ún.) - Impossibilidade de subsistência da tutela concedida - Sentença reformada para julgar-se improcedente o pedido inicial - Inversão dos ônus sucumbenciais - Honorários recursais devidos - Recurso provido. Voto 16.681 apelação cível 1030905-67.2020.8.26.0002 Apelante: Peach Tree Participações e Empreendimentos Imobiliários e Rurais Ltda Apelado: Softline International Brasil Comércio e Licenciamento de Software Ltda Comarca: São Paulo Juiz(a): Anderson Cortez Mende, Rel. Des. Mauricio Pessoa.
A Emenda Constitucional n. 113, promulgada no fim de 2021, estabeleceu um o novo regime de pagamentos de precatórios. Esse regime1, aliás, presente desde a Constituição de 1934, foi objeto de valioso comentário do professor Pontes de Miranda, segundo o qual essa forma pagamentos de créditos devidos pela Fazenda Pública constitui "medida constitucional moralizadora, contra a advocacia administrativa, diante da necessidade de fazê-los na ordem de apresentação dos precatórios"2. De acordo com  Ministro Celso de Mello a exigência constitucional relativa à expedição de precatório tem como escopo i) assegurar a igualdade entre os credores e proclamar a inafastabilidade do dever estatal de solver os débitos judicialmente reconhecidos em decisão transitada em julgado, ii) evitar favorecimentos pessoais indevidos e iii) frustrar tratamentos discriminatórios, evitando injustas perseguições ou preterições motivadas por razões destituídas de legitimidade jurídica (ADI 2.356 e ADI 2.362). Pois bem, uma questão que vem sendo abordada pela doutrina é a inclusão ou não dos créditos decorrentes de sentenças arbitrais ao regime constitucional dos precatórios. Ora, a norma constitucional estabelece que os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, estaduais, distrital e municipais deverão seguir tal regime de pagamento (art. 100). O termo 'sentença judiciária' adotado pelo constituinte não diz respeito apenas a numerários contidos em sentenças judiciais, mas também aqueles decorrente de títulos executivos judiciais3 e, como não poderia deixar de ser, das sentenças arbitrais condenatórias4. O modelo de pagamento via precatório é prerrogativa das Fazendas Públicas e se funda na Constituição. O ambiente processual em que as prerrogativas da Fazenda Pública geralmente não tem aplicabilidade imediata é na arbitragem. Encerrada a fase arbitral, todos os atos executivos para reconhecimento do crédito e o seu respectivo pagamento deverão ocorrer no Poder Judiciário e sob o regime do estabelecido na Constituição (art. 100) e no Direito Processual Civil (art. 534, 535 e 910). De todo modo, deve-se considerar que a existência dos precatórios se fundamenta na real necessidade de um mecanismo jurídico-constitucional que torne possível a previsão orçamentária de despesas públicas decorrentes de provimentos que estabelecem a obrigação de pagar quantia certa, seja de que natureza for. Essa questão, sem dúvida, gera desconforto por parte do vencedor-credor porque há certeza quanto ao valor, mas incerteza quanto ao momento do seu pagamento e mais ainda depois da EC 113/2021. Concordamos que o Estado brasileiro precisa aperfeiçoar o seu sistema financeiro e, especificamente, o manejo do orçamento público. A verdade é que não há nenhum impedimento para previsão em lei orçamentária de reserva de recursos para pagamento de custas, despesa e possíveis condenações nas arbitragens. Tudo dependente de vontade político-governamental. De todo modo, e apesar de tudo, existem algumas alternativas para aqueles que pretendem evitar o desconforto e a morosidade decorrente da ordem cronológica estabelecida pelo caput do art. 100 da CF.   A primeira alternativa é a execução da sentença arbitral no exterior, utilizando-se da  Convenção de Nova Iorque de 1958, ratificada pelo Brasil, pelo decreto 4.311/02, a qual estabelece que a sentença arbitral proferida no território brasileiro poderá ser executada em qualquer outro país que tenha aderido a tal convenção internacional. A pactuação da convenção arbitral impede a posterior invocação de imunidade de jurisdição, o Estado brasileiro não poderá fazer uso de tal expediente perante judiciário estrangeiro em que se pretenda executar a decisão arbitral. Com efeito, fazendo uso das regras internacionais e processuais relativas à arbitragem, é possível que se evite regime de precatório sem, contudo, violar qualquer tipo de regra constitucional, no caso de execução contra à Fazenda. A segunda alternativa encontra-se na própria constituição: a negociação de créditos decorrente de precatórios conforme previsão do §13º do art. 100. Segundo o texto, o credor poderá ceder, total ou parcialmente, seus créditos em precatórios a terceiros, independentemente da concordância do devedor. A cessão de crédito permite que o cedente adquira boa parte do valor de forma imediata, sem ter que aguardar a ordem cronológica estabelecida no art. 100. O cessionário adquire o crédito originário e só o receberá ao fim do processo. Trata-se de um verdadeiro investimento, já que, até a data do pagamento, incidem correções e juros sob valor do crédito adquirido. Acerca da questão Napoleão Casado explica que "o investidor permaneceria na propriedade dos créditos, mas com condição resolutiva", com a conclusão dos trâmites, "a propriedade sobre os créditos pactuados se resolveria e recairia sobre o investidor, na qualidade de credor"5. Existem diversas e respeitáveis empresas e fundos de investimento especializados na captação, gestão e disponibilização de recursos para aquisição de direitos creditórios que são ou serão objeto de litígio em processo arbitral e até aqueles que já estão definidos em sentença arbitral. É possível, então, a antecipação e monetização de recebíveis decorrente de sentença arbitral que condena a Fazenda Pública ao pagamento de quantia em dinheiro. As vantagens constadas nesse tipo de negócio são o recebimento do valor no ato cessão, a segurança jurídica e financeira do procedimento, o deságio compatível e a aquisição de capital para fluxo de caixa, investimento e quitação de despesas6. Há aqui uma oportunidade interessante para construção de parcerias com financiadores, com os quais seriam compartilhados alguns riscos do litígio. Cria-se, conforme apontou Arnoldo Wald, "uma oportunidade para fazerem uma parceria com financiadores, aos quais são repassados determinados riscos do valor e do momento dos eventuais recebimentos, e dividindo-se o resultado que vier a ser obtido entre a parte e quem o financiou, na forma convencionada"7. O legislador constitucional atento a esse movimento e, sobretudo à conjuntura econômico-financeira da Fazenda Pública, estabeleceu que o credor poderá ceder, total ou parcialmente, seus créditos em precatórios a terceiros, independentemente da concordância do devedor. Essa cessão de precatórios, contudo, apenas produzirá efeitos após comunicação, por meio de petição protocolizada, ao tribunal de origem e à entidade devedora (CF, art. 100, §14).  Como se nota, apesar do regime constituir um desconforto para aqueles que possuem valores a receber da Fazenda Pública existem soluções jurídica e economicamente viáveis. O que não se mostra adequado é uma interpretação literal ou restritiva do art. 100, caput da CF, a justificar o desvio de uma regra constitucionalmente estabelecida. __________ 1 Recomenda-se excelente obra sobre o assunto: MOREIRA, Egon Bockmann et al. Precatórios: o seu novo regime jurídico: a visão do direito financeiro, integrada ao direito tributário e ao direito econômico. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, Thomson Reuters Brasil, 2021. 2 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários à Constituição de 1967 com a Emenda n. 1 de 1969. São Paulo: Ed. RT, 1970. v. 3. p. 646-647. 3 Vide súmula 279 do Superior Tribunal de Justiça 4 CUNHA, Leonardo Carneiro da. A fazenda pública em juízo. 19. ed Rio de Janeiro: Forense, 2022, p. 698. 5 CASADO, Napoleão. Arbitragem e acesso à justiça: o novo paradigma do thirty party founding. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 220. 6 BADARÓ, Gilberto. 5 motivos para você vender precatórios. Migalhas. Disponível aqui, acesso em 25 de maio de 2022. 7 WALD, Arnoldo. Alguns aspectos positivos e negativos do financiamento da arbitragem. Revista de Mediação e Arbitragem. n. 49, São Paulo: Revista dos Tribunais. 2016, p. 34 e ss.
A homologação de decisões estrangeiras pelo STJ é condição para que essas decisões ganhem força executiva em território nacional (exequatur), inclusive quando se tratar de decisões arbitrais. A lei de arbitragem trata desse tema em seus arts. 34-40, cujas regras dão importância aos tratados internacionais, como a Convenção de Nova Iorque (1958) e o Protocolo de Las Lenãs (1992), além de fornecem um rol taxativo das hipóteses em que o STJ não pode homologar a decisão arbitral estrangeira. Dentre essas hipóteses, vale destacar a do inciso VIII do art. 38, in verbis: a sentença arbitral não se tenha, ainda, tornado obrigatória para as partes, tenha sido anulada, ou, ainda, tenha sido suspensa por órgão judicial do país onde a sentença arbitral for prolatada. Daí por que, ao menos em princípio, a indagação feita no título deste breve estudo seria fácil de responder, ou seja, se anulada a decisão arbitral estrangeira em seu país de origem, não poderia o STJ homolar essa decisão. No entanto, o STJ já se posicionou em sentido contrário a esse entendimento: SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA Nº 611 - EX (2005/0055688-0) RELATOR REQUERENTE REQUERENTE ADVOGADO REQUERIDO REQUERIDO ADVOGADO : MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA : FIRST BRANDS DO BRASIL LTDA : STP DO BRASIL LTDA : LUIZ FERNANDO HENRY SANT'ANNA E OUTROS : STP - PETROPLUS PRODUTOS AUTOMOTIVOS S/A PPA : PETROPLUS SUL COMÉRCIO EXTERIOR S/A PSC : CARLOS HENRIQUE MENDES DIAS E OUTROS EMENTA HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA. SENTENÇA ARBITRAL. MATÉRIA DE MÉRITO. IRRELEVÂNCIA. ART. 38 DA LEI N. 9.307/96. 1. As disposições contidas no art. 38 da Lei n. 9.307/96 apresentam um campo mais largo das situações jurídicas que podem ser apresentadas na contestação, em relação à prevista no art. 221 do RISTF, mas não chega ao ponto de permitir a invasão da esfera de mérito da sentença homologanda. 2. A existência de ação anulatória da sentença arbitral estrangeira em trâmite nos tribunais pátrios não constitui impedimento à homologação da sentença alienígena, não havendo ferimento à soberania nacional, hipótese que exigiria a existência de decisão pátria relativa às mesmas questões resolvidas pelo Juízo arbitral. A Lei n. 9.307/96, no § 2º do seu art.33, estabelece que a sentença que julgar procedente o pedido de anulação determinará que o árbitro ou tribunal profira novo laudo, o que significa ser defeso ao julgador proferir sentença substitutiva à emanada do Juízo arbitral.  Daí a inexistência de decisões conflitantes. 3. Sentença arbitral estrangeira homologada. E em outra importante decisão, o STJ adotou entendimento diferente, rejeitando o pedido de homologação: SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA Nº 5.782 - EX (2011/0129084-7) RELATOR : MINISTRO JORGE MUSSI REQUERENTE : EDF INTERNATIONAL S/A ADVOGADOS : MARCUS VINICIUS VITA FERREIRA E OUTRO(S) ARNOLDO WALD REQUERIDO : ENDESA LATINOAMÉRICA S/A ADVOGADOS : ANDRÉ LUIZ SOUZA DA SILVEIRA LUIS FELIPE FREIRE LISBOA E OUTRO(S) SÉRGIO BERMUDES FABIANO DE CASTRO ROBALINHO CAVALCANTI REQUERIDO : YPF S/A ADVOGADOS : VICENTE COELHO ARAÚJO MARCELLO ALFREDO BERNARDES E OUTRO(S) DANIEL COSTA REBELLO NATALIA PEPPI GABRIELA MARCONDES BORGES MARCO AURÉLIO MARTINS BARBOSA LÍVIA CALDAS BRITO JOSE RUBENS BATTAZZA IASBECH CAROLINA FEITOSA DE ALBUQUERQUE TARELHO EMENTA QUESTÃO PRELIMINAR. DESPACHO QUE TORNA SEM EFEITO INTIMAÇÃO PARA JUNTADA DE DOCUMENTOS. AUSÊNCIA DE CONTEÚDO DECISÓRIO. INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO PARA A PARTE. OPOSIÇÃO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. NÃO CABIMENTO. HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ARBITRAL ESTRANGEIRA CONTESTADA. ARTIGO 34 DA LEI N. 9.307/1996. INCIDÊNCIA INICIAL DOS TRATADOS INTERNACIONAIS, COM EFICÁCIA NO ORDENAMENTO JURÍDICO INTERNO. APLICAÇÃO DA LEI DE ARBITRAGEM NA AUSÊNCIA DESTES. LAUDO ARBITRAL ANULADO NO PAÍS DE ORIGEM, COM SENTENÇA JUDICIAL TRANSITADA EM JULGADO. JUÍZO DE DELIBAÇÃO. DESCABIMENTO DO EXAME DO MÉRITO DA SENTENÇA ARBITRAL. IMPOSSIBILIDADE DA ANÁLISE DA DECISÃO. JUDICIAL ESTRANGEIRA. INDEFERIMENTO DA PRETENSÃO HOMOLOGATÓRIA. 1. O artigo 34 da Lei n. 9.307/1996 determina que a sentença arbitral estrangeira será homologada no Brasil, inicialmente, de acordo com os tratados internacionais com eficácia no ordenamento interno e que, somente na ausência destes, incidirão os dispositivos da Lei de Arbitragem Brasileira. 2. No caso em exame, a sentença arbitral que se pretende homologar foi anulada judicialmente pelo Poder Judiciário Argentino, com decisão transitada em julgado. 3. A legislação aplicável à matéria - Convenção de Nova York, Artigo V(1)(e) do Decreto n. 4.311/2002; Convenção do Panamá, Artigo 5(1)(e) do Decreto n. 1.902/1996); Lei de Arbitragem Brasileira, Artigo 38, inciso VI, da Lei n. 9.307/1996; e Protocolo de Las Leñas, Artigo 20(e) do Decreto n. 2.067/1996, todos internalizados no ordenamento jurídico brasileiro - não deixa dúvidas quanto à imprescindibilidade da sentença estrangeira, arbitral ou não, ter transitado em julgado para ser homologada nesta Corte Superior, comungando a doutrina pátria do mesmo entendimento. 4. O Regimento Interno deste Sodalício prevê o atendimento do mencionado requisito para a homologação de sentença estrangeira, arbitral ou não, conforme se depreende do caput do artigo 216-D do RI/STJ. 5. O procedimento homologatório não acrescenta eficácia à sentença estrangeira, mas somente libera a eficácia nela contida, internalizando seus efeitos em nosso País, não servindo, pois, a homologação de sentença para retirar vícios ou dar interpretação diversa à decisão de Estado estrangeiro. Precedentes desta Corte Superior e do Supremo Tribunal Federal. 6. Na hipótese sob exame, sendo nulo na Argentina o presente laudo arbitral - por causa de decisão judicial prolatada naquele País, com trânsito em julgado devidamente comprovado nos autos -, nula é a sentença arbitral no Brasil que, por isso, não pode ser homologada. 7. Pedido de homologação de sentença arbitral estrangeira indeferido. Se, por um lado, o STJ não pode avaliar o mérito da decisão judicial estrangeira que anulou a decisão arbitral, por outro lado remanesce a soberania nacional, principalmente se essa decisão judicial estrangeira levou em consideração fatores  jurídicos que não são relevantes no ordenamento jurídico nacional. Como se vê, o tema ainda está longe de ser pacificado no âmbito do STJ, inclusive porque não é recorrente. A primeira decisão é de 2006 e segunda é de 2015, ou seja, o STJ passou quase dez anos sem enfrentá-lo. Particularmente, creio que na próxima o STJ seguirá o entendimento adotado na decisão mais recente.
A promulgação da lei 9.307/96 pode ser considerada o evento mais importante para o desenvolvimento da arbitragem em nosso país1, pois rompeu com os diplomas legais anteriores, que não apenas desfavoreciam, mas inviabilizavam a utilização do instituto em território nacional. Desde então, a arbitragem tem se desenvolvido extraordinariamente e se consolidado como importante instrumento de resolução de litígios no país, que hoje é uma das referências mundiais na matéria. Congressos, palestras, cursos e publicações sobre arbitragem têm se multiplicado, demonstrando a consolidação do instituto que, a teor do disposto no art. 1º da Lei. 9.307/96, se destina a "dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis". Essa disponibilidade dos direitos2 se sobreleva de tal modo no ambiente arbitral que, ao optarem pela instituição da arbitragem, as partes, além de renunciarem à tutela jurisdicional do Estado e abdicarem do processo civil como técnica para solucionar seus conflitos de interesse e tutelar seus direitos de natureza material e processual, assumem a responsabilidade de adotar o regulamento procedimental da câmara arbitral que escolherem, ou, ainda, por definirem as regras procedimentais adequadas para o desenvolvimento e julgamento do seu caso3. Toda essa liberdade outorgada às partes se soma a outras características - tidas como positivas - da arbitragem, como a confidencialidade e a celeridade de seu procedimento e julgamento4; e a possibilidade de escolha dos árbitros - que geralmente são especialistas na matéria em litígio, demonstrando a valorização da autonomia da vontade5 das partes no ambiente arbitral6. É nesse contexto de ampla autonomia da vontade que o art. 3º da Lei de Arbitragem define que "As partes interessadas podem submeter a solução de seus litígios ao juízo arbitral mediante convenção de arbitragem, assim entendida a cláusula compromissória e o compromisso arbitral". A convenção de arbitragem, seja sob a forma de compromisso arbitral ou de cláusula compromissória, é avença escrita, por meio da qual as partes descartam a jurisdição estatal e se comprometem a submeter a solução de conflitos à arbitragem. A Lei de Arbitragem disciplina que o compromisso arbitral é a convenção por meio da qual as partes estabelecem que determinado conflito já instaurado será resolvido em sede arbitral, dividindo-o em 2 (duas) espécies: a primeira, referente ao compromisso arbitral judicial; e a segunda, referente ao extrajudicial7. A cláusula compromissória, por sua vez, "é a convenção através da qual as partes em um contrato" (Art. 4º caput) ou "em documento apartado que a ele se refira" (§ 1º do Art. 4º) "comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal contrato" (Art. 4º caput). Ou seja, a cláusula compromissória nada mais é do que uma cláusula contratual por meio da qual as partes antes da existência de conflito(s)8 celebram negócio jurídico bilateral prevendo que eventuais desacordos serão solucionados pela via arbitral. Nesse aspecto, o Legislador, antevendo a possibilidade de inserção abusiva de cláusulas compromissórias em contratos de adesão, e certamente visando a preservar o alto grau volitivo das partes em sede arbitral, foi explícito ao prever, no § 2º do Art. 4º da Lei de Arbitragem, que: nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula. Nesse sentido, em 14/03/2022, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de AgInt nos Edcl no Agravo em Recurso Especial nº 1560937 - SP (2019/0234404-7), cujo relator foi o Ministro Marco Aurélio Bellizze, prestigiando a autonomia da vontade das partes, reconheceu expressamente "caber ao Poder Judiciário, nos casos em que é identificado um compromisso arbitral claramente ilegal, declarar a nulidade dessa cláusula". Consta da ementa: AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE FRANQUIA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO ESTATAL. CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA. INVALIDADE. CONTRATO DE ADESÃO. INOBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 4º, § 2º, DA LEI 9.307/1996. MULTA DO ART. 1.021, § 4º, DO NCPC. ANÁLISE CASUÍSTICA. NÃO OCORRÊNCIA, NA ESPÉCIE. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. 1. A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de caber ao Poder Judiciário, nos casos em que é identificado um compromisso arbitral claramente ilegal, declarar a nulidade dessa cláusula. Destacou, ainda, que os contratos de franquia, mesmo não se tratando de relação de consumo, possuem a natureza de contrato de adesão. Por fim, consignou que deve ser conferida à cláusula compromissória integrante do pacto firmado entre as partes o devido destaque, em negrito, tal qual exige a norma em análise, com aposição de assinatura ou de visto específico para ela, sob pena de manifesta ilegalidade. 2. O mero não conhecimento ou a improcedência de recurso interno não enseja a automática condenação à multa do art. 1.021, § 4º, do NCPC, devendo ser analisado caso a caso. 3. Agravo interno improvido. (AgInt nos EDcl no AREsp 1560937/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/03/2022, DJe 18/03/2022). Portanto, autonomia da vontade é pressuposto e princípio irrenunciável e inalienável do processo arbitral9, e sua ausência - ou corrompimento - demonstra a imposição indesejada do juízo arbitral à parte mais frágil na relação contratual, revelando compromisso arbitral patológico10. Ocorre que, conforme expressa previsão do § 2º do Art. 4º da Lei de Arbitragem, não há vedação à instituição de arbitragem nos contratos de adesão, desde que atenda aos requisitos legais lá previstos. Ademais, é sabido que os contratos de adesão se caracterizam como negócio jurídico bilateral ou plurilateral em que a(s) parte(s) estipulante(s) impõe(m) as cláusulas sem possibilitar à(s) parte(s) aderente(s) discuti-las ou alterá-las. Ou seja, para viabilizar a instituição de procedimento arbitral, a cláusula deverá ser escrita em documento anexo devidamente assinado, ou constar do contrato, mas com destaque em negrito e com assinatura ou visto especialmente para essa cláusula. Não há dúvidas, portanto. A lei é bastante clara. As questões que se põem, entretanto, dizem respeito à possibilidade de o Poder Judiciário vir a reconhecer que a convenção de arbitragem é ilegal11 em decorrência da perda, ou inexistência, de autonomia da vontade de uma das partes, ou, ainda mais grave, que determinado contrato tem natureza de contrato de adesão e, por conseguinte, presumir que o - agora reconhecido judicialmente como - estipulante decidiu prévia e unilateralmente acerca da inserção da cláusula compromissória no contrato, em detrimento dos interesses do aderente. De fato, em qualquer contrato a cláusula compromissória deve ser objeto de reflexões e debates, mas a demonstração de anuência expressa dos contratantes é imprescindível, não sendo exagero, tampouco preciosismo (i) destacá-la no corpo do contrato; e (ii) assinando-se ou visando especificamente a cláusula, sob pena de eventual reconhecimento de sua ilegalidade12, principalmente em hipótese em que o Poder Judiciário poderá decidir que no ato da contratação as partes não estavam em plena igualdade, declarando a nulidade da cláusula compromissória. Bibliografia BONICIO, Marcelo José Magalhães. Princípios do processo no novo Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 235. CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: um comentário à Lei nº 9.307/96. 2. ed. rev., ampl. e atual. 4. reimpr. São Paulo: Atlas, 2007. CRETELLA NETO, José. Comentários à lei de arbitragem brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 2004. DINAMARCO, Cândido Rangel. A Arbitragem na Teoria Geral do Processo. São Paulo: Malheiros, 2013. FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alves; ROCHA, Matheus Lins; FERREIRA, Débora Cristina Fernandes Ananias Alves. Lei de Arbitragem Comentada Artigo por Artigo. 2. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Juspodivm, 2021. PARENTE, Eduardo de Albuquerque. Processo arbitral e sistema. São Paulo: Atlas, 2012. p. 94-103. WLADECK, Felipe Scripes. Impugnação da sentença arbitral. Salvador: Juspodivm, 2014. p. 31-32. __________ 1 Nesse sentido: "Após a aprovação da Lei de Arbitragem em 1996, o Código Civil de 2002 e o Código de Processo Civil de 2015 passaram a mencionar a arbitragem como um método autônomo e independente de resolução de conflitos, inclusive com a utilização da cláusula compromissória. Saliente-se que, no ano de 2015, foi editada a Lei 3129/15 que alterou a Lei 9307/96 em alguns pontos [...]" (FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alves; ROCHA, Matheus Lins; FERREIRA, Débora Cristina Fernandes Ananias Alves. Lei de Arbitragem Comentada Artigo por Artigo. 2. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Juspodivm, 2021. p. 24.). 2 "Ponto fundamental da arbitragem é a liberdade dos contratantes ao estabelecer o modo pelo qual seu litígio será resolvido. Tal liberdade diz respeito ao procedimento a ser adotado pelos árbitros e ao direito material a ser aplicado na solução do litígio, de sorte que o dispositivo legal comentado, ao referir-se no parágrafo primeiro a 'regras de direito', está se reportando às regras de forma e de fundo [...]". (CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: um comentário à Lei nº 9.307/96. 2. ed. rev., ampl. e atual. 4. reimpr. São Paulo: Atlas, 2007. p. 75.) 3 "Sem nenhum desejo de processualizar a arbitragem, que é um temor inerente a todo arbitralista, o fato é que a teoria geral do processo a envolve o suficiente para que todos os princípios do processo aqui estudados, em especial os de ordem constitucional, possam ser aproveitados no estudo da arbitragem. Mas a arbitragem confere ampla liberdade às partes, inclusive na escolha do procedimento (ônus e poderes etc.) e das regras materiais aplicáveis à solução de um caso concreto, e isso, evidentemente, empresta aos princípios do processo uma coloração muito diversa daquela que é encontrada no processo estatal" (BONICIO, Marcelo José Magalhães. Princípios do processo no novo Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 235.) 4 O art. 23 da lei 9.307/96 estabelece que a sentença arbitral seja proferida no prazo estipulado pelas partes ou no prazo de seis meses, contados da instituição da arbitragem ou da substituição do árbitro, se nada houver sido convencionado a esse respeito. 5 "Da necessária disponibilidade dos direitos suscetíveis de exame pela via da arbitragem, bem como do próprio fundamento convencional desta, em que a autonomia da vontade ocupa destacada posição central, decorre a ampla liberdade das partes para a escolha das normas de direito material a serem aplicadas, se as brasileiras, se as de alguma outra Nação, se as representadas com certas regras corporativas que quiserem acatar, se as da lex mercatoria, se aquelas hauridas diretamente dos princípios de direito, se as que emanam da equidade." (DINAMARCO, Cândido Rangel. A Arbitragem na Teoria Geral do Processo. São Paulo: Malheiros, 2013. p. 41-42.) 6 "Com a edição da Lei nº 9.307, todavia, a arbitragem modernizou-se, chamando atenção pelos diversos pontos de vantagem que apresenta em relação ao sistema arbitral heterocompositivo estatal, o processo judicial, como, por exemplo: a celeridade na prestação da tutela; a possibilidade de os contendentes escolherem como julgador(es) pessoa(s) especializada(s) na(s) matéria(s) objeto da controvérsia, o que repercute diretamente na qualidade do julgamento; e a informalidade e flexibilidade procedimental. Tudo isso sem prejuízo da definitividade das decisões em sua sede proferidas, as quais não podem ser controladas pelo Poder Judiciário por motivos relacionados ao seu mérito e, ademais, salvo pactuação em sentido diverso pelas partes, não podem ser objeto de impugnações nem mesmo internamente ao processo arbitral" (WLADECK, Felipe Scripes. Impugnação da sentença arbitral. Salvador: Juspodivm, 2014. p. 31-32.) 7 Sobre o tema, vide: CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: um comentário à Lei nº 9.307/96. 2. ed. rev., ampl. e atual. 4. reimpr. São Paulo: Atlas, 2007. p. 165-175; CRETELLA NETO, José. Comentários à lei de arbitragem brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 72-74; FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alves; ROCHA, Matheus Lins; FERREIRA, Débora Cristina Fernandes Ananias Alves. Lei de Arbitragem Comentada Artigo por Artigo. 2. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Juspodivm, 2021. p. 194-207; 230-232. 8 "A cláusula compromissória refere-se sempre ao futuro (artigos 4º ao 8º da Lei em estudo), e a sua existência é suficiente para afastar a jurisdição estatal (artigo 7º da Lei de Arbitragem), inexistente o conflito, esta cláusula não surte efeitos concretos." (FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alves; ROCHA, Matheus Lins; FERREIRA, Débora Cristina Fernandes Ananias Alves. Lei de Arbitragem Comentada Artigo por Artigo. 2. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Juspodivm, 2021. p. 195.). 9 Sobre o tema, vide: PARENTE, Eduardo de Albuquerque. Processo arbitral e sistema. São Paulo: Atlas, 2012. p. 94-103. 10 "[o] Poder Judiciário pode, nos casos em que prima facie é identificado um compromisso arbitral 'patológico', i.e., claramente ilegal, declarar a nulidade dessa cláusula, independentemente do estado em que se encontre o procedimento arbitral" (REsp 1.602.076/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 15/09/2016, DJe 30/09/2016.) 11 Veja-se que no acórdão em comento (AgInt nos EDcl no AREsp 1560937/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/03/2022, DJe 18/03/2022), a parte agravante alega "que o contrato, apesar de se referir a uma franquia, não é caracterizado como de adesão, tendo as partes negociado efetivamente todas as cláusulas pactuadas, não cabendo falar em nenhuma ilegalidade da cláusula compromissória", entretanto, foi decidido que "Conforme se verifica das informações acima colacionadas, não houve anuência expressa da parte à submissão do litígio à arbitragem. Além disso, a cláusula compromissória não foi redigida em destaque, no corpo do contrato, situação que contraria o entendimento firmado por essa Corte de Justiça, caracterizando a sua ilegalidade". 12DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL CUMULADA COM REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E COMPENSAÇÃO DE DANOS MORAIS. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 282/STF. CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM. CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA. RELAÇÃO DE CONSUMO. CONTRATO DE ADESÃO. 1. Ação ajuizada em 05/03/2012. Recurso especial concluso ao gabinete em 26/09/2016. Julgamento: CPC/73. 2. O propósito recursal é definir se é válida cláusula compromissória arbitral inserida em contrato de adesão, notadamente quando há relação de consumo, qual seja, a compra e venda de imóvel residencial. 3. A ausência de decisão acerca dos argumentos invocados pela recorrente em suas razões recursais impede o conhecimento do recurso especial. 4. Com a promulgação da Lei de Arbitragem, passaram a conviver, em harmonia, três regramentos de diferentes graus de especificidade: (i) a regra geral, que obriga a observância da arbitragem quando pactuada pelas partes, com derrogação da jurisdição estatal; (ii) a regra específica, contida no art. 4º, § 2º, da Lei nº 9.307/96 e aplicável a contratos de adesão genéricos, que restringe a eficácia da cláusula compromissória; e (iii) a regra ainda mais específica, contida no art. 51, VII, do CDC, incidente sobre contratos derivados de relação de consumo, sejam eles de adesão ou não, impondo a nulidade de cláusula que determine a utilização compulsória da arbitragem, ainda que satisfeitos os requisitos do art. 4º, § 2º, da Lei nº 9.307/96. 5. O art. 51, VII, do CDC limita-se a vedar a adoção prévia e compulsória da arbitragem, no momento da celebração do contrato, mas não impede que, posteriormente, diante de eventual litígio, havendo consenso entre as partes (em especial a aquiescência do consumidor), seja instaurado o procedimento arbitral. 6. Na hipótese sob julgamento, a atitude da recorrente (consumidora) de promover o ajuizamento da ação principal perante o juízo estatal evidencia, ainda que de forma implícita, a sua discordância em submeter-se ao procedimento arbitral, não podendo, pois, nos termos do art. 51, VII, do CDC, prevalecer a cláusula que impõe a sua utilização, visto ter-se dado de forma compulsória. 7. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, provido. (REsp 1628819/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/02/2018, DJe 15/03/2018) (grifo nosso).
Não há dúvidas de que a arbitragem atingiu um patamar de estabilidade como método de solução de conflitos no ambiente de negócios brasileiro. Do ponto de vista científico, também não se nega que a arbitragem seja matéria de estudo e venha obtendo sua autonomia em face do direito processual, embora, tenha com ele relação umbilical de cooperação. Um destes pontos de contato é exatamente a definição de quem julga primeiro o caso, quem tem prioridade em um caso com cláusula compromissória. Via de regra, estão em jogo o princípio do favor arbitralis, prioridade da arbitragem na interpretação de cláusulas, autonomia da convenção de arbitragem em face do contrato que a contenha, e o princípio da competência-competência, o árbitro tem prioridade para dizer sobre a sua própria competência.1 Tradicionalmente o direito e o Judiciário brasileiro sempre foram bastante rígidos em não analisar a convenção de arbitragem do ponto de vista interpretativo, adotando a escola francesa do princípio da competência-competência. Houve julgados em que tentou-se aplicar a análise prima facie da convenção de arbitragem.2 Todos estes questionamentos passaram a ser feitos perante o STJ por conta do desenvolvimento da técnica do conflito de competência para este fim. Tratou-se de uma ideia prática, do foro, que acabou acolhida pelo STJ e vem sendo aplicada com fervor.3 Recentemente um novo capítulo desta relação arbitragem e Judiciário com a utilização do instrumento do conflito de competência foi inaugurado com o caso JBS na medida em que discute conflitos de competência entre painéis arbitrais instaurados sob as regras da Câmara de arbitragem do mercado - B3.4 Existem em curso procedimentos arbitrais separados envolvendo a responsabilização da própria companhia, algo que foi requerido por acionistas minoritários (inovação técnica já vista em outras demandas de minoritários com a companhia5) e outro procedimento, mais tradicional do ponto de vista doutrinário, que foi requerido pela própria companhia. Este paralelismo levou a própria Companhia a requerer o conflito de competência que deu origem à decisão do ministro Marco Aurélio Belizze. Embora seja uma decisão monocrática, que ainda se sujeitará a reanalise da turma julgadora no STJ, não deixa de representar uma interessante inovação sobre a forma com a qual o STJ vem lidando com a questão desde o Caso Petrobrás.6 Parece-nos, assim, que há uma amenização do efeito negativo da convenção de arbitragem, isto é, o Judiciário poderia sim avançar sobre a análise e a interpretação da convenção de arbitragem, mas, além disso, o próprio princípio do favor arbitralis seria amenizado com a possibilidade do Judiciário e não da câmara de arbitragem, via seu regulamento, solucionar questões envolvendo painéis sob as suas regras. É uma tendência que se observa também nos Estados Unidos da América conforme o professor George Bermann indica: "Worse yet, in order to be clear and unmistakable, a delegation should appear on the face of an arbitration agreement , not be relegated to a set of procedural rules merely referenced in that agreement and almost certainly not read when the agreement is made".7 Como se vê, novos vieses de contato entre arbitragem e o Judiciário ainda estão sendo explorados, bem como o ajuste de princípios fundamentais, como o da competência-competência, tornam-se fundamentais para dosar a extensão destes pontos de contato entre a arbitragem e o Judiciário. É preciso levar em consideração, no entanto, que esta decisão elenca alguns problemas muito relevantes, que não existiram na - já tradicional - hipótese de conflito entre a jurisdição estatal e a arbitral, mas que poderão surgir no contexto de um conflito de competência entre duas câmaras arbitrais, conforme segue: a) o primeiro deles diz respeito à flexibilização do efeito negativo da convenção de arbitragem, ou seja, permitir que o Poder Judiciário resolva questões que, em princípio, seriam de competência apenas dos árbitros; b) o acolhimento do chamado "conflito positivo de competência" proposto pela própria JBS provocaria o deslocamento de um dos procedimentos arbitrais para a competência de um painel arbitral constituído por outros árbitros, sob outras regras. Nesse ponto, a autonomia de vontade das partes restaria invadida de forma muito intensa, talvez até mesmo a ponto de comprometer o interesse dessas pessoas em prosseguir com a arbitragem; c) a composição do painel arbitral de um dos procedimentos, ou de ambos, teria de ser revista, porque não seria admissível a simples unificação dos painéis, seja porque constituiriam um número par de julgadores, seja por que as partes que escolheram um dos painéis podem não querer nenhuma alteração no painel original de árbitros; d) os custos da arbitragem precisariam ser redimensionados, sob todos os aspectos. Esses problemas, dentre outros, terão de ser decididos no julgamento definitivo desse interessantíssimo leading case, ou seja, o STJ tem um grande desafio pela frente. _____ 1 Os dois últimos princípios, autonomia da cláusula compromissória e da competência-competência decorrem expressamente do art. 8º da Lei de Arbitragem. O favor arbitralis é uma decorrência destes dois outros princípios. 2 Guerrero, Luis Fernando, Princípio da Arbitragem não são Entendidos por Completo aqui. 3 Guerrero, L. F. Árbitros, juízes e conflitos de competência in Motta Pinto, A. L. B. da e Skitnevsky, K. H. (coords.), Arbitragem Nacional e Internacional - Os Novos Debates e a visão dos jovens arbitralistas, Rio de Janeiro, Elsevier, 2012. 4 STJ, CC 185.702-SP, Decisão Monocrática Rel. Min. Marco Aurélio Belizze, j. em 17/3/22. 5 Disponívelm aqui e aqui, 6 STJ, CC 151.130-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. em 27/11/19. 7 Bermann, George A. After First Options: Delegation Run Amok, 32 Am. Rev. Int'l Arb. 15 (2021). Disponível aqui.
O TJ/SP, em julgado de 29/3/22, por meio da 2ª câmara de Direito Empresarial, na apelação Cível 1002077-20.2021.8.26.0457, cujo relator foi o desembargador Jorge Tosta, prestigiou, mais uma vez, a validade da cláusula arbitral, a qual prevalece, diante da alegação de inexistência de recursos para custear o procedimento. Consta da ementa: "Apelação - Ação declaratória de nulidade/anulabilidade de ato assemblear, c/c obrigação de fazer e substitutiva de declaração de vontade - Sentença que extinguiu o processo, sem resolução de mérito, ante a existência de cláusula compromissória em acordo de acionistas - Previsão de submissão de eventuais conflitos envolvendo a avença à arbitragem - Pretensão de que seja afastada a referida cláusula, em razão da ausência de condições financeiras para custeio do procedimento arbitral - Justificativa que não se mostra suficiente à anulação da cláusula, seja porque a parte já tinha conhecimento dos custos, seja porque o processo arbitral não está submetido à política do amplo acesso - Autor, ademais, que se intitula grande acionista da maior Companhia de cachaça do mundo e que, por certo, percebe dividendos expressivos que lhe permitem suportar as despesas do procedimento arbitral - Extinção do processo mantida."1 Referida decisão cita precedente da lavra do culto desembargador Enio Zuliani: "Se essa questão financeira for alçada ao patamar de revogação da cláusula compromissória, haverá insegurança contratual injustificável e que depõe contra a ideologia de uma jurisdição estabilizada e coerente com os princípios maiores da função (solucionar conflitos)"2. Há julgado do STJ que não acolheu alegação no sentido de que o alto custo do procedimento arbitral Inglês viola a ampla defesa e contraditório, impondo-se a preservação da autonomia privada na homologação de sentença arbitral estrangeira: "Em que pesem os argumentos expendidos, da análise dos autos exsurge certo que as ora requeridas não só aderiram livremente aos contratos que continham expressamente a cláusula compromissória, como tiveram amplo conhecimento da instauração do procedimento da arbitragem, sendo certo que apresentaram mais de uma manifestação - considerações preliminares (fls. 370/385) e defesa (fls. 352/369).A partir do momento em que as requeridas celebraram contratos que continham a referida cláusula aderiram expressamente à possibilidade de solução de litígios pela via arbitral, sendo despicienda agora, nesta seara, a tentativa de se discutir a onerosidade do procedimento.No mesmo sentido, mostra-se incabível a alegação da OITO EXPORTAÇAO de ofensa à ordem pública, ao argumento de que o procedimento arbitral além de trazer limitações ao seu direito de defesa, permite que uma empresa estrangeira que praticou a justiça privada ainda tenha o direito de cobrar valores das partes prejudicadas, sendo certo que no Brasil vige a regra do monopólio da Jurisdição, não podendo os particulares exercerem a autotutela"3. No mesmo diapasão, decisão de 2019, do STJ acolheu, em relação não consumerista (duas empresas de comércio de gás natural), a tese de que a hipossuficiência de qualquer delas não afasta os efeitos da cláusula de arbitragem, aplicando-se o princípio da competência-competência4, isto é, de que cabe ao árbitro a primeira decisão sobre o tema. O TJ/SP não acolheu a alegação de hipossuficiência para afastar o princípio da competência-competência5, em contrato de distribuição de produtos médicos e hospitalares entre duas empresas. Em outra recente decisão, o citado Tribunal rechaçou a alegação de que o alto custo afasta a aplicação da cláusula arbitral, aplicando-se o princípio da obrigatoriedade dos contratos6. Portanto, temos que a alegação de alto custo da arbitragem não constitui fundamento para afastar a cláusula, permanecendo a competência do árbitro para apreciação7, nem constitui fundamento para a designação de instituição arbitral diversa da prevista em cláusula cheia8, preservando-se a autonomia da vontade, externada pela cláusula, mediante aplicação da força obrigatória dos contratos, em benefício da segurança jurídica. ____ 1 TJ/SP 2ª câmara de Direito Empresarial, na apelação Cível 1002077-20.2021.8.26.0457, julgado de 29/3/22, relator Jorge Tosta. 2 Apelação Cível 1010093-17.2014.8.26.0001, relator Enio Zuliani, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, j. 10/8/16. 3 No referido julgado consta: "Consoante anteriormente explicitado, a arbitragem foi legalmente instituída no Brasil por meio da Lei nº 9.307/96, sendo referida norma considerada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal, não violando a ordem pública brasileira a utilização da arbitragem como forma de solução de conflitos. Neste sentido: 'SENTENÇA ARBITRAL ESTRANGEIRA. CONDENAÇAO DE EMPRESA BRASILEIRA AO CUMPRIMENTO DE CLÁUSULA CONTRATUAL. REQUISITOS FORMAIS PARA O DEFERIMENTO DO PEDIDO DE HOMOLOGAÇAO OBSERVADOS. RECONHECIMENTO DA ARBITRAGEM COMO MEIO LEGAL DE SOLUÇAO DE CONFLITOS DE DIREITOS DISPONÍVEIS. LEI N. 9307/96. AUSÊNCIA, IN CASU, DE AFRONTA A PRINCÍPIOS DE ORDEM PÚBLICA. I - Não viola a ordem pública brasileira a utilização de arbitragem como meio de solução de conflitos, tanto que em plena vigência a Lei n. 9307/96 (Lei de Arbitragem), não se podendo afirmar, de outro turno, ter a ora requerida eleito esta via alternativa compulsoriamente, como sugere, até mesmo porque sequer levantou indício probatório de tal ocorrência. (omissis). IV - Observados os requisitos legais, inclusive os elencados na Resolução n. 9/STJ, de 4/5/2005, relativos à regularidade formal do procedimento em epígrafe impossibilitado o indeferimento do pedido de homologação da decisão arbitral estrangeira. V - Pedido de homologação deferido, portanto.' (SEC 874/EX, Relator Ministro FRANCISCO FALCÃO, DJ de 15/5/06). Repita-se, ainda, que na presente hipótese houve inequívoca manifestação de vontade das partes contratantes no tocante à escolha do procedimento arbitral para a solução de conflitos, não restando configurada qualquer ofensa à ordem pública. Quanto ao tema esta Corte já se manifestou anteriormente:'PROCESSUAL CIVIL. SEC - SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA. HOMOLOGAÇAO. DESCABIMENTO. ELEIÇAO DO JUÍZO ARBITRAL. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇAO EXPRESSA DA PARTE REQUERIDA. OFENSA A PRINCÍPIO DE ORDEM PÚBLICA. INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE HOMOLOGAÇAO. (omissis). 2. Na hipótese em exame, consoante o registrado nos autos, não restou caracterizada a manifestação ou a vontade da requerida no tocante à eleição do Juízo arbitral, uma vez que não consta a sua assinatura nos contratos nos quais se estabeleceu a cláusula arbitral. 3. A inequívoca demonstração da manifestação de vontade de a parte aderir e constituir o Juízo arbitral ofende à ordem pública, porquanto afronta princípio insculpido em nosso ordenamento jurídico, que exige aceitação expressa das partes por submeterem a solução dos conflitos surgidos nos negócios jurídicos contratuais privados arbitragem. 4. No caso em exame, não houve manifestação expressa da requerida quanto à eleição do Juízo Arbitral, o que impede a utilização desta via jurisdicional na presente controvérsia. 5. Pedido de homologação a que se nega deferimento." (SEC 967/EX, Relator Ministro JOSÉ DELGADO, DJ de 20/3/06)" (STJ - SEC: 507 GB 2005/0209540-1, Relator: Ministro GILSON DIPP, Data de Julgamento: 18/10/06, CE - CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: --> DJ 13/11/06 p. 204). 4 REsp 1.598.220/RN, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Terceira Turma, j. 25/6/19, DJe 1/7/19. 5 TJ/SP, 4ª Cam Dir Priv, Apel 1053037-31.2014.8.26.0002, j. 25.07.2019, unânime. No mesmo sentido: TJSP, 17ª Cam Dir Priv, Apel 0120452-31.2008.8.26.0011, j. 24/4/19, unânime; TJSP Apel 0036760-07.2007.8.26.0000, Rel. Des. Luiz Antonio de Godoy; TJSP, Apel 0003784-70.2012.8.26.0161, Rel Des Ênio Santarelli Zuliani; TJRJ, 21ª CC, Apel 0005859-60.2015.8.19.0068, j. 11.04.2018, unânime; TJSP, Apel 0029502-72.202.8.26.0451, Rel Des Ricardo Negrão; TJSP Apel 1040579-42.2015.8.26.0100, Rel Des Carlos Alberto Garbi; TJSP Apel 4010691-72.2013.8.26.0576, Rel Des Fabio Tabosa; TJPR Apel 0010731-22.2009.8.16.0001, Rel Des João Domingos Kuster Puppi; TJPR Apel 009832-87.2010.8.16.0001, Rel Des Ruy Muggiati; TJMG, Apel 0086730-20.2010.8.13.0521, Rel Des Rogério Medeiros; TJMG Apel 6041987-77.2015.8.13.0024, Rel Des Luiz Carlos Gomes da Mata. Em sentido contrário admitindo a declaração de nulidade da cláusula arbitral em situações de hipossuficiência: TJSP, Apel 1011982-63.2014.8.26.0564, Rel Des Carlos Alberto Garbi, consideraram desproporcional o custo da arbitragem, diante do negócio (franquia de sapatos) e a ausência de ciência das partes sobre os custos da arbitragem no momento da celebração da convenção; TJPA, 4ª CC, AI 162.748, j. 25.07.2016, unânime; TJBA, 5ª CC, Apel 0523742-23.2016.8.05.0001, p. 21.06.2017, unânime. Há uma corrente intermediária admitindo o controle sobre os custos da arbitragem, nesse sentido: TJSP Apel 1010093-17.2014.8.26.0001, Rel Des Ênio Zuliani, concluíram que os custos da arbitragem não eram elevados, em demanda envolvendo franquias, mantendo a arbitragem; TJSP Apel 104947-8-63.2014.8.26.0100, Rel Des Hamid Bdine, concluíram que não ocorreu no caso a modificação da situação financeira que gerasse uma incapacidade financeira da parte que assinou a cláusula, mantendo a arbitragem. 6 "No mais, como bem consignou, o alegado alto custo da arbitragem não afasta a incidência da cláusula compromissória, uma vez que, antes de celebrar o contrato, as partes tiveram a oportunidade de sopesar, de sorte que não pode dele se eximir a essa altura dos fatos, por se tratar de risco inerente ao negócio firmado. Logo, nota-se que a observância da cláusula compromissória estipulada no contrato celebrado entre as partes é medida que se impõe, pois as partes concordaram com a referida disposição quando da contratação, conforme o princípio da obrigatoriedade dos contratos ("pacta sunt servanda"). E, em razão da previsão da cláusula compromissória, os conflitos decorrentes do contrato celebrado entre as partes devem ser resolvidos mediante arbitragem, o que torna o Poder Judiciário incompetente para o julgamento desta causa", TJ-SP, 26ª Câmara de Direito Privado, Apelação Cível 1091775-75.2020.8.26.0100, Rel. Des. Dias Motta j. 5/4/21. 7 Nesse sentido vide TEPEDINO, Gustavo. ARBITRAGEM E AUTONOMIA PRIVADA: A IMPORTÂNCIA DA BOA-FÉ OBJETIVA NA DELIMITAÇÃO DO CONSENTIMENTO, Revista Quaestio Iuris, vol. 09, nº. 01, Rio de Janeiro, 2016. pp. 604-619. Igualmente vide: TJ/SP, 33ª Cam Dir Priv, Apel 1017500-23.2014.8.26.0309, j. 27.11.2017, unânime; TJ-SP, 1ª Cam Res Dir Emp, Apel 1010893-44.2016.8.26.0011, j. 3/8/17, unânime; TJ-RS, 15ª CC, Apel 70062721501, j. 27/5/15, unânime. 8 TJ-SP, 1ª Cam Res Dir Emp, Apel 1004199-59.2016.8.26.0011, j. 3/5/17, unânime.
terça-feira, 29 de março de 2022

STJ e arbitragem

RECURSO ESPECIAL 1.639.035/SP (2015/0257748-2) RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO - RECORRENTE : PARANAPANEMA S/A RECORRENTE : BANCO BTG PACTUAL S.A. ARBITRAGEM. CONTRATOS COLIGADOS. CONFLITO DECORRENTE DE CONTRATOS DE "SWAP" COLIGADOS A CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO COM CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA.2.1. Nos contratos coligados, as partes celebram uma pluralidade de negócios jurídicos tendo por desiderato um conjunto econômico, criando entre eles efetiva dependência. 2.2. Reconhecida a coligação contratual, mostra-se possível a extensão da cláusula compromissória prevista no contrato principal aos contratos de "swap", pois integrantes de uma operação econômica única. 2.3. No sistema de coligação contratual, o contrato reputado como sendo o principal determina as regras que deverão ser seguidas pelos demais instrumentos negociais que a este se ajustam, não sendo razoável que uma cláusula compromissória inserta naquele não tivesse seus efeitos estendidos aos demais Em mais um julgamento paradigmático, o STJ entendeu que a cláusula compromissória pode alcançar os contratos que não tinham essa previsão, desde que se trate de contratos coligados, ou seja, "que integrem uma operação econômica única". Embora não se trate da única possibilidade de extensão da cláusula compromissória ou do termo de arbitragem, o fato é que o "Caso Paranapanema" ganhou notoriedade e passou a servir de paradigma para outras hipóteses análogas. No julgamento do REsp 1.834.338/SP o STJ reafirmou esse entendimento, frente à "inexistência de autonomia entre as obrigações ajustadas" entre as partes. Daí por que é altamente recomendável que a partes disciplinem esse tema nos contratos que eventualmente "não sejam autônomos", porque a tendência da jurisprudência será a de considerar que a cláusula compromissória de arbitragem a todos alcança. Se as partes vislumbrarem esse possibilidade de extensão, devem levar em consideração os custos e demais particularidades da arbitragem em relação a todos os contratos coligados, aí incluída a escolha da câmara arbitral etc. Mas também é possível que as partes excluam a possibilidade de extensão, de forma explícita. Isso significa que está na esfera de autonomia da vontade das partes a limitação da arbitragem a um determinado contrato, mesmo que esse contrato não possua autonomia. Dessa forma, a limitação só poderá ser afastada pelo Poder Judiciário em circunstâncias muito especiais, em que razões de ordem pública ou de efetividade das decisões judiciais, dentre outras, justifiquem tal invasão da esfera privada dos contratantes pelo Estado.
Decisão monocrática do Ministro Marco Aurélio Bellizze, no CC nº 185.702/DF, publicada em 17/03/2022, merece uma coluna especial, já que a questão é inédita, conforme reconhecido pela própria decisão1, admitindo o processamento de Conflito de Competência entre dois Tribunais Arbitrais dentro de uma mesma Câmara de Arbitragem: "Na específica hipótese em que o correlato Regulamento é absolutamente omisso em disciplinar a solução para o impasse criado entre os Tribunais arbitrais que proferiram, em tese, decisões inconciliáveis entre si, em procedimentos arbitrais que possuem pedidos e causa de pedir parcialmente idênticos (controvertendo-se as partes sobre a amplitude de cada qual, se haveria litispendência - parcial - entre os feitos ou mesmo relação de continência), tendo a Presidência da Câmara reconhecido, inclusive, não ter atribuição para dirimi-lo, segundo as disposições do Regulamento. A questão posta guarda contornos absolutamente inéditos na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (sobretudo após o leading case CC 111.230/DF, julgado em 8.5.2013), cabendo ao relator do presente incidente, que atua em delegação do colegiado da Segunda Seção, a quem compete dar a palavra final sobre o conhecimento e, em sendo o caso, o julgamento do conflito de competência, permitir o processamento do feito e, por meio da adoção de medidas acautelatórias, salvaguardar tal deliberação"2. Feito uma breve síntese do caso, resta lembrar que cabe ao Superior Tribunal de Justiça3 julgar o conflito de competência entre o Judiciário e o árbitro4, diante da interpretação extensiva do termo "Tribunais" do artigo 105, I, "d", da Constituição Federal. Entretanto, o conflito de competência entre instituições arbitrais diversas não é competência do Superior Tribunal de Justiça, mas do juízo de primeiro grau5, situação diversa do caso em comento, já que envolve dois Tribunais diferentes dentro da mesma instituição arbitral. Além do ineditismo do tema, a decisão em comento6 reafirma a natureza jurisdicional da arbitragem, corrente predominante na doutrina7 e jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça8 e de Tribunais Estaduais9, já que o artigo 18 da Lei em estudo prevê que o árbitro é juiz de fato e de direito, demonstrando, de forma clara, que o árbitro exerce a jurisdição. Ademais, a sentença arbitral produz os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário (artigo 31, da Lei da Arbitragem), configura título executivo judicial (artigo 515, VII do Código de Processo Civil de 2015 e artigo 31, da Lei da Arbitragem), sujeito a impugnação ao cumprimento de sentença, nos termos do artigo 525 e seguintes do Código de Processo Civil de 2015, conforme prevê o artigo 33, §3º da Lei de Arbitragem. Não se pode olvidar que o Código de Processo Civil de 2015 equiparou a carta arbitral à carta precatória expedida por (artigos 237, IV, 260 e 267), corroborando a natureza jurisdicional da arbitragem, defendida por Carnelutti10. Importante citar que a decisão em comento afastou a apreciação da questão do conflito de competência pelo juiz de primeira instância, uma vez que inexistente atribuição legal ou constitucional a esse propósito, reafirmando a inexistência de hierarquia e/ou de vinculação entre jurisdição estatal e a arbitral. Em poucas palavras, consta da decisão que não há subordinação ou vinculação entre Tribunal arbitral e Judiciário (de primeira e segunda Instância), já que o ordenamento jurídico somente consagra a possibilidade de ação anulatória, restrita às hipóteses do artigo 32 da Lei de Arbitragem ou à execução da sentença arbitral, possibilitando a impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, tal como a judicial. Acrescenta o Ministro Belizze a particularidade do caso concreto de que os Tribunais arbitrais suscitados são vinculados à mesma Câmara de Arbitragem, cujo regulamento é "omisso em disciplinar a solução para o impasse criado entre os Tribunais arbitrais que teriam proferido, em tese, decisões inconciliáveis entre si, em procedimentos arbitrais que possuem pedidos e causa de pedir parcialmente idênticos, tendo a Presidência da Câmara reconhecido, justamente, não ter atribuição para dirimi-lo, segundo as disposições do Regulamento". Como bem ressaltado, na decisão, o regulamento de arbitragem nem sempre é capaz de antever todas as situações práticas que mereçam um regramento específico, prevenindo impasses, motivo pelo qual admitiu o conflito de competência, determinando a suspensão cautelar dos Procedimentos Arbitrais, até o julgamento final do incidente pelo Colegiado. Outro ponto interessante abordado na decisão em tela consiste no fato de que a reunião entre feitos ensejaria a "a descabida imposição de submeter uma das partes ao julgamento de um Tribunal arbitral cuja composição não foi por ela escolhido, em clara afronta aos arts. 13 e 19 da lei 9.307/1996". Esta circunstância haverá de ser sopesada, necessariamente, por ocasião do julgamento final do presente conflito de competência". Não podemos deixar de elogiar a riqueza da fundamentação da citada decisão, prestigiando, mais uma vez, a arbitragem11, impondo-se concluir que é importante a reflexão da comunidade arbitral no sentido da revisão dos regulamentos das instituições arbitrais, com a previsão de competência de órgão interno (Conselho Deliberativo ou Presidência) ou comitê constituído para decisão acerca destes conflitos, proporcionando rápida solução da questão, evitando-se a propositura de conflito de competência perante o Superior Tribunal de Justiça. __________ 1 Esta decisão consta do site oficial do Superior Tribunal de Justiça, sem restrição para acesso, motivo pelo qual divulgamos neste curto artigo. 2 Cf. trecho da decisão em comento. 3 ROCHA, Caio Cesar Vieira. Conflito positivo de competência entre árbitro e magistrado. Revista de Arbitragem e Mediação, São Paulo, ano 09, v. 34, p. 263-286, jul./set. 2012.   4 STJ, CC 111.230/DF, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 08/05/2013, DJe 03/04/2014; STJ, 2ª Seção, CC 146939, j. 23.11.2016, unânime; e STJ, CC 151.130, j. 09.03.2017, monocrática (decisão reconsiderada pela PET no CC 151.130). 5 STJ, 2ª Seç., CC 113260, j. 08.09.2010, maioria. 6 Consta da decisão "Em delimitação a esta atribuição constitucional do Superior Tribunal de Justiça, a jurisprudência da Segunda Seção, tomando como premissa a compreensão de que a atividade desenvolvida no âmbito da arbitragem possui natureza jurisdicional, reconhece a competência desta Corte de Justiça para dirimir conflito de competência em que figura, seja como suscitante, seja como suscitado, o Tribunal arbitral. É de suma importância registrar que, não obstante a aceitação prevalecente no cenário jurídico nacional do caráter jurisdicional da arbitragem, sobretudo após a declaração de constitucionalidade da Lei 9.307/1996 pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento da SE 5.206 (STF. SE 5206 AgR, Relator Ministro Sepúlveda Pertence, Tribunal Pleno, julgado em 12/12/2001, DJ 30-04-2004 PP-00059 EMENT VOL-02149-06 PP-00958), dúvidas remanesciam, sobretudo no âmbito desta Corte de Justiça, se a equiparação do árbitro ao "juiz de fato e de direito" (Lei 9.307/96, art. 18) o colocaria na condição de órgão passível de protagonizar conflito de competência nos moldes definidos no art. 66 do CPC e 105, I, d, da CF, dispositivo este inserido no capítulo da Constituição estruturante do Poder Judiciário. A partir do julgamento do leading case, o Conflito de Competência n. 111.230/DF (Rel. Ministra Nancy Andrighi, julgado em 08/05/2013, DJe 03/04/2014), é possível afirmar que a Segunda Seção do STJ estabeleceu o caráter jurisdicional da arbitragem, reconhecendo ser possível a existência de conflito de competência entre juízo estatal e câmara arbitral, a ser dirimido por esta Corte de Justiça. Esta conclusão decorre do reconhecimento de que o Tribunal arbitral, a despeito de não compor organicamente o Poder Judiciário, deve ser compreendido na expressão "quaisquer tribunais" a que a norma constitucional em questão (art. 105, I, d, CF) se refere, sobretudo, porque, tal como o Judiciário, resolve o conflito de interesses em definitivo, com aplicação da ordem jurídica. Este julgado representou verdadeiro divisor de águas na jurisprudência desta Corte de Justiça, passando-se a admitir, doravante, o processamento, no âmbito desta instância especial, dos conflitos de competência protagonizados por Tribunal arbitral em confronto, naquele caso, com órgãos integrantes organicamente do Poder Judiciário". 7 CARMONA, Carlos Alberto, Arbitragem e processo: um comentário à Lei n. 9.307/96, 3. ed., São Paulo: Atlas, 2009, p. 268-269; BATISTA MARTINS, Pedro. Apontamentos sobre a Lei de Arbitragem. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 218-219; THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil, 34ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2005, V III, p. 330. CAHALI, Francisco José. Curso de Arbitragem. 6ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017. p. 133. FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Arbitragem, jurisdição e execução. 2. ed. São Paulo: RT, 1999. p. 157. ARRUDA ALVIM, José Manoel de. Sobre a natureza jurisdicional da arbitragem. In: CAHALI, Francisco José; RODOVALHO, Thiago; FREIRE, Alexandre (Coord.). Arbitragem. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 142. DINAMARCO, Cândido Rangel. Arbitragem na teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros, 2013. p. 41. SESTER, Peter Christian, Comentários à Lei de Arbitragem e à Legislação Extravagante, São Paulo, Quartier Latin, 2020.   8 Trata-se da posição adotada pelo Superior Tribunal de Justiça, STJ, 2.ª Seção, CC n.º 113.260/SP, Min. João Otávio de Noronha, j. 08.09.2010, DJ 07.04.2011. No mesmo sentido vide: "PROCESSO CIVIL. ARBITRAGEM. NATUREZA JURISDICIONAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA FRENTE A JUÍZO ESTATAL. POSSIBILIDADE. MEDIDA CAUTELAR DE ARROLAMENTO. COMPETÊNCIA. JUÍZO ARBITRAL. 1. A atividade desenvolvida no âmbito da arbitragem tem natureza jurisdicional, sendo possível a existência de conflito de competência entre juízo estatal e câmara arbitral. 2. O direito processual deve, na máxima medida possível, estar a serviço do direito material, como um instrumento para a realização daquele. Não se pode, assim, interpretar uma regra processual de modo a gerar uma situação de impasse, subtraindo da parte meios de se insurgir contra uma situação que repute injusta. 3. A medida cautelar de arrolamento possui, entre os seus requisitos, a demonstração do direito aos bens e dos fatos em que se funda o receio de extravio ou de dissipação destes, os quais não demandam cognição apenas sobre o risco de redução patrimonial do devedor, mas também um juízo de valor ligado ao mérito da controvérsia principal, circunstância que, aliada ao fortalecimento da arbitragem que vem sendo levado a efeito desde a promulgação da Lei nº 9.307/96, exige que se preserve a autoridade do árbitro como juiz de fato e de direito, evitando-se, ainda, a prolação de decisões conflitantes. 4. Conflito conhecido para declarar a competência do Tribuna Arbitral", (STJ - CC: 111230 DF 2010/0058736-6, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 08/05/2013, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 03/04/2014). Recentemente, reiterou o STJ este entendimento: "AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA. INCIDENTE MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. JUÍZO ARBITRAL E JUÍZO ESTATAL. ARBITRAGEM. NATUREZA JURISDICIONAL. MEIOS ALTERNATIVOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITO. DEVER DO ESTADO. PRINCÍPIO DA COMPETÊNCIA-COMPETÊNCIA. PRECEDÊNCIA DO JUÍZO ARBITRAL EM RELAÇÃO À JURISDIÇÃO ESTATAL. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Segundo a regra da Kompetenz-Kompetenz, o próprio árbitro é quem decide, com prioridade ao juiz togado, a respeito de sua competência para avaliar a existência, validade ou eficácia do contrato que contém a cláusula compromissória, nos termos dos arts. 8º, parágrafo único, e 20 da Lei nº 9.307/1996. 2. O caráter jurisdicional da arbitragem, decorrente da regra Kompetenz-Kompetenz, prevista no artigo 8º da lei de regência, impede a busca da jurisdição estatal quando já iniciado o procedimento arbitral, operando-se o efeito negativo da arbitragem previsto no art. 485, VII, do NCPC. 3. Na hipótese dos autos as informações prestadas pelo Juízo Arbitral dão conta de que, além de se pronunciar sobre a sua própria competência com a efetiva verificação da cláusula compromissória existente no contrato celebrado entre as partes, foi comprovada a alteração de sua denominação social com a juntada do documento respectivo. 4. Agravo interno não provido" (STJ - AgInt nos EDcl no AgInt no CC: 170233 SP 2019/0386014-7, Relator: Ministro MOURA RIBEIRO, Data de Julgamento: 14/10/2020, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 19/10/2020). O Tribunal Constitucional de Portugal adota a tese da natureza jurisdicional da arbitragem, vide Acórdãos nºs 230/86, 52/92, 506/96, 181/2007, 42/2014. 9 TJ-GO - APL: 00082351920178090006, Relator: ORLOFF NEVES ROCHA, Data de Julgamento: 02/05/2018, 1ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ de 02/05/2018; TJ-ES - APL: 00130471420168080024, Relator: ÁLVARO MANOEL ROSINDO BOURGUIGNON, Data de Julgamento: 02/10/2018, SEGUNDA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 06/12/2018; TJ-MG - AC: 10223150104873001 Divinópolis, Relator: Arnaldo Maciel, Data de Julgamento: 12/09/2017, Câmaras Cíveis / 18ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 15/09/2017.   10 Instituciones del Proceso Civil, tradução da quinta edição italiana por Santiago Sentis Melendo, Buenos Aires, Ed. Jurídicas Europa-America, 1989, v. I, p. 109-114. 11 Sobre o prestígio da jurisdição arbitral pelo Superior Tribunal de Justiça vide aqui.
Muito já se falou da importância do Dispute Board como meio adequado de solução de controvérsias sobretudo em contratos de obras, de trato sucessivo e de longa adequação. A matéria ganha ainda mais relevo quando o assunto envolve a Administração Pública, com sua obras vultosas e porque não dizer vultuosas, ainda mais quando os conflitos decorrem de problemas técnicos e que poderiam ser resolvidos rapidamente, quando apresenta-se um instrumento de solução do conflito mais adequado. Neste cenário o dispute board, caracterizado pela formação de um painel por peritos (geralmente de engenharia no caso de execução de obras), que durante o curso do contrato são acionados de maneira a solucionar conflitos que surgem na execução. Via de regra, a formação do painel ou comitê é prevista em cláusula contratual específica, que prevê a forma de indicação (em geral cada parte indica um especialista e ambos indicam um terceiro), e que tem a função de supervisionar, prevenir, e resolver conflitos durante a execução do contrato, evitando assim o início de uma arbitragem ou disputa judicial. A grande questão do dispute board é que, embora de uso comum, não tem o caráter jurisdicional da arbitragem, ou seja, não são institutos equivalentes, o que pode levar as partes a questionar judicialmente ou na via arbitral a decisão do comitê. A necessidade da aprovação de uma legislação específica sobre o tema, trará garantias ao instituto, e se mostra a cada dia mais necessária sua aprovação. Especificamente sobre o tema o PLS 206/18 de origem no Senado e já aprovado nesta casa iniciadora (tramitando sob o número 2.421/21 na Câmara), e o PL 9.883/18 cuja a origem é da Câmara, tratam da dispute board e alguns pontos merecem ser abordados.  Embora apresentando pequenas diferenças, no mérito em muito se aproximam. Em síntese o PLS 206/18 do Senado, tendo por base a legislação do Município de São Paulo tem como preocupação a previsão da cláusula de dispute board inserida no instrumento convocatório da licitação e no contrato administrativo, para dirimir conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis em contratos da administração direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, A cláusula pode ainda ser inserida mediante acordo entre as partes por aditamento. Por sua vez o Comitê de Prevenção e Solução de Disputas pode ter natureza revisora, adjudicativa ou híbrida, a depender dos poderes que lhe forem outorgados pelo contrato celebrado, devendo sempre apresentar os fundamentos das suas recomendações e decisões, sob pena de nulidade: I - ao Comitê por Revisão é conferido o poder de emitir recomendações não vinculantes às partes em litígio; II - ao Comitê por Adjudicação é conferido o poder de emitir decisões vinculantes às partes em litígio; e III - o Comitê Híbrido poderá tanto recomendar quanto decidir sobre os conflitos, cabendo à parte requerente estabelecer a sua competência revisora ou adjudicativa. Deverão ainda ser respeitados os princípios da legalidade e da publicidade por parte do Comitê.1 Quanto a formação do Comitê, na proposta do Senado temos a previsão de 3 (três) membros, sendo 2 (dois) com reconhecido saber na área objeto do contrato e 1 (um) advogado com reconhecida atuação jurídica na área objeto do contrato: I - 1 (um) escolhido pelo Poder Público; II - 1 (um) escolhido pela contratada; III - 1 (um) escolhido em conjunto pelos outros 2 (dois) membros, o qual será o Presidente do Comitê.2 Pois bem, a grande novidade das duas propostas legislativas do instituto da Dispute Board envolvendo o Poder Público diz respeito ao aumento das garantias quanto a validade e eficácia da decisão proferida pelo comitê . Nesse sentido o PL 206 do Senado prevê que recomendações do Comitê poderão ser objeto de compromisso, nos termos do art. 26 do decreto-lei 4.657, de 4 de setembro de 1942 (Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro). Assim, lembrando que o art 26 da LINDB traz a chamada cláusula geral de acordo administrativo, para fins de resolução de controvérsia, temos que a decisão proferida pelo comitê passa a ser objeto de acordo administrativo, podendo o poder público celebrar compromisso com os interessados e dessa maneira liminar irregularidade, incerteza jurídica ou situação contenciosa na aplicação do direito público. Se necessário fara a oitiva de órgãos interessados ou mesmo se valer de consultas públicas.  E no parágrafo segundo do art. 2temos a garantia que as recomendações e as decisões proferidas pelos Comitês de Prevenção e Solução de Disputas poderão ser reformadas pelo Poder Judiciário ou, quando houver convenção neste sentido, por arbitragem.3 Por tudo isso, embora não exista um verdadeiro opt out em relação ao jurisdição estatal, ambas propostas legislativas visam dar uma maior garantia quanto a qualidade da decisão proferida pelo Comitê, seja pela forma de escolha de seus membros, seja, pela previsão do escalonamento do conflito, onde uma vez delimitado e não satisfazendo umas das partes possa ser discutido tanto pela arbitragem, tanto pelo judiciário que já tem se mostrado favorável a manter as decisões eminentemente técnicas proferidas por comitês de resolução de conflitos.4 _____________ 1 PL 9883/2018 da Câmara prevê: Art. 8º Os Comitês poderão ter natureza revisora, adjudicatória ou híbrida, a depender dos poderes que lhes forem outorgados no contrato administrativo: I - os Comitês de Revisão (Dispute Review Boards) emitem recomendações, não vinculantes às partes em litígio; II - os Comitês de Adjudicação (Dispute Adjudication Boards) emitem decisões, de adoção obrigatória e imediata pelas partes em litígio; 3 III - os Comitês Híbridos (Combined Dispute Boards) emitem recomendações e decisões, a depender da forma como o litígio lhe for submetido pelas partes contratantes 2 Por sua vez no projeto da Câmara PL 9883/2018 temos diferenças de composição : Art. 3º Os Comitês serão compostos por três membros, sendo dois com conhecimento técnico sobre o objeto do contrato, para exercer a função de Membro Técnico, e um com formação jurídica, para atuar na função de Presidente do Comitê. § 1º Os membros do Comitê deverão ser pessoas de confiança das partes, escolhidas consensualmente e na forma prevista no contrato, e deverão agir, no desempenho de suas funções, com independência, imparcialidade, competência e diligência. § 2º Excepcionalmente, quando a complexidade do contrato assim o exigir, os Comitês poderão ter em sua composição um número maior de membros técnicos 3 O PL 9883/2018 da Câmara prevê: Art. 9º As partes contratantes têm o prazo de 30 (trinta) dias para manifestar discordância da recomendação emitida pelo Comitê, hipótese em que a questão pode ser levada à arbitragem ou ao Poder Judiciário, tornando-se obrigatório o cumprimento da recomendação apenas depois de confirmada por sentença arbitral ou judicial. Parágrafo único. Decorrido o prazo do caput sem qualquer manifestação das partes contratantes, a recomendação passa a vinculá-las de imediato. Art. 10. As decisões emitidas pelos Comitês poderão ser submetidas à arbitragem ou ao Poder Judiciário em caso de inconformismo de qualquer das partes contratantes, respeitados os prazos prescricionais e decadenciais previstos em lei. § 1º As partes só ficam desobrigadas do cumprimento das decisões emitidas pelos Comitês a partir de sentença arbitral ou judicial que assim o determine. 4 Nesse sentido, comentam Flávia Câmara e Castro e Leonardo Guimarães, demonstrando um pouco da experiência do Metrô de São Paulo: "Apesar de já estar disseminada em países como os Estados Unidos, a aplicação desse método é bastante recente no Brasil. Não há lei federal que o regule, apesar de já existir um PL em trâmite no Senado. Em âmbito de legislação municipal, apenas a Prefeitura de São Paulo já fomentou e regularizou a utilização dos 'Comitês de Prevenção e Resolução de Disputas'. Além disso, há algumas regulações acerca do método previstas em câmaras privadas de arbitragem e mediação. Os dispute boards foram inseridos no âmbito brasileiro, em grande parte, como consequência de imposições do Banco Interamericano de Desenvolvimento e do Banco Mundial, que exigem essa prerrogativa para financiamentos de obras de infraestrutura. Recentemente, o metrô de São Paulo foi condenado pelo TJ/SP a pagar quantia extra, equivalente a R$10 milhões, ao consórcio formado pelas construtoras Tiisa e Comsa, que realizou as obras da Linha Amarela. Tal dívida deve como pano de fundo uma divergência entre as partes acerca dos custos de retirada de material contaminado da construção. Na ocasião, um dispute board, previsto no contrato de construção e formado por três técnicos - dois engenheiros e um advogado -, foi acionado. Quando acionada, essa equipe, contratada pelas partes para solucionar os conflitos surgidos durante a execução do contrato, havia decidido pelo pagamento do valor acima mencionado. Quando o Tribunal de Justiça foi demandado, optou por manter a decisão do dispute board. Dessa forma, o TJ/SP reforçou a autonomia e o poder decisório desse método extrajudicial, contribuindo para sua eficácia. O entendimento do Tribunal revela uma tendência nacional de valorização dos métodos alternativos ou, como também chamados, adequados de solução de conflitos, deixando a resolução judicial como a última alternativa." (CÂMARA, Flávia; GUIMARÃES, Leonardo. Dispute board: o método de solução de conflitos que vem ganhando espaço no Brasil. Migalhas, de 24 ago. 2018. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI286212,21048-Dispute+board+o+metodo+de+solucao+de+conflitos+que+vem+ganhando. Acesso em: 30 nov. 2019).
RECURSO ESPECIAL Nº 1.433.940 - MG (2014/0024753-9) RECURSO ESPECIAL. AÇÃO ANULATÓRIA DE PROCEDIMENTO ARBITRAL. POLO PASSIVO. ÓRGÃO ARBITRAL INSTITUCIONAL. CÂMARA ARBITRAL. NATUREZA ESSENCIALMENTE ADMINISTRATIVA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. INTERESSE PROCESSUAL. AUSÊNCIA. 1. A instituição arbitral, por ser simples administradora do procedimento arbitral, não possui interesse processual nem legitimidade para integrar o polo passivo da ação que busca a sua anulação. 2. Recurso especial provido. STJ. Rel. Min. Vilas Bôas Cueva, j. 02.10.17.              Em linhas gerais, o posicionamento do STJ a respeito da legitimidade da administradora do procedimento arbitral é irretocável. Da mesma forma, a inclusão dos próprios árbitros no polo passivo de uma ação em que se busca a desconstituição de uma decisão arbitral afigura-se igualmente incorreta. Nenhuma dessas pessoas possui legitimidade para tanto. O absurdo seria tão grande quanto o de incluir o Poder Judiciário e o juiz que proferiu uma determinada decisão no polo passivo de uma ação rescisória. A legitimidade decorre de uma regra simples: aquele que for o titular de uma determinada relação de direito material estará, ao menos em tese, habilitado a figurar num processo em que se discute essa relação. Nos termos do disposto no art. 18 do CPC, "ninguém pode pleitear direito alheio em nome próprio, salvo quando autorizado pelo ordenamento jurídico". Em outras palavras, apenas os titulares do direito material é que podem figurar como partes no processo em que esses direitos serão discutidos, ressalvadas, obviamente, as hipóteses de substituição processual. Daí por que, repita-se, esse leading case do STJ que está em tela é irretocável, mas desse entendimento não decorre, obviamente, que em nenhuma hipótese a instituição arbitral pode ser parte num processo. Se a gestão do procedimento arbitral foi temerária por parte de uma determinada instituição, nada impede que, a título de indenização, essa instituição seja ré numa determinada demanda. Nesse caso, a relação material discutida não envolve invalidação da decisão arbitral, mas sim a má-fé ou a desídia da instituição arbitral na administração de um determinado litígio arbitral. É o caso, por exemplo, de culpa in eligendo a nomeação de um presidente de painel arbitral que não reúne condições mínimas de conduzir uma determinada arbitragem, quando dessa condução advém algum prejuízo às partes justamente pela ausência de capacidade técnica do presidente do painel. Nesse caso, a instituição arbitral responde pelos prejuízos decorrentes da sua falta de critérios de escolha de presidentes de painel, quando lhes competir essa escolha. Também se pode pensar na responsabilidade das instituições arbitrais pela guarda e proteção de documentos e informações pessoais (LGPD), pelos atrasos na condução dos procedimentos dentre tantas outras situações. Em síntese, a legitimidade sempre decorrerá da análise dos pedidos formulados em juízo e estes, por certo, sempre estarão conectados a uma determinada relação de direito material que se pretende discutir em juízo.
Reiteramos o que dissemos no primeiro artigo desta coluna que a jurisdição arbitral é prestigiada pela interpretação do Superior Tribunal de Justiça, tanto que Ministros da Corte da Cidadania destacam o crescente papel da arbitragem como mecanismo de solução de conflitos1. Em setembro de 2021 a terceira turma do STJ2 reafirmou dois entendimentos consolidados sobre arbitragem: i) é possível a "cumulação de motivos de nulidade em sede de impugnação, desde que o impugnante ofereça a defesa dentro do prazo de 90 (noventa) dias a contar da notificação da sentença arbitral", aplicando julgado da Terceira Turma do STJ3. Desta forma prestigia-se a celeridade, efetividade e segurança jurídica das partes signatárias do compromisso arbitral, conforme salienta o julgado em comento. Esta é a tese que adotamos em nosso livro, com as vênias aos defensores da tese contrária. Ultrapassado o prazo não há falar-se em possibilidade de impugnação4, evitando-se que a coisa julgada fique sujeita a impugnação eternamente, em afronta ao princípio da segurança jurídica5, elemento essencial do Estado Democrático de Direito6.   ii) o Judiciário não está autorizado a proceder a modificação do mérito da sentença arbitral, afirmaram os ministros que: "a pretensão postulada em juízo de especificar a responsabilidade individual de cada consorciada refoge do mérito decidido pelo Tribunal arbitral, que acabou por firmar a responsabilidade solidária das consorciadas, requeridas no procedimento arbitral", certo que este tema nem foi objeto do pedido de esclarecimentos, conforme salientado no acórdão. A tese sobre a impossibilidade da revisão do mérito da sentença arbitral foi adotada desde 1956 pela primeira turma do STF7 e reafirmada em diversos julgados recentes8, inclusive em sede de impugnação de cumprimento de sentença, embargos à execução ou exceção de pré-executividade9, também diante de sentença arbitral que homologava acordo firmado entre as partes10. Peter Sester salienta que a não correção do mérito da sentença arbitral pelo Judiciário tem contribuído para o sucesso da arbitragem11. Portanto, o presente julgado constitui mais um do rol daqueles que confirmam o fortalecimento da arbitragem no Brasil e o seu prestígio pelo STJ. _____ 1 Conforme notícia intitulada "A jurisdição arbitral prestigiada pela interpretação do STJ", extraída do site do Superior Tribunal de Justiça. Disponível aqui. 2 REsp 1.862.147/MG, relator ministro Bellizze. 3 REsp 1.900.136/SP, relator ministro Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 06.04.2021. Consta do informativo 691 do STJ: "A declaração de nulidade da sentença arbitral pode ser pleiteada, judicialmente, por duas vias: (i) ação declaratória de nulidade de sentença arbitral (art. 33, § 1º, da lei 9.307/96) ou (ii) impugnação ao cumprimento de sentença arbitral (art. 33, § 3º, da lei 9.307/96). Se a declaração de invalidade for requerida por meio de ação própria, há também a imposição de prazo decadencial. Esse prazo, nos termos do art. 33, § 1º, da Lei de Arbitragem, é de 90 (noventa) dias. Sua aplicação, reitera-se, é restrita ao direito de obter a declaração de nulidade devido à ocorrência de qualquer dos vícios taxativamente elencados no art. 32 da referida norma. Assim, embora a nulidade possa ser suscitada em sede de impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, se a execução for ajuizada após o decurso do prazo decadencial da ação de nulidade, a defesa da parte executada fica limitada às matérias especificadas pelo art. 525, § 1º, do CPC/15, sendo vedada a invocação de nulidade da sentença com base nas matérias definidas no art. 32 da lei 9.307/96". 4 Nesse sentido: Enunciado 10 da I Jornada de Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios. "O pedido de declaração de nulidade da sentença arbitral formulado em impugnação ao cumprimento da sentença deve ser apresentado no prazo do art. 33 da lei 9.307/96", disponível aqui. 5 A imutabilidade da coisa julgada visa garantir a certeza do direito e estabilidade das relações jurídicas, dos quais decorrem o princípio da segurança jurídica que significa: "À implantação de um valor específico, qual seja o de coordenar o fluxo das interações interhumanas, no sentido de propagar no seio da comunidade social o sentimento de previsibilidade quanto aos efeitos jurídicos da conduta. Tal sentimento tranqüiliza os cidadãos, abrindo espaço para o planejamento de ações futuras, cuja disciplina jurídica conhecem, confiantes que estão no modo pelo qual a aplicação das normas do direito se realiza. Concomitantemente, a certeza do tratamento normativo dos fatos já consumados, dos direitos adquiridos e da força da coisa julgada, lhes dá a garantia do passado. Essa bidirecionalidade passado/futuro é fundamental para que se estabeleça o clima de segurança das relações jurídicas" , Paulo de Barros Carvalho, Curso de Direito Tributário, p. 92. "Além de tudo, como conclui Radbruch, um direito incerto é também um direito injusto, pois não é capaz de assegurar a fatos futuros tratamento igual", ministro Moreira Alves, STF, Ação Declaratória de Constitucionalidade 1-1/DF. 6 Nelson Nery Júnior aponta: "a doutrina mundial reconhece o instituto da coisa julgada material como elemento de existência do estado democrático de direito (v.g. Katharina Sobota, Das Princip Rechtsstaat, Mohr, Tübíngen, 1997, p. 179 ss; Philip Kuning, Das Rechtsstaatsprinzip, Mohr, Tübíngen, 1986; Maurer, Kontinuitätsgewähr und Vertrauensschutz, in Josef Isensee & Paul Kirchhof [coordenadores], "Handbuck des Staatsrechts", v. III, Heidelberg, 1988, p. 211 ss, especialmente n. 100, p. 269 ss; Schwab-Gottwald, Verfanssung, II, 5, p. 28).Quando se fala da intangibilidade da coisa julgada, não se deve dar ao instituto tratamento jurídico inferior, de mera figura do processo civil, regulada por lei ordinária, mas, ao contrário, impõe-se o reconhecimento da coisa julgada com a magnitude que lhe é própria, ou seja, de elemento formador do estado democrático de direito, que não pode ser apequenado por conta de algumas situações, velhas conhecidas da doutrina e jurisprudência", CPC Anotado, op. cit., p. 791. 7 Já antes da atual Lei de Arbitragem, quando era exigida homologação da sentença arbitral pelo Poder Judiciário, o STF sufragou entendimento de ser descabida reanálise do mérito da sentença arbitral pelo juízo estatal (STF, 1ª T., RE 32.226, j. 16.08.1956, unânime). 8 STJ, AREsp 1.662.996, j. 3/8/20, monocrática | STJ, 4ª T., AgInt 1.566.306, j. 30.03.2020, unânime; STJ, 3ª T., AgInt 1.143.608, j. 18.03.2019, unânime; STJ, 3ª T., REsp 1.636.102, j. 13/6/17, unânime; STJ, AREsp 404.752, j. 30/8/16, monocrática; TJ/GO, 5ª CC, AI 5.637.901-41.2020.8.09.0000, j. 1/3/21, unânime; TJ/PR, 4ª CC, AI 0051089-46.2020.8.16.0000, j. 26.02.2021, unânime; TJ/SP, 2ª Cam Res Dir Emp, AI 1118383-81.2018.8.26.0100, j. 1/12/20, monocrática; TJGO, 1ª CC, apel. 5021737-96.2017.8.09.0051, j. 23/11/20, unânime; TJSP, 2ª Câm Res Dir Emp, AI 2193202-10.2020.8.26.0000, j. 27/10/20, unânime. 9 STJ, REsp 1.865.591, j. 10/6/20, monocrática; TJ/GO, 1ª CC, AI 5495629-24.2020.8.09.0000, j. 15/3/21, unânime; TJSP, 31ª Cam Dir Priv, AI 2103984-05.2019.8.26.0000, j. 22/9/20, unânime; TJSP, 33ª Câm Dir Priv, AI 2198020-05.2020.8.26.0000, j. 2/9/20, unânime; TJGO, 3ª CC, AI 5067862-76.2020.8.09.0000, j. 28.07.2020, unânime. 10 STJ, AREsp 1.580.104, j. 12/3/20, monocrática; TJ/GO, 4ªCC, Apel. 5154856-07.2019.8.09.0174, j. 8/3/21, unânime; TJ/GO, 5ª CC, Apel 0366890-09.2013.8.09.0051, j. 30/3/20, unânime; TJ/GO, 3ª CC, Apel 0119922.13.2016.8.09.0175, j. 7/5/19, monocrática; TJ/GO, 4ª CC, AI 5366577-77.2017.8.09.0000, j. 30/11/17, unânime. No Tribunal de Justiça de São Paulo vide: "Cumprimento de sentença - Restituição de valores - Acordo arbitral homologado por sentença -[...] Rediscussão dos termos do acordo arbitral e revisão do contrato firmado entre as partes que não pode ser admitida - Trânsito em julgado da sentença arbitral - Reexame de mérito que resta vedado, sob pena de violação ao princípio da coisa julgada" (TJ/SP, Apel. 1025695-49.2018.8.26.0602, Rel. Des. José Joaquim dos Santos, j. 30/9/20). 11 SESTER, Peter Christian, Comentários à Lei de Arbitragem e à Legislação Extravagante, São Paulo, Quartier Latin, 2020, p. 49.
Em coluna anterior mencionamos que a jurisdição arbitral é prestigiada pela interpretação do Superior Tribunal de Justiça, tanto que Ministros da Corte da Cidadania destacam o crescente papel da arbitragem como mecanismo de solução de conflitos1. O julgado, ora em comento, reafirma tal premissa. O objeto deste breve artigo é tecer algumas considerações sobre o recente julgado do Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial 1.953.212/RJ, de 26/10/21, que concluiu na linha da jurisprudência anterior do mesmo Tribunal: "As ações movidas em face de empresas em recuperação judicial que demandam quantias ilíquidas devem tramitar regularmente onde foram propostas, inclusive aquelas submetidas a juízo arbitral, até a apuração do montante devido. 5. A natureza do crédito (concursal ou extraconcursal) não é critério definidor da competência para julgamento de ações (etapa cognitiva) propostas em face de empresa em recuperação judicial, mas sim as regras ordinárias dispostas na legislação processual. 6. O que constitui competência exclusiva do juízo universal, segundo a jurisprudência deste Tribunal, é a prática ou o controle de atos de execução de créditos individuais promovidos contra empresas falidas ou em recuperação judicial. 7. Segundo a regra da kompetenz-kompetenz, incumbe aos próprios árbitros decidir a respeito de sua competência para avaliar a existência, validade ou eficácia do contrato que contém a cláusula compromissória. 8. O deferimento do pedido de recuperação judicial não tem o condão de transmudar a natureza de direito patrimonial disponível do crédito que a recorrida procura ver reconhecido e quantificado no procedimento arbitral. 9. Reconhecida a competência do tribunal arbitral para processamento e julgamento da demanda perante ele proposta - que se limita à apuração dos créditos inadimplidos no âmbito do contrato de prestação de serviços celebrado entre as partes -, não há falar em nulidade da sentença parcial por ele proferida, revelando-se escorreita a conclusão do acórdão recorrido". Convém lembrar que há regra disposta no artigo 6º, § 9º, da lei 11.101/05 (com redação dada pela lei 14.112/20), consagrando que o processamento da recuperação judicial ou a decretação da falência não autoriza o administrador judicial a recusar a eficácia da convenção de arbitragem, não impedindo ou suspendendo a instauração de procedimento arbitral. Em poucas palavras, não pode o administrador judicial recusar a eficácia da cláusula compromissória, uma vez que esta possui autonomia em relação ao contrato, conforme decidiu o Superior Tribunal de Justiça2. No mesmo diapasão o enunciado 75 da II Jornada de Direito Comercial3 dispõe que na hipótese de existência de convenção de arbitragem, havendo a decretação da falência, não se suspende eventual procedimento arbitral já em curso, bem como pode ser iniciado novo procedimento arbitral. Portanto, é possível concluir que é cabível a arbitragem no âmbito do direito falimentar, contanto que a convenção arbitral seja anterior à decretação da quebra, e tratando-se de quantia líquida, observe-se o disposto no artigo 6º, § 1º, da Lei de Falências4, impondo-se a partir da decretação da quebra a intimação do administrador judicial para representar a massa falida, sob pena de nulidade5. Nessa linha há diversos julgados do Tribunal de Justiça de São Paulo6. Registre-se, no entanto, que há precedente do mesmo Tribunal negando a possibilidade de arbitragem prevista em cláusula anterior à quebra, porém instalada posteriormente à decretação7. No mesmo sentido, no que se refere à recuperação judicial, é possível a aplicação do procedimento arbitral8, com a aplicação do artigo 6º, caput e § 4º, da lei 11.101/05 (com redação dada pela lei 14.112/20), que suspende, pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias, todas as ações e execuções em face do devedor9. Ocorre que o Enunciado 6 da I Jornada de Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios estabelece que "o processamento da recuperação judicial ou a decretação da falência não autoriza o administrador judicial a recusar a eficácia da convenção de arbitragem, não impede a instauração do procedimento arbitral, nem o suspende"10. Ainda acerca da competência segundo o Superior Tribunal de Justiça, "cabe ao juízo em que se processa a recuperação judicial fiscalizar o destino dos bens da recuperanda, que devem seguir o que determinado no plano de recuperação aprovado pelos credores"11, já que o caso versava sobre cautelar do Poder Judiciário referendada pelo Tribunal Arbitral (artigo 22-B da Lei de Arbitragem), inclusive com reforço do bloqueio de contas da recuperanda, que fazia parte de Consórcio que era parte na arbitragem. Portanto, o deferimento da recuperação judicial não tem o condão de afastar a arbitrabilidade do litígio, cabendo aos árbitros a decisão acerca da própria competência. Apenas constitui competência exclusiva do juízo universal a prática ou o controle de atos de execução de créditos individuais promovidos contra empresas falidas ou em recuperação judicial. Por fim, esta é nossa última coluna do ano de 2021, entraremos em recesso até fevereiro, desejando um excelente Natal e próspero ano de 2022 para todos nossos leitores. *Olavo Augusto Vianna Alves Ferreira é procurador do Estado de São Paulo. Doutor e mestre em Direito do Estado pela PUC/SP. Professor do Programa de doutorado e mestrado em Direito da UNAERP. Professor convidado de cursos de pós-graduação (PUC-COGEAE, Faculdade Baiana de Direito, IDP-SP, Escola Paulista da Magistratura, EDAMP-MS, ESPGE-SP e USP-FDRP). Membro de listas de árbitros de diversas Instituições Arbitrais. Membro da Comissão Especial de Arbitragem do Conselho Federal da OAB. _____________ 1 Conforme notícia intitulada "A jurisdição arbitral prestigiada pela interpretação do STJ", extraída do site do Superior Tribunal de Justiça, disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/A-jurisdicao-arbitral-prestigiada-pela-interpretacao-do-STJ.aspx , acesso em 08/06/2021. 2 "Efeitos da falência superveniente de contratante de cláusula compromissória. Manutenção de eficácia da convenção arbitral", STJ, 3ª T., REsp 1355831, j. 19.03.2013, unânime. Igualmente vide: TJ-SP, 11ª Cam Dir Priv, Apel 0144646-17.2011.8.26.0100, j. 27.08.2015, unânime; TJ-SP, 35ª Cam Dir Priv, APL. 1766160620098260100, j. 26.03.2012, unânime; TJ-SP, 4ª Cam Dir Priv, ED 6442044401, j. 10.12.2009, unânime; TJSP, Cam Res Fal e Rec, AI 5310204300, j. 25.06.2008, unânime. 3 "Havendo convenção de arbitragem, caso uma das partes tenha a falência decretada: (i) eventual procedimento arbitral já em curso não se suspende e novo procedimento arbitral pode ser iniciado, aplicando-se, em ambos os casos, a regra do art. 6º, § 1º, da Lei n. 11.101/2005; e (ii) o administrador judicial não pode recusar a eficácia da cláusula compromissória, dada a autonomia desta em relação ao contrato. Justificativa: Nos termos do art. 6º, § 1º, da Lei n. 11.101/20058, as ações que demandam quantia ilíquida não se suspendem em razão da decretação da falência nem são atraídas para o juízo universal falimentar, continuando a tramitar normalmente no juízo competente até a eventual definição de crédito líquido, o qual será incluído no quadro geral de credores, na classe correspondente. Da mesma forma, ações que demandam quantia ilíquida podem ser ajuizadas normalmente após a decretação da quebra, aplicando-se a mesma regra. O art. 117 da Lei n. 11.101/2005 permite que o administrador judicial decida se cumpre ou não os contratos bilaterais do falido que ainda estiverem em curso, observado o princípio da maximização do ativo do devedor e ouvido o comitê de credores. Ocorre que a cláusula compromissória é autônoma em relação ao contrato no qual está prevista, sendo um ato jurídico perfeito e acabado, de modo que a regra em questão não se aplica a ela. Assim, o administrador judicial não pode recusar cumprimento a ela nem precisa de autorização do comitê (ou do juiz) para dar início a procedimento arbitral dela decorrente." Enunciado 75 da II Jornada de Direito Comercial. Disponível aqui. Acesso em: 30 de dezembro de 2017. 4 CAHALI, Francisco José. Curso de Arbitragem. 6ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017. p. 422. 5 Nos termos do artigo 76, parágrafo único da Lei 11.101/2005. 6 Ementa "Agravo de Instrumento. Falência. Impugnação judicial objetivando habilitação de crédito fundamentado em sentença arbitral. Cláusula com promissória pactuada em contrato de construção de edifício firmado entre as partes. Inadimplemento contratual gerador de resolução do contrato e formulação de demanda perante a Câmara de Arbitragem. Posterior decretação da falência da demandada. Intervenção do Administrador Judicial da Massa Falida no procedimento arbitral, com alegação de incompetência do Juízo Arbitral, em face da falta de capacidade processual da falida e indisponibilidade dos bens da devedora, com base no artigo 25, da Lei nº 9.307/96, sustentando dever a demanda ser atraída para o Juízo Universal da Falência. Prosseguimento da demanda arbitral com condenação da devedora na indenização fixada pela Câmara de Arbitragem. Aplicabilidade do artigo 6o, § 1o, da Lei nº 11.101/2005, eis que, versando a demanda sobre quantia ilíquida, o processo não é suspenso em virtude da falência da devedora, inexistindo a"vis attractiva"do art. 76,"caput", devendo o procedimento arbitral prosseguir com o administrador judicial que representará a massa falida, sob pena de nulidade. Inaplicabilidade do artigo 117 à convenção de arbitragem. Inexistência de previsão legal de intervenção do Ministério Público nas demandas arbitrais em que a massa falida seja parte, especialmente sob a óptica do veto ao artigo 4o, da Lei nº 11.101/2005, que não manteve norma similar ao artigo 210 do Decreto-lei nº 7.661/45. Legitimidade da inclusão do crédito reconhecido no Tribunal Arbitrai no Quadro-Geral de Credores da falida, pelo valor determinado no juízo arbitrai, limitada a atualização monetária e os juros até a data do decreto da quebra, a teor dos artigos 9o, inciso II e 124, ambos, da Lei nº 11.101/2005. Agravo parcialmente provido para ser deferida a impugnação e a habilitação do crédito da agravante, observados os limites acima estabelecidos."(Tribunal de Justiça de São Paulo TJ-SP - Agravo de Instrumento: AG 5310204300 SP. Processo: AG 5310204300 SP. Órgão Julgador: Câmara Especial de Falências e Recup. Judiciais. Publicação: 30/09/2008. Julgamento: 25 de Junho de 2008. Relator: Desembargador Pereira Calças.) 7 "CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA. Contrato. Arbitragem. Falência da credora que optou pela via jurisdicional. Possibilidade. Inexistência de direito patrimonial indisponível ao tempo da distribuição da demanda. Extinção da ação de cobrança afastada na origem e que é confirmada. Agravo desprovido" (TJSP; AGI 0333524-03.2009.8.26.0000; Relator (a): Costabile e Solimene; Órgão Julgador: 6ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 42.VARA CIVEL; Data do Julgamento: 10/12/2009; Data de Registro: 22/12/2009). 8 Há julgado do Superior Tribunal de Justiça admitindo arbitragem visando garantir os direitos dos acionistas de empresa em recuperação judicial deliberarem em assembleia geral sobre questões de sua competência: "CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO ARBITRAL E JUÍZO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL. DISCUSSÃO ACERCA DA LEGALIDADE DE DISPOSIÇÕES INTEGRANTES DO PLANO DE SOERGUIMENTO. AUMENTO DE CAPITAL. ASSEMBLEIA DE ACIONISTAS. NÃO REALIZAÇÃO. CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA PREVISTA NO ESTATUTO SOCIAL. QUESTÕES SOCIETÁRIAS. COMPETÊNCIA DO JUÍZO ARBITRAL. 1. A existência de provimentos jurisdicionais conflitantes entre si autoriza o conhecimento do conflito positivo de competência.2. O juiz está autorizado a realizar controle de legalidade de disposições que integram o plano de soerguimento, muito embora não possa adentrar em questões concernentes à viabilidade econômica da recuperanda. Precedentes. 3. As jurisdições estatal e arbitral não se excluem mutuamente, sendo absolutamente possível sua convivência harmônica, exigindo-se, para tanto, que sejam respeitadas suas esferas de competência, que ostentam natureza absoluta. Precedentes. 4. Em procedimento arbitral, são os próprios árbitros que decidem, com prioridade ao juiz togado, a respeito de sua competência para examinar as questões acerca da existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha cláusula compromissória - princípio da kompetenz-kompetenz. Precedentes. 5. A instauração da arbitragem, no particular, foi decorrência direta de previsão estatutária que obriga a adoção dessa via para a solução de litígios societários. 6. Ainda que a jurisprudência do STJ venha entendendo, consistentemente, que a competência para decidir acerca do destino do acervo patrimonial de sociedades em recuperação judicial é do juízo do soerguimento, a presente hipótese versa sobre situação diversa. 7. A questão submetida ao juízo arbitral diz respeito à análise da higidez da formação da vontade da devedora quanto a disposições expressas no plano de soerguimento. As deliberações da assembleia de credores - apesar de sua soberania - estão sujeitas aos requisitos de validade dos atos jurídicos em geral. Precedente.8. O art. 50, caput, da Lei 11.101/05, ao elencar os meios de recuperação judicial passíveis de integrar o plano de soerguimento, dispõe expressamente que tais meios devem observar a legislação pertinente a cada caso. Seu inciso II é ainda mais enfático ao prever que, em operações societárias, devem ser "respeitados os direitos dos sócios, nos termos da legislação vigente". E, no particular, o objetivo da instauração do procedimento arbitral é justamente garantir o direito dos acionistas de deliberar em assembleia geral sobre questões que, supostamente, competem privativamente a eles, mas que passaram a integrar o plano de recuperação judicial sem sua anuência. CONFLITO CONHECIDO. DECLARADA A COMPETÊNCIA DO JUÍZO ARBITRAL" (CC 157.099/RJ, Rel. Ministro MARCO BUZZI, Rel. p/ Acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 10/10/2018, DJe 30/10/2018). Também a recuperação judicial não impede a homologação da sentença arbitral, nesse sentido: STJ, SEC 14.408-EX, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, por unanimidade, julgado em 21/6/2017, DJe 31/8/2017. 9 SCAVONE, op. Cit. 10 Enunciado 6 da I Jornada de Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios. Disponível aqui. Acesso em 07 de janeiro de 2018. No mesmo sentido Donaldo Armelin, A arbitragem, a falência e a liquidação extrajudicial, Revista de Arbitragem e Mediação vol 13, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 23, que acrescenta que a atividade do Ministério Público, de natureza fiscalizadora, não afasta esta possibilidade. 11 STJ - CC: 148932 RJ 2016/0251791-4, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 13/12/2017, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 01/02/2018.  
STJ: SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA Nº 9.412 - US EXISTÊNCIA DE RELAÇÃO CREDOR/DEVEDOR ENTRE ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA DO ÁRBITRO PRESIDENTE E O GRUPO ECONÔMICO INTEGRADO POR UMA DAS PARTES. HIPÓTESE OBJETIVA PASSÍVEL DE COMPROMETER A ISENÇÃO DO ÁRBITRO. RELAÇÃO DE NEGÓCIOS, SEJA ANTERIOR, FUTURA OU EM CURSO, DIRETA OU INDIRETA, ENTRE ÁRBITRO E UMA DAS PARTES. DEVER DE REVELAÇÃO. INOBSERVÂNCIA. QUEBRA DA CONFIANÇA FIDUCIAL. SUSPEIÇÃO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. PREVISÃO DA APLICAÇÃO DO DIREITO BRASILEIRO. JULGAMENTO FORA DOS LIMITES DA CONVENÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. É muito provável que essa decisão do STJ tenha se tornado um dos mais conhecido precedentes em termos de arbitragem, não só pela autoridade de seus argumentos, mas também por envolver cifras milionárias e nomes muito conhecidos no meio acadêmico. Em breve resumo, o fato é que o STJ deixou de homologar duas decisões arbitrais estrangeiras, proferida nos Estados Unidos, por entender que, embora não lhe caiba a análise do mérito desse tipo de decisão, o exame da compatibilidade dessas decisões com a ordem jurídica nacional é sua missão constitucional. Nessa perspectiva, o STJ entendeu que seria "matéria de ordem pública" a ausência de isenção de um dos árbitros (o presidente do painel) por quebra do dever de revelar que ele, através de seu escritório, possuía relações comerciais com grupo econômico integrado por uma das partes da arbitragem. Não se trata, aqui, de aplicação de disposições do CPC a respeito de suspeição ou impedimento do árbitro, mas sim de observar uma diretriz muito mais ampla, que é peculiar à esfera da arbitragem, segundo a qual o árbitro tem o dever de revelar "qualquer fato" que possa influir, razoavelmente, em seu convencimento. E se o árbitro oculta esse tipo de informação, mesmo em relação a fato que ocorreu após o início da arbitragem, esse seu comportamento1 robustece a suspeita de ausência de imparcialidade e, na linha do "caso Abengoa", pode levar à desconstituição da decisão arbitral perante o Poder Judiciário ou, se se tratar de decisão estrangeira, à negativa de homologação perante o STJ. Daí por que, ao aceitar atuar como árbitro, o indicado deve revelar toda informação que tiver, como, por exemplo, se já atuou como advogado de qualquer das partes ou se é credor ou devedor, pessoalmente ou através de pessoas jurídicas, de qualquer uma delas, dentre outras tantas hipóteses. Até mesmo opiniões externadas em artigos ou livros, que digam respeito ao tema que será colocado em discussão na arbitragem, é recomendável que o árbitro revele. Aliás, na dúvida sobre ser necessário revelar ou não, é melhor que o indicado revele tudo, justamente para não colocar em risco a decisão arbitral que será proferida. É importante destacar que essa necessidade de isenção (absoluta) do árbitro não tem relação com sua aptidão técnica para atuar na arbitragem. Esse aspecto somente ensejaria algum controle judicial se a falha na condução da arbitragem violasse fortemente alguma garantia constitucional, como a do contraditório, e causasse efetivo prejuízo a qualquer das partes que viesse a se derrotada (errore in procedendo). Por último, vale ressaltar que a decisão do STJ ora em análise não aceitou homologar a decisão estrangeira também porque a condenação extrapolava o que havia sido submetido à arbitragem através da convenção assinada entre as partes. Dessa forma, não seria exagero afirmar que os parâmetros fixados pelo STJ no conhecido "caso Abengoa" sempre estarão presentes em qualquer discussão sobre o dever de revelação dos árbitros que vier a ocorrer no meio acadêmico nacional. _____________ 1 Conforme já tive oportunidade de abordar na obra Fundamentos da prova civil (Revista dos Tribunais, 2017), o comportamento das partes é meio atípico de prova e pode influir decisivamente na decisão final de um processo judicial ou, vale acrescentar, na análise da imparcialidade dos árbitros.
Ao contrário da regra geral dos processos judiciais, no qual a publicidade dos atos processuais é a regra geral, quanto aos que versem sobre arbitragem existe a possibilidade de as partes estipularem a confidencialidade do procedimento o que, em alguns casos, pode se revelar vantajoso, especialmente no mundo dos negócios, no qual o sigilo pode melhor resguardar o interesse dos envolvidos na disputa visando o desenvolvimento empresarial, societário, tecnológico ou comercial, dentre outros. De acordo com o art. 1º, IV da CF/88, a livre iniciativa constitui um dos fundamentos da República, além de representar um dos princípios gerais da atividade econômica e financeira (art. 170, caput da CF/88). Assim, qualquer intervenção estatal no domínio econômico que venha a mitigar ou suprimir a autonomia da vontade das partes, a exemplo do afastamento pelo Judiciário da cláusula que estipula a confidencialidade do procedimento arbitral, inclusive com relação a eventuais processos judicias que versem sobre arbitragens sob sigilo, somente se justificaria para resguardar os princípios constitucionais da ordem econômica previstos no art. 170 da Lei Maior, impondo-se o respeito à livre iniciativa e à livre concorrência, que em uma economia livre restringe a interferência estatal nas ações realizadas pelas pessoas e empresas. Apesar de a Lei de Arbitragem não prever a confidencialidade como regra na arbitragem, ela encontra previsão na maioria dos regulamentos das instituições arbitrais. No âmbito brasileiro podem ser mencionados, por exemplo, o artigo 14 das regras da CCBC; os artigos 10 e 20.1 das regras Amcham; o artigo 13.1 das regras da Camarb; e os artigos 46 e 47 das regras da FGV. No plano internacional a confidencialidade também constitui a regra, conforme se observa do artigo 6º do Estatuto da ICC, do artigo 37 do regulamento das arbitragens internacionais da ICDR, braço internacional da AAA e do artigo 30 do regulamento da LCIA. É bem verdade que se o processo tiver como parte a Administração Pública, incidirá obrigatoriamente o princípio da publicidade, previsto no artigo 37, caput, da CF/88, reafirmado pelo artigo 2º, § 3º da Lei de arbitragem, sob pena de nulidade. Com relação aos processos judiciais que versam sobre arbitragens, o art. 189, IV do CPC prevê o segredo de justiça, incluindo o cumprimento da carta arbitral, desde que haja comprovação em juízo da estipulação da cláusula de sigilo pelas partes. Ocorre que, apesar dessa previsão legal expressa, tem-se observado a existência de uma polêmica na jurisprudência do TJSP, com relação à constitucionalidade do artigo 189, IV do CPC. Com relação especificamente aos processos judicias que versam sobre arbitragens, a 1ª Câmara de Direito Empresarial do TJSP, ao julgar o Agravo de Instrumento 2263639-76.2020.8.26.0000, em 02 de março de 2021, recusou a aplicação do sigilo processual previsto no art. 189, IV, do CPC a uma ação anulatória de sentença arbitral, com fundamento na aplicação do artigo 93, IX da CF/88. No mesmo sentido, verifica-se a decisão monocrática do Desembargador Azuma Nishi, na Apelação Cível 1048961-82.2019.8.26.0100, em 15 de março de 2021. Importante salientar a posição no sentido da nulidade desse tipo de decisão, diante da violação da cláusula de reserva de plenário (artigo 97 da CF/88), reafirmada pela Súmula Vinculante nº 10, já que a decisão competiria ao Órgão Especial. Discordamos, com todas as venias, do entendimento acima. Tanto que no Agravo de Instrumento 2110621-35.2020, julgado pela 2ª Câmara de Direito Privado, em 17 de dezembro de 2020, envolvendo apenas a partilha de bens de pessoas maiores e capazes em razão de divórcio, o TJSP reconheceu o direito ao segredo de justiça, visando resguardar dados das partes protegidos pelo direito constitucional à intimidade, como declarações de Imposto de Renda e extratos bancários. No mesmo sentido é o Agravo de Instrumento 2103902-71.2019, julgado pela 3ª Câmara de Direito Privado do TJSP em 26 de junho de 2019, impondo-se, por dever de coerência, que seja levada em consideração tal posicionamento na abordagem do segredo de justiça nos processos judiciais que analisam arbitragens. No sentido da constitucionalidade do segredo de justiça, previsto para as ações que versem sobre arbitragem, em 13 de setembro de 2021, a 33ª Câmara de Direito Privado do TJSP deu provimento ao Agravo de Instrumento 2071707-62.2021 para determinar a tramitação em segredo de justiça em processo judicial versando sobre arbitragem, cujo termo de arbitragem previu expressamente o sigilo de todas e quaisquer informações relacionadas à arbitragem. A recente Resolução nº 421 do CNJ, de 29 de setembro de 2021, que estabelece diretrizes e procedimentos sobre a cooperação judiciária nacional em matéria de arbitragem e dá outras providências, prevê em seu art. 4º que "Desde que a confidencialidade do procedimento arbitral seja comprovada, os pedidos de cooperação judiciária entre juízos arbitrais e órgãos do Poder Judiciário deverão observar o segredo de justiça, na forma prevista no artigo 189, IV, do Código de Processo Civil, e no artigo 22-C, parágrafo único, da Lei de Arbitragem". Ainda, o Enunciado nº 99 da II Jornada Prevenção e solução extrajudicial de litígios, do Conselho da Justiça Federal, dispõe que "O art. 189, IV, do Código de Processo Civil é constitucional, devendo o juiz decretar segredo de justiça em processos judiciais que versem sobre arbitragem, desde que a confidencialidade estipulada na arbitragem seja comprovada perante o juízo". Assim, não obstante à existência de entendimentos diversos, sustenta-se neste artigo a constitucionalidade do art. 189, IV do CPC, ao entendimento de que o artigo 93, IX, da CF/88 deve ser interpretado sem desprezar os mandamentos constitucionais da livre iniciativa e da livre concorrência, que protegem o segredo do negócio, além da autonomia constitucional da vontade. *Olavo Augusto Vianna Alves Ferreira é doutor e mestre em Direito pela PUC/SP. Procurador do Estado de São Paulo. **Carlos Eduardo Montes Netto é doutorando e mestre em Direitos Coletivos e da Cidadania pela UNAERP. Juiz de Direito do Estado de São Paulo.  
Em recente decisão, entendeu o STJ, no REsp 1.900.136-SP, relatado pela Ministra Nancy Andrighi que, embora a declaração de nulidade da sentença arbitral possa ser pleiteada tanto pela via de ação declaratória de nulidade (art. 33, § 1º da LA), quanto por impugnação ao cumprimento de sentença arbitral (art. 33 §3º da LA), haverá, em ambos os casos, imposição do prazo decadencial de 90 dias. No caso, a recorrente apresentara impugnação à ação de cumprimento de sentença arbitral, suscitando a nulidade por cerceamento de defesa, em razão do indeferimento de prova pericial, além de violação ao art. 524 do CPC, por não comprovados os desembolsos para verificação dos cálculos apresentados. O TJ/SP verificou que a impugnação estava baseada apenas no art. 32, inciso VIII da LA, reconhecendo a decadência, diante do decurso do prazo nonagesimal, visto que a matéria não integra o rol previsto no art. 525, § 1º do CPC. Postulou-se, assim, no recurso especial, o afastamento da decadência. Confirmando a decisão do TJ/SP, concluiu o STJ que, na hipótese de impugnação ao cumprimento, se a execução for ajuizada após o decurso desse prazo decadencial, "a defesa da parte executada fica limitada às matérias especificadas no art. 525, § 1º, do CPC, sendo vedada a invocação da nulidade da sentença nas matérias definidas no art. 32 da lei 9.307/96". Algumas questões podem ser suscitadas a propósito do acórdão do STJ: a) a primeira, de ordem teórica, diz respeito à natureza da decisão que reconhece a invalidade da sentença arbitral. Nos termos do art. 33 da LA, a parte interessada poderá pleitear "a declaração de nulidade da sentença arbitral", e a sentença que julgar procedente o pedido "declarará a nulidade da sentença arbitral, nos casos do art. 32, e determinará se for o caso, que o árbitro ou tribunal profira nova sentença arbitral" (§ 2º do art. 33). Em que pese a terminologia utilizada pelo legislador, a tutela jurisdicional prevista no art. 33, para atacar a sentença arbitral, quando qualificada como nula pela lei, tem, segundo a doutrina1, natureza desconstitutiva, e não, declaratória. Como ensina Cândido Rangel Dinamarco, a demanda tem claramente natureza constitutiva negativa, pois "a pronúncia de sua procedência tem por efeito a implantação de uma situação jurídica nova, mediante a eliminação da sentença impugnada"2. Com efeito, até o advento da decisão judicial que invalide a sentença arbitral, esta produz normalmente seus efeitos, não sendo, pois, de se declarar uma nulidade preexistente, mas de desconstituir uma decisão até então válida e eficaz. E esse objetivo pode ser alcançado, indiferentemente, tanto pela via da denominada "ação de nulidade" do art. 33, como em sede de impugnação ao cumprimento da sentença arbitral, desde que presente uma das hipóteses elencadas no art. 32. b) um segundo ponto, de grande relevância prática, foi levantado na doutrina citada na fundamentação do voto da Ministra Relatora. Qual seja, o argumento de que, com relação à impugnação ao cumprimento da sentença, evidentemente não seria aplicável o prazo de 90 dias, "mesmo porque não terá o executado como controlar a ocasião em que, na execução, lhe será facultado defender-se do requerimento do cumprimento de sentença".3 Ora, se a lei arbitral enumera no art. 32 as hipóteses, de natureza processual, para sua invalidação4, assim como os meios legais de impugnação, não seria razoável exigir-se que o executado, por cautela, ajuizasse previamente ação de nulidade apenas para não sofrer os efeitos da decadência quanto à matéria arguível no âmbito da ação de cumprimento de sentença. Ficaria esse direito de ampla impugnação, pois, restringível por um fator externo e incontrolável pelo executado, qual seja, a maior ou menor fluidez do andamento processual. Assim, a exegese restritiva do direito de defesa do executado não se coaduna com a natureza desconstitutiva da via impugnatória da decisão arbitral, por qualquer dos seus meios, visto não distinguir a lei arbitral as matérias invocáveis para cada meio de impugnação, nem podendo ser o devedor punido pela eventual demora do processamento da impugnação ao cumprimento de sentença. c) por último, vale lembrar a existência de vícios que não podem ser convalidados pelo simples transcurso do prazo de noventa dias. Esse tema, naturalmente polêmico, pode envolver diferentes perspectivas, como a da flexibilização da coisa julgada, que é pacífica no contexto da jurisprudência, e o da querela nullitatis insanabilis (a hipótese prevista no art. 525, parágrafo primeiro, I, aplica-se à arbitragem e, portanto, não se sujeita à prazo), assim como a ilicitude da prova utilizada que, ao menos em princípio, pode levar a questionamentos não sujeitos a esse prazo.5 Também seria possível tratar desse tema na perspectiva da "inexistência", mas isso fica para outra oportunidade. __________ 1 CAHALI, Francisco José, Curso de Arbitragem. São Paulo : Thomson Reuters, 2017, p. 385. 2 DINAMARCO, Cãndido Rangel, A arbitragem na teoria geral do processo. São Paulo : Malheiros, 2013, p. 236. 3 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Curso de Processo Civil. São Paulo : RT, vol. 3, p. 574. 4 Assim, são hipóteses de nulidades processuais, dentre outras, quando a sentença arbitral: emanou de quem não podia ser árbitro; não continha os requisitos obrigatórios (relatório, fundamentos de fato e de direito, dispositivo, data e lugar em que foi proferida); desrespeitou os princípios do contraditório, da igualdade das partes, da imparcialidade do árbitro e de seu livre convencimento; ou foi proferida fora dos limites da convenção de arbitragem. Já, em se tratando da hipótese de nulidade da convenção arbitral, trata-se de vício legal de ordem material, referente a um negócio jurídico, que já tem previsão de nulidade nos casos dos art. 166  (incapacidade, objeto ou motivo determinante ilícito, inobservância da forma ou solenidade legal, fraude à lei ou proibição legal) e 167 (simulação)do Código Civil. Tais hipóteses, segundo a doutrina dominante, não são taxativas. 5 V., a propósito, a tese de Doutorado "Provas Ilícitas e Arbitragem" defendida por Luiz Francisco Torquato Avolio este ano na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, tendo por orientador Marcelo José Magalhães Bonizzi.
Conforme excelente artigo de autoria de Thiago Marinho Nunes, publicado no site Migalhas1, o Tribunal de Justiça de São Paulo, ao julgar o Agravo de Instrumento nº 2263639-76.2020.8.26.0000, recusou a aplicação do sigilo processual previsto no art. 189, IV, do CPC a uma ação anulatória de sentença arbitral. O caso foi julgado em 02/03/2021 pela 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial. No mesmo sentido, vide decisão monocrática do desembargador Azuma Nishi, na Apelação Cível nº 1048961-82.2019.8.26.0100, datada de 15 de março de 2021. Para além dos efeitos prejudiciais ao instituto da arbitragem e às partes que optaram por se submeter a um tribunal arbitral (os quais foram muito bem abordados no artigo referido acima), há algo que muito incomoda nesse caso concreto: o órgão fracionário do Tribunal de Justiça de São Paulo afastou disposição legal expressa (mais precisamente, o art. 189, IV, do CPC) sem remeter a análise da questão ao Plenário ou ao Órgão Especial da Corte. Houve, portanto, clara violação à cláusula de reserva de plenário, prevista no art. 97 da CF/88, com a devida vênia aos Desembargadores que gozam de total admiração e respeito por parte destes autores. Para melhor compreensão, vejamos o que estabelecem os dispositivos do CPC e da Constituição Federal que acabamos de mencionar. O art. 189, IV, do CPC, de forma bastante clara, estabelece que, embora a regra na prática dos atos processuais seja a publicidade, os processos que envolvam arbitragem devem tramitar em segredo de justiça, caso tenha sido aplicada a confidencialidade no juízo arbitral de origem. Eis o teor do dispositivo: "Art. 189, CPC. Os atos processuais são públicos, todavia tramitam em segredo de justiça os processos: (...) IV - que versem sobre arbitragem, inclusive sobre cumprimento de carta arbitral, desde que a confidencialidade estipulada na arbitragem seja comprovada perante o juízo." Por sua vez, o art. 97 da CF/88, que estabelece a chamada cláusula de reserva de plenário (ou regra da full bench), determina que os Tribunais do Poder Judiciário apenas podem declarar a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo do poder público por meio de seu Plenário ou Órgão Especial, devendo a decisão ser tomada pela maioria absoluta dos membros do órgão julgador. A redação desse dispositivo é a seguinte: "Art. 97, CF/88. Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público." Caso um Tribunal deixe de observar a cláusula de reserva de plenário (o que ocorrerá sempre que declarar uma inconstitucionalidade por meio de órgão que não seja o seu Plenário ou o seu Órgão Especial), a decisão proferida será absolutamente nula, conforme jurisprudência pacificada do Supremo Tribunal Federal2. Além disso, há situações em que o órgão fracionário do Tribunal, embora não afirme expressamente que está declarando a inconstitucionalidade de uma norma, simplesmente a afasta em um caso no qual ela teria aplicação. Uma manobra como essa nada mais é do que o reconhecimento da invalidade (isto é, da inconstitucionalidade) da norma por via oblíqua, pois, se toda norma se presume válida e se, no caso concreto, havia subsunção, a negativa de aplicação da norma equivale ao reconhecimento de sua invalidade, o que, conforme já esclarecido, apenas pode ser feito com a observância da cláusula de reserva de plenário. E foi exatamente isso que o TJSP fez no julgamento do caso que aqui estamos analisando: a Corte não declarou expressamente a invalidade do art. 189, IV, do CPC, mas deixou de aplicar essa disposição legal em uma situação que se subsumia perfeitamente a ela. Houve, portanto, uma declaração de inconstitucionalidade por via oblíqua realizada por um órgão fracionário do Tribunal. Esse tipo de situação é tão comum, que o Supremo Tribunal Federal chegou a aprovar um enunciado de súmula vinculante no qual registrou expressamente que há, nessa hipótese, violação ao art. 97 da CF/88. Trata-se da Súmula Vinculante nº 10, que tem o seguinte teor: "Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua incidência, no todo ou em parte." Não há dúvida alguma, portanto, de que a decisão proferida pela 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do TJSP no Agravo de Instrumento nº 2263639-76.2020.8.26.0000, ao negar o sigilo judicial a uma ação anulatória de sentença arbitral, violou a cláusula de reserva de plenário e, como consequência, nasceu viciada com nulidade absoluta. A bem da verdade, o que se pode perceber é que o órgão fracionário da Corte discordou da opção política do legislador consistente em determinar a aplicação do segredo de justiça aos processos judiciais envolvendo questões atinentes a juízos arbitrais, provavelmente, por uma falta de compreensão do instituto da arbitragem e da sua importância para o desenvolvimento socioeconômico do País. E, no açodamento para evitar que o processo tivesse tramitação nos termos previstos em lei, acabou ignorando que, no desempenho de suas funções, encontra-se submetido à Constituição Federal, mais precisamente, à cláusula de reserva de plenário. O lado bom de tudo isso é que, por ter violado enunciado de súmula vinculante, a decisão em questão pode ser atacada pela via célere da reclamação, conforme permitem os arts. 7º da lei 11.417/063 e 988, III, do CPC4, sem prejuízo, sempre, do recurso cabível, já que reclamação não é sucedâneo recursal5. *Francisco Maia Braga é graduado em Direito com láurea universitária pela Universidade Federal de Pernambuco (Faculdade de Direito do Recife). Procurador do Estado de São Paulo. Ex-Procurador do Estado do Rio Grande do Sul. Ex-Procurador do Estado de Rondônia. Professor de cursos preparatórios para concursos públicos. Autor de livros jurídicos. Sócio fundador dos cursos RevisãoPGE e Trino Concursos.   **Olavo Augusto Vianna Alves Ferreira é procurador do Estado de São Paulo. Doutor e Mestre em Direito do Estado pela PUC/SP. Professor do Programa de Doutorado e Mestrado em Direito da UNAERP. Professor convidado de cursos de pós-graduação. Membro de listas de árbitros de diversas Instituições Arbitrais. Membro da Comissão Especial de Arbitragem do Conselho Federal da OAB. Autor de livros jurídicos. __________ 1 Disponível aqui. 2 Rcl 18165 AgR-ED, j. 21/08/2017, Segunda Turma, Rel. Min. Alexandre de Moraes. 3 "Art. 7º Da decisão judicial ou do ato administrativo que contrariar enunciado de súmula vinculante, negar-lhe vigência ou aplicá-lo indevidamente caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal, sem prejuízo dos recursos ou outros meios admissíveis de impugnação." 4 "Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para: (...) III - garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; (...)". 5 Pleno, AgRg na Rcl 5.703/SP, AgRg na Rcl 5.926/SC, e AgRg na Rcl 5.684/PE.
Antes de tudo, quero agradecer ao prestigioso Migalhas pela abertura dessa coluna quinzenal intitulada Observatório da Arbitragem, que compartilho com o caro amigo Olavo Augusto V. Alves Ferreira. Na linha inaugurada por Olavo, destacaremos aqui decisões e fatos importantes para a arbitragem, a começar por alguns precedentes do STJ que fixam diretrizes para aqueles que atuam, ou pretendem atuar, nessa área. Em julgamento recente, o STJ ressuscitou a antiga expressão "ação executiva lato sensu", para explicar que o pedido de despejo não pode ser formulado em sede de arbitragem, porque o árbitro não teria poderes para forçar a saída do locatário inadimplente do imóvel locado. Se as ações executivas lato sensu possibilitam execução imediata do despejo, somente o Poder Judiciário poderia tratar desse tema, segundo entendeu o STJ. Essa expressão caiu em desuso no âmbito processual, porque todas as decisões condenatórias passaram a permitir execução imediata, ou seja, sem intervalo entre a fase cognitiva e a fase executória, desde 2005, devido à inclusão dos artigos 475-I a 475-R no CPC de 1973, assim como ocorre também no CPC atual (art. 513). Antes dessas regras, competia ao credor iniciar um processo novo, com nova citação do réu, para dar início à execução civil. Mas isso não significa que não possa existir convenção arbitral em contrato de locação, mas apenas que não se pode pedir que o árbitro decida pelo despejo do locatário por falta de pagamento. Há outros tantos conflitos que podem surgir nesse contexto, como, por exemplo, aqueles que dizem respeito aos critérios de reajuste dos valores pagos mensalmente e os que tratam do uso adequado do imóvel locado. O mesmo entendimento pode ser aplicado à adjudicação compulsória. As partes podem pedir ao árbitro que resolva as controvérsias relacionadas à existência do direito à transmissão compulsória de um determinado bem imóvel, mas não podem pedir a imissão na posse desse imóvel. Em síntese, não se pode pedir ao árbitro que promova o despejo ou a imissão na posse de imóveis em geral, porque tais medidas constituem verdadeiros atos de execução e exigem um poder coercitivo que o árbitro não possui, afastada, nessas hipóteses, a possibilidade de utilização da "carta arbitral" (art. 237, IV, CPC), em que os árbitros pediriam apoio do Poder Judiciário para o cumprimento de suas decisões. Essa decisão do STJ, no entanto, pode causar alguma instabilidade nas hipóteses em que se pede ao árbitro a entrega de um determinado bem móvel ou a prática (ou abstenção) de um ato, porque, nessas situações de "tutela específica", o árbitro também determinará a execução se reconhecer a procedência do pedido, que será feita justamente através da carta arbitral. Mas, nesses casos, é preciso observar que a cognição do árbitro é ampla, ao contrário do que ocorre na ação de despejo por falta de pagamento ou na imissão na posse pura e simples, em que, na grande maioria das vezes, praticamente nada há a conhecer e julgar senão a simples inadimplência do locatário ou a flagrante ilegalidade da posse, como se se tratasse, nesses casos, de uma execução direta. É nesse ponto que o STJ não admite arbitragem. Daí por que esse posicionamento do STJ não deve ser utilizado como precedente em outras situações em que se pede ao árbitro a "tutela específica" já mencionada, cuja fase de cognição é ampla o suficiente para não permitir qualquer analogia com as hipóteses tratadas na decisão ora analisada.
Diante dos vinte cinco anos da Lei de Arbitragem, temos o prazer de inaugurar esta coluna no Migalhas, que denominamos "Observatório da Arbitragem", com o objetivo de publicar artigos sobre o tema, visando à divulgação do instituto e comentar decisões dos Tribunais. Tenho a honra e o prazer de coordenar esta coluna, junto do Professor Doutor Marcelo Magalhães Bonizzi (Largo do São Francisco/USP), certo que também teremos convidados, lembrando que pesquisamos sobre o tema nas Instituições em que lecionamos1. A jurisdição arbitral é prestigiada pela interpretação do Superior Tribunal de Justiça, tanto que Ministros da Corte da Cidadania destacam o crescente papel da arbitragem como mecanismo de solução de conflitos2. São diversos os julgados da Corte que contribuíram muito para a consolidação da arbitragem no Brasil, de modo que o objetivo destas breves linhas é tratar de três casos que se destacaram sobre a autonomia da arbitragem e sobre a inaplicabilidade subsidiária do Código de Processo Civil no âmbito da arbitragem, especificamente os recursos especiais: nº 1.903.359-RJ, nº 1.519.041/RJ; e nº 1.903.359-RJ. Entretanto, antes é importante contextualizar a polêmica. Hans Kelsen3 e Miguel Reale4 discorrem acerca da autonomia científica de um determinado ramo do Direito, explicando que cada subsistema detém institutos, fins, métodos e objetos próprios, inconfundíveis com outras áreas jurídicas. Nesse sentido, cada ramo do Direito possui seu objeto, já que, "para que haja ciência, é essencial a unidade epistemológica, isto é, a unidade de objeto"5. Feitos estes esclarecimentos, podemos avançar e apontar que o processo arbitral "é autorreferente, e, por isso autônomo"6, afirmando a doutrina: "Arbitragem é arbitragem, e isso justifica seja ela 'objeto de um tratamento autônomo', verdadeiro sistema, com características próprias, a distinguir este método de solução de litígios"7. Eduardo de Albuquerque Parente considera que o processo arbitral é um subsistema que opera em obediência aos próprios parâmetros (operacionalmente fechado, portanto) em razão de suas claras distinções em relação ao processo judicial: se, por um lado, o rito processual judicial está previamente determinado em lei, o processo arbitral se resolve sem as nuances típicas do arcabouço judicial, dado que seu procedimento é por natureza flexível, porque decorrente da autonomia da vontade, e seu rito pode decorrer da pura criação das partes, da adoção de regras pré-existentes ou ainda da montagem de procedimento inteiramente pelo árbitro8. Desse modo, o processo arbitral opera em seus próprios termos, de modo autorreferencial e independente do processo judicial. Portanto, podemos concluir que há autonomia científica da arbitragem9. Verificadas essas premissas, resta saber se há a possibilidade da aplicação do Código de Processo Civil subsidiariamente na arbitragem, apesar da omissão das partes ou da Lei de Arbitragem, ou se há autonomia científica deste objeto de estudo, existindo duas correntes sobre o tema: i) Há doutrinadores que apontam a aplicação subsidiária10 das regras da legislação processual civil, mesmo sem previsão na cláusula compromissória e no compromisso arbitral. ii) Em sentido contrário à aplicação subsidiária das normas do Código de Processo Civil no procedimento da arbitragem, defendem os doutrinadores11 e, em julgados do Superior Tribunal de Justiça12, que não há dispositivo legal, na Lei de Arbitragem ou no Código de Processo Civil, a autorizá-la, salvo o que trata de impedimento e suspeição dos árbitros serem os mesmos do Código de Processo Civil (artigo 14 da Lei de Arbitragem), além da expressa autorização da Lei de Arbitragem no sentido de que as partes criem as regras procedimentais (artigos 2º, §1º, 11, IV, 19, parágrafo único, e 21, caput e §§1º e 2º, todos da Lei 9307/96), cabendo ao árbitro estabelecer, em caso de omissão das partes, com fundamento no seu poder normativo supletivo (§ 1º do artigo 21 da Lei de Arbitragem) as normas procedimentais. Recentemente o Superior Tribunal de Justiça adotou esta segunda tese, no REsp nº 1.903.359-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 11/05/2021, definiu: "É de suma relevância notar, a esse propósito, que o árbitro não se encontra, de modo algum, adstrito ao procedimento estabelecido no Código de Processo Civil inexistindo regramento legal algum que determine, genericamente, sua aplicação, nem sequer subsidiária, à arbitragem. Aliás, a Lei de Arbitragem, nos específicos casos em que preceitua a aplicação do diploma processual, assim o faz de maneira expressa". Decidiu o Tribunal da Cidadania, em outro caso, acerca da aplicação do CPC na arbitragem: "Não autoriza o intérprete a compreender que a arbitragem - regida por princípios próprios (notadamente o da autonomia da vontade e da celeridade da prestação jurisdicional) - deva observar necessária e detidamente os regramentos disciplinadores do processo judicial, sob pena de desnaturar esse importante modo de heterocomposição. Há que se preservar, portanto, as particularidades de cada qual" (Resp nº 1.519.041/RJ). Anteriormente a este julgado a Ministra Nancy Andrighi afirmou: "Transplantar formalismo e tecnicismo característicos da justiça comum ao procedimento da arbitragem fere o fim ao qual a arbitragem se propõe - qual seja, o de oferecer método célere e flexível de resolução de conflito. Nesse sentido, acerta a doutrina ao afirmar que "Jogar o CPC no colo dos árbitros e exigir enormemente a utilidade da arbitragem, tornando-a excessivamente rígida, demorada e quase tão onerosa para os interessados quanto os recursos no Judiciário" (VERÇOSA, Haroldo Malheiros Duclerc. Aspectos da Arbitragem Institucional - 12 anos da lei 9.307/1996. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 26)"13. A tese ora defendida é reafirmada pelo fato de que quando o Legislador faz opção pela aplicação subsidiária, há previsão expressa na Lei, tal como ocorreu no artigo 24 da Lei do Mandado de Segurança (lei 12016/2009)14, no artigo 14 da Lei do Mandado de Injunção (lei 13300/2016)15, no artigo 22 da Lei da Ação Popular (lei 4717/1965)16 e artigo 19 da lei de Ação Civil Pública (lei 7347/1985)17. Na Lei de Arbitragem, inexiste qualquer previsão desse teor, salvo no artigo 14, quanto ao impedimento e suspeição dos árbitros, que será objeto de tratamento específico. Contudo, nada impede que as partes convencionem sobre a aplicação do Código de Processo Civil18 na arbitragem19, o que não é recomendável diante das características arbitragem20. Diante dos fundamentos acima, no sentido da autonomia da arbitragem e em virtude da inexistência de norma expressa consagrando a aplicação subsidiária, adotamos a segunda corrente, defendendo a inaplicabilidade do Código de Processo Civil à arbitragem21, salvo se a convenção de arbitragem previr expressamente a aplicação subsidiária. Portanto, mediante um procedimento analítico de decomposição ou diferenciação da ciência do Direito22, concluímos pela independência científica do Direito Arbitral do Direito Processual Civil, em virtude de sua especificidade, a qual não se confunde com as outras áreas do Direito, possuindo normas próprias, regido por regime jurídico disciplinado em Leis diversas. Este tópico sobre a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil é importantíssimo, pois repercutirá na solução de diversas questões a serem abordadas no presente trabalho, que constituem questões importantes no decurso das arbitragens, dentre elas, exemplificativamente, a aplicação: i) Do instituto da estabilização da tutela (artigo 304 do CPC) ao procedimento arbitral, conforme já decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo23. ii) Da nomeação de curador especial à parte, que não apresentou defesa. iii) Da presunção de veracidade dos fatos decorrente da revelia e efeitos da confissão no depoimento pessoal; iv) Dos critérios para a fixação de sucumbência e litigância de má-fé; v) Da interrupção da contagem do prazo para ação anulatória, caso os embargos arbitrais não sejam conhecidos, ou seja, não se aplica o artigo 1.026 do Código de Processo Civil, se as partes não convencionaram ou não consta no Regulamento da Câmara, conforme decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo24; vi) Da aplicação do artigo 927 do Código de Processo Civil na arbitragem e consequente nulidade da sentença arbitral que não observa decisões com efeito vinculante; vii) Da suspensão da arbitragem em virtude de recursos extraordinários e especiais repetitivos25, incidentes de resolução de demandas repetitivas26; viii) Do cabimento da ação anulatória prevista no artigo 966, §4º, do Código de Processo Civil; ix) Do cabimento da reclamação no processo arbitral; x) Do cabimento da ação rescisória contra sentença arbitral. __________ 1 No Programa de doutorado e mestrado da UNAERP pesquisamos arbitragem com diversos orientandos. 2 Conforme notícia intitulada "A jurisdição arbitral prestigiada pela interpretação do STJ", extraída do site do Superior Tribunal de Justiça, disponível aqui, acesso em 08/06/2021. 3 Teoria Pura do Direito, São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 50-54. 4 Filosofia do Direito. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 75-76. 5 MACHADO NETO, Antonio Luiz, Teoria da Ciência Jurídica, São Paulo: Saraiva, 1975. p. 03. 6 MARIANI, Rômulo Greff, Precentes na arbitragem, Belo Horizonte: Fórum, 2018, p. 84. 7 Ibidem, p. 84. 8 PARENTE, Eduardo de Albuquerque. Processo arbitral e sistema. São Paulo: Atlas, 2012, p. 47/60. 9 Nesse sentido FICHTNER, José Antonio, MANNHEIMER, Sergio, MONTEIRO, Nelson André Luís, Teoria geral da arbitragem. - Rio de Janeiro: Forense, 2019. 10 "No silencio de todos prevalece nas arbitragens nacionais realizadas no Brasil (LA, art. 34, par.) o disposto na Lei de Arbitragem nacional e, em grau sucessivo de subsidiariedade, o Código de Processo Civil - cujas normas só terão aplicabilidade na medida em que forem compatíveis com o sistema arbitral", DINAMARCO, Cândido Rangel. Arbitragem na teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros, 2013. p. 46. "Quando as regras de procedimento da arbitragem não forem suficientes e o árbitro ou árbitros, tenham que recorrer, subsidiariamente, à legislação processual, essa deverá ser a do local sede da arbitragem", BASSO, Maristela. As leis envolvidas nas arbitragens comerciais internacionais: campos de regência. Revista de Direito Bancário do Mercado de Capitais e da Arbitragem, São Paulo, v. 3, n.9, p. 307-314, 2000 ELIO FAZZALARI, L'Arbitrato, cit., p. 56-57 e 68, defende, no direito italiano, que existindo omissão das regras escolhidas pelas partes ou fixadas pelo árbitro, são aplicáveis as regras processuais que regem os procedimentos judiciais. JUNIOR, Humberto Theodoro. Arbitragem e Terceiros: Litisconsórcio Fora do Pacto Arbitral: Outras Intervenções de Terceiros. In: MARTINS, Pedro A. Batista; ROSSANI GARCEZ, José Maria (Org.). Reflexões sobre arbitragem: in memoriam do Desembargador Cláudio Vianna de Lima. São Paulo: LTr, 2002. p. 246-248. 11 CARMONA, Carlos Alberto. O processo arbitral, Revista de Arbitragem e Mediação. São Paulo, ano 1, jan./abr. 2004, n. 9, p. 28; PARENTE, Eduardo de Albuquerque, Processo arbitral e sistema, São Paulo: Atlas, 2012, p. 105; JOSÉ CARLOS DE MAGALHÃES, A ordem das provas In: BERTASI, Maria Odete Duque; CORRÊA NETTO, Oscavo Cordeiro (Coord.), Arbitragem e desenvolvimento. São Paulo: Quartier Latin, 2009, p. 52 ss; PINTO, José Emilio Nunes. Anotações práticas sobre a produção de prova na arbitragem. In: FINKELSTEIN, Cláudio; VITA, Jonathan B.; CASADO FILHO, Napoleão (Coord.). Arbitragem internacional: Unidroit, Cisg e direito brasileiro. São Paulo: Quartier Latin, 2010. p. 83; FICHTNER, José Antonio, MANNHEIMER, Sergio, MONTEIRO, Nelson André Luís.Teoria geral da arbitragem, Rio de Janeiro: Forense, 2019. Na doutrina estrangeira contrários à aplicação da regra processual estatal na arbitragem vide: BRUNO OPPETIT, Teoría del arbitraje, Bogotá: Legis, 2006, p. 42 ss, e p. 60 ss. No sentido da inconveniência de se aplicar o Código de Processo Civil na arbitragem, em prejuízo da agilidade e celeridade, vide JOSÉ CARLOS DE MAGALHÃES, A ordem das provas, cit., p. 52 ss,; MARCOS PAULO DE ALMEIDA SALLES, Efeitos da judicialização da arbitragem. Revista de Arbitragem e Mediação. São Paulo, ano 4, nº 4, abr./jun. 2007, p. 32-37; HAROLDO MALHEIROS DUCLERC VERÇOSA, Doze anos da lei de arbitragem: alguns aspectos ainda relevantes. In: (Coord.). Aspectos, cit., n. 5, p. 26. SESTER, Peter Christian, Comentários à Lei de Arbitragem e à Legislação Extravagante, São Paulo, Quartier Latin, 2020, p. 90. 12 REsp nº 1.903.359-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 11/05/2021. 13 voto da Ministra Nancy Andrighi, no Resp nº 1.636.102 - SP. 14 Art. 24. Aplicam-se ao mandado de segurança os arts. 46 a 49 da lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil. 15 Art. 14. Aplicam-se subsidiariamente ao mandado de injunção as normas do mandado de segurança, disciplinado pela Lei nº 12.016, de 7 de agosto de 2009, e do Código de Processo Civil, instituído pela lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973, e pela lei 13.105, de 16 de março de 2015, observado o disposto em seus arts. 1.045 e 1.046. 16 Art. 22. Aplicam-se à ação popular as regras do Código de Processo Civil, naquilo em que não contrariem os dispositivos desta lei, nem a natureza específica da ação. 17 Art. 19. Aplica-se à ação civil pública, prevista nesta Lei, o Código de Processo Civil, aprovado pela lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973, naquilo em que não contrarie suas disposições. 18 O regulamento da Câmara de Arbitragem da FGV prevê: "Art. 49 - Caberá ao tribunal arbitral decidir as questões a respeito das quais seja omisso o presente Regulamento, podendo valer-se, subsidiariamente, das normas do Código de Processo Civil, atendidos os objetivos de celeridade e de informalidade". Todavia, o citado regulamento ressalva que a revelia não acarreta os efeitos previstos no Código de Processo Civil (art. 26, § 3º), vide aqui, acesso em 10.11.2020. 19 ELIO FAZZALARI, L'Arbitrato, Turim: UTET, 1997, p. 55. 20 TODD CARVER e ALBERT VONDRA apresentam dados empíricos que demonstram o fracasso do processo arbitral quando (i) as partes e seus advogados não têm a exata dimensão de como o processo arbitral é distinto do judicial, (ii) as partes pensam ser a total vitória contra a contraparte como a única alternativa possível e (iii) quando contratam advogados excessivamente litigiosos (Alternative dispute resolution: why it doesn't work and why it does Harvard Business Review, Boston, maio-jun. 1994 apud PARENTE, Eduardo, Ordem Jurídica arbitral, in Arbitragem: 5 anos da lei 13.129, de 26 de maio de 2015.Olavo A. V. Alves Ferreira e Paulo Henrique dos Santos Lucon (coord.). - Ribeirão Preto, SP: Migalhas, 2020, p. 368). "Uma interpretação da Lei de Arbitragem presa ao Código de Processo Civil seria contraproducente para atingir os seus objetivos, pois o modelo do Código é rígido (ou um "one-size-fits-all-approach"), o que não se harmoniza com a flexibilidade do procedimento arbitral, da qual dependem os princípios da eficácia e celeridade", SESTER, Peter Christian, Comentários à Lei de Arbitragem e à Legislação Extravagante, São Paulo, Quartier Latin, 2020, p. 90. 21 JOSÉ CARLOS DE MAGALHÃES, com razão, aponta que "o processo arbitral não é judicial e tem pressupostos distintos. Enquanto que o último é público e decorre do direito constitucional de acesso ao Judiciário, o primeiro é privado e tem seu fundamento na vontade das partes, que podem estabelecer o rito que desejarem para a composição de suas controvérsias, respeitadas as diretrizes maiores impostas pela lei, como o contraditório e a igualdade de tratamento. Se o procedimento é fixado na convenção de arbitragem - nela se incluindo o regulamento da instituição de arbitragem, quando nela corre o processo - não há que se buscar na legislação processual pública os mecanismos para a condução do processo, salvo se a isso as partes autorizam" (Soluções rápidas e objetivas, In Revista Brasil Canadá. São Paulo: CCBC, Ano 2, n. 7, 2007, p. 45). 22 A averiguação analítica por decomposição ou diferenciação da ciência do Direito consiste "no fato de se partir de um todo, separando-o e especificando-o nas suas partes, isto é, procede por distinções, classificações e sistematizações", DINIZ, Maria Helena, Compêndio de Introdução à Ciência do Direito. 20. ed. rev. e atual, São Paulo: Saraiva, 2009, p. 200. 23 Vide nosso Lei de Arbitragem Comentada, 2021, 2ª Edição, São Paulo: Juspodivm. 24 Vide nosso Lei de Arbitragem Comentada, 2021, 2ª Edição, São Paulo: Juspodivm. 25 CPC: art. 1.029, §4º; art. 1.036, § 1º ; art. 1.037, II. 26 CPC: art. 982, I.