COLUNAS

  1. Home >
  2. Colunas

Lauda Legal

Resenhas de livros jurídicos.

Roberta Resende
quarta-feira, 13 de abril de 2016

Introdução à Ciência do Direito

Editora: Thomson Reuters, por meio de seu selo editorial Revista dos TribunaisAutor: André Franco MontoroPáginas: 688 A obra foi publicada pela primeira vez no longínquo ano de 1968 - distante nem tanto pelo tempo decorrido desde então, mas sobretudo em virtude das modificações operadas no mundo e na sociedade brasileira, em especial no direito pátrio, que para dizer o mínimo, viu nascer uma nova Constituição e um novo Código Civil, sobre bases bem diversas dos anteriores regramentos da vida do cidadão. Desde o seu lançamento, o texto sempre foi um sucesso: gerações inteiras foram formadas a partir de seus ensinamentos, e no dizer da apresentação preparada pela própria editora - outra instituição longeva em nosso mundo jurídico - "com essa base atuam nos mais diversos setores da sociedade". O ponto é que mesmo diante de todas as modificações sofridas pelo ordenamento brasileiro, a qualidade das lições foi capaz de manter o texto atraente, vigoroso, impelindo familiares do autor e casa editorial ao desafio de mantê-lo acessível ao estudante de hoje. Com esse objetivo, o trabalho da equipe responsável pela atualização foi no sentido de não interferir na expressão das ideias pelo autor, ponto alto da obra, limitando-se à inserção, entre colchetes, e em cor e fontes destacadas, das modificações ocorridas na legislação eventualmente citada. Vez ou outra, notas explicativas também destacadas do texto dão conta da pertinência das citações doutrinárias à moldura legislativa hodierna. Compulsando a obra, percebe-se que a necessidade dessas intervenções deu-se em raras ocasiões, de maneira pontual. O que a sustenta, de fato, é a expressão didática, em boa linguagem e método perfeito, da crença do autor no Direito como força-motriz da sociedade em direção à civilização. Bebendo na preleção eterna de Ihering, no célebre A luta pelo Direito, Montoro constrói todo o curso apoiado na ideia de que o direito não é teoria, mas "força viva", "trabalho incessante". Nesse sentido, é revigorante para o leitor encontrar, em um dos prefácios às muitas edições da obra, o já maduro parlamentar maravilhar-se com o surgimento "de novos direitos", dentre eles o direito a um ambiente sadio, os direitos do consumidor, todos frutos da "dinâmica da vida econômica e social". E ao reconhecê-los, sem ranço e com muita abertura, reafirmar a razão de ser do direito, a "luta pela vigência concreta e viva da Justiça", conclamando o intérprete a estar sempre atento a normas que atendam a interesses contrários ao bem comum. Quanta lucidez na distinção entre direitos relativos e absolutos, classificando-os conforme tenham sujeitos passivos determinados ou se dirijam aos membros da sociedade, antecipando, talvez sem o saber, discussão que toma hoje boa parte das interpretações jurídicas mais relevantes. A obra é toda feita de lições preciosas, capazes de funcionar para o estudante como vetores perenes. Sobre o autor : André Franco Montoro foi professor da USP, da PUC/SP e da UnB. Doutor em Direito e Filosofia, escreveu muitas obras jurídicas, dentre as quais, Estudos de Filosofia do Direito. Exerceu funções de relevância na vida pública brasileira: foi vereador no município de São Paulo; deputado estadual em São Paulo; presidente da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo; ministro do Trabalho e da Previdência Social; senador da República e governador do Estado de São Paulo. ___________ Ganhador : Henrique Fratta Lobo, advogado em SP
Editora: Del ReyCoordenadores: Sylvia Helena Steiner e Leonardo Nemer Caldeira BrantPáginas: 1.688 Se é certo que a anterioridade do juízo competente fortalece a legitimidade do julgamento, a ideia de um tribunal permanente, com regras preestabelecidas, em oposição ao casuísmo que pode ser apontado nos tribunais ad hoc é algo muito positivo. Assim, a abertura dos trabalhos do Tribunal Penal Internacional em março de 2003, autorizada pela entrada em vigor em julho do ano anterior do Estatuto de Roma, ratificado pelo Brasil e promulgado por meio do decreto 4.388/2002, caminhou no sentido da civilização. É confortante pensar em uma comunidade internacional intolerante a graves violações de direitos humanos e preocupada com o respeito ao direito humanitário em geral, mas o substrato jurídico do TPI vai além, para atribuir a essa mesma comunidade a legitimidade para exigir o processo e julgamento dos responsáveis por tais violações. No artigo que abre a coletânea vê-se que a ideia não nasceu do dia para a noite, mas ao contrário, veio se desenvolvendo gradativamente desde o Tratado de Versailles, assinado logo após a Primeira Guerra, e foi fomentada sobretudo por discussões de política internacional e filosofia do direito internacional que perceberam "uma ampla e articulada questão penal no âmbito desse ramo do Direito, fornecendo o instrumental teórico necessário para que os internacionalistas - junto com muitos penalistas -, iniciassem a dissecá-la, estendendo seus horizontes para além dos atos de pirataria". Logo em seguida, outro trabalho dá conta de reflexões acerca da natureza da norma jurídica, lembrando que "A visão do Direito como uma ordem inspirada por valores não exclui, é claro, o reconhecimento de que ao regular a conduta das pessoas e das instituições ao terreno social, a norma jurídica contempla interesses e orienta a busca de solução para conflitos", funcionando como advertência pertinente a um tribunal que ainda enfrenta duras críticas acerca de seu alcance. Composta por nada menos do que 73 caprichados artigos - após a cuidadosa introdução feita por cinco diferentes trabalhos todas as disposições do Estatuto de Roma são esmiuçadas -, a preocupação da obra é apresentar o TPI ao leitor, revelando sua composição, competência e jurisdição, regime de garantias, sistema procedimental e o princípio da complementaridade, síntese de sua relação com o Judiciário dos Estados participantes. Coescrita por mais de 50 especialistas de diferentes nacionalidades, muitos deles integrantes do próprio TPI, todos juristas de renome em seus países, a obra está sendo publicada totalmente em língua portuguesa, em louvável trabalho editorial. Sobre os autores : Sylvia Helena Steiner é juíza do TPI desde 2003. Iniciou sua carreira em 1977 como advogada, e em 1982, ingressou por concurso público no MP Federal; foi procuradora Regional da República em São Paulo até 1995, quando foi nomeada desembargadora do TRF da 3ª região, onde atuou até 2003. Graduada em Direito pela USP, mestre em Direito Internacional pela USP. Leonado Nemer Caldeira Brant é doutor em Direito Internacional pela Universidade Paris X, Nanterre, com tese laureada com o Prix du Ministère de la Recherche; mestre em Direito pela UFMG. Jurista adjunto na Corte Internacional de Justiça - CIJ. Ex-membro do Comitê Consultivo para Nomeações do TPI. Professor associado de Direito Internacional Público da UFMG e da PUC/Minas. Presidente da Comissão de Relações Internacionais da OAB/MG. Advogado. ___________ Ganhador : José Alexandre Silva Lemos, de Aracaju/SE
Editora: NoesesAutor: José Renato CamilottiPáginas: 372 A preocupação da obra é eminentemente prática: a partir de pronunciamentos reiterados do STJ, a jurisprudência vem se estabilizando de modo que "sem considerar o necessário contexto hermenêutico-normativo, encerra, com uma pá de cal, o instituto da denúncia espontânea [previsto no art. 138 do CTN] no sistema de direito positivo brasileiro". Nesse cenário, embora adote de saída premissas teóricas, a louvável pretensão do trabalho é suscitar na doutrina o inconformismo com tal estabilização contra legem. Em termos claros e rigorosamente pautados pela lógica o texto busca, assim, "(...) não deixar esmorecer as discussões, os debates, não deixar arrefecer os argumentos, as alegações, para que o tema da denúncia espontânea permaneça presente (...)". Adotando a concepção de direito positivo como sistema de comunicação, e a norma jurídica como unidade comunicacional, asserções apoiadas nas lições de Vilém Flusser, a obra é aberta com a marcação da importância do rigor e da precisão da linguagem para controle do discurso científico. Em seguida, o fenômeno jurídico é "situado" como sistema de comunicação, o que enuncia a "imprescindibilidade da linguagem para a manifestação de qualquer dado do fenômeno jurídico". De posse desse instrumental, o autor aproxima-se do art. 138 do CTN, para então reconhecer, nos termos do que Umberto Eco chamou de superinterpretação, uma série de "interpretações ruins" feitas pela jurisprudência para a norma citada, conferindo-lhes sentido que "se desconectam dos parâmetros do texto a ser interpretado e do contexto em que se desenvolve tal interpretação". Interpretações, enfim, na percepção do autor, que terminam por mitigar o campo de incidência da norma, na medida em que se valem de ressalvas e segregações que a linguagem da norma não autoriza. Encantado com a coerência lógica da análise e com a relevância prática da proposta, o leitor chega, com o autor, à naturalidade da conclusão: a denúncia espontânea é integrante do rol de direitos e garantias individuais dos contribuintes, e como tal, é temerário que esteja sendo afastada. Sobre o autor : José Renato Camilotti é mestre em Direito Tributário pela PUC/SP; especialista em Direito Tributário pela PUC/SP/COGEAE. Advogado e consultor tributário. ___________ Ganhadora: Gracia Aparecida Branco Camargo, advogada em Florianópolis/SC
quarta-feira, 23 de março de 2016

Controle de Constitucionalidade e seus efeitos

Editora: JusPodivmAutor: Olavo Augusto Vianna Alves FerreiraPáginas: 318 A fim de evitar decisões conflitantes, são dotadas de efeito vinculante as decisões de procedência e de improcedência proferidas em sede de controle abstrato - também chamado concentrado - de constitucionalidade. O mesmo motivo, ensina o autor, inspirou a súmula com efeito vinculante e as alterações legislativas daí decorrentes. Preliminarmente, é imperiosa a advertência trazida pela obra, segundo a qual o efeito vinculante é mais abrangente do que o efeito erga omnes, pois cria uma relação de subordinação, obrigando seus destinatários a aplicarem a mesma tese a todos os casos que versarem sobre a mesma matéria, enquanto o efeito erga omnes produz efeitos "tipicamente processuais", impedindo propositura de nova discussão sobre o mesmo tema. Fácil compreender, portanto, a preocupação do autor, para quem o efeito vinculante "restringe demasiadamente a liberdade do operador do direito" e do intérprete da Constituição, configurando inconstitucionalidade, na medida em que violaria o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, do juiz natural, a possibilidade de controle das leis de forma incidente e até mesmo a separação dos poderes. Em debate denso, profundo, o autor segue advertindo que o efeito vinculante "implica certa relativização da coisa julgada 'inconstitucional', pois os demais órgãos judiciários também estão obrigados a adotar idêntico sentido dado à questão constitucional pelo STF (...) mesmo que a decisão questionada tenha sido proferida antes da decisão vinculante (...)". É esse o foco da obra, que em sua terceira edição, amplia o alcance do texto que já é um sucesso - vide, abaixo, o extenso rol de julgados do STF que o cita diretamente1 -, para acolher também recortes suscitados pelo Novo Código de Processo Civil, que acaba de entrar em vigor e inaugura, dentre outros temas, o efeito vinculante para os precedentes judiciais, especialmente aqueles proferidos no incidente de julgamento de casos repetitivos e no incidente de assunção de competência. Pelo ponto de vista esposado, essa extensão do efeito vinculante a outras hipóteses afigura-se, pelos mesmos fundamentos, também inconstitucional. A obra debruça-se ainda sobre a também polêmica eficácia temporal das decisões. Para o autor, não há dúvidas de que o ato inconstitucional é nulo, e não anulável, pois a CF "dispõe que a inconstitucionalidade é reconhecida por decisão declaratória (...)", e não constitutiva. Os efeitos deveriam ser, pois, ex tunc, já que os atos normativos inconstitucionais nunca teriam possuído "aptidão para produzir efeitos jurídicos válidos". Ocorre que com o advento das leis 9.868 e 9.882, de 1999, passou a ser permitido ao STF, tendo em vista "razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social", por maioria de dois terços de seus membros, "restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado", autorizando assim a produção de efeitos ex nunc, o que seria inconstitucional para boa parte da doutrina, inclusive para o autor. Com o zelo e a propriedade do estudioso, e sem abrir mão da sagacidade, o autor constrói texto denso, amplo, capaz de a um só tempo fotografar o momento presente e destacar, na mesma foto, o que não se enquadra no desenho constitucional. Sobre o autor : Olavo Augusto Vianna Alves Ferreira é doutor e mestre em Direito do Estado pela PUC/SP. Professor de cursos preparatórios para concursos públicos desde 1999; professor convidado de cursos de pós-graduação - PUC-COGEAE, UFBA, FAAP, LFG; professor titular do Programa de Mestrado e da Graduação da Unaerp; orientador da pós-graduação da Escola Superior da Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo e da pós-graduação da USP-FDRP. Procurador do Estado de São Paulo desde 1998. __________ 1 ADIn MC 3.300 (informativo do STF n. 414), RE 438025, RE 422536, RE 383962, RE 371089, Rcl 5.512-MC, RE 353508 AgR, AI 589789 AgR, AI 582280 AgR, AI 589281 AgR, RE 395902 AgR, AI 453071 AgR, Rcl 6064 MC. ___________ Ganhadora : Neusi Camargo, advogada em Brasília
Editora: Thomson Reuters, por meio de seu selo editorial Revista dos TribunaisAutores: Gilberto Gomes Bruschi, Rita Dias Nolasco e Rodolfo da Costa Manso Real AmadeoPáginas: 192 A efetividade do cumprimento de sentença condenatória ou da execução de pagar quantia certa depende da existência de bens no patrimônio do executado, o que além de lógico, depreende-se da dicção do art. 789 do Novo CPC, segundo o qual, "o devedor responde, para o cumprimento das suas obrigações, com todos os seus bens, presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei". Pois são essas restrições uma das motivações da obra, para a qual em que pese à legitimidade das impenhorabilidades, o Novo CPC permite ao intérprete privilegiar a garantia da execução, uma das maneiras de se resguardar a dignidade da justiça, protegida, dentre outros, pelo seu art. 774, e pelas hipóteses de desconsideração da personalidade jurídica arroladas no art. 792. Sobre o peso da interpretação é importante que se faça, de partida, remissão a pesquisa empírica realizada por um dos autores1 tomando por base mais de 130 precedentes do STJ, em que se apurou que a atribuição do ônus de provar a má-fé do terceiro adquirente ao credor (Súmula 375) faz com que a fraude à execução seja declarada em estarrecedores menos de 8% dos casos. Embora não neguem a necessidade de proteção ao adquirente de boa-fé, os autores argumentam que tal interpretação não é a melhor, consistindo em verdadeira prova diabólica. O razoável seria cobrar do adquirente, isso sim, o dever de exigir a exibição das certidões negativas do local do bem e do domicílio do vendedor. A adoção da teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova pelo Novo CPC (art. 373, § 1°) corroboraria a tese. Ligada aos deveres processuais de lealdade, cooperação e boa-fé, não só das partes mas de todos aqueles que participam do processo, a distribuição dinâmica pode ser determinada de ofício ou a requerimento das partes em casos de impossibilidade ou excessiva dificuldade de cumprir o encargo (prova diabólica), ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, em nítida atenção à efetividade do processo. Outro dado relevante marcado pelos autores é que diferentemente do Código de 1973, o CPC de 2015 arrola dentre as condutas caracterizadoras de atos atentatórios à dignidade da justiça comportamentos omissivos do executado, conferindo ao juiz um alargamento das situações capazes de serem reconhecidas como tal. Os autores discorrem ainda sobre a incompatibilidade do art. 54 da lei 13.097/2015 com o inciso IV do art. 792 do Novo CPC e a imperiosidade de que este último prevaleça, não só em razão de sua posterioridade, mas também pela coesão do sistema, pois é certo que nem toda constrição sobre imóvel é levada a registro. Em argumentação cuidadosa, detida, os autores não só delineiam as hipóteses em que "os limites dos patrimônios do devedor e do terceiro tornam-se inoponíveis", mas destacam, sobretudo, as nuances hermenêuticas capazes de perverter ou acurar a finalidade da lei. Sobre os autores : Gilberto Gomes Bruschi é doutor e mestre em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Professor na graduação e na pós-graduação da Faculdade Damásio. Advogado em SP. Rita Dias Nolasco é doutora em Direito pela PUC/SP. Professora do Cogeae/PUC/SP na especialização em Direito Processual Civil. Professora do curso de especialização em Direito Processual Civil da Escola Superior da Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo e da Escola da Advocacia Geral da União. Procuradora da Fazenda Nacional. Rodolfo da Costa Manso Real Amadeo é doutor e mestre em Direito Processual Civil pela USP. Professor de Direito Processual Civil na pós-graduação em Direito da FGV (GVLaw). Advogado da banca Lilla, Huck, Otranto, Camargo Advogados. __________ 1 AMADEO, Rodolfo da Costa Manso Real. A relevância do elemento subjetivo na fraude de execução. Tese de Doutorado. Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2010, p. 220 e ss. __________ Ganhadora : Shirley Pereira Delgado de Sousa, de João Pessoa/PB
Editora: Thomson Reuters, por meio de seu selo editorial Revista dos TribunaisAutores: Cezar Saldanha Souza Junior e Carlos Eduardo Dieder ReverbelPáginas: 175 Se o modelo teórico descrito por Montesquieu, a célebre tripartição dos poderes, permitia desenhar um certo equilíbrio para o Estado no século XVIII, para os autores o que melhor define e reflete um contorno balanceado de poderes para o Estado no século XXI é o que chamam de hexapartição, modelo que demarcam como idealizado no primeiro pós-guerra por Hans Kelsen e consolidado no segundo, com a criação dos Tribunais Constitucionais em vários países ocidentais. Sim, a ideia é essa, tratar a divisão dos poderes como processo histórico, na intenção de mostrar aos leitores a racionalidade subjacente a tal evolução, ou seja, a "especialização crescente dos poderes políticos, que não terminará enquanto houver Estado sobre a terra". Nesse propósito, partem do início da Idade Moderna, quando a concentração do poder nas mãos do soberano permitiu a criação da "esfera pública", até os dias atuais, em que as democracias ocidentais mais desenvolvidas alcançaram o tal modelo hexapartido de poder. Nesse caminho, a grande virada é a passagem da Constituição de carta política, sem força normativa, para o modelo em que se tornou carta jurídica, o que começa a acontecer na segunda década do século XX, "No bojo da escola alemã de direito público", cuja concepção encontra sua representação máxima na Teoria Pura do Direito, de Hans Kelsen. Em um ordenamento jurídico "piramidal e escalonado, estruturado em bases rigorosamente lógicas", a Constituição passa a ser o ápice, em cujo texto todas as demais normas passam a encontrar validade. A aplicação das Cartas Magnas passa então a independer da boa vontade política dos governantes, as constituições deixam de ser acordo de cavalheiros para se tornarem normas jurídicas, passando ao controle dos tribunais constitucionais, que de "excentricidade estadunidense" passam a ser vistos, "numa das maiores revoluções da história do direito continental", como "centro vivo da nova concepção do sistema constitucional". Como o leitor pode depreender, ao tratar o tribunal constitucional como poder político do Estado, ainda que partindo de um corpus formado pelas democracias históricas, deixa de ser teórica a proposta da obra para falar diretamente às perplexidades institucionais vivenciadas neste momento pelo Brasil, cuja democracia ainda se encontra em desenvolvimento e se sente abalada pelo chamado protagonismo do Judiciário. Sobre os autores : Cezar Saldanha Souza Junior é livre-docente em Direito pela USP; doutor e mestre em Direito do Estado pela USP; especialista em Development Administration pela Manchester University, Reino Unido. Professor titular de Direito na UFRGS. Procurador da Fazenda Nacional aposentado. Carlos Eduardo Dieder Reverbel é doutor em Direito do Estado pela USP; doutor em Direito do Estado pela UFRGS; especialista em History and Western Culture pela Notre Dame University, EUA; especialista em Direito do Estado pela UFRGS. Professor adjunto de Direito do Estado pela UFRGS. __________ Ganhadora : Kátia Munhoz de Ávila, advogada em Amparo/SP
quarta-feira, 2 de março de 2016

Teoria Geral do Novo Processo Civil

Editora: Malheiros Editores Ltda.Autores: Cândido Rangel Dinamarco e Bruno Vasconcelos Carrilho LopesPáginas: 263 A obra sela alguns encontros interessantes, dentre eles entre "um dos mais antigos e idosos processualistas em atividade no país e um jovem integrante de uma geração bem posterior", entre "a solidez de pensamentos amadurecidos durante mais de cinco décadas e a modernidade das construções desenvolvidas na doutrina nacional e estrangeira em tempos mais recentes", tudo em palavras escolhidas pelos próprios autores. Embora construída na mesma linha da célebre Teoria Geral do Processo, em que Dinamarco compõe um dos vértices da tríade autora, esta optou por recorte mais específico, deixando de dizer respeito ao processo, de maneira geral, e passando a se dedicar aos institutos fundamentais do direito processual civil: jurisdição civil, ação civil, defesa no processo civil. Excluídos, pois, os institutos e procedimentos de natureza penal, trabalhista e eleitoral, o que não deixa de ser encontro dos autores com antigo anseio da doutrina, para quem as diferenças sobretudo da seara penal limitavam o alcance do enfoque geral. As lições são inauguradas com noções da relação entre direito material e processo, esse conceituado em primeiras linhas como técnica para a solução imperativa de conflitos, o que confere chave hermenêutica à obra e proporciona outro encontro de relevo, agora com o clássico texto A instrumentalidade do Processo, também de autoria de Dinamarco, elaborado em momento de virada do processo brasileiro. Ao tratar dos princípios do processo civil a obra revela mais um encontro significativo, o da contemporânea supremacia da Constituição com os modernos fundamentos processuais, dedicando-se não só "ao método consistente em examinar o sistema processual e os institutos do processo à luz da Constituição (...)" mas também à regra da proporcionalidade a ser utilizada em casos de colisões entre princípios, em nome da harmonização entre os meios empregados e os fins a serem alcançados. É a proporcionalidade, explicam os autores, que autoriza e legitima, por exemplo, a concessão de medidas urgentes antes da citação do réu, e, portanto, sem a prévia efetivação da garantia constitucional do contraditório, grande nota distintiva do atual processo sincrético brasileiro. O itinerário permite traçar as principais notas características do "procedimento-padrão para a prestação da tutela jurisdicional"; de suas diferentes fases; do processo monitório; do processo nos juizados especiais; do processo coletivo; do processo arbitral; da eficácia das sentenças; dos recursos e outros meios de impugnação das decisões judiciais. E em sua boa tessitura constrói o encontro entre autores e leitores. Sobre os autores : Cândido Rangel Dinamarco é sócio do escritório Dinamarco, Rossi, Beraldo & Bedaque Advocacia. Professor aposentado de Direito Processual da Faculdade de Direito da USP; desembargador aposentado do TJ/SP; ex-procurador de Justiça em São Paulo. Bruno Vasconcelos Carrilho Lopes é advogado do escritório Dinamarco, Rossi, Beraldo & Bedaque Advocacia. Mestre e doutor em Direito Processual pela USP. __________ Ganhadora : Juliana Rodrigues Vieira Lazarini, advogada em Arapongas/PR
quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Tratado de Registros Públicos e Direito Notarial

Editora: AtlasAutor: Marcelo RodriguesPáginas: 1.154 Ao expor que o fenômeno da "desjudicialização" é uma realidade progressiva no direito brasileiro, como alternativa eficaz, célere e segura à "complexa, onerosa, e por vezes, demorada movimentação da máquina judicial", o autor não só ressalta a pertinência da obra, mas também contextualiza toda uma gama de diplomas legais surgidos em pouco mais de uma década com o fito de conferir aos cartórios e tabeliães brasileiros a prerrogativa de celebrar atos e negócios antes privativos do Poder Judiciário. Nesse rol, inserem-se, dentre outras, a lei 9.514/1997, que permitiu a execução extrajudicial na alienação fiduciária de imóveis; a chamada Lei de Afetação, lei 10.931/2004, que autoriza o processamento extrajudicial da retificação de área de imóveis urbanos e rurais; a lei 11.441/2007, que conferiu atribuição concorrente aos tabeliães de notas para a realização de inventário, partilha e separação se todos os interessados forem capazes e concordes; a lei 11.977/2009, que dentre outras providências instituiu o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida, mas que também criou nova modalidade de aquisição da propriedade imobiliária em área de interesse social, permitindo que a formação do título se dê perante o cartório de registro de imóveis, e por fim, embora não se trate de lei, merece lembrança a Resolução 125 do CNJ, que autoriza e disciplina as práticas de mediação e conciliação por notários e registradores. Em semelhante contexto, a obra reúne doutrina, legislação e jurisprudência referente ao Direito Registral e Notarial, enxergados, muitas vezes, como misteriosas searas, em razão sobretudo das características formais que lhes acentuam a especialidade. Sobre essa, o autor destaca que se origina do fato de tratar-se de administração pública de interesses privados, "instrumentalizada por meio de procedimentos especiais, seja de índole processual, seja de viés exclusivamente administrativo, similares à jurisdição voluntária (...)". Sobre o fim último dos registros públicos, é perfeita a lição do autor ao relacioná-los ao "aperfeiçoamento e desenvolvimento do sistema de publicidade", que em nosso sistema jurídico desdobra-se em autenticidade, segurança e eficácia, desvelando, assim, a transcendência do tema, que de nenhuma forma se limita às formalidades. A completude da obra fez com que a primeira edição estivesse esgotada em menos de um ano. Para esta segunda, recém-saída do forno, o autor preparou a atualização com o novo Código de Processo Civil (lei 13.105/2015), que entrará em vigor no próximo mês. Sobre o autor : Marcelo Rodrigues é desembargador do TJ/MG. Consultor especial da Comissão de Anteprojeto do Código de Normas dos Serviços dos Tabelionatos e Registros Públicos do Estado de Minas Gerais. Presidente da Comissão de Concurso e examinador da disciplina Registros Públicos. Ex-juiz de Direito titular da vara de Registros Públicos de Belo Horizonte. __________ Ganhador : Bruno Gressler Wontroba, de Curitiba/PR
quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Justiça Fiscal

Editora: Del ReyCoordenadores: Misabel Abreu Machado Derzi e João Paulo Fanucchi de Almeida MeloPáginas: 657 Discutir Justiça fiscal envolve pensar o tipo de Estado que se quer, mas nas bem ponderadas lições de Sacha Calmon, que aponta a distância dos caminhos escolhidos por Noruega e Índia, envolve também a realidade que se tem. Assim, os 21 trabalhos que integram a coletânea tratam desde princípios e fundamentos para a tributação até estudos pontuais, em que mecanismos práticos como a progressividade do IPVA, por exemplo, são trazidos e discutidos sob a ótica da tributação justa. Para debate tão profundo, é pertinente começar pelas lições de Heleno Taveira Torres, que lembra em seu artigo que para a justiça em matéria tributária não basta a legalidade e a isonomia; é preciso adicionar requisitos de aferição da "Justiça individual e sistêmica", caso da pessoalidade, da generalidade, da proporcionalidade, da capacidade contributiva, etc. Em busca dos requisitos legítimos o festejado doutrinador traça minucioso histórico do fundamento do tributo ao longo da história da civilização, com especial atenção à passagem do bem comum aristotélico e tomista às razões de Estado cantadas pelo absolutismo, para enfim alcançar os dias de hoje, em que essas últimas cedem espaço ao interesse público, que com assento na Constituição, vai conferir legitimidade à tributação. Aqui, são pertinentes os parênteses para destacar que no dizer do autor, interesse público, para a Constituição, é a proteção dos direitos e liberdades fundamentais. Ainda sobre os fundamentos da tributação, um dos coordenadores da obra, o professor e advogado João Paulo Fanucchi de Almeida Melo também busca "revisitar na história os diferentes fundamentos utilizados para dar sustentáculo ao exercício da tributação até os dias atuais", explorando com percuciência a evolução do conceito de igualdade e relacionando-o à capacidade contributiva, "a medida de comparação a ser adotada". Em ponto alto da coletânea, Misabel Abreu Machado Derzi, Cristiane Miranda Botelho e Regivano Fiorindo demonstram, em trabalho de fôlego, que a tributação da renda da pessoa física no Brasil afasta-se dos princípios constitucionais tributários da universalidade e da generalidade ao conceder isenções à distribuição de lucros e dividendos de sócios e acionistas (art. 10 da lei 9.249/1995), "submetendo-se essencialmente o rendimento assalariado à tabela do IRPF", e permitindo que "o maior percentual do IRPF" seja pago "essencialmente por servidores públicos e funcionários das empresas estatais". Muitos outros temas completam a coletânea, dentre os quais a necessidade de maior tributação de heranças e doações no Brasil, por Aluizio Porcaro Rausch; a imperiosidade da desoneração da folha de pagamentos, por Gabriela Cabral Pires; o apelo à participação do contribuinte na formulação da política tributária, por Reinaldo Lage Rodrigues de Araújo. Sobre os coordenadores : Misabel Abreu Machado Derzi é professora titular de Direito Tributário e Financeiro da UFMG e Faculdades Milton Campos. Presidente honorária da ABRADT. Advogada. João Paulo Fanucchi de Almeida Melo é professor da pós-graduação e da graduação da PUC/Minas. Mestre em Direito pela PUC/Minas; doutorando em Direito Público pela Universidade de Coimbra. Advogado. __________ Ganhadora : Tassia Mara Pereira Lima, do TJ/RO, de Cacoal
Editora: Quartier LatinAutor: Newton Coca Bastos MarzagãoPáginas: 236 Embora distante de suas raízes, e talvez influenciado pelo modelo norte-americano, fundado na common law, o ordenamento jurídico pátrio vinha, há algum tempo, privilegiando a forma pecuniária de recomposição dos danos. Nas balizas postas pelo autor, partindo de uma inexplicável reverência ao princípio nemo ad factum praecise cogi potest e "ancorados na falsa premissa de que a intangibilidade da vontade humana garantiria a liberdade individual, os Tribunais e a doutrina vinham sistematicamente relegando o desempenho da tutela específica a segundo plano". Gradativamente desenvolveu-se a percepção de que i) nem todos os direitos violados podem ser satisfatoriamente recompostos por meio de indenizações pecuniárias; ii) o cumprimento forçado em juízo de obrigação prévia e livremente assumida não caracteriza ofensa à liberdade individual; iii) os direitos transindividuais são melhor protegidos por meio das tutelas cominatórias do que por provimentos indenizatórios, e tal modelo de atuação jurisdicional passou a ser contestado. Nas lições do autor, não só os operadores do Direito, "mas sobretudo os próprios consumidores dos serviços jurisdicionais" passaram "a clamar por um sistema processual (...) capaz de tutelar os próprios direitos ameaçados (...)". Tais percepções e queixas culminaram em reformas legislativas - iniciadas em 1992, e inspiradas sobretudo pela "bem sucedida e paradigmática disciplina dada a tais tutelas [específicas] pelos arts. 83 e 84 do Código de Defesa do Consumidor (...)", o legislador alterou, primeiramente, os arts. 461, 644 e 645 do CPC, para sucessiva e lentamente conferir à tutela específica "o lugar de primazia que vinha sendo indevidamente ocupado pelo sucedâneo indenizatório". É nesse contexto que surgem as astreintes, multa coercitiva imposta à parte recalcitrante em cumprir a obrigação que se vem mostrando como "a ferramenta mais eficaz e mais utilizada pelas partes para obtenção da tutela específica em Juízo". Sobre tal instrumento não há regramento detalhado: qual o campo de incidência? A partir de quando a multa se torna exequível? Pode ser imposta cumulativamente a outras sanções, como o crime de desobediência? Tem o autor a obrigação de devolvê-la, se a liminar vier a ser reformada por provimento final? Quais os critérios para a fixação do valor e da periodicidade da multa? Quem é o ente legitimado para a excussão, o Estado ou o autor? Essas são algumas das questões exploradas pela obra, que para solvê-las busca apoio na doutrina e na jurisprudência brasileiras, mas também no Direito Comparado. A par do profundo alcance prático, o texto tem qualidades intrínsecas - é objetivo sem deixar de ser erudito. Erudição, aliás, percebida e destacada pela arte editorial escolhida: diagramação e tom de papel clássicos ressaltam a sobriedade do trabalho. Sobre o autor : Newton Coca Bastos Marzagão é advogado do escritório Demarest Advogados. Mestre em Direito pela Faculdade de Direito da USP. __________Ganhadores : Thomaz Pompeu Magalhaes Neto, de Fortaleza/CE Stefânia Tubaldini Chagas
Editora: ZeniteAutores: Gustavo Justino de Oliveira e Gustavo Henrique Carvalho SchieflerPáginas: 194 Prevista no art. 25, II, da lei 8.666/93, a inexigibilidade de licitação para os serviços técnicos especializados tem sido o grande calcanhar de Aquiles dos agentes públicos, que além de incidirem no art. 89 do mesmo diploma, terminam muitas vezes nas teias da Lei de Improbidade Administrativa. A par dos reais abusos perpetrados por esses agentes, ou talvez exatamente em razão deles, existiria uma espécie de desconfiança sobre as contratações diretas, certa "presunção de que a ausência de licitação corresponde a práticas de corrupção". Em outras palavras, abusos também por parte dos julgadores, a começar dos tribunais de contas, cujos excessos, sob a perspectiva dos autores, estaria levando à "própria captura da discricionariedade administrativa pelos órgãos de controle". Assim, o objetivo do estudo é "oferecer elementos para atenuar o ambiente de insegurança jurídica que envolve a temática", em nome sobretudo da eficiência - é certo que a licitação desnecessária significa custos e tempo dispendiosos à Administração. De mais a mais, argumentam os autores, o administrador público não deve contratar serviços técnicos especializados de qualidade duvidosa ou a serem prestados por profissionais de cuja confiança não compartilha. Se nem o particular contrata dessa forma, por que razão haveria de fazê-lo a Administração, a quem cabe "conservar" os interesses da coletividade? Mas onde está a dificuldade na interpretação do dispositivo em foco? Uma das chaves para afastar a nebulosidade seria livrar-se da imagem corriqueira de regra e exceções e interpretar licitação, dispensa e inexigibilidade como institutos distintos, postos lado a lado, no mesmo patamar. Afinal, arrazoam os autores, encontram idêntica guarida constitucional, não existindo razão para tratá-las como "nobre" e "menos nobres"; devem, isso sim, igualmente servir ao melhor atendimento do interesse público. Em seguida, é necessário delimitar os termos trazidos pela lei: começam da própria expressão "serviços técnicos especializados", estendendo-se pela "inviabilidade de competição", "natureza singular", "notória especialização". Passam em seguida a exemplos práticos, elencando, dentre outros, a capacitação e treinamento de pessoal da própria administração; a contratação dos chamados "sistemas de ensino", envolvendo livros, apostilas e conteúdo online; a clássica contratação de consultoria jurídica; a compra de periódicos especializados. Nesse mesmo capítulo, as análises envolvem julgados selecionados do STF e STJ. Sobre os autores :Gustavo Justino de Oliveira é advogado do escritório Justino de Oliveira Advogados. Professor doutor de Direito Administrativo na USP. Pós-doutor em Arbitragem Internacional pelo Max-Planck-Institut (Hamburgo) e em Direito Administrativo pela Universidade de Coimbra. Educação Executiva em Negociação pela Harvard University. Presidente da Comissão da Administração Pública do CAM-CCBC. Árbitro e consultor em Direito Público.Gustavo Henrique Carvalho Schiefler é doutorando em Direito do Estado pela USP. Mestre e bacharel em Direito pela UFSC, onde desenvolveu pesquisa na área de Direito Administrativo Contratual. Educação Executiva pela Harvard University. __________Ganhadores : Ana Paula Fonseca Alves, de São Luís/MA Augusto Bouret Orro, de Cuiabá/MT
Editora: Del ReyAutor: Sérgio Abdalla SemiãoPáginas: 214 Sob o prisma exclusivo do Direito positivo brasileiro, personalidade jurídica é "a aptidão para ter direitos e obrigações". Mas quando se dá o início de tal personalidade civil da pessoa natural como sujeita de direitos? Mostrando que a resposta divide a doutrina entre concepcionistas e natalistas, e alinhando-se a esses últimos, o autor mostra que embora o art. 2° do Código Civil reconheça alguma proteção ao nascituro, distingue-o claramente da pessoa já nascida, tanto que "põe a salvo" alguns direitos. Ao contrário, se fosse "considerado pessoa, teria todos os direitos inerentes à personalidade civil plena", não havendo necessidade de elencá-los. E nessa linha argumentativa derruba o principal argumento dos concepcionistas - corrente minoritária, mas com representantes de peso na doutrina brasileira -, que apontam a proibição do aborto pelo Direito Penal como o principal sinal de que sim, desde a concepção o ser humano é protegido pelo Direito brasileiro como se já tivesse nascido. Para o autor, basta contrapor a pena cominada ao crime de aborto à do homicídio para constatar a diferença da proteção. Com o avanço da ciência, a questão adquire um novo viés, e para o autor, a teoria natalista ganha sobrepeso como "a que melhor se adequa à ciência da biogenética" e "ao sistema constitucional aberto". Com a constitucionalização do Direito Civil, adverte, não há mais como estudar o assunto sem o Direito Constitucional. Assim, recorre à argumentação do STF na ADIn 3510, em que o relator, ministro Ayres Britto, fundamentou a permissão à pesquisa e terapia com células-tronco de embriões humanos na refutação inequívoca da tese da personalidade civil desde a concepção, para reconhecer como "pessoas físicas ou naturais (...) somente aquelas que sobrevivem ao parto feminino (...)". A discussão adentra os meandros da biotecnologia, expondo as controvertidas e relevantes questões éticas e deontológicas com que tem que se deparar o jurista do biodireito na atualidade, como a inegável necessidade de destruição de embriões para o avanço da ciência, em que pese à existência dos limites contidos no art. 5° da lei de Biossegurança. Com rigor científico, respeito a opiniões divergentes e tratamento cuidadoso do tema, o autor percorre as principais situações-problema trazidas pelo avanço científico - comercialização e doação de embriões, posse em nome de nascituro procriado artificialmente, direito das sucessões de embriões criopreservados -, contrapondo-as, sempre, unicamente, ao ordenamento jurídico brasileiro. Sobre o autor : Sérgio Abdalla Semião é doutor em Direito pela UFMG, mestre em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos. Juiz de Direito do TJ/MG. __________ Ganhadora : Karina Y. O. Braga, de Campo Grande/MS
quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Lavagem de Dinheiro por meio de Obras de Arte

Editora: Del ReyAutor: Fausto Martin De SanctisPáginas: 329 Por meio de brechas legais e institucionais, quantidades vultosas de dinheiro provenientes de crimes têm sido convertidas em dinheiro lícito a partir da aquisição de obras de arte. E pasmem: galerias e casas de leilões não constituem as únicas instituições de que têm se servido os criminosos - ONGs, trusts, associações, fundações, também foram encontradas no criterioso percurso de pesquisa empreendido pelo autor. Ao compor o histórico da repressão aos grandes crimes econômicos o autor lembra a grande virada representada pela Convenção de Viena de 1988, primeira expressão concreta da conscientização internacional da inutilidade dos ordenamentos nacionais no combate a essa espécie criminal. À época, contudo, a preocupação concentrava-se no narcotráfico, e a "objetividade jurídica era, ainda que de modo indireto e reflexo", a mesma dos crimes de tráfico ilícito de drogas. Ao ampliar o espectro, começam a surgir problemas conceituais e doutrinários para sua objetivação, dentre os quais, a grande dificuldade em traçar um modus operandi único. Sob o aspecto técnico, deve-se ter em vista que o delito de lavagem de dinheiro é conduta destinada a esconder um crime antecedente. Nesse contexto, o autor explica que a arte constitui um dos setores atrativos diante das grandes transações monetárias envolvidas e de certo desconhecimento desse mundo particular, marcado por confidencialidade e historicamente cercado de atividades criminosas como furto, falsificação, receptação. Decorre desse quadro a importância do mapeamento do ambiente de negociação de obras de arte levado a cabo na obra, que além das características acima destaca a inexistência de autorização legal específica para a atividade dos dealers - aqui o autor narra a experiência norte-americana, que preocupada em combater o financiamento ao terrorismo, desde o Patriot Act obriga os corretores e negociadores de arte a reportarem as operações em espécie superiores a dez mil dólares. A obra comenta os principais diplomas internacionais existentes sobre o tema, assim como as iniciativas para adequação do ordenamento brasileiro aos parâmetros das Recomendações do Grupo de Ação Financeira Internacional. Um dos pontos altos está na minuciosa análise de casos da jurisprudência - cerca de um terço do texto dedica-se a tais narrativas. Outro ponto que merece destaque são as muitas reflexões proporcionadas: se em sua origem o Direito preocupava-se em proteger instituições básicas do Estado e sobretudo os interesses mais elementares dos cidadãos, a complexa realidade social contemporânea tem exigido "brutal mudança das estratégias de intervenção estatal", uma tutela jurídico-penal capaz de alcançar tentáculos deitados sobre todas as esferas da sociedade. Em texto descomplicado, De Sanctis deita luz sobre as novas técnicas usadas para lavagem de dinheiro pela criminalidade organizada, chamando a atenção do jurista para a necessidade do aperfeiçoamento institucional e normativo em nome da persecução criminal eficaz. Sobre o autor : Fausto Martin De Sanctis é doutor em Direito Penal pela USP e especialista em Processo Civil pela UnB. Foi Procurador do município de SP, procurador do Estado de SP, juiz de Direito do Estado de SP. Atualmente é desembargador Federal no TRF da 3ª região. __________ Ganhador : Alexsander Prado, advogado em Porto União/SC
Editora: AtlasAutor: Luis Fernando GuerreroPáginas: 197 Uma interpretação "moderna" para o conceito de ação incorpora também os mecanismos alternativos de solução de controvérsias, na medida em que passa a ser definido como o direito do indivíduo perante o Estado de obter instrumentos eficientes para a satisfação do seu direito. Em outras palavras, com a permissão estatal, a negociação, a conciliação, a mediação e a arbitragem também passam a servir à pacificação social, e como tal, devem ser miradas sob o ângulo instrumental, técnicas para se alcançar o bem da vida buscado pelas partes. Na boa lição inaugural da obra, devem proporcionar plena conjugação da instrumentalidade com a efetividade. Ainda assentando premissas, o autor lembra que os métodos alternativos de solução de controvérsias têm importante impacto no tocante à duração razoável do processo, que por meio da EC 45 tornou-se princípio constitucional, "tornando a questão ainda mais relevante em nosso ordenamento jurídico". Nesse contexto, à obra interessa, sobretudo, investigar a natureza jurídica do liame em que se fundamentam tais métodos alternativos de solução de controvérsias, de que modo podem se relacionar, no plano contratual, bem como as consequências processuais e materiais advindas das relações entre eles. Sim, pois a prática tem revelado que os diferentes métodos alternativos de solução de controvérsias são muitas vezes utilizados em uma mesma relação processual, em situações de sequência, ou "em escalonamento". Dependendo do critério adotado para interpretá-los, alerta o autor, as consequências jurídicas serão diversas: poderão ser vistos como sucedâneos do Judiciário, pressupostos processuais negativos, questões judiciais ou até mesmo condições da ação. É um tema, portanto, que demanda o olhar do jurista, a fim de evitar-se o risco de criar mais um obstáculo ao acesso à justiça, em lugar de permitir que a conjugação de diferentes métodos tragam a tão almejada efetividade. O texto detém-se também sobre a possibilidade de os métodos consensuais de resolução de conflitos - previstos contratualmente entre as partes - não serem utilizados, o que de acordo com o ponto de vista sustentado, pode ensejar indenização pela perda da chance de resolver a questão. Até o início do procedimento de resolução, argumenta o autor, a disciplina de tais métodos é contratual, "as bases são de direito privado", edificadas na autonomia da vontade, do pacta sunt servanda e da boa-fé. Valendo-se de olhar afilado, altamente especializado, o autor desvenda para o processualista importantes questões práticas. Sobre o autor : Luis Fernando Guerrero é graduado em Direito pela USP; doutor e mestre em Direito Processual Civil pela mesma universidade; especialista em Negociação e Mediação pela Northwestern University, EUA. Professor da graduação e da pós-graduação da EPD e do MBA em Gestão Empresarial da Fundação Instituto de Administração - FIA/USP. Advogado. __________ Ganhadora: Patrícia Irina Loose, advogada em Tarumã/SP
Editora: Gazeta JurídicaAutor: Tarcisio Vieira de Carvalho NetoPáginas: 372 Com a chamada virada kantiana do Direito, isso é, a reaproximação do Direito da moral e da ética, "julga-se cada vez mais com princípios". Nas ótimas palavras do autor, "no ambiente do neoconstitucionalismo, ou do pós-positivismo, em que os princípios dispõem de força normativa e merecem aplicação concreta, o princípio da impessoalidade, extraído do texto constitucional, fundamenta um sem-número de decisões administrativas, mesmo sem a intermediação de leis". Daí a importância de dotá-lo de contornos claros, visíveis, seguros. Para o intérprete, sustenta o autor, importa saber o que é ser imparcial para uma Administração que não pode ser neutra ou indiferente quanto a interesses legítimos envolvidos. Pois uma das exigências do Estado, no atual contexto, é que seja comprometido com a inclusão, com a igualdade e com a Justiça - Justiça que leve em conta a dignidade humana do administrado. A releitura de todo o Direito, e neste caso, do Direito Administrativo, à luz dos princípios constitucionais, reclama do hermeneuta um novo esforço. É a esse que se lança a obra. Em seu percurso, o autor explora alguns dos conceitos de impessoalidade apresentados por doutrinadores brasileiros, confessando reconhecer nas lições de Odete Medauar a "abordagem completa e contemporânea", que traz para o cerne do conceito a ideia de função, de conjugação de interesses múltiplos envolvidos, "sem preconceitos ou radicalismos de qualquer tipo". Para Medauar, o escopo da impessoalidade é "impedir que fatores pessoais, subjetivos, sejam os verdadeiros móveis e fins das atividades administrativas". A obra traz para o debate também o posicionamento dos tribunais superiores sobre o tema, remarcando que embora no caput do art. 37 a impessoalidade tenha caráter de princípio, no § 1° do mesmo dispositivo e no art. 100 também da CF, assume claramente a forma de regra, não prescindindo da casuística para ser aplicada. No âmbito das decisões administrativas, a vastíssima incursão doutrinária empreendida pelo autor assinala a fundamentação adequada (absoluta correlação entre fundamentação e decisório) como requisito relevante à consagração da impessoalidade, frisando a conexão íntima com o princípio do contraditório e da ampla defesa consagrados na CF, cujo texto procurou "casar" fundamentação e publicidade, "numa parelha de instrumentalização recíproca, como convém". Após explorar as consequências jurídicas da quebra da impessoalidade - desde as possibilidades de anulação do ato até a responsabilização do servidor -, o autor conclui que a implementação da impessoalidade administrativa decisória impõe a adoção de técnicas, dentre as quais emergem a ponderação e a conciliação "como solução constitucionalmente ajustada". Um dos pontos altos do texto é a ampla pesquisa bibliográfica em que se sustenta, constituindo fonte substanciosa para estudiosos da mesma seara. Sobre o autor : Tarcisio Vieira de Carvalho Neto é mestre e doutor em Direito do Estado pela Faculdade de Direito da USP. Professor da Faculdade de Direito da UnB. Ministro Substituto do TSE. Subprocurador-geral do DF. Advogado. __________ Ganhadores : Gustavo Vaughn, de SP ; Diego Marlon Assunção, de Ibiá/MG ; Clarissa Ferrari Veloso, de Barra do Piraí/RJ
Editora: Del ReyAutor: Antônio Pereira Gaio JúniorPáginas: 324 É significativo que logo na abertura da obra o autor tenha optado por remarcar a chamada "dimensão social do processo" como o ângulo de onde tal instrumento deve ser mirado nos dias que correm, "exatamente porque nele é que o jurisdicionado deposita confiança - ainda que, por vezes, em forma diminuta - esperando alcançar sua verdade em tempos onde o descumprimento de uma obrigação acertada é bom negócio para muitos". Significativo porque dá o tom em que se desenvolve a obra, eminentemente prática, eminentemente útil, nas boas palavras do professor Humberto Theodoro Jr, prefaciador do trabalho. Sim, para o autor, na melhor tradição das lições de Cappelletti acerca das "Dimensões do Direito e da Justiça", o Direito e neste caso o Processo, deve ser instrumento a tornar as pessoas mais felizes ou menos infelizes! É "nessa toada" (como ele mesmo repete em vários momentos de sua conversa com o leitor), de trabalhar pelo acesso à Justiça que o autor situa a iniciativa do constituinte, no art. 24, X, de instituir os Juizados de Pequenas Causas (regidos originalmente pela lei 7.244/1984, que teve suas principais disposições transpostas para a atual), e mais à frente, no art. 98, de criar os juizados especiais, cíveis e penais, órgãos em que o processo teria rito mais simples, menos formal, e primaria pela celeridade. Devem, pois, ser essas as premissas orientadoras da interpretação das leis 9.099/1995, 10.259/2001, e 12.153/2009 - não se deve esquecer, e o autor remarca: essas leis vieram para que não fiquem longe do Judiciário aqueles jurisdicionados que pelo sopesamento valor/duração da demanda tradicional escolheriam a não litigância, contribuindo para deixar crescer na sociedade a tal "litigiosidade contida", tão bem definida por Kazuo Watanabe, um dos autores do anteprojeto da primeira lei dos juizados. Sob essas chaves o autor desenvolve a obra de maneira tripartida, examinando cuidadosamente em cada uma das leis acima, referentes aos i) juizados especiais cíveis estaduais; ii) juizados especiais cíveis federais; iii) juizados especiais da Fazenda Pública, tópicos como composição, competência, procedimentos, atos cognitivos, cautelares e de execução. Em seguida de cada parte, a íntegra da lei respectiva completa as lições. Sobre o autor : Antônio Pereira Gaio Júnior é pós-doutor em Democracia e Direitos Humanos pela Universidade de Coimbra; doutor em Direito pela Universidade Gama Filho; mestre em Direito pela mesma universidade. Professor adjunto da UFRRJ. Advogado. __________ Ganhadora : Luciane Dilly, de Guaraciaba/SC
quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Ética das Virtudes e Ponderação

Editora: Nuria FabrisAutor: Guilherme Moreira Loures da CostaPáginas: 119 De acordo com as premissas postas pelo autor, "no meio jurídico brasileiro, desde o advento da Constituição de 88, notáveis esforços têm sido despendidos pelos doutrinadores no sentido de encontrar um conteúdo sólido para o princípio da dignidade da pessoa humana". Buscam, todos, o atributo exclusivo do ser humano, de todo ser humano, que o torne especial perante os demais seres, e que seja capaz de fortalecer a argumentação jurídica nesse sentido. Em tal percurso, apegaram-se demasiadamente à ética kantiana, sistema que, segundo o autor, "quando coerentemente interpretado, revela-se incompatível com a concepção de direito proposta pelo projeto pós-positivista, caracterizada não apenas pelo resgate da razão prática mas também pela reabilitação das técnicas de ponderação e de retórica". O exercício proposto pelo autor para "testar" a compatibilidade da ética kantiana aos fins buscados pelos doutrinadores nacionais parte da ideia de enxergar o Direito como uma rede de decisões encimadas e orientadas pelas normas constitucionais, dentre as quais se encontra a dignidade da pessoa humana. O que se percebe nos escritos doutrinários, aponta o autor, é o uso da norma da dignidade da pessoa humana como premissa maior nas decisões tomadas pelos intérpretes do Direito, principalmente o julgador. Ocorre que ponderar, em suas bem escolhidas palavras, ganha o contorno de "dar atenção à realidade tanto quanto à norma", atividade para a qual a mera repetição do imperativo kantiano mostra-se insuficiente, pois o racionalismo do filósofo de Könisgberg não ofereceria possibilidades de leitura de fatos e de argumentos. Na ótima tradução do autor, o sistema ético kantiano não aceita o conhecimento do mundo advindo das sensações, pois entende que "aquilo que os sentidos apreendem não conduz a quaisquer proposições universais e necessárias, somente a generalizações imprecisas"; não permitindo, portanto, um conhecimento racional. Em outra síntese elogiável, para o autor a moralidade kantiana compõe-se apenas de regras formais. Nessa senda, e em linguagem clara, mas nem por isso pobre, o autor confronta as éticas de Kant e Aristóteles para concluir que a ética das virtudes fornece "o único substrato filosófico possível para o direito", à medida que ao comparar a trajetória humana a uma peça teatral improvisada, o filósofo grego "toma como principal exigência metodológica o dever de abertura à realidade". Não é necessário, é claro, comungar de seus pontos de vista, tampouco de suas conclusões. Acompanhá-lo em suas considerações basta para aprimorar o olhar para o "kantismo heterodoxo", simplificado da doutrina brasileira, ampliando as possibilidades de fundamentação jurídica da dignidade da pessoa humana. Lê-lo significa, enfim, melhorar a aplicação do Direito. Sobre o autor : Guilherme Moreira Loures da Costa é bacharel em Direito pela PUC/RJ; especialista em Direito Administrativo pela Escola da Magistratura do RJ. Durante a graduação, participou do programa de intercâmbio acadêmico na Universidade Georgetown, em Washington D. C., ocasião em que passou a aprofundar-se no estudo da Filosofia Clássica, especialmente à obra de Aristóteles. Atualmente ocupa o cargo de especialista em Regulação no âmbito da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis - ANP. __________ Ganhadores : Carlos Schubert, de Juiz de Fora/MGEllen Ersching, advogada em Jaraguá do Sul/SC.
sexta-feira, 27 de novembro de 2015

O Futuro do Estado

Editora: Saraiva Autor: Dalmo de Abreu DallariPáginas: 198 É da natureza humana buscar prever o futuro, tentar preparar-se para o que vai chegar. Sob esse prisma, o tema proposto pela obra encaixa-se no gênero. Mas não se trata, é claro, de adivinhação, futurologia imaginativa. Trabalhando "com objetividade científica", partindo do que já se conhece sobre a experiência histórica humana, e considerando as principais teorias formuladas sobre o futuro político, o conceituado jurista, professor e teórico do Estado, lança-se à formulação de futuros possíveis para os contornos do Estado. A tarefa inicia-se pela conceituação jurídica e política de Estado, passa pela sua origem e justificação no tempo e chega à sua interferência na vida social, tópico em que o autor sustenta haver em nosso tempo verdadeira onipresença do Estado, "pois existe a consciência de que nada interessa exclusivamente ao indivíduo (...), sempre se pensa nas suas repercussões sociais (...)". Dessa onipresença resulta uma interpenetração das atividades públicas e privadas, com o Estado utilizando frequentemente técnicas jurídicas antes exclusivas do direito privado, e vice-versa, em nítida superação da dicotomia direito público/direito privado. Em verdade, explana o autor, critérios tradicionais que isolavam o Estado em uma ordem política hoje não servem mais: a própria noção de político tornou-se imprecisa, podendo ser considerado como tal um ato de natureza aparentemente jurídica ou econômica, como o estabelecimento de relações comerciais entre dois Estados. Sim, conclui o autor: a indefinição dos contornos do Estado pode ser apontada como uma das características da realidade contemporânea. Ao examinar as principais teorias sobre o futuro do Estado, o autor busca destrinçar, entre seus elementos, o que é permanente, o que é momentâneo. Para tanto, utiliza-se de alguns referenciais teóricos, dentre os quais, a noção de "sistema político" de David Easton, que elege como essencial nos diferentes modelos de Estado os seus "mecanismos institucionais". De posse de algumas classificações, aponta algumas tendências, dentre as quais uma maior integração entre o político e o social; um crescimento da demanda de participação nos "produtos sociais", isto é, uma demanda por inclusão, que por sua vez exige maior racionalização e organização, "implicando formas autoritárias de governo"; e por fim, uma volta do nacionalismo operando como símbolo emocional. Antes de ler as predições, vale ter em mente a admoestação do autor: por não se tratar de propostas, e sim de mapeamento de possibilidades, a obra pode ser lida como estímulo ou advertência, "provocando reflexões ou inspirando conclusões". E arremata: "Em qualquer dessas hipóteses ela será útil para os que se dispõem a trabalhar pela consecução de uma ordem política e social justa, condição indispensável para que a humanidade possa viver em paz". Sobre o autor : Dalmo de Abreu Dallari graduou-se em Direito pela USP em 1957. Foi professor titular de Teoria do Estado da Faculdade de Direito da USP de 1964 a 2001, ano de sua aposentadoria. Foi diretor da mesma Faculdade entre 1986 e 1990. Foi professor e orientador dos cursos de pós-graduação da mesma Faculdade. Desde 2007, é professor emérito da Faculdade de Direito da USP. __________Ganhador : Aislan Rolim Gomes, de Jaboatão dos Guararapes/PE
quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Novo Perfil da Regulação Estatal

Editora: ForenseAutor: Rafael Carvalho Rezende OliveiraPáginas: 333 Se a consolidação do Direito Administrativo deu-se sob a égide dos ideais liberais da Revolução Francesa, estruturando-se sobre a nítida separação entre Estado e sociedade civil, e sobre a supervalorização da lei, hoje o cenário da disciplina é outro. Na tentativa de atender aos múltiplos interesses de uma comunidade complexa, plural, heterogênea, que não se sente mais representada pelo Parlamento e por vezes tampouco pela lei, sociedade civil e Administração compartilham e acumulam funções, conferindo ao Estado novas feições. Nas lições do autor, neoconstitucionalismo e pós-positivismo surgidos após a Segunda Guerra Mundial provocaram verdadeira relativização da vertente liberal do princípio da legalidade, segundo a qual "a atuação do agente público depende da habilitação prévia do legislador", delegando aos princípios jurídicos o controle da juridicidade dos atos administrativos. Nessa vertente, o autor anota que até mesmo o princípio da supremacia abstrata do interesse público sobre o interesse privado sofre críticas na atualidade, "notadamente em razão da centralidade dos direitos fundamentais e da estreita relação entre os direitos individuais e as finalidades públicas do Estado". Nesse movimento, e inspirada pelo direito norte-americano, a Administração Pública brasileira buscou, a partir da década de 1990, obter legitimidade e eficiência a partir da atuação regulatória, modelo capaz de conciliar o pragmatismo e o diálogo com a sociedade. Nesse contexto, interessa à obra, pois, examinar as possíveis vantagens da AIR - Análise de Impacto Regulatório -, instrumento utilizado com relativo sucesso no direito comparado, como mecanismo de formulação e avaliação de políticas regulatórias, a fim de aperfeiçoá-las. Embora ainda pouco usado no Brasil, algumas experiências pontuais mostram, segundo o autor, boas potencialidades do instrumento, "especialmente para efetivação das exigências de eficiência e legitimidade da regulação estatal". Sim, pois na esteira das preocupações tratadas, é necessário evitar a paralisia ou asfixia regulatórias advindas da regulação excessiva, inviabilizadora da atividade econômica, mas também a ausência de regulação, comprometedora da higidez do mercado. Em um texto denso, capaz de condensar de maneira hábil fatos históricos, tendências ideológicas e consequências práticas captadas pelo ordenamento jurídico, o autor não só mapeia o Direito Administrativo atual como sinaliza para o futuro, indicando caminhos a serem trilhados. Sobre o autor : Rafael Carvalho Rezende Oliveira é doutor em Direito pela UVA/RJ; mestre em Teoria do Estado e em Direito Constitucional pela PUC/RJ; especialista em Direito do Estado pela UERJ. Professor de Direito Administrativo do IBMEC, da EMERJ e do Curso Fórum. Professor dos cursos de pós-graduação da FGV e da Universidade Cândido Mendes. Procurador do município do Rio de Janeiro. Ex-defensor público da União. Advogado e consultor jurídico. __________ Ganhadora : Ursula Morena Chaves, advogada no RJ
segunda-feira, 23 de novembro de 2015

A Humanização do Direito Internacional

Editora: Del ReyAutor: Antônio Augusto Cançado TrindadePáginas: 790 Embora reconheça a persistência de "um panorama marcado, por um lado, pela generalização da violência, em meio a novos e sucessivos conflitos e crises humanitárias em distintos continentes", afirmação que ganha eco diante da brutalidade ocorrida em Paris, na semana passada, o autor destaca, por outro lado, "que vem sendo construída, de modo alentador, a jurisprudência dos tribunais internacionais contemporâneos", que a seu ver vêm contribuindo "de modo marcante" à realização da justiça e à responsabilização de Estados e indivíduos por violações dos direitos humanos e do Direito Internacional Humanitário. Na verdade, na opinião do autor a barbárie tem estado presente em toda a história da humanidade, como a outra face da moeda da civilização. O papel dos tribunais internacionais, do Direito Internacional Humanitário, portanto, seria trabalhar incessantemente para que nessa equação a civilização restasse privilegiada, de maneira substancial e progressiva. E assim acredita que tem sido, em um cenário em que indivíduos e organizações não governamentais assumem um papel cada vez mais relevante na formação da opinio juris internacional. Nessa seara, ao comentar outro fato marcante dos dias atuais, as grandes ondas migratórias forçadas, o autor destaca a formação de verdadeira consciência jurídica universal, desencadeando reações positivas "à secular violência vitimando milhões de seres humanos em distintos continentes, deslocando-os forçadamente de um lugar a outro e destruindo seus lares", e sustenta seu argumento com a detalhada exposição de numerosas Consultas do ACNUR - Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados - e suas respostas práticas, dentre as quais a mobilidade laboral, os vistos humanitários, o reconhecimento da condição de refugiado ou asilado político/religioso. Os 37 ensaios que compõem a obra estão organizados sob sete rubricas, partindo da formação da consciência jurídica humana como fonte primeira do Direito Internacional Público; pelos sujeitos do Direito Internacional Humanitário em sua concepção contemporânea - "os seres humanos, os povos e a humanidade" -; para enfim chegar a detalhada análise das vertentes atuais de proteção internacional dos direitos da pessoa humana, seara em que o autor é renomado especialista, e a uma avaliação geral do processo histórico de humanização do Direito Internacional, um "novo jus gentium em que a centralidade é da pessoa humana, e não dos Estados". Importa ainda dizer que os ensaios vêm escritos no idioma original em que foram redigidos: alguns em francês, outros em inglês, muitos em espanhol, alguns em português. Espelhando o renomado autor, a coletânea é obra para cidadãos do mundo. Sobre o autor : Antônio Augusto Cançado Trindade é Ph.D. em Direito Internacional. Professor titular da UnB e do Instituto Rio Branco. Professor visitante em algumas das principais universidades do mundo. Consultor de distintos organismos internacionais, dentre os quais a ONU, o Conselho da Europa, a OEA, e o Comitê Internacional da Cruz Vermelha. Tem atuado como consultor jurídico na solução de importantes controvérsias internacionais. Foi presidente (1999-2004) e juiz (1995-2008) da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Em novembro de 2008 foi eleito pela ONU juiz da Corte Internacional de Justiça de Haia. __________ Ganhador : Wallas Almeida da Silva, de BH
Editora: AlmedinaAutor: Eduardo Lasmar Prado LopesPáginas: 185 Em diferentes incisos do mesmo artigo 5° da CF estão a proteção à livre manifestação do pensamento (incisos IV e IX), e a vedação à utilização indevida dos direitos da personalidade, notadamente a vida privada, a imagem e a intimidade (inciso X). Como conciliá-los? Antes do julgamento da ADIn 4815 pelo STF, a tendência jurisprudencial brasileira era "atribuir prevalência desproporcional aos direitos da personalidade", em hermenêutica pouco constitucional, centrada sobretudo na letra dos arts. 20 e 21 do CC. Hoje, embora demarcado pela Corte que a proibição a priori significa censura, algo conflitante com a democracia, com a evolução da sociedade e com o Estado de Direito, ainda são reconhecidas dificuldades no delineamento das responsabilizações a posteriori, em caso de abuso (quer envolvam aspectos civis ou penais), e até mesmo pouca nitidez na dimensão alcançada, na vida do indivíduo, pelo entrelaçamento das três liberdades agrupadas sob o nome de livre manifestação do pensamento: de expressão, de informação e de imprensa. Nesse contexto, a partir da análise do direito comparado, do ordenamento jurídico brasileiro, da jurisprudência dos tribunais de diferentes estados da Federação e sobretudo de aspectos teóricos dos direitos tutelados, a ideia central da obra é demarcar standards decisórios que permitam aos tribunais lidar melhor com o conflito liberdade de expressão x direitos da personalidade. Nos EUA, "um dos países que mais protege a liberdade de expressão no mundo", o autor marca que um dos parâmetros sensíveis é a doutrina do fair use, segundo a qual o intérprete deve perquirir se o uso feito da informação era de fato pertinente e necessário para a narrativa daquela história. Parece de extremo relevo destacar o fundamento de um dos casos paradigmáticos comentados na obra, no qual a Suprema Corte norte-americana frisou que "as biografias são fundamentalmente histórias pessoais", ressaltando assim não só a existência de muitos ângulos para se mirar a complexa e intrincada rede de acontecimentos que compõem a História mas sobretudo a legitimidade conferida ao cidadão para fazê-lo. Na Alemanha, cuja hermenêutica constitucional é fortemente marcada pela teoria da ponderação - influência fortemente recebida pelo direito brasileiro -, a jurisprudência recente também tem trabalhado com essa dicotomia entre fatos e opinião como um dos standards mais notáveis. Se os fatos veiculados na obra são falsos, dão margem ao direito de resposta; somente se causadores de um "dano sério e grave" à personalidade ensejam reparação pecuniária. Se, no entanto, os fundamentos da queixa do ofendido são apenas opiniões expressadas na obra, será muito difícil obter direito a qualquer uma das hipóteses de tutela. Da recente experiência brasileira - o autor examina cuidadosamente cada um dos casos notórios -, é fácil concluir com o autor que a necessidade de autorização inibia o desenvolvimento de área literária e artística importante para a formação da identidade cultural do país, e até mesmo para o enriquecimento do debate público. E mais: que a tendência restritiva recém-afastada pela decisão do STF era herança de um passado autoritário. Em texto detalhado, rigoroso, em que percorre ainda as tutelas inibitórias do abuso existentes no direito brasileiro, o autor reafirma a necessidade, para toda a sociedade, da prevalência prima facie, da liberdade de expressão sobre os demais direitos da personalidade. Sobre o autor : Eduardo Lasmar Prado Lopes é graduado em Direito pela UERJ. Advogado da clínica de Direitos Fundamentais da mesma universidade e do escritório Pinheiro Neto Advogados. __________ Ganhador : Leonardo Graffunder de Oliveira, de Jaraguá do Sul/SC
Editora: SaraivaAutor: Daniel Silva PassosPáginas: 159 Diante dos horrores do nazismo, a tendência observada nos países ocidentais no período pós-Segunda Guerra foi aproximar mais uma vez o Direito à moral, transformando suas Constituições em verdadeiras cartas de direitos, extensas declarações de todo o conteúdo de que o Direito deveria estar revestido. Ao aumentar a carga axiológica da norma, contudo, ampliou-se o papel do intérprete, fazendo surgir, nas palavras do autor, "a preocupação com os limites impostos à jurisdição constitucional". O caso torna-se ainda mais grave no Brasil, adverte, país marcado por fortíssima desigualdade social, em que o poder público descumpre reiteradamente "as promessas emancipatórias" da CF materializadas sob a forma de extenso rol de direitos sociais. Começam a surgir, então, decisões judiciais condenando o poder público a realizar determinadas políticas públicas, a agir desta ou daquela forma; decisões que conforme destacado pelo autor, vão "além dos limites semânticos impostos pelos enunciados linguísticos veiculados em lei", isto é, ultrapassam o modelo tradicional de decisão judicial para assemelhar-se à lei - um dos casos lembrados na obra é o julgado que determinou a demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol, em que o STF criou condições para tal demarcação. Muitos trabalhos foram publicados problematizando essa questão, reconhece o autor, mas os argumentos contrários restringem-se à violação da separação dos poderes e ao potencial de desorganização das políticas públicas previamente idealizadas. Assim, esta obra elegeu perquirir a legitimidade (base legal e moral) da participação judicial nesse processo de escolha de políticas públicas, "avaliando a compatibilidade dessa postura com outros princípios sistêmicos, também previstos constitucionalmente". A resposta às indagações da obra parece estar na forma como ocorre a interpretação jurídica nos dias que correm, no modo como se deve operar a racionalidade judicial diante das características da Constituição de 1988 e de uma "leitura ética" do Direito, imposta pelos direitos fundamentais. Direitos fundamentais esses que, segundo anotado pelo autor, forte na melhor doutrina, são responsáveis por criar "um vínculo insolúvel entre Estado e dignidade da pessoa humana, transformando uma democracia apenas formal em um regime substancialmente democrático", além de contribuir para a paz no âmbito interno do país. Nessa linha, o Judiciário não estaria avançando o campo da política partidária ao ver-se obrigado a tomar decisões direcionadoras de políticas públicas. E tampouco estaria a sociedade e a democracia ameaçadas, em que pese à diferença entre o modelo atual e o juiz "boca da lei", idealizado por Montesquieu no pós-absolutismo. Para preservar o equilíbrio e salvaguardar o jurisdicionado de eventuais abusos há a teoria dos princípios; pela argumentação racional, a fundamentação adequada, dar-se-á a contenção da discricionariedade. A cada decisão deverá o julgador "laborar pelo convencimento da sociedade". Sobre o autor : Daniel Silva Passos é professor do Centro Universitário de Brasília - UniCEUB. Mestre em Direito e Políticas Públicas pelo Centro Universitário de Brasília - UniCEUB (CAPES 5). Especialista em Direito Tributário pela UFBA. Advogado da União. __________ Ganhadora: Natália Regiane Alaniz Doná, de Birigui/SP
Editora: MétodoAutores: Luiz Flávio Gomes e Silvio MacielPáginas: 352 Ao recolher na melhor doutrina a consideração de que o tratamento conferido pela Constituição Federal de 1988 ao meio ambiente é notável e avançado, não só em comparação com as constituições brasileiras anteriores - que sequer falavam em meio ambiente -, mas também em relação a outros países, os autores abrem a obra com a chave para a interpretação da matéria, o ângulo de onde deve ser mirada. E dentro dos mandamentos constitucionais para a tutela do meio ambiente, destacam a proteção penal, seara em que são especialistas, destacando tratar-se de orientação internacional nascida no âmbito do Congresso Internacional de Direito Penal realizado em Varsóvia, no ano de 1975. Mas se por um lado é inegável que o meio ambiente é um bem jurídico passível de proteção penal, também o é o fato de que tal proteção deve ser adequada e necessária, o que conflita com a "quantidade exorbitante de tipos penais" existentes para tanto no ordenamento brasileiro, assim como com a falta de proporcionalidade percebida entre algumas cominações, caso dos crimes de destruição de floresta e de transporte de balões, por exemplo, condutas de gravidade díspares, mas de penas idênticas. Um penalista consagrado, outro professor especialista em Direito Penal, aos autores não agradam algumas das marcas recentes do direito penal brasileiro: julgam errônea a inflação da legislação penal brasileira dos últimos anos, que "sob o impulso do populismo penal, confundiu o direito administrativo com o direito penal"; tampouco reconhecem como adequada a simples menção, pela lei, de que a pessoa jurídica pode ser responsabilizada criminalmente (art. 3° da lei). Sustentam que por romper com forte tradição do direito romano, segundo a qual a pessoa jurídica, ente fictício, não poderia delinquir, o tema mereceria tratamento mais cuidadoso e aprofundado por parte do legislador, que deveria ter-se ocupado, antes de mais nada, com uma teoria do delito para a pessoa jurídica. Tal como está, argumentam, não se trata de sanção penal, propriamente dita, pois impossível falar em "privação de liberdade" para a pessoa jurídica; tampouco de direito administrativo, pois não é a autoridade administrativa a competente para impor a sanção; terminam por imaginar um tertium genus a que, por falta de melhor nome, optam por chamar de "direito judicial sancionador". Nas críticas acima é possível reconhecer o tom em que as lições são ministradas - embora o texto seja construído lançando mão da contribuição de diversos doutrinadores, a linha mestra é autoral e confere substância à obra. Sobre os autores : Luiz Flávio Gomes é doutor em Direito Penal pela Universidade Complutense de Madri-UCM e mestre em Direito Penal pela USP. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Jurista e professor de Direito Penal em vários cursos de pós-graduação no Brasil e no Exterior. Foi promotor de Justiça (1980-1983); juiz de Direito (1983-1998) e advogado (1999-2001). Silvio Maciel é mestre em Direito Penal pela PUC/SP. Professor de Direito Penal, Direito Processual Penal e Legislação Penal Especial da rede LFG desde 2005. Professor de pós-graduação e de cursos de extensão em diversas instituições nacionais. Palestrante. Ex-delegado de polícia do Estado de São Paulo. __________ Ganhadora : Cristiane de Oliveira R. Pereira, de Araguari/MG
sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Curso Básico de Direito Arbitral

Editora: JuruáAutor: Joaquim de Paiva MunizPáginas: 343 O próprio autor apresenta a obra como "um manual prático, usando terminologia simples, que possa ser utilizado facilmente por aqueles que ainda estão se acostumando ao mundo arbitral, mas que contenha o resultado de grande parte das pesquisas necessárias para a advocacia na área". Sim, de fato, o texto descomplicado é uma das boas notas da obra, aberta com a lição de que não existe um conceito legal para arbitragem, que no entanto poderia ser facilmente definida pelas palavras do professor de Direito Processual Civil da USP Carlos Alberto Carmona, para quem trata-se de "mecanismo privado de solução de litígios, através do qual um terceiro, escolhido pelos litigantes, impõe sua decisão, que deverá ser cumprida pelas partes". E para reforçar a lição, o autor destaca os três componentes presentes e marcantes na definição: a natureza heterocompositiva do método (um terceiro impõe a decisão às partes); a ausência de intervenção de órgãos estatais; e a força vinculante das decisões, equiparadas legalmente àquelas proferidas pelo Poder Judiciário. Em outro momento, resume em uma única página os pontos tratados pela recente reforma da Lei de Arbitragem - arbitragem e administração pública; arbitragem em direito societário; nomeação de árbitros; prescrição; sentença parcial; pedido de nulidade na impugnação; medidas cautelares; carta arbitral -, situando o estudante e o profissional, e revelando, mais uma vez, que a singeleza e o didatismo podem-se tornar acuidade. (É claro que em outros pontos do texto tais temas são desenvolvidos, mas o quadro geral já está fixado, facilitando em muito a compreensão da matéria). Outro capítulo que merece destaque é o destinado à lei aplicável à arbitragem, em que partindo do art. 2° da lei 9.307/1996 o autor traça roteiro seguro, contornando o art. 17 da LINDB e demarcando os limites da autonomia da vontade no direito brasileiro. E por falar em limites, vale comentar o posicionamento do autor no capítulo referente ao procedimento arbitral. Após explicar que as partes têm total liberdade para fixar na convenção de arbitragem o procedimento a ser seguido, "desde que respeitados os princípios do contraditório, da igualdade das partes, da imparcialidade do árbitro e de seu livre convencimento", o autor apregoa a necessidade de os operadores do Direito, no Brasil, "desapegarem-se" das normas procedimentais estatais, tachando de equivocada "a postura de se invocar frequentemente o Código de Processo Civil em arbitragens". Com o mesmo tom preciso a obra trata ainda da sentença arbitral e da homologação de sentença estrangeira. Em volume breve, todas as lições necessárias. Sobre o autor : Joaquim de Paiva Muniz é mestre em Direito pela Universidade de Chicago; membro, presidente da Comissão de Arbitragem da OAB/RJ; diretor do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem; membro da lista de árbitros da FIESP, CBMA, CAMARB e CAMFIEP; membro do Chartered Institute of Arbitrators. Advogado do escritório Trench, Rossi e Watanabe Advogados. __________ Ganhador : Tito Trolese de Alcantara, de Itapecerica da Serra/SP  
quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Dano Ambiental - Uma abordagem conceitual

Editora: AtlasAutor: Paulo de Bessa AntunesPáginas: 224 A preocupação com a proteção ao meio ambiente ganhou prestígio na segunda metade do século XX, "sobretudo nos países com elevado grau de desenvolvimento econômico e social". A grande virada proposta pela obra é a perspectiva de onde mira tal proteção. Para o autor, a Natureza é um conceito filosófico, cultural, isso é, criado pelos homens como parte da estratégia para "entender o seu meio e resolver questões que o angustiam". Assim o seria desde os gregos, para quem a natureza se revestiria de contornos filosóficos capazes de oferecer ao homem a harmonia necessária à vida equilibrada. Passando pela Renascença, por Rousseau, Thoreau, e chegando aos atuais adeptos do direito natural, o autor desvela, com muita habilidade expositiva e linguística, que "As relações intermediadas pelo direito e que se estabelecem entre os homens e a forma de apropriação dos recursos naturais são de caráter cultural". Mas o contexto hoje está mudando: de paradigma, o mundo natural vem ganhando espaço no mundo jurídico como sujeito de direito, e um dos sinais dessa mudança é o novo enfoque que tem sido dado à natureza na disciplina da responsabilidade civil. Para o autor, é aqui que se deve acender o alerta. Retomando os pilares do direito ocidental contemporâneo - direito romano e direito canônico -, reconstrói o caminho percorrido pela ideia de equivalente jurídico, essência da responsabilidade, desdobrando-o em dois elementos, a avaliação do agravo sofrido e a reparação a posteriori. A intenção aqui é mostrar que embora nascida dessa mesma fonte, é imperioso à reparação ambiental adotar desenvolvimento diverso, pois se trata, em grande parte das vezes, de recuperação de bens "irrecuperáveis", para os quais resolver a questão em termos pecuniários, nos moldes do art. 952 do CC, nada adiantaria. Outra perspectiva. Mais do que se deixar impactar por exageros e modismos - sim, há pontos questionáveis e raízes poucos profundas até mesmo em movimentos críticos como os que questionam o antropocentrismo -, à obra importa a seguinte inquirição: "O que a sociedade pretende ao tutelar o ambiente?" De acordo com a tese esposada, proteger a natureza só faz sentido "desde um ponto de vista humano, com finalidades de atendimento às necessidades humanas, em última instância". O texto é belo em todos os seus aspectos - filosoficamente, pois descortina novidades, recolocando o homem no lugar de ser capaz de descobertas; e como tessitura fina, elaborada, pois suas palavras registram não só a erudição, mas também a genuína emoção diante do conhecimento. Sobre o autor : Paulo de Bessa Antunes é mestre e doutor em Direito. Professor adjunto de Direito Ambiental da UNIRIO, líder de pesquisa acadêmica cadastrada no CNPq. Procurador regional da República aposentado. Advogado. __________ Ganhadora : Thais dos Santos Monteiro, da banca Bichara Advogados, do RJ
Editora: SingularAutor: Antonio Sergio Altieri de Moraes PitomboPáginas: 189 Nas palavras do autor, "(...) estes escritos - aqui coletados do presente para o passado, do mais recente ao mais antigo - expressam, cada um e o conjunto, a postura de responder a diferentes situações em que os direitos individuais encontravam-se em risco". Ainda segundo o próprio julgamento, são textos simples, se comparados a trabalhos acadêmicos, e muitos já foram publicados em sítios na internet, a fim de suscitar o debate. A intenção, ao reuni-los e enfeixá-los em um só volume, é de oferecê-los ainda uma vez ao público, de "convidar muitos a repensarem, com vagar, sobre certos problemas e sobre a importância dos direitos humanos no processo penal". Assim, em verdadeiro tom de bate-papo, o autor abre o livro com breve consideração acerca dos equívocos que entende ainda persistirem nas grades curriculares dos cursos jurídicos de graduação - de acordo com o seu ponto de vista, compêndios de Tratados Internacionais de Direitos Humanos deveriam funcionar como "bíblias entregues a seminaristas", permitindo ao novel estudante "engatinhar pelo Direito Constitucional", e ao mesmo tempo reconhecer e aprender a lidar com a sobreposição de princípios, tema caro à contemporaneidade. Em sua opinião, "muitas bobagens ditas em matéria processual" devem-se à "má formação em direito constitucional e ao desconhecimento quanto a direitos humanos". Na mesma senda, segue conversando com o leitor sobre os mestres que o inspiraram, desde os bancos da faculdade, mas também sobre aqueles profissionais que seguem iluminando seu caminho, revelando, por debaixo das palavras, o quanto o exercício da advocacia tem de fervor, de atividade vocacionada. Em momentos mais específicos sobre o ofício do defensor criminal, especialmente em segundo grau de jurisdição, observa, dentre outras, a importância do conhecimento das decisões da Câmara e da turma, apontando a leitura de votos vencidos como importante sede de conhecimento sobre os fundamentos dos debates e divergências. Mas o ponto alto da obra é, sem dúvida, a preocupação com o ser humano, destinatário do Direito Penal, fim último de qualquer Direito. Nesse sentido, é louvável reconhecer em sua queixa certa intransigência: estuda-se demais tipicidade, ilicitude e culpabilidade, em lugar de cuidar-se da pena e de seu cumprimento. No mesmo tom, atribui a qualidade de "devaneio" ao seu desejo de desaparecimento das penas privativas de liberdade, desejo que não impõe a todos. Exige, isso sim, dos demais profissionais do Direito Penal, que exibam indignação em face do que acontece no sistema prisional brasileiro, sede de "jaulas obscenas" nomeadas pelo velho mestre Manoel Pedro Pimentel nos idos da reforma de 1984. Com o mesmo vigor discorre sobre a função do habeas corpus, sobre a desnaturação da prisão cautelar, sobre o perigo da negligência de fatos em nome de teses jurídicas, sobre as imprecisões técnico-legislativas nascidas do atendimento ao clamor popular, tantos outros temas candentes em nossos dias. Para profissionais e estudantes igualmente apaixonados, a leitura será só começo de conversa. Sobre o autor : Antonio Sergio Altieri de Moraes Pitombo é sócio do escritório Moraes Pitombo Advogados. Graduado em Direito pela USP; mestre e doutor em Direito Penal pela mesma universidade. Pós-doutor pela Universidade de Coimbra. Advogado. __________ Ganhadora : Raquel dos Santos Monteiro, de São Luiz Gonzaga/RS
quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Empresas Sociais: Uma Abordagem Societária

Editora: AlmedinaAutora: Aline Gonçalves de SouzaPáginas: 113 Se um exemplo poupa muitas palavras, podemos recorrer ao mais conhecido caso de empresa social do momento, o Banco de microcrédito criado pelo hoje Nobel da Paz Muhammad Yunus, o economista indiano que percebeu que bastavam alguns poucos dólares para muitos pequenos empreendedores conseguirem sustentabilidade. Partindo daí tem-se, pois, que a empresa social organiza-se sob os moldes de qualquer outra empresa privada (segundo setor), mas tem um objeto social voltado ao atendimento de interesses comunitários, e não à distribuição de lucro aos sócios, o que a aproxima também das organizações da sociedade civil sem fins lucrativos (terceiro setor). Ao redor do mundo, muitos ordenamentos jurídicos entenderam que não estavam prontos para essa figura híbrida, grande revolução da contemporaneidade, e criaram tipos societários específicos para acolhê-la. No Brasil, onde não há ainda a previsão de um tipo jurídico específico para as empresas sociais, a formalização desses empreendimentos dá-se ora por meio da adoção de tipos societários próprios do segundo setor, normalmente sociedade com responsabilidade limitada ou anônima; ora por tipos próprios do terceiro setor, geralmente associações ou fundações. Mas por que não abrigá-las simplesmente sob o guarda-chuva das ONGs? Bem, em primeiro lugar, explica a autora, somente aquelas com status de OSCIP poderiam remunerar seus diretores, o que já configuraria um entrave jurídico considerável à profissionalização das empresas sociais - é recorrente a menção à capacidade de gestão como a grande diferença entre os setores com e sem fins lucrativos, mostrando, sob seu ponto de vista, a "influência negativa que determinadas normas brasileiras tiveram com relação ao desenvolvimento econômico das organizações da sociedade civil" ao marcá-las com o viés meramente assistencialista e de trabalho voluntário. Em busca de um estatuto jurídico que permita eficiência e profissionalização foi instalado um grupo de trabalho misto, composto por setores governamentais e por entidades da sociedade civil, coordenado pela Secretaria Geral da Presidência da República, do qual a autora fez parte entre 2012 e 2014. Desse grupo de trabalho já nasceram as primeiras alterações legislativas - dentre outros, o decreto 7.568/2011, alterando os requisitos para o convênio com o poder público, e a lei 13.019/2014, que instituiu normas gerais para as parcerias voluntárias, dentre as quais, o "chamamento público obrigatório" -, e na mesma senda seguem os estudos para desenho do tipo societário mais apto às empresas sociais. É nesse contexto que se encaixa a obra: valendo-se do estudo de dois casos que se formalizaram por meio de tipos societários distintos - sociedade empresarial e associação sem fins lucrativos - a autora aponta os obstáculos existentes no ordenamento jurídico à excelência da gestão das empresas sociais, bem como cada uma das alterações pontuais necessárias à caracterização de um novo tipo societário. A autora reconhece que o tema ainda não está pronto na sociedade: são comuns as referências à "pilantropia", às fraudes envolvendo ONGs que no ano de 2011 ganharam as manchetes, enfim, a desconfiança brasileira nas instituições alcança também as iniciativas sociais. Para combatê-la, contudo, nada melhor que a informação - entre 2008 e 2012, volta a informar a autora, somente 1% das ONGs atuantes em âmbito federal firmaram convênio com a administração. Todas as demais desenvolveram suas atividades sem dinheiro público. Na outra ponta da argumentação, por reunirem profissionais especializados e debruçarem-se sobre recortes específicos, vêm das ONGs muitos saberes que proporcionaram valor a toda a sociedade. Dentre eles, a autora cita dois, o emblemático tratamento para o HIV/AIDS desenvolvido no Brasil, reconhecido internacionalmente, e a criação de tecnologia para construção de cisternas no semiárido nordestino. Resta assinalar, ainda, outra percepção da autora, nascida da experiência em diferentes grupos de trabalho desde a época de estagiária: iniciativas da sociedade civil como as empresas sociais são importantíssimas para a democracia, melhorando desmedidamente a noção de cidadania, a qualidade do vínculo do cidadão com a comunidade. Sobre a autora : Aline Gonçalves de Souza é bacharel em Direito pela PUC/SP e especialista LL.M em Direito Societário pelo Insper. Coordenadora e pesquisadora do programa Estado e Sociedade Civil no Centro de Pesquisa Jurídica Aplicada da FGVLaw/SP. Advogada. __________ Ganhador : Felipe Bragantini, de Campinas/SP
Editora: Del ReyAutor: Leonardo de Faria BeraldoPáginas: 451 No dia 18 de março de 2016 entrará em vigor o novo Código de Processo Civil, lei 13.105/2015, com alterações que nas admoestações do autor, "modificam, profundamente, o âmago do nosso sistema processual". Preocupado com a preparação dos estudantes e profissionais jurídicos para trabalharem com a nova lei, a proposta é "mostrar ao leitor, num texto corrido, com linguagem simples, clara e objetiva, sem citações doutrinárias/jurisprudenciais e sem notas de rodapé", todas as inovações do novo CPC. Ater-se às modificações significa não retomar conceitos pré-existentes, tampouco "regras que não foram alteradas pelo legislador". A fim de que o leitor possa experimentar o texto, comentam-se dois tópicos. Ao tratar dos honorários advocatícios, após indicar os artigos em que estão disciplinados, o autor informa que o novo CPC ratifica o disposto no art. 23 do Estatuto da Advocacia, estabelecendo que os honorários sucumbenciais pertencem ao advogado, bem como transforma em lei "o entendimento uníssono do STF e do STJ" sobre a natureza alimentar dos honorários advocatícios sucumbenciais. É interessante notar que a exposição não é indiferente à práxis: em vários momentos do texto, celebra o que entende como verdadeiras conquistas da advocacia, caso da vedação à compensação em caso de sucumbência recíproca, pondo fim ao "absurdo" comando que preconizava a compensação entre pessoas que não eram credoras e devedoras entre si; e da nova disposição que obrigou a observação de percentuais para a fixação dos honorários nas causas em que a Fazenda Pública for parte, acabando "com a grande injustiça" vigente de levar em consideração tão somente a equidade do juiz. Outro ponto de grande interesse para o profissional do Direito é o incidente de resolução de demandas repetitivas, que em nome da simplificação o autor opta por chamar de IRDR. Em primeiras palavras sobre a novidade, esclarece tratar-se de "procedimento no qual poderão ser ouvidas várias pessoas, com as mais diversas teses ligadas à matéria litigiosa", para que ao final o tribunal fixe a tese jurídica "que deverá, obrigatoriamente, ser aplicada a todas as ações individuais ou coletivas, já em andamento, bem como as que vierem a ser propostas". Frisa ainda que por meio dessa cognição "diferenciada e democrática", busca-se conferir maior previsibilidade aos julgamentos e maior celeridade ao trâmite processual, tudo em nome dos princípios constitucionais da igualdade, segurança jurídica e duração razoável do processo. Nesse mesmo tom descomplicado seguem as outras exposições, que versam temas relativos a todos os livros do Código, passando por cada uma das novidades. Sobre o autor : Leonardo de Faria Beraldo é especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Gama Filho; mestre em Direito Privado pela PUC/Minas. Professor convidado do Conselho da Justiça Federal, da Escola Judicial do TJ/MG, da Escola Judiciária Eleitoral do TER/MG e da Escola de Magistratura Federal da 1ª região. Árbitro, consultor, parecerista. Advogado. __________ Ganhadora : Carolina Regina de Gaspari, de São Caetano do Sul/SP
quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Lei Maria da Penha

Editora: Thomson Reuters, por meio de seu selo editorial Revista dos TribunaisAutora: Maria Berenice DiasPáginas: 315 Partindo de ditados populares que "absolvem e naturalizam" a violência doméstica sofrida pela mulher, a autora chama a atenção para o fundamento cultural que a mantém, mostrando como a sociedade brasileira ainda cultiva valores que incentivam a ideia de dominação, de "errônea consciência de poder" assegurada ao homem, permitindo que "fenômenos socialmente inaceitáveis" sejam "ocultados, negados e obscurecidos por meio de pactos sociais informalmente estabelecidos e sustentados". Em sequência, destaca as muitas razões do silêncio diante da agressão - em todas as modalidades, as denúncias nunca ultrapassam 1/3 dos casos! -, compondo assim, de maneira brilhante, o contexto em que a lei 11.340/2006 é cotidianamente aplicada. Tomando como base o art. 226 da CF, e especialmente seu § 8° ("O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações"), a autora mapeia os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil nessa seara, que vão além dos dois tratados citados na ementa da própria lei 11.340/2006, com especial destaque para a definição formal da violência contra a mulher como violação aos direitos humanos ocorrida na Conferência da ONU em Viena, no ano de 1993. Para a configuração de violência doméstica não é necessário que as partes sejam marido e mulher, nem que estejam ou tenham sido casados. Se parece lógico depreender que a união estável seja protegida pela lei, as lições da autora vão além, e mostram que outras situações em que o agressor se valha da posição de gênero e do ambiente familiar também recebem guarida. Assim, fundamentando-se na jurisprudência, sustenta que "a agressão do cunhado contra a cunhada, entre irmãs ou entre ascendentes e descendentes tem admitido a imposição de medidas protetivas", assim como dos patrões contra a empregada doméstica. Também acerca do sujeito passivo as considerações são esclarecedoras: embora a lei exija que a vítima da violência familiar seja mulher, em consonância com o ordenamento jurídico brasileiro toda pessoa que tiver "identidade social com o sexo feminino" (transmulheres, travestis e intersexuais) estará protegida. A obra segue pela exposição das diferentes formas de violência - física, psicológica, sexual, patrimonial, moral -; pelos delitos e penas trazidos pelo diploma e as alterações proporcionadas no CP; pelas características processuais das ações penais que a tenham por fundamento. O texto é descomplicado, e dialoga permanentemente com a interpretação dos tribunais e com a realidade social. Sobre a autora : Maria Berenice Dias foi a primeira desembargadora do Rio Grande do Sul. Trabalhou ao longo da carreira no atendimento jurídico e psicológico voluntário a vítimas de violência doméstica; foi uma das fundadoras do Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFam; participou dos debates que levaram à elaboração da Lei Maria da Penha. Mestre e especialista em Processo Civil pela PUC/RS, hoje aposentada, advoga nas áreas de Direito das Famílias, Sucessões e Direito Homoafetivo. __________ Ganhadora : Heloísa Peixoto, do RJ
quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Crime Organizado e Infiltração Policial

Editora: AtlasAutor: Marllon SousaPáginas: 153 Qual o limite da infiltração policial como método de investigação no combate às organizações criminosas no Brasil à luz de um processo penal pautado pelo respeito aos direitos fundamentais do cidadão? Prevista na lei 12.850/2013, cuja ementa diz tratar da definição de organização criminosa, e consistindo em "medida de caráter claramente mais invasiva que outros meios de obtenção de prova, previstos no CPP e em legislações esparsas", o autor começa por defender interpretação restritiva, "não podendo estendê-la a outros casos nos quais o crime organizado não esteja caracterizado". Sobre a definição de agente infiltrado, após exame detido de lições doutrinárias nacionais e estrangeiras, o autor afirma que a lei brasileira mostra-se lacunosa, "limitando-se a declinar que a infiltração policial em organizações criminosas ficará a cargo de agente da autoridade policial (...)", sendo prudente, para complementá-la, valer-se da CF e "regras gerais de Direito" previstas em tratados internacionais dos quais o Brasil seja signatário. Em que pese à vagueza da definição, é possível, ensina o autor, distingui-la de figuras limítrofes, caso do agente da Agência Brasileira de Inteligência - Abin; da participação velada de policiais em manifestações de rua para fins de identificação de autores de infrações penais; da atuação de policiais como "P2", isto é, policiais que veladamente mapeiam áreas de risco em planejamento a operações futuras; e por fim, da figura repudiada pelo Direito brasileiro do agente provocador. Aos doutrinadores que acusam a infiltração policial de afronta ao princípio da moralidade de que se devem revestir todos os atos do Estado, o autor responde que desde que respeitados as garantias processuais e os direitos individuais "não se enxerga qualquer mácula" em seu estabelecimento; antes, trabalharia, isso sim, "como parcela de otimização dos meios para a consecução dos fins de pacificação social (...)", "manifestação do legislador na busca de eficiência estatal na proteção da coletividade (...)". Para tanto, defende certa correção de rumos em algumas das disposições da lei 12.850/2013, sustentando que todos os atos da infiltração passem pelo Poder Judiciário, "com respeito à bilateralidade dos atos processuais e do direito à ampla defesa", a fim de que seja feita a valoração dos elementos de prova colhidos pelo agente infiltrado. Além de se debruçar sobre cada um dos dispositivos legais disciplinadores da infiltração a obra os compara ao modelo norte-americano, "cujos parâmetros de utilização mostram-se relativamente mais largos que os previstos na lei 12.850/2013". Sobre o autor : Marllon Souza é mestre em Direito Processual Penal pela UFMG, especialista em Direito Eleitoral e Processo Eleitoral pelo Centro Universitário Claretiano, bacharel em Direito pela Universidade Federal de Ouro Preto. Juiz do TRF da 1ª região. __________ Ganhador: Neyl Armstrong Pereira dos Santos, de Recife/PE