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Gramatigalhas

Esclarecendo dúvidas da Língua Portuguesa.

José Maria da Costa
quarta-feira, 13 de julho de 2005

Pronome átono e locuções verbais

1) As palavras, em português, têm uma de suas sílabas pronunciada com mais força (sílaba tônica) do que as outras, que são fracas (sílabas átonas). A exceção fica para alguns monossílabos e raros dissílabos, nos quais não há sílabas tônicas, mas apenas átonas. 2) Quanto aos vocábulos átonos, estes, na pronúncia, postam-se sempre na dependência sonora de uma sílaba tônica. Assim, quando se diz "Passe-me o pão, por favor", percebe-se com clareza tal fenômeno, a ponto de, na pronúncia, serem identificadas apenas três palavras, e não seis: "Pásseme opão, porfavor". 3) Quanto aos pronomes pessoais oblíquos átonos, exatamente por não terem autonomia sonora, dependem do verbo por eles acompanhado, cingindo-se a questão a verificar onde a sonoridade melhor aconselha seu posicionamento: a) em próclise (antes do verbo), como em "O juiz não se conteve"; b) em mesóclise (no meio do verbo), como em "Realizar-se-á o júri, como previsto"; c) em ênclise (depois do verbo), como em "Conteve-se o advogado..." 4) Estudar o melhor lugar para o pronome em relação ao verbo, em tais casos, é assunto para a topologia pronominal ou colocação dos pronomes. 5) De modo mais específico para o caso em estudo, é de se ver que, nas locuções verbais (dois ou mais verbos fazendo o papel de um só), três são as hipóteses, em tese, de colocação dos pronomes: a) em próclise ao verbo auxiliar, como em "Eu lhes estou mostrando meu trabalho"; b) em ênclise ao verbo auxiliar, como em "Eu estou-lhes mostrando meu trabalho"; c) em ênclise ao verbo principal, como em "Eu estou mostrando-lhes meu trabalho". 6) Não se olvide, ademais, que, em tais casos, o pronome não se refere ao verbo auxiliar ou verbo principal separadamente; ele completa a locução verbal como um todo. Exs.: a) "As situações estão-se desenvolvendo perpetuamente" (a locução é estão desenvolvendo); b) "Vou-lhe permitir sair mais cedo" (a locução é vou permitir); c) "Quer-me fazer o favor de sair?" (a locução é quer fazer). E se veja que tal caso é totalmente diferente da mera justaposição de dois verbos autônomos, que não compõem uma locução verbal, em que a colocação de pronomes deve estudar cada verbo com seu respectivo pronome. Ex.: "Saiu, fazendo-me ameaças" (saiu e fazendo são verbos autônomos e integram até mesmo orações distintas: saiu e fez-me ameaças). 7) À possibilidade de vir o pronome pessoal oblíquo átono a ocupar mais de uma posição na frase, sem prejuízo de sentido e sem transgressão da disciplina gramatical, Carlos Góis denomina "tipos sintáticos equivalentes de topologia pronominal". 8) Ressalva o mencionado autor, entretanto, que, se, com a alteração de posicionamento do pronome no período, "o sentido for diferente, não haverá tipo sintático equivalente", como é o caso dos seguintes exemplos: a) "Cumpre-lhe dizer" (isto é, Cumpre a ele dizer); b) "Cumpre dizer-lhe" (isto é, Cumpre dizer a ele); c) "Mandou-me arrolar" (o me é agente de arrolar); d) "Mandou arrolar-me" (o me é paciente).1 9) Com essas anotações iniciais, observa-se que, para alguns autores, se se tem a hipótese de uma locução verbal, "o uso do hífen, nos casos em que o pronome aparece em posição intermediária é considerado optativo". Ou seja, estariam corretas ambas as estruturas: a) "Eu estou-lhes mostrando meu trabalho"; b) "Eu estou lhes mostrando meu trabalho". 10) Justificam tais gramáticos que, "na verdade, a primeira forma tende a representar a fala lusitana, que encosta o pronome no verbo auxiliar ('Eu estou-lhes...'), enquanto a segunda forma tende a representar a fala brasileira, que encosta o pronome no verbo principal ('... lhes mostrando').2 11) Esse, todavia, não é o entendimento da grande maioria, ou mesmo quase totalidade, dos nossos gramáticos, começando por Júlio Nogueira, em lição para o gerúndio, mas que pode ser estendida para o infinitivo e para o particípio, como verbos principais da locução: "No caso de estar o gerúndio constituindo tempo composto com outro verbo, a partícula pode ficar em várias posições... Não deve, porém, ... ficar solta antes do gerúndio (os visitantes foram se aproximando)".3 12) Ainda sobre o assunto, assim primeiro esclarece Aires da Mata Machado Filho: "escritores brasileiros há que preferem deixar o pronome átono solto entre os elementos constitutivos de locução verbal e da conjugação de tempos compostos". Em seguida, anota o referido autor que, quando se posiciona depois do auxiliar ou depois do principal, o pronome átono vem "sempre a eles ligado por hífen", acrescentando que a ênclise ao auxiliar, nesses casos, não dispensa o traço de união entre o auxiliar e o pronome átono, sob pena de se relacionar, indevidamente, o pronome em próclise ao verbo principal.4 Exs.: a) "A natureza inteira estava-lhe dando uma festa" (correto); b) "A natureza inteira estava lhe dando uma festa" (errado); c) "A natureza inteira estava dando-lhe uma festa" (correto); d) "A natureza inteira estava dando lhe uma festa" (errado). 13) Nesse mesmo sentido, leciona Édison de Oliveira: "o pronome oblíquo não pode ficar solto entre dois verbos", estando, assim, errada a seguinte construção: "Os torcedores foram se retirando" E, observando que, em tal caso, "reúne-se o pronome oblíquo à forma verbal anterior", manda esse autor assim corrigir tal frase: "Os torcedores foram-se retirando".5 14) De Carlos Góis também é idêntico ensino para a grafia do pronome, quando posto em ênclise ao auxiliar: "O traço de união (hífen ou tirete) assinala que até eles se estende a acentuação do verbo. Constitui por isso grave erro omiti-lo: havia lhe dito por havia-lhe dito".6 16) Ante tais lições, em termos bem práticos vejam-se os seguintes exemplos com a indicação do acerto ou erronia da colocação dos pronomes átonos: a) "As situações se estão desenvolvendo..." (correto); b) "As situações estão-se desenvolvendo..." (correto); c) "As situações estão se desenvolvendo..." (errado); d) "As situações estão desenvolvendo-se..." (correto); e) "As situações estão desenvolvendo se..." (errado); f) "Eu lhe vou permitir sair mais cedo" (correto); g) "Eu vou-lhe permitir sair mais cedo" (correto); h) "Eu vou lhe permitir sair mais cedo" (errado); i) "Eu vou permitir-lhe sair mais cedo" (correto); j) "Eu vou permitir lhe sair mais cedo" (errado); l) "Você me quer fazer o favor de sair?" (correto); m) "Você quer-me fazer o favor de sair?" (correto); n) "Você quer me fazer o favor de sair?" (errado); o) "Você quer fazer-me o favor de sair?" (correto); p) "Você quer fazer me o favor de sair?" (errado) ----------1 Cf. GÓIS, Carlos. Sintaxe de Construção. 4. ed. São Paulo: Paulo de Azevedo & Cia. Ltda., 1945, p. 135-136. 2 Cf. CIPRO NETO, Pasquale; INFANTE, Ulisses. Gramática da Língua Portuguesa. 1. ed. São Paulo: Editora Scipione, 1999, p. 559. 3 Cf. NOGUEIRA, Júlio. Programa de Português - 3. série secundária. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1939, p. 232.
quarta-feira, 6 de julho de 2005

Devedor fiduciante ou devedor fiduciário?

1) Vinda do latim ("fiducia") com a conotação de uma alienação em confiança, o certo é que, apenas com base na denominação alienação fiduciária, costuma-se ouvir, para identificar as partes de um tal relacionamento, credor fiduciário e devedor fiduciário. Ou seja, usa-se o mesmo adjetivo, extraído da mencionada expressão, para designar tanto o credor como o devedor. Para comprovar, basta ler com atenção alguns manuais que tratam do assunto e alguns acórdãos sobre a questão. E a dúvida sempre retorna: devedor fiduciante ou devedor fiduciário?2) Para adequado entendimento, veja-se, por primeiro, que o regramento legal do instituto encontra-se sintetizado em sua lei de regência1: "A alienação fiduciária em garantia transfere ao credor o domínio resolúvel e a posse indireta da coisa móvel alienada, independentemente da tradição efetiva do bem, tornando-se o alienante ou devedor em possuidor direto e depositário com todas as responsabilidades e encargos que lhe incumbem de acordo com a lei civil e penal".3) Complete-se com o conceito de Ernane Fidélis dos Santos, voltado para a incidência do instituto sobre bens móveis: "Dá-se a alienação fiduciária, quando o devedor, para garantir dívida, transfere ao credor domínio da coisa móvel, sem, no entanto, lhe transferir a posse"2. Fixe-se bem, pois é importante: quem aliena o bem é exatamente o devedor, que o faz ao credor, em garantia de dívida, na confiança de que, uma vez pago o débito, o domínio lhe seja devolvido.4) Fixados esses conceitos jurídicos, é oportuno observar que, em português, os sufixos ante (amante), ente (gerente) e inte (ouvinte) podem designar o autor, aquele que pratica a ação indicada no radical da palavra a que eles se acoplam; já o sufixo ário (locatário) pode designar o recebedor ou destinatário da mencionada ação. Na linguagem forense, esbarramos a toda hora com vocábulos que revelam esses aspectos, como, por exemplo, nas seguintes contraposições: alienante e alienatário, arrendante e arrendatário, comodante e comodatário, depositante e depositário, endossante e endossatário, fideicomitente e fideicomissário, promitente e promissário.5) No caso da alienação fiduciária, reitere-se o que nela ocorre: o devedor aliena, em confiança, o domínio da coisa ao credor; e o credor, por sua vez, é o destinatário dessa alienação em confiança. Daí, portanto, ser correto dizer devedor fiduciante, ou simplesmente fiduciante, e credor fiduciário, proprietário fiduciário (como refere a lei com freqüência), ou simplesmente fiduciário. O devedor, em suma, é o autor da alienação e da confiança; o credor, o seu destinatário.6) No sentido desse entendimento, basta conferir o art. 22 da Lei 9.514/97, explícita, ao tratar da incidência do instituto sobre bens imóveis: "A alienação fiduciária regulada por esta lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel da coisa imóvel". 7) Ou seja, em resumo: pode-se dizer credor, ou fiduciário, ou credor fiduciário, ou, ainda, proprietário fiduciário. Por outro lado, devedor, ou fiduciante, ou mesmo devedor fiduciante; não, porém, devedor fiduciário. ----------1 Cf. art. 66 do Decreto-lei 911, de 1º/10/69, com a redação conferida pela Lei 4.728, de 14/7/65.2 Cf. SANTOS, Ernane Fidélis. Manual de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva. Vol. IV, p. 250.
quarta-feira, 29 de junho de 2005

Secção

1) Alguns dicionaristas, dentre eles Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, dão tal vocábulo como variante de seção,1 caso em que teria o significado abrangente de departamento, repartição, parte de um todo. Ex.: "Ela fez compras vultosas na secção de armarinhos daquela loja". 2) Abrangeria, ainda, tal vocábulo o conteúdo semântico de amputação, corte operatório, ato de serrar, cortar. Ex.: "No acidente, houve secção da medula entre as vértebras". 3) Para outros autores, porém, como Napoleão Mendes de Almeida, o vocábulo deve ser resguardado para o último lote de significados (amputação, corte operatório, ato de serrar, cortar).2 4) O uso geral, todavia, tem reconhecido seção e secção como palavras sinônimas, como é o caso do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa da Academia Brasileira de Letras, que aponta uma como variante da outra e lhes confere o significado de corte.3 5) Não confundir com cessão, que indica o ato de ceder, a transferência por concessão, nem com sessão, a indicar o lapso de tempo que dura uma reunião. ----------1 Cf. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. 1. ed., 8. reimpressão. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. p. 1.279. 2 Cf. ALMEIDA, Napoleão Mendes de. Dicionário de Questões Vernáculas. São Paulo: Editora Caminho Suave Ltda., 1981. p. 291. 3 Cf. Academia Brasileira de Letras. Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa. 2. ed., reimpressão de 1998. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1999. p. 674.
quarta-feira, 8 de junho de 2005

Prolatar

1) De acordo com lição de Silveira Bueno, "este verbo é formado do supino de proferre (proferir) prolatum / prolatar. Significa, portanto, proferir, relatar, explicar, expor, etc.12) Em Direito, "é usado em sua acepção ampla: tanto significa declarar oralmente a sentença, quanto dá-la por escrito".2 Ex.: a) "Encerrada a instrução, o magistrado prolatou a sentença no próprio termo de audiência";b) "Após ter consigo os autos por seis meses, o magistrado prolatou a sentença". 3) Lembrando que "as palavras podem ser agrupadas pelo sentido, compondo as chamadas famílias ideológicas", mas que "não há falar-se em sinonímia perfeita", sobretudo na linguagem jurídica, que é técnica, anotam Regina Toledo Damião e Antonio Henriques - em observação conjunta para os verbos prolatar, proferir, exarar e pronunciar - que se referem todos à decisão judicial, mas "não representam, no entanto, exatamente a mesma idéia", muito embora acrescentem tais autores que esse uso técnico e de escolha apurada "não é seguido com rigor pela linguagem legislativa, sempre repleta de imperfeição semântica".4) Assim, para eles, "o verbo prolatar é utilizado em sua acepção ampla: tanto significa declarar oralmente a sentença, quanto dá-la por escrito".5) Já "proferir ajunta-se à idéia da sentença oral".6) "Exarar corresponde a lavrar, consignar por escrito a decisão judicial".7) O verbo pronunciar "encontra seu sentido preso ao Direito antigo que o recomenda para a decisão anunciada em voz alta".38) Não traz problema algum quanto à conjugação verbal, já que é verbo regular.9) De igual modo, pela própria análise do exemplo dado, quanto à regência verbal, vê-se que é transitivo direto, sem dificuldade alguma de construção.10) Para resumir, não parece haver razão plausível em conferir sentidos diferentes para proferir e prolatar, e isso no mínimo por duas razões: a) ambas as formas provêm de um mesmo verbo latino, com a observação de que a primeira se origina do infinitivo (proferre), e a segunda, do supino (prolatum); b) a tentativa de diferenciação semântica, preconizada por alguns, não conta com apoio da maioria dos gramáticos, nem mesmo é seguida com uniformidade pelos autores dos textos de lei. ----------1 Cf. BUENO, Francisco da Silveira. Questões de Português. São Paulo: Saraiva, 1957. 2. vol, p. 382. 2 Cf. DAMIÃO, Regina Toledo; HENRIQUES, Antonio. Curso de Português Jurídico. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1994. p. 44. 3 Ibid.
quarta-feira, 25 de maio de 2005

Consecução dos tempos verbais

1) Existem, em português, normas de correlação, de correspondência temporal ou, ainda, de consecução dos tempos verbais (em latim, com regras mais rígidas, "consecutio temporum"), determinadoras de harmonização quanto ao uso das formas dos verbos. 2) Por essas normas é que, na prática, assim se redigem os seguintes exemplos, guardando a correlação dos tempos (o uso primeiro de um tempo exige o emprego de um outro a seguir): a) "Se é clara, a lei dispensa interpretação": b) "Se for clara, a lei dispensará interpretação"; c) "Se fosse clara, a lei dispensaria interpretação". 3) Por aplicação desses princípios, não se olvide, nesse ponto, a lição de Vasco Botelho do Amaral: "Modernamente, contra a índole da língua dos melhores escritores, com freqüência se perde de vista o paralelismo das formas verbais, e redige-se: 'Há dias que se trabalhava'. Evite-se essa construção". Em tal caso, o correto é redigir-se: "Havia dias que se trabalhava".1 4) Juntando os problemas de referência a tempo passado e a tempo futuro no que tange ao verbo haver, Arnaldo Niskier sintetiza o problema da seguinte forma: "Tendo como ponto de referência o momento presente, use a para o futuro e há para o passado. Se o ponto de referência já for passado, use havia em vez de há".2 Exs.: a) "Ele estará casado daqui a dois meses"; b) "Ele está casado há dois meses"; c) "Ele estava casado havia dois meses". 5) Para ilustrar, veja-se que, ao comentar o art. 324 do Projeto do Código Civil - que registrava "se forem casados há mais de dois anos" - Rui Barbosa, preocupado com o assunto, já questionava a estrutura de modo expresso: "Forem está no futuro; há, no presente. Será legítima esta combinação gramatical?"3 6) Em análise do exemplo "A Espanha já lutava há muito tempo contra aquele semelhante estado de coisas", José de Sá Nunes aponta a ausência de correlação entre os tempos - há no presente e lutava no pretérito imperfeito - explicando: "Assim nesta como em todas as construções análogas, o verbo da segunda oração tem de ficar, obrigatoriamente, para que haja "consecutio temporum", no mesmo tempo em que se acha o verbo da oração anterior: se esta tem o verbo no presente, no presente há de se estar o verbo daquela; e se o verbo de uma se acha no passado, também no passado se deve achar o verbo da outra". 7) Em seguida, traz tal autor exemplos de autorizados escritores, que fizeram uso adequado da consecução dos tempos: a) "Havia dois dias que nenhum incógnito atravessava o Crissus" (Alexandre Herculano); b) "Começara, havia dois meses, a guerra da Criméia" (Rui Barbosa). 8) Remata ele, todavia, com a observação de que "nem sempre os dois verbos deverão ficar no mesmo tempo, presente ou passado, porque muitas vezes a verdade dos fatos exige que os verbos estejam em tempos diferentes". 9) E exemplifica os casos de tal aspecto: a) "Escrevia então o jovem poeta de São Paulo, há mais cinqüenta anos"; b) "Há dezessete anos, o progresso material desconhecia a precisão dos cafés" (Camilo). 10) Alinhando significativas observações para conseguir adequada consecução dos tempos verbais, o próprio José de Sá Nunes, por primeira regra, anota que, quando se emprega o imperfeito do subjuntivo na oração condicional, o verbo da oração principal deve ficar no futuro do pretérito ou no imperfeito do indicativo. Exs.: a) "Se quisesse anular a sentença, o advogado deveria entender-se com a Justiça"; b) "Se quisesse anular a sentença, o advogado devia entender-se com a Justiça". 11) Em segunda regra, leciona que, quando o verbo da oração condicional está no futuro do subjuntivo, emprega-se, na oração principal, o futuro do indicativo, ou, às vezes, o imperativo. Exs.: a) "Se quiser anular a sentença, o advogado deverá entender-se com a Justiça"; b) "Se o advogado quiser anular a sentença, entenda-se com a JustiçaI". 12) Em terceira observação, realça o ilustre gramático que "o que não está em harmonia com a índole de nosso idioma, nem encontra apoio nos grandes padrões da vernaculidade, é a correlação do imperfeito do subjuntivo com o futuro do indicativo. Ex.: "Se quisesse anular a sentença, o advogado deverá entender-se com a Justiça" (errado).4 13) Não se olvide, também, o ensinamento de Vitório Bergo, que parte de um exemplo de Alexandre Herculano: "... eles tinham sido, havia dois séculos, inimigos armados..."; e registra sua lição: "deve empregar-se havia (pretérito imperfeito) e não há (presente do indicativo) para indicar o termo de período referente a época passada".5 14) Oportuno, neste assunto, é atentar a dois importantes lembretes de João Ribeiro: I) "Na correlação dos tempos só importa conhecer os casos em que os verbos se correspondem em modos diferentes"; II) Nesse assunto, "não só as regras são todas lacunosas, como a verdade geral é que só o sentido, positivo ou hipotético, isto é, o modo e não os tempos, determina o uso. Dizer que quando o sentido é incerto ou hipotético o verbo vai para o subjuntivo, é nada dizer, pois isso decorre da definição do subjuntivo".6 15) E se complemente com a doutrina do mesmo gramático, para quem "a falta de simultaneidade de tempos nas proposições" configura, em realidade verdadeiro galicismo, como nos seguintes exemplos: a) "É isso que me incomodou" (errado) b) "Foi isso que me incomodou" (correto); c) "É Jesus quem dizia..." (errado); d) "Foi Jesus quem dizia" (correto).7 16) Com a exposição dos princípios e regras que devem ser obedecidos em tais circunstâncias, podem-se extrair as seguintes conclusões para o exemplo que motivou a consulta: a) "Migalhas quis é poupar os leitores de mais essa" (errado); b) "Migalhas quis foi poupar os leitores de mais essa" (correto); c) "O que o Migalhas quis é poupar os leitores de mais essa" (errado); d) "O que o Migalhas quis foi poupar os leitores de mais essa" (correto). ----------1 Apud ALMEIDA, Napoleão Mendes de. Dicionário de Questões Vernáculas. São Paulo: Editora Caminho Suave Ltda., 1981. p. 133. 2 Cf. NISKIER, Arnaldo. Questões Práticas da Língua Portuguesa: 700 Respostas. Rio de Janeiro: Consultor, Assessoria de Planejamento Ltda., 1992. p. 4. 3 Cf. BARBOSA, Rui. Parecer sobre a Redação do Código Civil. Rio de Janeiro: edição do Ministério da Educação e Saúde, 1949. p. 141. 4 Cf. NUNES, José de Sá. Aprendei a Língua Nacional (Consultório Filológico). 1. ed. São Paulo: Saraiva, 1938. vol. I, p. 12-13 e 26-27. 5 Cf. BERGO, Vitório. Erros e Dúvidas de Linguagem. Rio de Janeiro: Livraria Editora Freitas bastos, 1944. vol. II, p. 131. 6 Cf. RIBEIRO, João. Gramática Portuguesa. 20. ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1923. p. 190. 7 Ibid., p. 250.
quarta-feira, 18 de maio de 2005

Constar

1) Verbo de largo uso na linguagem forense, significa chegar ao conhecimento, estar escrito ou registrado, fazer parte de. Exs.: a) "O patrimônio e a herança constituem coisas universais, ou universalidades, e como tais subsistem, embora não constem de objetos materiais" (CC, art. 57); b) "A instituição deverá constar de escritura pública transcrita no registro de imóveis e publicada na imprensa local e, na falta desta, na da Capital do Estado" (CC, art. 73); c) "A autorização do marido pode ser geral ou especial, mas deve constar de instrumento público ou particular previamente autenticado" (CC, art. 244). 2) Já quanto à acepção em que pode ser empregado, vale transcrever a lição de Luís A. P. Vitória, segundo quem "os puristas condenam este verbo, no significado de ser provável, uma vez que, etimologicamente, ele significa haver certeza".1 Exs.: a) "É o que consta neste livro" (correto); b) "Consta que o réu teve sua folga facilitada" (errado). 3) Domingos Paschoal Cegalla, todavia, leciona que ele pode ter o sentido de passar por certo, ou ser dito com aparências de verdade, ou de chegar ao conhecimento: a) "Consta que o ditador se suicidou"; b) "Consta que a jovem vai desfazer o noivado"; c) "Não me consta que essa casa está à venda".2 4) Celso Pedro Luft também lhe aceita a acepção de ser comentado ou dito com aparências de verdade (o que é bem diverso de haver certeza): a) "Constava-me que ele era contrabandista"; b) "Consta-lhe que haverá demissões".3 5) O mais certo, nesse campo, em verdade, parece ser acatar ambos os significados do mencionado verbo, até pelo princípio de que, na divergência entre doutos, deve-se conceder liberdade de emprego ao usuário (in dubio pro libertate). 6) Sob um outro aspecto, firme-se o posicionamento de que, quanto à regência verbal, admite ele ser construído indiferentemente com uma de duas preposições: em ou de. 7) Assim, são igualmente corretas as construções seguintes: a) "Consta nos autos que ele furtou"; b) "Consta dos autos que ele furtou". 8) Assim é que Domingos Paschoal Cegalla leciona que, no sentido de estar registrado ou mencionado, "pode-se dizer, indiferentemente, constar em (preferível) ou constar de".4 9) Celso Pedro Luft, de igual modo, também acata ambas as possibilidades de construção5, entendimento esse também partilhado por Francisco Fernandes.6 10) No que concerne aos textos legais, no sentido de estar escrito ou registrado em, de ser mencionado, de fazer parte, de incluir-se, observa Adalberto J. Kaspary que constar de "é a regência quase que exclusiva, atualmente, nos textos legais", enquanto constar em é regência "de uso raro".7 Exs.: a) "O Presidente da República poderá convocar Ministro de Estado para participar da reunião do Conselho, quando constar da pauta questão relacionada com o respectivo Ministério" (CF/88, art. 90, § 1°); b) "A aceitação da herança pode ser expressa ou tácita; a renúncia, porém, deverá constar, expressamente, de escritura pública, ou termo judicial" (CC, art. 1.581) c) "Os termos de juntada, vista, conclusão e outros semelhantes constarão de notas datadas e rubricadas pelo escrivão" (CPC, art. 168); d) "Nenhum corretor pode dar certidão senão do que constar do seu protocolo e com referência a ele" (C. Com, art. 46); e) "Quando o réu estiver no território nacional, em lugar estranho ao da jurisdição, será deprecada a sua prisão, devendo constar da precatória o inteiro teor do mandado" (CPP, art. 289); f) "Os impostos componentes do sistema tributário nacional são exclusivamente os que constam deste título..." (CTN, art. 17); g) "...do que constar a respeito no Instituto Médico-Legal, no Instituto de identificação e Estatística ou em estabelecimentos congêneres..." (CPP, art. 541, § 2°, b). ----------1 Cf. VITÓRIA, Luiz A. P. Dicionário de Dificuldades, Erros e Definições de Português. 4. ed. Rio de Janeiro: Tridente, 1969. p. 72. 2 Cf. CEGALLA, Domingos Paschoal. Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p. 86. 3 Cf. LUFT, Celso Pedro. Dicionário Prático de Regência Verbal. 8. ed. São Paulo: Ática, 1999. p. 143-144. 4 Cf. CEGALLA, Domingos Paschoal. Op. cit., p. 86, nota 337. 5 Cf. LUFT, Celso Pedro. Op. cit., p. 143-144, nota 338. 6 Cf. FERNANDES, Francisco. Dicionário de Verbos e Regimes. 4. ed., 16. reimpressão. Porto Alegre: Editora Globo, 1971. p. 164. 7 Cf. KASPARY, Adalberto J. O Verbo na Linguagem Jurídica - Acepções e Regimes. 4. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 1996. p. 106-107.
quarta-feira, 11 de maio de 2005

Dupla negativa

1) Em latim, similarmente ao que se dá em outros idiomas, o advérbio non aposto a outra palavra de força negativa destruía o sentido negativo da frase. 2) Em português, todavia, é correto - e isso sem perder o cunho negativo - repetir a idéia do não (anteriormente expresso na frase) em outras palavras de significação negativa, que apareçam na seqüência da construção. Exs.: a) "Não encontrou nada naquele autor"; b) "Não compareceu ninguém à audiência"; c) "Não encontrou nenhuma saída para o caso". 3) Em tais casos, dá-se o que se denomina negativa intensiva, e a segunda palavra de valor negativo, conforme o caso, também pode ser substituída por coisa alguma, pessoa alguma ou simplesmente por alguma (este último vocábulo, desde que posposto ao substantivo). Exs.: a) "Não encontrou coisa alguma naquele autor"; b) "Não compareceu pessoa alguma à audiência"; c) "Não encontrou saída alguma para o caso". 4) Nessas construções, porém, o não deve ser a primeira das palavras negativas, sendo errôneo repetir a negativa em exemplos como os seguintes: a) "Ele nada não encontrou naquele autor"; b) "Ninguém não compareceu à audiência"; c) "Nenhuma saída ele não encontrou para o caso". 5) Os exemplos do item anterior hão de ser assim corrigidos: a) "Ele nada encontrou naquele autor"; b) "Ninguém compareceu à audiência". c) "Nenhuma saída ele encontrou para o caso". 6) Aires da Mata Machado Filho coleciona, nos melhores autores, variadas formas de dupla negativa: a) "Nunca por nunca deparei um homem que pudesse..." (Camilo Castelo Branco); b) "O sentimento nunca em tempo algum lhe deixou brilhar no rosto o festival rubor da mocidade" (idem); c) "Nunca dos nuncas poderás saber a energia e obstinação que empreguei em fechar os olhos" (Machado de Assis); d) "Nem tu não hás de vir" (Gil Vicente).1 7) A um consulente que lhe indagava se era português legítimo dizer "não vi nada", Cândido de Figueiredo respondeu pela afirmativa, justificando: "duas negativas, em latim, afirmam; em português, não". 8) Em outra passagem, tal gramático observava que "isso são reminiscências do latim. No latim, com efeito, duas negativas afirmam; mas, em português, a sintaxe é outra". 9) E continuava: "A língua portuguesa é considerada filha da latina, mas não nos confundamos: o que temos do latim é grande parte do vocabulário; quanto à sintaxe, temos muitas coisas que os latinos não conheceram nunca e que portanto nos não vieram de lá".2 10) De Silveira Bueno advém interessante lição nesse mesmo sentido: "Os erros são como as doenças; fáceis de contrair, mas difíceis de curar. Este, de que duas negativas juntas fazem uma afirmativa, é dos mais renitentes. Algum gramático, fauna que não se extingue, tendo lido que, em latim, duas negativas valem uma afirmativa, como non nullos = ullus; non nihil = aliquid, transportou para o português a mesma doutrina e errou. Em nosso idioma, duas ou duzentas negativas juntas são sempre negativas".3 11) Para Cândido Jucá Filho, a negação dupla às vezes efetivamente nega ("ninguém não diga", "desinfeliz") e às vezes afirma ("não sem razão" = com razão, "nada anormal" = mui normal, "sem desconhecer" = conhecendo).4 ---------- 1 Cf. MACHADO FILHO, Aires da Mata. .Principais Dificuldades.. In: Grande Coleção da Língua Portuguesa, 1. ed. São Paulo: co-edição Gráfica Urupês S/A e EDINAL. Editora e Distribuidora Nacional de Livros Ltda., 1969. vol. 1, p. 114-115. 2 Cf. FIGUEIREDO, Cândido de. Falar e Escrever. 4. ed. Lisboa: Livraria Clássica Editora, 1941. vol. II, p. 46 e 272. 3 Cf. BUENO, Francisco da Silveira. Questões de Português. São Paulo: Saraiva, 1957. 2. v., p. 311-312. 4 Cf. JUCÁ FILHO, Cândido. Índice Alfabético e Crítico da Obra de Mário Barreto. Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 1981. p. 86.
quarta-feira, 4 de maio de 2005

Despercebido

1) Significa o que não se vê, o que não é notado, aquilo em que não se atenta. Ex.: "Passou despercebida à imprensa a notoriedade do réu". 2) Não confundir com sua parônima desapercebido, que quer dizer desprevenido, desguarnecido, desprovido. 3) Silveira Bueno faz essa distinção entre desperceber (não pressentir) e desaperceber (não estar preparado).1 4) Também fazendo a distinção de significados entre os dois vocábulos, Eliasar Rosa transcreve frase de Otoniel Mota, que serve para a fixação dos dois sentidos: "O soldado tratou de passar despercebido perante o inimigo porque estava desapercebido para a luta". Bem por isso, critica ele a seguinte passagem de um acórdão: "No vertente, a falta passou desapercebida ao ilustre Juiz, bem como às partes litigantes...".2 5) Vasco Botelho de Amaral anota um cochilo de desapercebidas por despercebidas em Camilo Castelo Branco.3 6) Quanto ao emprego equivocado de tais vocábulos, lembra Luiz Antônio Sacconi que se trata de barbarismo semântico.4 7) Eduardo Carlos Pereira denomina-o barbarismo de idéia, conceituando-o como o "uso desnecessário de termos estrangeiros e de termos em acepção estranha à língua".5 8) Também é lição de Júlio Ribeiro que "dar às palavras significação que elas não têm", como em tais casos, constitui "vício lexeológico" que se chama "barbarismo".6 9) Arnaldo Niskier, de igual modo, é dos que vêem nítida diferença entre tais vocábulos: "Despercebido é o que não foi notado: desapercebido é desprovido, desaparelhado".7 10) Ronaldo Caldeira Xavier caracteriza o emprego de desapercebido por despercebido - e vice-versa - como "cruzamento", vale dizer, como "o emprego de uma palavra em lugar de outra", decorrente "da falta de discernimento entre vocábulos assemelhados quanto à estrutura fonológica (parônimos), o que motiva a alteração da mensagem tencionada", atentando contra a precisão terminológica".8 11) Oportuno, todavia, é observar que Pedro A. Pinto - que vê Cândido de Oliveira como autor e defensor da distinção de significados entre tais vocábulos - pondera, a esse respeito, serem "correntes ambas as formas, e uma não é melhor que a outra". 12) Em seqüência, refere tal gramático que Heráclito Graça "demonstrou à saciedade, que pode dizer-se, com o mesmo sentido, passou desapercebido ou passou despercebido. 13) E, para corroborar seu pensamento, remata ele com exemplo de Almeida Garrett: "Sr. Presidente, em toda a minha vida tenho professado a liberdade, e por isso não podia deixar desapercebido este fato injusto e altamente inconveniente à causa pública...".9 14) Em síntese, apesar dos entendimentos contrários, a regra hoje, sobretudo nos textos que devam submeter-se à norma culta, é fazer a distinção entre ambos os vocábulos: desapercebido é desprevenido, desguarnecido, desprovido; já despercebido é o que não se viu, o que não é notado, aquilo em que não se atentou. 15) De modo específico para o caso da consulta, vê-se, assim, que o correto é dizer: "Não passou despercebido dos atentos migalheiros...". ---------- 1 Cf. BUENO, Silveira. Português pelo Rádio. São Paulo: Saraiva & Cia., 1938. p. 75. 2 Cf. ROSA, Eliasar. Os Erros Mais Comuns nas Petições. 9. ed. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos S/A, 1993. p. 56-57. 3 Cf. AMARAL, Vasco Botelho de. Estudos Vernáculos. Porto: Editora Educação Nacional, 1939. p. 105. 4 Cf. SACCONI, Luiz Antônio. Nossa Gramática. 1. ed. São Paulo: Editora Moderna, 1979. p. 269. 5 Cf. PEREIRA, Eduardo Carlos. Gramática Expositiva para o Curso Superior. 15. ed. São Paulo: Monteiro Lobato & Cia., 1924. p. 260. 6 Cf. RIBEIRO, Júlio. Gramática Portuguesa. 8. ed. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos, 1908. p. 328. 7 Cf. NISKIER, Arnaldo. Questões Práticas da Língua Portuguesa: 700 Respostas. Rio de Janeiro: Consultor, Assessoria de Planejamento Ltda., 1992. p. 27. 8 Cf. XAVIER, Ronaldo Caldeira. Português no Direito. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1991. p. 85. 9 Cf. PINTO, Pedro A. Termos e Locuções: Miudezas de Linguagem Luso-Brasileira. Rio de Janeiro: Tipografia Revista dos Tribunais, 1924. p. 98-99.
quarta-feira, 27 de abril de 2005

Numeral

1) Quando se quer significar a especificação da ordem ou série em que dispostos os seres e as coisas, é correto o uso do numeral ordinal. Exs.:quarta oportunidade, quinto dia útil, centésima vez. 2) Por brevidade e simplificação, entretanto, tem-se defendido o uso dos cardinais em vez dos ordinais na enumeração de séries de objetos, capítulos, artigos, parágrafos, incisos. Exs.: capítulo dois, artigo dez. 3) Realce-se, porém, por primeiro, que, em tais casos, não variam para o feminino os números um e dois. Exs.: página vinte e um, lição trinta e dois. 4) Também se verifica que, se anteposto o numeral ao substantivo, de rigor é a utilização do ordinal. Exs.: vigésima primeira página, trigésima segunda lição. 5) Em interessante observação nesse sentido, também acrescentam José de Nicola e Ernani Terra: "O numeral anteposto ao substantivo deve ser lido como ordinal, concordando com esse substantivo. Já o numeral posposto ao substantivo deve ser lido como cardinal, concordando com a palavra número, que se considera subentendida": III Salão do Automóvel (terceiro), II Maratona Estudantil (segunda), VIII Copa do Mundo (oitava), casa 2 (dois), apartamento 44 (quarenta e quatro).1 6) Para Celso Cunha, "na numeração dos artigos de leis, decretos e portarias, usa-se o ordinal até nove, e o cardinal de dez em diante"; oportuno é anotar, todavia, que pela leitura do exemplos de tal autor - o qual exemplifica para ambos os numerais com algarismos romanos - estes últimos tanto servem à leitura de cardinais como de ordinais2: capítulo IX (nono), capítulo XI (onze). 7) Na lição de Luís A. P. Vitória, "para indicar a ordem dos séculos, ou a ordem de sucessão de soberanos, usa-se o ordinal até dez e o cardinal de onze em diante. Ex.: 'Pio Onze substituiu Pio Décimo no trono papal'".3 8) De grande interesse é a lição de Silveira Bueno, que sintetiza regras práticas para a solução do problema da enumeração de reis, papas, séculos e capítulos: a) de 1 a 10, usam-se os ordinais, independentemente de vir o numeral antes ou depois do substantivo: Pedro II (segundo), João IV (quarto), Pio X (décimo), século VIII (oitavo), capítulo V (quinto); b) de 11 em diante, se o numeral vem antes do substantivo, emprega-se o ordinal: o XIII século (o décimo terceiro século), o XV Luís (o décimo quinto Luís), o XXV capítulo (o vigésimo quinto capítulo); c) ainda de 11 em diante, se o numeral vem depois do substantivo, há de se usar o cardinal: O Luís XV (quinze), o século XXV (vinte e cinco), Pio XII (doze), o capítulo XIII (treze). 9) Faz, em seguida, tal autor uma ressalva: "Estas regras servem somente para a enumeração de reis, papas, capítulos, séculos. Fora destes, não há regra fixa, existindo toda liberdade.4 10) De modo prático para as indagações feitas pelo leitor, pode-se afirmar o que segue: a) os números romanos (I, II, III, IV, V...) podem servir tanto para uso de cardinais (um, dois, três...) como para ordinais (primeiro, segundo, terceiro...); b) no caso atual, tem-se que o papa falecido era João Paulo II (segundo), e o novo é Bento XVI (dezesseis); c) nada impede que se escreva João Paulo 2° e Bento 16, que são formas igualmente corretas; d) também está correto grafar João Paulo Segundo e Bento Dezesseis. ---------- 1 Cf. NICOLA, José de; TERRA, Ernani. 1.001 Dúvidas de Português. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 54-55. 2 Cf. CUNHA, Celso. Gramática Moderna. 2. ed. Belo Horizonte: Editora Bernardo Álvares S/A, 1970. p. 136. 3 Cf. VITÓRIA, Luís A. P. Dicionário de Dificuldades, Erros e Definições de Português. 4. ed. Rio de Janeiro: Tridente, 1969. p. 174. 4 Cf. BUENO, Francisco da Silveira. Questões de Português. São Paulo: Saraiva, 1957. vol. II, p. 318.
quarta-feira, 20 de abril de 2005

À baila

1) Mário Barreto emprega à balha sem problema algum ou explicação adicional, também não fazendo referência nenhuma à locução à baila: "Os exemplos, porém, que do nosso admirável Rui Barbosa, trouxe à balha o meu colega, não merecem o mínimo crédito por não serem limpas e puras as fontes donde os tirou".12) Cândido de Figueiredo, por seu lado, opõe-se à expressão à baila, e assevera que o correto é à balha.3) Heráclito Graça, por fim, que transcreve a lição do gramático por último citado, após alongadas considerações e com exemplos de autores abalizados, dá por corretas ambas as expressões, e conclui: "Vir à baila ou vir à balha são, portanto, formas idênticas, equivalem-se".24) Também nessa esteira, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, órgão incumbido oficialmente de determinar a existência dos vocábulos em nosso idioma, além de sua grafia oficial, registra baila e balha como formas variantes uma da outra. E ainda registra bailha como terceira forma para significar a mesma realidade.35) E Napoleão Mendes de Almeida traz alongada explicação: baila "é mais usada, mas é corruptela de balha, designação da divisão de madeira, de uns cinco palmos de altura, que rijamente se cravava no chão, no centro da liça, e que servia para impedir que os combatentes fossem de encontro um do outro e para facultar-lhes que se ferissem unicamente com as armas. O mantenedor (cavaleiro que combatia com a lança) vinha à balha ou para quebrar novas lanças com o mesmo aventureiro ou para acudir ao desafio de outro".46) Ante as dúvidas e discussões entre os gramáticos e a própria posição oficial sobre o assunto, o melhor é concluir que há liberdade ao usuário para escolher, indistintamente, entre as três formas de expressão, usadas com freqüência na locução vir à balha, ou vir à baila, ou vir à bailha, que significa vir a propósito (in dubiis, libertas).7) Cândido Jucá Filho, nesse sentido, vê como mera questão de opção o emprego de baila ou balha em casos que tais.58) Corrobora esse entendimento de facultatividade de uso a lição de Cândido de Figueiredo - que Heráclito Graça havia citado como contrário a tanto -, o qual manifesta visível preferência por à balha: "vir à baila é corruptela de vir à balha", e, "quando as corruptelas se vulgarizam,... não é indecoroso subscrevê-las".69) Resumindo a questão: são igualmente corretas as expressões "trazer à baila", "trazer à balha" e "trazer à bailha", todas com o mesmo sentido de trazer à discussão ou vir a propósito. ---------- 1 Cf. BARRETO, Mário. De Gramática e de Linguagem. 2. ed. Rio de Janeiro: Organização Simões Editora, 1995. p. 39. 2 Cf. GRAÇA, Heráclito. Fatos da Linguagem. Rio de Janeiro: Livraria de Viúva Azevedo & Cia. . Editores, 1904. p. 68-71. 3 Cf. Academia Brasileira de Letras. Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa. 2. ed., reimpressão de 1998. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1999. p. 91-92. 4 Cf. ALMEIDA. Napoleão Mendes de. Dicionário de Questões Vernáculas. São Paulo: Editora Caminho Suave Ltda., 1981. p. 37. 5 Cf. JUCÁ FILHO, Cândido. Dicionário Escolar das Dificuldades da Língua Portuguesa. 3. ed. Rio de Janeiro: FENAME . Fundação Nacional de Material Escolar, 1963. p. 93. 6 Cf. FIGUEIREDO, Cândido de. Falar e Escrever. 4. ed. Lisboa: Livraria Clássica Editora, 1941. v. II, p. 277-278.
quarta-feira, 13 de abril de 2005

Um dos que

1) Trata-se de expressão que traz problemas quanto à concordância verbal.2) Com ela no sujeito, o verbo pode concordar optativamente no singular ou no plural. Exs.: a) "Dentre nossos juristas, Vicente Rao foi um dos que mais abusou do talento e da cultura" (correto);b) "Dentre nossos juristas, Vicente Rao foi um dos que mais abusaram do talento e da cultura" (correto). 3) Após lembrar que tal expressão às vezes faz o verbo concordar no singular, às vezes no plural, Júlio Nogueira observa o que sintaticamente se dá: na segunda hipótese, "predomina o plural os, contido em dos; na primeira, um".4) Em continuação, opina o referido gramático: "Parece-nos preferível o verbo no plural, e usá-lo assim é a tendência mais generalizada".15) Embora haja a condenação de alguns gramáticos ora a esta, ora àquela construção, Laudelino Freire, fundando-se em diversos exemplos de abalizados autores e reforçado pela autoridade de conceituados gramáticos, defende a concordância do verbo, em tais casos, tanto no singular quanto no plural, refutando superiormente tais invectivas adversárias.26) Júlio Nogueira, de seu lado, assevera que, "com um dos que é preferível o plural"; por outro lado, assevera que, "se, porém, vale o exemplo dos clássicos, pode-se usar o singular", passando a arrolar exemplos abalizados de bons escritores: a) "Foi uma das primeiras terras de Espanha que recebeu a fé de Cristo" (Frei Luís de Sousa);b) "Uma das causas que derribou a Galba do Império foi...".3 7) Para Laudelino Freire, "há dupla sintaxe para as orações em que o pronome que vem precedido de um dos, uma das", observando tal gramático que, à semelhança do que ocorre na língua francesa, são facilmente justificáveis ambas as concordâncias.48) Em realidade, autorizadas que estão as duas construções em nosso idioma, pode-se asseverar que, hoje, a questão é apenas de sentido: com o verbo no singular, realça-se a idéia da ação individual; com o verbo no plural, reforça-se o aspecto da ação coletiva. 9) Atentando, de modo específico, à indagação do leitor, vê-se que ambas as concordâncias estão igualmente corretas no plano sintático, e a diferença reside tão-somente na ênfase que se quer conferir ao sentido: I) - quando se faz a concordância no singular, prioriza-se a ação individual do um; II) - quando se põe o verbo no plural, destaca-se a atuação coletiva dos migalheiros. ---------- 1 Cf. NOGUEIRA, Júlio. A Linguagem Usual e a Composição. 13. ed. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos, 1959. p. 112. 2 Cf. FREIRE, Laudelino. Estudos de Linguagem. Sem número de edição. Rio de Janeiro: Cia. Brasil Editora, impresso em 1937. p. 18-23. 3 Cf. NOGUEIRA, Júlio. Programa de Português . 3ª série secundária. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1939. p. 212. 4 Cf. FREIRE, Laudelino. Sintaxe da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Empresa Editora ABC Ltda., 1937. p. 97.
quarta-feira, 6 de abril de 2005

Datas

1) De início, anote-se o ensinamento da maioria dos gramáticos de que o primeiro dia do mês é ordinal, não cardinal.1 2) Assim, 1º de março (e não l de março).2 3) Por conseguinte, em forma compacta, de igual modo, escreve-se 1º, e não 01 (1º/10/49 e não 01/10/49). 4) Anote-se, contudo, que Aires da Mata Machado Filho afiança ser correta a construção "Hoje é um de dezembro".3 5) Também muito embora observe que "hoje há preferência pelo ordinal", leciona Domingos Paschoal Cegalla que, "para designar o primeiro dia do mês, pode-se usar o ordinal ou o cardinal: 'O fato ocorreu no dia primeiro (ou no dia um) de julho de 1990'".4 6) Para resumir esse aspecto, ante a divergência entre os gramáticos, deve-se conferir liberdade usuário (in dubiis, libertas), de modo que se deve considerar correto o emprego tanto do ordinal quanto do cardinal. 7) Em continuação, atente-se a que, em português, os nomes de meses se escrevem com letra minúscula, porque o Formulário Ortográfico não os inclui entre os nomes próprios, conforme esclarece observação do inciso 3º de sua regra 49: janeiro, março, outubro; jamais Janeiro, Março, Outubro. 8) Sob outro aspecto, em oportuna observação, lembra Luiz Antônio Sacconi que, por um lado, "atualmente usa-se o ponto também na separação de casas decimais: 15.245, 289.493, 1.648.396, etc."; por outro lado, "os números que identificam o ano não costumam ganhar ponto: 1979, 1947, 1900, 1822, etc.".5 9) Quanto à concordância verbal, o verbo ser, nas datas, admite três construções igualmente corretas: a) "Hoje é dia 30 de novembro";b) "Hoje é 30 de novembro";c) "Hoje são 30 de novembro". ____________ 1Cf. GÓIS, Carlos. Sintaxe de Concordância. 8. ed. São Paulo: Livraria Francisco Alves, 1943. p. 88. 2Cf. CUNHA, Celso. Gramática Moderna. 2. ed.Belo Horizonte: Editora Bernardo Álvares S/A, 1970. p. 136. 3Cf. MACHADO FILHO, Aires da Mata. .A Correção na Frase.. In: Grande Coleção da Língua Portuguesa. 1. ed. São Paulo: co-edição Gráfica Urupês S/A e EDINAL . Editora e Distribuidora Nacional de Livros Ltda., 1969. vol. 2, p. 577. 4Cf. CEGALLA, Domingos Paschoal. Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p. 121. 5Cf. SACCONI, Luiz Antônio. Nossa Gramática. 1. ed. São Paulo: Editora Moderna, 1979. p. 236.
quarta-feira, 30 de março de 2005

Junte-se / Cumpra-se / Intime-se

1) Às vezes se quer saber qual função do "se" e o comportamento da estrutura sintática como um todo, sobretudo quanto à concordância verbal, quando se está em presença de expressões como "Junte-se", "Cumpra-se" e "Intime-se".2) Muito embora não se tenha expresso o termo que se quer relacionar ao verbo em tais orações (ou seja, o que ou quem se quer juntar, cumprir ou intimar), é de fácil percepção que se abrevia o texto, deixando-se subentendida alguma palavra, possivelmente porque já mencionada anteriormente: "Junte-se (o documento)"; "Cumpra-se (o mandado)"; "Intime-se (a testemunha)".3) Em tais casos, a análise que se há de fazer é a mesma de uma conhecida estrutura ("Aluga-se uma casa"), em que também há um se acoplado ao verbo e pode ser dita de outra forma: "Uma casa é alugada". No caso aqui apreciado: "O documento seja juntado"; "O mandado seja cumprido"; "A testemunha seja intimada".4) Por serem frases que permitem essa transformação, pode-se dizer que são frases reversíveis, cujas observações, em corolário, servem para todas as outras, também reversíveis, que tenham o se unido ao verbo desse modo.5) Em frases dessa natureza, podem-se extrair as seguintes conclusões: a) o exemplo está na voz passiva sintética;b) o se é partícula apassivadora;c) o sujeito é uma casa (sujeito, e não objeto direto). E, ainda, os sujeitos, nas demais orações, são documento, mandado e testemunha.6) Por essas razões, se, em vez de uma casa, se diz casas, tem-se, por conseqüência, o sujeito no plural. O mesmo se afirme quando se diz documentos, mandados e testemunhas.7) Exatamente por isso e por mera aplicação da regra de concordância verbal de sujeito simples, se o sujeito está no plural, o verbo também deve ir para o plural: "Alugam-se casas". "Juntem-se os documentos". "Cumpram-se os mandados". "Intimem-se as testemunhas".8) Acrescente-se que, quando se usam as estruturas de forma abreviada e se subentendem outros termos, se estes são do plural (como seria o caso de já terem sido mencionados anteriormente os documentos, os mandados ou as testemunhas), as estruturas, ainda que abreviadas, teriam o verbo no plural: "Juntem-se"; "Cumpram-se"; "Intimem-se".9) Sempre é bom lembrar que essa é uma construção muito comum nos meios jurídicos, e se deve zelar por sua concordância adequada, no plural, e não no singular, quando necessário: "Buscaram-se soluções para o conflito"; "Citem-se os réus"; "Devolvam-se os autos"; "Entreguem-se os autos da carta precatória"; "Processem-se os recursos".10) Observações adicionais podem ser obtidas em outro verbete já analisado: Aluga-se uma casa.
quarta-feira, 23 de março de 2005

Consumerismo

1) Em inglês, "consumer" significa consumidor, o que, em termos de técnica jurídica, quer indicar aquela pessoa que adquire produtos ou serviços para seu próprio uso.2) Também naquele idioma, de "consumer" deriva "consumerism", palavra que lá tem dois significados: a) mania ou excesso de consumo, que se manifesta no hábito de comprar bens ou serviços em exagero, ou não essenciais, ou desnecessários; b) estrutura jurídica que busca estabelecer regras de proteção aos adquirentes de bens e serviços contra sua baixa qualidade e alertar quanto aos perigos que alguns deles representam para as pessoas. 3) Ora, para representar a compulsão ao consumo em Português, já de há muito existe a palavra consumismo. Todavia, para a estrutura de proteção ao consumidor (preocupação antiga em países de língua inglesa, mas recente em nosso meio), nosso idioma trouxe "consumerism" e o aportuguesou normalmente: consumerismo (não é consumeirismo).4) Essa, aliás, é a forma que consta no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras, que é o órgão oficial para determinar quais as palavras pertencentes ao nosso léxico, bem como qual sua adequada grafia em Português.15) Por fim, se se quiser empregar não o substantivo, mas o adjetivo referente ao consumidor em tais casos, dir-se-á consumerista (não, porém, consumeirista).__________1 Cf. Academia Brasileira de Letras. Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa. 2. ed, 6. impressão, reimpressão de 1998. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1999. p. 190.  
quarta-feira, 16 de março de 2005

Interpor/opor

1) Na prática processual do foro, alguns se vêem em dificuldades ante determinadas situações, quanto ao emprego dos verbos interpor e opor, quando se trata de empregar certas expressões técnicas:opor embargos? interpor embargos? 2) Ora, num primeiro aspecto, a etimologia revela aspecto significativo, a partir das preposições que integram os vocábulos. Assim, interpor (inter + ponere) traz a idéia de colocar entre, de pôr de permeio. Ex.: "Entre ti e mim se interpôs um abismo". Já opor (ob + ponere) reflete o sentido de pôr diante de, de colocar como óbice, como impedimento. Ex.: "Ele opôs uma barreira à invasão". 3) Nosso sistema legislativo emprega usualmente interpor para referir-se aos recursos, já que estes configuram um ato processual que se mete de permeio entre um ato recorrido e os atos subseqüentes, em mesmo feito. Exemplifica-se: a) "Quando... forem interpostos simultaneamente embargos infringentes e recurso extraordinário ou recurso especial..." (CPC, art. 498); b) "O recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério Público" (CPC, art. 499); c) "Cada parte interporá o recurso..." (CPC, art. 500, "caput"); d) "(O recurso adesivo) será interposto perante a autoridade competente para admitir o recurso principal" (CPC, art. 500, I); e) "Na apelação, nos embargos infringentes, no recurso ordinário, no recurso especial, no recurso extraordinário e nos embargos de divergência, o prazo para interpor e para responder é de quinze (15) dias" (CPC, art. 508); f) "Será, no entanto, recebida (a apelação) só no efeito devolutivo, quando interposta de sentença que..." (CPC, art. 520, "caput"); g) "O recurso extraordinário e o recurso especial, nos casos previstos na Constituição Federal, serão interpostos perante..." (CPC, art. 541, "caput"); h) "O recurso extraordinário, ou o recurso especial, quando interpostos..." (CPC, art. 542, § 3º); i) "É da competência de cada uma das Turmas do Tribunal: [...] b) julgar, em última instância, os recursos de revista interpostos de decisões..." (CLT, art. 702, § 2º, "b"); j) "Os recursos serão interpostos por simples petição e terão efeito meramente devolutivo..." (CLT, art. 899); l) "Já tendo sido interposto recurso de despacho ou de sentença, as condições de admissibilidade, a forma e o julgamento serão regulados pela lei anterior" (LICPP, art. 11); m) "Os recursos ... deverão ser interpostos..." (CPP, art. 574, "caput"); n) "O Ministério Público não poderá desistir de recurso que haja interposto" (CPP, art. 576); o) "O recurso poderá ser interposto pelo Ministério Público, ou pelo querelante, ou pelo réu, seu procurador ou seu defensor" (CPP, art. 577, "caput"); p) "O recurso será interposto por petição..." (CPP, art. 578, "caput"); q) "Interposto por termo o recurso..." (CPP, art. 578, § 3º); r) "O recurso voluntário poderá ser interposto..." (CPP, art. 586, "caput"); s) "As apelações poderão ser interpostas quer em relação a todo o julgado, quer em relação a parte dele" (CPP, art. 599); t) "Se o apelante declarar, na petição ou no termo, ao interpor a apelação, que deseja arrazoar na Superior Instância..." (CPP, art. 600, § 4º); u) "Incumbe, ainda, ao Ministério Público: [...] III - interpor recursos de decisões proferidas pela autoridade judiciária, durante a execução" (Lei 7.210, de 11.7.1984, art. 68, III). 4) A mesma lição vale para o adjetivo interposto e para o substantivo interposição, como se pode ver no Código de Processo Civil (arts. 497, 500, 506, "caput", 506, parágrafo único, 507, 509, "caput", 509, parágrafo único, 511, "caput", 511, § 1º, 514, 518, "caput", 523, § 2º, 523, § 3º, 525, § 2º, 526, 542, § 3º, 544, § 1º, 550, 551, § 3º) e no Código de Processo Penal (arts. 578, § 2º, 579, "caput", 580, 583, 588, 593, § 2º, 598). 5) Já o verbo opor costuma ser empregado com a significação etimológica de colocar como óbice, de antepor como obstáculo, como é o caso de impedimentos, compensação, exceções, dúvidas (no Código Civil), irregularidades, embargos, exceções (Código de Processo Civil e Consolidação das Leis do Trabalho). Exemplifica-se: a) "Nas mesmas penas incorrerá o juiz: I - que celebrar o casamento antes de levantados os impedimentos opostos contra algum dos contraentes" (CC/1916, art. 228, I); b) "Nas mesmas penas incorrerá o juiz: ... III - que se abstiver de opô-los (os impedimentos), quando lhe constarem..." (CC/1916, art. 228, III); c) "O devedor demandado pode opor ao credor as exceções que lhe forem pessoais e as comuns a todos; não lhe aproveitando, porém, as pessoais a outro co-devedor" (CC/1916, art. 911 - o CC/2002, art. 281, mantém a dicção); d) "O devedor que, notificado, nada opõe à cessão, que o credor faz a terceiros, dos seus direitos..." (CC/1916, art. 1.021 - o CC/2002, art. 377, mantém a dicção); e) "Salvo os casos previstos nos arts. 1.268 e 1.269, não poderá o depositário furtar-se à restituição do depósito, alegando não pertencer a coisa ao depositante, ou opondo compensação, exceto se noutro depósito se fundar" (CC/1916, art. 1.273 - o CC/2002, art. 638, mantém a dicção); f) "Em falta de estipulações explícitas quanto à gerência social: I - presume-se que cada sócio tem o direito de administrar, e válido é o que fizer, ainda em relação aos associados que não consentiram, podendo, porém, qualquer destes opor-se, antes de levado o ato a efeito" (CC/1916, art. 1.386, I); g) "As sociedades sem personalidade jurídica, quando demandadas, não poderão opor a irregularidade de sua constituição" (CPC, art. 12, § 2º); h) "Na execução por quantia certa contra a Fazenda Pública, citar-se-á a devedora para opor embargos em dez (10) dias; se esta não os opuser, no prazo legal, observar-se-ão as seguintes regras..." (CPC, art. 730, "caput"); i) "O devedor poderá opor-se à execução por meio de embargos" (CPC, art. 736); j) "Aos embargos opostos na forma deste artigo, aplica-se o disposto nos Capítulos I e II deste Título" (CPC, art. 746, parágrafo único); l) "O devedor será citado para, no prazo de dez (10) dias, opor embargos..." (CPC, art. 755); m) "Se o oficial opuser dúvidas ou dificuldades à tomada do protesto..." (CPC, art. 884); n) "Compete, ainda, às Juntas de Conciliação e julgamento ... d) julgar as exceções de incompetência que lhes forem opostas" (CLT, art. 653, d); o) "Nas causas da jurisdição da Justiça do Trabalho, somente podem ser opostas, com suspensão do feito, as exceções de suspeição ou incompetência" (CLT, art, 799); p) - "É vedado à parte interessada suscitar conflitos de jurisdição quando já houver oposto na causa exceção de incompetência" (CLT, art. 806). 6) Com tais considerações, anota-se que o art. 536 do Código de Processo Civil registra: "Os embargos (de declaração) serão opostos, no prazo de cinco (5) dias, em petição dirigida ao juiz ou relator, com indicação do ponto obscuro, contraditório ou omisso, não estando sujeitos a preparo". A uma análise do que costumeiramente ocorre em nosso sistema, não se duvida de que os embargos de declaração configuram um recurso, trazendo a inconfundível idéia de ato que se coloca entre, que se põe de permeio. Daí porque, para guardar coerência com o restante do sistema processual, o correto deve ser interpor, e não opor. Por isso, quem usar interpor em tal caso não incorre em erro algum. A par disso, ainda no caso específico dos embargos de declaração, o emprego de opor também não pode ser inquinado de erro, porquanto, embora seja flagrante um afastamento da etimologia e da diretriz adotada pelo sistema, e apesar de não haver justificativa plausível para a mudança, tal é a linguagem do próprio código. 7) Todavia, por mera questão de preferência pessoal, fico com interpor embargos de declaração, o que, à falta de justificativa para o outro modo de expressão, guarda coerência com as linhas gerais do ordenamento.
quarta-feira, 9 de março de 2005

Vir

1) Num primeiro aspecto, é verbo que traz problemas quanto à acentuação gráfica, já que tanto ele quanto seus compostos são grafados, na terceira pessoa do plural do presente do indicativo, com um acento circunflexo, para diferenciar da terceira pessoa do singular: eles vêm, eles intervêm (conferir acento diferencial).2) Seus compostos, na terceira pessoa do singular, recebem um acento agudo, em razão de regra específica das oxítonas: ele vem, ele intervém.3) Atente-se, assim, às seguintes formas do presente do indicativo: ele vem, eles vêm, ele intervém, eles intervêm.4) Nem vir nem seus compostos apresentam dois ee na terceira pessoa do plural do presente do indicativo, encontro vocálico esse próprio de crer, dar, ler e ver.5) Quanto à conjugação verbal, importante é observar-lhe as formas do presente do indicativo e tempos derivados: venho, vens, vem, vimos, vindes, vêm (presente do indicativo); venha, venhas, venha, venhamos, venhais, venham (presente do subjuntivo); vem, venha, venhamos, vinde, venham (imperativo afirmativo); não venhas, não venha, não venhamos, não venhais, não venham (imperativo negativo).6) "As pessoas menos cultas manifestam a tendência para dizer viemos em vez de vimos na primeira pessoa do plural do presente do indicativo"1, forma equivocada pertencente ao pretérito perfeito do indicativo.7) Essa falha de emprego da forma do pretérito perfeito pelo presente do indicativo, Júlio Nogueira a atribui à "falta de uso" da forma correta.28) São as seguintes as formas do pretérito perfeito: vim, vieste, veio, viemos, viestes, vieram.9) Cuidado, assim, com os tempos derivados do pretérito do perfeito do indicativo: a) viera, vieras, viera, viéramos, viéreis, vieram (pretérito mais-que-perfeito do indicativo);b) vier, vieres, vier, viermos, vierdes, vierem (futuro do subjuntivo);c) viesse, viesses, viesse, viéssemos, viésseis, viessem (imperfeito do subjuntivo). 10) Observe-se que o gerúndio e o particípio são iguais (vindo).11) Por esse verbo se conjugam outros: advir, convir, desavir-se, intervir, provir, reconvir, sobrevir.12) Cuidado com a conjugação dele e de seus compostos no pretérito perfeito e tempos derivados: a) "Terceiros intervieram no processo" (e não interviram);b) "O réu não apenas contestou, mas também reconveio" (e não reconviu);c) "Quando sobrevier sentença.... (e não .Quando sobrevir..."). 13) Grafias equivocadas, como interviu em lugar de interveio, lembra Luiz Antônio Sacconi que são barbarismos morfológicos.314) A leitora, no caso da consulta, indaga qual a forma correta: a) "Se algum direito vir a ser deferido ao Autor...";b) "Se algum direito vier a ser deferido ao Autor...". 15) Sem maiores dificuldades, duas afirmativas podem ser feitas com facilidade: I) - Não há dúvida de que o verbo é exatamente o que está sob análise (vir e não ver), bastando pensar com o exemplo no presente do indicativo: "Se algum direito vem a ser deferido ao Autor...";II) - A conjunção se evidencia que o tempo a ser usado no caso é o futuro do subjuntivo. 16) Não há dúvida, assim, acerca de qual seja a forma correta: "Se algum direito vier a ser deferido ao Autor..."___________1 Cf. REIS, Otelo. Breviário da Conjugação dos Verbos da Língua Portuguesa. 34. ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1971. p. 123. 2 Cf. NOGUEIRA, Júlio. O Exame de Português. 4. ed. Rio de Janeiro: Livraria Editora Freitas Bastos, 1930. p. 201. 3 Cf. SACCONI, Luiz Antônio. Nossa Gramática. 1. ed. São Paulo: Editora Moderna, 1979. p. 268.  
quarta-feira, 2 de março de 2005

Documentação

1) Atenta consulta aos dicionários atesta que o vocábulo documentação tem dois sentidos: a) ação ou efeito de documentar;b) conjunto de documentos. 2) Quando significa ação ou efeito de documentar, é difícil pensar na possibilidade de passar o vocábulo ao plural, até por inadequação quanto ao sentido: "A documentação dos atos processuais é de suma importância".3) Por outro lado, quando seu sentido é um conjunto de documentos, tem a palavra valor de um coletivo, e, como se dá com este, normalmente fica no singular: "A documentação do caso discutido foi dolosamente incinerada".4) Nesse último caso, porém, pode-se pensar na hipótese de haver mais de um conjunto de documentos, hipótese em que não se vê objeção a seu emprego no plural, a exemplo de as manadas, as constelações, os cardumes...: "As documentações dos casos similares foram todas dolosamente incineradas".5) Passando à análise específica do exemplo trazido pelo leitor, parece não haver sentido em pluralizar o vocábulo discutido na frase proposta, qualquer que seja o sentido: "Deverá a parte juntar todas as documentações necessárias". Em tal caso, ou a palavra tem o sentido de documento ou, no máximo, quer dizer um conjunto de documentos de um só caso. Se se quiser atribuir-lhe o sentido de documento, estará errado o emprego de documentação, porquanto esta não é sinônima daquele. Por outro lado, se se pensar em conjunto de documentos, será inadequado o uso do plural, certo como é que se terá apenas um único conjunto de documentos, referente a um único caso.
quarta-feira, 23 de fevereiro de 2005

Adjetivação desnecessária

1) O tratamento meritíssimo, de acordo com o ensino dos dicionaristas, destina-se ao juiz, não ao juízo. A este, a praxe forense tem conferido outros tratamentos: digno juízo, douto juízo, etc. 2) Todavia, na apropriada lição de Eliasar Rosa, seria bom eliminar da linguagem jurídica uma adjetivação "cheia de mesuras e que soa falso sem nada acrescentar às peças forenses: digna autoridade; douta Curadoria ou Procuradoria; ilustrado órgão do Ministério Público; egrégia Câmara; colendo Grupo; venerando acórdão; respeitável decisão ou despacho; excelso Pretório ou Pretório excelso".3) Segundo tal autor, "tudo isso são salamaleques, hoje vazios de significação verdadeira. Autênticos preciosismos são essas postiças reverências, sem as quais em nada fica sacrificada a cortesia do advogado, nem a majestade da Justiça e a dos que a servem com elevação e dignidade".4) E, finalizando sua admoestação, aduz ele que a linguagem forense deve ser "sóbria e parcimoniosa, clara, nobre, correta e persuasiva, que bem dispensa o 'data venia', o 'datissima venia' (!), o 'concessa venia', o 'concessa maxima venia', o 'permissa venia' ou 'venia permissa' etc...15) Nessa mesma esteira, sempre é bom não esquecer que se pode discordar com reverência e polidez, e, por outro lado, a ofensa e o desrespeito podem muito bem embutir-se em cumprimentos afetados, rapapés, adulações e lisonjas.6) Por outro lado, atento ao fato de que muitos conceitos, por seu conteúdo, repelem um termo qualificador, já que este não os modifica, assevera Edmundo Dantès Nascimento que os adjetivos, em tais casos, são inúteis, porquanto os conceitos têm sua própria conotação, que lhes é conferida pela doutrina e pela lei; e cita ele exemplos dessa inutilidade: cristalina e indefectível Justiça; apresentar contestação válida.27) No que toca especificamente ao linguajar das determinações dos magistrados, acrescenta Geraldo Amaral Arruda que "não há conveniência em que o juiz, ao manifestar oficialmente o seu convencimento, peça licença às partes, usando a expressão 'data venia' ou outra equivalente, ou, pior, ainda, a aberrante expressão 'datissima venia'".38) Registre-se, em outro aspecto, que, quanto ao vocábulo egrégio, Antonio Henriques o vê como composto do prefixo e (ex) denotador de afastamento e grex-gregis (rebanho), significando, assim, aquele ou aquilo "que sai do rebanho, do comum e se distingue da multidão".9) E, ressaltando que seu uso normal é antes do substantivo para realçá-lo, complementa tal autor que ele "ocorre em expressões próprias do Direito e, em geral, com maiúsculas e sentido superlativo: Egrégio Tribunal, Egrégia Corte, Egrégio Juiz, Egrégia Câmara e outras".410) Atente-se, por fim, a que, quanto ao vocábulo egrégio, o art. 3º, caput, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo assim estatui: "Têm o Tribunal e todos os seus órgãos o tratamento de Egrégio...".__________ 1Cf. ROSA, Eliasar. Os Erros Mais Comuns nas Petições. 9. ed. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos S/A, 1993. p. 98-99. 2 Cf. NASCIMENTO, Edmundo Dantès. Linguagem Forense. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1982. p. 229. 3 Cf. ARRUDA, Geraldo Amaral. A Linguagem do Juiz. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 11. 4 Cf. HENRIQUES, Antonio. Prática da Linguagem Jurídica. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1999. p. 53.
quarta-feira, 16 de fevereiro de 2005

Penalizar

1) Trata-se de verbo que usualmente tem o sentido de causar pena, afligir. Exs.: a) "Penalizava-o o ar de tristeza das crianças pobres"; b) "Penalizava-me assistir ao drama daqueles presos sem julgamento". 2) Nos meios jurídicos e forenses, também tem sido empregado com freqüência na acepção de punir, impor penalidade. Exs.: a) "O Ibama penalizou a madeireira"; b) "O juiz penalizou o réu com dois meses de detenção". 3) Nessa última significação, todavia, Domingos Paschoal Cegalla o considera um "neologismo dispensável", preconizando sua substituição por punir ou prejudicar, conforme o caso.14) Apesar disso, Celso Pedro Luft apresenta o referido verbo exatamente no sentido de impor penalidade a, de sujeitar a penalidade, de castigar, de punir, como no exemplo: "Penalizar os infratores da lei".25) Em verdade tais problemas decorrem de que este verbo é derivado de um substantivo polissêmico: pena. Este vocábulo pode ter os seguintes significados: a) castigo - sentido em que forma o verbo apenar (condenar a pena, aplicar a pena). Ex.: "O juiz apenou o réu"; b) dó, piedade - sentido em que forma o verbo penalizar (causar pena). Ex.: A situação das crianças penalizou o advogado"; c) pluma - sentido em que forma os verbos empenar (criar penas ou enfeitar com penas) e depenar ou despenar (tirar as penas ou, na gíria, extorquir dinheiro astuciosamente). Exs.: I. "O frango, enfim, está empenando"; II. "Antes de ser trinchado, o peru deve ser despenado"; III. "Depenaram o coitado no cassino"; d) e ainda pode ter o significado de sacrifício, como no maravilhoso poema de Fernando Pessoa: "Tudo vale a pena / Se a alma não é pequena...". 6) Ante a divergência entre os gramáticos - Cegalla o considera um neologismo dispensável e Luft lhe defende integralmente o emprego - deve-se aceitar indistintamente o uso de penalizar ou de apenar no sentido de aplicar pena ou de impor pena. Vale, nesse caso, o vetusto brocardo de que, na dúvida, deve-se conferir liberdade ao usuário ("in dubio, pro libertate"). ________1 Cf. CEGALLA, Domingos Paschoal. Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p. 314.2 CF. LUFT, Celso Pedro. Dicionário Prático de Regência Verbal. 8. ed. São Paulo: Ática, 1999. p. 397.
quarta-feira, 2 de fevereiro de 2005

Trema

1) Para sua utilização - que é obrigatória quando implementadas as exigências - são necessários, cumulativamente, os seguintes requisitos: a) que o u seja precedido de g ou de q;b) que o grupo gu ou qu seja seguido de e ou de i;c) que o u seja pronunciado;d ) que o u seja átono (fraco).1 2) Por isso, grafam-se com trema agüentar, argüição, cinqüenta, freqüência, tranqüilo; não, porém, aquilo, contíguo, aquarela, arguo, arguas.3) E mais: se todos os três primeiros requisitos são preenchidos, mas o u é tônico, e não átono, em vez de trema, usa-se o acento agudo: ele argúi, averigúe, obliqúe.4) Se o trema ocorre na última sílaba, mas a palavra é paroxítona, por determinação da 12ª regra de Acentuação Gráfica do Formulário Ortográfico de 1943, não se usa o acento gráfico, mas apenas o trema: apropinqüe, delinqüem. Confira-se: "Não se põe acento agudo na sílaba tônica das formas verbais terminadas em qüe, qüem: apropinqüe, delinqüem".5) Em inquérito, inquirir, perquirir, o u não é pronunciado, motivo pelo qual não se há de falar no uso do trema.6) O Vocabulário Ortográfico registra qüestão a par de questão, de modo que, em tal vocábulo, o trema é optativo.2 7) Também dupla é a possibilidade de grafia e pronúncia para os cognatos de questão: questionamento ou qüestionamento, questionar ou qüestionar, questionário ou qüestionário, questiúncula ou qüestiúncula...8) Em palavras como liquidação, liquidar, líquido, liquidificador, sanguinário, sanguíneo, o u é ou não pronunciado, conforme a região do Brasil, do que decorre ser facultativo o uso do trema em tais palavras.9) Carlos Góis e Herbert Palhano lembram, com propriedade, que, dos verbos terminados em guir, apenas argüir e redargüir têm o u pronunciado.3 Desse modo, vê-se que distinguir não tem o u pronunciado, nem, muito menos, trema.10) Como se verifica, a questão da existência ou não do trema, além de outros aspectos, depende da pronúncia que se confere ao vocábulo. No caso da palavra submetida a análise pelo leitor, o já citado Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa apenas registra qüiproquó (p. 629), e ele é a palavra oficial acerca da grafia e da pronúncia que se deve conferir aos vocábulos em nosso idioma. Assim, tal é a única pronúncia e correta grafia do termo. Errou, por isso, duplamente nosso periódico: não usou o trema e grafou có ao final do vocábulo, quando o correto é quó.11) Uma observação final: na mensagem do leitor, observa ele que consultou o Dicionário Aurélio para saber a forma correta. É certo que a posição do dicionarista, no caso, coincidiu com a do Vocabulário Ortográfico, razão pela qual não resultou confusão alguma. A palavra oficial para tais fins, todavia, é do referido Vocabulário, e não dos dicionários. Há vezes em que estes acabam defendendo posições que não são adotadas por aquele: aportuguesam palavras e adotam novas grafias e pronúncias. Veja-se, só para exemplo, que o Dicionário Aurélio registra a grafia fôrma, enquanto o Vocabulário Ortográfico, em estrita obediência aos ditames da Lei 5.765, de 18.12.71, registra a grafia forma, quer para o timbre fechado (ô), quer para o timbre aberto (ó). E seguir o Dicionário Aurélio, pela adoção da grafia fôrma, em tal caso, seria, indiscutivelmente, errar na grafia._________1 Cf. OLIVEIRA, Cândido de. Revisão Gramatical. 10. ed. São Paulo: Editora Luzir, 1961. p. 98-99.2 Cf. Academia Brasileira de Letras. Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa. 2. ed., reimpressão de 1998. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1999. p. 626.3 Cf. GÓIS, Carlos; PALHANO, Herbert. Gramática da Língua Portuguesa. 5. ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1963. p. 113.
quarta-feira, 19 de janeiro de 2005

Crase antes de substantivos comuns

1) É a fusão de duas vogais idênticas.2) Seu aspecto mais importante é o caso de fusão da preposição a com os artigos femininos e pronomes demonstrativos a ou as (resultando à e às). E o acento grave tem hoje por função única em Português representar a existência da crase.3) Duas regras básicas são de grande utilidade.4) Por primeiro, quando se trata de saber se ela existe antes de um substantivo comum feminino, o melhor é substituir mentalmente, na frase, tal substantivo feminino por um correspondente masculino; se, com essa substituição, aparece ao ou aos no masculino, há crase no feminino.5) Assim, diz-se "Vou à cidade", porque, no masculino, se fala "Vou ao campo".6) De semelhante modo, "Ficaram junto à porta", porque "Ficaram junto ao portão".7) Diz-se, todavia, "Encontrei a menina", porque se fala "Encontrei o menino"; e, também, "A paz une as nações", porque "A paz une os povos".8) Quanto à expressão submetida a esta análise ("... à presença de V. Exa....), não há como saber se há ou não crase no caso concreto, porque esta depende de haver uma palavra anterior que exija a preposição a. Por isso, vamos formular dois exemplos com a referida expressão já precedida de outra palavra, ora com crase, ora sem crase, bastando conferir o procedimento do a questionado quando se procede à substituição da palavra feminina que se lhe segue por um substantivo masculino: a) "Venho à presença de V. Exa...", porque "Venho ao convívio...";b) "Aprecio a presença de V. Exa...", porque "Aprecio o convívio..." 9) Uma observação final: crase não é o nome do acento, e sim o fenômeno lingüístico de encontro de duas vogais idênticas. O nome do acento empregado em tal caso é grave, o qual, como já se observou, apenas existe hoje em Português para indicar existência de crase. Tecnicamente, portanto, deve-se dizer que se usa o acento grave para indicar a existência da crase.
quarta-feira, 22 de dezembro de 2004

Residir

1) No que tange à regência verbal, querem alguns que se construa residir apenas com complemento indicativo de lugar precedido pela preposição em: "O réu reside na Rua do Ouvidor".2) Na lição de Eliasar Rosa, "os verbos morar, residir, estabelecer, situar, isto é, os verbos de quietação, exigem a preposição em, e não a preposição a".13) Para Laudelino Freire, não é correto empregar o verbo residir regido pela preposição a, mas deve esta ser substituída pela preposição em, de modo que, para ele, não se deve dizer "Reside à Rua de São José", e sim " Resido na Rua de São José".24) Luiz Antônio Sacconi, que também condena seu emprego com a preposição a, defende seja construído com a preposição em.35) Evanildo Bechara também só lhe admite a construção com a preposição em,4 e Regina Toledo e Antonio Henriques lecionam que, por se tratar de verbo estático, exige regência com a preposição em.56) Nessa esteira, Cândido Jucá Filho complementa que se deve dizer "Resido na Rua Tal, número 27", complementando: "Não diga 'residir a', senão quando a preposição signifique 'para os lados de', na proximidade de'".67) E Artur de Almeida Torres assim sintetiza: "O verbo residir, do mesmo modo que o morar, constrói-se corretamente com a preposição em ou com o advérbio onde": a) "A arca do testamento residia na casa do santuário" (Antônio Vieira);b) "Deixa-me voltar o rosto para os lugares sagrados onde resides" (Mário Barreto).7 8) Após defender o emprego da preposição em com o verbo morar, exemplificando que ninguém diz 'Eu moro ao Bairro São João', mas 'Eu moro no Bairro São João', Édison de Oliveira preconiza que "a mesma orientação deve ser aplicada a residir...".89) De acordo com o ensinamento de Domingos Paschoal Cegalla, "à semelhança de morar, constrói-se com a preposição em e não a". Exs.: a) "O alfaiate residia na Rua Anchieta";b) "Meus avós residiram na Praça Tiradentes".9 10) Reitera tal autor o mesmo ensinamento em outra passagem: tal verbo usa-se com a preposição em e não a. Exs.: a) "Ele reside na (e não à) Rua Itu";b) "A rua em que resido é tranqüila";c) "Residíamos na Avenida Tiradentes"; d) "Meus tios residiam na Praça da Paz";e) "No Rio, o estudante residiu no Largo do Machado".10 11) Para José de Nicola e Ernani Terra, esse verbo "exige a preposição em".1112) Luís A. P. Vitória considera um "contra-censo" empregá-lo em expressões como "Residir à Rua Tal", já que é um "verbo de quietação e exige a regência em".1213) Já segundo lição de Silveira Bueno, contrariamente ao que ensinam os gramáticos citados, a construção de Resido à rua Tal não é galicismo; "é de bom cunho português", trazendo ele o abono de exemplos de Machado de Assis e de Padre Vieira.1314) Em preciosas observações, que merecem ser seguidas como o resumo da questão para o emprego de tal verbo, assim anota Celso Pedro Luft: a) primariamente, a construção em residir em;b) mas a sintaxe residir a, sobretudo diante do substantivo rua, "é de boa tradição escrita";c) na linguagem culta formal, o que normalmente se emprega é residir em.14 15) Nos textos legais, tal verbo aparece, invariavelmente, construído com a preposição em. Exs.: a) "...o juiz titular residirá na respectiva comarca..." (CF/88, art. 93, VII);b) "A obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente" (LICC, art. 9º, § 2º);c) "Se alguns do contraentes houver residido a maior parte do último ano em outro Estado..." (CC/1916, art. 180, parágrafo único);d) "Se os nubentes residirem em diversas circunscrições do Registro Civil, em uma e em outra se publicarão os editais" (CC/1916, art. 181, § 2º);e) "O filho ilegítimo, reconhecido por um dos cônjuges, não poderá residir no lar conjugal sem consentimento do outro" (CC/1916, art. 359);f) "... devendo o requerente indicar as comarcas em que haja residido durante aquele tempo" (CPP, art. 743). ___________1 Cf. ROSA, Eliasar. Os Erros Mais Comuns nas Petições. 9. ed. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos S/A, 1993. p. 95. 2 Cf. FREIRE, Laudelino. Sintaxe da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Empresa Editora ABC Ltda., 1937. p. 110. 3 Cf. SACCONI, Luiz Antônio. Nossa Gramática. 1. ed. São Paulo: Editora Moderna, 1979. p. 225. 4 Cf. BECHARA, Evanildo. Moderna Gramática Portuguesa. 19. ed., segunda reimpressão. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1974. p. 320. 5 Cf. DAMIÃO, Regina Toledo; HENRIQUE, Antonio. Curso de Português Jurídico. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1994. p. 164. 6 Cf. JUCÁ FILHO, Cândido. Dicionário Escolar das Dificuldades da Língua Portuguesa. 3. ed. Rio de Janeiro: FENAME - Fundação Nacional de Material Escolar, 1963. p. 552. 7 Cf. TORRES, Artur de Almeida. Regência Verbal. 7. ed. Rio de Janeiro - São Paulo: Editora Fundo de Cultura S/A., 1967. p. 253. 8 Cf. OLIVEIRA, Édison de. Todo o Mundo Tem Dúvida, Inclusive Você. Porto Alegre: Gráfica e Editora do Professor Gaúcho Ltda., edição sem data. p. 129. 9 Cf. CEGALLA, Domingos Paschoal. Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p. 356. 10 Ibid., p. 267-268. 11 Cf. NICOLA, José de; TERRA, Ernani. 1.001 Dúvidas de Português. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 151. 12 Cf. VITÓRIA, Luís A. P. Dicionário de Dificuldades, Erros e Definições de Português. 4. ed. Rio de Janeiro: Tridente, 1969. p. 166 e 210. 13 Cf. BUENO, Silveira. Português pelo Rádio. São Paulo: Saraiva & Cia., 1938. p. 213. 14 Cf. LUFT, Celso Pedro. Dicionário Prático de Regência Verbal. 8. ed. São Paulo: Ática, 1999. p. 455.
quarta-feira, 15 de dezembro de 2004

Morar

1) Quanto à regência verbal, segundo Napoleão Mendes de Almeida, esse verbo pede complemento indicativo de lugar regido pela preposição em: "Ele mora na rua do Ouvidor".12) Também na lição de Eliasar Rosa, "os verbos morar, residir, estabelecer, situar, isto é, os verbos de quietação, exigem a preposição em, e não a preposição a".23) Luiz Antônio Sacconi, que também condena seu emprego com a preposição a, defende seja construído com a preposição em.34) Também Aires da Mata Machado Filho assevera ser o correto morar em e anota tratar-se a outra construção de "ultracorreção artificialmente introduzida na nossa língua escrita".45) Desse entendimento também não destoa Artur de Almeida Torres, ao lecionar de modo expresso: "Constrói-se, corretamente, com a preposição em ou com o advérbio onde, devendo evitar-se o emprego da preposição a, por se tratar de verbo de quietação": a) "Tempos depois, estando já formado e morando na rua de Mata-Cavalos..." (Machado de Assis);b) "Levou-me à quinta de Calvados, onde morava a viúva do magistrado e as duas filhas" (Camilo Castelo Branco).5 6) Defendendo o emprego da preposição em nesses casos, Édison de Oliveira observa que "facilmente compreenderemos essa norma, se substituirmos 'rua' por 'bairro'. Ninguém diz, por exemplo, 'Eu moro ao Bairro São João', e sim 'Eu moro no Bairro São João'.67) Também Vitório Bergo doutrina que tal verbo "rege a preposição em e não a, por exprimir idéia de quietação, em vez de movimento".78) Ainda para Arnaldo Niskier, dever-se-á dizer "sempre na Rua Aracati, nunca à Rua Aracati".89) De igual modo, para José de Nicola e Ernani Terra, esse verbo "exige a preposição em".910) Para Laudelino Freire, não é correto empregar o verbo morar regido pela preposição a, mas deve esta ser substituída pela preposição em, de modo que não se deve dizer "Moro à Rua do Ouvidor", e sim "Moro na Rua do Ouvidor".1011) Luís A. P. Vitória considera um "contra-senso" empregá-lo em expressões como "Morar à Rua Tal", já que, sendo um "verbo de quietação, exige a regência em".1112) Também para Domingos Paschoal Cegalla, tal verbo "usa-se com a preposição em e não a. Portanto: 'Ele mora na (e não à) Rua Itu'. 'A rua em que moro é tranqüila'. 'Morávamos na Avenida Tiradentes'. 'Meus tios moravam na Praça da Paz'. 'No Rio, o estudante morou no Largo do Machado'".13) E acrescenta tal autor que "a preposição a tem cabimento em construções do tipo: 'Moro a poucos metros da estrada'. 'Morávamos a pequena distância da praia'".1214) Num outro posicionamento, contudo, Silveira Bueno afiança ser morar a de bom cunho português.1315) Sob a justificativa de que "a proximidade expressa por a pode confundir-se com o lugar exato e definido", justifica João Ribeiro a construção de tal verbo com a preposição a. Ex.: "Mora à Rua Áurea".1416) Cândido Jucá Filho também defende o uso da preposição a "para indicar um sítio vago", com o sentido de "para os lados de".1517) E o Padre José F. Stringari - após referir que o substantivo morador admite ser construído com as preposições em e a - leciona, com mais liberdade, que "regime idêntico apresenta o verbo morar". São em número inumerável os exemplos de morar em..., e é esta a genuína construção".18) Continua, por outro lado, tal gramático lecionando ser "trivialíssimo hoje ouvirem-se e verem-se frases como as seguintes, que ainda se capitulam de incorretas: 'Ele mora à rua tal'; 'Ele mora à casa número 15'".19) E ultima com exemplo significativo, de mais de cento e cinqüenta anos: "Esse artista, que mora à Emília Escola, / Exprimir-te-á no bronze, ao vivo, as unhas, / E dos cabelos a moleza, o mimo" (Antônio Luís de Seabra).1620) O insuspeito Francisco Fernandes também admite, indiferentemente, ambas as construções, quer regido o complemento por a, quer por em: a) "Morando na Rua de Mata-Cavalos, perto da do Conde..." (Machado de Assis);b) "Ele mora à Rua das Palmeiras" (R. Nóbrega). 21) E tal autor ainda levanta a possibilidade de emprego desse verbo construído com dentro de, entre e sobre: a) "Morava dentro de uma cuba" (Mário Barreto);b) "Os animais que entre eles moram..." (Camões);c) "Morava Elias mui descansado sobre as ribeiras do rio Carith" (Padre Antônio Vieira).17 22) Essa extensa possibilidade de sintaxes também é admitida por Celso Pedro Luft.1823) Para Cândido de Oliveira - muito embora com preferência pela sintaxe com em - "ambas as construções são consideradas corretas: 'Morar à Rua Tal' ou 'Morar na Rua Tal'".1924) Sousa e Silva, que rotula de clássica a regência com a preposição em e moderna a regência com a preposição a, assevera, com firmeza, que a regência clássica é "absolutamente irrepreensível. Não condenamos, entretanto, a regência moderna, censurada por alguns, mas empregada por bons autores".2025) Ante o peso e os argumentos de ambas as correntes de gramáticos, há de se aplicar o princípio de que, na dúvida, deverão ser permitidas, indiferentemente, ambas as possibilidades de construção, quer com a preposição em, quer com a preposição a (in dubio, pro libertate).26) É importante observar que não há diferença semântica para emprego, em tais casos, entre "Morar na Rua da Consolação, número 32" e "Morar à Rua da Consolação, número 32". Por primeiro, se verdade é que se diz que o mendigo mora na rua, tal expressão, neste caso, é genérica, não significa normalmente uma rua específica, nem tem número específico, de modo que foge ao conteúdo semântico que esse verbo tem quando se lhe confere alguma discriminação. Ao depois, não é verdade que, quando alguém diz moro à Rua Tal, esteja querendo dizer que sua casa fica à margem da rua; em verdade, a rua, nessa acepção, não é apenas o leito carroçável e a calçada, mas tem sentido mais amplo e abarca as casas que lhe são adjacentes.______1 Cf. ALMEIDA, Napoleão Mendes de. Dicionário de Questões Vernáculas. São Paulo: Editora Caminho Suave Ltda., 1981. p. 195. 2 Cf. ROSA, Eliasar. Os Erros Mais Comuns nas Petições. 9. ed. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos S/A, 1993. p. 95. 3 Cf. SACCONI, Luiz Antônio. Nossa Gramática. 1. ed. São Paulo: Editora Moderna, 1979. p. 222. 4 Cf. MACHADO FILHO, Aires da Mata. "Análise, Concordância e Regência". In: Grande Coleção da Língua Portuguesa. 1. ed. São Paulo: co-edição Gráfica Urupês S/A e EDINAL - Editora e Distribuidora Nacional de Livros Ltda., 1969. vol. 2, p. 729-730. 5 Cf. TORRES, Artur de Almeida. Regência Verbal. 7. ed. Rio de Janeiro - São Paulo: Editora Fundo de Cultura S/A, 1967. p. 200-201. 6 Cf. OLIVEIRA, Édison de. Todo o Mundo Tem Dúvida, Inclusive Você. Porto Alegre: Gráfica e Editora do Professor Gaúcho Ltda., edição sem data. p. 129. 7 Cf. BERGO, Vitório. Erros e Dúvidas de Linguagem. Rio de Janeiro: Livraria Editora Freitas Bastos, 1944. vol. II, p. 164. 8 Cf. NISKIER, Arnaldo. Questões Práticas da Língua Portuguesa: 700 Respostas. Rio de Janeiro: Consultor, Assessoria de Planejamento Ltda., 1992. p. 105. 9 Cf. NICOLA, José de; TERRA, Ernani. 1.001 Dúvidas de Português. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 151. 10 Cf. FREIRE, Laudelino. Sintaxe da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Empresa Editora ABC Ltda., 1937. p. 110. 11 Cf. VITÓRIA, Luís A. P. Dicionário de Dificuldades, Erros e Definições de Português. 4. ed. Rio de Janeiro: Tridente, 1969. p. 166. 12 Cf. CEGALLA, Domingos Paschoal. Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1999. p. 267-268. 13 Apud ALMEIDA, Napoleão Mendes de. Dicionário de Questões Vernáculas. São Paulo: Editora Caminho Suave Ltda., 1981. p. 195. 14 Cf. RIBEIRO, João. Gramática Portuguesa. 20. ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1923. p. 207. 15 Cf. JUCÁ FILHO, Cândido. Dicionário Escolar das Dificuldades da Língua Portuguesa. 3. ed. Rio de Janeiro: FENAME - Fundação Nacional de Material Escolar, 1963. p. 432. 16 Cf. STRINGARI, Padre José F. Canhenho de Português. São Paulo: Editorial Dom Bosco, 1961. p. 68. 17 Cf. FERNANDES, Francisco. Dicionário de Verbos e Regimes. 4. ed., 16. impressão.Porto Alegre: Globo, 1971. p. 426. 18 Cf. LUFT, Celso Pedro. Dicionário Prático de Regência Verbal. 8. ed. São Paulo: Ática, 1999. p. 371. 19 Cf. OLIVEIRA, Cândido de. Para Entender Português. São Paulo: Gráfica Biblos Ltda. - Editora, edição sem data. p. 94. 20 Cf. SILVA, A. M. de Sousa e. Dificuldades Sintáticas e Flexionais. Rio de Janeiro: Organização Simões Editora, 1958. p. 37.
quarta-feira, 8 de dezembro de 2004

De há muito

1) O verbo haver, na acepção de tempo passado, às vezes entra na formação de frases adverbiais. Ex.: "O advogado entrou há pouco na sala de audiências".2) Em expressões adverbiais dessa natureza, haver não é visto como verbo, mas, sobretudo, como preposição, razão por que se lhe podem antepor de, desde e até, e isso, segundo o magistério de Napoleão Mendes de Almeida, por analogia com outras expressões como de então, desde ontem, até hoje.13) São, portanto, corretas, frases como as seguintes: a) "Guarda integral viço, embora seja uma lei de há três décadas";b) "Desde há cinco anos, a ação já podia ter sido proposta";c) "Até há três anos, a mencionada lei ainda não vigorava". 4) Também para Domingos Paschoal Cegalla, de há muito e de há pouco são "expressões da linguagem culta, referentes ao tempo passado", de integral correção, acrescentando tal autor que, "em vez de muito e pouco, podem-se usar outras expressões de tempo", como de há cem anos, de há três décadas, de há mil anos. Ex.: "Ouve pela última vez o rir que responde ao teu riso de há dez anos" (Alexandre Herculano).25) Vasco Botelho de Amaral, todavia, é do parecer de "que o de superabunda em giros fraseológicos como este", motivo por que julga "mais correta a supressão daquele de, redigindo antes há muito".36) A posição divergente ao gramático por último citado não muda o entendimento de que são corretas ambas as expressões - "há muito" e "de há muito" - assim como de que não há diferença de sentido entre ambas._____ 1 Cf. ALMEIDA, Napoleão Mendes de. Dicionário de Questões Vernáculas. São Paulo: Editora Caminho Suave Ltda., 1981. p. 133. 2 Cf. CEGALLA, Domingos Paschoal. Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p. 105-106. 3 Cf. AMARAL, Vasco Botelho de. Estudos Vernáculos. Porto: Editora Educação Nacional, 1939. p. 20.
quarta-feira, 1 de dezembro de 2004

Concordância nominal

1) É a harmonização em gênero (masculino ou feminino) e número (singular ou plural) entre o adjetivo ou palavra de valor adjetivo (artigo, numeral, pronome adjetivo) e o substantivo a que se refere.2) As primeiras (denominadas palavras regidas ou subordinadas) acomodam-se à flexão da última (denominada palavra regente ou subordinante).1 Exs.: a) "Apenas um alto morro ruiu";b) "Apenas uma alta montanha ruiu";c) "Os dois altos morros ruíram";d) "As duas altas montanhas ruíram". 3) Para os problemas mais corriqueiros, a primeira regra de capital importância sobre o assunto é que, quando um mesmo adjetivo (a tanto equivalendo as demais palavras de valor adjetivo) qualifica dois ou mais substantivos e vem depois deles, pode o adjetivo ir para o plural ou concordar com o substantivo mais próximo. Exs.: a) "O aluno e a aluna estudiosos saíram" (correto);b) "O aluno e a aluna estudiosa saíram" (correto);c) "A aluna e o aluno estudioso saíram" (correto). 4) Se a concordância se faz no plural, não se olvide a lição de Júlio Nogueira de que, "havendo mais de um nome de gêneros diversos, predomina, para o efeito da concordância, o masculino, como já acontecia em latim: 'pai e mãe carinhosos', 'amor e amizade verdadeiros'.25) Ainda para os problemas mais freqüentes, uma segunda regra que se pode enunciar é a de que, quando um mesmo adjetivo qualifica dois ou mais substantivos e vem antes deles, concorda, por regra, com o mais próximo. Exs.: a) "Ele provocou intensa luta e desconforto" (correto);b) "Ele provocou intenso desconforto e luta" (correto);c) "Ele provocou intensos luta e desconforto" (errado);d) "Ele provocou intensos desconforto e luta" (errado). 6) É preciso cuidado, já que muitas vezes, sobretudo porque distam um do outro o vocábulo modificado e o adjetivo ou outra palavra modificadora, esquecem-se equivocadamente alguns de proceder à regular concordância, erro esse que se dá até mesmo com textos de lei.7) Assim: "O direito à guarda de veículos nas garagens ou locais a isso destinados nas edificações ou conjuntos de edificações será tratado como objeto de propriedade exclusiva, com ressalva das restrições que ao mesmo sejam impostas por instrumentos contratuais adequados, e será vinculada à unidade habitacional a que corresponder..." (art. 2°, § 1°, da Lei 4.591, de 16/12/64, que dispôs sobre o condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias). Naquilo que tem interesse para o caso concreto, corrija-se o texto para: "O direito... será tratado... e será vinculado".8) Veja-se, em mesma esteira, um outro equívoco: "Nos contratos do sistema de consórcio de produtos duráveis, a compensação ou a restituição das parcelas quitadas, na forma deste artigo, terá descontada, além da vantagem econômica auferida com a fruição, os prejuízos que o desistente ou inadimplente causar ao grupo" (art. 53, § 2°, da Lei 8.078, de 11/9/90, que dispôs sobre a proteção ao consumidor). Faça-se a correção do seguinte modo: "... a compensação ou a restituição das parcelas quitadas... terá descontados... os prejuízos", porque, em última análise, terá os prejuízos descontados.9) Também segue o mesmo molde de equívoco o seguinte dispositivo: "O Banco Nacional de Habitação poderá operar em: I - prestação de garantia em financiamento obtido, no país ou no exterior, pelas entidades integrantes do Sistema Financeiro da Habitação, destinados a execução de projetos de habitação de interesse social" (art. 24, I, da Lei 4.380, de 21/8/64, que regulamentou os contratos imobiliários). Assim deve ser sua correção: "... prestação de garantia em financiamento... destinado a execução...".10) Segue o mesmo modelo de erro um outro dispositivo: "Ficarão sujeitos à prévia aprovação do Banco Nacional da Habitação: I - as alterações dos estatutos sociais das sociedades de crédito imobiliário; II - a abertura de agências ou escritórios das referidas sociedades; III - a cessação de operações da matriz ou das dependências da referidas sociedades" (art. 37 da Lei 4.380, de 21/8/64, que regulamentou os contratos imobiliários). Se se antepuserem os núcleos do sujeito, será fácil a correção: As alterações, a abertura e a cessação ficarão sujeitas...11) Mais um exemplo a ser evitado: "As modificações, os acréscimos e os melhoramentos de edifício em construção, bem como os acabamentos especiais e partes complementares das respectivas unidades autônomas, inclusive decoração permanente, serão consideradas partes integrantes da obra, para efeito de tributação..." (art. 29 da Lei 4.864, de 29/11/65, que criou medidas de estímulo à construção civil). Sendo modificações, acréscimos, melhoramentos, acabamentos e partes os substantivos modificados, e havendo entre eles alguns nomes do gênero masculino, determina a regra geral da concordância nominal que o adjetivo vá para o masculino plural; por conseguinte, serão considerados, e não serão consideradas.12) Veja-se também: "Se o agente usa de violência, incorre também nas penas a esta cominada" (art. 9º, § 1º, da Lei 5.471, de 1º/12/71, que dispõe sobre proteção de bens imóveis financiados). A ordem direta dirime dúvidas e determina o modo de concordância entre o adjetivo e substantivo (Se agente usa de violência, incorre nas penas cominadas a esta).13) E não é só: "As diferenças apuradas nas revisões dos encargos mensais serão atualizadas com base nos índices contratualmente definidos para reajuste do saldo devedor e compensados nos encargos mensais subseqüentes" (art. 4º, § 2º, da Lei 8.692, de 28/7/93, que definiu os planos de reajustamento das prestações de financiamento de imóveis). Uma simples busca pelo substantivo modificado por compensados definirá sua concordância: As diferenças apuradas... serão atualizadas... e compensadas..."14) Mais ainda: "É vedada a aplicação de reajustes aos encargos mensais inferiores aos índices de correção aplicadas à categoria profissional do mutuário" (art. 8º, § 3º, da mesma Lei 8.692, de 28/7/93). Também da junção entre o adjetivo modificador (aplicadas) e o substantivo modificado (índices) deflui a automática correção: índices de correção aplicados.15) Observe-se, ainda, este outro dispositivo: "Descumprir, dolosa ou culposamente, os deveres inerentes ao pátrio poder ou decorrente de tutela ou guarda..." (art. 249 da Lei 8.069, de 13/7/90, que dispôs sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente). Basta que, de igual modo, se contraponham o adjetivo modificador e o substantivo modificado, para que se tenha a automática correção: deveres... decorrentes.16) E mais: "... poderá e expropriando requerer o levantamento de oitenta por cento da indenização depositada, quitado os tributos e publicados os editais..." (art. 6º, § 1º, da Lei Complementar 76, de 6/7/93, que dispôs sobre desapropriação). Reflexão similar às anteriores evidenciará a correção: quitados os atributos.17) Mais um exemplo: "Quando o casamento se seguir a uma comunhão de vida entre nubentes, existentes antes de 28 de junho de 1977..." (art. 45 da Lei 6.515, de 26/12/77, que instituiu o divórcio). O sentido do dispositivo revela que o adjetivo sublinhado refere-se a comunhão, que é singular, e não a nubentes, que é plural; assim, existente, e não existentes.18) E outro: "O prazo dos contratos de parceria, desde que não convencionados pelas partes, será no mínimo de três anos..." (art. 96, I, da Lei 4.504, de 30/11/64, que dispôs sobre o Estatuto da Terra). Atenta leitura do dispositivo revela que o substantivo modificado é prazo, e não contratos; o adjetivo em flexão, assim, há de ser convencionado, e não convencionados.19) Mais outro: "Estas citações e intimações devem ser feitas pela imprensa, publicadas no jornal oficial do Estado e no 'Diário Oficial' para o Distrito Federal, e nos periódicos indicados pelo juiz, além de afixados nos lugares de estilo, e na bolsa da praça do pagamento" (art. 36, caput, segunda parte, do Decreto 2.044, de 31/12/1908, que definiu e regulamentou a letra de câmbio e a nota promissória). Sendo citações e intimações os substantivos modificados, o adjetivo há de ser, assim, afixadas, não afixados.20) Mais um: "Em qualquer caso de internação de toxicômanos em estabelecimentos públicos ou particular, a autoridade sanitária comunicará o fato à autoridade policial competente e bem assim ao representante do Ministério Público" (art. 29, § 8º, do Decreto-lei 891, de 25/11/38, que aprovou a lei de fiscalização de entorpecentes). Se estabelecimentos é substantivo, o adjetivo que o modifica há de ser particulares, e não particular. Além disso, não se poderia pretender, no caso, interpretar a sintaxe com a mesma estrutura de uma expressão como justiças federal e estadual, quer porque o sentido do texto aponta para mais de um estabelecimento público e mais de um estabelecimento particular, diferentemente da hipótese de apenas uma justiça federal e uma justiça estadual, quer porque, no caso da expressão considerada, não haveria sentido em deixar públicos no plural, e manter particular sem flexão de número, no singular.21) Adicione-se mais um exemplo: "Enquanto não se criarem os estabelecimentos referidos neste artigo, serão adaptados, na rede já existente, unidades para aquela finalidade" (art. 9º, § 1º, da Lei 6.368, de 21/10/76, que dispôs sobre medidas de prevenção e repressão ao tráfico ilícito e uso indevido de substâncias entorpecentes ou que determinem dependência física e psíquica). A simples justaposição mental entre o adjetivo modificador e o substantivo modificado determina automática correção:... serão adaptadas... unidades...22) E outro: "Os índios, enquanto não integrados, não estão obrigados a inscrição do nascimento. Este poderá ser feito em livro próprio do órgão federal de assistência aos índios" (art. 50, § 2°, da Lei 6.015, de 31/12/73, que dispôs sobre os registros públicos). Procure-se o substantivo modificado (inscrição, e não nascimento), e se terá o modo correto de dizer: Esta poderá ser feita.23) Acrescente-se outro: "Nas escrituras, lavradas em decorrência de autorização judicial, serão mencionadas, por certidão, em breve relatório, com todas as minúcias que permitam identificá-los, os respectivos alvarás" (art. 224 da mesma Lei de Registros Públicos). Tal equívoco, existente na publicação oficial, pode ser facilmente corrigido pela simples aproximação entre o adjetivo modificador (mencionadas) e o substantivo modificado (alvarás): mencionados, portanto.24) Observe-se mais este caso: "Às plantas serão anexadas o memorial e as cadernetas das operações de campo, autenticadas pelo agrimensor" (art. 278, § 2°, também da Lei de Registros Públicos). Ora, se memorial e cadernetas são os substantivos modificados, havendo entre eles um masculino, a soma só pode resultar um masculino plural; anexados, por conseguinte.25) Repete-se o problema no art. 13 do Decreto 61.867, de 7/12/67, que regulamenta os seguros obrigatórios: "São excluídas da obrigatoriedade prevista no artigo anterior os bens e mercadorias objetivo de viagem internacional". Da soma dos substantivos modificados (bens e mercadorias) só pode resultar o adjetivo excluídos.26) Mais um: "A exigência constante do art. 22 da Lei n. 4.947, de 6 de abril de 1966, não se aplica às operações de crédito rural proposta por produtores rurais e suas cooperativas..." (art. 78, caput, do Decreto-lei 167, de 14/2/67, que dispôs sobre os títulos de crédito rural). O adjetivo proposta modifica operações; corrija-se, então para propostas.27) E outro: "Nas ações possessórias, a participação do cônjuge do autor ou do réu somente é indispensável nos casos de composse ou de ato por ambos praticados" (art. 10, § 2°, do Código de Processo Civil). A simples reflexão de qual seja o substantivo modificado por praticados (que é ato) evidencia a necessidade de correção do texto oficial: praticado.28) E outro ainda: "No caso de serem instalados outros Tribunais Regionais Federais, os seus presidentes escolherão os cinco que integrarão o Conselho, observados a forma e o critério a serem por este estabelecido" (art. 3°, § 2°, da Lei 8.472, de 14/10/92, que dispôs sobre a composição e a competência do Conselho da Justiça Federal). Referindo-se o adjetivo tanto a forma como a critério, forçosa é sua concordância com a soma de ambos: estabelecidos.29) E não se esqueça um próximo: "Os juízes que integrem os Tribunais de Alçada somente concorrerão às vagas no Tribunal de Justiça correspondente à classe dos magistrados" (art. 100, § 4°, da Lei Complementar 35, de 14/3/79, que dispôs sobre a Lei Orgânica da Magistratura Nacional). Verificado o substantivo modificado (vagas) e o adjetivo modificador (correspondente), fácil é corrigir: correspondentes.30) Da própria leitura dos aspectos observados, duas conclusões podem ser extraídas: I) - é muito mais comum do que se pensa, até mesmo em textos jurídicos, o equívoco apontado pelo leitor; II) - o sensor do missivista foi adequadamente acionado, pois, com facilidade, vê-se que o correto, no caso por ele apontado, é "vedadas férias coletivas", e não "vedado férias coletivas". Para quem quiser pensar um pouco mais, veja que se diria "sendo vedadas férias coletivas", e não "sendo vedado férias coletivas". 31) De igual modo, deve-se dizer "consideradas as circuntâncias", e não "considerada as circunstâncias".____________1 Cf. GÓIS, Carlos. Sintaxe de Concordância. 8. ed. São Paulo: Livraria Francisco Alves, 1943. p. 25. 2 Cf. NOGUEIRA, Júlio. Programa de Português: 3ª série secundária. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1939. p. 201.
quarta-feira, 24 de novembro de 2004

Pronome relativo preposicionado

1) Aspecto interessante, quanto a esse tópico, diz respeito à regência verbal.2) Se funciona como complemento, o pronome relativo depende totalmente da regência do verbo ao qual se liga.3) Assim, se vai ou não haver preposição antes do pronome, ou qual vai ser essa preposição, tudo depende do verbo que está sendo completado pelo pronome. Vejam-se os exemplos: a) "Editou-se uma lei em que acreditamos, com que simpatizamos e por que lutamos" (acreditar em, simpatizar com e lutar por);b) "Fazer da aplicação da lei a arte de distribuir justiça é o ideal a que aspiramos, com que simpatizamos e em que nos comprazemos" (aspirar a, simpatizar com e comprazer-se em). 4) Assim é a lição de Sousa e Silva a esse respeito: "Nas orações adjetivas cujo pronome relativo não funcione como sujeito, se o verbo exigir alguma preposição, coloca-se esta antes do relativo". Exs.: a) "Atualmente, os meios de que dispomos...";b) "Fui traído pelos amigos em quem mais confiava";c) "...em relação àquele a quem devia respeito e admiração";d) "É um monumento de que todos os brasileiros se orgulham" (dispor de, confiar em, dever respeito e admiração a, orgulhar-se de). 5) Num segundo aspecto, lembra tal autor que, "se o relativo for o adjetivo (atualmente pronome adjetivo) cujo, a construção gramatical é idêntica". Exs.: a) "...eram R. S. e um pretinho de cujo nome não se lembra" (lembrar-se de).1 6) Desse modo, no que respeita à questão especificamente submetida a nossa análise, se o verbo incluir exige a preposição em, e se alguém foi incluído no programa, está certo o leitor: no qual foi incluído, e não o qual foi incluído.________1 Cf. SILVA, A. M. de Sousa e. Dificuldades Sintáticas e Flexionais. Rio de Janeiro: Organização Simões Editora, 1958. p. 230-233.