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Gramatigalhas

Esclarecendo dúvidas da Língua Portuguesa.

José Maria da Costa
quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

Subsume ou Subsome?

1) Um leitor diz ter encontrado as seguintes frases em votos de ministros de nossos tribunais superiores: a) "A conduta do paciente subsume-se ao preceito"; b) "O tema da prescrição subsume-se ao âmbito das normas". Mas lhe parece que a flexão nesses casos deve ser subsome-se, e não subsume-se. E indaga qual a forma correta. 2) Ora, subsumir é o verbo que indica o fato da subsunção e significa, em síntese, realizar "a operação de diagnose do direito, consistente em enquadrar o caso concreto no preceito legal abstrato a ele aplicável". Ex.: "No caso concreto, o fato noticiado não se subsumia à legislação benéfica atualmente em vigor". 3) E, ainda, segundo Geraldo Amaral Arruda, significa "pensar (um objeto individual) como compreendido em um conjunto (ou indivíduo em uma espécie, uma espécie em um gênero)". 4) Num primeiro aspecto, na apropriada lição de Luiz Antônio Sacconi, seu s intermédio tem real som de s (como em subsolo), e não de z (como em subzona). 5) Num segundo aspecto, quanto a sua conjugação, trata-se de assunto a cujo respeito não se encontram grandes subsídios. Mas Vera Cristina Rodrigues, em monografia de grande utilidade, junta-o ao verbo sumir e manda conjugá-lo pelo modelo sacudir, com a observação específica de que "a vogal -u- passa a -o- fechado /ô/ nas quatro formas em que há abertura de timbre"). 6) Ora, para começar, veja-se o verbo sacudir no presente do indicativo: sacudo, sacodes, sacode, sacudimos, sacudir, sacodem. Três das formas referidas pela mencionada autora estão aí registradas; a outra é a segunda pessoa do singular do imperativo afirmativo (sacode). 7) Passe-se ao verbo sumir, que ela junta com subsumir, em mesmo paradigma de conjugação: sumo, somes, some, sumimos, sumis, somem. 8) Então se chega ao verbo subsumir: subsumo, subsomes, subsome, subsumimos, subsumis, subsomem. 9) Com essas anotações teóricas, não é difícil solucionar a dúvida do leitor: a) "A conduta do paciente subsume-se ao preceito" (errado); b) "A conduta do paciente subsome-se ao preceito" (correto); c) "O tema da prescrição subsume-se ao âmbito das normas" (errado); d) "O tema da prescrição subsome-se ao âmbito das normas" (correto).
quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Optar - Foi optado - É correto?

1) Um leitor indaga se é correto o emprego do verbo optar na voz passiva, como no seguinte exemplo: "Considerando-se os riscos, foi optado por não se operar o paciente". 2) De início, observe-se que voz ativa e voz passiva são duas maneiras sintaticamente diversas de dizer a mesma realidade de fato, conforme o sujeito pratique ou receba a ação indicada pelo verbo. Exs.: a) "O magistrado proferiu a sentença" (voz ativa, porque o sujeito magistrado pratica a ação indicada pelo verbo proferir); b) "A sentença foi proferida pelo magistrado" (voz passiva, porque o sujeito sentença recebe a ação indicada pelo verbo proferir). 3) Uma análise de ambas as estruturas revela os seguintes aspectos, que são de suma importância para a análise que está sendo feita: a) o objeto direto da voz ativa torna-se o sujeito da voz passiva; b) o sujeito da voz passiva torna-se o agente da passiva. 4) Ora, se o objeto direto da voz ativa se torna o sujeito da voz passiva, a primeira e importante regra, nesse campo, é a de que permitem o emprego na voz passiva os verbos transitivos diretos. 5) É por isso que, por mais que se tente, não se consegue passar para a voz passiva o exemplo "O livro pertence ao Magistrado": a) é que o verbo pertencer é transitivo indireto, e b) a expressão "ao Magistrado" é um objeto indireto. 6) Tendo essas observações como premissas, segue-se para a resposta à indagação do leitor: a) no sentido da frase proposta, quem opta, opta por alguma coisa ou opta por alguém; b) ou seja, tal verbo é tradicionalmente transitivo indireto, e seu complemento (um objeto indireto) é precedido pela preposição por; c) assim o empregaram nossos melhores autores, como Camilo Castelo Branco ("Afirmavam que ela optara pelo mais rico") ou Euclides da Cunha ("Determinou que optasse por uma das pontas do dilema"); d) com essas premissas, conclui-se que o verbo optar não admite ser empregado na voz passiva; e) é correto dizer "... optou-se por não se operar o paciente"; f) também é correto dizer "optaram por não se operar o paciente"; g) mas não é correto dizer "foi optado por não se operar o paciente".
1) Uma leitora indaga qual das duas expressões está correta: os embargos de declaração ou o embargos de declaração? 2) Em português, há certos substantivos que se empregam só no plural: anais, arredores, esponsais, núpcias, pêsames, víveres. E a eles se juntam aqueles vocábulos - como embargo e embargos - que têm sentidos diferentes no singular e no plural. 3) Explicite-se: por um lado, embargo traz em si a ideia de impedimento, obstáculo, estorvo, embaraço, medida de oposição a algum ato, como aquele que se faz para que o construtor não continue na execução de determinada obra (CPC, art. 935). 4) Já em embargos se vê com nitidez a ideia de um recurso judicial para oposição em diversas circunstâncias (embargos de declaração, embargos à execução, embargos de terceiro, embargos infringentes...). 5) E, nessa acepção de recurso processual, é palavra do plural, que exige também no plural todos os vocábulos a ela referentes (os embargos, embargos intempestivos...). Se for sujeito, também pede o verbo no plural: a) "Cabem embargos infringentes..." (CPC, art. 530); b) "Os embargos serão opostos..." (CPC, art. 536); c) "... os embargos serão oferecidos..." (CPC, art. 747). 6) Com os embargos de declaração, a situação é exatamente a mesma: a) "Cabem embargos de declaração..." (art. 535); b) "Na reiteração de embargos protelatórios..." (CPC, art. 538, parágrafo único). 7) E, assim, respondendo diretamente ao leitor: a) no sentido trazido por ele (de recurso processual), a palavra embargos é empregada apenas no plural; b) nessas circunstâncias, ela exige que os demais vocábulos que a ela se referem (artigo, adjetivo...) também venham no plural (os embargos de declaração, embargos de declaração protelatórios); c) se tal vocábulo é o sujeito da oração, o verbo também concorda no plural (cabem embargos de declaração).
quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

Quem serve para coisa ou só para pessoa?

quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Registre-se ou Registra-se?

1) Um leitor narra que é comum ler em petições "registre-se", "frise-se" e "note-se". Mas lhe parece que, tais como escritas, essas formas misturam um aspecto de imperativo, o que ele não sabe se está certo. E indaga se, no sentido de que algum ponto apenas deva ser registrado, frisado ou notado, o melhor não seria "registra-se", "frisa-se" e "nota-se". 2) Faça-se o seguinte raciocínio: a) o exemplo "O imóvel foi registrado" está na voz passiva analítica; b) tem-se, no caso, voz passiva, porque o sujeito (imóvel) recebe a ação indicada pelo verbo (registrar); c) seria voz ativa, se o sujeito praticasse a ação indicada pelo verbo (O Cartório registrou o imóvel); d) existe uma outra forma de voz passiva, que é a voz passiva sintética; e) para formar a voz passiva sintética, põe-se o verbo na forma ativa (registra) e se acrescenta o se, que passa a ter a função de partícula apassivadora; f) assim, a voz passiva analítica "O imóvel foi registrado" tem, como voz passiva sintética, "Registra-se o imóvel"; g) se a voz passiva analítica fosse "Os imóveis foram registrados", a voz passiva sintética seria "Registraram-se os imóveis". 3) Vejam-se as variações dessa expressão, conforme o tempo e o modo em que se queira empregar o verbo registrar: a) se a voz passiva analítica é "O imóvel é registrado", a voz passiva sintética é "Registra-se o imóvel"; b) se a analítica é "O imóvel era registrado", a sintética é "Registrava-se o imóvel"; c) para a analítica "O imóvel será registrado", tem-se a sintética "Registrar-se-á o imóvel"; d) para a forma imperativa "O imóvel seja registrado", tem-se a sintética "Registre-se o imóvel". 4) Respondendo de modo prático à indagação do leitor, tem-se, num primeiro aspecto, que, se o que se quer é uma forma imperativa, resultante de efetiva determinação de autoridade, têm-se as seguintes formas sintéticas no chamado modo imperativo: a) "Registre-se o imóvel"; b) "Frise-se este ponto de vista"; c) "Note-se este aspecto importante". Correspondem elas às seguintes formas analíticas: i) "O imóvel seja registrado"; ii) "Este ponto de vista seja frisado"; iii) "Este aspecto importante seja notado". 5) Se, porém, o que se quer é apenas indicar um fato que ocorre no momento em que se fala, sem carga nenhuma de ordem ou determinação, então se têm as formas sintéticas no chamado modo indicativo: a) "Registra-se o imóvel"; b) "Frisa-se este ponto de vista"; c) "Nota-se este aspecto importante". Correspondem elas às seguintes formas analíticas: i) "O imóvel é registrado"; ii) "Este ponto de vista é frisado"; iii) "Este aspecto importante é notado". 6) Por fim, embora não seja difícil perceber, parece oportuno realçar que a voz passiva sintética (e, assim, o se como partícula apassivadora) coexiste normalmente com a forma verbal no imperativo.
quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Um ou mais deles - Verbo no singular ou no plural?

1) Um leitor indaga como fica a concordância, quando o sujeito composto é formado por um elemento no singular e outro no plural, como no seguinte exemplo: "Um ou mais deles é (são) selecionado(s) para representar a controvérsia". 2) Esclareça-se, de início, ao leitor, que a dificuldade do exemplo trazido por ele não reside no fato de que um núcleo do sujeito seja singular e outro, no plural, e sim na circunstância de que os dois núcleos (um e mais deles) estão unidos pela conjunção ou. 3) E, quando os núcleos do sujeito (estando ao menos um deles no singular, para que possa haver dúvida) se unem por ou, e esta conjunção não indica exclusão, de modo que o fato expresso pelo verbo pode ser atribuído a ambos, então o verbo vai para o plural (CUNHA, 1970, p. 241). Exs.: a) "Violência ou traição não o venceram"; b) "Pedro ou Paulo encontrarão uma solução para o problema". 4) É exatamente o que se dá no exemplo trazido para análise, em que, em princípio, nada impede que apenas um ou, então, mais de um venham a ser selecionados. 5) E, assim, atente-se à forma correta: "Um ou mais deles são selecionados para representar a controvérsia". 6) Apenas se remata com a observação de que, nos casos em que a conjunção ou indica exclusão obrigatória, então o verbo irá para o singular. Exs.: a) "Pedro ou Paulo casará com Maria"; b) "A União, o Estado ou o Município oferecerá ao ex-proprietário o imóvel desapropriado, pelo preço por que o foi, caso não tenha o destino, para que se desapropriou" (CC/1916, art. 1.150).
quarta-feira, 9 de novembro de 2016

Grato - E ponto final?

1) Uma leitora diz ter dúvidas em dois aspectos ao final de uma carta: a) deve empregar a palavra grata ou agradecida?; b) depois desse adjetivo, deve usar vírgula ou ponto final? 2) Observa-se, de início, que, com o correr dos tempos, a correspondência formal passou a ser regida por algumas regras que não são determinadas por normas oficiais, emanadas de órgãos detentores de delegação oficial para estabelecê-las no idioma, mas que são normalmente obedecidas, até porque, de um modo geral, emanam do bom-senso e, por isso, em certa escala, acabam sendo seguidas também pela correspondência menos formal. 3) Como repositórios de tais regras, os grandes jornais, as emissoras de televisão e os próprios órgãos governamentais elaboram seus manuais de redação, e estes, por um lado, enfeixam um conjunto comum de regras e, por outro, divergem entre si em alguns pontos. 4) Para responder à primeira parte da indagação da leitora, invoca-se o Manual de Redação Oficial da Presidência da República, facilmente encontrável na internet, o qual traz um item específico destinado aos fechos das comunicações oficiais e nele prescreve que elas terminem do seguinte modo: a) para autoridades superiores, inclusive o Presidente da República, Respeitosamente; b) para autoridades de mesma hierarquia ou de hierarquia inferior, Atenciosamente. 5) Ora, para a comunicação pretendida pela leitora, a qual, pelos termos trazidos, não chega a ser formal, embora venha com algo que aparenta média formalidade, o término tanto poderá ser agradecida como grata, ou outro adjetivo similar, até porque, em determinada escala, ambas não deixam de ser palavras sinônimas. 6) Já quanto à segunda dúvida, isto é, quanto a saber se vai haver vírgula ou ponto final depois desse adjetivo, deve-se partir do princípio de que quem está grato ou agradecido é exatamente aquele que vem nominado em seguida e vai assinar a correspondência. E isso quer dizer que há uma ligação direta e íntima de sentido entre ambos os vocábulos. 7) Desse modo, até para preservar essa ideia de continuidade de sentido e de vinculação entre os vocábulos, deve-se usar a vírgula, e não o ponto final. Assim, Grata, e não Grata. 8) Vale a pena finalizar com a observação de que uma leitura dos modelos ofertados pelo Manual de Redação Oficial da Presidência da República confirma exatamente essa postura quanto à pontuação.
quarta-feira, 19 de outubro de 2016

Recursos de apelação ou Recursos de apelações?

1) Uma leitora indaga qual a forma correta: recursos de apelação ou recursos de apelações? 2) Esclareça-se, de início, que apelação é a modalidade daquele recurso que serve para alguém se opor contra uma sentença (CPC, art. 513). 3) É apenas uma entre outras modalidades processuais de recursos: agravo, embargos infringentes, embargos de declaração, recurso ordinário, recurso especial, recurso extraordinário, embargos de divergência... 4) Uma análise de seu texto integral revela que o Código de Processo Civil de 1973, nas dezenas de vezes em que faz uso da referida expressão, jamais emprega a palavra apelação no plural. E sempre utiliza o vocábulo apelação apenas, e só uma vez emprega a expressão recurso de apelação (art. 518, § 1º). 5) O Código de Processo Civil de 2015 não foge muito a essa linha, a não ser que emprega duas vezes a expressão recurso de apelação (arts. 937, I, e 1.011, caput). 6) Feitas essas ponderações, enfrenta-se a questão trazida pela leitora. 7) Ora, em hipóteses como a trazida pela leitora, os recursos podem ser vários, mas a modalidade é uma só: apelação. 8) Por isso se pode ter um recurso de apelação ou vários recursos de apelação. Mas sempre com este último termo no singular, e não no plural. 9) Se, todavia, se tomar apenas a palavra apelação em lugar da mencionada expressão, então se poderá dizer as apelações. 10) Confiram-se, portanto, os seguintes exemplos: a) "Ambas as apelações foram providas" (correto); b) "Ambos os recursos foram providos" (correto); c) "Ambos os recursos de apelação foram providos" (correto); d) "Ambos os recursos de apelações foram providos" (errado).
quarta-feira, 28 de setembro de 2016

A curto prazo ou Em curto prazo?

1) Uma leitora quer saber qual é a forma correta: a curto prazo ou em curto prazo? Ou seja: quer saber que preposição deve empregar antes da palavra prazo, precedida ou não de um adjetivo como curto, médio ou longo. 2) Faça-se uma observação inicial sobre a falta de tratamento mais específico da matéria por parte dos gramáticos. Mas se complemente com a ponderação de que a verificação do que se dá na prática dos casos concretos responde suficientemente às dúvidas que surgem em tais situações. 3) Uma primeira possibilidade verificada no dia a dia é o emprego da preposição em com expressões dessa natureza. Ex.: "Termino a obra em curto prazo". E isso assim acontece, porque uma frase como essa responde à indagação "Você termina essa empreitada em que prazo?" 4) Acrescentam-se outras frases com estrutura similar: a) "Em médio prazo, a situação estará equilibrada"; b) "Em longo prazo, não mais haverá solução". 5) Esse emprego com a preposição em admite associação com os artigos definidos o, a, os e as. Exs.: a) "Em contraste com o longo prazo, no curto prazo temos alguns fatores variáveis e outros fixos, relativamente ao nível de produção escolhido"; b) "É possível lucrar mais que a poupança no curto prazo". 6) Uma segunda possibilidade é o emprego da preposição por, sobretudo quando se está diante de um prazo determinado. Ex.: a) "Foi contratado por um prazo de três anos" (HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 2.279); b) "Foi contratado pelo prazo de três anos". 7) Uma terceira possibilidade é o emprego da preposição a, quando se utiliza a expressão opondo-se especificamente ao circunlóquio à vista. Ex.: "Comprei minha televisão a prazo" (FERREIRA, 2010, p. 1.693). 8) Em quarta possibilidade, também se admite o emprego da preposição a, quando o sentido da expressão é o de um prazo próximo não especificado, e a função sintática da expressão é a de um adjunto adverbial. Exs.: a) "A curto prazo não haverá mudanças sensíveis na economia"; b) "O negócio no início será ruim, mas a longo prazo poderá tornar-se lucrativo" (HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 2.279). 9) Uma quinta possibilidade, de igual modo, se apresenta nos exemplos práticos, com a preposição de, para um tempo não especificado, em expressões normalmente associadas a um substantivo (dívida, meta, objetivo, rendimento, etc.), normalmente com a função sintática de adjunto adnominal. Exs.: a) "Na tentativa de reorganização da Economia, o Governo escalonou seus alvos em metas de curto, de médio e de longo prazo"; b) "Entende-se por passivo de curto prazo..."; c) "Ele era apenas um especulador de curto prazo"; d) "Os fundos de investimento de curto prazo têm por objetivo reproduzir as variações das taxas de juros e das taxas pós-fixadas". 10) Algumas observações devem ser feitas, em síntese e como fecho, a esta altura: a) os gramáticos normalmente não se debruçam sobre a análise das preposições que devam ser empregadas nessas circunstâncias; b) em vários casos, os empregos observados constituem peculiaridades do idioma, sem justificativa técnica maior para esta ou aquela construção; c) um estudo mais aprofundado revela alguma diversidade de conteúdo semântico entre as expressões, além de diferenças sintáticas entre as estruturas em tais casos; d) não parece haver razão para condenar o emprego desta ou daquela forma de expressão.
quarta-feira, 21 de setembro de 2016

Graças a - Pode ter sentido negativo?

1) Um leitor quer saber se a expressão graças a tem sempre sentido positivo, ou se pode ter significação negativa. 2) Aurélio Buarque de Holanda Ferreira confere à mencionada expressão um conteúdo neutro, sem atribuição de valor positivo ou negativo: por causa de, devido a. E assim exemplifica: "A varíola - enfermidade hoje erradicada, graças a uma campanha mundial de vacinação - era particularmente letal"1. 3) Aos significados já referidos, Antônio Houaiss acrescenta com o auxílio de, de igual modo sem qualquer atribuição de conteúdo semântico positivo ou negativo. E traz o seguinte exemplo: "Escapou de perder o ano, graças aos amigos"2. 4) É certo, por um lado, que os exemplos dados por ambos os dicionaristas trazem em si a acepção positiva de que fala o leitor. 5) Não menos certo, também, é que essa tendência a pensar positivamente sobre a expressão resulta das acepções positivas com que se emprega a palavra ou as expressões por ela formada, como graça (em sentido religioso), graças a Deus, cair nas graças, estado de graça, "ela está uma graça"... 6) E isso sem falar nos sinônimos de sentido positivo em que o vocábulo é usado: mercê, favor, benefício, gentileza, privilégio... 7) Sem prejuízo, porém, de todos esses aspectos e considerações, nada impede que se empregue a mencionada expressão em sentido negativo, como é fácil perceber nos exemplos seguintes: a) "Estamos sendo levados à bancarrota graças a uma política de incompetência e a uma corrupção nunca antes vista na história deste País"; b) "A equipe perdeu vergonhosamente o mundial graças a uma série de equívocos dos dirigentes e à profunda arrogância e indolência dos jogadores". __________________ 1 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. 5. ed. Curitiba: Positivo, 2010, p. 1.045.2 HOUAISS, Antônio (Organizador). Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. 1. ed. Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2001, p. 1.471.
quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Cumprimentar em nome ou Cumprimentar na pessoa?

1) A situação trazida pela dúvida de uma leitora costuma ocorrer com frequência em solenidades: havendo muitas autoridades a serem listadas em um discurso, o orador prefere eleger uma delas e, tomando-a como representante das outras, saúda nela as demais. 2) Indaga a leitora se, nesse caso, a saudação se dá em nome ou na pessoa da autoridade escolhida. De modo mais específico, o orador cumprimenta os demais em nome ou na pessoa de alguém. 3) Ora, num primeiro aspecto, quer pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, quer, mais especificamente entre nós, pelo art. 2º do Código Civil, todo ser humano é reconhecido como pessoa perante a lei. 4) Por outro lado, o nome é a designação pela qual a pessoa se identifica no seio da família e da sociedade. Nesse sentido, Spencer Vampré dizia com total propriedade: "Quando pronunciamos ou ouvimos um nome, transmitimos ou recebemos um conjunto de sons, que desperta, em nosso espírito e no de outrem, a ideia da pessoa indicada, com seus atributos físicos, morais, jurídicos, econômicos, etc. Por isso, é lícito afirmar que constitui o nome a mais simples, a mais geral e a mais prática forma de identificação" (1935, p. 38). 5) Em outras palavras: a pessoa é o ser representado; o nome, parte dela e sua representação. 6) Com essas ponderações, é oportuno acrescentar que, às vezes, com integral correção, se utiliza uma figura de linguagem conhecida como metonímia, que consiste em usar uma palavra em lugar de outra, desde que ambas tenham entre si algum tipo de relação e de proximidade, como - exatamente o que ocorre no caso apreciado - é o caso de empregar a parte (o nome) em lugar do todo (a pessoa). 7) De modo mais prático e direcionado à indagação da leitora: a) por um lado, o vocábulo nome não pode ser tido como sinônimo objetivo de pessoa, já que aquele é apenas parte e representação desta última; b) por outro lado, é possível empregar nome em lugar de pessoa, quando se faz uso da figura de linguagem denominada metonímia, pela qual uma palavra toma o lugar de outra, com base em alguma relação de proximidade entre ambas (causa e efeito, parte e todo, autor e obra, continente e conteúdo, etc.); c) por isso, em uma saudação coletiva por representação, tanto é correto cumprimentar várias autoridades em nome de alguém, como cumprimentá-las na pessoa de alguém.
quarta-feira, 31 de agosto de 2016

A uma ... a duas - É correto?

1) Um leitor indaga se as expressões a uma e a duas são corretas em frases como a seguinte: "Essa é a única interpretação do art. 65 da Lei 8.884/94. A uma, porque a conjunção 'assim como' não encerra natureza disjuntiva, mas conjuntiva. A duas, porque é princípio basilar na hermenêutica que a norma não possui expressões inúteis...". 2) Ora, em realidade, há algumas estruturas - e corretas - que são encontradas quase que com exclusividade nos textos jurídicos e forenses. 3) Essa, trazida pelo leitor, é uma delas, empregada para listar, em sequência, as justificativas de uma afirmação que se faz em um determinado contexto, seguindo invariavelmente este raciocínio: a) de início, faz-se uma afirmação geral (no caso da consulta, "Essa é a única interpretação do art. 65 da Lei 8.884/94"); b) tal afirmação geral pode vir seca ou seguida de circunlóquios, como "por diversos motivos" ou "por diversas razões"; c) em seguida, precedendo uma primeira justificativa, lança-se a expressão a uma; d) e se enfileiram as demais razões, introduzidas pelas expressões a duas, a três... 4) Com a observação específica de que a frase trazida pelo leitor é correta, veja-se também uma variação, exemplo de tantas outras, todas elas, de igual modo, estruturadas em português escorreito: "Essa é a única interpretação do art. 65 da Lei 8.884/94, e isso por razões específicas. A uma, porque a conjunção 'assim como' não encerra natureza disjuntiva, mas conjuntiva. A duas, porque é princípio basilar na hermenêutica que a norma não possui expressões inúteis...".
quarta-feira, 24 de agosto de 2016

Aditamento contratual ou Aditivo contratual?

1) Um leitor indaga se o correto é dizer e escrever aditamento contratual ou aditivo contratual. 2) O aditamento, nos casos mais comuns, quer dizer a ação de aditar. Exs.: a) "Ao Poder Executivo é facultado exigir que se proceda a alterações ou aditamento no contrato ou no estatuto..." (CC/2002, art. 1.129); b) "Não realizado o aditamento a que se refere o inciso I do § 1º deste artigo, o processo será extinto sem resolução do mérito" (CPC-2015, art. 303, § 2º); c) "O aditamento a que se refere o inciso I do § 1º deste artigo dar-se-á nos mesmos autos, sem incidência de novas custas processuais" (CPC/2015, art. 303, § 3º). 3) Às vezes, aditamento também quer significar o resultado, o próprio acrescentamento ou respectivo termo dele resultante. Exs.: a) "Ele carreou aos autos cópia do aditamento celebrado"; b) "Este é o Aditamento n. 01/2015 às Instruções n. 02/2008...". 4) O aditivo, por sua vez, coincide, em seu conteúdo semântico, com esse segundo sentido de aditamento, significando, então, o resultado do acrescentamento ou respectivo termo dele resultante. Exs.: a) "Ele carreou aos autos cópia do aditivo"; b) "Este é o Aditivo n. 01/2015 às Instruções n. 02/2008...". 5) O vocábulo aditivo não tem, contudo, o significado primeiro de aditamento, a saber, o sentido da própria ação de aditar. Desse modo, seriam incorretos os seguintes exemplos: a) "Ao Poder Executivo é facultado exigir que se proceda a alterações ou aditivo no contrato ou no estatuto..."; b) "Não realizado o aditivo a que se refere o inciso I do § 1º deste artigo, o processo será extinto sem resolução do mérito"; c) "O aditivo a que se refere o inciso I do § 1º deste artigo dar-se-á nos mesmos autos, sem incidência de novas custas processuais".
quarta-feira, 17 de agosto de 2016

Tenho realizado ou Tenho realizada?

1) Um leitor diz ter dúvida sobre qual seja a forma correta: "Tenho realizado a compra" ou "Tenho realizada a compra"? 2) Ora, por via de regra, pode-se dizer que os verbos ter e haver (este, de uso menos frequente) servem para formar tempos compostos na voz ativa (o sujeito pratica a ação indicada pelo verbo). Exs.: a) "O advogado tinha estudado o caso"; b) "O advogado havia estudado o caso". 3) Já os verbos ser e estar servem para formar tempos compostos, aquele normalmente compondo voz passiva (o sujeito recebe a ação indicada pelo verbo). Exs.: a) "O caso foi estudado pelo advogado"; b) "O caso estava estudado suficientemente". 4) Como regra geral, com os verbos ter e haver, o particípio passado fica invariável. Exs.: a) "O advogado tinha estudado o caso"; b) "O advogado tinha estudado a ação"; c) "O advogado tinha estudado os casos"; d) "O advogado tinha estudado as ações"; e) "A advogada havia estudado o caso"; f) "A advogada havia estudado a ação"; g) "A advogada havia estudado os casos"; h) "A advogada havia estudado as ações"; i) "Os advogados tinham estudado o caso"; j) "Os advogados tinham estudado a ação"; k) "Os advogados tinham estudado os casos"; l) "Os advogados tinham estudado as ações"; m) "As advogadas haviam estudado o caso"; n) "As advogadas haviam estudado a ação"; o) "As advogadas haviam estudado os casos"; p) "As advogadas haviam estudado as ações". 5) Já com os verbos ser ou estar, o particípio se flexiona em gênero (masculino ou feminino) e número (singular ou plural), para concordar com o seu sujeito. Exs.: a) "O caso foi estudado pelo advogado"; b) "A ação foi estudada pelo advogado"; c) "Os casos foram estudados pelo advogado"; d) "As ações foram estudadas pelo advogado"; e) "O caso estava estudado suficientemente"; f) "A ação estava estudada suficientemente"; g) "Os casos estavam estudados suficientemente"; h) "As ações estavam estudadas suficientemente". 6) De modo específico para a indagação do leitor, vejam-se as formas corretas: a) "Ele tinha realizado a compra"; b) "Ela tinha realizado a compra"; c) "Eles tinham realizado a compra"; d) "Elas tinham realizado a compra"; e) "Ele havia realizado as compras"; f) "Ela havia realizado as compras"; g) "Eles haviam realizado as compras"; h) "Elas haviam realizado as compras". 7) Com as variações já consideradas para a voz passiva, também se observem as seguintes formas corretas: a) "O trabalho foi realizado por ela"; b) "A compra foi realizada por ele"; c) "Os trabalhos foram realizados por ela"; d) "As compras foram realizadas por ele"; e) "O trabalho estava realizado adequadamente"; f) "A obra estava realizada adequadamente"; g) "Os trabalhos estavam realizados adequadamente"; h) "As obras estavam realizadas adequadamente".  
quarta-feira, 10 de agosto de 2016

Pane - Um ou uma?

1) Um leitor ouviu, em transmissão esportiva, a seguinte frase: "Deu um pane na seleção brasileira". E traz duas indagações: a primeira é se pane é palavra do português; a segunda é se, em caso positivo, deve-se dizer um pane ou uma pane. 2) Ora, sempre é bom lembrar - até para criar no leitor o hábito salutar de um raciocínio que se repete em tal situação - que, quando se quer saber se uma palavra existe ou não em português, ou mesmo qual é seu gênero, grafia e/ou pronúncia, ou qual o seu plural quando foge à normalidade, deve-se tomar por premissa o fato de que a autoridade para listar oficialmente os vocábulos pertencentes ao nosso idioma e para definir-lhes as demais peculiaridades e circunstâncias, é a Academia Brasileira de Letras. 3) E essa autoridade, a ABL a exerce por via da edição do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa.1 4) Uma simples consulta ao VOLP mostra dois aspectos quanto ao vocábulo da consulta do leitor: a) pane é palavra perfeitamente registrada como integrante do vernáculo; b) pertence ao gênero feminino (uma pane, e não um pane).2 5) Em reposta ao leitor, confiram-se os seguintes exemplos, com a indicação de sua correção ou erronia entre parênteses: a) "Deu um pane na seleção brasileira" (errado); b) "Deu uma pane na seleção brasileira" (correto). _____________1 Em algumas épocas, a ABL põe o VOLP à disposição do leitor on-line; em outras, a disponibilização ocorre apenas por edição de livro específico com tal função. 2 Academia Brasileira de Letras. Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa. 5. ed. São Paulo: Global Editora Distribuidora Ltda., 2009, p. 614.
quarta-feira, 27 de julho de 2016

Alface - O ou a?

1) Uma leitora afirma que tem ouvido, com certa frequência, em restaurantes, pessoas pedindo o alface em vez de a alface. Como até ela ficou na dúvida, pergunta se o correto é dizer e escrever o alface ou a alface. 2) Ora, sempre é bom lembrar - até para criar no leitor o hábito de um salutar raciocínio que se repete - que, quando se quer saber se uma palavra existe ou não em português, ou mesmo qual é seu gênero, grafia e/ou pronúncia, ou qual o seu plural quando foge à normalidade, deve-se tomar por premissa o fato de que a autoridade para listar oficialmente os vocábulos pertencentes ao nosso idioma e para definir-lhes as demais peculiaridades e circunstâncias, é a Academia Brasileira de Letras. 3) E essa autoridade, a ABL a exerce por via da edição do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa.1 4) Uma simples consulta ao VOLP mostra que alface é palavra pertencente ao gênero feminino (a alface, e não o alface).2 5) Assim, em reposta à leitora, confiram-se os seguintes exemplos, com a indicação de sua correção ou erronia entre parênteses: a) "Ele pediu um alface com tomate" (errado); b) "Ele pediu uma alface com tomate" (correto). ______________1 Em algumas épocas, a ABL põe o VOLP à disposição do leitor on-line; em outras, a disponibilização ocorre apenas por edição de livro específico com tal função. 2 Academia Brasileira de Letras. Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa. 5. ed. São Paulo: Global Editora Distribuidora Ltda., 2009, p. 37.
quarta-feira, 13 de julho de 2016

Memorial ou Memoriais?

1) Uma leitora indaga qual das duas palavras está correta para significar a peça que se entrega aos julgadores de um recurso logo antes de um julgamento: memorial ou memoriais? 2) Por um lado, o dicionarista Antônio Houaiss vê possibilidade expressa de emprego da palavra memorial no sentido da indagação da leitora, ao conceituá-lo do seguinte modo: "qualquer sustentação feita à autoridade judiciária ou administrativa, geralmente no final do processo".1 E não faz referência ao emprego de memoriais nessa acepção. 3) Inversamente a essa postura, o Código de Processo Civil de 1973 não registra a palavra memorial nesse sentido, e sim memoriais: a) "Quando a causa apresentar questões complexas de fato ou de direito, o debate oral poderá ser substituído por memoriais" (CPC, art. 454, § 3º); bi) "Encerrado o debate ou oferecidos os memoriais..." (CPC, art. 456); ci) "...sendo-lhes assegurado o direito de apresentar memoriais ou de pedir a juntada de documentos" (CPC, art. 482, § 2º). 4) O Código de Processo Civil de 2015 tem idêntico proceder ao anterior: a) "Qualquer das partes poderá, no prazo de 5 (cinco) dias, apresentar memoriais ou discordância do julgamento por meio eletrônico" (CPC, art. 945, § 2º); b) "A parte legitimada à propositura das ações previstas no art. 103 da Constituição Federal poderá manifestar-se, por escrito, sobre a questão constitucional objeto de apreciação, no prazo previsto pelo regimento interno, sendo-lhe assegurado o direito de apresentar memoriais ou de requerer a juntada de documentos" (CPC, art. 950, § 2º). 5) Com essas ponderações, pode-se responder à leitora do seguinte modo: a) por um lado, o dicionarista citado fala em memorial, mas não em memoriais, no que tange ao sentido pretendido por ela; b) por outro lado, as codificações processuais de 1973 e 2015 falam em memoriais, mas não em memorial; c) ante essas circunstâncias, continua valendo o princípio segundo o qual onde os estudiosos divergem, devem-se permitir ambas as formas ("Ofereceu memorial antes do julgamento da apelação" e "Ofereceu memoriais antes do julgamento da apelação". ____________ 1 HOUAISS, Antônio (Organizador). Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. 1. ed. Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2001, p. 1.891.
quarta-feira, 6 de julho de 2016

Expertise - Existe?

1) Um leitor indaga se existe em nosso idioma o vocábulo expertise, que ele tem encontrado muitas vezes no meio jurídico, ao que parece com o sentido de experiência. 2) Ora, em salutar raciocínio que se deve repetir sempre, quando se quer saber se uma palavra existe ou não em português, deve-se tomar por premissa o fato de que a autoridade para listar oficialmente os vocábulos pertencentes ao nosso idioma é a Academia Brasileira de Letras. 3) E essa autoridade, a ABL a exerce por via da edição do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa.1 4) Uma simples consulta ao VOLP mostra que nele não se registra a palavra expertise, o que implica dizer que tal vocábulo simplesmente não existe no idioma e, assim, seu emprego não está autorizado ao usuário da língua portuguesa. 5) Desse modo, deve ser substituído por experiência ou outro sinônimo que couber. Exs.: a) "A empresa de assessoria tinha expertise suficiente para auxiliar no caso" (errado); b) "A empresa de assessoria tinha experiência suficiente para auxiliar no caso" (correto). 6) Todavia, aos que, mesmo depois dessas observações, insistirem em usar a palavra expertise, anota-se que ela é de origem francesa, e não inglesa, de modo que sua pronúncia é paroxítona (com força no i), o r tem pronúncia carioca, e o s tem o som de z (ecspertize). __________________ 1 Em algumas épocas, a ABL põe o VOLP à disposição do leitor on-line; em outras, a disponibilização ocorre apenas na edição escrita do respectivo volume.  
quarta-feira, 29 de junho de 2016

Em mão ou Em mãos?

1) Dois leitores querem saber qual a forma correta: em mão ou em mãos? E um deles indaga qual o seu real significado? 2) Ora, a entrega de uma determinada carta ou objeto ao respectivo destinatário pode ser confiada a alguém em particular, e não ao correio. É exatamente desse modo de entrega de correspondência que se diz em mão, ou em mãos, ou em mão própria, ou em mãos próprias. 3) E, no sobrescrito da carta, costuma-se abreviar E. M. ou E. M. P. 4) Aurélio Buarque de Holanda Ferreira1 e Cândido Jucá Filho2 trazem apenas a forma no singular para ambas as expressões; já Antônio Houaiss as registra no singular e no plural.3 E todos sem comentário algum acerca de uma ou de outra posição. 5) Domingos Paschoal Cegalla, por seu lado, justifica que "as duas formas são corretas, mas no Brasil se emprega geralmente em mãos".4 6) Ante esse quadro, a postura mais adequada parece ser aquela que dá por corretas todas essas formas de expressão. _______________1 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. 5. ed. Curitiba: Positivo, 2010, p. 1.332-1.333. 2 JUCÁ FILHO, Cândido. Dicionário Escolar das Dificuldades da Língua Portuguesa. 3. ed. Rio de Janeiro: Fename - Fundação Nacional de Material Escolar, 1963, p. 409. 3 HOUAISS, Antônio (Organizador). Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. 1. ed. Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2001, p. 1.843. 4 CEGALLA, Domingos Paschoal. Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999, p. 136.
quarta-feira, 15 de junho de 2016

Rigorismo - Existe? E rigorosismo?

1) Um leitor indaga se é correto falar a palavra rigorismo. Diz ele optar por rigorosismo, por questão de eufonia. E quer saber se há prejuízo no emprego de uma ou de outra. 2) Ora, em raciocínio que sempre é bom repetir, até para formar no leitor um hábito mais do que salutar, lembra-se que, quando se quer saber se uma palavra existe ou não em português, deve-se tomar por premissa o fato de que a autoridade para listar oficialmente os vocábulos pertencentes ao nosso idioma é a Academia Brasileira de Letras. 3) E essa autoridade, a ABL a exerce por via da edição do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa.1 4) Uma simples consulta ao VOLP mostra dois aspectos de extrema importância para resposta ao leitor: a) o vocábulo rigorismo encontra-se ali normalmente registrado; b) já rigorosismo, não.2 5) Em tais circunstâncias, a forçosa conclusão que se há de extrair é que a palavra rigorismo existe perfeitamente em português, e seu emprego está normalmente autorizado ao usuário do idioma. 6) Por outro lado, há uma segunda e reversa conclusão a ser tirada desse raciocínio: o vocábulo rigorosismo não existe no vernáculo, e não se autoriza seu uso na fala e na escrita que devam submeter-se aos ditames da norma culta. 7) Anota-se, por fim, que, se ao leitor repugna, por afronta à eufonia, a forma rigorismo, o VOLP registra um outro sinônimo que pode ser empregado em tais circunstâncias: rigorosidade. _______________1 Em algumas épocas, a ABL põe o VOLP à disposição do leitor on-line; em outras, a disponibilização ocorre apenas por edição de livro específico com tal função. 2 Academia Brasileira de Letras. Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa. 5. ed. São Paulo: Global Editora Distribuidora Ltda., 2009, p. 723.  
quarta-feira, 8 de junho de 2016

Que ou De que?

1) Um leitor diz ter dúvidas quanto ao emprego da palavra que ou da expressão de que em frases como as seguintes: a) "Uma das informações que se colhe no noticiário é que o advogado..."; b) "Uma das informações que se colhe no noticiário é de que o advogado ..."? 2) Nesse campo, de integral propriedade é a observação de Eliasar Rosa para uma situação frequente nos discursos a pretexto de suposta erudição: "Há uma forma de errar muito curiosa nas sustentações orais, ou em discursos forenses ou parlamentares". 3) E especifica tal autor: "Consiste ele em usar-se a preposição de com verbos que não a exigem". 4) E cita ele o seguinte trecho como exemplo: "O Dr. Promotor afirmou de que o réu matou por motivo fútil; entretanto a defesa vai demonstrar de que isso não é verdade, pois está provado nos autos de que o réu matou impelido por motivo de relevante valor social..." 5) Por fim, assim ele explica e conclui: "Os verbos afirmar, demonstrar, provar não se constroem com a preposição de. Logo o certo seria: 'O Dr. Promotor afirmou que...; entretanto a defesa demonstrará que..., pois está provado ... que...'"1 6) No caso da dúvida trazida pela leitora, tem-se o verbo ser, que é de ligação e que pede predicativo do sujeito não precedido de preposição. O correto, portanto, é "Uma das informações que se colhe no noticiário é que o advogado ..." ______________________ 1 ROSA, Eliasar. Os Erros Mais Comuns nas Petições. 9. ed. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos S.A., 1993, p. 54-55.
quarta-feira, 1 de junho de 2016

De facto ou De fato?

1) Um leitor, estranhando ter visto no noticiário a expressão de facto em contraposição a de direito, indaga qual a razão desse c e se o correto não seria de fato. 2) Ora, desde o começo do século XX, houve tratativas para acordos ortográficos entre Brasil e Portugal, e elas acabaram, com o tempo, abrangendo os países lusófonos que, gradativamente, se formaram a partir da independência das antigas colônias portuguesas. 3) Tais tentativas de acordo, entretanto, invariavelmente malogravam e sempre por um mesmo motivo: uma das partes buscava impor seu modo de pronunciar ou de escrever, preconizando a consequente eliminação do ponto de vista do outro. 4) Diferentemente, porém, do que se tentou em outras épocas, o Acordo Ortográfico de 2008, discutido e trabalhado desde a década de 90 do século passado, teve a sabedoria e o bom-senso de estabelecer que, quando, considerada toda a extensão territorial de fala portuguesa, houvesse duas pronúncias para um determinado vocábulo, então haveria também duas escritas aceitas e válidas. 5) E essa é exatamente a situação do vocábulo trazido na dúvida do leitor: enquanto no Brasil a pronúncia é de fato, já em Portugal se fala de facto. 6) Em tal caso, a conclusão só pode ser uma: se há duas pronúncias na extensão territorial de fala portuguesa, ambas são consideradas válidas e corretas. 7) Bem por isso, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras, como autoridade oficial para determinar a grafia e a pronúncia dos vocábulos existentes em nosso idioma, registra, como existentes, válidos e corretos ambos os vocábulos: facto e fato.1 8) Assim, de modo direto para a indagação do leitor, tanto é correta a expressão de fato, como também o é o circunlóquio de facto. _______________ 1 Academia Brasileira de Letras. Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa. 5. ed. São Paulo: Global Editora Distribuidora Ltda., 2009, p. 361 e 365.
quarta-feira, 25 de maio de 2016

Contas bancárias ou contas bancária?