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CPC na prática

Questões práticas do CPC/15.

Elias Marques de Medeiros Neto, André Pagani de Souza, Daniel Penteado de Castro e Rogerio Mollica
É possível a conversão de pedido de reintegração de posse em "ação de execução" quanto o veículo automotor objeto de contrato de arrendamento mercantil ("leasing") não é localizado. Foi o que decidiu a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por votação unânime, nos autos do Recurso Especial n. 1.785.544/RJ, em julgamento realizado em 21.06.2022. Como se sabe, duas modalidades bastante utilizadas para possibilitar a aquisição de bens consistentes em veículos automotores de maneira financiada são o contrato de alienação fiduciária e o contrato de arrendamento mercantil, também conhecido como "leasing". Na hipótese da alienação fiduciária, caso ocorra o inadimplemento do devedor no que diz respeito ao pagamento das parcelas pactuadas para obtenção do financiamento, o credor pode recuperar fisicamente o bem mediante o ajuizamento de "ação de busca e apreensão", nos termos do art. 3º, do decreto-lei 911/1969, com a redação conferida pela lei 13.043/2014, que dispõe o seguinte: "Art. 3o O proprietário fiduciário ou credor poderá, desde que comprovada a mora, na forma estabelecida pelo § 2o do art. 2o, ou o inadimplemento, requerer contra o devedor ou terceiro a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente, a qual será concedida liminarmente, podendo ser apreciada em plantão judiciário". Caso o bem não seja encontrado no curso da "ação de busca e apreensão", o art. 4º, do decreto-lei 911/1969, estabelece expressamente que o credor pode pedir a conversão da "ação de busca e apreensão" em "ação de execução". Confira-se: "Art. 4o Se o bem alienado fiduciariamente não for encontrado ou não se achar na posse do devedor, fica facultado ao credor requerer, nos mesmos autos, a conversão do pedido de busca e apreensão em ação executiva, na forma prevista no Capítulo II do Livro II da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil. (Redação dada pela lei 13.043, de 2014)". Já no caso do arrendamento mercantil ("leasing"), na hipótese de inadimplemento do devedor, cabe ao credor propor "ação de reintegração de posse" para recuperar fisicamente o bem objeto do contrato disciplinado lei 6.099/1974. Sem dúvida, existia um tratamento diferenciado conferido pela lei no que diz respeito ao procedimento para o credor retomar o bem objeto do financiamento dependendo da espécie contratual adotada para viabilizar o negócio: alienação fiduciária ou arrendamento mercantil. Em 2014, a lei 13.043, do mesmo ano, inseriu o § 15 no art. 3º do decreto-lei 911/1969, que versa exatamente sobre a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente em garantia na hipótese de inadimplemento do devedor, com o seguinte teor: "§ 15.  As disposições deste artigo aplicam-se no caso de reintegração de posse de veículos referente às operações de arrendamento mercantil previstas na lei 6.099, de 12 de setembro de 1974." Em outras palavras, o dispositivo legal acima transcrito autorizou expressamente a aplicação das normas procedimentais previstas para a alienação fiduciária em garantia de veículos automotores aos casos de reintegração de posse referentes às operações de arrendamento mercantil desses bens. Portanto, em decisão irretocável, o STJ entendeu que é válida a extensão das normas previstas no decreto-lei 911/1969, que trata da alienação fiduciária, às hipóteses de reintegração de posse de veículos que foram objeto de contrato de arrendamento mercantil, também conhecido como "leasing". Veja-se, a propósito, a ementa do julgado: "RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. ARRENDAMENTO MERCANTIL. INADIMPLEMENTO. LIMINAR DEFERIDA. VEÍCULO NÃO LOCALIZADO. CONVERSÃO EM AÇÃO DE EXECUÇÃO. POSSIBILIDADE. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. ART. 4º DO DECRETO-LEI Nº 911/1969. APLICABILIDADE. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. Cuida-se, na origem de ação de reintegração de posse que objetiva a retomada de veículo em virtude do inadimplemento de contrato de arrendamento mercantil. O pedido de conversão da ação em processo executivo em virtude da não localização do bem foi indeferido, tendo sido extinto o processo sem resolução de mérito. 3. Cinge-se a controvérsia a definir se, diante da não localização do bem objeto do contrato de arrendamento mercantil, é possível a conversão do pedido de reintegração de posse em ação de execução, por aplicação analógica do decreto-lei 911/1969 que estabelece normas de processo acerca de alienação fiduciária. 4. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça traçou orientação no sentido de que, em ação de busca e apreensão processada sob o rito do decreto-lei 911/1969, o credor tem a faculdade de requerer a conversão do pedido de busca e apreensão em ação executiva se o bem não for encontrado ou não se achar na posse do devedor (art. 4º). 5. A lei 13.043/2014, que trouxe modificações no Decreto-Lei nº 911/1969, autoriza a aplicação das normas procedimentais previstas para a alienação fiduciária aos casos de reintegração de posse de veículos referentes às operações de arrendamento mercantil (Lei nº 6.099/1974). 6. Recurso especial provido. (REsp n. 1.785.544/RJ, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 21/6/2022, DJe de 24/6/2022)". Assim, diante da não localização do veículo automotor objeto do contrato de arrendamento mercantil, é possível a conversão do pedido de reintegração de posse em ação de execução, por aplicação analógica do Decreto-Lei nº 911/1969 que estabelece normas de processo acerca de alienação fiduciária. Trata-se da uma decisão acertada da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, que equipara o procedimento a ser adotado para situações muito parecidas, em harmonia com a jurisprudência recente da Corte.
Inspirado na obra de João de Castro Mendes1, o processualista português José Lebre de Freitas2 pontua que "a prova tem por objeto os fatos pertinentes para o objeto do processo". João Batista Lopes3 define provas como: "À demonstração dos fatos (ou melhor, das alegações dos fatos) é que se dá o nome de prova... o vocábulo prova provém do latim probatio, com o significado de verificação, exame, inspeção. De acordo com os dicionaristas, quer dizer 'aquilo que mostra a verdade de uma proposição ou realidade de um fato'. Na linguagem jurídica, o termo é empregado como sinônimo de demonstração (dos fatos alegados no processo). É a chamada prova judiciária". Para o mesmo mestre, as provas podem ser: direta (se refere ao próprio fato objeto da prova) ou indireta (se refere a fato diverso do que efetivamente se pretende demonstrar, mas que com ele se relaciona), pessoal (feita por meio de testemunho ou de depoimento) ou real (feita por meio de objetos e demonstrações), oral (ex: testemunhal) ou escrita (ex: documento)4. E a prova também pode ser emprestada. O novo CPC, no capítulo referente às provas, prevê, em seu art. 372, que: "o juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório". Trata-se da possibilidade de o magistrado validar a utilização da prova emprestada, sendo certo que esta orientação está em consonância com a posição que predomina na doutrina e na jurisprudência pátria. A prova emprestada deve ser entendida como aquela que foi produzida em outro processo e cujos efeitos a parte pretende que sejam apreciados e considerados válidos por magistrado que preside um processo diverso. Para Nelson Nery Jr.5 prova emprestada é "aquela que, embora produzida em outro processo, se pretende produza efeitos no processo em questão. Sua validade como documento e meio de prova, desde que reconhecida sua existência por sentença transitada em julgado, é admitida pelo sistema brasileiro". Para João Batista Lopes, a admissibilidade da prova emprestada depende dos seguintes requisitos: (i) a prova emprestada tem que ter sido produzida em processo com as mesmas partes litigantes; (ii) no processo anterior, o princípio do contraditório deve ter sido observado; e (iii) é fundamental que não seja possível a reprodução da prova6. Para Nelson Nery Jr7., a questão mais importante para a admissão da prova emprestada é a observância do contraditório em relação aos litigantes. Na mesma direção segue Luiz Guilherme Marinoni8, para quem a observância do contraditório na produção da prova é fundamental para que esta possa emprestar os seus efeitos a outros autos. Lição semelhante está na obra de Eduardo J. Couture9: "As provas produzidas em outro juízo podem ser válidas, se nele a parte teve a oportunidade de empregar contra elas todos os meios de controle e de impugnação que a lei lhe conferia no juízo em que foram produzidas (...). Da mesma maneira, as provas do juízo penal podem ser válidas no juízo cível, se no processo criminal a parte teve a oportunidade de exercer contra elas todas as formas de impugnação facultadas pelo processo penal". No Fórum Permanente de Processualistas Civis do IBDP - Instituto Brasileiro de Direito Processual, no encontro de Salvador, foi votado, em 2013, enunciado sugerido pelo Centro de Estudos Avançados de Processo (Ceapro), sendo aprovado por unanimidade que, para fins de admissão da prova emprestada, o princípio do contraditório deve ser observado tanto no processo de origem, no qual se formou a prova, como no processo de destino, no qual se pretende utilizar a prova produzida no processo anterior. A necessidade de observância do princípio do contraditório nas duas esferas, tanto no processo de origem como no processo de destino, é fundamental para que a prova emprestada possa ser validamente admitida no direito processual civil pátrio; tudo de modo a se respeitar o direito constitucionalmente protegido de zelar-se pelo devido processo legal. Em recente julgado, o STJ se posicionou no sentido de que: "10. Não se pode ignorar o fato de que a prova emprestada tem como fundamento os princípios da economia processual, da eficiência e da celeridade, tendo em vista que se evita a repetição desnecessária da produção de prova de idêntico conteúdo, a qual tende a ser demasiado lenta e dispendiosa, notadamente em se tratando de provas periciais na realidade do Poder Judiciário brasileiro. Ademais, a medida garante a obtenção do mesmo resultado útil, em menor período de tempo, em consonância com a garantia constitucional da duração razoável do processo.11. Nos EREsp n. 617.428, julgado pela Corte Especial, firmou-se o entendimento de que a prova emprestada não pode se restringir a processos em que figurem partes idênticas, sob pena de se reduzir excessivamente sua aplicabilidade, sem justificativa razoável para tanto (EREsp n. 617.428/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, DJe de 17/6/14)" (AgInt no AREsp 1.827.101 / RJ, 2ª. turma, ministro Og Fernandes, j. 29/11/21). Em outro recente julgado, o STJ, com enfoque para a importância do contraditório, prescreveu que: "1. É assente o entendimento desta Corte Superior sobre a admissibilidade de prova emprestada, uma vez observado o devido contraditório, ainda que as partes não tenham participado do feito para o qual a prova será trasladada (EREsp 617.428-SP, Relatora a Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, DJe de 17/6/14). 2. No caso, além de haver identidade substancial de partes e o objeto da prova ser o mesmo, a exigência do contraditório foi observada, uma vez que os réus foram intimados e ofereceram suas respectivas contestações, por meio das quais puderam se pronunciar sobre a prova emprestada, insurgindo-se, inclusive, contra os seus efeitos. Desse modo, é de se ressaltar a desnecessidade da produção de prova testemunhal e de depoimento pessoal dos ora recorrentes, na medida em que a discussão sobre o crime praticado não necessitaria ser repetida nos presentes autos." (AgInt no AREsp 1.333.528 / SP, 3ª. turma, ministro Marco Aurelio Bellizze, j. 19/8/19). Não há dúvida que o regular uso da prova emprestada pode contribuir para a fluência e o dinamismo do processo civil; sendo importante, contudo, que se respeite o princípio do contraditório tanto no processo em que a prova foi produzida, como no processo em que ela será utilizada como emprestada, tudo de modo a se respeitar sempre o devido processo legal e o princípio da proibição da prova ilícita. _____ 1 MENDES, João de Castro. Do conceito de prova em processo civil. Lisboa: Ática, 1961. 2 FREITAS, José Lebre de. A ação declarativa comum. Coimbra: Coimbra Editora, 2013. p. 201. 3 LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. São Paulo: RT, 3ª. Edição. 2006. p.25. 4 LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. São Paulo: RT, 3ª. Edição. 2006. p. 35 e 36. 5 NERY Jr., Nelson. Princípios do processo civil na constituição federal. São Paulo: RT, 8ª. edição. p. 190. 6 LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. São Paulo: RT, 3ª. Edição. 2006. p. 65 e 66. 7 NERY Jr., Nelson. Princípios do processo civil na constituição federal. São Paulo: RT, 8ª. edição. p. 191. 8 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual do processo de conhecimento. São Paulo: RT, 3ª. Edição, 2006. p. 323. 9 COUTURE, Eduardo J. Fundamentos do direito processual civil. Tradução: Henrique de Carvalho. Florianópolis: Conceito Editorial. 2008. p. 125.
A comunidade jurídica ficou em polvorosa com a publicação, em 15/7/22, da EC 125, que prevê "a relevância das questões de direito federal infraconstitucional discutidas no caso" como requisito de admissibilidade dos REsp. Segundo o presidente do STJ: "A PEC corrige uma distorção do sistema, ao permitir que o STJ se concentre em sua missão constitucional de uniformizar a interpretação da legislação federal. O STJ, uma vez implementada a emenda constitucional, exercerá de maneira mais efetiva seu papel constitucional, deixando de atuar como terceira instância revisora de processos que não ultrapassam o interesse subjetivo das partes".1 É notório que o STJ recebe uma carga muito grande de processos, aproximadamente 10 mil novos processos por ministro a cada ano. Como o Tribunal permanece em recesso nos meses de janeiro e julho, temos uma média de 1.000 processos a serem julgados todo mês pelos ministros. Obviamente por mais que cada ministro possua muitos assessores, é um número que acaba inviabilizando grandes discussões nos casos julgados e que levou à criação do nefasto expediente da jurisprudência defensiva para a eliminação sumária de recursos. Em artigo publicado anteriormente nessa coluna já tivemos oportunidade de defender "que se os Tribunais possuem muitos recursos a serem julgados, que se criem filtros objetivos para selecionar os recursos que devem ser julgados e os que não. O que não se pode admitir é a criação de armadilhas não previstas em lei ou exacerbando a previsão legal e que surpreendem diuturnamente a advocacia e o jurisdicionado."2 Portanto, se tivéssemos a substituição de um limitador recursal subjetivo e não previsto em lei por outro objetivo e com previsão legal teríamos realmente muito a comemorar. Entretanto, não se pode ser ingênuo e, pelo menos num primeiro momento, devemos ter esses dois limitadores trabalhando concomitantemente e barrando o julgamento da imensa maioria dos recursos. É de se esperar que com o tempo a relevância venha a cumprir o seu papel e a jurisprudência defensiva deixe de ser necessária para limitar o número de recursos a serem julgados no STJ. Desde muito a doutrina entendia que seria necessária a instituição de um filtro também para o STJ3. Entretanto, sempre se discutiu quanto aos problemas que podem advir de tal limitação, já que ainda não temos a cultura de respeito aos precedentes arraigada em nosso ordenamento, a jurisprudência de nossos tribunais superiores ainda se altera com certa facilidade e o número de recursos especiais providos não se mostra desprezível4. A grande discussão que se passou a travar é quanto ao termo inicial da necessidade da demonstração da relevância. De fato, no §2 introduzido pela EC 125 consta a expressão "nos termos da lei". Não obstante, estranhamente, o art. 2º da EC prevê que suas novas disposições se aplicam aos recursos especiais interpostos após início da sua vigência, que se deu com sua publicação em 15/7/22. Parece clara a necessidade da edição de lei regulamentando a relevância nos recursos especiais, assim como aconteceu quando da instituição da repercussão geral. Portanto, tal requisito não poderia ser exigido de imediato5. Entretanto, cabe aos operadores serem cautelosos e fazerem desde já em seus recursos especiais um capítulo similar ao utilizado nos RE, para tratar da relevância das questões de direito federal infraconstitucional. _____ 1 Disponível aqui. 2 Publicação em 21/03/2019. Disponível aqui. 3 Nesse sentido é o entendimento de Carlos Frederico Bastos Pereira: "A introdução de um filtro recursal de admissibilidade nos recursos especiais mostra-se a saída para que o STJ se pronuncie apenas sobre questões federais infraconstitucionais dotadas de relevância e transcendência. Essa alteração poderá promover ganhos não só quantitativos, mas também qualitativos, na medida em que a Corte poderá dedicar seu tempo para julgamento de casos importantes ao desenvolvimento da ordem jurídica brasileira. (Revista Eletrônica de Direito Processual - REDP, Ano 13. Volume 20. Número 2. Maio a Agosto de 2019, p. 42). 4 Nesse sentido Marco Aurélio Serau Jr. E Denis Donoso mostravam essa preocupação desde o início da tramitação da PEC da Relevância: "Com efeito, o percentual de reforma de acórdãos está na média de 15%, o que já é um número elevado, em nosso sentir. Tais percentuais - pasme-se - conhece picos de 30 a 50% de reforma em relação a determinados Tribunais e matérias. Tal dado estatístico é mais do que suficiente para a manutenção do papel do recurso especial como mecanismo de controle dos Tribunais inferiores. Não pode haver dúvidas, em outras palavras, de que esse quadro exigiria maior cuidado em relação á tomada de posição quanto aos temas que seriam excluídos de apreciação pelo STJ, diante do reconhecimento da ausência de relevância das questões federais. Por fim, não é exagero agregar que as "engenharias jurídicas" cujo escopo é a redução do número de processos que sobrecarregam o Judiciário representam um remédio amargo e que nem sempre cura o paciente." (Relevância da Questão Federal como filtro de admissibilidade do Recurso Especial: Análise das Propostas de EC 209/12 e n. 17/13, in Revista de Processo, 224, outubro de 2013, p. 250).   5 Nesse sentido é o entendimento do professor Elpídio Donizetti: "Calma.   A exigência do requisito da "relevância das questões de direito federal infraconstitucional" ainda vai demorar um pouco para ser implementada. Fica na dependência da edição da lei. Como já dito, certamente haverá alteração do CPC". Disponível aqui.
Em pretérita edição desta coluna registramos a preocupação quanto a não aplicação, em determinados julgados, do art. 85, § 2º, do CPC/2015, cujo novel dispositivo apontou critérios objetivos quando do arbitramento da verba honorária advocatícia sucumbencial, fixada entre o mínimo de 10% e o máximo de 20% sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa. Em contrapartida, as hipóteses de arbitramento de honorários por equidade ficaram limitadas a situações pontuais reservadas no § 8º, do art. 85: "nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quanto o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2º." (grifou-se). A despeito das regras previstas nos parágrafos acima tratarem de situações claras, objetivas e distintas quanto a aplicação do § 8º ou do § 2º, sem prejuízo de igual entendimento de abalizada doutrina, referenciamos precedentes destinados a aplicar o arbitramento por equidade ainda que presente as hipóteses taxativas capituladas no § 2º, retro citado1. Também noutras oportunidades trouxemos razões acerca da necessária aplicação pelo legislador do comando previsto no art. 85, § 2º, de sorte que a equidade somente é permitida aplicação em hipóteses previstas em lei, tal qual impõe o art. 140, do CPC/2015234. Os fundamentos de referida intepretação (seja extensiva, seja contra legem), em síntese, (i) partem do pressuposto de que tal qual quando o valor da causa é muito baixo, aplica-se a equidade, idêntico regime há de ser observado quando o julgador vislumbrar que valor da condenação, do proveito econômico ou o valor da causa é excessivo ou, ainda (ii) a verba honorária arbitrada com base no art. 85, § 2º, por vezes pode constituir quantia exorbitante conferida ao patrono vencedor na demanda, devendo se evitar suposto enriquecimento sem causa. Por fim, o colega Rogério Mollica referenciou o resultado do julgamento do tema n. 1046, levado à efeito pela Corte Especial do STJ aos 16.03.2022, para assim fixar a tese de que a aplicação equitativa não é permitida quando os valores da condenação ou da causa, ou do proveito econômico da demanda, forem considerados elevados, sendo obrigatória a observância da regra objetiva do art. 85. §§s 2º e 3º do CPC5, tendo a tese presente em referido precedente obrigatório também sido aplicada pelo STF6 Finalmente restou publicado o acórdão oriundo do aludido tema n. 1046, valendo transcrever tanto a proposta de afetação quanto a ementa do quanto restou decidido, no sentido de afastar a aplicação da fixação de honorários advocatícios por equidade além da hipótese legal prevista no art. 85, § 8º, do CPC:  "PROCESSUAL CIVIL. PROPOSTA DE AFETAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. RITO DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS. ART. 256-I C/C ART. 256-E DO RISTJ, NA REDAÇÃO DA EMENDA REGIMENTAL 24, DE 28/09/2016. ART. 85, § 8º, DO CPC. DEFINIÇÃO DO ALCANCE DO DISPOSITIVO NAS DEMANDAS EM QUE ELEVADOS O VALOR DA CAUSA OU O PROVEITO ECONÔMICO. MULTIPLICIDADE DE PROCESSOS. PARTICIPAÇÃO DE AMICI CURIAE. ART. 138 DO CPC. DESNECESSIDADE DE DETERMINAÇÃO DA SUSPENSÃO DOS PROCESSOS QUE VERSEM SOBRE A QUESTÃO. ART. 1.037, INC. II, DO CPC. PROPOSTA DE AFETAÇÃO ACOLHIDA. 1. Delimitação da controvérsia: "Definição do alcance da norma inserta no § 8º do artigo 85 do Código de Processo Civil nas causas em que o valor da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados.". 2. Recurso especial afetado ao rito do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015 (art. 256-I c/c art. 256-E do RISTJ, na redação da Emenda Regimental 24, de 28/09/2016). 3. Convite à Ordem dos Advogados do Brasil - OAB, à União, ao Colégio Nacional de Procuradorias-Gerais dos Estados e do Distrito Federal - CONPEG, ao Instituto Brasileiro de Direito Processual - IBDP, e à Associação Norte e Nordeste de Professores de Processo - ANNEP, para atuação como amici curiae. 4. Afastada a determinação de suspensão nacional dos processos que versem sobre a matéria. 5. Acolhida a proposta de afetação do recurso especial como representativo da controvérsia, para que seja julgado na Corte Especial (afetação conjunta dos Recursos Especiais 1.850.512/SP e 1.877.883/SP). "PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL SOB O RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. ART. 85, §§ 2º, 3°, 4°, 5°, 6º E 8º, DO CPC. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. VALORES DA CONDENAÇÃO, DA CAUSA OU PROVEITO ECONÔMICO DA DEMANDA ELEVADOS. IMPOSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO POR APRECIAÇÃO EQUITATIVA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. RECURSO JULGADO SOB A SISTEMÁTICA DO ART. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015, C/C O ART. 256-N E SEGUINTES DO REGIMENTO INTERNO DO STJ. 1. O objeto da presente demanda é definir o alcance da norma inserta no § 8º do artigo 85 do CPC, a fim de compreender as suas hipóteses de incidência, bem como se é permitida a fixação dos honorários por apreciação equitativa quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. 2. O CPC/2015 pretendeu trazer mais objetividade às hipóteses de fixação dos honorários advocatícios e somente autoriza a aplicação do § 8º do artigo 85 - isto é, de acordo com a apreciação equitativa do juiz - em situações excepcionais em que, havendo ou não condenação, estejam presentes os seguintes requisitos: 1) proveito econômico irrisório ou inestimável, ou 2) valor da causa muito baixo. Precedentes. 3. A propósito, quando o § 8º do artigo 85 menciona proveito econômico "inestimável", claramente se refere àquelas causas em que não é possível atribuir um valor patrimonial à lide (como pode ocorrer nas demandas ambientais ou nas ações de família, por exemplo). Não se deve confundir "valor inestimável" com "valor elevado". 4. Trata-se, pois, de efetiva observância do Código de Processo Civil, norma editada regularmente pelo Congresso Nacional, no estrito uso da competência constitucional a ele atribuída, não cabendo ao Poder Judiciário, ainda que sob o manto da proporcionalidade e razoabilidade, reduzir a aplicabilidade do dispositivo legal em comento, decorrente de escolha legislativa explicitada com bastante clareza. 5. Percebe-se que o legislador tencionou, no novo diploma processual, superar jurisprudência firmada pelo STJ no que tange à fixação de honorários por equidade quando a Fazenda Pública fosse vencida, o que se fazia com base no art. 20, § 4º, do CPC revogado. O fato de a nova legislação ter surgido como uma reação capitaneada pelas associações de advogados à postura dos tribunais de fixar honorários em valores irrisórios, quando a demanda tinha a Fazenda Pública como parte, não torna a norma inconstitucional nem autoriza o seu descarte. 6. A atuação de categorias profissionais em defesa de seus membros no Congresso Nacional faz parte do jogo democrático e deve ser aceita como funcionamento normal das instituições. Foi marcante, na elaboração do próprio CPC/2015, a participação de associações para a promoção dos interesses por elas defendidos. Exemplo disso foi a promulgação da Lei n. 13.256/2016, com notória gestão do STF e do STJ pela sua aprovação. Apenas a título ilustrativo, modificou-se o regime dos recursos extraordinário e especial, com o retorno do juízo de admissibilidade na segunda instância (o que se fez por meio da alteração da redação do art. 1.030 do CPC). 7. Além disso, há que se ter em mente que o entendimento do STJ fora firmado sob a égide do CPC revogado. Entende-se como perfeitamente legítimo ao Poder Legislativo editar nova regulamentação legal em sentido diverso do que vinham decidindo os tribunais. Cabe aos tribunais interpretar e observar a lei, não podendo, entretanto, descartar o texto legal por preferir a redação dos dispositivos decaídos. A atuação do legislador que acarreta a alteração de entendimento firmado na jurisprudência não é fenômeno característico do Brasil, sendo conhecido nos sistemas de Common Law como overriding. 8. Sobre a matéria discutida, o Enunciado n. 6 da I Jornada de Direito Processual Civil do Conselho da Justiça Federal - CJF afirma que: "A fixação dos honorários de sucumbência por apreciação equitativa só é cabível nas hipóteses previstas no § 8º, do art. 85 do CPC." 9. Não se pode alegar que o art. 8º do CPC permite que o juiz afaste o art. 85, §§ 2º e 3º, com base na razoabilidade e proporcionalidade, quando os honorários resultantes da aplicação dos referidos dispositivos forem elevados. 10. O CPC de 2015, preservando o interesse público, estabeleceu disciplina específica para a Fazenda Pública, traduzida na diretriz de que quanto maior a base de cálculo de incidência dos honorários, menor o percentual aplicável. O julgador não tem a alternativa de escolher entre aplicar o § 8º ou o § 3º do artigo 85, mesmo porque só pode decidir por equidade nos casos previstos em lei, conforme determina o art. 140, parágrafo único, do CPC. 11. O argumento de que a simplicidade da demanda ou o pouco trabalho exigido do causídico vencedor levariam ao seu enriquecimento sem causa - como defendido pelo amicus curiae COLÉGIO NACIONAL DE / CONPEG - deve ser utilizado não para respaldar apreciação por equidade, mas sim para balancear a fixação do percentual dentro dos limites do art. 85, § 2º, ou dentro de cada uma das faixas dos incisos contidos no § 3º do referido dispositivo. 12. Na maioria das vezes, a preocupação com a fixação de honorários elevados ocorre quando a Fazenda Pública é derrotada, diante da louvável consideração com o dinheiro público, conforme se verifica nas divergências entre os membros da Primeira Seção. É por isso que a matéria já se encontra pacificada há bastante tempo na Segunda Seção (nos moldes do REsp n. 1.746.072/PR, relator para acórdão Ministro Raul Araújo, DJe de 29/3/2019), no sentido de que os honorários advocatícios sucumbenciais devem ser fixados no patamar de 10% a 20%, conforme previsto no art. 85, § 2º, inexistindo espaço para apreciação equitativa nos casos de valor da causa ou proveito econômico elevados. 13. O próprio legislador anteviu a situação e cuidou de resguardar o erário, criando uma regra diferenciada para os casos em que a Fazenda Pública for parte. Foi nesse sentido que o art. 85, § 3º, previu a fixação escalonada de honorários, com percentuais variando entre 1% e 20% sobre o valor da condenação ou do proveito econômico, sendo os percentuais reduzidos à medida que se elevar o proveito econômico. Impede-se, assim, que haja enriquecimento sem causa do advogado da parte adversa e a fixação de honorários excessivamente elevados contra o ente público. Não se afigura adequado ignorar a redação do referido dispositivo legal a fim de criar o próprio juízo de razoabilidade, especialmente em hipótese não prevista em lei. 14. A suposta baixa complexidade do caso sob julgamento não pode ser considerada como elemento para afastar os percentuais previstos na lei. No ponto, assiste razão ao amicus curiae Instituto Brasileiro de Direito Processual - IBDP, quando afirma que "esse dado já foi levado em consideração pelo legislador, que previu 'a natureza e a importância da causa' como um dos critérios para a determinação do valor dos honorários (art. 85, § 2º, III, do CPC), limitando, porém, a discricionariedade judicial a limites percentuais. Assim, se tal elemento já é considerado pelo suporte fático abstrato da norma, não é possível utilizá-lo como se fosse uma condição extraordinária, a fim de afastar a incidência da regra". Idêntico raciocínio se aplica à hipótese de trabalho reduzido do advogado vencedor, uma vez que tal fator é considerado no suporte fático abstrato do art. 85, § 2º, IV, do CPC ("o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço"). 15. Cabe ao autor - quer se trate do Estado, das empresas, ou dos cidadãos - ponderar bem a probabilidade de ganhos e prejuízos antes de ajuizar uma demanda, sabendo que terá que arcar com os honorários de acordo com o proveito econômico ou valor da causa, caso vencido. O valor dos honorários sucumbenciais, portanto, é um dos fatores que deve ser levado em consideração no momento da propositura da ação. 16. É muito comum ver no STJ a alegação de honorários excessivos em execuções fiscais de altíssimo valor posteriormente extintas. Ocorre que tais execuções muitas vezes são propostas sem maior escrutínio, dando-se a extinção por motivos previsíveis, como a flagrante ilegitimidade passiva, o cancelamento da certidão de dívida ativa, ou por estar o crédito prescrito. Ou seja, o ente público aduz em seu favor a simplicidade da causa e a pouca atuação do causídico da parte contrária, mas olvida o fato de que foi a sua falta de diligência no momento do ajuizamento de um processo natimorto que gerou a condenação em honorários. Com a devida vênia, o Poder Judiciário não pode premiar tal postura. 17. A fixação de honorários por equidade nessas situações - muitas vezes aquilatando-os de forma irrisória - apenas contribui para que demandas frívolas e sem possibilidade de êxito continuem a ser propostas diante do baixo custo em caso de derrota. 18. Tal situação não passou despercebida pelos estudiosos da Análise Econômica do Direito, os quais afirmam com segurança que os honorários sucumbenciais desempenham também um papel sancionador e entram no cálculo realizado pelas partes para chegar à decisão - sob o ponto de vista econômico - em torno da racionalidade de iniciar um litígio. 19. Os advogados devem lançar, em primeira mão, um olhar crítico sobre a viabilidade e probabilidade de êxito da demanda antes de iniciá-la. Em seguida, devem informar seus clientes com o máximo de transparência, para que juntos possam tomar a decisão mais racional considerando os custos de uma possível sucumbência. Promove-se, dessa forma, uma litigância mais responsável, em benefício dos princípios da razoável duração do processo e da eficiência da prestação jurisdicional. 20. O art. 20 da "Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro" (Decreto-Lei n. 4.657/1942), incluído pela Lei n. 13.655/2018, prescreve que, "nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão". Como visto, a consequência prática do descarte do texto legal do art. 85, §§ 2º, 3º, 4º, 5º, 6º e 8º, do CPC, sob a justificativa de dar guarida a valores abstratos como a razoabilidade e a proporcionalidade, será um poderoso estímulo comportamental e econômico à propositura de demandas frívolas e de caráter predatório. 21. Acrescente-se que a postura de afastar, a pretexto de interpretar, sem a devida declaração de inconstitucionalidade, a aplicação do § 8º do artigo 85 do CPC/2015, pode ensejar questionamentos acerca de eventual inobservância do art. 97 da CF/1988 e, ainda, de afronta ao verbete vinculante n. 10 da Súmula do STF. 22. Embora não tenha sido suscitado pelas partes ou amigos da Corte, não há que se falar em modulação dos efeitos do julgado, uma vez que não se encontra presente o requisito do art. 927, § 3º, do CPC. Isso porque, no caso sob exame, não houve alteração de jurisprudência dominante do STJ, a qual ainda se encontra em vias de consolidação. 23. Assim, não se configura a necessidade de modulação dos efeitos do julgado, tendo em vista que tal instituto visa a assegurar a efetivação do princípio da segurança jurídica, impedindo que o jurisdicionado de boa-fé seja prejudicado por seguir entendimento dominante que terminou sendo superado em momento posterior, o que, como se vê claramente, não ocorreu no caso concreto. 24. Teses jurídicas firmadas: i) A fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória nesses casos a observância dos percentuais previstos nos §§ 2º ou 3º do artigo 85 do CPC - a depender da presença da Fazenda Pública na lide -, os quais serão subsequentemente calculados sobre o valor: (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa. ii) Apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo. 25. Recurso especial conhecido e provido, devolvendo-se o processo ao Tribunal de origem, a fim de que arbitre os honorários observando os limites contidos no art. 85, §§ 3°, 4°, 5° e 6º, do CPC, nos termos da fundamentação. 26. Recurso julgado sob a sistemática do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015 e art. 256-N e seguintes do Regimento Interno do STJ. (STJ, REsp 1.850.512/SP, Rel. Min. Og Fernandes, Corte Especial, j. 16/03/2022, DJe 31/05/2022, maioria de votos, grifou-se) Respeitados os entendimentos em sentido contrário ao quanto decidido por maioria de votos pela Corte Especial do STJ, não se pode fechar os olhos de que a intepretação de aplicação da equidade na fixação de honorários advocatícios além da hipótese prevista no art. 85, § 8º do CPC, não obstante na contramão da inteligência do art. 85, § 2º, é limitada ao deixar ao desprezar que; (i)  a condenação da verba sucumbencial constitui ônus financeiro do processo, a desestimular a litigância frívola informada por pedidos dotados de valores exorbitantes, sabedor o autor da demanda (ou o réu, que resiste indevidamente a pretensão autoral), que eventual sucumbência há de incidir em percentual sobre a soma financeira de tais pedidos ou valor da causa, a se materializar, em respeito à boa-fé e cooperação, a formulação de pedidos responsáveis e alinhados com a medida daquilo que o autor efetivamente acredita que tem razão;7 (ii) demandas cujos valores envolvidos soam exorbitantes podem por vezes ser resolvidas mediante meios alternativos de autocomposição, porquanto os litigantes, cientes de que eventual verba sucumbencial proporcional aos valores em disputa será alta, por meio de composições mútuas, podem chegar a um denominador comum em acordo que evitará o litígio judicial e risco de incidência de elevada verba honorária advocatícia sucumbencial; (iii) de igual sorte, a verba honorária sucumbencial fixada em parâmetros elevados (em verdade, cumprindo-se a regra do art. 85, § 2º, do CPC/2015), também desestimula a recorribilidade protelatória, porquanto sobre referida verba arbitrada, na eventualidade de manutenção da decisão impugnada, há de ser majorados os honorários sucumbenciais (art. 85, § 11º, do CPC/2015); (iv) sob tal prisma, atinge-se um dos desideratos do CPC/2015, voltado a desestimular o ajuizamento de ações e a interposição desenfreada de recursos (ou cultura de se recorrer sempre). De outra banda, tal objetivo torna-se letra morta acaso prevaleça entendimento de que, casuisticamente caberá ao julgador decidir se aplica o art. 85, § 2º ou, relativiza sua aplicação mediante interpretação extensiva da equidade, prevista no art. 85, § 8º; (v) Até porque, o subjetivismo do julgador, nitidamente cambiante para se subsumir que a verba honorária advocatícia seria excessiva (que varia no tempo, espaço e cultura do magistrado), também impactará no estímulo a recorribilidade, a se tornar mais um tema que desnecessariamente congestionará a pauta dos tribunais e tribunais superiores, dado que o que para determinado tribunal figura como honorários excessivos, para outro ministro pode se subsumir que não; (vi) No mais, o subjetivismo interpretativo daquilo que seria considerado honorários excessivos, trazem como efeito pernicioso a coexistência de decisões díspares, senão contraditórias e divorciadas de uniformização - determinado órgão jurisdicional pode entender que "x", a título de honorários, é excessivo, ao passo em que o mesmo valor pode ser interpretado por outro órgão jurisdicional como algo condizente a se aplicar o art. 85, § 2º - a se macular a própria imagem da jurisdição (que se espera aplicar o direito de forma uma), porquanto presente a insegurança jurídica, ausência de previsibilidade e quebra da isonomia ao se aplicar o dispositivo para dado caso concreto e negar sua vigência em outro; (vii) Também não se pode perder de vista que é comum na advocacia por vezes o causídico aceitar patrocinar determinada causa sem nada receber para remunerar seu trabalho, a labutar na incerteza se vencerá ou não em favor de seu cliente, porém contratados honorários ad exitum ou tão-somente dado o interesse do causídico na elevada verba sucumbencial uma vez aplicado o comando do art. 85, § 2º, do CPC/2015 e; (viii) Tal prática em que, indiretamente proporciona o acesso à justiça àqueles que não têm condições de, de plano, honrar o pagamento de honorários contratuais, restará mitigada acaso a fixação da verba honorária sucumbencial tangencie a regra prevista no art. 85, § 2º, do CPC/2015. Espera-se que o quanto decidido pela Corte Especial do STJ ao fixar tese firmada no tema n. 1046, por meio da técnica de julgamento de recursos repetitivos seja respeitado pelos órgãos fracionários (com o aval inclusive do STF, conforme mencionado acima), em especial os recursos especiais sobrestados que tratam desta matéria, a viabilizar a aplicação do precedente obrigatório na forma prevista nos arts. 1.039 e 1.040, II, do CPC ________________ 1 Disponível aqui. 2 Disponível aqui. 3 Disponível aqui. 4 Disponível aqui. 5 Disponível aqui. 6 Disponível aqui. 7 Ou, valendo-se do clássico ensinamento de Chiovenda: "Il processo deve dare per quanto è possibile praticamente a chi ha um diritto tutto quello e proprio quello ch'egli ha diritto di conseguire". In. CHIOVENDA, Giuseppe. Instituzioni di diritto processuale civile, v. 1. 2. Ed. Napoli: Jovene, 1935, p. 42. "O processo deve dar, na medida do possível, a quem tem um direito, tudo aquilo e exatamente aquilo que tem direito de conseguir", tradução livre.
Em decisão proferida há 5 (cinco) anos, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) decidiu que não caberia a condenação ao pagamento de honorários advocatícios no incidente de desconsideração da personalidade jurídica disciplinado pelos artigos 133 a 137 do Código de Processo Civil (CPC), quando, ao final, se entender que não teriam restadas comprovadas as hipóteses autorizadoras da medida prevista do art. 50 do Código Civil (CC).* No caso concreto, julgado em 07.02.2017, pela 37ª Câmara de Direito Privado do TJSP, nos autos do Agravo de Instrumento n. 2230826-35.2016.8.26.0000, da Comarca de Santos, durante a fase de cumprimento de sentença, foi instaurado e acolhido o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, em primeiro grau de jurisdição. Entretanto, os sócios atingidos pela decisão de desconsideração da personalidade jurídica interpuseram recurso de agravo de instrumento, conforme autorizado expressamente pelo art. 1.015, inciso IV, do CPC. No referido recurso, os sócios argumentaram que não restaram comprovadas nenhuma das hipóteses autorizadoras de desconsideração da personalidade jurídica discriminadas pelo artigo 50 do CC (confusão patrimonial ou desvio de finalidade), enfatizando que a mera inexistência de bens em nome da sociedade para pagar o valor objeto da execução movida em face da pessoa jurídica não autorizaria a adoção desta medida extrema. Assim, em sede recursal, pediram a reforma da decisão do incidente de desconsideração da personalidade jurídica que havia acolhido o pedido dos credores com base no art. 50 do CC, para afastar o decreto de desconsideração da personalidade jurídica, com a exclusão dos sócios do polo passivo da demanda e desbloqueio de valores eventualmente bloqueados, bem como condenar a parte que pediu a instauração do incidente a arcar com os ônus da sucumbência. Ocorre que o TJSP, reconhecendo que não houve demonstração de abuso da personalidade jurídica, acolheu o primeiro pedido acima mencionado, mas não acolheu o segundo pedido de condenação ao pagamento dos ônus de sucumbência por parte daqueles que requereram a instauração do incidente e terminaram vencidos. O julgado foi assim ementado: "Agravo de instrumento. Cumprimento de sentença. Incidente de desconsideração da personalidade jurídica acolhido. Insurgência dos sócios incluídos no polo passivo, ora Agravantes, sob o argumento de que não restaram comprovadas quaisquer das hipóteses autorizadoras da medida, previstas no artigo 50 do Código Civil. Medida que é excepcional, a ser deferida apenas em caso de desvio de finalidade ou de confusão patrimonial. Mera inexistência de bens em nome da pessoa jurídica para cobrir a execução não constitui motivo suficiente para a desconsideração da personalidade jurídica. Precedentes jurisprudenciais. Honorários advocatícios que não são cabíveis no caso. Ausência de previsão a esse respeito no CPC/15, que é taxativo quanto às hipóteses em que se mostram passíveis de fixação. Mero incidente no curso do processo que não autoriza a fixação de honorários. Atuação dos patronos que será avaliada como um todo no final do processo. Recurso parcialmente provido. (Relator: João Pazine Neto; Comarca: Santos; Órgão julgador: 37ª Câmara de Direito Privado; Data do julgamento: 07/02/2017; Data de registro: 08/02/2017, sem os destaques)". Como se pode perceber da simples leitura da ementa do julgado acima transcrita, o argumento utilizado pelo TJSP para negar o pedido de condenação ao pagamento de honorários advocatícios aos vencedores no incidente de desconsideração da personalidade jurídica é a ausência de previsão a esse respeito no CPC, que seria taxativo quanto às hipóteses de arbitramento de honorários desta natureza. Da leitura mais atenta do v. acórdão, percebe-se que há ainda outro argumento utilizado para se negar a condenação ao pagamento da verba sucumbencial pelo vencido ao vencedor. Confira-se, a propósito, o trecho do v. acórdão que trata do assunto: "(...) Por fim, não merece acolhida o pleito para fixação de honorários advocatícios em razão do acolhimento do incidente, pois não são cabíveis no caso. Insta ressaltar a ausência de previsão a esse respeito no CPC/15 que, diga-se de passagem, é extensamente enumerativo quanto às hipóteses em que possível tal fixação (art. 85, § 1º). Mero incidente no curso do processo, o que é o caso dos autos, não autoriza a fixação de honorários. Ademais, a atuação dos patronos será avaliada como um todo no final do processo, para fixação da verba honorária sucumbencial (...). Em outras palavras, os argumentos utilizados para se negar a condenação ao pagamento de honorários advocatícios no incidente de desconsideração da personalidade jurídica são os seguintes: (a) ausência de previsão legal no CPC, que teria um rol taxativo de hipótese de pagamentos de honorários no art. 85, § 1º; (b) descabimento de fixação de honorários em mero incidente no curso do processo, uma vez que a atuação dos advogados "será avaliada como um todo no final do processo". Depois desse julgamento ocorrido no TJSP, outros julgamentos no mesmo sentido começaram a surgir no Superior Tribunal de Justiça (STJ) sustentando haver "ausência de previsão legal"1 para condenação do vencido no incidente de desconsideração da personalidade jurídica ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência. Com o devido respeito, não se pode concordar com os entendimentos acima mencionados no que diz respeito à suposta impossibilidade de condenação ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais por parte daquele que sai vencido no incidente de desconsideração da personalidade jurídica pelas razões abaixo articuladas. Não se desconhece o fato de que o art. 85, § 1º, do CPC, estabelece hipóteses em que é cabível a condenação ao pagamento de honorários advocatícios e não menciona o incidente de desconsideração da personalidade jurídica. Com efeito, o referido dispositivo legal, após fixar que "a sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor" (CPC, art. 85, caput), menciona que "são devidos honorários advocatícios na reconvenção, no cumprimento de sentença, provisório ou definitivo, na execução, resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente" (CPC, art. 85, § 1º). No entanto, isso não é o suficiente para afirmar que esse rol do § 1º do art. 85 do CPC seria taxativo, pois a própria lei processual estabelece em outras passagens a possibilidade de se condenar alguém ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais. Veja-se, por exemplo, a hipótese do parágrafo único do art. 129 do CPC, que trata da denunciação da lide: "se o denunciante for vencedor, a ação de denunciação não terá o seu pedido examinado, sem prejuízo da condenação do denunciante ao pagamento das verbas de sucumbência em favor do denunciado". A propósito, na situação descrita pelo parágrafo único do art. 129 do CPC, fica claro que o sistema processual permite, em hipóteses nas quais ocorra o encerramento do processo por meio de decisões que decidam parcialmente o mérito, a condenação ao vencido de pagamento de honorários advocatícios ao advogado do vencedor. Nesse sentido, Thiago Asfor Rocha Lima e Marcus Claudius Saboia Rattacaso observam que "ao que parece, o legislador nunca pretendeu tornar a fixação dos honorários parciais a regra do sistema, pois, se assim o fosse, poderia ter feito, quando menos, nas alterações processuais de 2005, ou dez anos depois, quando da promulgação do Novo CPC. Isso, todavia, não impede o magistrado, em situações específicas e justificadas, de estabelecer os honorários de sucumbências parciais e nas decisões parciais de mérito. Isso é possível de ocorrer não apenas nos casos de extinção do processo em relação a uma das partes, por ilegitimidade, exempli gratia - visto que nesse caso a parte excluída não participará da decisão final - mas também quando houver desistência, renúncia ou reconhecimento parcial do pedido (art. 90, caput e § 1º) e ainda nos casos de parcela do pedido se mostrar incontroverso ou em imediatas condições de julgamento (art. 356, inciso II), seja por desnecessidade de produção de provas novas, seja por se operarem os efeitos de revelia"2. Assim, nas hipóteses em que o pedido de desconsideração da personalidade jurídica é julgado improcedente, após a regular tramitação do incidente sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, fica claro que o sócio, que era considerado parte no processo por ter sido citado (CPC, art. 135), inclusive com comunicação do ocorrido ao distribuidor (CPC, art. 134, § 1º), será excluído do processo, que será extinto em relação a ele, pelo menos3. Trata-se, evidentemente, de uma decisão interlocutória de mérito aquela de decide o incidente de desconsideração da personalidade jurídica acolhendo ou rejeitando o pedido, conforme já se manifestou Eduardo Talamini: "A decisão pode não chegar a julgar o mérito da demanda de desconsideração, nas hipóteses do art. 485 do CPC/2015 (por exemplo, constata-se que já houve sentença entre as mesmas partes rejeitando a possibilidade da desconsideração pretendida, havendo coisa julgada que proíbe nova decisão da questão, art. 485, V). Mas tendo julgado o mérito do pedido de desconsideração, seja para acolhê-lo, seja para rejeitá-lo, a decisão do incidente fará coisa julgada material, assim que transitar em julgado (i.e., uma vez não interposto recurso ou exaurido todos os cabíveis). Trata-se de uma decisão interlocutória de mérito, apta a fazer coisa julgada material (arts. 356, § 3.º, e 502, do CPC/2015)"4. Nesse particular, vale a pena observar que a ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça, compartilhava desse mesmo entendimento quando ao cabimento de fixação de honorários de sucumbência em incidentes processuais como o de desconsideração da personalidade jurídica, quando proferiu o voto vencido no julgamento cuja ementa está abaixo transcrita: RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO NA ORIGEM. INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DESCABIMENTO. ART. 85, § 1º, DO CPC/2015. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Não é cabível a condenação em honorários advocatícios em incidente processual, ressalvados os casos excepcionais. Precedentes. 2. Tratando-se de incidente de desconsideração da personalidade jurídica, o descabimento da condenação nos ônus sucumbenciais decorre da ausência de previsão legal excepcional, sendo irrelevante se apurar quem deu causa ou foi sucumbente no julgamento final do incidente. 3. Recurso especial provido. (REsp 1845536/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/05/2020, DJe 09/06/2020) Tanto isso é verdade, que a Min. Nancy Andrighi, em aditamento ao seu voto vencido, fez questão de esclarecer o seguinte: "No que importa à fixação de honorários e à correta interpretação do alcance do art. 85, caput e seu parágrafo § 1º, do CPC/15, é relevante notar que o CPC/15 inovou o sistema do CPC/73 no tocante aos novos critérios por meio dos quais são classificados os atos do juiz. Quanto ao tema, na redação original do CPC/73, as sentenças eram caracterizadas pelos atos do juiz que envolvessem decisões de mérito do processo, as quais, por sua vez, somente eram tomadas no julgamento final da lide na fase de conhecimento, por meio do pronunciamento único e uno, que marcava o final da tramitação da ação no primeiro grau de jurisdição. Vigia, portanto, no código revogado, a teoria da unidade estrutural da sentença, de modo que todas as demais decisões que não pusessem fim ao processo ostentariam a natureza de decisões interlocutórias. Paulatinamente, todavia, em busca de maior celeridade e efetividade na prestação jurisdicional, passaram a ser previstas hipóteses em que tutelas demérito satisfativas poderiam ser concedidas independentemente de regular instrução e até mesmo antes do final do processo, o que ocorreu, sobretudo, em virtude das alterações veiculadas pela Lei 11.232/2005 no CPC/73. A despeito das citadas alterações da Lei 11.232/2005, prevaleceu na jurisprudência, no entanto, que o CPC/73 não teria abandonado a classificação das sentenças a partir o critério da extinção do processo ou da fase processual. De fato, segundo o entendimento desta Terceira Turma, "permaneceu, dessa forma, no Código de Processo Civil de 1973 a teoria da unidade estrutural da sentença, a obstar a ocorrência de pluralidade de sentenças em uma mesma fase processual" (REsp 1281978/RS, Terceira Turma, DJe 20/05/2015). O CPC/15 inovou radicalmente, entretanto, o tratamento da matéria, ao passar a prever expressamente, em seus arts. 354, parágrafo único, e 356, a possibilidade do fracionamento do julgamento de mérito. Sob a nova disciplina do CPC/15, consoante ressalta a doutrina, "é expressamente permitido o fracionamento do julgamento do mérito, com a prolação de decisão parcial e, posteriormente, no mesmo processo, de sentença para julgamento do(s) pedido(s) restante(s)", de forma que "o CPC/2015, pelo seu art. 356 e pelo parágrafo único de seu art. 354, deu traços adequados à questão e colocou fim ao dogma da unicidade da sentença" (CAMARGO, Luiz Henrique Volpe. Honorários advocatícios em decisões parciais de mérito e em decisões parciais sem mérito. Revista de Processo: RePro, São Paulo, v. 43, n. 283, p. 133-151, set. 2018, sem destaque no original). Dessa forma, no atual CPC, por não mais viger o princípio da unicidade da sentença e, tampouco, a teoria da unidade estrutural, o exame de uma determinada questão ou capítulo do pedido pode encerrar uma parcela da demanda com resolução parcial do mérito ou mesmo acarretar a extinção parcial do processo sem resolução de mérito. Essa decisão terá natureza de decisão parcial de mérito, mesmo que possua natureza interlocutória e seja impugnável por agravo de instrumento, conforme prevê o art. 354, parágrafo único, do CPC/15, persistindo, assim, parcelas remanescentes do processo a serem examinadas somente ao fim da fase processual do primeiro grau de jurisdição. Trata-se, de fato, da fragmentação da coisa julgada, a partir da qual "existe a possibilidade de serem proferidas, no curso do processo, várias decisões com capacidade para se tornarem indiscutíveis pela coisa julgada, razão pela qual um mesmo processo poderá produzir tantas coisas julgadas quantas tenham sido as decisões proferidas que tenham essa aptidão" (CASTELO, Fernando Alcântara. A coisa julgada parcial e o problema do termoinicial para a propositura da ação rescisória no CPC de 2015. Revista de Processo: RePro, São Paulo, v. 43, n. 277, p. 283-304, mar. 2018., sem destaque no original). Portanto, mesmo que não exista menção expressa no art. 85, caput e § 1º, do CPC/15, não há razão para se interpretar restritivamente as hipóteses de decisões que decidam o mérito das distintas controvérsias e, por consequência, as de cabimento de honorários de sucumbência"5. Assim, na vigência do CPC de 2015, as decisões interlocutórias de mérito têm o condão de gerar coisa julgada material e são equivalentes a uma sentença, não fazendo sentido o argumento, à luz da lei atual, de alegar que o caput do art. 85 do CPC faz referência apenas às sentenças e que, por isso, não haveria previsão legal para condenação do vencido no incidente de desconsideração da personalidade jurídica ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência. Ora, em razão do não acolhimento do pedido de desconsideração da personalidade jurídica, o sócio ou administrador da pessoa jurídica que contratou advogados para se defender no prazo de 15 (quinze) dias e requereu a produção de provas (CPC, art. 135), inclusive periciais e testemunhais, será excluído da demanda originária, sem poder participar do processo principal até decisão final, após terminada a suspensão a que se refere o § 3º do art. 134. O que se busca demonstrar é que não é justo que alguém (sócio ou administrador de pessoa jurídica, nos termos do art. 50 do CC), a quem foi imputado um fato grave de desvio de finalidade ou confusão patrimonial com intuito fraudulento, que teve que contratar advogados para se defender de um pedido de tutela jurisdicional formulado por um credor leviano que queria lhe estender os efeitos de uma obrigação de uma pessoa jurídica para lhe tomar o patrimônio particular, não tenha o direito de - pelo menos - receber honorários de sucumbência e ser reembolsado pelas despesas processuais que antecipou (CPC, art. 82, § 2º). Não há nada de absurdo no que se defende aqui. O integrante da pessoa jurídica que foi atingido por uma decisão de desconsideração da personalidade jurídica teve que se defender de um pedido de tutela jurisdicional contra si e se esse pedido foi considerado infundado, leviano ou, enfim, improcedente, aquele que deu causa à movimentação de toda a máquina judiciária estatal para atingir o patrimônio do sócio ou do administrador da pessoa jurídica, deve arcar com as consequências, dentre elas pagar honorários de sucumbência ao advogado do vencedor (CPC, art. 85) e reembolsar as despesas antecipadas (CPC, art. 82, § 2º). Aliás, o próprio § 1º do art. 322 do CPC, ao tratar do pedido de tutela jurisdicional, que é exatamente o que faz aquele que pede a instauração do incidente a que se referem os artigos 134 e seguintes do CPC ao imputar a alguém o fato de ter realizado uma das hipóteses autorizadoras da desconsideração da personalidade jurídica, alcançando-se o seu patrimônio particular, estabelece que compreendem-se no pedido principal os juros legais, a correção monetária e as verbas de sucumbência, inclusive os honorários advocatícios. Note-se que o próprio Superior Tribunal de Justiça já decidiu por impor o pagamento de honorários advocatícios de sucumbência a quem pleiteou, a título de desconsideração da personalidade jurídica, a inclusão de sócios no pólo passivo de uma execução originariamente movida contra a sociedade da qual faziam parte sem a necessária instauração do incidente: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. INSTAURAÇÃO DO INCIDENTE. NECESSIDADE. NULIDADE RECONHECIDA. SUCUMBÊNCIA. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Segundo o princípio da causalidade, os encargos sucumbenciais devem ser suportados pela parte que deu causa ao ajuizamento da ação. 2. No caso concreto, foi a parte recorrente que pleiteou a inclusão dos sócios no polo passivo da execução, sem instauração do devido incidente de desconsideração da personalidade jurídica da pessoa jurídica executada, e foi este pedido que deu causa ao ajuizamento dos presentes embargos à execução, razão pela qual a recorrente deve arcar com a verba honorária. 3. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 1710393/PR, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 22/03/2021, DJe 13/04/2021) Em outras palavras, se o credor pede a desconsideração da personalidade jurídica para alcançar os bens dos integrantes da pessoa jurídica que até então não eram partes do processo, ele deve estar preparado para todas as consequências de ter um pedido de tutela jurisdicional negado pelo Estado-juiz, sobretudo no sentido de indenizar pelos prejuízos que eventualmente causou aos inocentes que tiveram que vir a juízo se defender, inclusive pagando-lhes honorários advocatícios e reembolsando as despesas incorridas. O argumento de que o Superior Tribunal de Justiça já teria "precedente" da Corte Especial no sentido de não caber arbitramento de honorários advocatícios em sede de incidente processual não sobrevive a uma análise mais detalhada. Isso porque todos os julgamentos que mencionam a existência desse "precedente"6 acerca do não cabimento de tais verbas em incidentes processuais remontam ao ERESsp 1.366.014/SP, que se refere ao Código de Processo Civil de 1973 e não ao de 2015. Confira-se: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. INCIDENTE PROCESSUAL. CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. ART. 20, § 1o. DO CPC/1973. IMPOSSIBILIDADE. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA PROVIDOS. 1. A divergência traçada nestes autos trata apenas da condenação em honorários de sucumbência em sede de incidente processual. 2. A jurisprudência desta Corte entende que a melhor exegese do § 1o. do art. 20 do CPC/1973 não permite, por ausência de previsão nele contida, a incidência de honorários advocatícios em incidente processual ou recurso. 3. Embargos de Divergência providos para reformar o acórdão embargado, e negar provimento ao Recurso Especial de POMPÉIA S.A. EXPORTAÇÃO E COMÉRCIO. (EREsp 1366014/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado em 29/03/2017, DJe 05/04/2017) Cumpre registrar que o julgado acima, com todo o respeito, não se aplica ao Código de Processo Civil atual no tocante ao incidente a que se referem os artigos 133 a 137 do CPC/2015 por, pelo menos, dois motivos: não havia incidente de desconsideração da personalidade jurídica no CPC/1973 e não havia dispositivo semelhante ao art. 356 do CPC/2015, que permite expressamente a decisão parcial de mérito. Portanto, invocar o julgado acima (refiro-me ao EREsp 1.366.014/SP) para justificar o não cabimento de condenação em honorários em incidente de desconsideração da personalidade jurídica parece ser uma interpretação descabida e incompatível com a boa-fé. Em outras palavras, naquela ocasião, a Corte Especial do STJ referia-se a outros incidentes e não tinha em mente a possibilidade de decisões parciais de mérito. Ademais, conforme já tivemos oportunidade de sustentar em outra ocasião, "(...) caso se descubra depois que não era hipótese de se desconsiderar a personalidade jurídica, nascerá para o prejudicado um direito de pleitear indenização, e somente quem pediu e se beneficiou com essa medida excepcional é que estará legitimado a indenizar (...)"7. A indenização pelos prejuízos causados com um pedido de desconsideração julgado improcedente - certamente devida - pode até ter lugar em um outro processo, mas a fixação de honorários advocatícios em favor do vencedor no incidente ao qual se refere o art. 134 e seguintes do CPC deve ser fixado no momento em que o juiz proferir a decisão interlocutória do art. 136, caput, do CPC ("Concluída a instrução, se necessária, o incidente será resolvido por decisão interlocutória"). Nesse sentido é a tese de Christian Garcia Vieira, apresentada para obtenção do título de Doutor na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo: "Afinal, uma vez citado o réu, ele irá constituir advogado, ingressar no feito e, exemplificativamente, apresentar defesa para demonstrar a inexistência de atos de confusão patrimonial que justificariam a inaplicabilidade do instituto no caso concreto. Há uma decorrência lógica de que o autor, que propôs a demanda, caso derrotado, remunere as custas e os honorários advocatícios ao réu (e vice-versa)"8. Também não é outro o entendimento de Eduardo Talamini, que observa o seguinte: "A decisão final do incidente condenará o vencido nas verbas de sucumbência (custas e honorários de advogado). Se a desconsideração for provida, o sócio ou sociedade responde por tais verbas. Se for rejeitada, a parte que a requereu é a responsável"9. Portanto, como a atuação do advogado que defendeu o sócio ou o administrador da pessoa jurídica no incidente de desconsideração da personalidade desta última não acompanhará o processo até o final porque o seu cliente foi excluído do seu polo passivo, a fixação das verbas de sucumbência não pode ser depois, ao final da demanda originária. Ela deve ser feita ao final do incidente, quando ele for acolhido ou rejeitado. Diante do exposto, conforme amplamente demonstrado, o art. 85, § 1º, do CPC, não apresenta um rol taxativo das hipóteses de cabimento de condenação do vencido ao pagamento de honorários advocatícios ao advogado do vencedor. Trata-se de um rol meramente exemplificativo, considerando-se que em outras passagens do CPC também se estabelece a condenação dos honorários advocatícios sucumbenciais, tais como o parágrafo único do art. 127. Vale reproduzir, uma vez mais, as palavras da Min. Nancy Andrighi, antes de se render à maioria circunstancial da Terceira Turma do STJ, acima mencionada: "(...) somente não há fixação de honorários nas resoluções dos incidentes processuais se a decisão do incidente se enquadrar como uma pura, genuína ou típica interlocutória, em que não ocorre o julgamento de mérito de algum capítulo do pedido ou a extinção do processo em relação a determinado litigante (...)"10. No caso do incidente de desconsideração, o sócio e o administrador podem ser citados para apresentar defesa no prazo de 15 (quinze) dias, pleiteando a produção de provas que entender necessárias. Trata-se, portanto, de trabalho significativo realizado pelo advogado daquele que é citado para se defender em um incidente de desconsideração da personalidade jurídica, semelhante ao trabalho de qualquer outro colega que atue em processo autônomo para defender os interesses de seu cliente. Portanto, o advogado deve fazer jus aos honorários referidos no art. 85 do CPC, sob pena de seu trabalho ficar sem a devida remuneração, ainda que tenha ocorrido a extinção do processo com relação ao seu cliente. A atuação desse advogado que atua no incidente de desconsideração da personalidade jurídica para defender o sócio ou administrador não poderá ser avaliada ao final do processo para se verificar se ele agiu de acordo com os parâmetros do ar. 85, § 2º, incisos I a IV, do CPC, devido ao fato de que ele não atuará mais no processo em que foi decidido sobre a desconsideração da personalidade jurídica em caráter definitivo, julgando-se improcedente o pedido. Uma vez proferida decisão que indefere a desconsideração, cessa-se a suspensão que havia sido determinada em atenção ao art. 136 do CPC e o processo volta a correr exclusivamente entre as suas partes originárias. Ou seja, não há o que mais avaliar no tocante à conduta do advogado do sócio ou do administrador que saiu vencedor do incidente de desconsideração da personalidade jurídica porque ele simplesmente não atuará mais no processo que não diz respeito aos seus clientes, todos excluídos da demanda. Portanto, não há qualquer pretexto para se adiar os pagamentos do advogado do vencedor do incidente ao qual se referem os artigos 134 a 137 do CPC, nos termos do art. 85 do mesmo diploma legal. Por idênticas razões, as despesas processuais também devem ser arcadas pelos vencidos, nos termos do § 2º do art. 82 do CPC. Logo, é cabível a condenação de pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais ao advogado do vencedor no incidente de desconsideração da personalidade jurídica. __________ *As ideias aqui colocadas foram originariamente sustentadas pelo autor em artigo publicado na Coluna "CPC na Prática", no "site" Migalhas, em 30.03.2017. Posteriormente, tais argumentos foram reproduzidos em outro local sob o título "Condenação de pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais ao advogado do vencedor no incidente de desconsideração da personalidade jurídica" (In: Ana Cândida Menezes Marcato; Elias Marques de Medeiros Neto; Luiz Dellore; Rodrigo Barioni; Rogério Mollica; Sidnei Amendoeira; William Santos Ferreira. Org. Reflexões sobre o Código de Processo Civil de 2015. São Paulo: Verbatim, 2018, v. 1, p. 23-29). Apesar do tempo decorrido e de alguns julgados do Superior Tribunal de Justiça em sentido contrário, o subscritor não mudou o seu entendimento, conforme se verá adiante, reproduzindo aqui os mesmos argumentos e acrescentando outros para rebater a tese de que não caberia a condenação ao pagamento de honorários em incidente de desconsideração da personalidade jurídica por ausência de previsão legal. 1 "No incidente de desconsideração da personalidade jurídica não cabe a condenação nos ônus sucumbenciais diante da ausência de previsão legal". (REsp 1943831/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/12/2021, DJe 17/12/2021). No mesmo sentido: AgInt no AREsp 1745989/PR, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 22/11/2021, DJe 26/11/2021; AgInt no AREsp 1707782/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/03/2021, DJe 25/03/2021; AgInt no AREsp 1691479/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 01/03/2021, DJe 22/03/2021; AgInt no REsp 1852515/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 24/08/2020, DJe 27/08/2020; AgInt no REsp 1834210/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 12/11/2019, DJe 06/12/2019; AgInt no REsp 1933606/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/02/2022, DJe 24/02/2022; 2 LIMA, Tiago Asfor Rocha; RATTACASO, Marcus Claudius Saboia. Honorários advocatícios parciais: muito além da interpretação literal do art. 85 do Novo CPC. In: COÊLHO, Marcus Vinicius Furtado; CAMARGO, Luiz Henrique Volpe. Honorários advocatícios. 2ª edição. Salvador: Juspodivm, 2016. p. 347. Os destaques são da transcrição. 3 Já tivemos a oportunidade de demonstrar que aquele que é atingido por uma decisão de desconsideração da personalidade jurídica deve ser considerado parte no processo e não terceiro. (SOUZA, André Pagani de. Desconsideração da personalidade jurídica: aspectos processuais. 2ª edição. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 118-148. 4 Disponível aqui (acesso em 27.03.2017). 5 REsp 1845536/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/05/2020, DJe 09/06/2020, p. 20-22 do acórdão. 6 Confira-se, por exemplo, o AgInt no REsp 1838933/RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/05/2020, DJe 15/05/2020;e o AgInt no REsp 1838236/DF, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/04/2020, DJe 27/04/2020. Ambos fazem referência ao RESP 1.366.014/SP. 7 SOUZA, André Pagani de. Desconsideração da personalidade jurídica: aspectos processuais. 2ª edição. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 188. 8 VIEIRA, Christian Garcia. Desconsideração da personalidade jurídica no Novo CPC: natureza, procedimentos e temas polêmicos. Salvador: Juspodivm, 2017. p. 183. 9 Disponível aqui (Acesso em 27.03.2017). 10 REsp 1845536/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/05/2020, DJe 09/06/2020, p. 24 do acórdão.
Em breve o Superior Tribunal de Justiça ("STJ") revisitará o tema da interpretação do artigo 406 do Código Civil, e definirá, através do julgamento do REsp nº 1795982 / SP pela Corte Especial, se a Selic é o único índice a ser utilizado para fins de correção monetária e incidência de juros de mora, nas hipóteses previstas naquele artigo do diploma civil. O julgamento tem notória importância, até porque, como se sabe, o STJ, no julgamento do EREsp 727.842, fixou a tese de que a taxa dos juros moratórios a que se refere artigo 406 do Código Civil é a Selic. Essa posição, já consolidada no STJ, é reflexo de orientação da 2ª Turma, que prontamente adotou, em seus julgados, a aplicação da Taxa Selic ao artigo 406 do Código Civil, entendendo que esta incluía tanto os juros legais quanto a correção monetária: "2. Com o advento do novo Código Civil, quando não convencionados os juros moratórios, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional; por enquanto, a taxa SELIC (a partir da citação), com a advertência de que não pode ser ela cumulada com qualquer outro índice de correção monetária, porque já embutida no indexador."1 "2. Os juros de mora devem incidir na correção do saldo das contas vinculadas do FGTS no percentual de 0,5% ao mês até a data de entrada em vigor do Novo Código Civil. A partir de então, deverá incidir a Selic (Lei n. 9.250/95), taxa que está em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional (art. 406 do Código Civil de 2002)."2 A 1ª Seção deliberou sobre o tema no mesmo sentido: "PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. JUROS DE MORA. TAXA SELIC. APLICABILIDADE. ART. 406 DO NOVO CÓDIGO CIVIL. 1. Os juros moratórios, nas ações em que se discute a inclusão de expurgos inflacionários nas contas vinculadas ao FGTS, são devidos a partir da citação - que nos termos do arts. 219 do Código de Processo Civil e 406 do Código Civil vigentes, constitui o devedor em mora -, à base de 0,5% (meio ponto percentual) ao mês até a entrada em vigor do Novo Código Civil (Lei n.º 10.406/2001) e, a partir de então, segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional (art. 406). Taxa esta que, como de sabença, é a SELIC, nos expressos termos da Lei n.º 9.250/95 (Precedentes: REsp n.º 666.676/PR, Segunda Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJU de 06/06/2005; e REsp n.º 803.628/RN, Primeira Turma, deste Relator, DJU de 18/05/2006)."3 E, em embargos de divergência, a matéria chegou a ser decidida pela Corte Especial, que votou pela aplicação da Taxa Selic: "CIVIL. JUROS MORATÓRIOS. TAXA LEGAL.  CÓDIGO CIVIL, ART. 406. APLICAÇÃO DA TAXA SELIC. 1. Segundo dispõe o art. 406 do Código Civil, "Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional". 2. Assim, atualmente, a taxa dos juros moratórios a que se refere o referido dispositivo é a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC, por ser ela a que incide como juros moratórios dos tributos federais (arts. 13 da Lei 9.065/95, 84 da Lei 8.981/95, 39, § 4º, da Lei 9.250/95, 61, § 3º, da Lei 9.430/96 e 30 da Lei 10.522/02). 3. Embargos de divergência a que se dá provimento."4 A partir desse julgado, o STJ adotou firme posicionamento pela aplicação da Selic como taxa de juros legais5. Apenas para elucidar quão pacífico se tornou o tema no STJ, apontamos os seguintes julgados: "3. A Corte Especial deste Tribunal pacificou o entendimento de que atualmente a taxa de juros moratórios a que se refere o art. 406 do Código Civil é a Selic."6 "4.  Os juros de mora, devidos in casu a partir do evento danoso (Súmula 54/STJ), devem ser calculados à base de 0,5% ao mês, nos termos do artigo 1.062 do Código Civil de 1916 até a entrada em vigor do Novo Código Civil (Lei nº 10.406/2001), devendo observar, a partir de então, a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional (artigo 406). Taxa esta que, como de sabença, é a SELIC, nos expressos termos da Lei nº 9.250/95 (Precedente da Corte Especial: EREsp 727.842/SP, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJe de 20/11/2008) 5. A incidência da taxa SELIC a título de juros moratórios, a partir da entrada em vigor do atual Código Civil, em janeiro de 2003, exclui a incidência cumulativa de correção monetária, sob pena de bis in idem (Precedente: EDcl no REsp 1077077/SP, Rel. Min. SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, DJe de 05/06/2009)"7 "5. Nas obrigações ainda não adimplidas, anteriores à vigência do CC/02, a jurisprudência tem se orientado no sentido de reputar aplicável, quanto aos juros, o art. 1.062 do CC/16 até a data de 10/1/2003, e o art. 406 do CC/02 após essa data. Precedentes. 6. O índice que deve ser aplicado de conformidade com o art. 406 do CC/02 é, consoante precedente da Corte Especial, a Taxa SELIC, não obstante a existência de julgados recentes aplicando, à espécie, o art. 161, §1º, do CTN. 7. A taxa SELIC abrange juros e correção monetária, não pode ser cumulada a nenhum outro índice que exprima tais consectários."8 "1. "Os juros (de mora) legais devem ser fixados à taxa de 0,5% ao mês (artigo 1.062 do CC/1916) no período anterior ao início da vigência do novo Código Civil (10.1.2003) e, em relação ao período posterior, nos termos do disposto no artigo 406 do Código Civil de 2002, o qual corresponde à Taxa SELIC". (AgRg no Ag 1370108/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/04/2011, DJe 27/04/2011)"9 "3. A taxa de juros moratórios a que se refere o art. 406 do Código Civil de 2002, segundo precedente da Corte Especial (EREsp 727842/SP, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, CORTE ESPECIAL, julgado em 08/09/2008), é a SELIC, não sendo possível cumulá-la com correção monetária, porquanto já embutida em sua formação."10 "7. Os juros de mora incidem desde o evento danoso, à taxa de 0,5% ao mês até a entrada em vigor do CC/2002, e pela Taxa Selic após essa data (EREsp n. 727.842/SP, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, CORTE ESPECIAL, DJe de 20/11/2008)."11 "6. Sobre os valores apurados em liquidação de sentença devem recair, até o efetivo pagamento, juros moratórios de 6% ao ano a partir da citação, nos termos dos arts. 1.062 e 1.063 do CC/1916, até 11.1.2003, quando passou a se aplicar a Taxa Selic (art. 406 do CC atual)."12 "2. Os valores a serem restituídos pelo banco serão acrescidos de juros remuneratórios de 1% ao mês, corrigidos monetariamente pelo INPC, mais juros de mora de 0,5% ao mês desde a citação e, após a vigência do novo Código Civil, da taxa Selic, índice comum de juros moratórios e correção monetária, na forma do art. 406 do CC."13 Ainda, conforme o posicionamento apontado: "2. Os juros de mora incidem desde o evento danoso, à taxa de 0,5% ao mêsatéa entrada em vigor do CC/2002, e pela Taxa Selic após essa data(EREsp727.842/SP, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, Corte Especial, DJe de 20/11/2008)."14 "1.EstaCortefirmouentendimento no sentido de que a fixação da taxadosjurosmoratórios, a partir da entrada em vigor do artigo 406doCódigoCivilde2002,deveser com base na taxa Selic, podendo essa tese ser aplicada inclusive nos casos em que se discute a execução de honorários. Precedentes."15 "1.OSuperior Tribunal de Justiça, em julgamento submetido ao rito dosprocessosrepresentativosdacontrovérsia(art.543-Cdo CPC/1973eart.1.036 do CPC/2015) firmou o entendimento de que a taxados juros moratórios a que se refere o art. 406 do CC/2002 é a taxareferencialdoSistemaEspecialde Liquidação e Custódia - SELIC 2. Agravo interno não provido."16 "3.OTribunaldeorigem, ao discorrer sobre os juros moratórios, entendeu que seu termo inicial será a partir da citação e na base de 6%aoanoaté a entrada em vigor do Código Civil, aplicada a taxa Selic,a partir de então, consoante interpretação feita do art. 406 do Código Civil, que se coaduna com jurisprudência desta Corte."17 "3. Os juros moratórios são devidos a partir do evento danoso no percentual de 0,5% a.m até a entrada em vigor do Código Civil atual (11.1.2003), quando deverão ser calculados na forma do seu art. 406, isto é, de acordo com a SELIC."18 E, como se pode imaginar, o STJ, para fins do artigo 406 do CC, manteve sua posição sobre a aplicação da taxa SELIC nos últimos dois anos, como se depreende dos seguintes julgados, apenas a título exemplificativo: "AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. JUROS DE MORA. TAXA SELIC. INCIDÊNCIA. PRECEDENTES. NÃO PROVIMENTO. 1. "A Corte Especial no julgamento de recurso especial repetitivo entendeu que por força do art. 406 do CC/02, a atualização dos débitos judiciais deve ser efetuada pela taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC, a qual deve ser utilizada sem a cumulação com correção monetária por já contemplar essa rubrica em sua formação" (AgInt no REsp 1794823/RN, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, DJe 28/5/2020). 2. Agravo interno a que se nega provimento."19 "3. Nos termos dos Temas 99 e 112/STJ, a taxa de juros moratórios a que se refere o art. 406 do Código Civil é a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC, vedada a acumulação com correção monetária."20 A orientação apenas segue, como mencionado previamente, os julgados da Corte Especial. Além do EREsp 727842 / SP, importante apontar que, em sede de recurso especial repetitivo, a Corte Especial firmou a seguinte tese na sessão de 02 de junho de 2010: "Tema 176: Tendo sido a sentença exequenda prolatada anteriormente à entrada em vigor do Novo Código Civil, fixado juros de 6% ao ano, correto o entendimento do Tribunal de origem ao determinar a incidência de juros de 6% ao ano até 11 de janeiro de 2003 e, a partir de então, da taxa a que alude o art. 406 do Novo CC, conclusão que não caracteriza qualquer violação à coisa julgada." Constata-se, a partir da orientação do STJ, que a taxa oficial de juros legais - prevista pelo artigo 406 do CC - é a Taxa Selic. Por isso, nesse contexto, fundamental é o julgamento do REsp nº 1795982 / SP pela Corte Especial do STJ, que revisitará importante tema, com impacto nacional nas mais diversas lides cíveis que tramitam no país.  __________ 1 STJ, REsp 781594/PE, 2ª Turma, Minª. Relª. Eliana Calmon, j. 16.05.2006. 2 STJ, REsp 916567/PE, 2ª Turma, Min. Rel. João Otávio de Noronha, 27.03.2007. 3 STJ, REsp 875919/PE, 1ª Seção, Min. Rel. Luiz Fux, j. 13.06.2007. 4 STJ, EREsp 727842 / SP, Corte Especial, Min. Rel. Teori Albino Zavascki, j. 08.09.2008. 5 Nessa toada: "AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO. PRECATÓRIO COMPLEMENTAR. JUROS MORATÓRIOS. MOMENTO DA INCIDÊNCIA. CRITÉRIOS. VIGÊNCIA NOVO CÓDIGO CIVIL. I - Trata-se de discussão acerca da incidência de juros moratórios em precatório complementar, em autos de execução de título judicial, onde o Tribunal a quo determinou que tais juros incidam à razão de 0,5% ao mês durante a vigência do Código Civil/1916 e, a partir do Novo Código, em 1% ao mês. II - Sob o argumento de que a indenização que gerou a referida execução se deu na vigência do Código Civil/1916, pretende o recorrente que durante todo o período os juros moratórios sejam fixados em 0,5% ao mês. III - Esta eg. Corte de Justiça já tem firme posicionamento no sentido de que os juros de mora são devidos à taxa de 0,5% ao mês, até a vigência do Código Civil de 2002, a partir de quando deve ser considerada a taxa que estiver em vigor para a mora no pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional (artigo 406), ou seja, a SELIC. Precedentes: AgRg no REsp nº 972.590/PR, Rel. Min. JOSÉ DELGADO, DJe de 23.06.2008; REsp nº 858.011/SP, Rel. Min. DENISE ARRUDA, DJe de 26/05/2008; REsp nº 926.140/DF, Rel. Min. LUIZ FUX, DJe de 12.05.2008. IV - Assim, a pretensão estadual é descabida e, por outro lado, considerando-se a peculiaridade da espécie, deve ser mantido o entendimento firmado pelo juízo a quo sobre o percentual dos juros moratórios, nada podendo se deliberar nestes autos sobre a incidência da SELIC, em observância ao princípio da non reformatio in pejus. V - Recurso improvido." - STJ, REsp 926285 / PR, 1ª Turma, Min. Rel. Francisco Falcão, j. 14.10.2008. 6 STJ, REsp 945601 / SC, 2ª Turma, Minª. Relª. Eliana Calmon, j. 16.06.2009. 7 STJ, EDcl no REsp 961512 / SP, 3ª Turma, Min. Rel. Vasco Della Giustina, j. 14.12.2010. 8 STJ, EDcl no REsp 953460 / MG, 3ª Turma, Minª. Relª. Nancy Andrighi, j. 09.08.2011. 9 STJ, AgRg no REsp 886970 / DF, 4ª Turma, Min. Rel. Luis Felipe Salomão, j. 16.08.2011. 10 STJ, EDcl no REsp 1025298 / RS, 2ª Seção, Min. Rel. Luis Felipe Salomão, j. 28.11.2012. 11 STJ, REsp 645729 / RJ, 4ª Turma, Min. Rel. Antonio Carlos Ferreira, j. 11.12.2012. 12 STJ, AgRg no AREsp 311954 / PR, 2ª Turma, Min. Rel. Herman Benjamin, j. 28.05.2013. 13 STJ, EDcl no AgRg no Ag 1316058 / GO, 3ª Turma, Min. Rel. João Otávio de Noro-nha, j. 10.09.2013. 14 STJ, AgInt nos EDcl no REsp 1740851 / MA, 3ª Turma, Min. Rel. Moura Ribeiro, j. 24.06.2019. 15 STJ, AgInt no AREsp 1180613 / MS, 4ª Turma, Min. Rel. Marco Buzzi, j. 21.10.2019. 16 STJ, AgInt no REsp 1628809 / SP, 3ª Turma, Min. Rel. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 18.05.2017. 17 STJ, AgInt no AREsp 870448 / SP, 2ª Turma, Min. Rel. Humberto Martins, j. 18.08.2016. 18 STJ, AgRg no REsp 831173 / RJ, 4ª Turma, Min. Rel. Raul Araujo, j. 16.12.2014. 19 STJ, AgInt no REsp 1723791 / MS, 4ª Turma, Minª. Relª. Maria Isabel Gallotti, j. 08.02.2021. 20 STJ, REsp 1846819 / PR, 3ª Turma, Min. Rel. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 13.10.2020.
A comprovação do Feriado Local é uma das muitas armadilhas que vêm atormentando os advogados. A grande conquista da advocacia com a contagem dos prazos processuais em dias úteis pode virar um pesadelo. Dada a importância do tema, ele já foi objeto de três artigos de minha autoria nessa coluna1. Apesar da primazia do julgamento de mérito ser um dos pilares do Código de Processo Civil de 2.015, do entendimento de nossa melhor doutrina quanto a possibilidade de comprovação posterior do feriado local2 e do Enunciado nº 663 do Conselho da Justiça Federal, tal entendimento restou vencido no Superior Tribunal de Justiça. Sendo necessária a comprovação quando da interposição do recurso, dúvida passou a surgir sobre a melhor forma de atestar a existência do feriado local. A mais comum e mais simples seria a juntada do calendário do Tribunal Local atestando os dias em que teríamos feriados.    Tal forma de comprovação restou em xeque após o recentíssimo julgado da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça: "AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CONDENATÓRIA - DECISÃO MONOCRÁTICA DA PRESIDÊNCIA DESTA CORTE QUE NÃO CONHECEU DO RECLAMO EM RAZÃO DA INTEMPESTIVIDADE DO RECURSO ESPECIAL. IRRESIGNAÇÃO DA PARTE REQUERIDA. 1. É intempestivo o recurso especial interposto após o prazo de 15 (quinze) dias úteis previsto nos artigos 219 e 1.003, § 5º, do CPC/15. 2. De acordo com a jurisprudência do STJ, o dia de Corpus Christi é feriado local, porquanto não previsto em lei federal, razão pela qual a ausência de expediente forense em tal data deve ser comprovada pela parte recorrente, no momento da interposição do recurso, por meio de documento idôneo, o que não ocorreu no presente caso. 3. A juntada de calendário extraído de página da Corte de origem mantida em rede mundial de computadores não se revela como documento idôneo a ensejar a comprovação da existência do aludido feriado, na medida em que, para tanto, é necessária a juntada de cópia de lei ou de ato administrativo que ateste, de modo inequívoco, a ausência de expediente forense na data em questão. Precedentes. 4. Agravo interno desprovido." (g.n.) (AgInt no AREsp n. 1.779.552/GO, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 26/4/2022, DJe de 6/5/2022.) Desse modo, a simples comprovação pela juntada do calendário do tribunal de origem não seria suficiente, sendo necessária a juntada de "lei ou ato administrativo que ateste, de modo inequívoco, a ausência de expediente forense na data em questão." Esse mesmo entendimento vinha sendo manifestado pela Terceira Turma da Corte: "AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. INTEMPESTIVIDADE. COMPROVAÇÃO POSTERIOR. IMPOSSIBILIDADE. DOCUMENTO IDÔNEO. NECESSIDADE. CALENDÁRIO. TRIBUNAL. INVIABILIDADE. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. É intempestivo o recurso especial protocolizado após o prazo de 15 (quinze) dias, de acordo com o artigo 1.003, § 5º, c/c artigo 219, caput, do CPC/2015. 3. O Superior Tribunal de Justiça entende que a existência de feriado local, paralisação ou interrupção de expediente forense deve ser demonstrada por documento oficial ou certidão expedida pelo tribunal de origem que comprove o período em que ocorreu eventual suspensão de prazos, não servindo cópia do calendário do Poder Judiciário extraído da internet. Precedentes. 4. Agravo interno não provido" (g.n.) (AgInt no AREsp n. 1.499.001/GO, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 28/3/2022, DJe de 31/3/2022.) Entretanto, em julgado mais recente, a Terceira Turma, por unanimidade, reviu seu posicionamento e passou a aceitar a comprovação pela juntada do calendário do Tribunal de origem: "EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TEMPESTIVIDADE RECURSAL. CALENDÁRIO DO PODER JUDICIÁRIO OBTIDO NA PÁGINA ELETRÔNICA DO TRIBUNAL DE ORIGEM. DOCUMENTO IDÔNEO PARA A COMPROVAÇÃO DE FERIADO LOCAL, NA FORMA DO § 6º DO ART. 1.003 DO CPC/2015. PRECEDENTE DO COLENDO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. EXISTÊNCIA DE VÍCIO NA DECISÃO EMBARGADA. EMBARGOS ACOLHIDOS COM EFEITOS INFRINGENTES. 1. Consoante dispõe o art. 1.022 do CPC/2015, destinam-se os embargos de declaração a expungir do julgado eventual omissão, obscuridade, contradição ou erro material, não se caracterizando via própria ao rejulgamento da causa. 2. Existência de vício no acórdão embargado, que, ao ratificar decisão da Presidência do STJ, ignorou a adequada comprovação da tempestividade recursal. 3. Apresentação, no ato de interposição do recurso especial, de cópia do calendário oficial obtido na página eletrônica do tribunal de origem, em que detalhados todos os feriados locais observados pelo Poder Judiciário estadual, documento que se revela perfeitamente apto à comprovação exigida pelo § 6º do art. 1.003 do CPC/2015, tal como decidido pelo colendo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RMS n. 36.114/AM. 4 . Embargos de declaração acolhidos com efeitos infringentes." (g.n.) (EDcl no AgInt no AREsp n. 1.526.182/SE, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 17/5/2022, DJe de 26/5/2022.) No Recurso Ordinário em Mandado de Segurança citado (RMS 36.114/AM) a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal decidiu que "O calendário judicial do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas - o qual instruiu o recurso -, aprovado por meio da Portaria nº 1.930/2015-PTJ, mostrou-se idôneo à elucidação pretendida, reforçada pelo crivo positivo de admissibilidade do Colegiado de origem." Portanto, denota-se que a questão ainda está longe de ser pacificada por nossas Cortes Superiores, cabendo aos operadores serem cautelosos e comprovarem sempre a existência do feriado local por meio da juntada da lei ou ato administrativo que ateste, de modo inequívoco, a ausência de expediente forense na data em questão.  __________ 1 Colunas de 6/7/2017, 25/10/2018 e 6/2/2020. 2 Neste sentido: Luis Guilherme Aidar Bondioli (Comentários ao Código de Processo Civil - arts. 994 a 1.044, 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 2017, p. 68); Daniel Amorim Assumpção Neves (Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo, Salvador: Juspodivm, 2016, p. 1.654); Luiz Guilherme Marinoni, Sergio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero (Novo Código de Processo Civil Comentado, 2ª ed., São Paulo, RT, 2016, p. 1063); Eduardo Talamini e Felipe Scripes Wladeck (Comentários ao Código de Processo Civil, coord. Cássio Scarpinella Bueno, v. 4, São Paulo: saraiva, 2017, p. 377). 3 Enunciado nº 66: "Admite-se a correção da falta de comprovação do feriado local ou da suspensão do expediente forense, posteriormente à interposição do recurso, com fundamento no art. 932, parágrafo único, do CPC."
O tema honorários advocatícios desperta cativante interesse e tem sido objeto das mais variadas discussões enfrentadas pelo STJ. Já tivemos a oportunidade de expor nesta coluna inúmeros entendimentos referentes a mais variadas questões que gravitam em torno da dinâmica da majoração de honorários em grau recursal, regra prevista no art. 85, § 11º, do CPC1-2-3-4-5-6. No tocante ao arbitramento da verba honorária advocatícia, em havendo litisconsortes, dispõe o art. 87 do CPC que os vencidos respondem proporcionalmente pelas despesas e honorários. Referido dispositivo não aponta regras objetivas quanto a aludida distribuição proporcional, tampouco se referida distribuição proporcional da verba honorária advocatícia deve ou não observar as limitações percentuais delineadas pelo art. 85, § 2º, do CPC. Coube a Terceira Turma do STJ perfilhar o entendimento de que, em havendo litisconsortes, em relação ao litisconsorte excluído da lide, há de se relativizar a regra objetiva de fixação dos honorários advocatícios nos percentuais de 10% a 20% sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, regra essa que se ocupa a redação do art. 85 § 2º, do CPC: "CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. COBRANÇA DE VALORES PREVISTOS EM CONTRATO. IRRESIGNAÇÃO DA PARTE CONTRATANTE. ALEGAÇÃO DE OFENSA A BOA-FÉ OBJETIVA E INVOCAÇÃO DA TEORIA DA APARÊNCIA. TEMAS NÃO PREQUESTIONADOS. SÚMULA Nº 211 DO STF. IRRESIGNAÇÃO DA PARTE CONTRATADA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL NÃO CONFIGURADA. EXCLUSÃO DE LITISCONSORTE PASSIVO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. FIXAÇÃO DE FORMA PROPORCIONAL A MATERIA DECIDIDA NO JULGAMENTO PARCIAL DA LIDE. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 85, § 2º, DO CPC NÃO CARATERIZADA. 1. As disposições do NCPC, no que se refere aos requisitos de admissibilidade dos recursos, são aplicáveis ao caso concreto ante os termos do Enunciado Administrativo nº 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016. 2. Recurso especial de SUSANA. A invocação aos princípios da boa-fé objetiva e da teoria da aparência não foram examinadas pelo Tribunal estadual a despeito dos embargos de declaração ali opostos. O tema carece, portanto, do devido prequestionamento, merecendo aplicação a Súmula nº 211 do STJ. 3. Recurso especial de POLLYMER. Negativa de prestação jurisdicional não configurada, pois houve exame adequado de todas as questões submetidas à apreciação judicial na medida necessária para o deslinde da controvérsia, ainda que em sentido contrário à pretensão da parte. 4. A teor do Enunciado nº 5 da I Jornada de Direito Processual Civil, ao proferir decisão parcial de mérito ou decisão parcial fundada no art. 485 do CPC, condenar-se-á proporcionalmente o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor, nos termos do art. 85 do CPC. 5. Isso significa que o juiz, ao reconhecer a ilegitimidade ad causam de um dos litisconsorte passivos e excluí-lo da lide, não está obrigado a fixar, em seu benefício, honorários advocatícios sucumbenciais mínimos de 10% sobre o valor da causa. 6. O art. 85, § 2º, do NCPC, ao estabelecer honorários advocatícios mínimos de 10% sobre o valor da causa, teve em vista decisões judiciais que apreciassem a causa por completo, ou seja, decisões que, com ou sem julgamento de mérito, abrangessem a totalidade das questões submetidas a juízo. Tratando-se de julgamento parcial da lide, os honorários devem ser arbitrados de forma proporcional a parcela do pedido efetivamente apreciada. 7. A prevalecer o entendimento propugnado nas razões do apelo nobre, no sentido de que o litisconsorte excluído antecipadamente faz jus a honorários de no mínimo 10% sobre o valor da causa, seria forçoso concluir que, numa outra hipótese, na qual presentes vários réus excluídos em momentos diferentes do processo, a verba honorária total poderia ultrapassar o limite legal de 20% sobre o valor da causa. 8. Recurso especial de SUSANA não conhecido. Recurso especial de POLLYMER não provido." (STJ, REsp 1760538/RS, Rel. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, j. 24/05/2022, DJe 26/05/2022, grifou-se)   (...) O voto condutor, da lavra da Ministro Moura Ribeiro, bem asseverou, em síntese: "(...) No caso dos autos apresenta-se mais uma questão relativa a honorários advocatícios sucumbenciais. Discute-se, neste processo, como devem ser fixados os honorários sucumbenciais nas hipóteses de exclusão de litisconsortes, tendo em vista os limites mínimo e máximo fixados no art. 85, § 2º, do NCPC que assim dispõe: Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. § 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos: I - o grau de zelo do profissional; II - o lugar de prestação do serviço; III - a natureza e a importância da causa; Como se percebe, o legislador quis conferir maior objetividade à quantificação dos honorários advocatícios sucumbenciais, determinando que eles devem ser arbitrados entre 10% e 20% sobre o valor da condenação ou, subsidiariamente, sobre o proveito econômico obtido ou, se imensurável, sobre o valor atualizado da causa. A pergunta que se coloca é se, nas hipóteses de exclusão de litisconsortes passivos, serão devidos sempre e em qualquer caso, honorários mínimos de 10% ou se, ao contrário, referida verba pode, excepcionalmente, ser fixada em menor percentual. No caso dos autos, a ação monitória foi proposta contra ANDRÉ e POLLYMER e, tendo sido reconhecida a ilegitimidade passiva desta sociedade, foi fixado, em benefício do seu patrono, verba honorária equivalente a 5% sobre o valor da causa. Não parece que daí resulte algum tipo de ilegalidade, porque observado o valor mínimo dos honorários advocatícios sucumbenciais que caberia ao advogado de POLLYMER. Afinal, se era lícita a fixação de honorários no percentual mínimo de 10% sobre o valor da causa na hipótese de rejeição dos embargos monitórios, é porque cada um dos réus receberia, em princípio, apenas 5% do valor da causa, correspondente a fração ideal do montante integral da verba de sucumbência. Dessa forma, sobrevindo decisão que julga parcialmente a causa, excluindo antecipadamente da lide um dos litisconsortes passivos, não parece coerente afirmar que houve ofensa ao art. 85, § 2º, do NCPC se, justamente, foi fixado, em seu benefício, honorários advocatícios sucumbenciais correspondentes ao quinhão que lhe tocaria na hipótese de uma decisão que apreciasse integralmente a lide. Perceba-se que o momento em que se dá o reconhecimento da ilegitimidade da parte ré (no curso ou ao fim do processo) não pode ser tomado como fundamento para majorar o valor dos honorários advocatícios devidos em favor da parte. Admitindo que o reconhecimento da ilegitimidade passiva ao final do processo pode resultar em honorários advocatícios de apenas 5% do valor da causa, parece necessário admitir que o reconhecimento antecipado dessa mesma circunstância pode, igualmente, resultar em honorários de apenas 5% sobre o valor da causa. A prevalecer o entendimento propugnado nas razões do apelo nobre, no sentido de que o litisconsorte excluído faz jus a honorários de no mínimo 10% sobre o valor da causa, imperioso seria concluir que, numa outra hipótese, em que presentes vários réus excluídos em momentos diferentes do processo, a verba honorária total poderia ultrapassar o limite legal de 20% sobre o valor da causa. Imagine-se, por exemplo, uma demanda proposta contra três réus. Dois deles sustentam, em contestação, ilegitimidade passiva para a causa. O magistrado de primeiro grau, no saneador, reconhece a ilegitimidade em favor de apenas um dos réus, e o Tribunal de Justiça dá provimento ao agravo de instrumento manejado em seguida para reconhecer a ilegitimidade passiva também em relação ao segundo réu. Ao final, sobrevém sentença julgando improcedente o pedido em relação ao terceiro réu que permaneceu no feito. Nessa situação, a cada decisão de extinção parcial sem julgamento de mérito, os honorários deveriam ser fixados no mínimo em 10% sobre o valor da causa. Logo, ao final do processo, a verba honorária total seria equivalente a no mínimo 30% sobre o valor da causa, o que claramente violaria o art. 85, § 2º, do NCPC. Ainda com base nessa mesma situação hipotética poder-se-ia cogitar que, se o pedido fosse julgado procedente em relação aos três réus, o autor da demanda teria assegurado, em proveito do seu patrono, apenas 10% sobre o valor da causa.  Não parece isonômico, portanto, admitir que alguém, desejando iniciar uma demanda, possa ser obrigado a pagar 30% de honorários advocatícios em caso de insucesso (com exclusões sucessivas de dois réus e posterior julgamento de improcedência do pedido), mas receber apenas 10% na hipótese de êxito. Bem por isso, o Enunciado nº 5 da I Jornada de Direito Processual Civil, realizada pelo CJF entre 24 e 25 de agosto de 2017, estabeleceu: Ao proferir decisão parcial de mérito ou decisão parcial fundada no art. 485 do CPC. condenar-se-á proporcionalmente o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor, nos termos do art. 85 do CPC. Nesta Corte Superior também é possível localizar julgados asseverando que os honorários advocatícios sucumbenciais, nos casos de decisões parciais de mérito, devem observar a parcela da pretensão decidida antecipadamente. (...) Examinando o inteiro teor de tais julgados, é possível observar que eles não tratam de situação idêntica a dos autos. Não versam sobre a fixação de honorários em caso de exclusão de litisconsorte passivo por ilegitimidade ad causam. Apesar disso, empregaram o advérbio proporcionalmente contido no Enunciado nº 5 da Jornada de Direito Processual Civil para adequar o valor dos honorários à parcela do pedido efetivamente apreciado nas decisões parciais de mérito examinadas Assim, admitindo-se que a legitimidade das pessoas indicadas no polo passivo da demanda constitui (parte da) matéria a ser examinada pelo julgador, tem-se que admitir também, por coerência, que os honorários a serem fixados na decisão parcial que aprecia a legitimidade deve ser proporcional ao tema efetivamente decidido. Em suma, o art. 85, § 2º, do NCPC, ao fixar honorários advocatícios mínimos de 10% sobre o valor da causa, teve em vista as decisões judiciais que apreciassem a causa por completo. Decisões que, com ou sem julgamento de mérito, abrangessem a totalidade das questões submetidas a juízo. Nas hipóteses de julgamento parcial, como ocorre na decisão que exclui um dos litisconsortes passivos sem pôr fim a demanda, os honorários devem observar proporcionalmente a matéria efetivamente apreciada. (...) (STJ, REsp 1760538/RS, Rel. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, j. 24/05/2022, DJe 26/05/2022, grifou-se) Consoante se depreende do entendimento supra citado, o limitador de 10% a 20%, sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido, ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor da causa (hipótese que sói ocorre quando há exclusão de litisconsorte no curso da demanda, antes de qualquer condenação), previsto no art. 85, § 2º, do CPC, há de ser compreendido em vista as decisões judiciais que apreciassem a causa por completo, a abranger a totalidade das questões submetidas a juízo, de sorte que, em havendo exclusão de um dos litisconsortes passivos da lide, sem pôr fim a demanda, os honorários devem observar proporcionalmente a matéria efetivamente apreciada. As razões que se assentaram o voto condutor partem da premissa de que, em havendo litisconsórcio passivo, sendo um dos litisconsortes excluído da lide e arbitrada a verba honorária em 10%, a sobrevier ulterior sentença de procedência da demanda, seria injusto com o Autor aplicar mais 10% de verba honorária advocatícia devida a cada um dos litisconsortes passivos que sagrarem-se vendedores na demanda, a fatalmente transcender a limitação de 20% prevista no art. 85, § 2º, do CPC. Malgrado o entendimento acima, ao trazer balizas de que o máximo da condenação que o Autor, sucumbente, venha experimentar quando litiga contra diversos réus, não pode exceder o percentual de 20% (observada as balizas do art. 85, § 2º, do CPC), espera-se que igual premissa seja adotada na situação inversa. Em outras palavras, sendo o Autor vencedor em demanda contra diversos Réus, a verba honorária advocatícia arbitrada em desfavor do Réus não poderá transcender a soma do percentual de 20%, observadas as hipóteses referenciadas no art. 85, § 2º. __________ 1 O cabimento da majoração (i) há de ser observado em recursos interpostos na vigência do CPC de 2015, (ii) pressupõe pretérita sucumbência arbitrada, (iii) os honorários são majorados na hipótese de improvimento ou não conhecimento do recurso por culpa do recorrente, e (vi) o aumento da verba honorária não incide se já majorada no mesma instância recursal. 2 Afastamento dos honorários advocatícios recursais em recursos tirados de mandado de segurança. 3 Nos recursos de apelação tirados de sentenças ilíquidas, caberá ao juízo a quo a fixação da verba honorária cuja majoração restou determinada pelo tribunal ao improver ou não conhecer do recurso.  4 Cabimento de honorários advocatícios recursais em embargos de declaração, caso o tribunal deixe de aplicar o art. 85, § 11º quando do julgamento da apelação.  5 Decisões divergentes, no bojo do STJ, quanto ao cabimento ou não de honorários advocatícios recursais quando o objeto do recurso interposto versa exclusivamente sobre a majoração de verba honorária advocatícia arbitrada pelo juízo a quo.  6 E, recentemente, tecemos considerações acerca da majoração de honorários advocatícios recursais quando a decisão atacada restar mantida em relação aos demais litisconsortes.
O art. 833, do CPC, indica os bens que são considerados impenhoráveis no processo de execução, ou seja, que não podem ser apreendidos por ordem judicial para serem empregados direta ou indiretamente na satisfação da obrigação que está sendo objeto de execução forçada (contra a vontade do devedor). O inciso IV do art. 833 estabelece, por sua vez, que os salários são impenhoráveis, "ressalvado o § 2º". E a ressalva do § 2º é a seguinte: "(...) o disposto nos incisos IV e X do caput não se aplica à hipótese de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem (...)". Em outras palavras, se a penhora for realizada para assegurar o "pagamento de prestação alimentícia", independentemente de sua origem, ela pode, sim, recair sobre salário. Ao menos, essa é a interpretação literal. A questão que se coloca, portanto, é a seguinte: as verbas de sucumbência têm natureza de prestação alimentícia ou não? Como se sabe, as verbas de sucumbência são aquelas mencionadas pelo art. 85, do CPC: "A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor". Assim, a indagação é: os honorários advocatícios aos quais o vencido é condenado a pagar ao advogado do vencedor em um processo judicial têm natureza alimentar? Para além de respostas lamentavelmente frequentes como "se fulano é advogado, vai dizer que sim pois está defendendo a classe" ou "se fulano é juiz, vai dizer que não, pois não gosta de ver advogado ganhando muito", vamos tentar responder tal pergunta com amparo na lei e não em percepções distorcidas da realidade, que não contribuem para uma melhor distribuição da justiça. Pois bem, o § 14 do art. 85 do CPC dispõe que "Os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial" (grifos nossos). À luz da lei, portanto, os honorários advocatícios de sucumbência tem natureza alimentar. E esse seria o fim da história se o Superior Tribunal de Justiça (STJ) não resolvesse "interpretar" o § 14 do art. 85 do CPC. E é isso que ele vai fazer em breve. A questão acima delineada foi submetida a julgamento e cadastrada no sistema de recursos repetitivos do STJ como Tema 1.153, com a seguinte redação: "Definir se os honorários advocatícios de sucumbência, em virtude da sua natureza alimentar, inserem-se ou não na exceção prevista no parágrafo 2º do artigo 833 do Código de Processo Civil de 2015 - pagamento de prestação alimentícia". Há dois recursos selecionados como representativos da controvérsia (REsp 1.905.573 e REsp 1.947.011) cuja relatoria coube ao ministro Villas Bôas Cueva. Cumpre observar que a Corte Especial do STJ, em recurso julgado em 2020 (REsp 1.815.055), já decidiu que as exceções destinadas à execução de prestação alimentícia não se estendem aos honorários advocatícios. Mas mesmo com este entendimento pacificado no STJ, ainda há tribunais que decidem de maneira diferente. Por tal razão é que o tema vem à tona novamente, para que o STJ decida pela sistemática dos recursos repetitivos, que honorários advocatícios de sucumbência não tem caráter alimentar. O Tema 1.153 ainda não foi julgado, mas não precisa ser um expert para conseguir adivinhar qual será o resultado. O § 14 do art. 85 do CPC sofrerá um golpe de uma força nunca antes vista que será difícil lembrar que um dia ele existiu (apesar de ter sido votado no Congresso Nacional e passado por todo o processo legislativo regular para se tornar uma Lei Federal). E quem perderá, mais uma vez será o jurisdicionado, que precisa de um advogado, que exerce função indispensável à administração da Justiça (quem diz isso é o art. 133, da Constituição Federal). Isso porque o advogado precisa sobreviver e receber pelo seu trabalho e, se os honorários sucumbenciais estão cada vez mais difíceis de receber com obstáculos artificiais de "interpretação", este profissional tem que garantir o sustento de sua família pelos honorários contratuais apenas. Se houvesse um pouco de previsibilidade e certeza no recebimento das verbas de sucumbência, será que os honorários contratuais precisariam ser altos? Antes de responder, lembre-se de um princípio geral do direito: a boa-fé é que se presume e a má-fé deve ser provada, sempre.
Em recente acórdão proferido relativo à proposta de afetação do Recurso Especial n. 1.955.539 - SP, restou estabelecido que, sob o rito dos recursos repetitivos, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça ("STJ") definirá os limites e requisitos para a aplicação do artigo 139, IV, do CPC/15, verificando se "é possível, ou não, o magistrado, observando-se a devida fundamentação, o contraditório e a proporcionalidade da medida, adotar, de modo subsidiário, meios executivos atípicos". O tema não é novo no STJ, sendo certo que a terceira turma já vinha delineando que as medidas atípicas devem ser subsidiariamente aplicadas, sendo condicionadas à presença de indícios de que exista patrimônio penhorável, além da necessidade de o magistrado aplicá-las com a observância dos princípios da proporcionalidade, motivação e contraditório. Foi exatamente essa a linha adotada no julgamento proferido no Recurso Especial n. 1896421/SP, conforme já noticiado nessa coluna: "6. A adoção de meios executivos atípicos é cabível desde que, verificando-se a existência de indícios de que o devedor possua patrimônio expropriável, tais medidas sejam adotadas de modo subsidiário, por meio de decisão que contenha fundamentação adequada às especificidades da hipótese concreta, com observância do contraditório substancial e do postulado da proporcionalidade". A 3ª. turma do STJ também enfrentou o tema no julgamento do AgInt no REsp 1799638 / SP, sendo que restou enfatizado que são requisitos para a aplicação do artigo 139, IV, do CPC/15: "i) existência de indícios de que o devedor possua patrimônio apto a cumprir com a obrigação a ele imposta; ii) decisão devidamente fundamentada com base nas especificidades constatadas; iii) a medida atípica deve ser utilizada de forma subsidiária, dada a menção de que foram promovidas diligências à exaustão para a satisfação do crédito; e iv) observância do contraditório e o postulado da proporcionalidade". A grande novidade do julgamento da proposta de afetação relativa ao Recurso Especial n. 1.955.539 - SP é o desafio do STJ de, sob o regime dos recursos repetitivos, fixar a tese quanto aos limites e requisitos para a aplicação do artigo 139, IV, do CPC/15, tese esta que restará consagrada para fins de precedente previsto no artigo 927, III, do CPC/15. A fixação da tese será de grande importância para o meio jurídico, em especial em tema onde, desde o início da vigência do CPC/15, existem relevantes reflexões doutrinárias. Vale lembrar que Teresa Arruda Alvim1 enfatiza a necessidade de o inciso IV do artigo 139 do novo CPC/15 ser interpretado "com grande cuidado, sob pena de, se entender que em todos os tipos de obrigações, inclusive na de pagar quantia em dinheiro, pode o juiz lançar mão de medidas típicas das ações executivas lato sensu, ocorrendo completa desconfiguração do sistema engendrado pelo próprio legislador para as ações de natureza condenatória". E Flávio Luiz Yarshell2, por sua vez, doutrina que, quanto ao artigo 139, IV, "será preciso cuidado na interpretação desta norma, porque tais medidas precisam ser proporcionais e razoáveis, lembrando-se que pelas obrigações pecuniárias responde o patrimônio do devedor, não sua pessoa. A prisão civil só cabe no caso de divida alimentar e mesmo eventual outra forma indireta de coerção precisa ser vista com cautela, descartando-se aquelas que possam afetar a liberdade e ir e vir e outros direitos que não estejam diretamente relacionados com o patrimônio do demandado". Não se olvide, por fim, que o tema ainda precisa ser enfrentado pelo Supremo Tribunal Federal ("STF"), no julgamento da ADI n. 5941, na qual se debate o desafio da constitucionalidade das medidas executivas atípicas, tendo a PGR já ali se posicionado no sentido de que o artigo 139, IV, do CPC/15, deveria ser aplicado de forma subsidiária e sempre com o escopo de possibilitar medidas de natureza patrimonial, evitando-se a efetivação de medidas que possam gerar restrições de direitos. Tanto o STF como o STJ, quanto ao tema, terão fundamental importância para o estabelecimento dos requisitos para a aplicação do artigo 139, IV, do CPC/15, almejando-se a sempre construir uma técnica de conformidade entre este dispositivo e os princípios presentes nos artigos 4, 6, 8 e 9 do CPC/15.   __________ 1 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins. RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva. TORRES de MELLO, Rogério Licastro. Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil. 1ª. Edição. São Paulo: RT, 2015. p. 264. 2 COELHO, Marcus Vinicius Furtado. MEDEIROS NETO, Elias Marques de. YARSHELL, Flávio Luiz. PUOLI, José Carlos Baptista. O Novo Código de Processo Civil: Breves Anotações para a Advocacia. Brasília: OAB, Conselho Federal, 2016. p. 28.
Em meu último artigo escrito em nossa coluna tive a oportunidade de citar o Julgamento da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça sobre a fixação dos honorários por equidade1.                         Restou fixada a tese que de acordo com o § 8º, do artigo 85 do CPC, a equidade na fixação dos honorários advocatícios só pode se dar para aumentar honorários que seriam irrisórios2.  Basicamente se respeitou a previsão legal, que concorde-se ou não, foi a opção do legislador e deve ser prestigiada.  Dúvida que surgiu é se efetivamente o Tema nº 1.076 dos Recursos Repetitivos seria aplicado por nossos Tribunais. E o bom exemplo vem da nossa mais alta Corte. Em recentíssimo julgado, a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal decidiu:  AGRAVO INTERNO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SENTENÇA RESTABELECIDA. INVERSÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. LIDE COM VALOR CERTO E DETERMINADO. VERBA HONORÁRIA RAZOÁVEL E PROPORCIONAL AO VALOR DA CAUSA. 1. A lide em que se postulou a anulação do Auto de Infração e da imposição da multa tem valor certo e determinado. Assim, não há razão para que verba honorária seja fixada por apreciação equitativa. 2. O CPC/2015 tornou mais objetivo o processo de determinação da verba sucumbencial, restringindo a subjetividade do julgador e remetendo-o aos critérios previstos no art. 85 do diploma processual, aos quais deve se submeter o caso concreto, na ordem de preferência estabelecida nos parágrafos desse artigo. 3. Com o provimento do RE, restauraram-se os honorários advocatícios, fixados na sentença em total conformidade com o CPC. Desse modo, não cabe qualquer alteração da verba honorária, a qual também se revela razoável e proporcional à complexidade da causa. 4. Agravo interno a que se nega provimento. (ARE 1367266 ED-AgR, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 22/04/2022, publ.28-04-2022) Cumpre frisar que o respeito à decisão do Superior Tribunal de Justiça, a quem cabe a última palavra quanto às questões infraconstitucionais, é expresso no voto do Ministro Relator:  "Registre-se que o Superior Tribunal de Justiça, a quem cabe a interpretação do direito infraconstitucional, compreende que o CPC/2015 tornou mais objetivo o processo de determinação da verba sucumbencial, restringindo a subjetividade do julgador e remetendo-o aos critérios previstos no art. 85 daquele diploma processual, aos quais deve se submeter o caso concreto na ordem de preferência estabelecida nos parágrafos daquele artigo." O referido julgamento proferido após a consolidação do entendimento do STJ sobre a matéria se mostra importante, eis que em fevereiro do corrente ano o Plenário do STF, de forma unânime, determinou a redução dos honorários pela aplicação da equidade:  "Direito Processual Civil. Embargos de declaração em ação cível originária. Honorários advocatícios. 1. Embargos de declaração opostos contra acórdão que julgou parcialmente procedente o pedido com fixação de honorários em percentual sobre o valor da causa. 2. Fixação dos honorários que gera à parte sucumbente condenação desproporcional e injusta. Processo que tratou de questão exclusivamente de direito. 3. Revisão do valor dos honorários para arbitrá-los por equidade, conforme art. 85, § 8º, do CPC. Precedentes. 4. Embargos de declaração parcialmente providos para fixar os honorários advocatícios por apreciação equitativa." (g.n.) (ACO 2988 ED, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 21/02/2022, Publ. 11-03-2022) Essa aparente mudança de entendimento de nossa mais alta Corte em respeito ao entendimento da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça é salutar e sem dúvida tem um efeito educativo, multiplicador e exemplar para os Tribunais Locais. Desse modo, espera-se que realmente o Tema nº 1.076 do STJ seja de observância obrigatória pelas nossas Cortes, com a eliminação de subjetivismos quanto a fixação dos honorários e reduzindo em muito os recursos em que só se discute a fixação de honorários advocatícios. __________ 1 Disponível aqui. 2 Nesse sentido o professor Cássio Scarpinella Bueno defende que "Sua aplicação, todavia, deve ficar restrita às hipóteses referidas no próprio § 8º do artigo 85, isto é, quando o proveito econômico perseguido for inestimável ou irrisório ou quando o proveito econômico perseguido for inestimável ou irrisório ou quando se tratar de valor da causa tão baixo que a fixação percentual referida nos §§ 3º e 4º do mesmo art. 85 não teria o condão de remunerar condignamente o trabalho do advogado. Entendimento contrário seria fazer prevalecer regra similar à do § 4º do art. 20 do CPC de 1973 que foi, como já destaquei acima, abolida do sistema processual pelo CPC de 2015." ("Honorários Advocatícios e o art. 85 do CPC de 2015: reflexões em homenagem ao professor José Rogério Cruz e Tucci", Estudos de Direito processual Civil em homenagem ao Professor José Rogério Cruz e Tucci, Salvador: Jus Podivm, 2018, p.134.
Dentre as inovações postas no CPC de 2015emerge a regra de previsão de majoração da verba honorária advocatícia em grau recursal (art. 85, § 11º). No tocante à majoração de honorários advocatícios recursais, já nos manifestamos nesta coluna para comentar precedentes do STJ que, a despeito da omissão do CPC de 2015 neste tema, fixou a tese de que a aplicação do art. 85, § 11º do CPC (i) há de ser observada em recursos interpostos na vigência do CPC de 2015, (ii) pressupõe pretérita sucumbência arbitrada, (iii) os honorários são majorados na hipótese de improvimento ou não conhecimento do recurso por culpa do recorrente, e (vi) o aumento da verba honorária não incide se já majorada no mesma instância recursal1. Também pudemos comentar precedentes que perfilharam o entendimento (v) do afastamento dos honorários advocatícios recursais em recursos tirados de mandado de segurança2, (vi) nos recursos de apelação tirados de sentenças ilíquidas, caberá ao juízo a quo a fixação da verba honorária cuja majoração restou determinada pelo tribunal ao improver ou não conhecer do recurso3, (vii) cabimento de honorários advocatícios recursais em embargos de declaração, caso o tribunal deixe de aplicar o art. 85, § 11º quando do julgamento da apelação4, e, (viii) decisões divergentes, no bojo do STJ, quanto ao cabimento ou não de honorários advocatícios recursais quando o objeto do recurso interposto versa exclusivamente sobre a majoração de verba honorária advocatícia arbitrada pelo juízo a quo5. As questões que gravitam em torno do tema não param por aí. Recentemente a Terceira Turma do STJ firmou o entendimento de que, em havendo cumulação de pedidos autônomos formulados por diversas partes em litisconsórcio, ao recurso interposto pela parte sucumbente e provido somente em relação a uma das pretensões deflagrada por um dos litisconsortes, há de se aplicar a majoração da verba honorária advocatícia no tocante aos demais litisconsortes, porquanto se se mantiveram como vencedores em grau recursal: "CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. REPARAÇÃO DE DANOS. PROVIMENTO DO RECURSO PARA REDUZIR A CONDENAÇÃO. HONORÁRIOS RECURSAIS. IMPOSSIBILIDADE. CONDICIONAMENTO DA VERDADE AO INTEGRAL DESPROVIMENTO DO RECURSO. PETIÇÃO INICIAL DE AÇÃO INDENIZATÓRIA AJUIZADA EM LITISCONSÓRCIO ATIVO. PEDIDOS AUTÔNOMOS E INDEPENDENTES. DIFERENTES CAUSAS DE PEDIR, AINDA QUE BASEADAS EM FATO COMUM. CUMULAÇÃO DE PEDIDOS PRÓPRIA, SUBJETIVA E SIMPLES. PRETENSÃO DE ACOLHIMENTO SIMULTÂNEO DE TODOS OS PEDIDOS. AMPLIAÇÃO DECORRENTE DO LITISCONSÓRCIO. DESTINO DAS PRETENSÕES QUE É INDIVIDUAL, INDEPENDENTE E AUTÔNOMO. REFLEXOS NA FASE RECURSAL. INTERPOSIÇÃO DE UMA ÚNICA APELAÇÃO PELO VENCIDO. NECESSIDADE DE RESULTADO DO JULGAMENTO INDIVIDUALIZADO. PROVIMENTO DO RECURSO QUE ATINGIU APENAS PARCIALMENTE O PEDIDO DE UM DOS LITISCONSORTES FACULTATIVOS SIMPLES. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS EM RELAÇÃO AOS PEDIDOS AUTÔNOMOS FORMULADOS PELOS DEMAIS LITISCONSORTES. POSSIBILIDADE. NEGATIVA DE PROVIMENTO DA APELAÇÃO EM RELAÇÃO AOS DEMAIS LITISCONSORTES. (...) 2- Os propósitos recursais consistem em definir: (i) se é possível a fixação de honorários recursais em favor do advogado do vencedor na hipótese em que a apelação do vencido somente foi provida para reduzir a condenação a ele imposta pela sentença; (ii) subsidiariamente, se é possível, na hipótese de cumulação simples subjetiva de pedidos, existir a fixação dos honorários advocatícios recursais quando o parcial provimento da apelação apenas atingir o pedido formulado por um dos litisconsortes. 3- É inadmissível a fixação de honorários recursais em favor do advogado do vencedor na hipótese em que a apelação do vencido somente foi provida para reduzir o valor da condenação, tendo em vista que o art. 85, §11, do CPC/15, interpretado à luz da jurisprudência desta Corte, exige a inadmissão ou o desprovimento integral do recurso como condição para a fixação da referida verba. Precedentes. 4- Quando a petição inicial da ação ajuizada em litisconsórcio ativo contém pedidos autônomos e independentes entre si e fundados em diferentes causas de pedir, ainda que derivados de fato comum, está configurada a existência de cumulação de pedidos própria, subjetiva e simples. 5- A cumulação é própria quando se pretende o acolhimento de todos os pedidos, de modo concomitante; a cumulação é subjetiva porque a ampliação decorrente dos pedidos formulados se opera no polo da ação, formando-se litisconsórcio; e a cumulação é simples, como o litisconsórcio que se forma a partir dela também é simples, porque o destino das respectivas pretensões é absolutamente individual, independente e autônomo 6- A interdependência entre as pretensões deduzidas, que autorizaria a propositura de ações individuais por cada um dos autores e de que resulta a possibilidade de os pedidos serem livremente julgados nas instâncias ordinárias, provoca reflexos igualmente na fase recursal, pois, ainda que o vencido tenha apresentado formalmente uma única apelação em face da sentença que julgou procedentes os pedidos em favor de todos os autores, o resultado do julgamento desse recurso deve ser individualizado. 7- Na hipótese, foram formulados, em petição inicial única, três pedidos de reparação de danos morais por três diferentes autores que, conquanto derivados de fato comum, lastreavam-se em fundamentos específicos, de modo que, julgados procedentes todos os pedidos, a impugnação do vencido a todas as pretensões acolhidas exige, por ocasião do julgamento do recurso, exame individualizado. 8- A melhor interpretação da regra do art. 85, §11, do CPC/15, à luz da jurisprudência desta Corte, é no sentido de que, na hipótese de cumulação simples e subjetiva de pedidos, o provimento do recurso que apenas atinja o pedido formulado por um dos litisconsortes facultativos simples não impede a fixação de honorários recursais em relação aos pedidos autônomos formulados pelos demais litisconsortes e que se mantiveram absolutamente intactos após o julgamento. 9- Recurso especial conhecido e parcialmente provido, a fim de majorar os honorários advocatícios devidos na apelação, de 10% para 15%, especificamente sobre os valores das condenações de que são beneficiários os autores S B L e J L B L." (STJ, REsp 1954472/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. 05/10/2021, DJe 08/10/2021, grifou-se)   (...) O voto condutor, da lavra da Ministra Nancy Andrighi, bem asseverou, em síntese: "(...) 09) A primeira tese deduzida no recurso especial diz respeito à possibilidade de fixação de honorários recursais em favor do advogado do vencedor na hipótese em que a apelação do vencido somente foi provida para reduzir a condenação a ele imposta pela sentença, na hipótese, a condenação devida a M P L (pai). 10) A esse respeito, verifica-se que a jurisprudência desta Corte se consolidou no sentido de que o provimento do recurso, ainda que parcial, é suficiente para afastar a incidência do art. 85, §11, do CPC/15, regra que apenas se aplicará nas hipóteses de inadmissão ou de desprovimento integral do recurso interposto. Nesse sentido: EDcl no REsp 1.746.789/RS, 3ª Turma, DJe 03/10/2018; REsp 1.727.396/PE, 2ª Turma, DJe 02/08/2018 e AREsp 1.532.049/MG, 2ª Turma, DJe 11/10/2019. 11) Sob esse fundamento, pois, não há que se falar em majoração dos honorários em razão da atividade em grau recursal, inexistindo violação ao art. 85, §11, do CPC/15. 12) A segunda tese deduzida no recurso especial, que versa sobre a possibilidade de, na hipótese de cumulação simples subjetiva de pedidos, existir a fixação dos honorários advocatícios recursais quando o parcial provimento da apelação apenas atingir o pedido formulado por um dos litisconsortes, merece reflexões mais profundas. 13) Do exame da petição inicial, da sentença e do acórdão recorrido, percebe-se que, a partir de um fato comum (ferimento da mãe com material perfurocortante deixado em seu leito após o parto), os três litisconsortes ativos formularam pedidos de danos morais, cada qual fundado em uma distinta causa de pedir. 14) O pai e a mãe pleitearam a reparação de danos morais em virtude do abalo psíquico que sofreram, ambos, com a suspeita de doenças graves, inclusive HIV, que poderiam acometer à mãe e, consequentemente, o próprio casal. A mãe e a criança pleitearam, ainda, a reparação de danos morais em razão de terem sido privados dos momentos de aleitamento materno, que somente puderam ser iniciados após três meses do nascimento. A mãe, exclusivamente, pleiteou a reparação de danos morais pelas reações adversas severas e graves que experimentou a partir da ingestão do medicamento destinado, preventivamente, ao combate do vírus HIV. 15) Verifica-se, pois, a existência da denominada cumulação de pedidos, que, na hipótese, pode ser classificada como própria, subjetiva e simples. 16) A cumulação é própria porque pretenderam os autores o acolhimento de todos os pedidos de reparação de danos morais de modo concomitante. A cumulação é subjetiva porque a ampliação decorrente da cumulação dos pedidos se operou no polo da ação, formando-se, na hipótese, um litisconsórcio ativo. 17) De outro lado, a cumulação é simples, como é simples o litisconsórcio formado pela família no polo ativo, porque o destino das respectivas pretensões é absolutamente independente e autônomo. (...) 19) A interdependência entre as pretensões deduzidas pelos autores é constatável de plano, pois os pedidos poderiam, em relação às partes, ser livremente julgados pelas instâncias ordinárias. 20) Com efeito, as pretensões poderiam ser julgadas procedentes ou improcedentes em relação a uma, a duas ou a todas as partes, bem como poderiam - como de fato foram - ser perfeitamente individualizadas, para cada parte, no que tange ao valor devido a título de danos morais, na medida em que, nos termos do acórdão recorrido, coube ao pai o valor de R$ 5.000,00, à mãe o valor de R$ 15.000,00 e ao filho o valor de R$ 20.000,00. 21) Em suma, é correto dizer que as ações cumulativamente ajuizadas pelos autores em litisconsórcio ativo facultativo simples poderiam ser objeto de três ações distintas, mas o foram em uma única ação porque a legislação assim autoriza, em observância aos princípios da economia processual, da celeridade e da razoável duração do processo. 22) Disso decorre o fato de que a autonomia e a independência dos pedidos cumulativamente formulados também possui reflexos na fase recursal, pois, ainda que o recorrido tenha apresentado, do ponto de vista formal, uma única apelação em face da sentença que julgou procedentes os pedidos em favor de todos os autores, fato é que o resultado do julgamento daquele recurso deve ser individualizado. (...) 26) Diante desse cenário, a melhor interpretação da regra do art. 85, §11, do CPC/15, bem como dos precedentes desta Corte, é de que deve ser excepcionado desse entendimento a hipótese em que, havendo cumulação simples e subjetiva de pedidos, o provimento do recurso apenas atinja o pedido formulado por um dos litisconsortes facultativos simples, caso em que deverá existir a fixação de honorários recursais em relação aos pedidos autônomos formulados pelos demais litisconsortes e que se mantiveram absolutamente intactos após o julgamento. (...) 28) Aplicando-se essa premissa à hipótese em exame, verifica-se que a recorrida, diante da sentença de procedência de todos os pedidos formulados pelos autores, poderia, a seu livre arbítrio, impugnar toda a condenação que lhe fora imposta ou apenas parte dela, inclusive apenas em relação a somente a algum ou alguns dos autores. 29) Como optou por impugnar integralmente a sentença, a recorrida, evidentemente, assumiu o risco de que o seu recurso viesse a ser integralmente desprovido em relação a algum ou alguns dos litisconsortes facultativos simples, o que confirma a incidência, nessa hipótese, dos honorários advocatícios recursais. (...)" (STJ, REsp 1954472/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. 05/10/2021, DJe 08/10/2021, grifou-se) O entendimento acima soa acertado, porquanto malgrado a pretensão recursal haver sido provida em desfavor de um dos litisconsortes, quanto aos demais a decisão atacada restou mantida em sua integralidade, a configurar os requisitos objetivos de a) pretérita fixação da verba honorária advocatícia arbitrada e b) manutenção dos capítulos da decisão impugnada em relação aos demais litisconsortes, a tornar cabível, portanto, a aplicação da regra do art. 85, § 11º, do CPC de 2015. __________ 1 Disponível aqui.  2 Disponível aqui. 3 Disponível aqui. 4 Disponível aqui. 5 Disponível aqui.
quinta-feira, 14 de abril de 2022

Os poderes do juiz na execução e o STJ

Logo quando entrou em vigor o Código de Processo Civil (CPC) atual, poucos perceberam uma novidade relativa à execução forçada que estava na sua Parte Geral e não na Parte Especial, Livro II, destinada ao "Processo de Execução". Refiro-me, obviamente, ao inciso IV, do art. 139, do CPC, que trata dos poderes do juiz, e dispõe que incumbe ao juiz "determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto a prestação pecuniária". Na execução forçada de obrigação de pagar quantia certa, as medidas executivas utilizadas tradicionalmente tem caráter sub-rogatório, tais como a penhora. Na execução forçada de obrigações de fazer, não fazer ou entregar coisa, as medidas executivas empregadas tem caráter coercitivo, tais como a multa. O art. 139, inciso IV, do CPC, veio romper com essa diferenciação e estabelecer que medicas coercitivas também podem ser empregadas na execução por quantia certa, ao estabelecer em sua parte final que as medidas coercitivas podem ser adotadas "(...), inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniárias". Daniel Mitidiero e Luiz Guilherme Marinoni estão entre o grupo dos que detectaram esta mudança quando ainda estava em curso o processo legislativo que resultou na lei atual, ao comentarem o dispositivo que tratava dos poderes-deveres do juiz e afirmarem: "A novidade está no reconhecimento da possibilidade de utilização de coerção para obtenção de tutela ressarcitória" (O projeto do CPC: crítica e propostas, São Paulo, Revista dos Tribunais, p.87). Pois bem, aproximadamente um ano após a entrada em vigor do Código de Processo Civil atual, começaram a ser determinadas as medidas executivas atípicas aqui e ali, sempre que se tratava de execução forçadas de obrigações de pagar quantia em dinheiro. Dentre essas medidas, é possível citar: suspensão de Carteira Nacional de Habilitação, apreensão de passaporte, proibição de utilização de cartões de crédito, proibição de participar de concursos públicos etc. Como consequência disso, começou-se a questionar quais seriam os critérios para se adotar tais medidas executivas atípicas (esgotamento das medidas típicas, por exemplo) e quais os limites para elas (não ferir os direitos fundamentais do executado, v. g.). A melhor doutrina começou a tentar delinear o que seria uma medida executiva atípica descabida e o que seria cabível. No rol das medidas descabidas, foram mencionadas a "prisão como medida atípica", a "suspensão do passaporte do executado", a "suspensão do CPF ou do CNPJ", o "cancelamento ou suspensão do uso do cartão de crédito", o "corte de água ou de energia elétrica". Como medidas admissíveis, chegou-se a mencionar "suspensão da CNH", "suspensão de brevê e arrais", "proibição de contratar com o Poder Judiciário", "proibição de contratar com o Poder Público", "multa coercitiva atípica", intervenção na pessoa jurídica devedora (Luis Eduardo Simardi Fernandes, Poderes do juiz e efetividade da execução civil", Curitiba: Editora de Direito Contemporâneo, 2022, p. 290-323). Exatamente por essa razão que a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) vai definir, sob o rito dos recursos repetitivos, "se, com esteio no artigo 139, IV, do Código de Processo Civil (CPC), é possível, ou não, o magistrado, observando-se a devida fundamentação, o contraditório e a proporcionalidade da medida, adotar, de modo subsidiário, meios executivos atípicos". Foram selecionados dois recursos como representativos da controvérsia, cadastrada como Tema 1.137: os recursos especiais 1.955.539 e 1.955.574, sendo que a relatoria é do ministro Marco Buzzi. Como consequência da decisão acima mencionada, sofrerão os credores que estão aguardando que um dia a execução se torne efetiva e que eles ficarão satisfeitos, de verdade, com o resultado do processo. Isso porque o colegiado determinou a suspensão de todos os processos e recursos pendentes que versem sobre idêntica questão, em todo o território nacional, nos termos do artigo 1.037, II, do CPC. Portanto, resta-nos aguardar agora a decisão do STJ sobre os poderes-deveres do juiz, sobretudo os do inciso IV do art. 139, do CPC, e a efetividade da execução civil. É preciso encontrar um equilíbrio entre as injustiças que podem ser cometidas com a aplicação equivocada do art. 139, inciso IV, do CPC, e a (in) efetividade do processo. Espera-se que a decisão seja equilibrada e justa, mas que também não demore muito.
O artigo 833, X, do CPC/15 prevê ser impenhorável: "a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos".  Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que essa previsão de impenhorabilidade se aplica a toda e qualquer quantia equivalente a 40 salários-mínimos, independentemente de o valor estar, de fato, depositado em uma caderneta de poupança. Essa foi a recente posição adotada, em 21/03/2022, no julgamento do AgInt no REsp 1933400 / RJ, tendo sido relatora a Ministra Maria Isabel Gallotti: "A jurisprudência desta Corte Superior entende que é impenhorável a quantia de até quarenta salários-mínimos poupada, seja ela mantida em papel-moeda; em conta corrente; aplicada em caderneta de poupança propriamente dita ou em fundo de investimentos, e ressalvado eventual abuso, má-fé, ou fraude, a ser verificado caso a caso, de acordo com as circunstâncias da situação concreta em julgamento. Precedentes." Igual raciocínio foi adotado no AgInt no REsp 1914302 / RS, tendo sido relator o Ministro Marco Aurélio Bellizze, também em recente julgamento ocorrido em 14/03/2022: "1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça manifesta-se no sentido de que todos os valores pertencentes ao devedor, até o limite de 40 (quarenta) salários mínimos, mantidos em conta-corrente, caderneta de poupança ou fundos de investimentos são impenhoráveis. 2. A proteção conferida pela regra da impenhorabilidade abrange todos os valores depositados em conta-corrente, poupança ou outras aplicações financeiras".  E no julgamento do AgInt no REsp 1914004 / DF, tendo sido relator o Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, de forma similar, entendeu-se que: "2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que são impenhoráveis os valores de até 40 (quarenta) salários mínimos poupados ou mantidos pelo devedor em conta-corrente ou em outras aplicações. 3. Na hipótese, a apresentação de defesa independe da identificação do tipo de conta onde os valores, inferiores a 40 (quarenta) salários mínimos, estão depositados". Finalmente, no julgamento do AgInt no REsp 1893441 / SP, tendo sido relator o Ministro Antonio Carlos Ferreira, igualmente pontuou-se que: "Nos termos do entendimento jurisprudencial firmado por esta Corte, a abrangência da regra do art. 833, X, do CPC/2015 se estende a todos os numerários poupados pela parte executada, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos, não importando se depositados em poupança, conta-corrente, fundos de investimento ou guardados em papel-moeda, autorizando as instâncias ordinárias, caso identifiquem abuso do direito, a afastar a garantia da impenhorabilidade". Como já noticiado nessa coluna, em 23/3/2017, essa mesma posição já estava sendo adotada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, em diversos julgamentos sobre o tema. A orientação jurisprudencial acima descrita parte da premissa de que o legislador buscou, na realidade, tornar impenhorável a quantia de 40 (quarenta) salários-mínimos, não havendo necessariamente a obrigação de tal valor estar investido na modalidade poupança. Logo, tal quantia pode estar aplicada em fundos de investimento, certificados de depósitos bancários, ou mesmo estar simplesmente depositada na conta corrente. O que o legislador buscou, na verdade, foi proteger a quantia de 40 (quarenta) salários mínimos, não se podendo exigir que tal valor esteja necessariamente atrelado a uma conta poupança. Vale lembrar que o artigo 833 do Novo Código de Processo Civil apresenta o rol dos bens impenhoráveis. Tem-se aqui o que Cândido Rangel Dinamarco1 denomina como limites políticos da execução, excluindo-se do seu campo de atuação, seja por interesse público, seja por respeito à pessoa e dignidade do devedor, determinados bens tidos como impenhoráveis. __________ 1 DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução civil. 8ª. ed. São Paulo: RT, 2002. p. 311.
A melhor sistematização dos honorários advocatícios no CPC/15 - Código de Processo Civil de 2015 é, sem dúvida, uma medida que deve ser aplaudida. Dentre as novidades do CPC/15 quanto aos honorários está a restrição à sua fixação por equidade e que era amplamente aplicada no CPC/73. De acordo com o § 8º, do art. 85 do CPC, a equidade na fixação dos honorários advocatícios só pode se dar para aumentar honorários que seriam irrisórios1. Entretanto, muitos juízes e Tribunais passaram a entender que o previsto no § 8º teria uma mão dupla, isto é, seria aplicado para aumentar honorários irrisórios e, também, poderia ser aplicado para diminuir honorários tidos por exorbitantes. Esse tema já foi abordado em diversas oportunidades em nossa coluna, tendo em vista a alternância da jurisprudência quanto à possibilidade ou não do dispositivo permitir a redução de honorários advocatícios tidos como exagerados. No último dia 23/3, a Corte Especial do STJ parece ter escrito o capítulo final dessa novela, que já dura os seis anos de vigência do CPC/15. Há pouco mais de uma semana, por 7 X 5, a Corte Especial do STJ definiu o tema 1.076 dos recursos repetitivos. O relator dos recursos submetidos a julgamento, ministro Og Fernandes, estabeleceu duas teses sobre o assunto: "1) A fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação ou da causa, ou o proveito econômico da demanda, forem elevados. É obrigatória, nesses casos, a observância dos percentuais previstos nos parágrafos 2º ou 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil (CPC) - a depender da presença da Fazenda Pública na lide -, os quais serão subsequentemente calculados sobre o valor: (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa.2) Apenas se admite o arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo."2 Os acórdãos dos casos afetados ainda não foram publicados, entretanto, parece claro que o STJ ratificou o caráter dúplice dos honorários advocatícios, que além da remuneração dos advogados, devem ser utilizados também para que se tenha uma litigiosidade mais responsável, afastando aventuras jurídicas e recursos meramente protelatórios. Tendo o referido enunciado observância obrigatória pelas instâncias ordinárias é de se esperar que deixemos de ter milhares de recursos discutindo unicamente a fixação dos honorários advocatícios, eis que afastando o subjetivismo da fixação equitativa dos honorários, restarão os critérios mais objetivos com percentuais máximo e mínimo para a sua fixação. Com o respeito ao percentual mínimo previsto em lei, será mais fácil a decisão, sob o ponto de vista econômico, em torno da racionalidade de iniciar ou não um litígio. _____ 1 Nesse sentido o professor Cássio Scarpinella Bueno defende que "Sua aplicação, todavia, deve ficar restrita às hipóteses referidas no próprio § 8º do artigo 85, isto é, quando o proveito econômico perseguido for inestimável ou irrisório ou quando o proveito econômico perseguido for inestimável ou irrisório ou quando se tratar de valor da causa tão baixo que a fixação percentual referida nos §§ 3º e 4º do mesmo art. 85 não teria o condão de remunerar condignamente o trabalho do advogado. Entendimento contrário seria fazer prevalecer regra similar à do § 4º do art. 20 do CPC de 1973 que foi, como já destaquei acima, abolida do sistema processual pelo CPC de 2015." ("Honorários Advocatícios e o art. 85 do CPC de 2015: reflexões em homenagem ao professor José Rogério Cruz e Tucci", Estudos de Direito processual Civil em homenagem ao Professor José Rogério Cruz e Tucci, Salvador: Jus Podivm, 2018, p.134. 2 Disponível aqui.
A Corte Especial do STJ, quando do julgamento do Recurso Especial n. 1.704.250/MT (Tema n. 988), decidiu, por maioria de votos, que o rol do art. 1.015 do CPC ao arrolar hipóteses taxativas de cabimento do recurso de agravo de instrumento, em verdade cede espaço à interpretação destinada à taxatividade mitigada: "RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. NATUREZA JURÍDICA DO ROL DO ART. 1.015 DO CPC/2015. IMPUGNAÇÃO IMEDIATA DE DECISÕES INTERLOCUTÓRIAS NÃO PREVISTAS NOS INCISOS DO REFERIDO DISPOSITIVO LEGAL. POSSIBILIDADE. TAXATIVIDADE MITIGADA. EXCEPCIONALIDADE DA IMPUGNAÇÃO FORA DAS HIPÓTESES PREVISTAS EM LEI. REQUISITOS. 1- O propósito do presente recurso especial, processado e julgado sob o rito dos recursos repetitivos, é definir a natureza jurídica do rol do art. 1.015 do CPC/15 e verificar a possibilidade de sua interpretação extensiva, analógica ou exemplificativa, a fim de admitir a interposição de agravo de instrumento contra decisão interlocutória que verse sobre hipóteses não expressamente previstas nos incisos do referido dispositivo legal. 2- Ao restringir a recorribilidade das decisões interlocutórias proferidas na fase de conhecimento do procedimento comum e dos procedimentos especiais, exceção feita ao inventário, pretendeu o legislador salvaguardar apenas as "situações que, realmente, não podem aguardar rediscussão futura em eventual recurso de apelação". 3- A enunciação, em rol pretensamente exaustivo, das hipóteses em que o agravo de instrumento seria cabível revela-se, na esteira da majoritária doutrina e jurisprudência, insuficiente e em desconformidade com as normas fundamentais do processo civil, na medida em que sobrevivem questões urgentes fora da lista do art. 1.015 do CPC e que tornam inviável a interpretação de que o referido rol seria absolutamente taxativo e que deveria ser lido de modo restritivo. 4- A tese de que o rol do art. 1.015 do CPC seria taxativo, mas admitiria interpretações extensivas ou analógicas, mostra-se igualmente ineficaz para a conferir ao referido dispositivo uma interpretação em sintonia com as normas fundamentais do processo civil, seja porque ainda remanescerão hipóteses em que não será possível extrair o cabimento do agravo das situações enunciadas no rol, seja porque o uso da interpretação extensiva ou da analogia pode desnaturar a essência de institutos jurídicos ontologicamente distintos. 5- A tese de que o rol do art. 1.015 do CPC seria meramente exemplificativo, por sua vez, resultaria na repristinação do regime recursal das interlocutórias que vigorava no CPC/73 e que fora conscientemente modificado pelo legislador do novo CPC, de modo que estaria o Poder Judiciário, nessa hipótese, substituindo a atividade e a vontade expressamente externada pelo Poder Legislativo. 6- Assim, nos termos do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015, fixa-se a seguinte tese jurídica: O rol do art. 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação. 7- Embora não haja risco de as partes que confiaram na absoluta taxatividade com interpretação restritiva serem surpreendidas pela tese jurídica firmada neste recurso especial repetitivo, eis que somente se cogitará de preclusão nas hipóteses em que o recurso eventualmente interposto pela parte tenha sido admitido pelo Tribunal, estabelece-se neste ato um regime de transição que modula os efeitos da presente decisão, a fim de que a tese jurídica somente seja aplicável às decisões interlocutórias proferidas após a publicação do presente acórdão. 8- Na hipótese, dá-se provimento em parte ao recurso especial para determinar ao TJ/MT que, observados os demais pressupostos de admissibilidade, conheça e dê regular prosseguimento ao agravo de instrumento no que tange à competência. 9- Recurso especial conhecido e provido." (STJ, REsp 1704520/MT, Rel. Min. Nancy Andrighi, Corte Especial, j. 05/12/2018, DJe 19/12/2018) Nesse contexto, já tecemos breves comentários a entendimentos pelo cabimento de agravo de instrumento (i) contra decisão que admite a intervenção de terceiros1 (ii) decisão que afasta a arguição de prescrição2, (iii) decisão tirada de recuperação judicial e falência3, sem prejuízo, ainda, de precedentes já referenciados quanto ao cabimento do recurso de agravo tirado contra decisões ligadas a (iv) definição de competência (v) decisões relativas à produção de provas4, assim como arbitramento de honorários periciais5 (vi) quando demonstrado risco de perecimento do direito6 (vii) decisões prolatadas no curso dos embargos à execução7 (viii) decisões prolatadas em ação de improbidade administrativa8 e, por fim, decisões interlocutórias que deixam de homologar acordo judicial9. Recentemente a Primeira Turma do STJ firmou o entendimento do cabimento de recurso de agravo como meio de impugnação cabível contra decisão que verse sobre a expedição de ofícios destinados a julgada de documentos. Trata-se do julgamento do Recurso Especial n. 1.853.458/S, havido na data de 22/02/2022: "PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CABIMENTO. ART. 1.015, VI, DO CPC/2015. PROLAÇÃO DE SENTENÇA NO PROCESSO PRINCIPAL. CARÊNCIA SUPERVENIENTE DO INTERESSE RECURSAL. AUSÊNCIA. RESPONSABILIDADE CIVIL. ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA. OPERAÇÃO "LAVA JATO". ERRO JUDICIÁRIO. INDENIZAÇÃO. REQUERIMENTO DE EXPEDIÇÃO DE OFÍCIOS PARA APRESENTAÇÃO DE ARQUIVOS. NATUREZA DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte, na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. In casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015. II - Esta Corte possui entendimento segundo o qual a prolação da sentença de mérito não induz o reconhecimento da carência superveniente do interesse processual do agravo de instrumento interposto contra decisão que defere ou indefere a produção de provas. Preliminar rejeitada. III - Na origem, o Autor, ajuizou ação cível em face da UNIÃO buscando a imposição de obrigações de fazer e indenização por danos morais causados por decisões judiciais proferidas no âmbito da denominada Operação "Lava Jato". IV - O juízo de primeiro grau indeferiu requerimento de expedição de ofícios para apresentação e juntada de documentos, ensejando a interposição de Agravo de Instrumento o qual, contudo, não foi conhecido pelo tribunal de origem. V - O art. 1.015, VI, do Código de Processo Civil de 2015 autoriza a interposição de agravo de instrumento contra decisão interlocutória que versa sobre exibição ou posse de documento ou coisa. VI - O pleito que visa a expedição de ofício para apresentação ou juntada de documento possui natureza de pedido de exibição de documento ou coisa, independentemente da menção expressa ao termo "exibição" ou aos arts. 396 a 404 do estatuto processual de 2015. VII - A circunstância de o procedimento estampado nos arts. 396 a 404 do codex processual não ser adotado não descaracteriza o pedido de pedido de exibição. VIII - É cabível agravo de instrumento contra decisão interlocutória que versa sobre a exibição de documento ou coisa, seja ela objeto de incidente processual instaurado conforme os arts. 396 a 404 do CPC 2015, de pedido de produção antecipada de provas, ou de requerimento singelo de expedição de ofício para apresentação ou juntada de documento ou coisa. "O rol do art. 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação" (REsp 1.696.396/MT, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, CORTE ESPECIAL, julgado em 05/12/2018, DJe 19/12/2018). IX - Recurso Especial parcialmente provido para determinar o retorno dos autos ao tribunal de origem a fim de dar continuidade ao julgamento do Agravo de Instrumento." (STJ, REsp n. 1.853.458/SP, Primeira Turma, Rel. Ministra Regina Helena Costa, v.u., j. 22.02.2022, grifou-se) O voto condutor restou fundado, em síntese: "(...) Dessa maneira, o pleito que reivindica a expedição de ofício para apresentação ou juntada de documento ou coisa possui natureza de pedido de exibição de documento ou coisa, independentemente da menção expressa ao termo "exibição" ou aos arts. 396 a 404 do Código de Processo Civil de 2015. Outrossim, a circunstância, usual na praxe forense, de o procedimento dos arts. 396 a 404 da carta processual não ser adotado, não descaracteriza a solicitação de expedição de ofício para apresentação ou juntada de documento como pedido de exibição. Dessa forma, haja vista o art. 1.015, VI, do codex processual não limitar a sua incidência à obediência ao disposto nos arts. 396 a 404 desse diploma normativo, não se justifica distinção quanto ao regime recursal, razão porque é cabível agravo de instrumento contra decisão interlocutória que versa sobre a exibição de documento ou coisa, seja ela objeto: i) de incidente processual instaurado conforme os arts. 396 a 404 do Código de Processo Civil de 2015; ii) de pedido de produção antecipada de provas; ou, iii) de requerimento singelo de expedição de ofício para apresentação ou juntada de documento ou coisa. (...)" O julgado acima conferiu interpretação mais ampla do art. 1.015, VI do CPC, para assim perfilhar o entendimento de que a despeito da formulação de mera expedição de ofício destinado a obtenção de documento ou coisa, tal providência se aproxima do mesmo desiderato constante no incidente de exibição de documento ou coisa previsto nos arts. 396 a 404 do CPC e, portanto, a decisão que defere ou indefere referido ofício é impugnável pela via do agravo de instrumento, ex vi ao quanto disposto no art. 1.015, VI, do CPC O julgado acima soa acertado, porquanto despreza o rótulo ou forma que restou veiculado o pleito de expedição de ofício destinado a exibição de documento ou coisa, seja referido pleito formulado de modo incidental ou por via de simples petição veiculado no curso de procedimento comum ou especial. Portanto, malgrado a redação do art. 1.015, VI, do CPC prever o cabimento do recurso de agravo contra a decisão que verse sobre "(...)exibição de documento ou coisa", pouco importa perquirir se referido pleito restou formulado incidentalmente, bastando por si só o fio condutor da decisão versar sobre exibição de documento ou coisa. __________ 1 STJ, REsp 1797991/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. 18/06/2019, DJe 21/06/2019. 2 STJ, REsp 1702725/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. 25/06/2019, DJe 28/06/2019. 3 Consoante se depreende de brilhante artigo da lavra do Professor Rogério Mollica, ao comentar o resultado do julgamento dos Recursos Especiais n. 1.707.066 e 1.717.213 4 4 Disponível aqui. TJSP, Agravo de instrumento n. 2187603-32.2016.8.26.0000, TJSP, 10ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Carlos Alberto Garbi, j. 13.12.2016. 5 Disponível aqui. TJSP, Agravo de instrumento n. 2240960-87.2017.8.26.0000, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Rel. Des. Maurício Pessoa, j. 3.4.2018.  6 Disponível aqui.  7 Disponível aqui. STJ, REsp n. 1682120/RS, Terceira Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 1.3.2019. Em verdade, referido entendimento emerge da literal redação do art. 1.015, parágrafo único, do CPC.  8 Disponível aqui. STJ, Resp n. 1.925.492-RJ, Segunda Turma, Min. Herman Benjamin, j. 4.5.2021. 9 Disponível aqui. Resp n. 1817205/SC, Primeira Turma. Min. Gurgel de Faria, v.u., j. 05.10.2021.
Em decisão tomada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) em sessão virtual concluída no último dia 08 de março de 2022, foi julgada constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contratos de locação residenciais e comerciais. Tal decisão foi proferida por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1307334, com repercussão geral (Tema 1.127). O referido Recurso Extraordinário foi interposto por um fiador contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) que confirmou a penhora de seu único imóvel, dado como garantia de um contrato de locação comercial. De acordo com o fiador, o direito constitucional de moradia (CF, art. 1º, III; art. 6º, art. 226) deveria se sobrepor à execução da dívida de aluguel comercial. Além disso, o fiador sustentava que a tese fixada pelo STF por ocasião do julgamento do RE 612360, com repercussão geral (tema 295), sobre a constitucionalidade da penhora do bem de família do fiador de contrato de locação, deveria ser aplicada apenas aos contratos de locação residencial. Entretanto, prevaleceu no STF o entendimento de que a livre iniciativa do locatário em estabelecer o seu empreendimento também é um direito fundamental (CF, art. 1º, IV; art. 170, caput) que deve se sobrepor ao direito à moradia. Foi ponderado que uma das formas mais utilizadas e menos onerosas de garantias nos contratos de locação comercial é a fiança, tendo em vista que as outras modalidades de garantia (caução e seguro-fiança). Limitar a possibilidade de fiança na locação comercial com a impenhorabilidade de bem de família do fiador significaria violar a livre iniciativa do locatário, que deve ser livre para decidir se quer ou não comprometer o seu patrimônio, ainda que seja o único imóvel de sua propriedade utilizado para fins de residência sua e de sua família (lei 8.009/1990). Assim, a tese de repercussão apresentada pelo relator foi a seguinte: "É constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, seja residencial, seja comercial". Em outras palavras, a decisão de ser fiador de contrato de locação de imóvel, residencial ou comercial, é algo que diz respeito à livre iniciativa da pessoa e que deve ser respeitada. Este entendimento do STF veio em boa hora para dar maior segurança aos contratos de locação comercial e aos atos de constrição patrimonial praticados nos processos em que se busca pela execução forçada a satisfação da obrigação de pagar aluguel. A livre iniciativa do fiador deve ser respeitada e o seu patrimônio deve responder pela dívida se o afiançado não cumprir a obrigação em primeiro lugar, ainda que o fiador tenha um único bem imóvel utilizado para fins residenciais. Espera-se que isso dê maior efetividade para execuções dessa natureza e proporcione o desenvolvimento do mercado de locação de imóveis comerciais.
O art. 523 do CPC/15 prevê que: "No caso de condenação em quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre parcela incontroversa, o cumprimento definitivo da sentença far-se-á a requerimento do exequente, sendo o executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver". Por sua vez, o artigo 525 do CPC/15 estipula que "transcorrido o prazo previsto no art. 523 sem o pagamento voluntário, inicia-se o prazo de 15 (quinze) dias para que o executado, independentemente de penhora ou nova intimação, apresente, nos próprios autos, sua impugnação". Esses prazos se contam em dias úteis, na forma como determina o art. 219 do CPC/15? Na I Jornada de Direito Processual Civil do CJF - Conselho da Justiça Federal, foi aprovado o Enunciado n. 89, que estabeleceu que: "Conta-se em dias úteis o prazo do caput do art. 523 do CPC". Logo, nessa linha, o prazo do art. 525 do CPC/15, que está relacionado com o prazo do art. 523 do CPC, também deve ser contado, da mesma forma, em dias úteis. Essa foi a posição adotada pelo STJ no julgamento do REsp 1.708.348/RJ, tendo sido relator o ministro Marco Aurélio Bellizze: "RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. INTIMAÇÃO DO DEVEDOR PARA PAGAMENTO VOLUNTÁRIO DO DÉBITO.  ART.  523, CAPUT, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE  2015. PRAZO DE NATUREZA PROCESSUAL. CONTAGEM EM DIAS ÚTEIS, NA FORMA DO ART. 219 DO CPC/2015. REFORMA DO ACÓRDÃO RECORRIDO. RECURSO PROVIDO.1.  Cinge-se a controvérsia a definir se o prazo para o cumprimento voluntário da obrigação, previsto no art. 523, caput, do Código de Processo Civil de 2015, possui natureza processual ou material, a fim de estabelecer se a sua contagem se dará, respectivamente, em dias úteis ou corrido, a teor do que dispõe o art. 219, caput e parágrafo único, do CPC/15.2.  O art. 523 do CPC/15 estabelece que, "no caso de condenação em quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre parcela incontroversa, o cumprimento definitivo da sentença far-se-á a requerimento do exequente, sendo o executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver".3.  Conquanto o pagamento seja ato a ser praticado pela parte, a intimação para o cumprimento voluntário da sentença ocorre, como regra, na pessoa do advogado constituído nos autos (CPC/15, art. 513, § 2º, I), fato que, inevitavelmente, acarreta um ônus ao causídico, o qual deverá comunicar ao seu cliente não só o resultado desfavorável da demanda, como também as próprias consequências jurídicas da ausência de cumprimento da sentença no respectivo prazo legal.3.1.  Ademais, nos termos do art. 525 do CPC/15, "transcorrido o prazo previsto no art. 523 sem o pagamento voluntário, inicia-se o prazo de 15 (quinze) dias para que o executado, independentemente de penhora ou nova intimação, apresente, nos próprios autos, sua impugnação". Assim, não seria razoável fazer a contagem dos primeiros 15 (quinze) dias para o pagamento voluntário do débito em dias corridos, se considerar o prazo de natureza material, e, após o transcurso desse prazo, contar os 15 (quinze) dias subsequentes, para a apresentação da impugnação, em dias úteis, por se tratar de prazo processual.3.2.  Não se pode ignorar, ainda, que a intimação para o cumprimento de sentença, independentemente de quem seja o destinatário, tem como finalidade  a  prática  de  um  ato  processual, pois, além de estar previsto   na  própria  legislação  processual  (CPC),  também  traz consequências  para  o processo, caso não seja adimplido o débito no prazo  legal, tais como a incidência de multa, fixação de honorários advocatícios,  possibilidade de penhora de bens e valores, início do prazo  para impugnação ao cumprimento de sentença, dentre outras. E, sendo um ato processual, o respectivo prazo, por decorrência lógica, terá a mesma natureza jurídica, o que faz incidir a norma do art. 219 do CPC/15, que determina a contagem em dias úteis." Igual raciocínio foi adotado no REsp 1.778.885/DF, tendo sido relator o ministro Og Fernandes. Ademais, o TJ/SP também já enfrentou o tema, tendo firmado posição de aplicação do art. 219 do CPC/15 aos prazos previstos nos arts. 523 e 525 do CPC/15, conforme se verificam dos acórdãos constantes dos seguintes julgamentos: (i) TJ/SP; agravo de instrumento 2234957-19.2017.8.26.0000; relator (a): Gilberto Leme; órgão julgador: 35ª Câmara de Direito Privado; foro de Paulínia - 1ª. vara Judicial; data do julgamento: 16/5/18; data de registro: 16/05/18); e (ii) TJ/SP; agravo de instrumento 2090967-67.2017.8.26.0000; relator (a): Sá Moreira de Oliveira; órgão julgador: 33ª Câmara de Direito Privado; foro de Votuporanga - 2ª vara Cível; data do julgamento: 7/8/17; data de registro: 8/8/17. A natureza processual desses prazos é reconhecida na doutrina da Professora Teresa Arruda Alvim1, bem como na doutrina do Professor Cássio Scarpinella Bueno2. Em boa hora, o STJ se posicionou sobre essa relevante matéria, fixando-se a relação natural do art. 219 do CPC/15 com os prazos processuais previstos nos arts. 523 e 525 do CPC/15. _____ 1 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins. RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva. TORRES de MELLO, Rogério Licastro. Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil. 2ª. Edição. São Paulo: RT, 2016. p. 955. 2 BUENO, Cassio Scarpinella. Manual de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 445.
A estabilização da tutela prevista no "caput" do art. 304 do CPC é uma das grandes inovações perpetradas pelo CPC Por ser um instituto novo, controverso e previsto de forma sucinta em apenas um artigo do Código, acaba gerando muitas dúvidas nos operadores. Uma das principais e que afeta diretamente os advogados é a fixação de honorários, no caso de ocorrer a estabilização da tutela concedida. O Código é silente quanto a esse ponto. Pelo princípio da causalidade, não há dúvidas quanto ao cabimento da condenação do réu ao pagamento de honorários sucumbenciais, restando, porém, incerta se tal condenação deveria seguir a regra do art. 85, § 2º, do CPC ou se deveria ocorrer redução, eis que o réu não se opôs à antecipação e permitiu a sua estabilização. A doutrina, desde logo, passou a defender a aplicação analógica da regra de fixação dos honorários no caso de ações monitórias1. Nesse sentido é o entendimento de Fredie Didier Jr., Paula Sarno Braga e Rafael Alexandria de Oliveira: "Isso se dá mediante a previsão de estabilização da decisão concessiva de tutela satisfativa (antecipada) em caráter antecedente. Monitoriza-se a tutela de urgência no rito comum ao garantir-se a realização prática e célere do direito do autor, quando é provável e antecipadamente tutelado sem que tenha havido qualquer resistência do réu. Qual é a vantagem para o réu? Diminuição do custo do processo: por não opor resistência, não pagará as custas processuais (aplicação analógica do disposto no § 1º do art. 701 do CPC) e pagará apenas 5% de honorários advocatícios de sucumbência (art. 701, caput, CPC, também aplicado por analogia)."2      Na mesma direção é a previsão do enunciado 18 da ENFAM3: "Na estabilização da tutela antecipada, o réu ficará isento do pagamento das custas e os honorários deverão ser fixados no percentual de 5% sobre o valor da causa (art. 304, caput, c/c o art. 701, caput, do CPC)". Em recente julgado o Superior Tribunal de Justiça encampou tal entendimento, determinando a aplicação analógica do art. 701 do CPC, referente a fixação dos honorários na tutela monitória: "RECURSO ESPECIAL. TUTELA ANTECIPADA ANTECEDENTE. DEFERIMENTO. RECURSO. RÉU. INEXISTÊNCIA. ESTABILIZAÇÃO. ART. 304, CAPUT, DO CPC/2015. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ART. 701, CAPUT, DO CPC/2015. APLICAÇÃO. AÇÃO MONITÓRIA. HONORÁRIOS RECURSAIS. FIXAÇÃO ANTERIOR. INEXISTÊNCIA.1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos 2 e 3/STJ).2. Cinge-se a controvérsia a definir a regra de fixação dos honorários advocatícios sucumbenciais em caso de estabilização de tutela antecipada antecedente e o cabimento dos honorários recursais em favor do recorrido.3. O art. 304, caput, do CPC/2015 trata de tutela de natureza monitória em sentido amplo, visto que permite a concessão da medida pleiteada em juízo de cognição sumária, tornando-se desnecessária a instauração do procedimento ordinário, desde que o demandado não interponha o recurso cabível.4. Os honorários advocatícios são arbitrados em 5% (cinco por cento) sobre o valor dado à causa no caso de estabilização de tutela antecedente, por força da aplicação do art. 701, caput, do CPC/15.5. A majoração dos honorários advocatícios recursais depende da fixação da referida verba na origem. Precedentes.6. Recurso especial parcialmente provido." (g.n.) (REsp 1.895.663/PR, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/12/21, DJe 16/12/21) Dada a ausência de previsão legal, a aplicação analógica do art. 701 do CPC parece ser uma medida adequada para que se tenha um critério objetivo, previsibilidade e segurança jurídica, sendo o trabalho do advogado devidamente remunerado e não onerando em demasia o réu, que concordou com a antecipação da tutela e permitiu a sua estabilização. _____ 1 O professor Daniel Amorim Assumpção Neves se mostra contrário a tal entendimento, mas defende a possibilidade de fixação de honorários em valores inferiores aos previstos no artigo 85, § 2º do CPC: "Não concordo com a premissa do pensamento porque para mim há diferenças inconciliáveis entre a tutela antecipada estabilizada e a tutela monitória, em especial quanto à formação do título executivo judicial. De qualquer forma, entendo que não é preciso recorrer a interpretações por analogia para se justificar a concessão no caso concreto de incentivo a não se insurgir contra a concessão de tutela antecipada antecedente. Esses incentivos são formas de execução indireta e, como tais, podem ser aplicadas pelo juiz de ofício, sendo possível, portanto, que o juiz isento o réu de pagamento de custas processuais e até mesmo do pagamento dos honorários advocatícios, independentemente de previsão legal expressa nesse sentido, como forma de pressionar o réu a deixar de fazer (no caso, evitar a estabilidade da tutela antecipada)". (Código de Processo Civil Comentado, 7ª ed., São Paulo: Jus Podivm, 2022, p. 549). 2 Estabilização da tutela provisória satisfativa e honorários advocatícios sucumbenciais, in Revista do Advogado, n. 126, São Paulo: AASP, 2015, p. 100). 3 Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados.
Em textos recentes disponibilizados nesta coluna comentou-se o alcance do art. 139, IV, do CPC, referente a adoção de medidas executivas atípicas, a aplicar-se tal técnica de forma subsidiária, em decisão fundamentada e alinhada às peculiaridades da causa, observado o contraditório1. Também restou comentado o entendimento do descabimento das medidas executivas atípicas no âmbito das execuções fiscais2. O tema é cativante e ainda desperta diversas dúvidas no tocante a interpretação do dispositivo. Nesse contexto, a Terceira Seção do STJ firmou o entendimento do afastamento da aplicação do art. 139, IV, do CPC quando a medida destinar-se à quebra de sigilo bancário. "RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MEDIDAS EXECUTIVAS ATÍPICAS. CABIMENTO DE FORMA SUBSIDIÁRIA. SUSPENSÃO DE CNH E APREENSÃO DE PASSAPORTE. POSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE  OSERVÂNCIA AO CONTRADITÓRIO E À PROPORCIONALIDADE. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. FINALIDADE DE SATISFAÇÃO DE DIREITO PATRIMONIAL DISPONÍVEL. INTERESSE MERAMENTE PRIVADO. DESCABIMENTO. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O propósito recursal consiste em definir o cabimento e a adequação de medidas executivas atípicas especificamente requeridas pela recorrente, sobretudo a quebra de sigilo bancário. 2. A jurisprudência desta Corte Superior, tal como já decidido no REsp n.  .788.950/MT, admite a adoção de medidas executivas atípicas, com fundamento no art. 139, IV, do CPC/2015, "desde que, verificando-se a existência de indícios de que o devedor possua patrimônio expropriável, tais medidas sejam adotadas de modo subsidiário, por meio de decisão que contenha fundamentação adequada às especificidades da hipótese concreta, com observância do contraditório substancial e do postulado da proporcionalidade" (Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 23/4/2019, DJe 26/4/2019), a exemplo das providências requeridas no presente feito, de suspensão das Carteiras Nacionais de Habilitação (CNHs) e de apreensão dos passaportes dos executados. Precedentes. 3. A falta de debate efetivo pelo Tribunal de origem acerca de questões levantadas nas razões do recurso especial caracteriza ausência de prequestionamento. Incidência da Súmula 211/STJ. 4. O sigilo bancário constitui direito fundamental implícito, derivado da inviolabilidade da intimidade (art. 5º, X, da CF/1988) e do sigilo de dados (art. 5º, XII, da CF/1988), integrando, por conseguinte, os direitos da personalidade, de forma que somente é passível de mitigação - dada a sua relatividade -, quando dotada de proporcionalidade a limitação imposta. 5. Sobre o tema, adveio a Lei Complementar n. 105, de 10/01/2001, a fim de regulamentar a flexibilização do referido direito fundamental, estabelecendo que, a despeito do dever de conservação do sigilo pela instituição financeira das "suas operações ativas e passivas e  serviços prestados" (art. 1º), esse sigilo pode ser afastado, excepcionalmente, para a apuração de qualquer ilícito criminal (art. 1º, § 4º), bem como de determinadas infrações administrativas (art. 7º) e condutas que ensejem a abertura e/ou instrução de procedimento administrativo fiscal (art. 6º). 6. Nessa perspectiva, considerando o texto constitucional acima mencionado e a LC n. 105/2001, assenta-se que o abrandamento do dever de sigilo bancário revela-se possível quando ostentar o propósito de salvaguardar o interesse público, não se afigurando cabível, ao revés, para a satisfação de interesse nitidamente particular, sobretudo quando não caracterizar nenhuma medida indutiva, coercitiva, mandamental ou sub-rogatória, como estabelece o art. 139, IV, do CPC/2015, como na hipótese. 7. Portanto, a quebra de sigilo bancário destinada tão somente à satisfação do crédito exequendo (visando à tutela de um direito patrimonial disponível, isto é, um interesse eminentemente privado) constitui mitigação desproporcional desse direito fundamental - que decorre dos direitos constitucionais à inviolabilidade da intimidade (art. 5º, X, da CF/1988) e do sigilo de dados (art. 5º, XII, da CF/1988) -, mostrando-se, nesses termos, descabida a sua utilização como medida executiva atípica. 8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, parcialmente provido. (STJ, Resp n. 1.951.176/SC, Terceira Turma, Rel. Min. Marca Aurélio Bellize, v.u., j. 19.10.2021, grifou-se) O voto condutor, da lavra do Ministro Marco Aurélio Belizze, complementa: "(...) 1. Do cabimento de medidas executivas atípicas Com efeito, dispõe o art. 139, IV, do CPC/2015, que: "o juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe [...] determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária". Consubstanciada nesse dispositivo legal, a jurisprudência desta Corte Superior, a exemplo do REsp n. 1.788.950/MT, assentou-se no cabimento de medidas executivas atípicas "desde que, verificando-se a existência de indícios de que o devedor possua patrimônio expropriável, tais medidas sejam adotadas de modo subsidiário, por meio de decisão que contenha fundamentação adequada às especificidades da hipótese concreta, com observância do contraditório substancial e do postulado da proporcionalidade" (Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 23/4/2019, DJe 26/4/2019). (...) 1.3. Da pretensão de quebra de sigilo bancário No que concerne à pretensão de quebra de sigilo bancário, a matéria merece uma análise mais detida. A princípio, convém destacar que a inviolabilidade desse sigilo, embora não esteja expressamente albergada no texto constitucional, decorre do direito fundamental de sigilo de dados consagrado constitucionalmente (art. 5º, XII, da CF/1988), o qual, por sua vez, está estreitamente ligado à inviolabilidade da intimidade e da vida privada (art. 5º, X, da CF/1988), integrando, assim, os direitos da personalidade. (...) Relativamente ao tema, adveio a Lei Complementar n. 105, de 10/01/2001 - que dispõe sobre o sigilo das operações de instituições financeiras -, estabelecendo que, a despeito do dever de conservação do sigilo pela instituição financeira das "suas operações ativas e passivas e serviços prestados" (art. 1º), esse sigilo pode ser afastado, excepcionalmente, para a apuração de qualquer ilícito criminal (art. 1º, § 4º), bem como de determinadas infrações administrativas (art. 7º) e condutas que ensejem a abertura e/ou instrução de procedimento administrativo fiscal (art. 6º). Não se destinando a nenhuma dessas finalidades, contudo, a violação ao dever de sigilo bancário, ainda que decorrente de decisão judicial, pode configurar o crime de que trata o art. 10 da LC n. 105/2001, assim redigido: Art. 10. A quebra de sigilo, fora das hipóteses autorizadas nesta Lei Complementar, constitui crime e sujeita os responsáveis à pena de reclusão, de um a quatro anos, e multa, aplicando-se, no que couber, o Código Penal, sem prejuízo de outras sanções cabíveis. Como se pode observar, essa medida drástica constante do art. 10 da LC n. 105/2001, decorre da tutela constitucional conferida, implicitamente, ao dever de sigilo dos dados bancários, que é uma espécie de direito da personalidade (proveniente da inviolabilidade à intimidade, à vida privada e ao dever de sigilo de dados), de forma que a sua flexibilização se revela possível apenas quando destinar-se à salvaguarda do interesse público. Na mesma esteira, Tercio Sampaio Ferraz Júnior (citando Celso Antônio Bandeira de Mello) discorre que, "se há interesse público envolvido, o sigilo privado sobre informações armazenadas pode ser excepcionado" (Sigilos bancário e fiscal: homenagem ao Jurista José Carlos Moreira Alves - Coordenadores Oswaldo Othon de Pontes Saraiva Filho e Vasco Branco Guimarães. 2ª edição. Belo Horizonte: Fórum, 2015, p. 102). Ao revés, não se revela plausível, em princípio, essa atenuação, quando visar à satisfação de um direito patrimonial disponível, tal como o adimplemento de obrigação pecuniária, de caráter eminentemente privado, mormente quando existentes outros meios suficientes ao atendimento dessa pretensão. A título de exemplo, como alternativa ao atendimento do objeto da execução, notadamente daquela que consista em obrigação de pagar quantia, aponta-se que o juiz pode se utilizar da penhora on-line positivada no art. 854 do CPC/2015 (equivalente ao art. 655-A do CPC/1973), determinando o bloqueio de valores porventura existentes em contas bancárias de titularidade do devedor. Aliás, ressaindo frustrada a penhora on-line, que é uma medida mais enérgica do Poder Judiciário, com menos razão se justificaria a decretação da quebra de sigilo bancário destinada à satisfação do crédito exequendo, por acarretar apenas a publicidade das movimentações bancárias da parte executada, o que não caracteriza nenhuma medida indutiva, coercitiva, mandamental ou sub-rogatória, como consta no art. 139, IV, do CPC/2015. Acerca da temática, a Terceira Turma desta Corte manifestou-se na linha cognitiva de que "a satisfação do crédito bancário, de cunho patrimonial, não pode se sobrepor ao sigilo bancário, instituto que visa proteger o direito à intimidade das pessoas, que é direito intangível da personalidade" (REsp 1.285.437/MS, Rel. Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 23/5/2017, DJe 2/6/2017). Ademais, ainda que baseado em suposta fraude o pedido de quebra de sigilo bancário, o seu acolhimento, além da necessidade de observância aos limites legais (LC n. 105/2001) e constitucionais (art. 5º, X e XII, da CF/1988) acima mencionados, pressupõe a existência de elementos indiciários da prática do ato fraudulento que implique prejuízo ao interesse público, em virtude da sua gravidade e reprovabilidade, não bastando meras alegações de interesse nitidamente privado, no sentido de longo transcurso temporal da execução (mais de 7 anos, segundo o recorrente) e de tentativas frustradas de localização de bens. Verifica-se, desse modo, o descabimento e a inutilidade da medida postulada, a denotar a sua desproporcionalidade, ressaindo impositiva a sua rejeição. Não há como subsistir, outrossim, o entendimento já exarado em outra oportunidade por esta Corte, no sentido de que "o deferimento da quebra do sigilo fiscal e bancário do executado só é possível em casos excepcionais, após comprovado que a exeqüente exauriu as possibilidades de localização de bens penhoráveis" (AgRg no Ag 982.780/SP, Rel. Ministro Massami Uyeda, Terceira Turma, julgado em 15/5/2008, DJe 6/6/2008). Portanto, a quebra de sigilo bancário destinada tão somente à satisfação do crédito exequendo (visando à tutela de um direito patrimonial disponível, isto é, um interesse eminentemente privado) constitui mitigação desproporcional desse direito fundamental - que decorre dos direitos constitucionais à inviolabilidade da intimidade (art. 5º, X, da CF/1988) e do sigilo de dados (art. 5º, XII, da CF/1988) -, mostrando-se, nesses termos, descabida a sua utilização como medida executiva atípica. (...)" Consoante se depreende do entendimento supra, as medidas atípicas previstas no art. 139, IV, do CPC não teriam o alcance de atender pedido da parte destinado a quebra de sigilo bancário. Deveras, referida medida quiçá se performaria inútil, pois impacto coercitivo algum imprimiria sobre a esfera psicológica do devedor a ponto de forçá-lo à satisfação da obrigação inadimplida ou cumprimento de ordem judicial. De toda sorte, respeitado entendimento em sentido contrário, (i) no campo da execução civil, (ii) em se tratando de crédito inadimplido, (iii) esgotados todos os meios suasórios de recebimento do crédito e (iv) presente questão controvertida havida entres as partes no que tange a alegação de desvio patrimonial ou outros meios ardilosos empregados pelo devedor  destinado a frustrar o adimplemento de obrigação, de se questionar se em tal hipótese excepcional a quebra do sigilo bancário não teria serventia, em especial para se resolver a questão controvertida necessária para julgamento de incidente de desconsideração da personalidade jurídica. Nada impede, em referida hipótese excepcional, que o acesso a tais dados sensíveis fique limitado às partes litigantes, a preservar o sigilo e publicidade externa de dados sensíveis. Em outras palavras, a providência se revelaria útil no campo da instrução processual, cujo resultado da prova teria serventia no esclarecimento de ponto controvertido havido entre as partes cujo esclarecimento seria imperativo para melhor decisão em incidente de desconsideração da personalidade jurídica. __________ 1 Consoante texto da lavra do colega Elias Marques de Medeiros Neto, clique aqui. 2 Conforme texto redigido pelo colega André Pagani de Souza, clique aqui.
Como se sabe, o art. 139, inc. IV, estabelece que "o juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: (...) determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária". É com base neste dispositivo acima transcrito que a doutrina e a jurisprudência afirmam existir a possibilidade de o juiz, na execução por quantia certa determinar a realização de "medidas executivas atípicas". São chamadas de "atípicas" porque não estão previstas em lei para serem aplicadas nessa espécie de execução, ao contrário da penhora (CPC, art. 831 e seguintes), por exemplo, que é considerada uma medida "típica". A utilização de medidas atípicas na execução por quantia certa é subsidiária, como já decidiu o Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.864.190), sendo que devem ser utilizadas na hipótese de haver sinais de que o devedor tem patrimônio expropriável (REsp 1.782.418 e REsp 1.788.950). Em várias oportunidades, já foram utilizadas como medidas atípicas com a finalidade de coerção a determinação de apreensão judicial do passaporte e da carteira de nacional habilitação (CNH) para dirigir do devedor. A discussão sempre gira em torno da limitação (ou não) do direito de ir e vir do devedor e da relação entre medida adotada e a possibilidade de ela tornar a execução mais efetiva. Entretanto, tais medidas atípicas não são aplicáveis ao processo de execução fiscal, regulado pela lei 6.830/1980, pois o STJ entendeu que o Fisco já tem muitos privilégios e já está em patente situação de vantagem sobre o devedor, não justificando a aplicação do art. 139, inc. IV, do CPC, nos executivos fiscais. Confira-se, a propósito ementa de julgado do STJ nesse sentido: "CONSTITUCIONAL. HABEAS CORPUS. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. DIREITO DE LOCOMOÇÃO, CUJA PROTEÇÃO É DEMANDADA NO PRESENTE HABEAS CORPUS, COM PEDIDO DE MEDIDA LIMINAR. ACÓRDÃO DO TC/PR CONDENATÓRIO AO ORA PACIENTE À PENALIDADE DE REPARAÇÃO DE DANO AO ERÁRIO, SUBMETIDO À EXECUÇÃO FISCAL PROMOVIDA PELA FAZENDA DO MUNICÍPIO DE FOZ DO IGUAÇU/PR, NO VALOR DE R$ 24 MIL. MEDIDAS CONSTRICTIVAS DETERMINADAS PELA CORTE ARAUCARIANA PARA GARANTIR O DÉBITO, EM ORDEM A INSCREVER O NOME DO DEVEDOR EM CADASTRO DE MAUS PAGADORES, APREENDER PASSAPORTE E SUSPENDER CARTEIRA DE HABILITAÇÃO. CONTEXTO ECONÔMICO QUE PRESTIGIA USOS E COSTUMES DE MERCADO NAS EXECUÇÕES COMUNS, NORTEANDO A SATISFAÇÃO DE CRÉDITOS COM ALTO RISCO DE INADIMPLEMENTO.RECONHECIMENTO DE QUE NÃO SE APLICA ÀS EXECUÇÕES FISCAIS A LÓGICA DE MERCADO, SOBRETUDO PORQUE O PODER PÚBLICO JÁ É DOTADO, PELA LEI 6.830/1980, DE ALTÍSSIMOS PRIVILÉGIOS PROCESSUAIS, QUE NÃO JUSTIFICAM O EMPREGO DE ADICIONAIS MEDIDAS AFLITIVAS FRENTE À PESSOA DO EXECUTADO. ADEMAIS, CONSTATA-SE A DESPROPORÇÃO DO ATO APONTADO COMO COATOR, POIS O EXECUTIVO FISCAL JÁ CONTA COM A PENHORA DE 30% DOS VENCIMENTOS DO RÉU. PARECER DO MPF PELA CONCESSÃO DA ORDEM. HABEAS CORPUS CONCEDIDO, DE MODO A DETERMINAR, COMO FORMA DE PRESERVAR O DIREITO FUNDAMENTAL DE IR E VIR DO PACIENTE, A EXCLUSÃO DAS MEDIDAS ATÍPICAS CONSTANTES DO ARESTO DO TJ/PR, APONTADO COMO COATOR, QUAIS SEJAM, (I) A SUSPENSÃO DA CARTEIRA NACIONAL DE HABILITAÇÃO, (II) A APREENSÃO DO PASSAPORTE, CONFIRMANDO-SE A LIMINAR DEFERIDA. 1. O presente Habeas Corpus tem, como moto primitivo, Execução Fiscal adveniente de acórdão do Tribunal de Contas do Estado do Paraná que responsabilizou o Município de Foz do Iguaçu/PR a arcar com débitos trabalhistas decorrentes de terceirização ilícita de mão de obra. Como forma de regresso, o Município emitiu Certidão de Dívida Ativa, com a consequente inicialização de Execução Fiscal. À época da distribuição da Execução (dezembro/2013), o valor do débito era de R$ 24.645,53. 2. Para além das diligências deferidas tendentes à garantia do juízo, tais como as consultas Bacenjud, Renajud, pesquisa on-line de bens imóveis, disponibilização de Declaração de Imposto de Renda, o Magistrado determinou a penhora de 30% do salário auferido pelo Paciente na Companhia de Saneamento do Paraná-SANEPAR, com retenção imediata em folha de pagamento. 3. O Magistrado de Primeiro Grau indeferiu, porém, o pedido de expedição de ofício aos órgãos de proteção ao crédito e suspensão de passaporte e de Carteira Nacional de Habilitação. Mas a Corte Araucariana deu provimento a recurso de Agravo de Instrumento interposto pela Fazenda de Foz do Iguaçu/PR, para deferir as medidas atípicas requeridas pela Municipalidade exequente, consistentes em suspensão de Carteira Nacional de Habilitação e apreensão de passaporte. 4. A discussão lançada na espécie cinge-se à aplicação, no Executivo Fiscal, de medidas atípicas que obriguem o réu a efetuar o pagamento de dívida, tendo-se, como referência analítica, direitos e garantias fundamentais do cidadão, especialmente o de direito de ir e vir. 5. Inicialmente, não se duvida que incumbe ao juiz determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária. É a dicção do art. 139, IV do Código Fux. 6. No afã de cumprir essa diretriz, são pródigas as notícias que dão conta da determinação praticada por Magistrados do País que optaram, no curso de processos de execução, por limitar o uso de passaporte, suspender a Carteira de Habilitação para dirigir e inscrever o nome do devedor no cadastro de inadimplentes. Tudo isso é feito para estimular o executado a efetuar o pagamento, por intermédio do constrangimento de certos direitos do devedor. 7. Não há dúvida de que, em muitos casos, as providências são assim tomadas não apenas para garantir a satisfação do direito creditício do exequente, mas também para salvaguardar o prestígio do Poder Judiciário enquanto autoridade estatal; afinal, decisão não cumprida é um ato atentatório à dignidade da Justiça. 8. De fato, essas medidas constritivas atípicas se situam na eminente e importante esfera do mercado de crédito. O crédito disponibilizado ao consumidor, à exceção dos empréstimos consignados, é de parca proteção e elevado risco ao agente financeiro que concede o crédito, por não contar com garantia imediata, como sói acontecer com a alienação fiduciária. Diferentemente ocorre nos setores de financiamento imobiliário, de veículos e de patrulha agrícola mecanizada, por exemplo, cujo próprio bem adquirido é serviente a garantir o retorno do crédito concedido a altos juros. 9. Julgadores que promovem a determinação para que, na hipótese de execuções cíveis, se proceda à restrição de direitos do cidadão, como se tem visto na limitação do uso de passaporte e da licença para dirigir, querem sinalizar ao mercado e às agências internacionais de avaliação de risco que, no Brasil, prestigiam-se os usos e costumes de mercado, com suas normas regulatórias próprias, como força centrífuga à autoridade estatal, consoante estudou o Professor JOSÉ EDUARDO FARIA na obra O Direito na Economia Globalizada. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 64/85. 10. Noutras palavras, em virtude da falta de garantias de adimplemento, por ocasião da obtenção do crédito, são contrapostas as formas aflitivas pessoais de satisfação do débito em âmbito endoprocessual. Essa modalidade de condução da lide, que ressalta a efetividade, é válida mundivisão acerca do que é o processo judicial e o seu objetivo, embora ela [a visão de mundo] não seja única, não se podendo dizer paradigmática. 11. Porém, essa almejada efetividade da pretensão executiva não está alheia ao controle de legalidade, especialmente por esta Corte Superior, consoante se verifica dos seguintes arestos: o habeas corpus é instrumento de previsão constitucional vocacionado à tutela da liberdade de locomoção, de utilização excepcional, orientado para o enfrentamento das hipóteses em que se vislumbra manifesta ilegalidade ou abuso nas decisões judiciais. O acautelamento de passaporte é medida que limita a liberdade de locomoção, que pode, no caso concreto, significar constrangimento ilegal e arbitrário, sendo o habeas corpus via processual adequada para essa análise (RHC 97.876/SP, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, DJe 9.8.2018; AgInt no AREsp. 1.233.016/SP, Rel. Min. MARCO AURÉLIO BELLIZZE, DJe 17.4.2018). 12. Tratando-se de Execução Fiscal, o raciocínio toma outros rumos quando medidas aflitivas pessoais atípicas são colocadas em vigência nesse procedimento de satisfação de créditos fiscais. Inegavelmente, o Executivo Fiscal é destinado a saldar créditos que são titularizados pela coletividade, mas que contam com a representação da autoridade do Estado, a quem incumbe a promoção das ações conducentes à obtenção do crédito. 13. Para tanto, o Poder Público se reveste da Execução Fiscal, de modo que já se tornou lugar comum afirmar que o Estado é superprivilegiado em sua condição de credor. Dispõe de varas comumente especializadas para condução de seus feitos, um corpo de Procuradores altamente devotado a essas causas, e possui lei própria regedora do procedimento (Lei 6.830/1980), com privilégios processuais irredarguíveis. Para se ter uma ideia do que o Poder Público já possui privilégios ex ante, a execução só é embargável mediante a plena garantia do juízo (art. 16, § 1o. da LEF), o que não encontra correspondente na execução que se pode dizer comum. Como se percebe, o crédito fiscal é altamente blindado dos riscos de inadimplemento, por sua própria conformação jusprocedimental. 14. Não se esqueça, ademais, que, muito embora cuide o presente caso de direito regressivo exercido pela Municipalidade em Execução Fiscal (caráter não tributário da dívida), sempre é útil registrar que o crédito tributário é privilegiado (art. 184 do Código Tributário Nacional), podendo, se o caso, atingir até mesmo bens gravados como impenhoráveis, por serem considerados bem de família (art. 3o., IV da Lei 8.009/1990). Além disso, o crédito tributário tem altíssima preferência para satisfação em procedimento falimentar (art. 83, III da Lei de Falências e Recuperações Judiciais - 11.101/2005). Bens do devedor podem ser declarados indisponíveis para assegurar o adimplemento da dívida (art. 185-A do Código Tributário Nacional). São providências que não encontram paralelo nas execuções comuns. 15. Nesse raciocínio, é de imediata conclusão que medidas atípicas aflitivas pessoais, tais como a suspensão de passaporte e da licença para dirigir, não se firmam placidamente no Executivo Fiscal. A aplicação delas, nesse contexto, resulta em excessos.(...)(HC 453.870/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 25/06/2019, DJe 15/08/2019, grifos nossos)". Como é possível perceber, o Superior Tribunal de Justiça reconhece que a Fazenda Pública e, em especial, o Fisco, já goza de inúmeros privilégios na execução fiscal outorgados pela Lei 6.830/1980, sendo que a autorização de medidas atípicas contra o executado nesta espécie de processo violaria o princípio da igualdade (CF, art. 5º, caput). Tal entendimento do Superior Tribunal de Justiça é digno de aplausos pois parece superar o frágil argumento de que o Fisco estaria sempre defendendo o interesse público sob pretexto de defender o Erário quando, na verdade, o interesse público maior (primário) é o de exercer corretamente a jurisdição, observando-se o princípio do devido processo legal e um de seus mais importantes corolários que é o princípio da igualdade. Em outras palavras, reconheceu-se que o tratamento dado ao Fisco já é de ampla vantagem no processo de execução fiscal e que lhe conferir mais vantagens do que já tem resultaria em um processo extremamente injusto e viabilizador de excessos, o que desmoralizaria o próprio Estado-juiz como distribuidor de justiça, sacrificando um interesse genuinamente público, comprometendo a credibilidade do cidadão em todo o sistema de justiça. O Fisco deve ter prerrogativas, mas não privilégios. Estes últimos são oriundos de tratamentos especiais, diferenciados, sem fundamento na Constituição Federal. É mais do que necessário, aos poucos, ir apontado tais privilégios e retirando as vantagens indevidas dadas ao Estado, como fez o STJ no caso concreto.
Recentemente, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça ("STJ"), através do julgamento de recurso especial repetitivo (Tema 1.097), fixou a tese de que: "em se tratando de multa aplicada às pessoas jurídicas proprietárias de veículo, fundamentada na ausência de indicação do condutor infrator, é obrigatório observar a dupla notificação: a primeira, que se refere à autuação da infração, e a segunda, sobre a aplicação da penalidade, conforme estabelecido nos artigos 280, 281 e 282 do Código de Trânsito Brasileiro". Com a fixação dessa tese, corrobora-se a linha que já vinha sendo adotada pelo STJ, havendo, inclusive, a súmula n. 312 quanto ao tema: "No processo administrativo para imposição de multa de trânsito, são necessárias as notificações da autuação e da aplicação da pena decorrente da infração." No processo administrativo regulado pelo Código de Trânsito Brasileiro ("CTB"), uma vez identifica a infração, nos moldes do artigo 280 do CTB, será lavrado o respectivo auto, sendo necessário seu preenchimento de acordo com as formalidades previstas nos incisos do referido artigo. E cabe pontuar que, conforme o artigo 257, §§ 7º e 8º, do CTB, não havendo imediata identificação do infrator, o proprietário do veículo terá o prazo de trinta dias para apresentá-lo. É certo que há a necessidade de envio de duas notificações para a devida aplicação das penas decorrentes das infrações de trânsito. Isso porque, constatada conduta infracional, deverá ser gerada uma notificação para cientificar o proprietário ou principal condutor acerca da sua lavratura. Existindo defesa julgada improcedente ou na sua ausência, nova notificação deverá ser expedida, desta vez comunicando a imposição da penalidade. Caso o veículo seja de propriedade de pessoa jurídica, caberá a esta a indicação do condutor infrator. A omissão da pessoa jurídica proprietária de veículo automotor em identificar quem o conduzia quando da autuação, deverá gerar novo auto de infração em relação à multa prevista no § 8º do artigo 257 do CTB, para que assim possa exercer seu direito constitucional de ampla defesa. Caso a pessoa jurídica não apresente defesa ou sua defesa seja julgada insubsistente, deverá ser enviada nova notificação para que tal pessoa jurídica tenha ciência da penalidade imposta. A validade do ato administrativo está condicionada ao envio de duas notificações, sendo: a primeira na lavratura do auto, "valendo esta como notificação de cometimento de infração" (Art. 280, IV, do CTB) e a segunda, após o julgamento da penalidade, "que assegure a ciência da imposição da penalidade" (Art. 282, do CTB). Esse era o entendimento já consolidado no STJ, recentemente reafirmado no tema 1.097: "ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. AÇÃO DECLARATÓRIA. MULTA ADMINISTRATIVA ACESSÓRIA. INDICAÇÃO DE CONDUTOR INFRATOR. ARTS. 280, 281 E 282 DO CTB. NECESSIDADE DE SEGUNDA NOTIFICAÇÃO. 1. O cerne da argumentação do agravante consiste na defesa de que "nada impede que órgão de trânsito concentre numa única notificação todos os avisos necessários", e de que, por causa disso, é lícito que seja dispensada a segunda notificação de imposição de multa administrativa aplicada, por ausência de indicação de condutor. 2. Não obstante, como foi claramente dito na decisão anterior, o STJ compreende que é, sim, necessária a dupla notificação, mesmo quando o veículo pertence a pessoa jurídica. Precedentes do STJ. 3. "No que concerne à alegação de violação dos arts. 280 e 281, II, do Código de Trânsito Brasileiro, com razão a recorrente nesse ponto, estando o acórdão recorrido em confronto com a jurisprudência deste STJ, no sentido de que, mesmo em se tratando de multa aplicada à pessoa jurídica proprietária de veículo, fundamentada na ausência de indicação do condutor infrator, é obrigatório observar a dupla notificação: a primeira que se refere à autuação da infração e a segunda sobre a aplicação da penalidade, conforme estabelecido nos arts. 280, 281 e 282 do CTB. Nesse sentido: AREsp 1.150.193/SP, Rel. Min. Assusete Magalhães, Julgamento em 31/10/2017, Dje. 6/11/2017 e REsp 1.666.665/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, Dje de 19/6/2017." (AgInt nos EDcl no AREsp 1219594/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 24/10/2018). 4. Além disso, sendo administrativa ou de trânsito a multa, não se vê razoável motivo para dela afastar a aplicação dos arts. 280, 281, 282 do CTB (os quais estão contidos na mesma lei federal que prevê tal multa), nem mesmo obstáculos que impossibilitem que uma segunda notificação seja expedida antes da imposição da penalidade, sendo incontestável que o próprio art. 257, § 8º, do CTB determina sanção financeiramente mais grave à pessoa jurídica que não identifica o condutor no prazo legal. Não se trata, portanto, de "fazer letra morta o texto legal", mas, ao contrário, de cumpri-lo com efetividade. 5. Por tudo isso, é mister manter a decisão anterior, que deu provimento ao Recurso Especial da parte agravada para declarar nulos os autos de infração em apreço, por falta de dupla notificação, nos termos da fundamentação. 6. Agravo Interno não provido." (STJ, AgInt no REsp 1901841 / SP, 2ª Turma, Min. Rel. Herman Benjamin, DJe 06.04.2021). "A obrigatoriedade da dupla notificação prevista nos arts. 280, 281 e 282 do Código de Trânsito Brasileiro aplica-se no procedimento de imposição  de multa por ausência de identificação do responsável pela  condução  do veículo por ocasião do cometimento de infração de trânsito." (STJ, REsp 1736145 /SP, 1ª Turma, Minª. Relª. Regina Helena Costa, Dje 20.08.2018). "2. Nos termos da jurisprudência do STJ, a norma dos arts. 280, 281 e 282 do CTB se aplica à imposição de multa por ausência de identificação do responsável pela condução do veículo por ocasião do cometimento de infração de trânsito. 3. Consoante a Súmula 312/STJ, no processo administrativo, para imposição de multa de trânsito, são necessárias as notificações da autuação e da aplicação da pena decorrente da infração." (STJ, REsp 1879009 / SP, 2ª Turma, Min. Rel. Herman Benjamin, DJe 06.10.2020). Nesse mesmo sentido, podem ser citados os seguintes julgados do Col. STJ: AgInt no REsp 1851111/SP, 1ª Turma, Min. Rel. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 29.06.2020; AgInt no REsp 1849050 / SP, 1ª Turma, Min. Rel. Benedito Gonçalves, DJe 27.11.2020; REsp 1790627/SP, 2ª Turma, Min. Rel. Herman Benjamin, DJe 30.05.2019; AgInt no REsp 1829234 / SP, 2ª Turma, Min. Rel. Mauro Campbell Marques, DJe 27.11.2019; AgInt nos EDcl no AREsp 1219594/SP, 2ª Turma, Min. Rel. Francisco Falcão, DJe 24.10.2018; REsp 1666665/SP, 2ª Turma, Min. Rel. Herman Benjamin, Dje 19.06.2017; e AgInt no AREsp 906113/SP, 2ª Turma, Min. Rel. Francisco Galvão, Dje 08.03.2017. O assunto ganhou tamanha relevância que o Col. STJ julgou o Recurso Especial do Sindicato das Empresas Locadoras de Veículos Automotores do Estado de São Paulo, através do rito dos recursos repetitivos (REsp n. 1.925.456/SP), tendo fixado a tese acima referida e relativa ao Tema 1.097. O CPC/15 se dedica seriamente a regular o regime de julgamento de recursos especiais repetitivos. O artigo 1036 do CPC/15 estipula que sempre que houver multiplicidade de recursos especiais com fundamento em idêntica questão de direito, haverá afetação para fins de julgamento no regime de recursos repetitivos, observado o disposto no regimento interno do STJ. O presidente ou o vice-presidente do tribunal de origem deve selecionar 2 ou mais recursos representativos da controvérsia, que serão encaminhados ao STJ para fins de afetação, determinando-se a suspensão do trâmite de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que tramitam no Estado ou na região. O relator no tribunal superior poderá, ainda, selecionar outros recursos representativos da controvérsia. Caso o interessado tenha o objetivo de evitar o sobrestamento do trâmite de recurso especial intempestivo, é possível que o mesmo apresente requerimento de inadmissão do recurso especial perante o tribunal a quo, tendo o recorrente o prazo de 5 (cinco) dias para manifestar-se. Caso este requerimento seja indeferido, com a manutenção do sobrestamento do recurso especial, o interessado poderá interpor agravo interno. Caso o tribunal de origem não tenha a iniciativa de selecionar recursos representativos da controvérsia, o relator no tribunal superior também poderá fazer a seleção, indicando 2 ou mais recursos representativos da matéria repetitiva. O CPC/15 tem o cuidado de indicar aos tribunais que selecionem, para fins de afetação, recursos admissíveis e que contenham abrangente argumentação acerca da matéria repetitiva a ser julgada. Nos termos do artigo 1037 do CPC/15, o relator, no tribunal superior proferirá decisão de afetação, na qual determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional. Os recursos afetados deverão ser julgados no prazo de 1 ano e terão preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvam réu preso e os pedidos de habeas corpus. Uma vez intimadas da decisão de suspensão de seu processo, as partes poderão demonstrar a distinção entre a questão a ser decidida no processo e aquela a ser julgada no recurso especial afetado; requerendo-se o prosseguimento do seu processo, devendo a outra parte ser intimada para se manifestar no prazo de 5 dias. Este pedido será dirigido: (i) ao juiz, se o processo sobrestado estiver em primeiro grau; (ii) ao relator, se o processo sobrestado estiver no tribunal de origem; (iii) ao relator do acórdão recorrido, se for sobrestado recurso especial no tribunal de origem; e (iv) ao relator, no tribunal superior, de recurso especial, cujo processamento houver sido sobrestado. A decisão que resolver o requerimento acima referido será recorrível por agravo de instrumento, caso tenha sido proferida por magistrado em primeira instância. Por outro lado, caberá agravo interno, caso a decisão tenha sido proferida no tribunal de origem ou superior. O artigo 1038 do CPC/15 confere ao relator a possibilidade de solicitar ou admitir manifestação de terceiros em conformidade com o artigo 138 do CPC/15, bem como fixar data para audiência pública. O relator também pode requisitar informações aos tribunais de origem, os quais terão 15 dias para cumprir a determinação. O Ministério Público será intimado para se manifestar em 15 dias após o recebimento das informações. Cassio Scarpinella Bueno1 lembra que "o inciso I do art. 1038 permite ampla participação de terceiros intervenientes na qualidade de amici curiae. São aqueles intervenientes que farão as vezes das 'pessoas, órgãos ou entidades com interesse na controvérsia, considerando a relevância da matéria', observando, desde que não haja restrição à sua ampla participação, fundamentada genericamente no art. 138, o que dispuser o RISTF e do RISTJ". Após essas providências instrutórias, o caso será julgado, sendo que o conteúdo do acórdão deverá abranger os fundamentos relevantes da tese jurídica debatida. Em homenagem à uniformização de jurisprudência, o artigo 1039 do CPC/15 prescreve que, uma vez decididos os recursos afetados, os órgãos colegiados considerarão prejudicados os recursos versando sobre idêntica controvérsia ou os julgarão em conformidade com a tese firmada pelo tribunal superior. Também em linha com a necessidade de uniformização de jurisprudência, o artigo 1040 do CPC/15 é cristalino ao dispor que, uma vez publicado o acórdão paradigma: (i) o presidente ou o vice-presidente do tribunal de origem negará seguimento aos recursos especiais sobrestados na origem, se o acórdão recorrido coincidir com a orientação do tribunal superior; (ii) o órgão que proferiu o acórdão recorrido, na origem, reexaminará o processo de competência originária, a remessa necessária ou o recurso anteriormente julgado, se o acórdão recorrido contrariar a orientação do tribunal superior; (iii) os processos suspensos em primeiro e segundo graus de jurisdição retomarão o curso para julgamento e aplicação da tese firmada pelo tribunal superior; (iv) se os recursos versarem sobre questão relativa à prestação de serviço público objeto de concessão, permissão ou autorização, o resultado do julgamento será comunicado ao órgão, ao ente ou à agência reguladora competente para fiscalização da efetiva aplicação, por parte dos entes sujeitos a regulação, da tese adotada. Antes de ser proferida sentença, uma vez fixada a tese vinculante firmada no regime de julgamento repetitivo, a parte autora, independentemente do consentimento do réu, poderá desistir da ação em curso na primeira instância, caso a questão seja rigorosamente idêntica à matéria que foi objeto do julgamento. Caso a desistência ocorra antes de apresentada a contestação, a parte ficará isenta do pagamento de custas e de honorários de sucumbência. Se, nos termos do artigo 1.041 do CPC/15, o tribunal de origem venha a manter o acórdão divergente, o recurso especial será remetido ao respectivo tribunal superior para fins de julgamento. A força vinculante da tese fixada em sede de julgamento de recurso especial repetitivo é bem nítida na análise dos artigos 311, II, 332, 927, III, do CPC/15. __________ 1 BUENO, Cássio Scarpinella. Manual de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 727.
A Defensoria Pública realiza o valoroso trabalho de assistir os mais necessitados nas ações judiciais, propiciando o efetivo acesso à Justiça aos hipossuficientes. Apesar de tão nobre e importante trabalho, o número de defensores públicos é muito aquém da real necessidade. Desse modo, as Defensorias de todos os Estados fazem convênios com a OAB, para que advogados dativos possam ajudar a suprir tão notável tarefa. No desempenho de suas funções, o Defensor Público tem asseguradas pela Lei Orgânica da Defensoria Pública (LC 80/94), em seu artigo 44, várias prerrogativas processuais. Já o Código de Processo Civil garante à Defensoria Pública o prazo em dobro em todas as suas manifestações processuais (art. 186), bem como a intimação pessoal do defensor público (art. 186, § 1º) e da parte patrocinada pela Defensoria, quando o ato processual depender de providência ou informação que somente por ela possa ser realizada ou prestada (art. 186, § 2º). Já o § 3º, do artigo 186 do CPC, assegura aos escritórios de prática jurídica das faculdades de Direito e às entidades que prestam assistência jurídica gratuita, mas que tenham convênios com a Defensoria Pública a contagem do prazo em dobro em suas manifestações processuais. Dúvida surge quanto à aplicação da intimação pessoal do advogado que atua na Assistência Judiciária por meio de convênio (§ 1º) e da própria parte assistida (§ 2º), eis que o parágrafo terceiro só estende a prerrogativa do prazo em dobro às entidades que mantêm convênio com a Defensoria Pública1. Parece claro que a não extensão da intimação pessoal do advogado e da parte assistida a todos que efetivamente realizem Assistência Judiciária ocasiona um desequilíbrio processual capaz de afetar normas processuais fundamentais, como o contraditório e a ampla defesa2. O Superior Tribunal de Justiça decidiu recentemente que a Prerrogativa da Intimação Pessoal da Parte conferida pelo artigo 186, § 2º, do CPC deve ser estendida aos casos em que a assistência se dá via Defensores Dativos: "CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO CONSTITUCIONAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. INTIMAÇÃO PESSOAL DA PARTE ASSISTIDA PELA DEFENSORIA PÚBLICA. EXTENSÃO DA PRERROGATIVA AO DEFENSOR DATIVO. POSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA E TELEOLÓGICA DO ART. 186, §2º, DO CPC/15. AUSÊNCIA DE RAZÃO JURÍDICA PLAUSÍVEL PARA TRATAMENTO DIFERENCIADO ENTRE A DEFENSORIA PÚBLICA E O DEFENSOR DATIVO NA HIPÓTESES. PROBLEMAS DE COMUNICAÇÃO, DE OBTENÇÃO DE INFORMAÇÕES E EXCESSO DE CAUSAS, QUE JUSTIFICARAM A EDIÇÃO DA REGRA, QUE SÃO EXPERIMENTADOS POR AMBOS. INTERPRETAÇÃO LITERAL E RESTRITIVA QUE ACARRETARIA NOTÓRIO PREJUÍZO AO ASSISTIDO QUE A LEI PRETENDEU TUTELAR, COM VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO ACESSO À JUSTIÇA, DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. EXTENSÃO DA PRERROGATIVA AO DEFENSOR DATIVO PLENAMENTE JUSTIFICÁVEL. INTIMAÇÃO PESSOAL DA PARTE ASSISTIDA. EXIGÊNCIA DE QUE HAJA PROVIDÊNCIA A SER POR ELA REALIZADA OU INFORMAÇÃO A SER POR ELA PRESTADA. EXERCÍCIO DO DIREITO DE RECORRER CONTRA A SENTENÇA PARCIALMENTE DESFAVORÁVEL AO ASSISTIDO. DESNECESSIDADE DA INTIMAÇÃO PESSOAL DO ASSISTIDO. MANDATO COM PODERES GERAIS DA CLÁUSULA AD JUDICIA. AUTORIZAÇÃO PARA A PRÁTICA DE TODOS OS ATOS PROCESSUAIS NECESSÁRIOS À DEFESA DO ASSISTIDO, INCLUSIVE RECORRER. 1- O propósito recursal é definir se é admissível a extensão da prerrogativa conferida à Defensoria Pública, de requerer a intimação pessoal da parte na hipótese do art. 186, §2º, do CPC/15, também ao defensor dativo nomeado em virtude de convênio celebrado entre a OAB e a Defensoria e se, na hipótese, estão presentes os pressupostos para o deferimento da intimação pessoal da parte assistida. 2- A interpretação literal das regras contidas do art. 186, caput, §2º e §3º, do CPC/15, autorizaria a conclusão de apenas a prerrogativa de cômputo em dobro dos prazos prevista no caput seria extensível ao defensor dativo, mas não a prerrogativa de requerer a intimação pessoal da parte assistida quando o ato processual depender de providência ou informação que somente por ela possa ser realizada ou prestada. 3- Esse conjunto de regras, todavia, deve ser interpretado de modo sistemático e à luz de sua finalidade, a fim de se averiguar se há razão jurídica plausível para que se trate a Defensoria Pública e o defensor dativo de maneira anti-isonômica. 4- Dado que o defensor dativo atua em locais em que não há Defensoria Pública instalada, cumprindo o quase altruísta papel de garantir efetivo e amplo acesso à justiça aqueles mais necessitados, é correto afirmar que as mesmas dificuldades de comunicação e de obtenção de informações, dados e documentos, experimentadas pela Defensoria Pública e que justificaram a criação do art. 186, §2º, do CPC/15, são igualmente frequentes em relação ao defensor dativo. 5- É igualmente razoável concluir que a altíssima demanda recebida pela Defensoria Pública, que pressiona a instituição a tratar de muito mais causas do que efetivamente teria capacidade de receber, também se verifica quanto ao defensor dativo, especialmente porque se trata de profissional remunerado de maneira módica e que, em virtude disso, naturalmente precisa assumir uma quantidade significativa de causas para que obtenha uma remuneração digna e compatível. 6- A interpretação literal e restritiva da regra em exame, a fim de excluir do seu âmbito de incidência o defensor dativo, prejudicará justamente o assistido necessitado que a regra pretendeu tutelar, ceifando a possibilidade de, pessoalmente intimado, cumprir determinações e fornecer subsídios, em homenagem ao acesso à justiça, ao contraditório e à ampla defesa, razão pela qual deve ser admitida a extensão da prerrogativa conferida à Defensoria Pública no art. 186, §2º, do CPC/15, também ao defensor dativo nomeado em virtude de convênio celebrado entre a OAB e a Defensoria. 7- Segundo o art. 186, §2º, do CPC/15, a intimação pessoal da parte assistida pressupõe uma providência que apenas por ela possa ser realizada ou uma informação que somente por ela possa ser prestada, como, por exemplo, indicar as testemunhas a serem arroladas, exibir documento por força de ordem judicial, cumprir a sentença (art. 513, §2º, II, do CPC/15) e ser cientificado do requerimento, pelo exequente, de adjudicação do bem penhorado (art. 876, §1º, II, do CPC/15). 8- O ato de recorrer da sentença que for desfavorável ao assistido, contudo, não está no rol de providências ou de informações que dependam de providência ou de informação que somente possa ser realizada ou prestada pela parte, pois o mandato outorgado ao defensor dativo lhe confere os poderes gerais da cláusula ad judicia, que permitem ao defensor não apenas ajuizar a ação, mas também praticar todos os atos processuais necessários à defesa dos interesses do assistido, inclusive recorrer das decisões que lhe sejam desfavoráveis. 9- Na hipótese, ademais, há procuração outorgada pela assistida com poderes expressos para recorrer e que foi utilizada pelo defensor dativo, inclusive, para, em nome dela, impetrar o mandado de segurança e para interpor recurso ordinário do acórdão que denegou a ordem, o que demonstra a desnecessidade da prévia intimação pessoal da assistida para que fosse impugnada a sentença de parcial procedência da ação de divórcio cumulada com guarda e alimentos. 10- Recurso ordinário em mandado de segurança conhecido e desprovido." (g.n.) (RMS 64.894/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/08/2021, DJe 09/08/2021) (AgInt no REsp 1914793/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/06/2021, DJe 01/07/2021) Conforme se depreende do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, mesmo o Código de Processo Civil tendo limitado tal prerrogativa aos Defensores Públicos, a intenção do legislador seria facilitar o trabalho dos defensores dos mais necessitados, eis que a comunicação com seus "clientes" seria mais difícil e, portanto, não importaria se fossem assistidos pela Defensoria Pública ou por advogados dativos, pois as dificuldades seriam as mesmas. Desse modo, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça parece atender ao escopo pretendido pelo legislador de proteger os assistidos hipossuficientes e de dar melhores condições a todos que prestam o valoroso trabalho da Assistência Judiciária, entretanto, seria importante que tal previsão passasse a ser expressa no Código de Processo Civil, para se afastar subjetivismos e decisões contraditórias.____________ 1 Segundo o professor José Roberto dos Santos Bedaque: "A ampliação do prazo é estendida a outras entidades, cujo escopo seja também a defesa de pessoas necessitadas (§3º). A intimação pessoal, todavia, não foi prevista pelo legislador. A regra faz referência apenas ao disposto no caput, ou seja, a ampliação do prazo. A limitação é, pois, expressa. Nessa medida, o benefício da intimação pessoal não se lhes aplica." (Comentários ao Código de Processo Civil - vol. III (arts 119-187): Da Intervenção de Terceiros até a Defensoria Pública, coordenação José Roberto Ferreira Gouvêa, Luis Guilherme Aidar Bondioli, João Francisco Naves da Fonseca, São Paulo: Saraiva, 2019, p. 356). 2 Nesse mesmo sentido já tive oportunidade de defender em artigo escrito conjuntamente com a professora Janice Coelho Derze e apresentado no XXVIII Encontro Nacional do Conpedi em Goiânia - GO e que pode ser acessado no seguinte link http://conpedi.danilolr.info/publicacoes/no85g2cd/1n5o200a/1bHALopnJ44Hl73m.pdf Outro não é o entendimento de Zumar Duarte de Oliveira Jr. ao prever que "Presente que a assistência judiciária é um direito e garantia individual e que o olhar aqui deve ser sempre pautado pela máxima proteção possível, pensamos que a melhor exegese no tema é aquela que estende a dobra do prazo e a intimação pessoal aos Defensores Públicos, aos escritórios e entidades indicadas no § 3º, bem como a todos aqueles que atuem em favor dos assistidos pela justiça gratuita." (in Teoria Geral do Processo: Comentários ao CPC de 2015: parte geral, coord. Fernando da Fonseca Gajardoni, São Paulo: Forense, 2015, p. 601). Em sentido contrário e entendendo inclusive que o § 3º do art. 186 seria inconstitucional vide Patrícia Elias Cozzolino de Oliveira in Comentários ao Código de Processo Civil- vol. 1, coord. Cássio Scarpinella Bueno, São Paulo: Saraiva, 2017, p. 735/736.
A reclamação constitucional, prevista no art. 105, I, f, da CF/88, bem como no art. 988 do CPC/15 (redação da lei 13.256/16), constitui meio de impugnação judicial destinado à preservação da competência do Tribunal (inciso I), a garantir a autoridade de suas decisões (inciso II) e à observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência (inciso IV e § 4º). Em determinado caso concreto houve o processamento de pedido de uniformização pelo STJ, de sorte que o Reclamante manejou a reclamação destinada a obter ordem de suspensão da demanda cuja questão jurídica seria a mesma a ser decidida no pedido de uniformização, a assim, em seu entender, preservar a uniformidade de entendimentos e isonomia no tratamento de questões congêneres por parte do Poder Judiciário. Nesse contexto, a 1ª seção do STJ firmou o entendimento de que a decisão que se busca preservar sua autoridade deve emanar do próprio caso concreto em que o Reclamante tenha figurado como parte. "PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NA RECLAMAÇÃO. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. RECLAMAÇÃO. ART. 105, I, F, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. ART. 988 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. INCIDENTE PROCESSUAL DESTINADO À PRESERVAÇÃO DA COMPETÊNCIA DESTE SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E GARANTIR A AUTORIDADE DE SUAS DECISÕES, TOMADAS NO CASO CONCRETO. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. INSTITUTO PROCESSUAL QUE NÃO SE PRESTA A DISCUTIR A NECESSIDADE DE SOBRESTAMENTO DO FEITO NA ORIGEM. INVIABILIDADE. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DESCABIMENTO. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. In casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015. II - A Reclamação, prevista no art. 105, I, f, da Constituição da República, bem como no art. 988 do Código de Processo Civil de 2015 (redação dada pela Lei n. 13.256/2016), constitui incidente processual destinado à preservação da competência deste Superior Tribunal de Justiça (inciso I), a garantir a autoridade de suas decisões, no próprio caso concreto, em que o Reclamante tenha figurado como parte, (inciso II) e à observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência (inciso IV e § 4º). III. É incabível o ajuizamento de reclamação contra decisão que defere ou indefere o sobrestamento do feito em razão de processamento de pedido de uniformização ou recurso especial repetitivo. IV - Não apresentação de argumentos suficientes para desconstituir a decisão recorrida. V - Em regra, descabe a imposição da multa, prevista no art. 1.021, § 4º, do Código de Processo Civil de 2015, em razão do mero improvimento do Agravo Interno em votação unânime, sendo necessária a configuração da manifesta inadmissibilidade ou improcedência do recurso a autorizar sua aplicação, o que não ocorreu no caso. IV - Agravo interno improvido."1 O voto condutor, da lavra da ministra Helena Costa, complementa:  "(...) Ressalte-se, ademais, que a Reclamação, a teor do art. 105, I, f da Constituição da República, destina-se a garantir a autoridade das decisões desta Corte, no próprio caso concreto, em que o Reclamante tenha figurado como parte, ou à preservação de sua competência, não servindo como sucedâneo recursal, consoante espelham os seguintes precedentes:   PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. ICMS. ART. 187 DO RISTJ. ART. 988 DO CPC/15. SOBRESTAMENTO EFETIVADO NO TRIBUNAL A QUO. DESOBEDIÊNCIA. AUSÊNCIA. A RECLAMAÇÃO NÃO SE PRESTA PARA VERIFICAR EVENTUAL EQUÍVOCO NO SOBRESTAMENTO DO PROCESSO NA ORIGEM. I - Trata-se, inicialmente, de reclamação em desfavor de decisão que determinou o sobrestamento do feito, para aguardar o julgamento de incidente de arguição de inconstitucionalidade, naquele pretório, bem assim de repercussão geral reconhecida no STF, sob o Tema n. 1.048, a decidir a mesma questão tratada no feito, ou seja, a legalidade da inclusão do ICMS da base de cálculo da Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta, instituída pela Lei n. 12.546/2011. Esta Corte não conheceu da reclamação. II - Conforme previsão dos arts. 105, I, f, da Constituição da República, e 187 do RISTJ, a reclamação dirigida a esta Corte tem cabimento para preservar sua competência ou assegurar a autoridade de suas decisões. Já o art. 988 do CPC/2015 prevê a reclamação como meio de preservar a competência do Tribunal, garantir a autoridade de suas decisões e, ainda, "garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência". III - No caso dos autos, o sobrestamento efetivado no âmbito do Tribunal a quo não implica desobediência à autoridade das decisões exaradas pelo Superior Tribunal de Justiça, nem tão pouco em inobservância de tese versada em demanda repetitiva. IV - Além disso, a jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que a reclamação não se presta para verificar eventual equívoco no sobrestamento do processo na origem com fundamento em decisão de afetação de recurso especial ao julgamento sob o rito dos repetitivos. Nesse sentido, confiram-se: AgInt na Rcl n. 34.147/RR, 2ª Seção, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 8/11/2017, DJe de 17/11/2017, AgInt na Rcl n. 34.175/MG, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, 2ª Seção, julgado em 27/9/2017, DJe de 3/10/2017. V - Agravo interno improvido.2   PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NA RECLAMAÇÃO. RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL (ARTIGO 105, I, F, DA CF) CONTRA ACÓRDÃO PROFERIDO PELO ÓRGÃO ESPECIAL DO TRIBUNAL DE ORIGEM EM SEDE DE AGRAVO REGIMENTAL QUE DETERMINOU O SOBRESTAMENTO DO RECURSO ESPECIAL COM AMPARO NO ARTIGO 1.030, III, DO CPC/2015. INCABÍVEL. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. 1. O recurso foi interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015, devendo ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele previsto, conforme Enunciado Administrativo n. 3/2016/STJ. 2. Na espécie, nos autos de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Goiás, o Desembargador Relator deu provimento ao agravo interno da empresa Brookfield Centro Oeste Empreendimentos Imobiliários S.A, para indeferir a liminar, retirando o efeito da ordem de indisponibilidade de bens da referida empresa e o de valores pelo BACENJUD. 3. No juízo prévio de admissibilidade, o Vice-Presidente do TJGO entendeu tratar-se de caso afeto às regras do artigo 1.030, III, do CPC/2015 e determinou ?o sobrestamento do presente feito até o pronunciamento definitivo da Corte Superior no Recurso Especial Repetitivo nº 1.366.721-BA (Tema 701)". 4. Nos termos do artigo 105, I, f, da Constituição Federal compete a este Superior Tribunal processar e julgar, originariamente, a reclamação para a preservação de sua competência e para a garantia da autoridade de suas decisões. 5. A reclamação de que trata o referido permissivo constitucional não é via adequada para preservar "jurisprudência" do STJ, mas, sim, a autoridade de decisão tomada em caso concreto, envolvendo as partes postas no litígio do qual oriunda a reclamação. Precedentes. 6. Na hipótese em que o recurso especial tem seu seguimento negado pela Tribunal de origem, por força do artigo 1.030 do CPC/2015, deverá a parte ingressar com o agravo em recurso especial, nos termos do artigo 1.042, caput, do CPC/2015, veiculando na petição argumentos próprios do agravo em recurso especial e do recurso especial. 7. Ou seja, "se há recurso cabível em tese para se pedir a equiparação ao repetitivo (agravo em recurso especial do art. 1.042, do CPC/2015), não pode ser o caso de reclamação constitucional" (Rcl 32.391/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 18/12/2017). 8. Agravo interno não provido3. (...) Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso." Sendo a reclamação constitucional, portanto meio de impugnação de manejo limitado, de sorte que o art. 105, I, "f" da CF/88 assegura o seu cabimento destinado a preservação da competência e garantia da autoridade das decisões do STJ e do STF (art. 102, I, "l", da CF/88), a despeito do art. 988 do CPC/15 haver ampliado o espectro de incidência da reclamação para também aceitar o seu cabimento no plano infraconstitucional4, no tocante a hipótese dos incisos I (preservar a competência do tribunal) e II (garantir a autoridade das decisões do tribunal), em reclamação distribuída perante o STJ, firmou-se o entendimento de que  a autoridade da decisão do STJ a ser preservada refere-se ao ato decisório decidido no próprio caso concreto em que a Reclamante tenha figurado como parte.  Tal entendimento, a despeito inexistência de referida limitação no bojo do art. 988, do CPC/15, foi a recente intepretação posta pela 1ª seção do STJ. Respeitado entendimento em sentido contrário, tal fundamento poderá trazer problemas de ordem prática, na contramão do próprio CPC/15.  Explica-se: uma das hipóteses de cabimento da reclamação é garantir a observância do acórdão proferido no incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência (art. 988, IV). Por vezes pode ocorrer do precedente firmando em sede de incidente de resolução de demandas repetitivas haver sido formado antes do ajuizamento de determinada demanda. A posteriori, a parte ajuíza demanda postulando o manejo de tutela provisória da evidência, porquanto defende que o direito aplicado ao caso concreto é o mesmo firmado quando do julgamento de determinado incidente de resolução de demanda repetitiva (art. 311, II, do CPC). Em havendo resistência do magistrado ou do tribunal na aplicação do precedente obrigatório, como exigir, in casu, que a decisão que se busca preservar a autoridade do STJ tenha sido prolatada no mesmo caso concreto? _______ 1 STJ, AgInt na Reclamação n. 31.193/SC, Primeira Seção, Rel. Min. Regina Helena Costa, v.u., j. 16.09.2021. 2 AgInt na Rcl 39.244/SC, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, 1 seção, julgado em 02/03/2021, DJe 10/03/2021.  3 AgInt na Rcl 33.470/GO, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, 1ª seção, julgado em 15/12/2020, DJe 18/12/2020. 4 "Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para: I - preservar a competência do tribunal; II - garantir a autoridade das decisões do tribunal; III - garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; IV - garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência: § 1º A reclamação pode ser proposta perante qualquer tribunal, e seu julgamento compete ao órgão jurisdicional cuja competência se busca preservar ou cuja autoridade se pretenda garantir. § 2º A reclamação deverá ser instruída com prova documental e dirigida ao presidente do tribunal. § 3º Assim que recebida, a reclamação será autuada e distribuída ao relator do processo principal, sempre que possível. § 4º As hipóteses dos incisos III e IV compreendem a aplicação indevida da tese jurídica e sua não aplicação aos casos que a ela correspondam. § 5º É inadmissível a reclamação: I - proposta após o trânsito em julgado da decisão reclamada; II - proposta para garantir a observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos extraordinário ou especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias ordinárias. § 6º A inadmissibilidade ou o julgamento do recurso interposto contra a decisão proferida pelo órgão reclamado não prejudica a reclamação."
O § 1º do art. 537 do CPC expressamente determina que só podem ser alterados a periodicidade e o valor da multa (astreinte) fixada por ordem judicial para que o devedor de uma obrigação de fazer, não fazer ou entregar coisa a cumpra se ela (a multa) estiver vencida. Entretanto, apesar da literalidade da lei, a Corte Especial do STJ, no EARESP 650.536/RJ, decidiu que haveria possibilidade de alteração, sim, das multas vencidas, conforme já anunciado nessa coluna Recentemente, avançando na exegese do § 1º do art. 537 do CPC, o STJ estabeleceu critérios para que tal modificação da multa vencida aconteça. Veja-se: CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. HOME CARE.DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL. MULTA COERCITIVA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. QUESTÕES EFETIVAMENTE DECIDIDAS PELO ACÓRDÃO RECORRIDO. TRANSMISSIBILIDADE DAS ASTREINTES APÓS O FALECIMENTO DA PARTE. POSSIBILIDADE. OBRIGAÇÃO PERSONALÍSSIMA. IRRELEVÂNCIA. RECONHECIMENTO DO DESCUMPRIMENTO DA ORDEM JUDICIAL NA FASE DE CONHECIMENTO. DECISÃO JUDICIAL TRANSITADA EM JULGADO. IMUTABILIDADE NA FASE DE CUMPRIMENTO. REDUÇÃO DA MULTA PERIÓDICA ACUMULADA. POSSIBILIDADE. CIRCUNSTÂNCIAS EXCEPCIONAIS E CUMULATIVAS QUE JUSTIFICAM A REDUÇÃO. EXORBITÂNCIA DO VALOR, AUSÊNCIA DE PROPORCIONALIDADE NA FIXAÇÃO E AUSÊNCIA DE CONDUTA DA BENEFICIÁRIA EM BUSCA DA MINIMIZAÇÃO DO PREJUÍZO. REQUISITOS PARA REDUÇÃO AUSENTES NA HIPÓTESE. AUSÊNCIA DE FIXAÇÃO DE PRAZO PARA CUMPRIMENTO E DE LIMITE DE VALOR PARA A ACUMULAÇÃO DA MULTA. IRRELEVÂNCIA. REQUISITOS NÃO OBRIGATÓRIOS. 1- Os propósitos recursais consistem em definir, para além da alegada negativa de prestação jurisdicional: (i) se o valor acumulado da multa é transmissível aos herdeiros em virtude do falecimento da paciente no curso da ação; (ii) se houve descumprimento da decisão liminar e, consequentemente, a incidência das astreintes; (iii) se, na hipótese, é admissível a redução do valor da multa periódica acumulada. 2- Não há que se falar em omissão ou em negativa de prestação jurisdicional na hipótese em que o acórdão recorrido, a partir de determinados elementos de fato e de prova, reitera a existência de descumprimento anteriormente reconhecida por ocasião do julgamento da apelação interposta ainda na fase de conhecimento. 3- Na esteira da jurisprudência desta Corte, as astreintes são transmissíveis aos sucessores da parte após o seu falecimento, ainda que tenham sido aplicadas em decorrência de obrigação personalíssima. Precedente. 4- Conquanto o valor acumulado da multa periódica seja excepcionalmente modificável após o trânsito em julgado da sentença de mérito, o reconhecimento do descumprimento da ordem judicial, que com ele não se confunde, não é modificável após o trânsito em julgado da decisão judicial que o reconhecer. 5- Para que seja autorizada a excepcional redução da multa periódica acumulada em virtude do descumprimento de ordem judicial, é preciso, cumulativamente, que: (i) o valor alcançado seja exorbitante; (ii) que, no momento da fixação, a multa diária tenha sido fixada em valor desproporcional ou incompatível com a obrigação; (iii) que a parte beneficiária da tutela específica não tenha buscado mitigar o seu próprio prejuízo. 6- Para que se examine a possibilidade de redução da multa periódica acumulada, não são relevantes, por si sós, a ausência de fixação de prazo para cumprimento da obrigação e a ausência de limite de valor para a acumulação da multa, circunstâncias que apenas eventualmente podem ser consideradas no exame da situação concreta submetida à apreciação do Poder Judiciário. 7- Na hipótese, o descumprimento da ordem judicial pela operadora do plano de saúde, reconhecido na fase de conhecimento e na fase de cumprimento da sentença, perdurou por 365 dias e somente cessou em razão do falecimento da paciente, de modo que o valor da multa periódica acumulada, de R$ 365.000,00, embora nominalmente elevado, é representativo de uma multa diária fixada em valor proporcional e que atingiu esse patamar em virtude exclusivamente da recalcitrância da devedora. 8- Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido. (REsp 1840280/BA, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Rel. p/ Acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 24/08/2021, DJe 09/09/2021, grifos nossos)". No entender esboçado pelo acórdão acima ementado, para a redução do valor da multa fixada com fundamento no art. 537 do CPC, devem ser observados os seguintes requisitos: (i) o valor alcançado seja exorbitante; (ii) que, no momento da fixação, a multa diária tenha sido fixada em valor desproporcional ou incompatível com a obrigação; (iii) que a parte beneficiária da tutela específica não tenha buscado mitigar o seu próprio prejuízo. Ao que tudo indica, tais critérios nada mais são do que um detalhamento da linha de raciocínio traçada pela Corte Especial do EARESP 650.536/RJ. Mais especificamente, o credor de obrigação de fazer, não fazer ou entregar coisa, não deve ficar inerte caso o devedor não cumpra tal obrigação a despeito da fixação da multa. A multa pode ser desproporcional ou incompatível com a obrigação e exatamente por isso não surte o efeito desejado. O acúmulo do valor da multa pode levar a um valor exorbitante que não pode fazer com que o credor ou o próprio judiciário se acomodem com a situação e deixem de buscar outras medidas de apoio que viabilizem a satisfação da obrigação. Se isso acontecer, o valor da multa, ainda que vencida, deve ser revisto, a despeito da redação literal do § 1º do art. 537 do CPC.
O art. 655, VII, do CPC/73, com as alterações da lei 11.382/06, passou a expressamente prever a constrição de percentual do faturamento de empresa devedora, figurando esta modalidade no sétimo lugar da ordem de preferência. A mesma lei, ainda que brevemente, positivou o procedimento a ser seguido na constrição de percentual do faturamento da empresa, sendo que o parágrafo terceiro do art. 655-A do CPC/73 determinava que: "Na penhora de percentual do faturamento da empresa executada, será nomeado depositário, com a atribuição de submeter à aprovação judicial a forma de efetivação da constrição, bem como de prestar contas mensalmente, entregando ao exequente as quantias recebidas, a fim de serem imputadas no pagamento da dívida". O art. 866 do CPC/15 mantém a previsão da penhora de percentual de faturamento da empresa, o qual também é previsto no inciso X do art. 835 do CPC/15. Dada a necessidade de exame do universo fiscal, contábil e financeiro da pessoa jurídica, inclusive com a ampla compreensão dos limites dos ativos e da extensão dos passivos da empresa, a penhora de faturamento exige um método, para sua aplicação, muito mais sofisticado do que a simples penhora de dinheiro na modalidade on line, de que tratam os arts. 835, I, e 854 do CPC/15, ou mesmo da penhora de créditos, de que tratam os arts. 855 a 860 do CPC/15.  E isso porque o conceito de faturamento está atrelado à noção de receita, que, por sua vez, envolve um conjunto de ativos e recebíveis da pessoa jurídica que vai muito além do simples numerário depositado em uma conta corrente bancária ou aplicado em instituições financeiras; podendo envolver, por exemplo, recebíveis futuros oriundos de certa atividade da empresa.  Enquanto a penhora de dinheiro consiste na constrição de recursos existentes e já disponíveis para o devedor, em espécie ou em depósitos bancários e aplicações financeiras, a penhora de faturamento envolve não só as disponibilidades em moeda, mas também implica na constrição de recebíveis futuros, cujo exame, inclusive, é fundamental para a elaboração do plano de pagamento a ser elaborado e executado por um administrador. E a técnica da penhora de faturamento, por demandar um sério exame do conjunto de receitas da empresa, exige a presença de um expert, que precisa ter acesso ao universo contábil e financeiro da pessoa jurídica. A penhora de faturamento é penhora de receita; logo, é a penhora de dinheiro presente e disponível, bem como de todos os demais valores referentes a recebíveis futuros da companhia, aí também se incluindo os créditos e direitos já existentes, bem como os demais valores que podem ser auferidos pela pessoa jurídica oriundos de suas atividades. Mas para que a penhora de faturamento possa ser bem aplicada, é fundamental que o plano de pagamento possa ser bem elaborado, tendo como lastro a exata realidade fiscal, contábil e financeira da empresa. A exigência de um administrador é fundamental, até para verificar a melhor forma de satisfazer o credor (art. 797 do CPC/15), sem que, contudo, seja promovida a destruição da empresa (art. 805 do CPC/15); sendo necessário, portanto, que um especialista estude o cenário fiscal, financeiro e contábil da pessoa jurídica e verifique a melhor forma de solver-se a dívida executada, sem acarretar problemas para as atividades e sobrevivência da empresa. E, recentemente, o STJ teve a oportunidade de, por três vezes, julgar questões referentes ao artigo 866 do CPC/15. Em 23/11/2020, a 4ª turma do STJ, no julgamento do AgInt no AREsp 1664898/SP, tendo a relatoria do Ministro Raul Araújo, decidiu que: "Nos termos da jurisprudência desta Corte, é cabível a penhora sobre o faturamento da empresa, quando ofertados bens de difícil liquidez ou não encontrados bens do devedor para satisfazer o crédito exequendo. Precedentes." Por sua vez, a mesma 4ª turma do STJ, em 08/06/2020, no julgamento do AgInt no AREsp 1552288/SC, tendo a relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão, pontuou que: "A jurisprudência desta Corte Superior é assente quanto à possibilidade de a penhora recair, em caráter excepcional, sobre o faturamento da empresa, desde que observadas, cumulativamente, as condições previstas na legislação processual e que o percentual fixado não torne inviável o exercício da atividade empresarial" (AgInt no REsp 1811869/SC, Rel. Ministro Og Fernandes, 2ª turma, julgado em 19/11/2019, DJe 26/11/2019). E a 2ª turma do STJ, em 17/09/2019, no julgamento do REsp 1827222/AL, tendo a relatoria do Ministro Herman Benjamin, destacou que: "Consoante a jurisprudência do STJ, "a penhora de faturamento da empresa só pode ocorrer em casos  excepcionais,  que  devem ser avaliados   pelo   magistrado   à  luz  das  circunstâncias  fáticas apresentadas no curso da Execução, obedecendo o que preceitua o art. 866  do  CPC  e  desde  que  não existam outros bens penhoráveis e a constrição não afete o funcionamento da empresa" (REsp 1.696.970/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, 2ª turma, DJe 19/12/2017). Hipótese em que a Corte a quo,  com  base nos elementos de convicção,  concluiu  que não foram preenchidos os requisitos para a decretação  da  medida. Asseverou: "(...) Não há elementos concretos que demonstrem a tentativa de localização de bens da empresa em seu próprio endereço nem tampouco que foi diligenciado junto aos cartórios   de registros  de  imóveis  na  investida  de  localizar eventuais bens registrados em nome da devedora. Além do mais, ao que se verifica dos autos, a própria recorrente oferta diversos bens de sua titularidade  como  garantia  à execução fiscal ajuizada em seu desfavor" (fl. 365, e-STJ)". É bem de ver que a excepcionalidade da aplicação da medida do artigo 866 do CPC/15 é elemento comum nos recentes julgados do STJ. Todavia, vale ponderar que pode ser mais benéfico para o devedor sofrer constrições em seu faturamento do que sucessivas penhoras online, notadamente na medida em que um administrador expert se dirigirá à empresa e examinará o contexto fiscal, financeiro e contábil da companhia, verificará a real necessidade de capital de giro da empresa, e proporá, dentro dos parâmetros da proporcionalidade, qual seria a melhor forma de se realizar a penhora sobre o faturamento; de tal sorte a conseguir-se pagar o credor em tempo razoável, sem prejudicar, além do necessário, o curso normal das atividades da empresa. Essa é, inclusive, a lição de Carlos Henrique Abrão: "Pensando nisso, a penhora de faturamento é menos traumática do que aquela junto ao Banco Central, online, uma vez que, comparativamente, estamos diante da retirada imediata de valores, ao passo que a dosagem se corporifica na constrição conforme as regras estabelecidas. O fato de se determinar a penhora de faturamento não significa que estará sendo colocada em risco a solvabilidade da empresa ou sua preservação. Há casos nos quais o devedor se mostra recalcitrante, arrastando o procedimento, sem razão lógica ou plausível, permitindo com isso a constrição do faturamento. Evidente, portanto, que o devedor pretende custo benefício e o recebimento será feito mediante alongamento, isso porque o credor não conseguirá receber a vista, ficando o administrador com a incumbência de apresentar o plano de pagamento".1 _____________ 1 ABRÃO, Carlos Henrique. A responsabilidade empresarial no processo judicial. São Paulo: Atlas, 2012. p. 59.  
A escolha de um julgado sobre Ação Rescisória para a análise nessa coluna é uma homenagem a um grande amigo, que nos deixou muito prematuramente. Rodrigo Otávio Barioni, professor da PUC/SP, falecido há pouco mais de uma semana foi um grande estudioso do tema e, sem dúvida nenhuma, uma das maiores Autoridades quando se fala em Ação Rescisória. Sempre atencioso e solícito, foi meu Conselheiro em todas as Rescisórias que me deparei em minha vida profissional. Rodrigo Barioni é uma dessas pessoas maravilhosas que passam por nossas vidas e não poderiam nos deixar. Amigo, leal, agregador deixa um grande vazio em todos, mas também uma vasta e profunda obra na área do direito processual, que eterniza o brilhante Mestre.                                     O § 1º do artigo 968, II, do CPC prevê a dispensa do depósito de 5% por parte da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, das suas respectivas autarquias e fundações de direito público1, do Ministério Público, da Defensoria Pública e dos que tenham obtido o benefício de gratuidade da justiça. Dúvida que surge é se os beneficiados pela dispensa do depósito para o ajuizamento da Ação Rescisória deveriam pagar multa de 5%, no caso da ação ser julgada, à unanimidade, inadmissível ou improcedente. Sobre o tema cumpre citar a lição do professor Rodrigo Barioni: "Aqui, cumpriria esclarecer apenas se esses entes dispensados do depósito prévio devem pagar a multa processual, caso a ação rescisória venha a ser julgada inadmissível ou improcedente por unanimidade. A dispensa inicial afigura-se correta, tendo em vista a presunção de solvabilidade dos entes públicos e o acesso à justiça no caso dos reconhecidamente pobres. Isso não afasta, porém, o dever de realizar o pagamento da multa, caso seja concretizada a situação que autoriza sua cobrança pelo réu. Na jurisprudência, os entes públicos e mesmo o beneficiário da Justiça gratuita não estão isentos do pagamento de multas por litigância de má-fé. No caso da ação rescisória o pagamento final da multa tem a mesma origem da condenação de litigância de má-fé: punir o demandante por haver proposto indevidamente uma ação judicial. Assim, por força do princípio da isonomia consagrado na Constituição Federal, o vencido na lide rescisória deve ser condenado ao pagamento da multa de 5% sobre o valor atribuído à causa, tenha ou não realizado o depósito inicial."2 Em acórdão publicado no começo do corrente mês, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça reiterou seu entendimento no mesmo sentido do defendido pelo professor Barioni:  "AÇÃO RESCISÓRIA. 1. BENEFÍCIO DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA DEFERIDO PARCIALMENTE. POSSIBILIDADE. NÃO EXONERAÇÃO DO BENEFICIÁRIO DA MULTA PROCESSUAL PREVISTA NO ART. 968, II, CPC/2015. 2. AUSÊNCIA, EM REGRA, DE LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DOS ADVOGADOS DA PARTE VENCEDORA NA AÇÃO RESCISÓRIA. RECONHECIMENTO, IN CASU. 3. PRETENSÃO DE DESCONSTITUIÇÃO DE ACÓRDÃO PROFERIDO PELA QUARTA TURMA DO STJ, NO BOJO DE IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA (QUE JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTES OS EMBARGOS À EXECUÇÃO), NO CAPÍTULO REFERENTE AOS HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS FIXADOS EM FAVOR DO ADVOGADO DA PARTE DEVEDORA. TÍTULO JUDICIAL AMBÍGUO, QUE FIXA PERCENTUAL SOBRE A DIFERENÇA ENTRE O VALOR COBRADO E O VALOR EFETIVAMENTE DEVIDO, SEM DETERMINAR O MOMENTO DE APURAÇÃO. VERIFICAÇÃO. INTERPRETAÇÃO JUDICIAL. NECESSIDADE. VALOR COBRADO A SER APURADO NO MOMENTO DO AJUIZAMENTO DA EXECUÇÃO, E NÃO DO TRÂNSITO EM JULGADO DOS EMBARGOS DO DEVEDOR, SOB PENA DE SUBVERTER A FINALIDADE DO PROCESSO EXECUTIVO. ACÓRDÃO RESCINDENDO EM ABSOLUTA CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. RECONHECIMENTO. VIOLAÇÃO LITERAL DE LEI E AFRONTA À COISA JULGADA. NÃO OCORRÊNCIA. 4. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO LITERAL DE LEI SOBRE QUESTIONAMENTO EM MOMENTO ALGUM SOPESADO NO ACÓRDÃO RESCINDENDO. IMPOSSIBILIDADE. 5. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. DESCABIMENTO. 6. AÇÃO RESCISÓRIA PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESSA EXTENSÃO, JULGADA IMPROCEDENTE. 1. A dispensa, por força do deferimento parcial do benefício da gratuidade de justiça, do recolhimento prévio do depósito de 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa - concebido como condição de procedibilidade ao ajuizamento da ação rescisória -, não exime o autor da ação de responder pela sanção processual prevista no inciso II do art. 968 do CPC/2015, na eventualidade de a presente pretensão rescisória vir a ser julgada improcedente ou inadmissível, por unanimidade de votos. Precedente específico da Segunda Seção do STJ (AR 4.522/RS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 24/05/2017, DJe 02/08/2017). (...) (AR 6.158/DF, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 27/10/2021, DJe 05/11/2021) Outro não é o entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo:  "AÇÃO RESCISÓRIA. DECADÊNCIA. PROVAS NOVAS OBTIDAS PELA PARTE IRRELEVANTES. Pretensão da autora à rescisão do acórdão que, no processo de sobrepartilha de bens sonegados, reconheceu a prescrição da sua pretensão naquele processo. Alegação de que não teria sido intimada da decisão que negou provimento ao Ag em REsp nº 20.367/SP. Ausência de comprovação nesse sentido. Situação que, em todo caso, não pode ser alegada em ação rescisória, por já ter decorrido o prazo decadencial de dois anos (art. 975 do CPC/2015). Suposta ciência da autora em 2013 e ação proposta em 2017. Decadência que ocorreu em relação a outras alegadas ilegalidades ocorridas no processo de sobrepartilha (art. 966, V c/c art. 975 do CPC/2015). Decadência que não ocorreu somente em relação à alegação de obtenção de novas provas (art. 975, VII c/c art. 975, § 2° do CPC/2015). Provas irrelevantes. Falta de nexo entre tais novas provas e um possível julgamento favorável à autora. Impossibilidade de elas modificarem o reconhecimento da prescrição do pedido de sobrepartilha de bens sonegados. Condenação da autora ao pagamento de multa de 5% do valor atualizado da causa, mesmo sendo beneficiária da gratuidade processual (art. 968, II c/c art. 98, § 4° do CPC/2015). Ação rescisória improcedente."3 (g.n.) (TJSP;  Ação Rescisória 2204143-24.2017.8.26.0000; Relator (a): Carlos Alberto de Salles; Órgão Julgador: 2º Grupo de Direito Privado; Foro de São Caetano do Sul - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 25/07/2019; Data de Registro: 29/07/2019) Esse parece ser o melhor entendimento, eis que a dispensa do depósito permite o ajuizamento de Ações Rescisórias pelos entes previstos no § 1º, II, do artigo 968, mas exige uma litigância responsável, já que tal dispensa não vai eximir os entes do pagamento da multa de 5%, no caso da ação ser julgada inadmissível ou improcedente, por unanimidade. __________ 1 Tal regra merece críticas de Thiago Marinho Nunes "Em relação a esse ponto, a regra merece críticas severas, uma vez que inexiste razão plausível para que o ente estatal esteja imune à realização do depósito prévio. Ora, o objetivo primordial do depósito prévio é o de garantir a seriedade da ação rescisória que está sendo proposta, e a garantia de seriedade só vale quando aplicada para todos. Da forma como se encontra a regra do art. 968, § 1º, viola-se o princípio constitucional da igualdade das partes (art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal). Nada obstante a opinião aqui colocada, há de ser citada a Súmula nº 175 do STJ, segundo a qual "Descabe o depósito prévio nas ações rescisórias propostas pelo INSS". (Código de Processo Civil Anotado, coord. José Rogerio Cruz e Tucci, et al., São Paulo: AASP e OAB/PR, 2019, p. 1588 e 1589) 2 "A Ação Rescisória no CPC: propostas de alteração", in Revista de Processo, n. 207, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 256. 3 Há precedentes do TJSP condenando o Autor da Rescisória no pagamento da multa de 5% do valor da causa, prevista no art. 968 do CPC, entretanto, suspendendo a exigibilidade, salvo se for revogado o benefício da gratuidade da justiça concedido a ele, citando entendimento exarado no RESP nº 1.096.874 (TJSP;  Ação Rescisória 2192576-88.2020.8.26.0000; Relator (a): Castro Figliolia; Órgão Julgador: 6º Grupo de Direito Privado; Foro de Monte Mor - 2ª Vara Judicial; Data do Julgamento: 18/01/2021; Data de Registro: 18/01/2021).
O legislador do CPC/15 introduziu, em substituição aos chamados embargos infringentes antes previstos no CPC/73, o dispositivo também conhecido como "técnica de julgamento estendido", por meio da qual "(...) quando o resultado da apelação for não unânime, o julgamento terá prosseguimento em sessão a ser designada com a presença de outros julgadores, que serão convocados nos termos previamente definidos no regimento interno, em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial, assegurado às partes e a eventuais terceiros o direito de sustentar oralmente suas razões perante os novos julgadores" (art. 942, caput). Na mesma sessão em que instaurada a divergência é possível a aplicação do julgamento estendido, tal qual autoriza o § 1º do art. 942, colhendo-se os votos adicionais de outros julgadores que porventura componham o órgão colegiado, assim como a possibilidade dos julgadores que já tiverem votado rever seus votos por ocasião do prosseguimento do julgamento (§ 2º). Além da hipótese de incidência prevista no caput do art. 942, reza o § 3º a aplicação do julgamento estendido também ao resultado não unânime, porém com determinadas restrições: a) julgamento proferido em ação rescisória, quando o resultado não unânime restar proclamado em relação a rescisão da sentença, b) em agravo de instrumento, quando houver reforma de decisão que aplica a técnica de julgamento antecipado parcial de mérito (arts. 356, caput, e § 5º) e, por fim, c) a vedação de referida técnica ao julgamento de incidente de assunção de competência (art. 947) e incidente de resolução de demanda repetitivas (arts. 976 a 987), assim como quando do julgamento em razão da remessa necessária (art. 496) e julgamento não unânime, proferido pelos tribunais pelo plenário ou corte especial. Em síntese, é possível extrair as seguintes conclusões quanto a aplicação de referida técnica: (i) cabimento quando do resultado não unânime do julgamento da apelação (com ou sem reforma da r. sentença de mérito1), (ii) observância na ação rescisória somente quando o resultado, por maioria de votos, direcionar-se para a rescisão da sentença ou acórdão impugnados e (iii) para o agravo de instrumento tirado da sentença de julgamento antecipado parcial de mérito (art. 356, caput e § 5º), somente na hipótese de reforma, por maioria de votos, da decisão impugnada2. E, em recente julgamento o Superior Tribunal de Justiça perfilhou o entendimento de não cabimento da técnica de julgamento estendido em recurso de agravo tirado de decisão monocrática de julgamento antecipado parcial de mérito: "PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRA DECISÃO QUE RECONHECE A LEGITIMIDADE DE PARTE DA CREDORA PARA AJUIZAMENTO DA EXECUÇÃO. RECURSO JULGADO POR MAIORIA. APLICAÇÃO DA TÉCNICA DE JULGAMENTO AMPLIADO. ART. 942, § 3º, II, DO NCPC. POSSIBILIDADE. OBSERVADA, CONTUDO, A REFORMA DA DECISÃO QUE JULGAR PARCIALMENTE O MÉRITO. AUSÊNCIA DE REFORMA NO CASO EM COMENTO. AGRAVO DE INSTRUMENTO QUE NÃO FOI PROVIDO, POR MAIORIA. DECISÃO AGRAVADA QUE NÃO ANALISOU O MÉRITO DA CONTROVÉRSIA. NECESSIDADE DE ANULAÇÃO DOS VOTOS PROFERIDOS EM SEDE DE JULGAMENTO AMPLIADO PARA FAZER PREVALECER O QUE FICOU DECIDIDO, POR MAIORIA DE VOTOS, PELO RELATOR, PRIMEIRO E SEGUNDO VOGAIS (NÃO PROVIMENTO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO). RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Aplica-se o NCPC a este julgamento ante os termos do Enunciado Administrativo nº 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. 2. Somente se admite a técnica do julgamento ampliado, em agravo de instrumento, prevista no art. 942, § 3º, II, do NCPC, quando houver o provimento do recurso por maioria de votos e desde que a decisão agravada tenha julgado parcialmente o mérito. Doutrina sobre o tema. 3. Ausência, no caso dos autos, de provimento do agravo de instrumento, por maioria de votos, e de decisão agravada que tenha analisado o mérito da causa. 4. Reconhecido que o julgamento ampliado se deu em confronto com a lei, devem ser anulados os votos proferidos na modalidade ampliada para prevalecer somente aqueles votos proferidos pelo Desembargador Relator e Primeiro Vogal, que o acompanhou, que entenderam, por maioria, em negar provimento ao agravo de instrumento. 5. Recurso especial provido. (STJ, REsp n. 1960580/MT, Terceira Turma, Rel. Min. Moura Ribeiro,  v.u, j. 05.10.2021) Dentre as razões que sustentam o entendimento acima, destaca-se os fundamentos do voto condutor: "(...) Ao lecionar sobre o tema, HUMBERTO THEODORO JÚNIOR aduz que o mesmo regime de prosseguimento de julgamento não unânime aplica-se ao agravo de instrumento quando provido por maioria para reformar decisão interlocutória proferida em solução parcial de mérito (art. 942, § 3º, II) (Curso de Direito Processual Civil. v. III. 51 ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2018. p. 810). No mesmo sentido, LUIZ RODRUIGUES WAMBIER e EDUARDO TALAMINI, defendem que a técnica recursal em que se busca, com a participação de outros julgadores, possibilitar a prevalência do voto vencido, só pode ser aplicada quando houver reforma da decisão agravada em julgamento não unânime em agravo contra interlocutória que verse sobre o mérito da causa (Curso Avançado de Processo Civil: Cognição Jurisdicional - processo comum de conhecimento e tutela provisória, v. 2. 16ª ed. reform. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 547). Corroborando o mesmo entendimento, FREDIE DIDIER JR. e LEONARDO CARNEIRO DA CUNHA lecionam que O disposto no art. 942 do CPC aplica-se ao julgamento não unânime proferido em agravo de instrumento, quando houver a reforma da decisão que julgar parcialmente o mérito. Aqui há uma observação que merece destaque: na apelação, a regra aplica-se a qualquer resultado não unânime. Não admitida, por maioria de votos, a apelação, aplicasse a regra. Admitida para ser provida ou não provida, seja ou não de mérito a sentença recorrida, pouco importa. Se o resultado não for unânime, aplica-se a técnica do julgamento prevista no art. 942 do CPC. Já no agravo de instrumento há uma restrição: a regra só se aplica se o agravo for admitido e provido, por maioria de votos, para reformar a decisão que julgar parcialmente procedente o mérito. Logo, no julgamento do agravo de instrumento, não se aplica a técnica de julgamento prevista no art. 942 do CPC: (a) se o julgamento for unânime; (b) se o agravo não for admitido, ainda que por maioria de votos; (c) se o agravo for admitido e desprovido, ainda que por maioria de votos; (d) se o agravo for admitido e provido para anular a decisão, ainda que por maioria de votos; (e) se o agravo for admitido e provido para reformar uma decisão que não trate do mérito, ainda que por maioria de votos (Curso de Direito Processual Civil: meios de impugnação às decisões judiciais e processo nos tribunais, v. 3. 13ª ed. reform. Salvador: JusPodivm, 2016. p.79). Verifica-se, assim, que a lei impõe e a doutrina entende que, em sede de agravo de instrumento, a técnica de julgamento ampliado só é admitida quando houver a reforma da decisão que verse sobre o mérito da causa, o que não ocorreu no caso dos autos pois como já pontuado anteriormente, além dos Desembargadores Relator e Primeiro Vogal terem negado provimento ao agravo de instrumento, a decisão de primeira instância, objeto do agravo, não adentrou ao mérito da controvérsia pois somente decidiu que além da DOW possuir legitimidade ativa para o ajuizamento da execução (art. 485, VI, do NCPC), era plenamente possível se manter nos cadastros de proteção ao crédito, a informação de que em relação àquelas pessoas consta processo de execução. Logo, no presente caso, não foram preenchidos os requisitos necessários para que fosse adotada a técnica do julgamento ampliado do agravo de instrumento. Diante do provimento do presente recurso, devem ser anulados os votos proferidos quando da ampliação do julgamento do agravo de instrumento realizado pelo Tribunal Estadual, para prevalecer, como resultado final, o voto da Desembargadora Relatora, que foi acompanhado pelo Primeiro Vogal, que negou provimento ao agravo de instrumento interposto por UNIÃO INSUMOS e outros no sentido de manter a decisão agravada. (STJ, REsp n. 1960580/MT, Terceira Turma, Rel. Min. Moura Ribeiro,  v.u, j. 05.10.2021, grifou-se) O entendimento supra citado vai de acordo com a opção política do legislador prevista no art. 942, II, que autoriza a aplicação do julgamento estendido contra agravo tirado de decisão de julgamento parcial de mérito, restrito ao resultado de julgamento de (i) reforma da sentença parcial e, (ii) por maioria de votos. Difícil entender a ratio de aludida restrição, porquanto a devolução da matéria recursal para exame de sentença de mérito - seja ela prolatada por meio da técnica de sentença de julgamento antecipado parcial de mérito (art. 356 do CPC/2015), seja por força de sentença quando do julgamento conjunto de todos os pedidos ou apenas de um pedido (art. 1.009 do CPC/2015) - é praticamente a mesma. O que varia é tão somente o iter procedimento em que prolatada referida sentença, e nada mais. Forçoso concluir, portanto, que tal qual o cabimento da técnica de julgamento estendido no recurso de apelação restou ampliada para as mais variadas hipóteses (bastando a maioria de votos no resultado, independentemente de referido resultado versar sobre o conhecimento ou não do recurso, a anulação ou a reforma ou manutenção da sentença), referida amplitude também deveria autorizar a observância do julgamento estendido quando do julgamento do agravo tirado contra a sentença de julgamento antecipado parcial de mérito. De toda sorte, a despeito de por vezes o Superior Tribunal de Justiça tecer interpretação sistemática com vistas a superar ou deixar de observar regras processuais objetivas, desta feita referida corte restringiu-se a aplicação literal da opção política do legislador: dura lex, sed lex. _________ 1 Basta o resultado não unânime, seja para manutenção, seja para reforma ou anulação da sentença impugnada. Percebe-se significativa ampliação das hipóteses de cabimento em confronto com o regime do CPC/73 (art. 530) quanto aos embargos infringentes. 2 Tamanha limitação soa incongruente. Na medida em que o art. 356 do CPC representa técnica em que o juiz pode julgar o mérito de um pedido frente aos demais (v.g., juiz decide o pedido A aplicando-se o art. 356 e, na mesma decisão, determina seja realizada instrução probatória destinada a esclarecer pontos controvertidos ligados aos pedidos B e C), de igual sorte poderia o juiz deixar de aplicar referida técnica, para julgar todos os pedidos numa única sentença (em arremate ao exemplo anterior, julgado os pedidos A, B e C em única decisão). Para a primeira hipótese (art. 356, § 5º), a aplicação da técnica de julgamento estendido é cabível somente quando houver reforma da decisão que julgue parcialmente o mérito. Para a segunda, basta o resultado do julgamento não unânime, com ou sem reforma da sentença de resolução de mérito (art. 942, caput). A mesma incongruência se projeta quanto ao cabimento de sustentação oral. Nos exemplos acima, na segunda hipótese é assegurada a sustentação oral (CPC/2015, art. 937, I); na primeira hipótese, o código é silente, muito embora, em ambos os casos tem-se a homogeneidade de um meio de impugnação tirado de decisão de mérito.
O art. 792, do CPC, estabelece que a alienação ou oneração de bem é considerada fraude à execução quando: a) sobre o bem houver ação baseada em direito real ou com pretensão reipersecutória  (reivindicação de um bem ou direito que não se encontra no próprio patrimônio); b) tiver sido averbada, no registro do bem, a pendência do processo de execução; c) o bem tiver sido objeto de constrição nos autos da ação em que foi suscitada a fraude; d) no momento da alienação ou oneração, tramitava contra o devedor ação capaz de reduzi-lo à insolvência. Mas, o que fazer se não foi averbada na matrícula do imóvel a informação de existência do processo de execução contra o proprietário, mas acredita-se que um terceiro adquirente comprou o imóvel em fraude à execução? O Superior Tribunal de Justiça teve que responder a esta pergunta em recente julgado assim ementado: "PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. FRAUDE À EXECUÇÃO. ALIENAÇÕES SUCESSIVAS. EXTENSÃO AUTOMÁTICA DA INEFICÁCIA DA PRIMEIRA ALIENAÇÃO ÀS TRANSAÇÕES SUBSEQUENTES. IMPOSSIBILIDADE. JULGAMENTO: CPC/2015. 1. Embargos de terceiro opostos em 07/05/2018, dos quais foi extraído o presente recurso especial interposto em 19/08/2019 e concluso ao gabinete em 28/08/2020. 2. O propósito recursal consiste em dizer sobre a configuração da fraude à execução em caso de alienações sucessivas. 3. A fraude à execução atua no plano da eficácia, de modo que conduz à ineficácia da alienação ou oneração do bem em relação ao exequente (art. 592, V, do CPC/73; art. 792, § 2º, do CPC/2015). Em outros termos, é como se o ato fraudulento não tivesse existido para o credor. 4. As hipóteses em que a alienação ou oneração do bem são consideradas fraude à execução podem ser assim sintetizadas: (i) quando sobre o bem pender ação fundada em direito real ou com pretensão reipersecutória; (ii) quando tiver sido averbada, no registro do bem, a pendência do processo de execução; (iii) quando o bem tiver sido objeto de constrição judicial nos autos do processo no qual foi suscitada a fraude; (iv) quando, no momento da alienação ou oneração, tramitava contra o devedor ação capaz de reduzi-lo à insolvência (art. 593 do CPC/73 e art. 792 do CPC/2015). 5. Esta Corte tem entendimento sedimentado no sentido de que a inscrição da penhora no registro do bem não constitui elemento integrativo do ato, mas sim requisito de eficácia perante terceiros. Precedentes. Por essa razão, o prévio registro da penhora do bem constrito gera presunção absoluta (juris et de jure) de conhecimento para terceiros e, portanto, de fraude à execução caso o bem seja alienado ou onerado após a averbação (art. 659, § 4º, do CPC/73; art. 844 do CPC/2015). Presunção essa que também é aplicável à hipótese na qual o credor providenciou a averbação, à margem do registro, da pendência de ação de execução (art. 615-A, § 3º, do CPC/73; art. 828, § 4º, do CPC/2015). 6. Por outro lado, se o bem se sujeitar a registro e a penhora ou a ação de execução não tiver sido averbada no respectivo registro, tal circunstância não obsta, prima facie, o reconhecimento da fraude à execução. Nesse caso, entretanto, caberá ao credor comprovar a má-fé do terceiro; vale dizer, de que o adquirente tinha conhecimento acerca da pendência do processo. Essa orientação é consolidada na jurisprudência deste Tribunal Superior e está cristalizada na Súmula 375 do STJ e no julgamento do Tema 243. 7. Desse modo, são pressupostos genéricos da fraude à execução: (i) processo judicial em curso em face do devedor/executado; (ii) registro, na matrícula do bem, da penhora ou outro ato de constrição judicial ou averbação premonitória ou, então, prova da má-fé do terceiro adquirente. 8. Em caso de alienações sucessivas, inicialmente, é notório que não se exige a pendência de processo em face do alienante do qual o atual proprietário adquiriu o imóvel. Tal exigência, em atenção aos ditames legais (art. 593 do CPC/73 e art. 792 do CPC/2015), deve ser observada exclusivamente em relação ao devedor que figura no polo passivo da ação de conhecimento ou de execução. É dizer, a litispendência é pressuposto a ser analisado exclusivamente com relação àquele que tem relação jurídica com o credor. 9. No que concerne ao requisito do registro da penhora ou da pendência de ação ou, então, da má-fé do adquirente, o reconhecimento da ineficácia da alienação originária, porque realizada em fraude à execução, não contamina, automaticamente, as alienações posteriores. Nessas situações, existindo registro da ação ou da penhora à margem da matrícula do bem imóvel alienado a terceiro, haverá presunção absoluta do conhecimento do adquirente sucessivo e, portanto, da ocorrência de fraude. Diversamente, se inexistente o registro do ato constritivo ou da ação, incumbe ao exequente/embargado a prova da má-fé do adquirente sucessivo. 10. No particular, o imóvel não foi adquirido pelos recorridos (embargantes) diretamente dos executados, mas sim de terceiro que o comprou destes. Embora tenha sido reconhecida a fraude na primeira alienação, isto é, dos executados ao adquirente primitivo, o quadro fático delineado na origem revela que a credora não havia procedido à averbação, na matrícula do imóvel, da pendência de execução, tampouco se desincumbiu de comprovar a má-fé dos adquirentes posteriores; isto é, de que eles tinham conhecimento da existência de ação capaz de reduzir o devedor à insolvência. Não há que se falar, assim, em ineficácia da alienação subsequente. 11. Recurso especial conhecido e desprovido. (REsp 1863999/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/08/2021, DJe 09/08/2021, grifos nossos)". Como se pode perceber, nesse caso de não averbação da execução na matrícula do imóvel, a fraude à execução somente pode ser reconhecida se restar comprovado que o terceiro adquirente agiu de má-fé, ou seja, que tinha conhecimento de que contra o alienante corria demanda capaz de reduzí-lo à insolvência. E mais, se houver alienações sucessivas, mas sem a averbação da existência da execução contra o primeiro alienante, aquele que quiser ver reconhecida a fraude à execução deve comprovar a má-fé de todos os adquirentes para se sejam declaradas ineficazes as alienações sucessivas. Tal decisão do Superior Tribunal de Justiça é digna de aplausos pois traz maior segurança jurídica no reconhecimento da fraude à execução e fornece parâmetros claros para que seja declarada a ineficácia da alienação em relação ao exequente.
O artigo 139, IV, do CPC/15 dispõe que cabe ao magistrado determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária. O tema desperta muitas polêmicas no Brasil, e, em breve, será objeto do julgamento da ADI n. 5941 no STF, em cujos autos a PGR já se posicionou no sentido de que o artigo 139, IV, do CPC/15, deveria ser aplicado de forma subsidiária e sempre com o escopo de possibilitar medidas de natureza patrimonial, evitando-se a efetivação de medidas que possam gerar restrições de direitos. A questão já vem sendo enfrentada pela 3ª. Turma do Superior Tribunal de Justiça, merecendo destaque o julgamento do HC 558313 / SP, tendo sido relator o Ministro Paulo de Tarso Sanseverino: "Na linha do entendimento firmado, portanto, apenas diante da existência de indícios de que o devedor possua patrimônio expropriável, ou que vem adotando subterfúgios para não quitar a dívida, ao magistrado é autorizada a adoção subsidiária de medidas executivas atípicas, tal como a apreensão de passaporte, e desde que justifique, fundamentadamente, a sua adequação para a satisfação do direito do credor, considerando os princípios da proporcionalidade e razoabilidade e observado o contraditório prévio". De forma similar, ressalta-se o julgamento do AgInt no REsp 1837680 / SP, tendo sido relator o Ministro Moura Ribeiro: "Segundo a jurisprudência desta Corte Superior, as medidas de satisfação do crédito devem observar os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, de forma a serem adotadas as providências mais eficazes e menos gravosas ao executado. Precedentes." Em 23/04/2019, na apreciação do REsp 1788950 / MT, tendo sido relatora a Ministra Nancy Andrighi, julgou-se no sentido de que: "A  adoção de meios executivos atípicos é cabível desde que, verificando-se  a  existência  de  indícios  de que o devedor possua patrimônio expropriável, tais medidas sejam adotadas de modo subsidiário, por meio de decisão que contenha fundamentação adequada às especificidades da hipótese concreta, com observância do contraditório substancial e do postulado da proporcionalidade." Vale lembrar que Teresa Arruda Alvim1enfatiza a necessidade de o inciso IV do artigo 139 do CPC/15 ser interpretado "com grande cuidado, sob pena de, se entender que em todos os tipos de obrigações, inclusive na de pagar quantia em dinheiro, pode o juiz lançar mão de medidas típicas das ações executivas lato sensu, ocorrendo completa desconfiguração do sistema engendrado pelo próprio legislador para as ações de natureza condenatória". Flávio Luiz Yarshell2, ainda, doutrina que, quanto ao artigo 139, IV, "será preciso cuidado na interpretação desta norma, porque tais medidas precisam ser proporcionais e razoáveis, lembrando-se que pelas obrigações pecuniárias responde o patrimônio do devedor, não sua pessoa. A prisão civil só cabe no caso de divida alimentar e mesmo eventual outra forma indireta de coerção precisa ser vista com cautela, descartando-se aquelas que possam afetar a liberdade e ir e vir e outros direitos que não estejam diretamente relacionados com o patrimônio do demandado". Neste contexto, ainda mais tendo-se em vista o próximo julgamento da ADI n. 5941, as recentes posições do STF sobre o tema são de enorme importância para a compreensão sobre os limites de aplicação do artigo 139, IV, do CPC/15. Em 04/12/2020, em decisão proferida no HC 192.127/SC, o relator Ministro Edson Fachin julgou no sentido de que: "Não tenho dúvidas de afirmar que as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais e sub-rogatórias são inadequadas, desnecessárias e desproporcionais ao cumprimento de medidas judiciais impositivas de obrigações pecuniárias. No caso dos autos, a suspensão da carteira nacional de habilitação e apreensão do passaporte da paciente, como medidas de fazer cumprir decisão judicial, tomadas no âmbito de processo de execução por título extrajudicial decorrente de contrato de locação comercial celebrado entre pessoas físicas, devem ser afastadas. A desproporcionalidade da utilização de medidas executivas atípicas pelos juízes com a intenção de forçar o executado a cumprir decisão judicial, apresenta-se evidente, considerando que a imposição de medidas restritivas de direitos fundamentais, para compelir à execução de dívidas pecuniárias, não se revela, como revela o caso dos autos, compatível com a Constituição da República de 1988".  Por sua vez, em 08/06/2021, ao apreciar o HC 199.767/ DF, o relator ministro Ricardo Lewandowski julgou no sentido de que: "A custódia do passaporte e da CNH, embora limite a possibilidade de o paciente realizar viagens internacionais e de dirigir veículo automotor, não restringe, necessariamente, sua liberdade de ir e vir". Nesse contexto, o julgamento da ADI n. 5941 será fundamental para o estabelecimento dos requisitos para a aplicação do artigo 139, IV, do CPC/15, almejando-se a sempre construir uma técnica de conformidade entre este dispositivo e os princípios presentes nos artigos 4, 6, 8 e 9 do CPC/15.   __________ 1 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins. RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva. TORRES de MELLO, Rogério Licastro. Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil. 1ª. Edição. São Paulo: RT, 2015. p. 264. 2 COELHO, Marcus Vinicius Furtado. MEDEIROS NETO, Elias Marques de. YARSHELL, Flávio Luiz. PUOLI, José Carlos Baptista. O Novo Código de Processo Civil: Breves Anotações para a Advocacia. Brasília: OAB, Conselho Federal, 2016. p. 28.