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Conversa Constitucional

Fatos do cotidiano à luz da CF e a rotina do STF.

Saul Tourinho Leal
segunda-feira, 29 de maio de 2017

Conversa Constitucional nº 31

PEC das Diretas pode tirar a locomotiva dos trilhos Parece florescer na mente de figuras respeitáveis da política brasileira um desejo talvez pouco refletido de substituir o modelo atual de Estado constitucional - cuja essência reside na atuação contramajoritária do Judiciário viabilizando a proteção de minorias -, por uma democracia popular segundo a qual, pelo "poder ao povo", a Constituição Federal passaria, simbolicamente, a dever obediência à vontade de multidões aglomeradas por aí, com seus discursos, gritos de guerra, cantos e marchas. Tramitam na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, propostas de emenda à Constituição desfigurando a forma atual pela qual se elege o presidente da República em caso de vacância do posto nos dois últimos anos do mandato. Atualmente, a eleição é indireta, ou seja, os eleitores são os parlamentares, segundo o § 1º do art. 81 da Constituição, em harmonia com o parágrafo único do art. 1º, que diz que todo o poder emana do povo, que o exerce, também, pelos representantes eleitos. A PEC 227/2016 (deputado Miro Teixeira), que tramita na Câmara, e a PEC 67/2016 (senador Antônio Reguffe), em discussão no Senado, reduzem, em marcos temporais diversos, o espaço para a realização dessas eleições excepcionais indiretas, convertendo-as em diretas, ou seja, com a participação de todo o eleitorado. As PEC's pretendem barrar os efeitos de eventual declaração de inconstitucionalidade dos § 3º e 4º, do art. 224 do Código Eleitoral, que, na redação da lei 13.165/2015, trouxe novo rito para preenchimento da vacância presidencial ocorrida nos dois últimos anos do mandato. Esses dispositivos estão sendo questionados no STF, por legitimados diversos, em aspectos diferentes, nas ações diretas de inconstitucionalidade 5525 e 5619, ambas de relatoria do ministro Luís Roberto Barroso já liberadas para inclusão em pauta de julgamento. O comando das eleições indiretas excepcionais acompanha o nosso constitucionalismo desde a Constituição de 1934 (art. 52, §3º), passando pelas de 1937 (art. 82) e 1946 (art. 79, §2º). A Constituição de 1967, em seu art. 76, previa eleições indiretas pelo Colégio Eleitoral. São quase cem anos de prestígio institucional conferido ao Congresso Nacional para apontar, excepcionalissimamente, aqueles que concluirão mandatos interrompidos pelas armadilhas da história. Por tudo o que consta nas justificativas das PEC's, e do que se conclui a partir dos debates que lhe dão suporte, fica a impressão de que o recente processo de impeachment deixou cicatrizes dolorosas que não serão curadas sem o empenho de toda a nação. Para muitos que dão suporte às eleições diretas, teria sido, o recente impeachment, um processo de tal forma injusto, que seus supostos artífices não poderiam ficar impunes. Talvez, eleições diretas em caso de vacância presidencial seja um acerto de contas entre os que se sentem vítimas e seus supostos algozes. Sempre que pessoas, machucadas pelo o que julgam ser trapaças políticas, anunciam um desejo de revanche, vem à mente Nelson Mandela e sua sabedoria em não deixar a pulsão da vingança ganhar curso entre a sua gente. "Nós podemos ter prosperidade ou nós podemos ter vingança. Mas não podemos ter os dois. Vamos ter de escolher"1, dizia ele durante as negociações que asseguraram à democratização do país e a superação do apartheid. Pura sabedoria. Potenciais traições que não raramente contaminam a democracia não devem servir de combustível para incendiar o constitucionalismo. Na Idade Antiga, o ditador Júlio César, no Senado Romano, levou 23 facadas cravadas por sessenta senadores. Isso mostra que nenhum governante está imune a conspirações. Aos que se sentem vítimas de injustiças, é preciso reagir com espírito elevado e de tal modo que não se mire a Constituição para meter nela o que se supõe ser uma bala de prata. Vale ceder espaço à razão. Quando chamado à responsabilidade de decidir acerca do preenchimento da vacância do posto do chefe do Poder Executivo num Estado, em 1962, o ministro Victor Nunes Leal, em voto vencido no STF, anotou: "Não sinto, no caso, qualquer emoção especial, porque suponho que não está envolvida neste processo a salus populi. É uma briga de políticos, em que a salvação pública não está em jogo". (Rp 515, Pleno, DJ 9.8.1962). Um "ministro-raiz" ou, usando uma expressão que é do ministro Marco Aurélio, "da velha guarda". Essa serenidade ganha relevo ao percebermos que, em muitos países da América Latina, e mesmo no Brasil, alterar as formas pelas quais políticos são eleitos, especialmente o presidente da República, são decisões que não raramente anunciam precipícios a partir de onde apenas os inocentes serão arremessados. Além disso, é preciso ter a consciência de que suprimir competências do Congresso Nacional ao argumento de que não se pode confiar nessa Casa, pode ser perigoso. Trechos de um documento histórico que governou um povo por décadas ajuda a entender a afirmação. "A Assembleia Parlamentar é uma representação enganadora do povo e os regimes parlamentares constituem uma solução enganadora do problema da democracia". Em seguida: "A Assembleia Parlamentar apresenta-se fundamentalmente, como representante do povo, mas esse fundamento, em si, não é democrático, porque a democracia significa o poder do povo não o poder de um substituto". Ao final, uma oração parecida com as trazidas nas justificativas das PECs 227 e 67: "O poder deve ser inteiramente o do povo". Essas são passagens do Livro Verde, que serviu como base do regime de Muammar Kadhafi, por quase quarenta anos, na Líbia. O "Cachorro-louco" terminou arrancado pelos cabelos de um buraco e morto, entre tiros, chutes, cuspidas, socos e coronhadas, pelo mesmo povo que ele mentirosamente disse defender. É a revolta absoluta do povo contra o regime absoluto de um tirano. "Parece natural que uma revolução seja predeterminada pelo tipo de governo que ela derruba; quanto mais absoluto for o governante, mais absoluta será a revolução que vem a substituí-lo"2, já explicava, profeticamente, a extraordinária Hannah Arendt. Se a lógica de Hannah Arendt estiver correta, aqueles que se julgam vítimas de um golpe, reagirão contra os que reputam golpistas, promovendo novos golpes, em um acerto de contas sem fim. Se for isso mesmo, acreditem, estamos todos condenados. Enquanto a peleja não acaba, a nossa juventude busca formas de construir a nova vida longe daqui. Ou, então, segue desesperançosa. Isso, quando não adere aos desejos de revanche. Esses meninos e meninas não merecem isso. Não se quer, com as menções ao Livro Verde, estereotipar os apoiadores das eleições diretas em caso de vacância presidencial. São irmãos e irmãs que têm investido energia em buscar alternativas a tudo o que temos visto no país, um país, frise-se, que pertence a todos nós. A apresentação das propostas é legítima e o debate em torno das PECs 227 e 67 tem sido de bom nível. A menção apenas mostra os riscos do raciocínio segundo o qual o Congresso é inconfiável e o povo deve se substituir à Constituição. Essa conclusão coloca o nosso futuro em risco. Isso é preocupante, porque, como sabemos, o futuro é onde todos nós passaremos o resto de nossas vidas. Além disso, está-se privando os próximos parlamentares de uma competência que há muitas décadas lhes foi dada. A esse respeito, a voz influente de H. L. A. Hart diz: "o Parlamento não pode, mediante lei por ele editada, subtrair irrevogavelmente nenhum tópico do âmbito da atividade legislativa futura do próprio Parlamento"3. O Congresso Nacional pode muito mais do que apontar os eleitos em um "mandato-tampão". Ele participa da declaração de guerra e da celebração de paz. Isso, por meio de seus membros, senadores e deputados. Confiar, a esse corpo eleito, a missão de eleger aqueles que conduzirão o país numa situação excepcional não é indigno à democracia. Essa é uma conclusão a que se chega também por Ronald Dworkin, para quem "nenhuma pessoa ou grupo sofre suspeita de indignidade quando uma decisão importante é atribuída a um Parlamento eleito em vez de ser deixada a cargo do povo em geral num referendo. Se essa decisão é uma negação parcial do direito de sufrágio, ela o nega igualmente a todos os grupos e pessoas não eleitos"4. Também não é tão convincente o argumento de que a Constituição precisa ser mudada, e o Congresso necessita perder uma de suas mais nobres competências, pelo fato de vivermos tempos de sopapos políticos. Moisés Naím lembra que a Holanda passou quatro meses sem governo em 2010. A Bélgica, em 1988, demorou 150 dias para ver seus políticos formarem uma coalização capaz de governar. Em 2007-2008, por tensões entre as regiões dos flamengos, de fala holandesa, e dos valões, de fala francesa, o país ficou nove meses e meio sem governo. Em fevereiro de 2011, a Bélgica superou o Camboja sendo o país a passar mais tempo sem governo no mundo. Em 6 de dezembro de 2011, após 541 dias, "foi empossado um novo primeiro-ministro"5. Alguém dirá que são, Holanda e Bélgica, "Repúblicas de Bananas" pelo fato de terem, em sua história recente, episódios de instabilidade política? Por fim, as eleições indiretas não têm espantado o Judiciário. Em 2009, julgando o RCED 698, o TSE decretou a perda de mandato do governador de Tocantins e de seu Vice, determinando a realização de eleição indireta pela Assembleia Legislativa. No mesmo ano, o STF, apreciando a ADI 4298 MC/TO, examinou a lei 2.154/2009, do Tocantins, que previa a eleição excepcional indireta. Reputando-a constitucional, o ministro Cezar Peluso, relator, anotou: "a própria regra da eleição indireta, no âmbito federal, traz em si mesma, na ratio iuris, a demonstração de sua razoabilidade e proporcionalidade, enquanto constitui sensata resposta normativo-constitucional às demandas de uma excepcional conjuntura que, por seu decisivo ingrediente temporal, desaconselharia realização de eleição direta, com todos os seus pesados e intuitivos custos ao aparato administrativo e à própria sociedade". Um ano antes, ao julgar a ADI 2709, a Suprema Corte declarou a inconstitucionalidade da Emenda Constitucional 28, que alterou o § 2º do art. 79 da Constituição de Sergipe, por suprimir a eleição indireta para governador e Vice, realizada pela Assembleia em caso de vacância nos dois últimos anos do mandato. Em 2001, ao apreciar a ADI 1057 MC/BA, analisando a Lei 6.571/94, da Bahia, acerca da mesma hipótese, o STF definiu, preliminarmente, tanto que as condições de elegibilidade (CF, art. 14, § 3º) e as hipóteses de inelegibilidade (CF, art. 14, § 4º a 8º), inclusive aquelas decorrentes de legislação complementar (CF, art. 14, § 9º), aplicam-se à eleição indireta. Também que a votação seria aberta. Faz sentido essa deferência judicial. Trata-se, inclusive, de uma postura presente em outros lugares do mundo. Aharon Barak, que foi juiz da Corte Constitucional de Israel, anota: "Sem a regra da maioria, como refletido no Poder Legislativo, não há democracia. Como juízes e juristas, muitas vezes esquecemos este princípio fundamental. (...) Minar o Poder Legislativo prejudica a democracia"6. De fato, é difícil imaginar Cortes Supremas, em Estados constitucionais contemporâneos, retrocedendo rumo às democracias populares do passado, onde, sob a invocação de "poder ao povo", Constituições nasciam para ser violadas. Numa democracia constitucional, o povo é o poder desde que em harmonia com a Constituição. É, como Peter Häberle fala, a substituição da velha ideia de "soberania popular" pelo conceito atual de "soberania da Constituição"7. Em suma, a locomotiva brasileira está andando. Há trilhos obstruídos, mas muita gente de boa-fé tem tentado arrumá-los. Não é uma viagem fácil, como jamais o é para os que são pioneiros. Vez ou outra há sopapos e eles nos assustam, é verdade. Até nos machucam. Mas isso é coisa de quem está tentando ser dono do próprio destino e, com a sua gente, realizar os remendos que esses trilhos, e essa locomotiva, precisam. Se a viagem ainda está sendo dura - e eu acho que está - serve de alento saber que, se fizermos a nossa parte, as futuras gerações gozarão de mais conforto. Eles passarão menos apertos e irão encarar poucos solavancos. A Constituição Federal de 1988 traçou um curso, lançou as regras e apontou as exceções. Não tem mistério. Agora, é se segurar firme, e seguir a marcha. Pode até ter alguma emoção, e deve ter, mas, no final, tudo vai dar certo. __________ 1 Os elementos da justiça. Tradução de William Lagos; revisão da tradução Aníbal Mari. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2009, p. 322. 2 Sobre a revolução. Tradução Denise Bottmann. São Paulo: Companhia das Letras, 2011. p. 205. 3 O conceito de direito. Pós-escrito organizado por Penelope A. Bulloch e Joseph Raz; tradução de Antônio de Oliveira Sette-Câmara; revisão da tradução Marcelo Brandão Cipolla; revisão-técnica Luiz Vergílio Dalla-Rosa. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2009. p. 194. 4 A Raposa e o Porco-Espinho: Justiça e Valor. Tradução Marcelo Brandão Cipolla. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2014, p. 601. 5 O Fim do Poder. Tradução Luis Reyes Gil. São Paulo: Leya, 2013. p. 133. 6 The judge in a democracy. Princeton University Press, 2017, p. 226. 7 Conversas Acadêmicas com Peter Häberle. Organizador Diego Valadés, traduzido do espanhol por Carlos dos Santos Almeida. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 4. Entrevista de César Landa.
segunda-feira, 15 de maio de 2017

Conversa Constitucional nº 30

Opinião: Não se constrói uma elite negra nacional sem a participação da iniciativa privada Abrindo o voto que proferiu semana passada no pleno do STF, na ADC 41, o ministro Alexandre de Moraes chamou a atenção para o papel da iniciativa privada na inadiável missão de combater os persistentes efeitos dos séculos de escravidão negra no Brasil. Essa ação, visava à reafirmação da constitucionalidade da lei Federal 12.990/2014, a chamada Lei de Cotas, que reserva aos negros 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública Federal direta e indireta. Já há cinco votos pela sua constitucionalidade. O ministro Alexandre de Moraes, em breve comentário, anotou o seguinte: "Lá atrás, em 2002, quando eu fui secretário da Justiça e Cidadania do Estado de São Paulo, em várias comissões, nós tratamos de ações afirmativas. Uma delas, que é importantíssima, ações afirmativas para a iniciativa privada, é a questão tributária de compensações tributárias para aquelas empresas que pratiquem ações afirmativas". O comentário apresenta a nova vertente dessa justa disposição de desobstruir os espaços capazes de erguer uma grande elite negra no país. Como se sabe, em abril de 2012, o STF, por unanimidade, considerou constitucional a política de cotas étnico-raciais para seleção de estudantes da Universidade de Brasília (UnB), ao apreciar a ADPF 186. Em 2012, entrou em vigor, então, a lei 12.711/2012, que dispõe sobre cotas para o ingresso nas universidades Federais e nas instituições Federais de ensino técnico de nível médio. Tanto a política de cotas voltada às universidades públicas, quanto àquela destinada ao serviço público, são temporárias e trazem exceções. São medidas importantes que representam a maior conquista da comunidade afro-descendente no Brasil nesse século. Todavia, ainda são medidas insuficientes para colocar de pé um projeto maior. O comentário do ministro Alexandre de Moraes é oportuno porque insere, nesse projeto, os atores sem os quais dificilmente os negros ocuparão instâncias de poder numa democracia capitalista: a iniciativa privada. De fato, não se muda uma realidade tão profundamente injusta sem o envolvimento intenso dos atores privados. Daí surge a deixa para uma nova frente a ser levantada, que é a de uma lei nacional de alcance geral obrigando que pessoas jurídicas de direito privado tenham cotas para os negros em seus organogramas. Essas cotas não devem se restringir às funções de menor complexidade. Não haveria qualquer transformação social se assim o fosse. Os negros precisam estar nos postos mais relevantes nas estruturas de grandes pessoas jurídicas. A África do Sul implementou o Black Economic Empowerment (BEE), uma política nesse sentido. Evidentemente, transformações profundas não se dão sem efeitos colaterais. Na África do Sul, com a implementação do BEE, pessoas jurídicas de direito privado se viram obrigadas a terem negros ocupando funções de destaque em seus organogramas. Como não havia capital humano preparado para essa nova realidade, as fraudes se tornaram frequentes. Espécies de "laranjas" passavam a ser usados para que emprestassem seus nomes a contratos sociais e, assim, ajudassem essas empresas a pontuarem nos rankings estabelecidos pelo programa. Quanto mais pontos, mais acesso as empresas têm a linhas de créditos, programas de investimento, cursos de formação e outras iniciativas. Descobertas as fraudes, a própria iniciativa privada percebeu que não havia outra coisa a fazer que não fosse formar esse capital humano. O resultado foi virtuoso. Floresceram bolsas de estudos para todas as universidades, escolas de negócios foram abertas, as próprias empresas criaram seus centros de formação, programas para financiar jovens aprovados em universidades estrangeiras passaram a pipocar e, então, havia, uma grande massa de negros qualificados e preparados para conduzir os rumos da iniciativa privada no país. O Brasil olhou inicialmente para as universidades públicas Federais. Depois, para o serviço público Federal. Agora, é hora de trazer a iniciativa privada para esse tabuleiro da Justiça e da equidade. Publicados acórdãos sobre a imunidade das entidades beneficentes de assistência social Foram publicados os acórdãos das ADIs 2036 e 2028 (min. Rosa Weber), cujas ementas trazem os seguintes trechos: "(....) Nos exatos termos do voto proferido pelo eminente e saudoso ministro Teori Zavascki, ao inaugurar a divergência: 1. '[...] fica evidenciado que (a) entidade beneficente de assistência social (art. 195, § 7º) não é conceito equiparável a entidade de assistência social sem fins lucrativos (art. 150, VI); (b) a Constituição Federal não reúne elementos discursivos para dar concretização segura ao que se possa entender por modo beneficente de prestar assistência social; (c) a definição desta condição modal é indispensável para garantir que a imunidade do art. 195, § 7º, da CF cumpra a finalidade que lhe é designada pelo texto constitucional; e (d) esta tarefa foi outorgada ao legislador infraconstitucional, que tem autoridade para defini-la, desde que respeitados os demais termos do texto constitucional'. 2. Aspectos meramente procedimentais referentes à certificação, fiscalização e controle administrativo continuam passíveis de definição em lei ordinária. A lei complementar é forma somente exigível para a definição do modo beneficente de atuação das entidades de assistência social contempladas pelo art. 195, § 7º, da CF, especialmente no que se refere à instituição de contrapartidas a serem observadas por elas. 3. Procedência da ação nos limites postos no voto do Ministro Relator. Arguição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente da conversão da ação direta de inconstitucionalidade, integralmente procedente". Contra o acórdão da ADI 2028, a Confederação Nacional da Saúde, Hospitais, Estabelecimentos e Serviços, opôs embargos de declaração requerendo que a decisão alcançada pelo RE 566.622 há de prevalecer, também, em relação ao mérito das referidas ADIs. Este recurso trata do Tema 32 da repercussão geral, cuja tese foi firmada da seguinte forma: "Os requisitos para o gozo de imunidade hão de estar previstos em lei complementar". PGFN pede aplicação de precedente em diferimento da compensação tributária advinda da correção monetária das demonstrações financeiras no período-base de 1990 A PGFN apresentou manifestação no RE 545.796 (min. Gilmar Mendes), que trata do Tema 298, sobre diferimento da compensação tributária advinda da correção monetária das demonstrações financeiras no período-base de 1990. Segundo a PGFN, "já restou definido o julgamento do RE 201.512, tendo declarado essa Colenda Corte a constitucionalidade do diferimento da restituição de diferenças de correção monetária, tal como previsto no art. 3º, I, da lei 8.200/91". A Fazenda pede que seja reafirmada a jurisprudência no caso com os efeitos da repercussão geral. União pede que Relator aguarde trânsito em julgado de ICMS base do PIS/COFINS para definir sua aplicação à inclusão do ISS na mesma base A PGFN apresentou manifestação no RE 592.616 (min. Celso de Mello), cujo tema 118 trata da inclusão do ISS na base de cálculo do PIS e da COFINS. Após a abertura de prazo pelo relator para que as partes se manifestem quanto à sua intenção de aplicar no caso a Tese 69 (RE 574.706: ICMS base PIS/COFINS), a PGFN alegou ser "prudente aguardar-se a definição daquele processo, inclusive o julgamento dos referidos Embargos, para que se saiba o alcance e extensão da decisão adotada pelo STF e sua aplicabilidade ao caso". A União solicita, então, que se aguarde o trânsito em julgado do RE 574.706, antes de se analisar o impacto daquele julgamento sobre o outro processo. Câmara Técnica de Procuradores Estaduais requer ingresso como amicus para discutir aplicação de diferencial de alíquota de ICMS à empresa optante pelo SIMPLES NACIONAL A Câmara Técnica do Colégio Nacional dos Procuradores dos Estados e do DF juntaram pedido de ingresso como amicus curiae no RE 970.821 (min. Edson Fachin), tendo, como amici curiae a ABAPLAT, FECOMÉRCIO/RS e Estado de SP, cujo tema 517 trata da aplicação de diferencial de alíquota de ICMS à empresa optante pelo Simples Nacional. PI recusa atacar precedente que entende devida a restituição da diferença do ICMS pago a mais no regime de substituição tributária para a frente O Estado do Piauí se manifestou, enquanto amicus curiae, no RE 593.849 (min. Edson Fachin), cuja Tese 201 da repercussão geral foi firmada da seguinte forma: "É devida a restituição da diferença do ICMS pago a mais no regime de substituição tributária para a frente se a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida". Em seguida, o Tribunal modulou os efeitos. O Estado do Piauí, em sua manifestação, afirmou: "A legislação tributária do Piauí assegura o direito à restituição do valor do imposto pago por força da substituição tributária, correspondente ao fato gerador presumido que não se realizar, sendo devida a restituição da diferença do ICMS pago a mais, no regime de substituição tributária para frente, quando a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida. Assim, o Estado do Piauí não possui interesse jurídico quanto à impugnação dos pleitos feitos em sede dos Embargos de Declaração interpostos, sobre os quais ora se manifesta". Encaminhado à redistribuição leading sobre anistia de dívidas de ICMS fruto de inconstitucionalidade declarada pelo Supremo Foi redistribuído ao ministro Roberto Barroso, o RE 851.421, antes sob a relatoria do ministro Marco Aurélio, cujo tema 817 da repercussão geral trata da possibilidade de os Estados e o DF, mediante consenso alcançado no CONFAZ, perdoar dívidas tributárias surgidas em decorrência do gozo de benefícios fiscais, implementados no âmbito da chamada guerra fiscal do ICMS, reconhecidos como inconstitucionais pelo STF. Reiterada negativa de liminar quanto à suspensão da lei 7.428/2016, do RJ, que condiciona o aproveitamento de incentivos fiscais de ICMS a depósitos em favor do FEEF Tramita no STF a ADI 5635 (min. Roberto Barroso), na qual a CNI questiona a lei 7.428/2016, do Estado do RJ, que condiciona o aproveitamento de incentivos fiscais relativos ao ICMS a depósitos em favor do Fundo Estadual de Equilíbrio Fiscal (FEEF). Semana passada, o ministro Roberto Barroso proferiu o seguinte despacho: "Limitando-me a analisar a violação ao direito adquirido no que se refere aos benefícios fiscais condicionados, penso que, tendo em vista a expressa manifestação do Estado do RJ, de que a lei 7.428/2016 não suprime isenções e benefícios fiscais condicionados, não é o caso, por ora, de concessão da liminar, sendo certo que eventual inobservância do afirmado ensejará a apreciação da questão em controle difuso. Prossiga-se, portanto, com o rito do art. 12 da lei 9.868/99". Protocolada ADI que questiona possibilidade de Governador conceder incentivo fiscal por decreto Foi protocolada a ADI 5699 (min. Celso de Mello), contra as redações atual e original do art. 151, caput, da lei 400/1997, do Estado do Amapá, que institui o Código Tributário daquele estado, especificamente quanto à possibilidade de Estados-membros, por suas Constituições, autorizarem seus governadores a concederem benefícios fiscais por meio de Decreto. O dispositivo em questão delega ao Poder Executivo a disciplina de matéria relacionada à extinção e suspensão da obrigação tributária e concessão de benefícios fiscais por atos normativos infralegais, o que entende ser incompatível com o princípio da legalidade estrita, consignado no art. 150, I, e com o princípio da exclusividade das leis tributárias, do art. 150, §6º, da CF, que exige lei específica para conceder desonerações tributárias relativas a impostos, taxas e contribuições, como anistia, remissão e crédito presumido. Plenário Virtual - Tema Tributário O min. Gilmar Mendes inseriu no Plenário Virtual do STF o RE 883.542, com votação prevista até dia 1/6/2017, manifestando-se pela reafirmação da jurisprudência da Corte, de modo a fixar o entendimento no sentido de que a Contribuição Sindical Rural, instituída pelo decreto-lei 1.661/1971, não configura hipótese de bitributação e que tal tributo foi recepcionado pela ordem constitucional vigente. Global Constitutionalism A Corte Constitucional da África do Sul entendeu que um trabalhador rural que ocupa uma casa de fazenda cuja manutenção não é feita pelo seu proprietário, tem, o caseiro, o direito de proceder à manutenção da habitação, mesmo sem autorização, em nome de sua própria dignidade. No país, em respeito ao direito de propriedade, nenhum caseiro pode proceder a alterações físicas de imóveis sem apresentar previamente um plano ao proprietário e obter, dele, autorização. Obiter Dictum Ao proferir seu voto na ADC 41, que tratava da Lei de Cotas no Serviço Público, o ministro Luiz Fux lembrou a música de Tom Jobim e emendou: "Senhora presidente, diante das questões tão árduas e complexas por que passa, nesse momento, o Supremo Tribunal Federal, nós olhamos para uma causa dessa natureza e temos até vontade de afirmar: 'Se todas fossem iguais a você!'".
segunda-feira, 24 de abril de 2017

Conversa Constitucional nº 29

Opinião: O Dia Nacional do Perdão e a oportunidade de reconciliação Foi publicada, semana passada, a lei 13.437, cujo art. 1º institui o Dia Nacional do Perdão a ser comemorado, anualmente, no dia 30 de agosto. Pode parecer nada, mas a história também é feita de símbolos e esse é um símbolo poderoso. A África do Sul me deu boas lições da força do perdão em nossas vidas. No funeral de Nelson Mandela, percebi que uma chuva de perdão lavou o solo manchado de sangue naquele país. Mandela costumava advertir: "Nós podemos ter prosperidade ou nós podemos ter vingança. Mas não podemos ter os dois. Vamos ter de escolher". Com razão, o filósofo David Schmidtz recorda que "o objetivo de Mandela (assim como o de Desmond Tutu) era a reconciliação e não a vingança. Ele queria evitar que o legado do apartheid continuasse a pairar sombriamente sobre as gerações futuras". Na Índia, não foi diferente. Quando os concidadãos hindus e muçulmanos derramavam sangue nas ruas do país lutando entre si antes da Independência, o Pandit (professor) Jawaharlal Nehru, que viria a ser primeiro-ministro, disse, enquanto Gandhi jejuava pelo fim dos conflitos: "Às vezes é quando se está quase sem esperança e na escuridão total que Deus vem para nos salvar. Gandhi está morrendo por causa da nossa loucura. Deixem de lado a vingança (...)". No Brasil, essa porta simbolicamente aberta ao perdão pode ser útil. Vou ilustrar. A 1ª Turma do STF, ano passado, recebeu a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal e queixa-crime apresentada pela deputada Federal Maria do Rosário (PT/RS) contra o também deputado Jair Bolsonaro (PSC/RJ), numa decisão que relativiza a imunidade material do parlamentar ao permitir que ele seja responsabilizado penalmente por suas opiniões e palavras (art. 53, caput, CF), ainda que proferidas dentro da Casa Legislativa. Todavia, um ponto suscitado, em obiter dictum, pelo ministro Luís Roberto Barroso, abre espaço ao perdão. O ministro exortou os líderes políticos a contribuírem para que o país fique melhor, não pior. Ao final, cogitou, em tese, a possibilidade de o deputado pedir perdão pelo o que fez. "Até quem sabe uma retratação", comentou. Um dos célebres casos apreciado pela Corte Constitucional sul-africana cuidou, exatamente, da dimensão da imunidade material de parlamentares (municipal councillors). É o caso Dikoko v Mokhatla (CCT62/05). Nele, o raciocínio empregado pelo justice Albie Sachs, apesar de vencido, esboçou um jeito de pensar próximo do que fora cogitado pelo ministro Barroso. Segundo Sachs, "o consolo verdadeiro e duradouro da pessoa indevidamente prejudicada é a restituição, pelo Tribunal, de sua reputação na comunidade. A maior compensação é ir-se embora de cabeça erguida, sabendo que até mesmo o difamador reconheceu a injustiça do insulto". Daí a necessidade de os juízes, diante de casos como esse, possibilitarem que o valor reparador da retratação e do pedido de desculpas seja introduzido nos processos. "O principal objetivo deveria ser reparar em vez de punir", anotou Sachs. Ao discorrer sobre o processo do deputado Bolsonaro, o ministro Barroso afirmou que abraçar expressões como "negro safado" ou "gay pervertido" não é uma forma natural de viver a vida, porque, ao assim agir, se está violando a dignidade das pessoas. Na África do Sul, em 2015, a presidente do Parlamento, Baleka Mbete, irritada com o líder oposicionista Julius Malema, o chamou de "barata". Em 1994, Ruanda sofreu um genocídio fruto da divergência entre os Tútsis e os Utus. No massacre, ficou imortalizada a forma pela qual os Utus se referiam aos Tútsis: "baratas" (cockroaches). Dias depois, pressionada pela comunidade, Baleka Mbete se dirigiu à imprensa pedindo publicamente perdão a Malema. Ele aceitou. Essa forma de pensar a vida em sociedade também inspirou os trabalhos da Comissão da Verdade e Reconciliação, sob a batuta do Nobel da Paz, o Arcebispo Desmond Tutu. Acusações de discurso do ódio têm sido resolvidas empregando o pedido de desculpas. No Brasil, o preâmbulo da Constituição Federal fala em "sociedade fraterna". O art. 3º, I, aponta como um dos objetivos fundamentais da República o de construir uma sociedade livre, justa e "solidária". Num momento nacional como o atual, estimular o pedido sincero de perdão, seguido da aceitação altiva por quem se sentiu insultado, é um ato de sabedoria. Algo, no Brasil de hoje, providencial. Essa lei exibe um símbolo poderoso para esse caminho. Precisa ser bem utilizado. PGR entende prejudicada discussão sobre cobrança antecipada de ICMS A procuradoria-Geral da República juntou parecer no RE 970.821 (min. Edson Fachin). Trata-se do tema 517, sobre cobrança antecipada de ICMS equivalente a diferencial de alíquotas, fundamentada em normas estaduais, do optante do Simples Nacional quando não se enquadre como consumidor final. O Recurso discute se haveria inconstitucionalidade formal, por não estar amparada por lei complementar federal (art. 146, III, d e parágrafo único), e material, porquanto não observa o regime constitucional do aludido imposto, mormente o princípio da não cumulatividade (art. 155, § 2º, I e VII), e o postulado do tratamento favorecido para as microempresas e empresas de pequeno porte (arts. 170, IX, e 179). Segundo a PGR, está "prejudicada a análise da admissibilidade do apelo extremo interposto com o objetivo de obter a declaração incidental de lei estadual que foi substancialmente alterada para observar a sistemática constitucional do ICMS". PGFN pede repetição de precedente do pleno na discussão sobre compensação de precatórios A procuradoria-Geral da Fazenda Nacional apresentou manifestação no RE 678.360 (min. Luiz Fux), cujo tema 558 trata da compensação de precatórios com débitos líquidos e certos, inscritos ou não em dívida ativa e constituídos contra o credor original pela Fazenda Pública devedora. A PGFN pede que seja "reprisado o entendimento já cimentado pela ADI 4.357 (em julgamento conjunto com as ADIs 4.400, 4.425 e 4.372) no sentido da inconstitucionalidade da compensação de precatórios com débitos líquidos e certos, inscritos ou não em dívida ativa e constituídos contra o credor original pela Fazenda Pública devedora, procedimento inscrito nos §§ 9º e 10º do art. 100 da CF, trazidos pela EC 62/09". FEBRAFITE pede ingresso como amicus em discussão sobre bônus A Federação Brasileira de Associações Fiscais de Tributos Estaduais - FEBRAFITE requereu ingresso como amicus curiae no RE 835.291 (min. Ricardo Lewandowski), tendo, como recorrente, o Ministério Público de Rondônia, cujo tema 934 trata da constitucionalidade da vinculação de receita arrecadada com multas tributárias para o pagamento de adicional de produtividade fiscal. Esse caso já conta, como amici curiae, com o SINDAFISCO - Sindicato dos Auditores Fiscais de Tributos Estaduais de Rondônia e o Sindicato dos Técnicos Tributários de Rondônia. A FENAT - Federação Nacional dos Auditores Fiscais das Administrações Tributárias, Federal, Estaduais e Distrital, também pediu ingresso. Destaque da Semana O STF definiu a tese de repercussão geral relativa ao RE 601.720: Incide o IPTU considerado o imóvel de pessoa jurídica de direito público cedido a pessoa jurídica de direito privado devedora do tributo. Tá na pauta: Maio Temas tributários voltam à pauta do STF em maio. Dia 24/5 (4ª-feira, às 9h): (i) RE 643.247 (min. Marco Aurélio), tema 16 é: constitucionalidade da cobrança da taxa de combate a sinistros instituída no Estado de SP. Com um placar de 4 x 1, entendendo pela constitucionalidade, o caso volta com o voto-vista do min. Dias Toffoli; (ii) RE 573.872 (min. Edson Fachin), tema 45 é: possibilidade de execução provisória contra a Fazenda Pública; (iii) RE 612.707 (min. Edson Fachin), tema 521: se o pagamento de qualquer parcela dos créditos incluídos no art. 78 do ADCT antes da integral satisfação dos créditos alimentares importa quebra da ordem cronológica de pagamento de precatório, autorizando a expedição de ordem de sequestro de recursos públicos. Tá na pauta: Maio Dia 24/5 (4ª-feira, às 14h): (i) RE 656.089 (min. Dias Toffoli), tema 515: constitucionalidade da majoração de 3% para 4% da alíquota da COFINS, a ser paga pelas pessoas jurídicas referidas nos §§ 6º e 8º do art. 3º da lei 9.718/98; (ii) RE 578.846 (min. Dias Toffoli), tema 665: constitucionalidade das modificações efetuadas na base de cálculo e na alíquota da contribuição ao PIS, destinada à composição do Fundo Social de Emergência e devida pelos contribuintes a que se refere o § 1º do art. 22 da lei 8.212/1991, no período de vigência do art. 72, V, do ADCT; (iii) RE 570.122 (min. Marco Aurélio), tema 34: constitucionalidade da ampliação da base de cálculo e da majoração da alíquota da COFINS instituída pela Lei 10.833/2003, resultante da conversão da MP 135/2003. Com um placar de 5 x 1 contra o contribuinte, o caso volta com a vista do Min. Dias Toffoli; (iv) RE 599.309 (min. Ricardo Lewandowski), tema 470: constitucionalidade da contribuição adicional de 2,5% sobre a folha de salários em momento anterior à EC 20/98, que autorizou a adoção de alíquotas diferenciadas. Tá na pauta: Maio Dia 25/5 (5ª-feira, às 14h): RE 626.837 (min. Dias Toffoli), tema 691: saber se os entes federativos se submetem ao pagamento de contribuição previdenciária patronal incidente sobre a remuneração dos agentes políticos não vinculados a regime próprio de previdência social, após o advento da lei 10.887/2004. Global Constitutionalism A Corte Constitucional da África do Sul aceitou apreciar um caso que discutirá se a votação, pelo Parlamento, de uma moção de perda de confiança contra o presidente Jacob Zuma, pode se dar por escrutínio secreto. O presidente sobreviveu a quatro votos processos desses. Num regime parlamentarista como o da África do Sul, a moção de perda de confiança equivalente ao nosso impeachment. Obiter dictum O ministro Luiz Fux é um cavalheiro com seus colegas de Suprema Corte. Dia desses, votando no RE 938.837, cujo tema 877 tratou da submissão dos conselhos de fiscalização profissional à execução pelo regime de precatórios, o ministro se viu diante da difícil missão de divergir do relator, o ministro Edson Fachin. Não foi fácil, mas o ministro Fux o fez. Não sem antes, claro, saudar o colega. "Quando os processos são distribuídos e relatados pelo ministro Edson Fachin, mesmo sem conhecer o voto, eu sempre digo: Não li e já gostei".
segunda-feira, 17 de abril de 2017

Conversa Constitucional nº 28

Opinião: O povo, as delações e a banalidade do mal: Uma nação civilizada se constitui, antes de tudo, da certeza de que cada cidadão e cidadã do país é o senhor e a senhora de seu próprio destino. Juntos, são os senhores e as senhoras da vontade coletiva, da pulsão social que resulta no triunfo ou no fracasso de todos. O povo é o poder. O resto é ficção, construção, representação e simbolismo. Na África do Sul, líderes gritam em suas manifestações: "Amandla". Então, ouvem a multidão responder: "Awethu". "Poder", é o grito. "Para o povo", é a resposta. No Brasil, essa máxima está na Constituição, que, em seu art. 1º, § 1º, diz que todo o poder emana do povo, que o exerce por meio dos seus representantes, ou diretamente, nos termos da Carta. Semana passada, contudo, a senhora digna, o senhor decente, a criança inocente, a jovem de boa-fé..., todos, foram humilhados pela degradação de se negociar os seus destinos tal como se adquire peixe fresco no mercado. A operação Lava Jato e as dezenas de vídeos de delações mostram que compradores do poder são procurados pela elite política que produzimos para que, por um punhado de dinheiro, adquiram, usando o mandato que lhe demos, o amanhã que deveria nos pertencer. É algo que corrompe os valores sobre os quais qualquer comunidade, em qualquer lugar, poderia se estruturar. Eles documentam a miséria que nos engoliu, a lama que emporcalhou nossas vestes institucionais. A Lava Jato chegou ao seu ápice mostrando o que Hannah Arendt chamou de "a banalidade do mal". A Filósofa, quando convidada a escrever para o The New Yorker a respeito do julgamento do criminoso Nazista, Eichmann, afirmou que a degradação moral do Nazismo destruiu a capacidade das pessoas de se indignarem, de reagirem. Isso fabricou personagens como Eichmann, alguém que era, para Hannah Arendt, "um tolo" que, engolido pela banalização do mal, cumpria, sem oposição, as ordens de seus superiores, o que incluía mandar judeus para campos de concentração. Os relatos das delações mostram que, na República brasileira, o mal é banal. A corrupção não era um vício da política. Era, para a maioria, a própria política. Choca a naturalidade com a qual senhores ricos, de pele alva e olhos claros, com suas abotoaduras douradas, ternos e gravatas, expunham as bases sobre as quais a nossa República reside. O povo tem, verdadeiramente, representação democrática no Brasil? Numa arena onde reina o dinheiro, qual a chance de igual consideração e respeito perante a lei e as instituições para aqueles que têm pouco? E para os que não têm nada? O mal da corrupção se banalizou entre nós. Não é fácil curar gerações e gerações alimentadas pela certeza de dinheiro fácil advindo da corrupção. Vai demorar para limparmos toda essa sujeira. CREA/SP pede adiamento de debate sobre submissão dos conselhos de fiscalização profissional à execução pelo regime de precatórios O CREA/SP requereu ao STF o adiamento do RE 938.837 (min. Edson Fachin), que tem como amici curiae o COREN/RJ e a União, tratando do Tema 877: "Submissão dos conselhos de fiscalização profissional à execução pelo regime de precatórios". O caso está pautado para a sessão plenária da próxima quarta-feira. O CREA/SP é a parte recorrida. CNI reitera cautelar questionando Lei que condiciona o aproveitamento de incentivos de ICMS a depósitos em favor do FEEF A CNI apresentou aditamento à inicial da ADI 5635 (min. Roberto Barroso), que questiona a lei 7.428/2016, do Estado do RJ, que condiciona o aproveitamento de incentivos fiscais relativos ao ICMS a depósitos em favor do Fundo Estadual de Equilíbrio Fiscal (FEEF). Ela pede que se declare a inconstitucionalidade do decreto 45.973/2017 e da resolução SEFAZ 33/2017, por arrastamento; e reitera o pedido de deferimento de cautelar incidental para suspender a eficácia da lei estadual 7.428/2016 e dos seus atos regulamentares até o julgamento final da ADI. Pedida suspensão nacional de tema relativo às contribuições do INCRA Terceiro interessado pleiteou, com base no CPC/2015, ao STF, a suspensão de todos os casos que tramitem na jurisdição constitucional tratando de dois temas da repercussão geral. O primeiro, é o RE 630.898 (min. Dias Toffoli), cujo Tema 495 é: "Referibilidade e natureza jurídica da contribuição para o INCRA, em face da EC 33/2001". O segundo, o RE 603.624 (min. Rosa Weber), contando, como amici curiae, com o SEBRAE, a ABDI e a APEX-BRASIL, tem o Tema 325 tratando do seguinte: "Indicação de bases econômicas para delimitação da competência relativa à instituição de contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, após o advento da EC 33/2001". Tá na Pauta Está na pauta da sessão plenária de quarta-feira a fixação da tese no RE 601.720 (Red. p/acórdão min. Marco Aurélio), cujo julgamento do Tema 437 permitiu que o detentor da posse figure no polo passivo da obrigação tributária do IPTU, cujo titular do domínio do imóvel é a União. Volta, também, o RE 434.251 (min. Edson Fachin), que visa definir se imóvel público objeto de contrato de concessão de uso para exploração de atividade econômica está abrangido pela imunidade recíproca prevista no art. 150, IV, 'a', da Constituição Federal. Ainda, o RE 870.947 (min. Luiz Fux), cujo tema 810 trata da validade da correção monetária e dos juros moratórios incidentes sobre as condenações impostas à Fazenda Pública, conforme previstos no art. 1º-F da lei 9.494/1997, com a redação dada pela lei 11.960/2009. Depois de oito votos, o caso volta com o voto-vista do min. Gilmar Mendes. Por fim, o RE 938.837 (min. Edson Fachin), cujo Tema 877 visa saber se os conselhos de fiscalização profissional submetem-se ou não à execução pelo regime de precatórios. Global Constitutionalism A Comissão de Reclamação (ou queixas) da Zâmbia repreendeu formalmente juízes da Corte Constitucional que estavam entendendo que pessoas do povo não podiam apresentar queixas formais contra servidores do Tribunal, nem seus juízes e juízas. Segundo a Comissão, qualquer cidadão e cidadã pode apresentar uma queixa desde que haja fundamento legal quanto à reprovação da conduta do julgador. Antes, parlamentares questionaram um grupo de cinco juízes da Corte ao argumento de que eles não tiveram um comportamento apropriado no julgamento de uma disputa relativa à eleição presidencial. Para a Comissão, o art. 236 da Constituição afirma que juízes e oficiais judiciais são responsáveis ??perante as pessoas pelas suas funções. Segundo o art. 118, a autoridade judiciária da República deriva seu mandato do povo da Zâmbia. Obter Dictum Dia desses, num ato falho, o ministro Marco Aurélio, numa sessão de julgamento do STF, ao se dirigir ao ministro Alexandre de Moraes, se confundiu é o chamou de "ministro Alexandre Garcia". Retificou, em seguida.
segunda-feira, 10 de abril de 2017

Conversa Constitucional nº 27

Opinião: Quando não matam, estupram. Quando não estupram, batem. Quando não batem, assediam Na mente de muitos de nós, o mundo artístico tem um "quê" de encantado. Uma espécie de conto de fadas contemporâneo no qual as pessoas transcendem uma vida ordinária e passam a experimentar uma existência de glória e reconhecimento. Semana passada, todavia, o Brasil reavivou um lado oculto desse universo. Um lado sombrio. A carta aberta da figurante da TV Globo, Susllem Meneguzzi, acusando o ator José Mayer de assédio sexual, deu o que falar. Isso mostra que a reconstrução ética das relações entre homens e mulheres é um caminho sem volta e que aqueles que insistirem em desafiar a força dos tempos terminarão mal. Não há saída. Não há um Plano B. O engrandecimento feminino continuará expondo, cada vez mais, toda a sorte de horrores aos quais as mulheres são submetidas em suas atividades cotidianas. Essa pauta por direitos, reconstruções sociais e nova calibração das relações de poder é um caminho sem volta. Não é de hoje que situações repulsivas acontecem no universo da fama. Primeiramente, os assassinatos, cuja configuração preenche o que hoje o tipo penal denomina de "feminicídio". Elísia Samudio é, sem dúvida, o exemplo mais perturbador. Antes, Sandra Gomide já havia ilustrado esse hall por meio do tiro nas costas que levou de Pimenta Neves, o homem trinta anos mais velho que não aceitava o rompimento da relação. Os julgamentos de O.J. Simpson, nos Estados Unidos, e de Oscar Pistorius, na África do Sul, ambos acusados de assassinarem suas mulheres, sendo que, este último, tendo sido condenado, são mais ilustrações macabras dessa relação. E há ainda os estupros. Tão logo a carta de Susllem Meneguzzi foi divulgada, a veterana Lady Francisco, com os seus mais de 80 anos, afirmou ter sido estuprada por um diretor de televisão. Em 2014, mais de 40 mulheres admitiram terem sido sedadas e estupradas por Bill Cosby. Ele chegou a confessar que sedara jovens para estuprá-las. Em 1977, o diretor Roman Polanski foi preso e condenado em Los Angeles por cinco crimes contra Samantha Gailey, uma menina de 13 anos. Dentre os crimes, estava lá: estupro. Mas há também a violência. Em 2009, a cantora Rihanna apareceu com a face desfigurada pelos socos de Cris Brown, seu namorado. Um ano antes, quem apanhava do namorado, Dado Dolabella, era a atriz Luana Piovani. Em 2005, Sandra Mendes, mulher de Netinho de Paula, fazia um Boletim de Ocorrência mostrando um rosto deformado por murros do companheiro. Ano seguinte, Ingrid Saldanha, com a face destruída por um olho roxo e oito pontos no nariz, estampava a capa da revista Veja denunciando o companheiro Kadu Moliterno. Em 2016, quem apareceu com hematomas e costelas quebradas foi Luísa Brunet, pelas mesmas razões. Esse ano, Poliana Batagini, a esposa grávida do cantor Victor Chaves, o acusou de violência. Ele a teria jogado no chão e a chutado. Dias depois, se retratou. No Brasil, não são as leis que não respeitam as mulheres. São os muitos homens que não respeitam, nem as leis, nem as mulheres. Passa da hora de todos os homens, de quaisquer idades e background social, perceberem o que está se passando no mundo. Há uma consciência global de que abusos passados não passarão. É isso. Eles não passarão mesmo. O universo da arte no Brasil e no mundo nos mostra que mesmo as mulheres donas de si, verdadeiramente livres, aquelas que iluminam gerações com lições de autonomia e poder, estão sujeitas a assassinatos, estupros, violências e assédios. Quando esse cenário avança em direção às camadas mais e mais vulneráveis, o resultado é desastroso. É uma grande vergonha que, no século XXI, mulheres do mundo das artes marchem de mãos dadas exigindo respeito. Mostra a insistência da miséria nas relações entre os gêneros. As mulheres não estão de brincadeira. Isso porque, assassinatos, estupros, violência e assédio não são coisas para se brincar. Ou os homens se conscientizam dessa refundação ética de suas interações com o sexo feminino, ou deverão começar a se habituar a encararem reputações destruídas, persecuções penais e, mais comumente, o chão frio das cadeias. E, nesse chão frio, vigora uma ética cruel contra aqueles que violam mulheres. Uma ética masculina, que costuma ser bem mais selvagem do que a das mulheres que, como se viu, simplesmente, com camisas brancas e hastags, exigem, muito dignamente, respeito. Publicadas atas de julgamento de temas tributários Foi publicada a ata nº 7 (DJE 66, divulgado em 31/3/2017), relativa ao RE 718.874 (red. p/acórdão min. Alexandre de Moraes), cujo tema 669 da repercussão geral foi definido assim: "É constitucional formal e materialmente a contribuição social do empregador rural pessoa física, instituída pela lei 10.256/2001, incidente sobre a receita bruta obtida com a comercialização de sua produção". Também na ata nº 7 consta o julgamento do RE 565.160 (min. Marco Aurélio), cujo tema 20 foi assim fixado: "A contribuição social a cargo do empregador incide sobre ganhos habituais do empregado, quer anteriores ou posteriores à Emenda Constitucional 20/1998". Município de SP admitido como amicus em disputa sobre IPTU O min. Alexandre de Moraes deferiu o pedido de ingresso como amicus curiae do município de São Paulo no RE 928.902, cujo tema 884 é: "Imunidade tributária recíproca em relação ao IPTU incidente sobre bens imóveis mantidos sob a propriedade fiduciária da CEF, mas que não se comunicam com o patrimônio desta, porque integrados ao Programa de Arrendamento Residencial - PAR, criado e mantido pela União, nos termos da lei 10.188/2001". Amazonas tenta adiar julgamento sobre creditamento de IPI na entrada de insumos provenientes da ZFM O Estado do Amazonas tenta adiar o seguimento do RE 592.891 (min. Rosa Weber), cujo Tema 322 cuida do creditamento de IPI na entrada de insumos provenientes da Zona Franca de Manaus, que conta com placar temporário de 3 x 1 pela tese dos contribuintes. Segundo o Estado do Amazonas, amicus curiae, o pedido de audiência encaminhado ao min. Alexandre de Moraes encontra-se pendente de análise, a fim de que o Estado, na condição de amici curiae, possa expor suas razões. Retirada de pauta ADI contra contribuição social sobre serviços prestados por cooperados O min. Alexandre de Moraes retirou de pauta a ADI 2594 contra o inciso IV da lei 8.212/91, que estabelece que a empresa pague contribuição destinada à seguridade social de 15% sobre o valor bruto da nota fiscal ou fatura de serviços que lhe são prestados por cooperados, por intermédio de cooperativas de trabalho. A CNI argumenta que o inciso I do art. 195 da Constituição Federal deixa claro que a base de cálculo da contribuição é a folha de salários ou rendimentos pagos à pessoa física. Alega que a empresa não contrata com o cooperado, nem com ele mantém qualquer vinculação jurídica, e tampouco lhe paga ou credita salários ou rendimentos. União é amicus em disputa quanto à submissão dos conselhos de fiscalização profissional à execução pelo regime de precatórios Após reiterar sua petição pedindo ingresso como amicus curiae no RE 938.837 (min. Edson Fachin), tratando da submissão dos conselhos de fiscalização profissional à execução pelo regime de precatórios (tema 887), a União teve deferida a sua participação na formação do referido precedente. Requerida inclusão em pauta do leading sobre bases econômicas para instituição de contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, pós EC 33/2001 A Fiação São Bento S/A peticionou à presidência do STF requerendo que o RE 603.624 (min. Rosa Weber) seja pautado para o mês de maio. O caso trata do tema 325: "Indicação de bases econômicas para delimitação da competência relativa à instituição de contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, após o advento da EC 33/2001". O leading case estava pautado, mas não houve tempo para o início do seu julgamento, razão pela qual saiu de pauta sem data certa para retorno. Participam da discussão, como amici curiae: SEBRAE, ABDI e APEX-BRASIL. AGU se manifesta quanto ao FEEF do Rio de Janeiro A Advocacia-Geral da União apresentou informações na ADI 5635 (min. Roberto Barroso), ajuizada pela CNI, para questionar a lei 7.428/2016, do Estado do Rio de Janeiro, que condiciona o aproveitamento de incentivos fiscais relativos ao ICMS a depósitos em favor do Fundo Estadual de Equilíbrio Fiscal (FEEF). A AGU é contra a procedência da ADI. IBRAVIN requer ingresso como amicus curiae Mesmo após o prazo escoado, já que o caso foi liberado para inclusão em pauta, o Instituto Brasileiro do Vinho - IBRAVIN, requereu ingresso como amicus curiae no RE 611.601 (min. Dias Toffoli), que já tem, como amicus curiae, a Sociedade Rural Brasileira, e cujo Tema 281 é: "Contribuição para a seguridade social a cargo das agroindústrias sobre a receita bruta prevista na lei 10.256/2001". UNAFISCO admitida como amicus curiae em debate sobre bônus A UNAFISCO Nacional - Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil e a Federação Nacional dos Auditores Fiscais das Administrações Tributárias, Federal, Estaduais e Distrital foram admitidas como amici curiae no RE 835.291 (min. Ricardo Lewandowski), interposto pelo MP/RO, cujo tema 934 é: "Constitucionalidade da vinculação de receita arrecadada com multas tributárias para o pagamento de adicional de produtividade fiscal. O Instituto dos Auditores Fiscais do Estado da Bahia e uma pessoa física tiveram seus pedidos indeferidos". Figura como amicus o Sindicato dos Técnicos Tributários de Rondônia. Destaque da semana: 6/4 Por unanimidade, o pleno do STF negou provimento ao recurso do contribuinte, o RE 592.145 (min. Marco Aurélio), cujo Tema 80 visava saber se a majoração da alíquota do IPI para o açúcar ofenderia os princípios da seletividade, da proporcionalidade, da uniformidade geográfica, da capacidade contributiva e da isonomia. Entendeu-se pela constitucionalidade da referida majoração. A tese proposta pelo relator foi essa: "Surge constitucional, sob o ângulo do caráter seletivo, em função da essencialidade do produto e do tratamento isonômico, o art. 2º da lei 8.393/91 a revelar a alíquota máxima de IPI de 18% assegurada a isenção quanto aos contribuintes das áreas abrangidas pela Sudene e pela Sudam, e a autorização para redução de até 50% da alíquota presentes os contribuintes situados no Estado do ES e do RJ". Destaque da semana: 6/4 Outro tema definido pelo pleno foi o tratado pelo RE 594.015 (min. Marco Aurélio), cujo tema 385 é o seguinte: "Imunidade tributária recíproca a sociedade de economia mista ocupante de bem público". O caso contou com os seguintes amici curiae: Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários - ANTF e Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais Brasileiras - ABRASF. Por maioria, negou-se provimento ao recurso da Petrobras, vencidos os ministros Edson Fachin, Celso de Mello e Cármen Lúcia. Não há que se falar em imunidade tributária recíproca a sociedade de economia mista arrendatária de imóvel pertencente à União. O caso tratou da cobrança de IPTU. Também foi apreciado o RE 601.720 (min. Edson Fachin), com os mesmos amici curiae, tratando do tema 437, pelo qual a Corte afastou o reconhecimento de imunidade tributária recíproca a empresa privada ocupante de bem público. Na linha anterior, o min. Marco Aurélio liderou divergência afastando a imunidade, entendimento que prevaleceu. Global Constitutionalism Uma decisão histórica foi tomada pela Suprema Corte do Quênia. A Corte determinou que o Parlamento promulgue, em 60 dias, legislação que incentive o ingresso de mais mulheres no Poder Legislativo, numa regra segundo a qual não mais do que dois terços dos legisladores devem ser homens. Caso não seja implementada a legislação, o Parlamento poderá ser dissolvido a partir do pedido de qualquer cidadão endereçado à Suprema Corte. A Constituição de 2010 - a Katiba - exige que não mais de dois terços dos legisladores sejam homens, princípio considerado, na época, um grande passo rumo à igualdade de gênero naquele espaço de poder. No entanto, o atual Parlamento, dominado por homens, tem repetidamente rejeitado a elaboração da referida legislação. Na mesma semana em que o Quênia alcança esse marco em sua jurisprudência, a Corte Constitucional da África do Sul recebe, do partido oposicionista Economic Freedom Fighter, uma petição pedindo que a presidente da Assembleia Nacional dê encaminhamento aos requerimentos de impeachment do presidente do país, Jacob Zuma, que, mesmo condenado pela Corte a ressarcir o erário por despesas pessoas arcadas por fundos público em um de suas residências particulares, ainda não foi forçado pelo Parlamento onde tem ampla maioria a pagar o que deve. Obiter dictum Debatendo o RE 718.874 (contribuição social do empregador rural pessoa física - lei 10.256/2001 - sobre a receita bruta obtida da comercialização da produção), o ministro Luís Roberto Barroso começou a leitura do seu voto como de costume, radiante. "Presidente, eu, em uma ocasião quando era advogado, trabalhei numa causa com um advogado gaúcho, dr. Ovídio Batista, grande processualista, e, se a causa era complicada e dava tudo errado, ele dizia: 'Dr. Barroso, as fáceis já pegaram todas, só ficaram as difíceis'". O comentário abriu espaço para que a ministra Cármen Lúcia, risonha, emendasse: "Ministro Barroso, eu acho que, então, desde que eu cheguei aqui, as fáceis já pegaram todas". Mais à frente, desenvolvendo seu raciocínio, o ministro se sentiu incomodado com o som da conversa entre os colegas, ministros Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski, facilmente captado pelos sensíveis microfones do Tribunal. Desabafou: "Aí não é um debate, não é?", olhando, com desapontamento, para a presidente, ministra Cármen Lúcia. Percebendo a situação, o ministro Marco Aurélio puxou o microfone para perto de si. "Ah, imagina! Será que eu interrompi o ministro Luís Roberto Barroso? É o espírito muito irrequieto. Vossa Excelência me perdoe. O microfone fica o tempo todo aberto e perdemos a nossa liberdade". Radiante mais uma vez, o ministro Barroso respondeu, com fidalguia: "Que é isso! Vossa Excelência é o nosso decano em exercício", e seguiu expondo o raciocínio. Como o próprio ministro Barroso ensina, na vida, o importante "é saber levar".
segunda-feira, 3 de abril de 2017

Conversa Constitucional nº 26

Opinião: Não somos os párias do mundo Amamos o futebol. Amamos de verdade. Para se ter uma ideia, um dos leading cases pendentes na Suprema Corte definirá quem ganhou o campeonato brasileiro de 1987, se o Flamengo ou o Sport Club do Recife. É uma paixão nacional. Por isso, foi duro suportar, em nossa casa, aquele 7 x 1 da seleção alemã na última Copa do Mundo. Dias depois, o porta-voz de Israel debochava de nós usando o episódio. Fazia, ali, tudo, menos diplomacia. Nós, altivos, seguimos com o comando constitucional de resolução pacífica das controvérsias internacionais. Somos da paz, não da guerra, nem mesmo as verbais. Isso não é covardia, é virtude. Recentemente, soubemos que o churrasco que orgulhosamente comemos era feito de papelão. Foi o que, de forma inconsequente, foi dito a nós e a todo o mundo. Parece que querem nos fazer acreditar que somos párias, que tudo nosso é inferior, errado e vergonhoso. É como se estivéssemos condenados. Mas não estamos. Semana passada, falando para investidores internacionais em Joanesburgo, África do Sul, no "Brazil - South Africa Trade & Investments: Legal Aspects", ouvi o jornalista Keith Campbell comentar sobre as favelas do Rio: "Não são um exemplo de estética. Mesmo assim, nós as invejamos. São casas cobertas por telhas, sustentadas por tijolos, com sanitários internos, luz elétrica e meios para se aquecer no frio, ou se refrescar no calor. Ficam na cidade, não em áreas remotas. Não são indignas. É um bairro mais pobre do que outros, nada mais". É a perspectiva de um sul-africano, alguém de um país que luta pela concretização de direitos sociais, notadamente o direito à moradia. No evento, Andréa Menezes, chefe do escritório de representação do Standard Bank no Brasil, esclarecia que o nosso país não tem o nível de corrupção que há em outros lugares. Você não é extorquido ou ameaçado ao adquirir um telefone, comprar um tapete numa loja ou reparar uma torneira em sua casa. Em muitos países, a tortura por dinheiro começa no aeroporto, pelas autoridades de imigração. No Brasil, a autoridade que reconheceu meu passaporte foi uma máquina, na qual um laser leu o código de barra do passaporte fazendo uma portinhola se abrir para mim. Nada mais. No evento, da plateia, um senhorzinho gringo, com seus óculos de armação redonda, usando uma gravata borboleta, dizia ao embaixador Nedilson Jorge que, na noite anterior, havia comprado um peito de frango. A carne tinha sido exportada pelo Brasil. "Estava delicioso. Não parecia papelão". Enquanto a Polícia Federal, em sua desarranjada forma de se comunicar, deu a entender que 206 milhões de pessoas comem carniça exportada aos quatro cantos do planeta, inúmeros países alimentam o seu povo, em parte, com as nossas exportações. Fazem orgulhosamente, não envergonhados. Na mesma semana, quando Neymar Júnior celebrou a vitória sobre o Uruguai garantindo a participação na Copa do Mundo da Rússia, a multidão, das arquibancadas, exigia Tite, o treinador, para presidente da República. Somos assim. Misturamos política e futebol. Cerveja e cachaça. Arroz e feijão. Desse hábito de misturar as coisas, nasceu um dos países mais culturalmente diverso da Terra. Misturamos tudo, até a nossa gente. Mas precisamos ter humildade para reconhecer os nossos vícios. Parte de tudo de negativo que temos suportado é fruto do "jeitinho", essa ideia de que é possível prosperar sem esforço e com falta de ética. É o anjo mal da nossa natureza coletiva. Em seu lugar, devemos colocar a "ginga", a mistura mágica que herdamos dos nossos ancestrais africanos. Pelé, em 1958, foi forçado a jogar imitando os europeus. Recusou. Nos campos, apresentou um futebol que não era força, mas beleza; não era competição, mas arte; não era técnica, mas paixão; não era somente disciplina, mas uma combinação entre ritmo e alegria. Ganhamos. O momento brasileiro requer "ginga". Criatividade, inventividade, beleza, paixão, orgulho de quem somos. É o desejo de inovação que a própria Constituição reafirma no artigo 218. Não somos párias. Não estamos condenados. Essa foi a mensagem deixada no "Brazil - South Africa Trade & Investiments: Legals Aspects", ocorrido em Joanesburgo, semana passada. É uma esperança que vale cultivar. O tempo estava escuro, é verdade. Mas o sol já começa a sair. Liberado relatório da majoração da alíquota do IPI para o açúcar O min. Marco Aurélio, relator do RE 592.145, além de ter liberado o caso para inclusão em pauta, divulgou o relatório confeccionado encaminhando cópias aos demais ministros e ao procurador-Geral da República. Trata-se do Tema 80 da repercussão geral, quanto à majoração da alíquota do IPI para o açúcar. Confederação pleiteia amicus curiae para discutir royalties do petróleo A Confederação Nacional dos Municípios pediu ingresso como amicus curiae na ADI 5621 (min. Cármen Lúcia), na qual o Partido da República ataca normas referentes aos royalties do petróleo devidos aos municípios que suportam as atividades de embarque e desembarque de petróleo ou são afetados por essa prática. Segundo o partido, a Constituição Federal prevê compensação àqueles que sofrem com os efeitos da exploração do petróleo, independentemente de suas instalações estarem ou não diretamente ligadas a um campo produtor ou de terem mais pertinência à extração do que à distribuição do petróleo. Associação não consegue análise conjunta de recurso com ADI atacando o FUNRURAL A Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo) não teve analisado requerimento para que a ADI 4395 (min. Gilmar Mendes), que ataca o art. 1º da lei 8.540/92, dando nova redação aos arts 12, V e VII, 25, I e II, e 30, IV, da lei 8.212/91, com redação atualizada até a lei 11.718/08, fosse apreciada conjuntamente ao RE 718.874 (min. Edson Fachin), que, semana passada, firmou a seguinte tese quanto ao tema 669 da repercussão geral: "É constitucional formal e materialmente a contribuição social do empregador rural pessoa física, instituída pela lei 10.256/2001, incidente sobre a receita bruta obtida com a comercialização de sua produção". A petição foi apresentada antes do julgamento do RE, mesmo assim, não foi apreciada. CONFAZ defende autorizador do Fundo Estadual de Equilíbrio Fiscal O CONFAZ juntou manifestação à ADI 5635 (min. Roberto Barroso), ajuizada pela CNI, questionando lei 7.428/2016, do Estado do RJ, que condiciona o aproveitamento de incentivos fiscais relativos ao ICMS a depósitos em favor do Fundo Estadual de Equilíbrio Fiscal (FEEF). O órgão defende a constitucionalidade do Convênio Confaz 42/2016, que autoriza estados e DF a criarem condições para o estabelecimento de incentivos e benefícios fiscais referentes ao imposto. Fazenda muda e pede antecipadamente modulação sobre contribuições A Fazenda Nacional mudou de postura após a lição que teve da presidente da Suprema Corte, min. Cármen Lúcia, que, ao definir o tema 69 da repercussão geral (exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/COFINS), afastou o pedido de modulação ao argumento de que não teria havido manifestação prévia. No RE 603.624 (min. Rosa Weber), a Fazenda apresentou petição requerendo a modulação em caso de eventual decisão desfavorável. Trata-se do Tema 325: "Indicação de bases econômicas para delimitação da competência relativa à instituição de contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, após o advento da EC 33/2001". Nesse caso, a APEX-BRASIL pediu modulação de efeitos para 12 meses após o trânsito em julgado, caso se declare a inconstitucionalidade da CIDE. O mesmo foi feito pela Fazenda no RE 630.898 (min. Dias Toffoli), cujo tema 495 é o seguinte: "Referibilidade e natureza jurídica da contribuição para o INCRA, em face da EC 33/2001". Publicado acórdão relativo à ICMS-ST Foi publicado o acórdão do RE 593.849 (min. Edson Fachin), que, após julgamento do Tema 201, afirmou o direito da parte recorrente em lançar em sua escrita fiscal os créditos de ICMS pagos a maior, nos termos da legislação tributária do Estado de MG e respeitado o lapso prescricional de 5 anos previsto na LC 118/05; na qualidade de prejudicial, declarou a inconstitucionalidade dos artigos 22, § 10, da lei 6.763/1975, e 21 do decreto 43.080/2002, ambos do Estado de MG; fixou interpretação conforme à Constituição nas expressões "não se efetive o fato gerador presumido" no § 11 do art. 22 da lei estadual e "fato gerador presumido que não se realizou" no art. 22 do Regulamento do ICMS, para que essas sejam entendidas em consonância à tese objetiva deste tema de repercussão geral. A tese fixada foi a seguinte: "É devida a restituição da diferença do ICMS pago a mais no regime de substituição tributária para a frente se a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida". AGU opina pela improcedência de ação que questiona ICMS sobre software A Advocacia-Geral da União juntou manifestação pela improcedência da ADI 5659 (min. Dias Toffoli), da Confederação Nacional de Serviços - CNS, visando excluir a incidência do ICMS sobre as operações com programas de computador. Pede a derrubada do decreto 46.877/2015, do Estado de MG, bem como a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do art. 5º da lei 6.763/1975 e do art. 1º (incisos I e II) do decreto 43.080/2002, de MG, bem como do art. 2º da LC 87/1996. De acordo com a CNS, as operações com software jamais poderiam ser tributadas pelo ICMS, sobretudo em razão de já estarem arroladas no âmbito de incidência do ISS, conforme definido pela LC 116/2003. Entidade de auditores fiscais pleiteia amicus curie para debater bônus por produtividade A FENAT - Federação Nacional dos Auditores Fiscais das Administrações Tributárias, Federal, Estaduais e Distrital, pediu ingresso como amicus curiae no RE 835.291 (min. Ricardo Lewandowski), tendo como recorrente o Ministério Público de Rondônia e, como amici curiae, o SINDAFISCO - Sindicato dos Auditores Fiscais de Tributos Estaduais de Rondônia e o Sindicato dos Técnicos Tributários de Rondônia, cujo Tema 934 é: "Constitucionalidade da vinculação de receita arrecadada com multas tributárias para o pagamento de adicional de produtividade fiscal". Admitido amicus no caso sobre PIS/COFINS sobre a receita advinda da locação de bens móveis O min. Marco Aurélio deferiu ingresso como amicus curiae à ALEC - Associação Brasileira das Empresas Locadoras de Bens Móveis em Geral, para participar da formação do RE 659.412, cujo Tema 684 é o seguinte: "PIS/COFINS sobre a receita advinda da locação de bens móveis". Governadores pedem suspensão de casos sobre Guerra Fiscal liberados para pauta Um grupo de Governadores esteve com a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, apresentando uma petição conjunta requerendo o sobrestamento de 42 ações tratando sobre "Guerra Fiscal", todas elas já liberadas para inclusão em pauta, pelo menos até que o Congresso Nacional delibere a respeito do projeto de lei complementar que lá tramita tratando do CONFAZ. Segundo a min. Cármen Lúcia, "há uma preocupação, inclusive no espaço político, que é o espaço próprio para decisão e delimitação das políticas públicas econômicas, financeiras e tributárias". Tudo leva a crer que os Governadores ganharão, do STF, um pouco de fôlego para tentarem resolver suas diferenças no Congresso Nacional. Destaque da semana: 30/03 O STF concluiu, num placar de 6 x 5, o julgamento do RE 718.874 (min. Alexandre de Moraes), concluindo o Tema 669 com a seguinte tese: "É constitucional formal e materialmente a contribuição social do empregador rural pessoa física, instituída pela lei 10.256/2001, incidente sobre a receita bruta obtida com a comercialização de sua produção". Tá na pauta: 6/4 Quinta-feira, dia 6/4, estão pautados os seguintes temas tributários: (i) RE 594.015 (min. Marco Aurélio), tema 385: "Reconhecimento de imunidade tributária recíproca a sociedade de economia mista ocupante de bem público". São amici curiae: ANTF - Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários, ABRASF - Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais Brasileiras. Com um placar de 1 x 1, o caso volta com o voto-vista do min. Roberto Barroso; (ii) RE 601.720 (min. Edson Fachin), tema 437: "Reconhecimento de imunidade tributária recíproca a empresa privada ocupante de bem público". São amici curiae: ANTF - Associação Nacional dos Transportes Ferroviários, Município de São Paulo, Distrito Federal e Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais Brasileira. Após o Relator ter negado provimento ao recurso, o caso volta com o voto-vista do min. Marco Aurélio; (iii) RE 434.251 (min. Edson Fachin), tema 437: "Reconhecimento de imunidade tributária recíproca a empresa privada ocupante de bem público". Após o placar de 1 x 1, o caso volta com o voto-vista da min. Cármen Lúcia; (iv) RE 643.247 (min. Marco Aurélio), tema 16: "Cobrança de taxa pela utilização potencial do serviço de extinção de incêndio". Após o placar de 4 x 1 contra a tese sustentada pelos contribuintes, o caso volta com o voto-vista do ministro Dias Toffoli. Global Constitutionalism A Corte Constitucional da África do Sul deliberou quanto ao pedido formulado pela Black Sash Trust (Black Sash), organização sem fins lucrativos dedicada às pessoas que recebem benefícios sociais no país. Em 2012, a Agência de Segurança Social da África do Sul (SASSA) contratou a Cash Paymaster Services (Pty) Limited (CPS), pessoa jurídica de direito privado, para administrar o pagamento de benefícios sociais. Este contrato foi declarado inconstitucional, com um prazo de 12 meses para que a SASSA assumisse o pagamento. Mais de 17 milhões de pessoas dependem desses benefícios. Prevendo que a SASSA não cumpriria seu dever antes de o prazo fixado pela corte expirar, a Black Sash apresentou à Corte um pedido de intervenção na matéria. Tanto a Corruption Watch como a South African Post Office Soc Ltd (SAPO) foram admitidas como amici curiae. Semana passada, a Corte Constitucional declarou que a SASSA e a CPS estão sob a obrigação constitucional de assegurar o pagamento de subsídios sociais aos beneficiários a partir de 1 de abril de 2017, data na qual o prazo anteriormente fixado expiraria, até que uma entidade que não seja a CPS possa fazê-lo. A Corte deu mais 12 meses para isso. Ela também determinou medidas que assegurem a prestação de contas, a transparência e a proteção das informações pessoais dos beneficiários. Obiter Dictum No julgamento que definiu, com repercussão geral, a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS, o ministro Gilmar Mendes, criticando a tese defendida pelos contribuintes, disse: "Nós inventamos um modelo em que se pode aprender inglês dormindo, enriquecer sem trabalhar e emagrecer comendo". Estudantes presentes ao julgamento não se seguraram e quebraram o clima tenso com uma sonora gargalhada.
terça-feira, 28 de março de 2017

Conversa Constitucional nº 25

Ubuntu é uma palavra que tem ganhado cada vez mais projeção. Representa uma filosofia coletivista africana, segundo a qual o ser humano é o que é individualmente graças ao que todas as pessoas são, quando vistas coletivamente. É uma forma de enxergar os compromissos com a comunidade, de manter vivos os laços sociais e, principalmente, de reafirmar a crença de que se importar com os outros é a maneira mais poderosa de se viver em sociedade. A filosofia Ubuntu, além de exercer profunda influência na vida africana e de, por isso, ter ganhado respeitabilidade em todo o mundo, também passou, na África do Sul, a compor julgamentos relevantes da Corte Constitucional. Associada aos direitos sociais, tem sido responsável por restabelecer laços esgarçados na sociedade em razão do inadimplemento estatal com muitas prestações sociais, notadamente o direito à moradia. Antes, foi associada ao direito à vida, quando a Corte declarou a inconstitucionalidade da pena de morte. Responsável por inserir em seus votos, exortações ao Ubuntu, mesmo não estando, esse valor africano tão profundo, na Constituição da África do Sul, o juiz aposentado da Corte Constitucional, Albie Sachs, fala, hoje, com exclusividade, à coluna Conversa Constitucional, a respeito da história e desenvolvimento do Ubuntu na jurisprudência sul-africana. Associando-o à ideia de fraternidade, que vigora firmemente no Canadá, por exemplo, Albie Sachs ilustra com casos específicos a utilização do Ubuntu para solucionar dilemas da comunidade entregues à Corte Constitucional em razão da constitucionalização de várias demandas sociais. Confira a entrevista, gravada em Clifton, na residência do juiz. Futuramente, o material deve ganhar legendas em Português. Por enquanto, está na sua versão bruta, integralmente em inglês.
segunda-feira, 20 de março de 2017

Conversa Constitucional nº 24

Opinião: HC de Olga Benário é o nosso caso Dred Scott No julgamento do RE 574.706, semana passada, que, com repercussão geral, entendeu pela inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo das contribuições ao PIS e à COFINS, o ministro Gilmar Mendes, um dos quatro votos vencidos, afirmou que aquela decisão equivalia ao caso Dred Scott, no qual a Suprema Corte dos Estados Unidos, em 1856, teria antecipado a Guerra Civil entre Norte e Sul ao dizer que escravos não eram sujeitos de direito. Seria, portanto, uma das piores - talvez a pior - decisões do Supremo em toda a sua história. Acontece que a Suprema Corte brasileira já tem um caso Dred Scott para chamar de seu. Trata-se do habeas corpus impetrado por Olga Benário, julgado em junho de 1936. Discorreremos sobre o caso com a ajuda da obra "A História do Direito - Entre Foices, Martelos e Togas: Brasil 1935-1965", de Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy. A mulher de Luís Carlos Prestes havia sido acusada de ser a mentora intelectual da Intentona Comunista de 1935. Foi detida pela Polícia e contra ela instaurado um inquérito. Ao fim, foi emitido despacho administrativo por Demócrito de Almeida (delegado auxiliar) e Filinto Müller (capitão de chefia de polícia), no qual se decidiu pela sua expulsão do país, devendo, ela, ser submetida à jurisdição alemã. Era uma mulher, grávida, alemã, comunista e judia. Seria entregue a Hitler. Heitor Lima, seu advogado, impetrou, no STF, em 3/6/1936, habeas corpus com o objetivo de que ela pudesse ser mantida presa no Brasil, onde seria julgada. Invocou o direito à vida, apontando que Olga encontrava-se grávida e o filho, brasileiro, não poderia ser expulso. Foi distribuído ao ministro Bento Faria, presidente do Supremo, que, inicialmente, determinou o recolhimento das custas, mesmo num habeas corpus. Um preciosismo cruel. Em ofício remetido ao STF, em 15/6/1936, Vicente Rao, ministro da Justiça, consignou que Olga era estrangeira e elemento perigoso e nocivo à ordem pública. O Supremo, por maioria de votos, negou o habeas corpus. Uma Suprema Corte masculina na qual nenhuma voz se elevou em favor daquela mulher. Olga foi expulsa e confinada no campo de concentração de Ravensbrück, na Alemanha. Lá, deu luz a sua filha. Foi exterminada em 5 de novembro de 1941. Ao serem indagados sobre o caso, os ministros do STF disseram que a decisão foi tomada com base no "interesse público". Parece ser essa a decisão que mais se aproxima do célebre caso Dred Scott, da Suprema Corte dos Estados Unidos, considerada uma das piores decisões da Suprema Corte estadunidense em toda a sua história. Ambas, atendendo às razões do Estado, em nome do "interesse público", negaram direitos fundamentais a quem se socorria perante àquela Casa de Justiça. Não foi o que ocorreu no julgamento que, preservando direitos, impediu que a União siga incluindo o ICMS na base de cálculo das contribuições ao PIS e à COFINS. Pelo contrário. Nesse julgamento, mesmo sob todas as invocações ao "interesse nacional", a maioria chegou a uma decisão justa e condizente com a Constituição Federal. CNS questiona incidência de ICMS sobre operações com software A Confederação Nacional de Serviços (CNS) ajuizou a ADI 5659 (min. Dias Toffoli), com o objetivo de excluir a incidência do ICMS sobre as operações com programas de computador. A entidade pede a declaração de inconstitucionalidade do Decreto 46.877/2015, de Minas Gerais, bem como a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, mediante interpretação conforme a Constituição, do art. 5º da lei 6.763/1975 e do art. 1º (incisos I e II) do decreto 43.080/2002, também de Minas Gerais, bem como do art. 2º da LC 87/1996. De acordo com a CNS, as operações com software jamais poderiam ser tributadas pelo ICMS, sobretudo em razão de já estarem arroladas no âmbito de incidência do ISS, conforme definido pela LC 116/2003. De acordo com essa norma, explica a entidade, tanto a elaboração de programas de computador quanto seu licenciamento ou cessão de direito de uso são considerados serviços e, como tais, pertencem ao campo de incidência do ISS, cuja competência para arrecadação é única e exclusiva dos municípios e do DF. Pleiteado amicus curiae dos Estados para derrubar reconhecimento do serviço de telecom como indústria básica Os Estados da Federação requereram ingresso como amicus curiae para defender, na ADPF 427 (min. Marco Aurélio), a inconstitucionalidade do art. 1º do Decreto 640/1962, do Conselho de Ministros, que considerou o serviço de telecomunicações como indústria básica, de interesse para o fomento da economia do país e de relevante significado para a segurança nacional. A ação ressalta que o art. 155 da CF prevê a competência dos estados e do DF para instituir impostos sobre prestação de serviços de comunicação. "Enquanto o legislador constituinte conferiu exclusivamente aos estados a competência para tributar uma atividade expressamente tratada como serviço, o ato impugnado o trata como indústria, em clara contradição aos termos dos dispositivos constitucionais", afirma. Segundo ele, a CF deixou claro que a atividade econômica de telecomunicações pode ser tributado pelo ICMS, que é estadual, e não pelo IPI, de competência da União. Liberado para retomada de julgamento caso sobre majoração da alíquota de contribuição para o PIS mediante medida provisória O min. Marco Aurélio devolveu para retomada de julgamento, com o seu voto-vista, o RE 607.642 (min. Dias Toffoli), cujo Tema 337 da repercussão geral é o seguinte: Majoração da alíquota de contribuição para o PIS mediante medida provisória. O caso já conta com sete votos proferidos até o momento. Destaque da semana O STF concluiu, num placar de 6 x 4, o julgamento que discute a inclusão do ICMS na base de cálculo das contribuições para o PIS e a Cofins. Julgando o RE 574.706 (min. Cármen Lúcia), no Tema 69 da repercussão geral, prevaleceu a seguinte tese proposta pela relatora: "O ICMS não compõe a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da Cofins". Tá na pauta: 23/03 O partido SOLIDARIEDADE apresentou petição nos autos da ADI 5244, que discute o programa de incentivo fiscal de ICMS do Estado de Pernambuco, PRODEPE, pautada para dia 23/3. Na linha do que ocorreu na ADI 2441, semana passada, relativa a benefícios do Estado de Goiás, pede-se o sobrestamento da ação até que o Congresso Nacional delibere a respeito do projeto de lei complementar que trata de várias questões relativas ao CONFAZ e à chamada "Guerra Fiscal". O relator do caso é o ministro Dias Toffoli. Global Constitutionalism A Corte de Apelações do Quênia decidiu que, ao contrário do que impunha o Ministério da Educação, não haverá mais aulas de sábado para os estudantes Adventistas do Sétimo Dia, cujos elementos de fé inclui guardar o sábado. Estudantes que perderam as aulas aos sábados estavam sendo, em alguns casos, suspensos ou convidados a deixarem a escola caso não estivessem dispostos a aderir ao programa dos sábados na escola. Segundo o Tribunal, a situação violaria o art. 32 da Katiba, a Constituição dos quenianos, na parte em que assegura a liberdade de consciência, religião, crença e opinião. Evento A primeira reunião do Centro Brasileiro de Estudos Constitucionais - CBEC, terá, como expositor, José Eduardo Cardozo, no dia 24 de março de 2017, sexta-feira, das 10h às 12h, no Auditório do Bloco 3, Campus UniCEUB Asa Norte. A entrada no auditório do Bloco 3 será mediante apresentação do convite. Obiter dictum No julgamento do RE 835.558 (Tema 648: Competência da Justiça Federal para processar e julgar crimes ambientais transnacionais), estava em votação a melhor tese a ser aprovada pelo Supremo retratando a decisão tomada. De repente, o ministro Ricardo Lewandowski, numa defesa intransigente dos animais, traz um exemplo sobre os "macacos bugios". A partir daí, a discussão fica mais quente, quanto a quais animais poderiam ser protegidos. Foi a deixa necessária para o ministro Luís Roberto Barroso arrematar: "Se eu pudesse, eu diria: 'menos as capivaras', porque eu queria tanto me livrar das que invadem o meu jardim!".
segunda-feira, 13 de março de 2017

Conversa Constitucional nº 23

Opinião: São Paulo segue inovando na concretização do Direito Constitucional à cidade: Poucas metrópoles em todo o mundo têm dado à comunidade um debate tão rico como São Paulo, no que diz respeito às formas pelas quais gestores públicos podem concretizar o direito à cidade. Independente da compreensão política de cada um, parece inegável que o ex-prefeito Fernando Haddad e, agora, o atual prefeito, João Dória, colocam em evidência um vibrante debate acerca das tantas formas de se concretizar o direito previsto no art. 182 da Constituição Federal de 1988, segundo o qual a política de desenvolvimento urbano tem por objetivo ordenar "o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade". Os centros urbanos são a extensão das pessoas. Não são somente prédios e corredores de veículos. Eles são a constatação de que as pessoas tendem a evitar a dor e o sofrimento e a guiar suas escolhas em busca de prosperidade e felicidade. O geógrafo urbano britânico, David Harvey, destaca que "o direito à cidade é, portanto, muito mais do que um direito de acesso individual ou grupal aos recursos que a cidade incorpora: é um direito de mudar e reinventar a cidade de acordo com nossos mais profundos desejos". O compromisso em garantir o direito à cidade tem gerado demandas por governanças metropolitanas de qualidade. O "manager" apresenta-se como a mais notável evolução político-administrativa norte-americana. Harvard se destaca como o melhor centro de formação de managers do mundo. 600 cidades são responsáveis por 60% do PIB global. Hoje, 243 milhões de americanos se aglomeram em 3% do país: a zona urbana. Uma população de 36 milhões de pessoas vive na cidade e no entorno de Tóquio, a região metropolitana mais produtiva do mundo. No centro de Mumbai residem 12 milhões de habitante e Xangai é quase o mesmo tamanho. Nos países em desenvolvimento, a cada mês mais cinco milhões de pessoas passam a viver nas cidades; em 2011, mais da metade da população do mundo já era urbana. Só a região metropolitana de São Paulo é a sexta maior área urbana do mundo, onde vivem quase 20 milhões de pessoas e se concentra mais da metade do PIB estadual e 15,6% do nacional. Daí vem a inovação. Florença nos deu o Renascimento. Birmingham, a Revolução Industrial. Na época de Platão e Sócrates, se debatia filosofia num mercado ateniense. Mas não se toca esses gigantes sem coragem. Edward Glaeser, de Harvard, ensina que, em nível municipal, as elevadas concentrações de população e pobreza demandam políticas fortes para combater os custos do adensamento. "A água potável e as ruas seguras não aparecerão automaticamente no atual mundo em desenvolvimento". Ele recorda, na realidade estadunidense, que, "no Oeste, a criação de cidades saudáveis e atraentes exigiu enormes investimentos financeiros e, muitas vezes, uma coercitiva intervenção governamental". Também lembra de Cingapura. Na década de 1960, Cingapura era um aglomerado de barracos de famílias pobres, na maioria sem banheiros. Hoje, é uma cidade de primeiro mundo, com um dos maiores PIBs per capita do planeta. O segredo, para Glaeser, foi a "notável capacidade de uma densa aglomeração de pessoas inteligentes inovar e prosperar quando abençoadas por um setor público bastante competente". Atualmente, o prefeito João Dória está tendo a chance de apresentar uma nova roupagem da concretização do direito constitucional à cidade, num experimentalismo que tem dado o que falar. Isso é positivo e coloca a gigante São Paulo, mais uma vez, no pioneirismo do nosso tempo. Admitidos amici curiae em debate relativo a IR sobre juros de mora recebidos por pessoa física O ministro Dias Toffoli deferiu o ingresso, como amici curiae no RE 855.091 (Tema 808: IR sobre juros de mora recebidos por pessoa física), das seguintes entidades: (i) Confederação Nacional dos Servidores Públicos - CNSP; (ii) Associação Nacional dos Servidores do Poder Judiciário - ANSJ; (iii) Ordem dos Advogados do Brasil - OAB; Associação dos Juízes Federais do Brasil - AJUFE; (iv) Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho - ANAMATRA; (v) Associação dos Magistrados Brasileiros - AMB; (vi) Associação Nacional dos Agentes de Segurança do Poder Judiciário da União - AGEPOLJUS; (vii) Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais - FENAPRF; (viii) Município de São Paulo; (ix) Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal - CONDSEF; e (x) Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação - CNTE. Liberado para pauta caso sobre marco prescricional para a interposição de ação para exigir contribuição sindical rural na Justiça do Trabalho Foi liberado para inclusão em pauta o ARE 913.264 (min. Edson Fachin), Tema 892 da repercussão geral: Marco prescricional para a interposição de ação para exigir contribuição sindical rural no âmbito da Justiça do Trabalho. Roraima requer suspensão de casos sobre inclusão dos valores pagos a título de "demanda contratada" na base de cálculo do ICMS sobre operações envolvendo energia elétrica O Estado de Roraima apresentou petição ao ministro Ricardo Lewandowski requerendo que, por ocasião do RE 593.824, cujo Tema 176 da repercussão geral trata da inclusão dos valores pagos a título de 'demanda contratada' na base de cálculo do ICMS sobre operações envolvendo energia elétrica, seja oficiado novamente ao Tribunal de Justiça de Roraima para que suspenda a análise de casos de matéria similar, uma vez que, até o momento, o Tribunal segue apreciando os casos ignorando a determinação anterior de suspensão por parte do STF em decorrência do reconhecimento da repercussão geral. ABRAFRIGO requer pauta conjunta sobre contribuição do empregador rural pessoa física sobre a receita bruta proveniente da comercialização de sua produção A Associação Brasileira de Frigoríficos - ABRAFRIGO funciona como amicus curiae no RE 718.874 (min. Ricardo Lewandowski), cujo Tema 669 da repercussão geral trata do seguinte: "Validade da contribuição a ser recolhida pelo empregador rural pessoa física sobre a receita bruta proveniente da comercialização de sua produção, nos termos do art. 1º da lei 10.256/2001". A Associação apresentou petição ao relator requerendo que, em razão do referido recurso estar pautado para o dia 29/3, seria o caso de a presidência pautar, também, a ADI 4395 (min. Gilmar Mendes), que trata do mesmo assunto. A ABRAFRIGO, em sua manifestação, expõe que o caso já foi pautado cinco vezes sem que tenha havido o julgamento. CONFAZ anuncia convocação extraordinária para deliberar a respeito do FEEF do Rio de Janeiro e ALERJ presta informações ao STF Eduardo Guardia, presidente em exercício do CONFAZ, oficiou ao ministro Roberto Barroso comunicando-o que o órgão convocará uma reunião extraordinária para que possa prestar as informações solicitada nos autos da ADI 5635, ajuizada pela CNI, contra a lei 7.428/2016, do Estado do Rio de Janeiro, que condiciona o aproveitamento de incentivos fiscais relativos ao ICMS a depósitos em favor do Fundo Estadual de Equilíbrio Fiscal (FEEF). Antes, o Estado havia apresentado suas informações defendendo o FEEF. A Assembleia Legislativa também juntou informações. Presidente do CARF recebe ofício para suspensão de casos O ministro Marco Aurélio oficiou ao presidente do CARF, Carlos Alberto Barreto, para que suspenda os processos relativos à decisão do STF proferida nos autos do RE 566.622, cujo Tema 32 da repercussão geral foi definido assim: "Os requisitos para o gozo de imunidade hão de estar previstos em lei complementar". UNAFISCO requer audiência pública para leading case dos bônus A UNAFISCO Nacional, que representa os auditores fiscais da Receita Federal, pediu ingresso como amicus curiae no RE 835.291 (min. Ricardo Lewandowski), cujo Tema 934 trata da "constitucionalidade da vinculação de receita arrecadada com multas tributárias para o pagamento de adicional de produtividade fiscal". O caso conta com os seguintes amici curiae: SINDAFISCO - Sindicato dos Auditores Fiscais de Tributos de RO e Sindicato dos Técnicos Tributários de RO. A UNAFISCO também requereu que o STF realize uma audiência pública para discutir a questão do bônus dos auditores da Receita: "Dada a relevância e impacto que possam advir do julgamento desta ação, não apenas nas finanças públicas do ente federativo, mas suportado por toda a sociedade - mormente na situação de déficit público sofrido pelo país - é que se faz relevante a realização de audiência pública para que a aplicação da Constituição possa considerar também outras posições vertentes da sociedade organizada e seus representantes, conforme permissivo do art. 6º, da lei 9.882/99". O TRF da 1ª Região já abriu um Incidente de Resolução de Demanda Repetitiva (IRDR) pretendendo pacificar a questão no âmbito da 1ª região. Lá, a matéria é a MP 765/2016. Juntado parecer no debate sobre diferencial de alíquota interestadual de ICMS para as empresas do Simples Nacional O patrono do recorrente Jefferson Schneider de Barros & CIA. LTDA. juntou parecer do tributarista Paulo Caliendo para "demonstrar os nefastos efeitos de permanecer no mundo jurídico (inconstitucionalidade patente) a denominada cobrança do 'diferencial de alíquota interestadual de ICMS para as empresas do Simples Nacional'". Trata-se do Tema 517 da repercussão geral, tratado no RE 970.821 (min. Edson Fachin). O leading case traz os seguintes amici curiae: Associação Brasileira de Assessoria e Planejamento Tributário, Fiscal e Proteção aos Direitos do Consumidor e do Contribuinte - ABAPLAT; FECOMÉRCIO/RS e Estado de SP. Destaque da semana Foi suspenso o julgamento que discute a inclusão do ICMS na base de cálculo das contribuições para o PIS e a Cofins. A matéria está sendo analisada no RE 574.706 (min. Cármen Lúcia), no Tema 69 da repercussão geral. Até o momento, por 5 x 3, está prevalecendo a seguinte tese proposta pela relatora: "O ICMS não compõe a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da Cofins". Na mesma semana a Corte julgou inconstitucionais normas do Rio Grande do Sul (ADI 2663, min. Luiz Fux) e do Paraná (ADI 3796, min. Gilmar Mendes) que concediam benefícios fiscais a empresas locais como contrapartida a adesão a programas de investimento e geração de emprego e de natureza educacional, sob o entendimento de que as normas configuram caso de "guerra fiscal". Em ambos os casos, modulou-se os efeitos da decisão para que tenha efeito a partir da publicação no Diário da Justiça eletrônico do STF da ata do julgamento. Foi adiada a ADI 2441 (min. Rosa Weber), relativa a benefício do Estado de Goiás. Por fim, em votação unânime, o STF decidiu que livros eletrônicos e os suportes próprios para sua leitura são alcançados pela imunidade tributária. A tese aprovada no RE 330.817 (min. Dias Toffoli) foi: "A imunidade tributária constante do art. 150, VI, "d", da CF, aplica-se ao livro eletrônico (e-book), inclusive aos suportes exclusivamente utilizados para fixá-lo". Para o RE 595.676 (min. Marco Aurélio), foi a seguinte: "a imunidade tributária da alínea "d" do inciso VI do art. 150 da CF alcança componentes eletrônicos destinados exclusivamente a integrar unidades didáticas com fascículos". Tá na Pauta: 8/3 Está pautado como primeiro item o RE 574.706 (min. Cármen Lúcia), cujo Tema 69 da repercussão geral trata da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins. Até o momento, placar de 5 x 3 pela exclusão. O caso volta com o voto do ministro Gilmar Mendes. Também está pautado, como último item da pauta, o RE 434.251 (min. Edson Fachin), visando a definir se imóvel público objeto de contrato de concessão de uso para exploração de atividade econômica está abrangido pela imunidade recíproca prevista no art. 150, IV, 'a', da CF. Após um placar de 1 x 1, o caso volta com o voto-vista da ministra Cármen Lúcia. Global Constitutionalism A Federal High Court da Nigéria, equivalente ao nosso Superior Tribunal de Justiça, declarou a educação básica gratuita e obrigatória como um direito a ser concretizado individualmente para cada criança nigeriana. A ação foi intentada pelo Projeto de Defesa e Assistência Jurídica, que exigia que os governos federal e estadual cumprissem com seus deveres constitucionais de fornecer financiamento adequado para o regime de educação gratuita. Falhar nessa tarefa passou a ser uma violação constitucional. Apesar de entender que o direito à educação gratuita (seção 18 (3)(a) da Constituição) não era um direito diretamente concretizável tais quais os demais constantes do capítulo 2 da Constituição, a Lei de Educação Básica Universal Obrigatória, de 2004, elevou o direito a um status executório, podendo ser requerido aos tribunais. Evento A primeira reunião do Centro Brasileiro de Estudos Constitucionais - CBEC, terá, como expositor, José Eduardo Cardozo, no dia 24 de março de 2017, sexta-feira, das 10h às 12h, no Auditório do Bloco 3, Campus UniCEUB Asa Norte. A entrada no auditório do Bloco 3 será mediante apresentação do convite. Obiter dictum No julgamento do RE 574.706 (Tema 69: Exclusão do ICMS da base do PIS/Cofins), estava em votação se a Associação Brasileira dos Franqueados do McDonald merecia, ou não, ser admitida como amicus curie. Votando, o ministro Marco Aurélio emendou: "Presidente, o meu gosto pelo que fornecido pelo McDonald é enorme, mas nem por isso posso conceber uma admissibilidade automática". Por unanimidade, foi negada a admissão.
segunda-feira, 6 de março de 2017

Conversa Constitucional nº 22

Opinião: A Constituição implora solidariedade. Respondemos matando travestis a pauladas Talvez sejamos nós uma experiência que simplesmente não deu certo. Pouco mais de 60 dias após o assassinato brutal do vendedor Luis Carlos Ruas, atacado ao tentar defender um morador de rua homossexual na estação do metrô em São Paulo, as redes sociais expõem novamente o anjo mau que habita a nossa natureza coletiva. Dandara, travesti que morava na cidade de Fortaleza, capital do Ceará, foi torturada e assassinada por três criminosos. A selvageria foi gravada. É repulsivo, é atormentador, é um murro em nosso estômago. O vídeo, e os fatos nele imortalizados, confrontam a fantasia que tentaram criar negando uma verdade com a qual temos dificuldade de lidar: a de que somos homofóbicos. O preâmbulo da Constituição diz que somos uma "sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos". Sem preconceitos, nós? A dignidade da pessoa humana aparece como um dos fundamentos da República (art. 1º, III). Além de livre, a nossa sociedade há de ser "justa e solidária" (art. 3º, I) devendo, também, promover o bem de todos, sem quaisquer formas de discriminação (art. 3º, IV). Têm, essas exortações constitucionais, reverberado em nossa alma coletiva? A Constituição completa, próximo ano, 30 anos. Ela diz que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (art. 5º, caput). Diz também que ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante (art. 5º, III). Fala que a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais (art. 5º, XLI). Chega a falar que devemos "assistir aos desamparados" (art. 6º). É muita bondade, essa, que a Constituição de 1988 enxergou em nós. Mal sabia ela do que somos capazes. Desconsiderou a nossa capacidade de perseguir, humilhar, menosprezar, destruir e matar uma pessoa pelo simples fato de ela ser..., gay. Cada Dandara que morre leva com ela a prova cabal da miséria que somos enquanto sociedade. E seguimos sem discutir verdadeiramente a homofobia. A Constituição implora por fraternidade, pluralismo, Justiça e solidariedade. Respondemos matando travestis a pauladas. Passa da hora de nós, heterossexuais, somarmos esforços à comunidade gay para reverter esse quadro que não é simplesmente anti-gay, é anti-humano. É preciso também que nós, homens, heterossexuais, mudemos nossas práticas e, assim, fundemos uma nova ética social de absoluto repúdio à homofobia. Isso começa na mesa do bar e culmina na demonstração sincera de consideração e respeito com algo banal: a sexualidade alheia. A Constituição mostrou o caminho. Passa da hora de o percorrermos. Plenário virtual - Reconhecida a repercussão geral da vinculação de receita arrecadada com multas tributárias a adicional de produtividade fiscal Por 8 x 1, o STF reconheceu a repercussão geral do Tema 934, ventilado no RE 835.291, tratando da "constitucionalidade da vinculação de receita arrecadada com multas tributárias para o pagamento de adicional de produtividade fiscal". Segundo o relator, ministro Ricardo Lewandowski, "a causa ultrapassa o interesse subjetivo das partes". Nesse ponto, anota: "A título de exemplo, vale mencionar a recentíssima MP 765/2016, que instituiu o Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira, cuja composição é em parte formada pela arrecadação de multas tributárias e aduaneiras incidentes sobre a receita de impostos, de taxas e de contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (art. 5°, § 4°, da MP 765/2016)". O parecer da procuradoria-Geral da República, pedindo a inconstitucionalidade do modelo, expande a tese para além de Rondônia: "A situação dos autos é ainda mais grave, porque o aumento de arrecadação em que se baseia a vantagem funcional fica a cargo do grupo de servidores responsáveis pela constituição dos créditos tributários. Como essa atividade estatal interfere na esfera jurídica do contribuinte, por meio de obrigação jurídica compulsória, degrada- se o princípio da imparcialidade". A consequência do reconhecimento da repercussão geral, segundo o CPC/2015, é o envio de ofícios, pelo STF, para toda a jurisdição nacional, para que suspenda o andamento de processos que "versem sobre a questão". O TRF da 1ª região já abriu um Incidente de Resolução de Demanda Repetitiva (IRDR) pretendendo pacificar a questão no âmbito da 1ª região. Lá, a matéria é, explicitamente, a MP 765/2016. Ministro Barroso assume relatoria de caso sobre perdão pelo Confaz de dívidas tributárias fruto de benefícios inconstitucionais Com a indicação do seu impedimento no RE 851.421, o ministro Marco Aurélio abriu espaço para a redistribuição tanto do referido recurso como da ação cautelar 3802, incidental a ele. Esta última, já foi redistribuída ao ministro Roberto Barroso. Trata-se de recurso do MPDFT contra o DF, tendo como amicus curiae o SINDIATACADISTA, cujo Tema 817 da repercussão geral é o seguinte: Possibilidade de os Estados e o DF, mediante consenso alcançado no CONFAZ, perdoar dívidas tributárias surgidas em decorrência do gozo de benefícios fiscais, implementados no âmbito da chamada guerra fiscal do ICMS, reconhecidos como inconstitucionais pelo STF. Sustentação oral no debate sobre a referibilidade e natureza jurídica da contribuição para o INCRA, em face da EC 33/2001 O patrono da Rol Mar Metalúrgica Ltda juntou manifestação no RE 630.898 (min. Dias Toffoli), requerendo sustentação oral. Trata do Tema 495 da repercussão geral: Referibilidade e natureza jurídica da contribuição para o INCRA, em face da EC 33/2001. O caso está pautado para a sessão do pleno do STF do dia 29/3. Retirada de mesa ADI contra convênios Confaz que regulam a incidência de ICMS em cobranças de tarifa de energia elétrica de consumidores de baixa renda Foi retirado de mesa para julgamento a ADI 3973 (min. Luiz Fux), que, ao lado da ADI 3972, contesta, no STF, convênios do Confaz que regulam a incidência de ICMS em cobranças de tarifa de energia elétrica de consumidores de baixa renda, que têm direito a pagar uma tarifa diferenciada, com parte da conta subsidiada pelo governo. As duas ações têm pedido de liminar. A ADI 3972 (min. Cármen Lúcia) questiona o convênio ICMS 24/06, que autoriza o estado de Sergipe a não cobrar multas e juros relativos ao ICMS nas operações de fornecimento de energia elétrica aos consumidores de baixa renda. Já a ADI 3973 contesta o Convênio ICMS 60/07, que autoriza os estados da Bahia e de Rondônia a conceder isenção de ICMS na parcela da tarifa de energia elétrica subsidiada pelo governo. Nos dois convênios, alega-se que o Confaz violou o princípio constitucional da capacidade contributiva (parágrafo 1º do art. 145, da CF). O resultado seria o caráter confiscatório desse tipo de tributação, com violação ao inciso IV do art. 150 da CF, e o desrespeito ao princípio da isonomia (art. 150, II; art. 5º, caput; e art. 3º, IV, da CF). As duas ações estavam liberadas para inclusão em pauta de julgamento. Liberado para pauta debate sobre majoração da alíquota do IPI para o açúcar Foi liberado para inclusão em pauta do pleno do STF o RE 592.145 (min. Marco Aurélio), cujo Tema 80 da repercussão geral trata da majoração da alíquota do IPI para o açúcar. Liberado para pauta tema relativo à restituição de valores recolhidos a maior a título de PIS e COFINS mediante o regime de substituição tributária Foi liberado para inclusão em pauta no pleno do STF o RE 596.832 (min. Marco Aurélio), cujo Tema 228 da repercussão geral versa sobre a restituição de valores recolhidos a maior a título de PIS e COFINS mediante o regime de substituição tributária. SEBRAE pede adiamento de julgamento sobre indicação de bases econômicas para delimitação da competência relativa à instituição de CIDE, após a EC 33/2001 O SEBRAE requereu o adiamento do julgamento do RE 603.624 (min. Rosa Weber), que tem, como amici curiae, o SEBRAE, a ABDI e a APEX-Brasil, cujo Tema 325 da repercussão geral versa sobre a indicação de bases econômicas para delimitação da competência relativa à instituição de contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, após o advento da EC 33/2001. Retirado de mesa caso relativo à fixação de alíquota da contribuição ao SAT a partir de parâmetros estabelecidos por regulamentação do Conselho Nacional de Previdência Social Foi retirado de mesa para julgamento o RE 677.725 (min. Luiz Fux), que tem, como amici curiae, a CONSIF - Confederação Nacional do Sistema Financeiro, a ABISA - Associação Brasileira das Indústrias Saboeiras e Afins e o Conselho Federal da OAB, cujo Tema 554 cuida da fixação de alíquota da contribuição ao SAT a partir de parâmetros estabelecidos por regulamentação do Conselho Nacional de Previdência Social. O caso estava liberado para inclusão em pauta. Governo do RJ junta manifestação contra ação que ataca o Fundo Estadual de Equilíbrio Fiscal - FEEF O governo do Estado do Rio de Janeiro juntou manifestação à ADI 5635 (min. Roberto Barroso), ajuizada pela CNI questionando a lei 7.428/2016, do Estado do RJ, que condiciona o aproveitamento de incentivos fiscais relativos ao ICMS a depósitos em favor do Fundo Estadual de Equilíbrio Fiscal (FEEF). AGU pede manutenção da legislação sobre recebimento de royalties pelos municípios e competência da ANP nos critérios de afecção e do que sejam operações de embarque e desembarque de petróleo e gás natural A Advocacia-Geral da União juntou manifestação à ADI 5621 (min. Cármen Lúcia), opinando pela constitucionalidade da lei 9.478/1997, em seu texto original e na redação dada pela lei 12.734/2012 e da lei 12.351/2010, relativas ao recebimento de royalties pelos Municípios, a ligação direta das instalações de embarque e desembarque de petróleo e gás natural ao campo produtor, ou que sejam as instalações predominantemente voltadas à extração do petróleo: bem como a interpretação de que é permitida à ANP a livre definição dos critérios de afecção e do que sejam operações de embarque e desembarque de petróleo e gás natural. Destaque da semana: proclamado resultado sem modulação de efeitos quando à imunidade de ICMS para aquisições por entidades filantrópicas Semana passada, o STF apreciou o RE 608.872 (min. Dias Toffoli), com repercussão geral, fixando a seguinte tese no Tema 342 da repercussão geral: "A imunidade tributária subjetiva aplica-se a seus beneficiários na posição de contribuinte de direito, mas não na de simples contribuinte de fato, sendo irrelevante para a verificação da existência do beneplácito constitucional a repercussão econômica do tributo envolvido". Foi concluído, também, o julgamento de um conjunto de processos relativos a exigências introduzidas pela lei 9.732/1998 para alterar a definição de entidade beneficente de assistência social para fim de concessão de isenção tributária. No RE 566.622 (min. Marco Aurélio), foi fixada a seguinte tese no Tema 32 da repercussão geral: "Os requisitos para o gozo de imunidade hão de estar previstos em lei complementar". Dia seguinte, proclamando o resultado do lote de ações representado pelo RE 566.622 e pelas ADIs 2028, 2036, 2228 e 2621, imaginava-se que a Corte deliberaria sobre a modulação dos efeitos das decisão. Todavia, tudo o que ocorreu foi a releitura da proclamação anterior do resultado, com a recontagem dos votos, mas sem alterar o conteúdo. Tá na Pauta: 8/3 Dia 8/3 (quarta-feira), estão pautados os seguintes casos tributários: (i) RE 330.817 (min. Dias Toffoli), Tema 593: Imunidade tributária de livro eletrônico (e-book) gravado em CD-ROM. O Min. Dias Toffoli votou negando provimento ao recurso; (ii) RE 595.676 (min. Marco Aurélio), Tema 259: Tributação da importação de pequenos componentes eletrônicos que acompanham material didático de curso de montagem de computadores. Negam provimento ao recurso os ministros Marco Aurélio, Roberto Barroso, Teori Zavascki, Luiz Fux. O caso volta com a vista do ministro Dias Toffoli; (iii) ADI 2663 (min. Luiz Fux): Se norma estadual que regula a concessão de bolsa de estudos a professores e que estabelece a contraprestação por serviços a serem prestados pelos beneficiários versa sobre matéria de competência privativa da União. Se norma estadual que possibilita a concessão de incentivos em ICMS a empresas que patrocinarem bolsas de estudos para professores ofende o art. 155, §2º, XII, "g" da CF; (iv) ADI 3796 (min. Gilmar Mendes): ICMS. Limitação ao poder de tributar. Competência. Princípio da igualdade. Saber se a norma impugnada padece de vício de iniciativa. Saber se a norma impugnada ofende o princípio da isonomia e o disposto no art. 163, I da CF; (v) ADI 2441 (min. Rosa Weber): ICMS. Benefícios concedidos pelos programas 'Fomentar' e 'Produzir' de Goiás. Saber se as normas estaduais que estabelecem programas de incentivo ao desenvolvimento industrial e econômico do Estado de Goiás se submetem a prévia deliberação no âmbito do CONFAZ. Saber se os dispositivos impugnados ofendem os princípios da igualdade, da uniformidade geográfica, da livre concorrência e da proibição da vinculação da receita de impostos ao conceder benefícios a empresas goianas. Tá na Pauta: 9/3 Dia 9/3 (quinta-feira), estão pautados: (i) RE 574.706 (min. Cármen Lúcia), Tema 69: Inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS; (ii) RE 594.015 (min. Marco Aurélio), Tema 385: Reconhecimento de imunidade tributária recíproca a sociedade de economia mista ocupante de bem público. Enquanto o ministro Marco Aurélio nega provimento ao recurso, o ministro Edson Fachin dá-lhe provimento. O caso volta com a vista do ministro Roberto Barroso; (iii) ADI 4281 (min. Rosa Weber): ICMS. Energia elétrica. Substituição tributária. Ambiente de contratação livre. Decreto 54.177-SP. Saber se os dispositivos atacados ofendem os princípios do equilíbrio federativo, da legalidade, da capacidade contributiva, da legalidade tributária e da livre concorrência. O caso volta com a vista da ministra Cármen Lúcia. Antes, a ministra Ellen Gracie havia julgado procedente a ação com efeitos ex nunc. Não votam: min. Rosa Weber, min. Luiz Fux e min. Dias Toffoli; (iv) RE 643.247 (min. Marco Aurélio), Tema 16: Cobrança de taxa pela utilização potencial do serviço de extinção de incêndio. Negam provimento ao recurso do município os ministros: Marco Aurélio, Edson Fachin, Roberto Barroso e Ricardo Lewandowski. O ministro Luiz Fux deu provimento. O caso volta com a vista do ministro Dias Toffoli. Global Constitutionalism A Suprema Corte da província de Gauteng, na África do Sul, decidiu a inconstitucionalidade da tentativa do governo do país de se retirar do Tribunal Penal Internacional (TPI). Isso porque o governo o fizera sem consulta ao parlamento. O tribunal ordenou ao presidente Jacob Zuma e aos Ministérios da Justiça e dos Assuntos Estrangeiros a revogação do aviso de retirada. Antes, a Gâmbia também havia cancelado a sua notificação de retirada do TPI. Evento O STF, semana passada, vivia um paradoxo. De um lado, placas anunciando, para o dia 16/3, a palestra Flow e Mindfulness, com Hélder Camel, ao lado de outro anúncio de aula de Kundalini Uoga. Enquanto isso, para além dos convites à tranquilidade, corredores do 3º e do 5º andares em frenesi, pela mudança do gabinete do ministro Edson Fachin e preparação do gabinete do iminente ministro Alexandre de Moraes, que tomará posse dia 22/3. Obiter dictum Num julgamento no plenário, o ministro Marco Aurélio se impressiona com uma nova informação trazida pelo ministro Roberto Barroso. "Vossa Excelência me deu um tombo", diz. O ministro Barroso, de imediato, se explica: "Mas foi involuntário". No que o ministro Marco Aurélio arremata: "Sempre involuntário, e no campo das ideias e do debate".
segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

Conversa Constitucional nº 21

Opinião: Efeitos colaterais do conceito de "apropriação cultural" no Brasil Tem sido chamado de apropriação cultural - um conceito consistentemente trabalhado, na filosofia das artes, por James Young, em "Cultural Appropriation and the Arts", 2010 - práticas brasileiras que, ou são mero exercício da liberdade, ou oportunismos baratos, ou não passam de atitudes comuns de pessoas de boa-fé em suas experiências cotidianas. Comecemos pela liberdade. O livre mercado, em democracias capitalistas, especialmente na globalização, converte encantos em produtos, colocando-os à disposição de quem deseja adquiri-los. Para mim, quando um jovem paulistano, branco, urbano, com o seu sotaque local, aparece numa casa de shows em São Paulo segurando uma sanfona, lançando o "Forró Universitário", ele está colocando entretenimento à disposição da sua comunidade e mostrando que o fascínio pela música não tem fronteiras culturais. Não enxergo, nisso, a pilhagem da cultura nordestina. Na África, senhoras e jovens negras - respectivamente as Mamas e as Sissys - sempre caminharam carregando crianças em panos envoltos em seus corpos. Hoje, criancinhas são carregadas por mães e pais em todo o mundo nessas trouxas ou em derivações delas. Mulheres sul-africanas se incomodam com a demora para terem cabelos longos. Muitas usam perucas. O fio mais procurado é o brasileiro. Ao usarem perucas brasileiras que as deixam com um visual parecido com o das nossas mulheres, não estão, elas, se apropriando culturalmente de nós. Estão, apenas, comprando algo desejado e que o mercado lhes permite adquirir. O nome de tudo isso não é apropriação cultural. É liberdade. Outros comportamentos são meros oportunismos. O sujeito oportunista, branco, que muda a aparência para parecer negro e, com isso, soar mais legitimado a discutir questões raciais, é tão impostor quanto a jovenzinha que dorme em conforto e, ao fazer proselitismo com a pobreza, brada: "nós, os excluídos". Rachel Dolezal, uma branca estadunidense, ativista de direitos humanos, certo dia apareceu como se negra fosse. Seus pais disseram que ela mentia ao se apresentar como uma afro-americana. Toda a sua ascendência vinha da Alemanha e da República Tcheca. Mas quem tolerava aquele uso inapropriado da identidade negra? A NAACP, a mais tradicional e influente organização de defesa dos direitos dos afro-americanos nos Estados Unidos, da qual Rachel era..., uma líder. No Brasil, pessoas que vivem uma vida real não engolem aquilo o que julgam oportunista. Mas não chamam de apropriação cultural. Chamam de oportunismo mesmo. E sabem reagir. Certo dia, a jovem Elisa Quadros, a "Sininho", saía de mais uma delegacia onde prestava esclarecimentos. A ativista carioca, que mora na rica Copacabana, inventou de esperar um ônibus diante da imprensa vestida numa camiseta com os dizeres: "A favela não se cala". De repente, o transporte coletivo parou. Dentro dele, trabalhadores exaustos voltavam para suas comunidades depois de um estafante dia de trabalho. Ao avistarem a menina de Copacabana falando pela favela, gritaram: "Aqui você não entra. Chega de hipocrisia!". O ônibus partiu. Há ainda as pessoas de boa-fé. Na África do Sul, Nelson Mandela, um homem vaidoso, passou quase trinta anos vestindo uniformes de presidiário. Uma vez livre, deixou extravasar as suas origens. Negro, da tribo dos Xhosas, nascido na minúscula Qunu, passou a vestir as camisas estampadas de mangas longas abotoadas até o pescoço. O justice Albie Sachs, um camarada de luta, judeu, branco, nascido na cosmopolita Cidade do Cabo, usa camisas parecidas. Eu, quando estou em solenidades sul-africanas, não raramente ponho uma dessas. Não estamos, nós, apropriando-nos da cultura de ninguém. Pelo contrário. Estamos praticando a filosofia africana do Ubuntu, segundo a qual você divide com os outros elementos dos costumes para, assim, se conectar à comunidade. Um dos julgamentos mais emblemáticos da Corte Constitucional sul-africana assegurou o direito da jovem hindu, Sunali Pillay, usar, na escola, um piercing nasal. Na decisão, traçou-se um erudito histórico da ligação cultural entre o piercing nasal feminino e as tradições do povo hindu. O símbolo está intrinsecamente ligado àquela cultura. Acontece que mulheres brasileiras usam piercings no nariz. Estão, elas, perpetrando males à cultura alheia? Merecem menor consideração e respeito? E quanto aos corpos tatuados? Estiveram eles, no passado, ligados a uma vida underground, muitas vezes marginal. Hoje, homens tímidos de vida certinha, ou mulheres de extraordinária reputação, exibem orgulhosamente suas belas tattoos. Cultura é troca. Defender revanches e intermináveis acertos de contas serve mais à divisão da sociedade do que à nossa união. A ninguém assiste o direito de estereotipar meninas que, no Dia do Índio, colocam um cocar ou pintam o rosto em homenagem ao vínculo ancestral que as ligam ao seu próprio país. Mentes como as de Paulo Freire, ao falar da pedagogia do oprimido; Frantz Fanon, discorrendo sobre a colonização francesa na Algéria; e Steve Biko, fundador do Movimento de Consciência Negra, dedicaram suas vidas à causa da igualdade. Suas obras mostram o desejo de enterrar o esnobismo autoritário de senhoras brancas colonizadoras que, ao verem jovens negras colonizadas abanando um leque, diziam: "Quem você pensa que é para usar meu leque?". Vandalizarão a memória desses ícones senhoras negras que, em democracias plurais no século XXI, ao verem uma jovem branca de turbante, digam: "Quem você pensa que é para usar o meu turbante?". Quão bom seria se, nesse Brasil multicultural, mais e mais crianças, de todas as cores e crenças, usassem, em momentos significativos de suas vidas, as roupas das nossas Mães de Santo, essas heroínas da nossa história. Deveriam, os heróis indígenas, com sua cultura e tradição, compor mais a rotina da família brasileira. Jogadores brancos, europeus, poderiam tentar devolver ao futebol a "ginga" renascida pelos pés do rei negro Edson Arantes do Nascimento, o Pelé. Nada disso é apropriação cultural. É compartilhamento. É a mais pura humanidade. O Brasil é um caldeirão cultural. O que não quer dizer que a desigualdade social, e racial, não seja absurda. Não conseguimos implementar políticas capazes de criar e consolidar uma grande elite negra nacional. O preconceito está espalhado por cada canto da nossa sociedade, às vezes sutil e engravatado, às vezes brutal e nu. Majoritária em números, a comunidade negra é minoritária em prestígio e em poder. Tudo isso é uma chaga persistente que vulnera a nossa dignidade. Todavia, não é julgando pessoas comuns que pulam carnaval usando perucas, crianças inocentes que põem um cocar na cabeça ou jovens brancas de boa-fé que cobrem a cabeça com um turbante, que cicatrizaremos feridas coletivas. O conceito de apropriação cultural tem consistência quando trabalhado historicamente, notadamente na análise das consequências das pilhagens promovidas por nações ricas e poderosas contra povos subjugados. Entretanto, ao ser aplicado à vida do brasileiro comum, é puro autoritarismo. A sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos da qual fala o preâmbulo da Constituição é a que reconhece suas faltas com os seus membros, que demonstra arrependimento pelos fracassos e injustiças históricas cometidas, que implementa políticas públicas transformadoras e que, ao final, vive junta, unida em sua diversidade. Esse é o Brasil ideal. Não o outro, com cidadãs e cidadãos amedrontados pela deturpação ideológica de um conceito que, originariamente, veio para engrandecer, não para destruir. Plenário Virtual - Repercussão geral Conta com quatro votos pelo reconhecimento da repercussão geral - quórum suficiente para a admissão - o Tema 939, no RE 986.296, discutindo a validade do decreto 8.426/2015, que restabeleceu as alíquotas de contribuição para o PIS e COFINS, bem como a constitucionalidade da lei 10.865/2004. Os ministros que votaram foram os seguintes: Dias Toffoli, Roberto Barroso, Celso de Mello e Rosa Weber. A votação segue até o dia 2/3. Também conta com quatro votos, mas recusando a repercussão geral do Tema 938, no RE 1.013.583, a discussão sobre o prazo decadencial para revisão de benefício derivado. Os ministros votantes foram: Roberto Barroso, Dias Toffoli, Celso de Mello e Rosa Weber. A votação segue até 2/3. Por fim, cinco votos até o momento reafirmam jurisprudência na discussão do Tema 937, no RE 999.425, que discute a inconstitucionalidade do art. 2°, II, da lei 8.137/90, ao argumento de que o tipo penal enseja hipótese de prisão por dívida, em violação direta às disposições do art. 5º, LXVII, da CF. A reafirmação é no sentido da constitucionalidade da referida norma. Os ministros que votaram foram: Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli, Roberto Barroso, Celso de Mello e Rosa Weber. A votação segue até dia 2/3. OAB pede ingresso como amicus em debate sobre coisa julgada O Conselho Federal da OAB juntou pedido de ingresso como amicus curiae nos leading cases que tratam das nuances processuais relativas à coisa julgada tributária. Primeiro, o RE 949.297 (min. Edson Fachin), cujo Tema 881 da repercussão geral é: "Limites da coisa julgada em matéria tributária, notadamente diante de julgamento, em controle concentrado pelo STF, que declara a constitucionalidade de tributo anteriormente considerado inconstitucional, na via do controle incidental, por decisão transitada em julgado". O segundo, o RE 955.227 (min. Roberto Barroso), cujo Tema 885 da repercussão geral é: "Efeitos das decisões do STF em controle difuso de constitucionalidade sobre a coisa julgada formada nas relações tributárias de trato continuado". Sindicato pede ingresso como amicus em discussão sobre auditores fiscais do Amazonas O SIFAM, Sindicato dos Fazendários do Estado do Amazonas requereu ingresso como amicus curiae na ADI 5597 (min. Celso de Mello), ajuizada pela FEBRAFITE - Federação Brasileira de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais, questionando lei amazonense que permite a cobrança de tributos por agentes da administração fazendária que não são auditores fiscais. AGU junta manifestação em ação sobre pagamento de royalties do petróleo a municípios A AGU juntou manifestação contra a procedência da ADI 5621 (min. Cármen Lúcia), ajuizada pelo Partido da República, contra normas referentes aos royalties do petróleo devidos aos municípios que suportam as atividades de embarque e desembarque de petróleo ou são afetados por essa prática. O partido solicita que seja excluída do ordenamento jurídico a interpretação que exige, para o recebimento dos royalties pelos municípios, a ligação direta das instalações de embarque e desembarque de petróleo e gás natural ao campo produtor, sobretudo quando se trata de petróleo originário da plataforma continental. AGU junta manifestação em ação contra contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade A AGU juntou manifestação na ADI 5626 (min. Celso de Mello), ajuizada pela PGR, para que se declare inconstitucionais § 2º e a parte final da alínea 'a' do § 9º do art. 28 da lei 8.212/1991, no que fazem incidir contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade. A AGU defende a validade das contribuições. Negada liminar que pedia suspensão de lei goiana sobre benefício fiscal em privatização no setor elétrico O ministro Gilmar Mendes negou liminar por meio da qual o PSOL pedia a suspensão da lei 19.473/2016, de Goiás, que institui a política para distribuição de energia elétrica no estado e concede benefício fiscal no contexto da privatização da Companhia Celg de Distribuição S.A. (Celg D). A decisão foi tomada na ADI 5640. Global Constitutionalism A Suprema Corte do Quênia declarou a inconstitucionalidade da seção 194 do Código Penal, que permitia a pena de prisão de até dois anos para quem fosse condenado por difamação. Segundo o juiz John Mativo, relator, a punição era excessiva e criminalizar a liberdade de expressão seria algo inaceitável numa sociedade democrática. Também entendeu que tal previsão violaria a seção 33 da Katiba - a Constituição do Quênia. Para o relator, qualquer pessoa difamada tem um remédio disponível no campo do Direito Civil que é a possibilidade de compensação pecuniária. A decisão se deu num caso anteriormente arquivado ajuizado por Jacqueline Okuta e Jackson Njeru, acusados de difamação por postagens no Facebook. Evento O presidente da Corte Suprema de Justiça da Argentina, ministro Ricardo Lorenzetti, apresentou, sexta-feira, no STF, a conferência "Audiências Públicas, Participação Social e Implementação de Direitos Fundamentais - A experiência da Corte Suprema Argentina". De acordo com o presidente da Corte argentina, o juiz deve selecionar um número limitado de temas prioritários por ano para a realização de audiências públicas. Para ele, no passado, os conflitos judiciais eram relativos a direitos individuais, principalmente nas áreas civil e penal. "Agora temos questões de interesse institucional, como corrupção, meio ambiente, direito do consumidor, e todos podem alterar o cenário político, econômico e social", frisou. Obiter dictum O folclore político brasileiro imortalizou a compreensão de que, em plebiscitos ou referendos, o fundamental, mais do que o voto, é a pergunta feita aos eleitores. Ali mora o segredo. O raciocínio, trazido para o mundo jurídico, mostra que, em julgamentos de temas com repercussão geral após a entrada em vigor do Código de Processo Civil de 2015, mais importante do que a discussão, é a tese fixada ao final do julgamento. Líder da iniciativa de firmar essas "teses", o ministro Luís Roberto Barroso passou a ser referido, pelos colegas, como "tesista". No julgamento do RE 835.558, tratando da competência para julgar crimes de exportação de animais, o relator, min. Luiz Fux, prevendo problemas futuros na fixação da tese, se adiantou: "Não sou especialista em teses como os tesistas do Tribunal". Sabia o que previa. Depois de um longo período de debate no qual os ministros tentavam definir a tese que melhor definia o que havia sido decidido, o ministro Fux mandou: "Ainda bem que eu tive a humildade de dizer que não era especialista em tese". Foi o que bastou para o ministro Barroso emendar: "Para a quantidade de gente formada em Direito aqui na sala, até que foi rápido". Todo mundo gargalhou.
quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Conversa Constitucional nº 20

Opinião: Arrebentar pichadores não é lição de cidadania Hannah Arendt costumava dizer que, se você convida uma pessoa para um debate no clarão do meio-dia e, ao perguntar como está o céu, ouve como resposta "sim, a noite está linda", você já não mais está diante de um debatedor, mas de alguém que perdeu parte da capacidade cognitiva e que apresenta sintomas de pessoas com lesões cerebrais. Perguntar a alguém sobre as pichações e ouvir como resposta "a cidade é de todos" ou "a arte é do povo", é algo muito mais próximo da perda da capacidade de discernir sobre fatos do que de um verdadeiro ponto de vista. Segundo o art. 65 da lei 9.605/1998, é crime contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural pichar edificação ou monumento urbano, com pena de detenção, de 3 meses a 1 ano, e multa. Além disso, a conduta viola dimensões essenciais do direito à cidade, constantes tanto do art. 182 da Constituição Federal como do art. 2o., 'f' e 'g', da lei 10.257/2001 (Diretrizes Gerais de Política Urbana). A comunidade não deveria precisar de uma lei dizendo, por exemplo, que ninguém tem o direito de riscar um carro alheio, ainda que veja ali um laboratório artístico. Crianças são orientadas desde cedo a não escreverem nem desenharem em livros emprestados, ainda que se julguem ótimas desenhistas ou escritoras. Imaginar adultos devassando o que não lhes pertence é desalentador. Apesar disso, não devemos abraçar a ideia de que o certo numa sociedade civilizada é arrebentar moralmente pichadores. Semana passada, o Tribunal de Justiça do Piauí concedeu um habeas corpus a um jovem de 20 anos, conhecido como "Palestino". Samuel Ali Silva Haroon foi preso por apologia às drogas. Ele postava fotos fumando maconha. A Delegacia Especializada de Prevenção e Repressão a Entorpecentes, a "DEPRE", conseguiu um mandado de prisão e, ao chegar na casa da mãe do jovem, na periferia, não encontrou qualquer droga. Havia, contudo, material de pichação. Perceberam, então, que estavam diante do sujeito cujo apelido está pichado em boa parte das propriedades públicas e privadas de Teresina. Ele foi preso. Horas depois, lá estava o delegado de polícia, com distintivo, camisa xadrez e um sorriso escondido por um bigode branco, dando "joinha" para as câmeras da Secretaria de Segurança Pública do Estado. Por trás dele, diante de um painel da polícia civil, um mulato magrelo, de cabelos desregrados, calçando chinelos, vestido numa camisa com a gola esfolada e uma bermuda mostrando as canelas. Palestino era exibido como troféu. Forçado pelas autoridades, segurava, envergonhado, uma faixa na qual havia sido coagido a pichar "#DEPRE". A cena insultava a nossa ética quanto ao que devemos uns aos outros enquanto comunidade. Palestino pareceu, ali, um objeto esmagado pelo Estado. Pela polêmica, a seccional da OAB interveio. Depois de um dia preso, veio o habeas corpus. É lamentável que tudo isso tenho ocorrido no Piauí. O Estado é, em muitas áreas, um oásis progressista. Ele sedia a primeira delegacia de combate ao crime de feminicídio do país. À frente da delegacia da mulher, está a delegada Vilma Alves, uma senhora que exala dignidade, de hábitos modestos, negra, que, usando às vezes seus turbantes, circula honrada pela sua extraordinária reputação. Recentemente, uma emenda alterou a Constituição Estadual passando a prever a vedação a preconceitos em razão de "orientação sexual", previsão constante em constituições como a da África do Sul. Além disso, veio de Colônia do Piauí, um pequeno município sertanejo, o brilho de Kátia Tapety, vereadora eleita, em primeiro lugar, em 1992, 1996 e 2000, tendo sido vice-prefeita da cidade. É a primeira transexual da história do Brasil a ser alçada, pelas urnas, a um cargo público. Mesmo um Estado que conta com conquistas tão inspiradoras como essas viu autoridades policiais se seduzirem pela chance de arrebentar moralmente um pichador. O respeito ao direito à cidade passa, em grande medida, pela educação e pelo despertar de um senso de pertencimento. Não virá de episódios como esse lições de cidadania. O esculacho público praticado por autoridades contra moradores da cidade - cumpram, esses moradores, as leis, ou não -, é um tipo de humilhação que gera dor e ressentimento. Nada de bom nasce daí. PGR questiona legislação cearense de IPVA sobre aeronaves e embarcações A PGR ajuizou a ADI 5654, contra (i) o art. 6º, II, da lei 12.023/1992, e (ii) o art. 1º, da lei 15.893/2015, no ponto em que altera o art. 6º, III, IV e IV-A, da lei 12.023/1992, todas leis do Ceará. No caso, elas alteraram o dispositivo ao longo dos anos, e a lei 15.893/2015 foi a última a modificar a regulação do IPVA no Estado. Desde a redação original, a lei 12.023/1992 inclui aeronaves e embarcações no campo de incidência do tributo. A PGR ataca esse ponto. Plenário Virtual Ocorrerá até o dia 2/3, no Plenário Virtual do STF, votação quanto à repercussão geral do Tema 939, no RE 986.296 (min. Dias Toffoli), discutindo a validade do decreto 8.426/2015, que restabeleceu as alíquotas de contribuição para o PIS e da COFINS, bem como a constitucionalidade da lei 10.865/2004. O ministro Dias Toffoli reconheceu a repercussão geral. Também irá até o dia 2/3, a votação no Plenário Virtual quanto à presença de repercussão geral no Tema 938, no RE 1.013.583, sobre o prazo decadencial para revisão de benefício derivado. O relator, ministro Roberto Barroso, se manifestou pela ausência de repercussão geral. Por fim, perdurará até o dia 2/3 a votação quanto à repercussão geral do Tema 937, no RE 999.425, que discute a inconstitucionalidade do art. 2°, II, da lei 8.137/90, ao argumento de que o tipo penal enseja hipótese de prisão por dívida, em violação direta às disposições do art. 5º, LXVII, da CF. Até agora, só o relator, ministro Ricardo Lewandowski, votou. O ministro se manifestou no sentido de que deve ser reafirmada a jurisprudência da Corte no sentido da constitucionalidade da referida norma. AGU junta manifestação quanto a questionamento do DF a atos normativos sobre repartição de receitas tributárias A AGU juntou sua manifestação pelo não conhecimento e, caso contrário, pela improcedência da ADI 5565 (min. Luiz Fux), segundo a qual, ao limitarem o alcance dos arts. 157, I, e 158, I, da CF, a IN 1599/2015 e as Soluções de Consulta 166/2015 e 28/2016 interferiram diretamente na sistemática de contabilidade de receitas próprias do DF, exigindo do ente federado a apresentação à União de DCTF relativa ao Imposto de Renda retido na fonte decorrente de contratos de fornecimento de bens e serviços. Pela nova sistemática os valores passam a ser contabilizados como pertencentes à União. Destaque da semana: É válida a penhora de bens da RFFSA, vedada execução dos bens por precatório O pleno do STF, julgando o RE 693.112 (min. Gilmar Mendes), fixou, por unanimidade, a seguinte tese no Tema 355 da repercussão geral: "É válida a penhora em bens de pessoa jurídica de direito privado, realizada anteriormente à sucessão desta pela União, não devendo a execução prosseguir mediante precatório". Global Constitutionalism Os juízes do "Judiciário Yuan", mais alto órgão judicial de Taiwan, convocarão uma sessão da Corte Constitucional dia 24 de março para debaterem a questão do casamento entre pessoas do mesmo sexo. A Corte terá de interpretar dispositivos do Código Civil à luz da Constituição do país. Qi Jia-wei, gay, ajuizou, há 16 anos, a primeira demanda judicial forçando uma discussão sobre a questão. Não conseguiu. Agora, volta à ribalta tendo, até agora, extraordinário êxito. Se Taiwan reconhecer a validade das uniões homoafetivas, será a primeira país asiático a fazê-lo. Os debates terá inícios às 9h do dia 24 de março e serão transmitidos ao vivo pelo site do Yuan Judicial. Evento O Instituto de Diálogos Constitucionais - IDCon em parceria com a pós-graduação lato sensu em Direito e o Instituto CEUB de Pesquisa e Desenvolvimento - ICPD, convida para participar da Palestra "Teoria da decisão judicial", que terá a presença dos palestrantes: Ricardo Luis Lorenzetti - presidente da Corte Constitucional da Argentina; Luís Roberto Barroso e Edson Fachin, ministros do STF e Carlos Ayres Britto, ministro aposentado do STF. A palestra será realizada no dia 16 de fevereiro, quinta-feira, às 19h, no Auditório do Bloco 2, Campus Asa Norte. As vagas são limitadas à capacidade do auditório. Obiter dictum Durante o julgamento que baniu as vaquejadas, o ministro Luiz Fux, amante das artes marciais, fez uma analogia entre a prática e os esportes de contato. O ministro Luís Roberto Barroso, que acabara de pedir vista, segurando o riso, não se aguentou: "Eu achei interessante a analogia com os esportes de contato onde, realmente, há uma, digamos, autorização do contendor, mas, aqui, no caso do boi, eu teria dificuldade em aplicar a analogia". A ministra Rosa Weber, rindo para não chorar, tomou partido pelo boi e emendou: "Coitado!".
quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Conversa Constitucional nº 19

Opinião: O novo relator da "Lava Jato" no STF O ministro Edson Fachin passou a conduzir, como relator na Suprema Corte, os casos frutos da operação "Lava Jato". Antes, havia deixado a Primeira Turma, presidida pelo ministro Roberto Barroso, para compor a Segunda, cuja presidência cabe ao ministro Gilmar Mendes. A comunidade recebeu bem o nome, o que torna fascinante o "sereno do tempo". Quando, em 2015, o mesmo nome veio à tona como o indicado ao STF pela então presidente Dilma Rousseff, aqueles que não o conheciam terminaram amedrontados pela figura pintada na batalha virtual da internet. Sua fala, em nome de centenas de juristas, pedindo votos para a presidente Dilma, reverberou entre alguns como um compromisso ideológico e partidário incompatível com a função. De repente, aquele professor conhecido, um senhor formal, com o seu bigode branco, gestos sutis e fala de clérigo, virara alguém a temer. Na sabatina no Senado, o senador Magno Malta (PR/ES), pastor evangélico, liderou votos contra a sua indicação. A sabatina foi a "mais difícil em décadas", segundo a BBC. Durou mais de 12 horas. Líderes religiosos como Silas Malafaia pediam que os senadores rejeitassem o nome. Do plenário do Senado, vieram 27 votos contrários. Uma rejeição considerável, mas insuficiente a barrar a indicação. O tempo seguiu. Hoje, a comunidade conhece o julgador que, mesmo vencido, exorta o federalismo de cooperação com protagonismo dos Estados e municípios e não só da União. No caso que baniu a vaquejada, costume nutrido pelos ancestrais de vaqueiros nordestinos, o Ministro destacou o grave risco de a identidade de comunidades rurais ser destruída por interpretações urbanas indiferentes às diversidades. Recentemente, líderes religiosos o criticaram por ter composto o quórum de um habeas corpus no qual o ministro Roberto Barroso fez juntar voto fazendo considerações sobre a descriminalização do aborto. Na mesma semana, o ministro Fachin havia votado no sentido de se trancar uma ação penal contra uma liderança religiosa acusada de incitação ao ódio. "Não cabe ao Poder Judiciário, por razões metajurídicas, censurar manifestações de pensamento", anotou. Isso mostra que ter ideais enquanto humanista não é o mesmo que ter lados enquanto juiz. Com a redistribuição, a Lava Jato passará aos cuidados de um gabinete ágil, liderado por um julgador descrito como "acelerado". Seus assessores - os clerks - são mergulhados em juventude intelectual. Uma vez por mês pensadores dão as caras no gabinete para discutir temas do momento. É o "Hora de Atualização". Veio desse ambiente a iniciativa de uma audiência pública para discutir os bloqueios do WhatsApp. Agora, é a Lava Jato que precisa desse time. Um time que tem o DNA da faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná. O mesmo DNA que, de Curitiba, julga o braço originário da operação. Não se trata de um caso rápido, nem simples. Mas essa realidade não deve assombrar o novo relator. Certa feita, o ministro Fachin, recebendo um advogado em audiência, ouviu: "Ministro, eu vim aqui tratar de um caso rápido e simples". Retrucou, fazendo pilhéria: "O senhor está no Tribunal errado!". Sabia o que dizia. Agenda do ministro Fachin segue O ministro Edson Fachin segue com sua agenda de casos tributários. Essa semana o ministro recebeu um grupo de Procuradores da Fazenda para tratar do RE 587.108, cujo Tema 179 da repercussão geral é o seguinte: "Aproveitamento de créditos calculados com base nos valores dos bens e mercadorias em estoque, no momento da transição da sistemática cumulativa para a não-cumulativa da contribuição para o PIS e da COFINS". Na sequência, recebeu autoridades para tratar da ADI 4858, ajuizada pela Mesa Diretora da Assembleia Legislativa do Espírito Santo, questionando a resolução 13/2012 do Senado, que reduziu as alíquotas interestaduais de ICMS incidente sobre mercadorias importadas. Diferencial de alíquota de ICMS à empresa no Simples Nacional Foi liberado para pauta o RE 970.821 (min. Edson Fachin), cujo Tema 517 da repercussão geral é o seguinte: "Aplicação de diferencial de alíquota de ICMS à empresa optante pelo Simples Nacional". Liberado voto-vista sobre prazo prescricional à cobrança de valores não depositados no FGTS por empregadores e tomadores de serviço O ministro Roberto Barroso liberou o seu voto-vista no RE 522.897 (min. Gilmar Mendes), que discute o prazo prescricional aplicável para cobrança de valores não depositados no FGTS por empregadores e tomadores de serviço. O ministro Gilmar Mendes, relator, acompanhado da ministra Ellen Gracie, havia votado pela declaração de inconstitucionalidade com efeitos ex nunc [a partir da data da decisão] dos arts 23, parágrafo 5º, da lei 8.036/90 e 55 do decreto 99.684/90. Segundo o ministro, a prescrição de 30 anos deve ser substituída pelo prazo previsto no inciso 29 do art. 7º da CF, que fixa o tempo de cinco anos para que trabalhadores urbanos e rurais possam cobrar créditos resultantes das relações de trabalho. O dispositivo prevê ainda o prazo decadencial de dois anos, após a extinção do contrato de trabalho. O assunto também é discutido, em sede de repercussão geral, no ARE 709.212. Liberado caso sobre indicação de bases econômicas para delimitação da competência em contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico (pós-EC 33/2001) Foi liberado para pauta o RE 603.624 (min. Rosa Weber), cujo Tema 325 da repercussão geral é o seguinte: "Indicação de bases econômicas para delimitação da competência relativa à instituição de contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, após o advento da EC 33/2001". Amicus no debate sobre IR sobre juros de mora recebidos por pessoa física A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação - CNTE pleiteou ingresso como amicus curiae no RE 855.091 (min. Dias Toffoli), cujo Tema 808 da repercussão geral é o seguinte: "IR sobre juros de mora recebidos por pessoa física. Estamos encaminhando a petição". Município tenta ingresso em caso sobre convalidação, pela EC 57/2008, de desmembramento municipal inconstitucional e suas consequências sobre execuções fiscais anteriores O município de Seropédica pediu ingresso como amicus curiae no RE 614.384 (min. Luiz Fux), cujo Tema 559 da repercussão geral é o seguinte: "Convalidação, pela EC 57/2008, de desmembramento municipal realizado em desobediência ao § 4º do art. 18 da CF e suas consequências sobre execuções fiscais ajuizadas anteriormente à promulgação da citada emenda constitucional". Senado opina contrariamente à Ação que ataca normas referentes aos royalties do petróleo O Senado juntou manifestação pela improcedência da ADI 5621 (min. Cármen Lúcia), ajuizada pelo Partido da República, contra normas referentes aos royalties do petróleo devidos aos municípios que suportam as atividades de embarque e desembarque de petróleo ou são afetados por essa prática. Senado pede improcedência de ação contra contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade O Senado também juntou manifestação na ADI 5626 (min. Celso de Mello) ajuizada pelo PGR para que se declare inconstitucionais § 2º e a parte final da alínea "a" do § 9º do art. 28 da lei 8.212/1991, no que fazem incidir contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade. Além que suscitar a inadmissão da ADI, o Senado requer que o pedido de cautelar seja indeferido por não atendimento dos requisitos legais. No mérito, pede a improcedência da ADI, com declaração de constitucionalidade do § 2º e da parte final da alínea "a" do § 9º do art. 28 da Lei nº 8.212/1991. AGU opina contra procedência de ADO sobre FUST e CIDE A AGU juntou manifestação na ADO 37 (min. Ricardo Lewandowski) opinando pelo não conhecimento da ação e, no mérito, pela improcedência dos pedidos. A Ação discute a aplicação de recursos do FUST. Ela foi ajuizada pela OAB, que aponta omissão administrativa do Poder Executivo e da Anatel quanto à aplicação dos recursos, conforme a lei 9.998/2000, que o instituiu. AGU defende Convênio ICMS 93/2015, do Confaz A AGU juntou manifestação na ADI 5469 (min. Dias Toffoli), ajuizada pela ABCOMM. O ministro Dias Toffoli, em liminar, suspendeu cláusula do Convênio ICMS 93/2015. A decisão, proferida na ADI 5464, suspendeu a cláusula nona do convênio, que inclui as micro e pequenas empresas optantes pelo Simples no novo regime do comércio eletrônico. O Convênio como um todo é objeto de questionamento na ADI 5469. A AGU se manifestou no sentido do não conhecimento da ADI e, quanto ao mérito, pela improcedência, devendo ser declarada a constitucionalidade das Cláusulas primeira, segunda, terceira, sexta e nona do Convênio ICMS nº 93/2015, do CONFAZ. PGR opina contra remissão de benefícios fiscais inconstitucionais A PGR juntou manifestação no RE 851.421 (min. Marco Aurélio), cuja Tema 817 da repercussão geral é o seguinte: "Possibilidade de os Estados e o DF, mediante consenso alcançado no CONFAZ, perdoar dívidas tributárias surgidas em decorrência do gozo de benefícios fiscais, implementados no âmbito da chamada guerra fiscal do ICMS, reconhecidos como inconstitucionais pelo STF". Segundo a PGR, "não cabe à legislação infraconstitucional convalidar efeitos de ato normativo declarado inconstitucional por violação ao art. 155, 2º, XII, "g", da Constituição, mediante subterfúgio de suspensão de exigibilidade e remissão de créditos tributários oriundos da pronúncia de inconstitucionalidade, ainda que posteriormente autorizados em convênio celebrado por estados e pelo Distrito Federal no CONFAZ". Município de SP pede ingresso em ADI contra legislação estadual disciplinando ICMS sobre software A Confederação Nacional de Serviços (CNS), havia ajuizado a ADI 5576 (min. Roberto Barroso), com pedido de medida liminar, contra leis do Estado de São Paulo que instituem a incidência do ICMS sobre operações com programas de computador (software). O município de São Paulo juntou aos autos manifestação como amicus curiae se insurgindo contra a legislação estadual. Plenário Virtual O Plenário Virtual tem até o dia 16/2 para deliberar sobre a repercussão geral do Tema 933: "Balizas constitucionais para a majoração de alíquota de contribuição previdenciária de regime próprio de previdência social". Trata-se do ARE 875.958 (min. Roberto Barroso), já com oito votos reconhecendo sua repercussão geral. Também segue em votação até dia 23/02 o tema 934, no RE 835.291 (min. Ricardo Lewandowski), que cuida do modelo de gratificação de servidores fiscais vinculado ao aumento da arrecadação de multas tributárias. Segundo o Relator, "vale mencionar a recentíssima MP 765/2016, que instituiu o Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira, cuja composição é em parte formada pela arrecadação de multas tributárias e aduaneiras incidentes sobre a receita de impostos, de taxas e de contribuições administrados pela Secretaria da RFB (art. 5°, § 4°, da MP 765/2016)". O ministro Lewandowski reconhece a repercussão geral. Tá na pauta: Fevereiro Dia 22/2, o pleno apreciará os seguintes casos: RE 607.642 (min. Dias Toffoli), Tema 337 da repercussão geral: "Majoração da alíquota do PIS mediante medida provisória"; RE 608.872 (min. Dias Toffoli), Tema 342 da repercussão geral: "Imunidade de ICMS sobre produtos e serviços adquiridos por entidade filantrópica"; RE 390.960 (min. Luiz Fux): "ICMS. Operações de aquisição de bens destinados ao ativo fixo. Direito de crédito proporcional à vida útil do bem. Princípios da reserva de lei complementar nacional e da não-cumulatividade. Lei 3.188/99-RJ"; RE 592.891 (min. Rosa Weber), Tema 322 da repercussão geral: "Creditamento de IPI na entrada de insumos provenientes da Zona Franca de Manaus". No dia 23/2, o caso pautado é o seguinte: RE 566.622 (min. Marco Aurélio), Tema 32 da repercussão geral: "Reserva de lei complementar para instituir requisitos à concessão de imunidade tributária às entidades beneficentes de assistência social". O placar está 5 x 4 negando provimento ao recurso. Será julgado em conjunto com as ADIs 2028, 2036, 2228 e 2621. Global Constitutionalism A Comissão de Erradicação da Corrupção da Indonésia confirmou que havia detido um juiz da Corte Constitucional em uma investigação envolvendo outros três suspeitos e até dez outros detidos. A investigação envolve alegações de que o juiz e outro oficial aceitaram subornos em troca de decisões favoráveis. A Comissão pretende solicitar que o juiz seja afastado definitivamente de sua posição. Eventos Acontecerá no auditório do STJ, dia 31/3, o evento "Diálogo entre Cortes: fortalecimento da proteção dos direitos humanos". As inscrições podem ser feitas até dia 29/3 por meio do site da Enfam. Obiter dictum No julgamento sobre desconto nos vencimentos dos servidores públicos dos dias não trabalhados em virtude de greve, o ministro Gilmar Mendes foi aparteado pelo ministro Marco Aurélio para comentar que muito em breve os juízes passarão a querer ganhar tanto quanto os membros do Ministério Público, o que seria uma inversão de valores. Findo o aparte, o ministro Gilmar emendou: "O paradigma do Ministério Público é o ideal para todos, que é o céu". Nem o procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, se segurou. A gargalhada foi geral.
quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

Conversa Constitucional nº 18

Opinião: O Caso Renan - Segurança para, pelos menos, saber quem comanda nossos Poderes: Em dezembro de 2008, o STF decidia o "caso Raposa Serra do Sol" (PET 3388) quando, votando a liminar, formou-se um placar de sete votos num sentido. O ministro Marco Aurélio pediu vista. O colega, Carlos Ayres Britto, relator, argumentou que dever-se-ia proclamar o resultado, pois já havia maioria e a questão era delicada. "Excelência, então seria o caso de cassar a vista que pedi do processo. Vossa Excelência propõe a cassação do pedido de vista? Chega a esse ponto, a essa teratologia? Oh, ministro Carlos Ayres Britto", rebateu o ministro Marco Aurélio. Prevaleceu o pedido de vista. Oito anos depois, o ministro Marco Aurélio determinou o afastamento do presidente do Congresso Nacional, apreciando, sozinho, uma antiga cautelar anteriormente prejudicada, na ADPF 402, ajuizada pela Rede, mesmo estando, o julgamento, paralisado por um pedido de vista do colega, ministro Dias Toffoli. A ADPF aparentemente contava com seis votos favoráveis a que réus não presidam nem a Câmara dos Deputados nem o Senado, pois integram a linha sucessória da presidência da República. Um réu pode ser presidente da República sem que a ele se aplique qualquer suspensão de mandato, seja por ter se tornado réu antes de sua diplomação, seja porque, depois de diplomado, se tornou réu quanto a um crime comum dissociado das funções presidenciais (art. 86, § 1º, I e § 4º). Hoje, o senador Renan Calheiros é elegível para o cargo de presidente da República. E não pode presidir o Senado porque talvez substitua o presidente num de seus pernoites no exterior? A ADPF concentra-se nos réus do STF, mas, se potencializarmos o raciocínio, Luiza Erundina (PSOL/SP), condenada numa ação popular, seria "indigna" de presidir a Câmara. O mesmo se diga quanto ao senador Cristovam Buarque (PDT/DF), por uma ação de improbidade. Numa peleja política, o ex-presidente Fernando Henrique tentou, no STF, tornar réu o antecessor Itamar Franco (Inq 2179). Se tivesse conseguido, Itamar seria "indigno" de presidir o Senado? Erundina, Cristovam e o saudoso ex-presidente Itamar Franco são pessoas decentes que gozam de boa reputação em nossa comunidade. Jornalistas de coragem, artistas criativos, escritores talentosos, cartunistas espirituosos, livres pensadores, líderes sociais, ativistas de direitos humanos..., frequentemente se veem como réus. São, eles, "indignos"? Chega-se a supor que o que o Partido almejava era simplesmente afastar Eduardo Cunha e Renan Calheiros das presidências da Câmara e do Senado, respectivamente. Se era isso, ou os justos pagarão pelos pecadores, ou a Corte terá de dar o dito pelo não dito no futuro. Voltando à ADPF 402, em agosto, a procuradoria-Geral da República havia opinado pela sua prejudicialidade, por não ter, a inicial, indicado o ato específico violador de preceito fundamental da Constituição. Além disso, como a ação se voltava para o então presidente da Câmara, depois afastado, alegou-se não haver "mais interesse de agir", devendo, o caso, "ser extinto sem resolução de mérito". Em novembro, contudo, num segundo parecer, a PGR defendeu o afastamento. Um dos argumentos foi o de que um réu teria de ter reuniões com advogados e, isso, "tende a perturbar-lhe a mente". Veio uma ainda mais persuasiva: "Que mensagem e que exemplo esse estado de coisas daria para as crianças...?". Pois é. Dia 1º/12, o senador Renan Calheiros tornou-se réu, por 7 x 3, acusado de irregularidades no uso da verba de gabinete (Inq 2593). Mesmo o Senado podendo sustar o andamento da ação (art. 53, § 3º e § 5º, da CF), dia 5/12, às 11h17, o Partido volta-se à ADPF e apresenta novo pedido sustentando que já havia maioria e que o ministro Marco Aurélio deveria retomar, sozinho, o pedido cautelar anteriormente prejudicado. Falou no "grave desencanto e a frustração com as instituições republicanas". Alegou que "esses são bens e valores de importância transcendental" e invocou o "sentimento constitucional". Vieram, então, duas afirmações: "Como é altamente improvável que o julgamento da presente ADPF venha a ser finalizado antes do término do mandato do senador Renan Calheiros, que se encerra em 1/2/2017", não haveria como "aguardar a finalização do mérito da ação". A ADPF 402 mirava, agora, expressamente, o presidente do Congresso, um chefe de Poder. Foi dito isso no novo pedido, mas o cidadão apontado sequer foi ouvido, como impõe o art. 5º, LV, da Constituição. No mesmo dia, numa feliz iniciativa do ministro Luís Roberto Barroso, o STF recebeu o filósofo Michael Sandel, professor de Harvard, que falou sobre "Ética Pública e Democracia". Todos ouvimos dele que o maior escândalo da história dos Estados Unidos foi o Watergate. Fui checar. Em 1974, após o presidente Richard Nixon ter renunciado, o Congresso, incendiado, aprovou uma lei casuística que previa que Nixon não poderia ter acesso imediato aos seus papéis e fitas na Casa Branca. A Suprema Corte foi acionada (Nixon v. Administrator of General Services, 1977). A prudência veio do voto-vencido do juiz Warren Burger: "Considero muito perturbador que os princípios fundamentais do Direito Constitucional estejam subordinados ao que parecem ser as necessidades de uma situação particular. O fato de os momentos de grande angústia nacional dar origem a paixões nos lembra por que os três Poderes foram criados como separados e iguais, cada um destinado a verificar, por sua vez, possíveis excessos de um ou de ambos. (...) Para 'punir' uma pessoa, o Congresso - e agora o Tribunal - despedaça o tecido do nosso arcabouço constitucional". Nos EUA, a prudência num país em choque veio do voto-vencido. Na ADPF 402, o ministro Marco Aurélio, às 15h, determinou, sozinho, que o presidente do Congresso se afaste da presidência, dentre outras razões, por estar "ensejando manifestações de toda ordem". Vem da Constituição a composição da Mesa do Congresso sendo, o presidente do Senado, o seu necessário presidente (art. 57, § 5º). A liminar reformou materialmente a Constituição quanto ao que se exige para a formação da Mesa do Senado e, consequentemente, do Congresso. Também repercute na formação dos Conselhos da República e de Defesa Nacional (art. 89 e art. 91), órgãos que contam com a presença do presidente do Senado e que deliberam sobre defesa Nacional, guerra e paz. Dia seguinte, num manifesto assinado por toda a Mesa, o Senado anunciou que o certo a fazer seria aguardar a manifestação do pleno da Suprema Corte quanto ao seu recurso. O pleno é o órgão competente para apreciar ações contra o presidente do Senado (art. 5º, I e V do RISTF). Julgando o recurso, a liminar foi revertida por 6 x 3. A democracia não é feita só de representantes do povo. Mas nunca houve uma sem eles. O preâmbulo da Constituição se abre com os "representantes do povo". São eles que assinam o texto ao final. O art. 1º, parágrafo único, reitera que "todo o poder emana do povo", sendo exercido, primeiramente, pelos "representantes eleitos". Esmagar adversários políticos ou líderes indesejados, humilhá-los e persegui-los, é uma deformação da política. Por isso, precisamos da jurisdição constitucional. O STF foi convidado a embarcar numa caçada incompatível com a ADPF, principalmente numa liminar. No julgamento, a presidente, ministra Cármen Lúcia, falou em pacificação. Permitir que as pessoas possam dormir e acordar sabendo, pelo menos, quem comanda os Poderes do país, seria um bom começo. Passa da hora. Plenário virtual I Está em votação no Plenário virtual, até dia 22/12, o RE 944.245/SP (min. Edson Fachin), cujo tema 931 da Repercussão Geral trata do "cômputo como horas in itinere do tempo gasto pelo trabalhador para deslocar-se da portaria até o local do registro de sua entrada na empresa". Dois votos entendem que não se trata sequer de questão constitucional. Além do relator, votou nesse sentido o ministro Teori Zavascki. Plenário virtual II Também fica em votação no Plenário Virtual até dia 22/12 o RE 937.595/SP (min. Roberto Barroso), cujo tema 930 da repercussão geral trata da readequação de benefício concedido entre 5/12/1988 e 4/2/1991 (buraco negro) e a aplicação imediata dos tetos instituídos pelas EC's 20/1998 e 41/2003. O ministro Luís Roberto Barroso, único a votar, se manifestou no sentido de reafirmar a jurisprudência da Corte. Amicus curiae A Cooperativa dos Cafeicultores da Zona de Três Pontas Ltda (COCATREL), pediu ingresso como amicus curiae na ADPF 248 (min. Dias Toffoli), ajuizada pela CNC, que pretende: (i) conferir interpretação conforme a Constituição ao art. 168, I, do CTN, definindo-se que o prazo prescricional para a repetição de tributo declarado inconstitucional deve ser contado a partir da decisão do STF que declara a inconstitucionalidade; ou, por eventualidade, (ii) determinar que a nova orientação do STJ quanto ao prazo prescricional para repetição de tributo declarado inconstitucional - decidida no EREsp 435.835/SC, após 10 anos de entendimento consolidado em sentido diverso - somente pode ser aplicada a demandas iniciadas após 4 de junho de 2007 (data da publicação do referido acórdão pelo STJ) ou, caso assim não se entenda, em 24/3/2004 (data do julgamento do feito pelo STJ). Reconsideração no ICMS base da Cofins A Associação Brasileira dos Franqueados do McDonald's pediu a reconsideração, pela ministra Cármen Lúcia, de sua decisão negativa ao pedido de ingresso como amicus curiae no RE 574.706/PR (min. Cármen Lúcia), tema 69 da repercussão geral, sobre a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS. Rodada tributária Ontem, dia 7/12, o ministro Dias Toffoli teve audiências com patronos de vários casos tributários, tantos os advogados públicos quanto os privados. Os casos são os seguintes: i) RE 640.905/SP (min. Luiz Fux), tema 573: ofensa aos princípios da isonomia e do livre acesso à Justiça pela Portaria 655/93, do Ministério da Fazenda; ii) RE 605.506/RS (min. Rosa Weber), tema 303: cobrança de IPI na base de cálculo do PIS e da COFINS exigida e recolhida pelas montadoras de veículos em regime de substituição tributária; iii) RE 608.872/MG (min. Dias Toffoli), tema 342: imunidade de ICMS sobre produtos e serviços adquiridos por entidade filantrópica; e RE 570.122/RS (Min. Marco Aurélio), tema 34: ampliação da base de cálculo e majoração da alíquota da COFINS pela lei 10.833/2003, resultante da conversão da MP 135/2003. Tá na pauta: quarta-feira Na última semana de trabalho do STF antes do recesso, a pauta está repleta de temas tributários. Na quarta-feira, dia 14/12: i) ADI 4281/SP (Min. Rosa Weber), da ABRACEEL: ICMS. Energia elétrica. Substituição tributária. Ambiente de contratação livre. Decreto 54.177/SP. Saber se os dispositivos atacados ofendem os princípios do equilíbrio federativo, da legalidade, da capacidade contributiva, da legalidade tributária e da livre concorrência. O caso volta com o voto-vista da ministra Cármen Lúcia; ii) RE 605.506/RS (min. Rosa Weber), tema 303: cobrança de IPI na base de cálculo do PIS e da COFINS exigida e recolhida pelas montadoras de veículos em regime de substituição tributária; iii) RE 597.124/PR (min. Edson Fachin), tema 222: extensão do adicional de risco portuário ao trabalhador portuário avulso. Tá na pauta: quinta-feira Na quinta-feira, dia 15/12, os temas são os seugintes: i) RE 640.905/SP (min. Luiz Fux), tema 573: ofensa aos princípios da isonomia e do livre acesso à Justiça pela Portaria 655/93, do Ministério da Fazenda; ii) ADI 1055/DF (min. Gilmar Mendes), CNI: Saber se a MP 449/94, convertida na lei Federal 8.866/94, é compatível com a Constituição no que prevê a prisão civil do depositário infiel de valores referentes ao pagamento de obrigações tributárias; iii) ACO 758/SE (min. Marco Aurélio), Estado de Sergipe: Saber se os descontos do PIN e PROTERRA da base de cálculo do Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal - FPE caracterizam afronta à Constituição Federal. O caso volta com o voto-vista do ministro Gilmar Mendes. Global Constitutionalism A Corte Constitucional da África do Sul, no caso, declarou inconstitucional o dispositivo legal que, regulando a chamada barriga de aluguel, exigia vínculo genético entre o bebê e a contratante da barriga. Pelo dispositivo, ou a contratante daria seus óvulos para a barriga de aluguel ou, pelo menos, seu parceiro doaria o sémen, de modo que houvesse, entre os pais e o bebê, algum vínculo genético. A Corte Constitucional entendeu haver violação a direitos fundamentais, incluindo a igualdade, privacidade, dignidade e integridade física e psicológica. Também o direito à saúde dos pais que não puderam contribuir com gametas ou óvulos. A África do Sul é um dos poucos países da África que regulou a barriga de aluguel. A Suprema Corte do Quênia já reconheceu que o instituto não estava regulamentada por uma lei específica e, portanto, o Judiciário, quando chamado a arbitrar conflitos, deveria decidir caso a caso. Evento Ocorreu dia 7/12, o lançamento do livro "Protagonismo Judicial, Segurança Jurídica e Paternalismo Exarcebado: Desafios em tempo de incertezas - Estudos Jurídicos em Homenagem ao Ministro Carlos Mario da Silva Velloso". O ministro Velloso integrou o STF de 1990 a 2006, e exerceu a presidência da Corte no biênio 1999-2001. O lançamento da obra, publicada pela Editora GZ e coordenada por Werson Rêgo, ocorreu no Átrio da Biblioteca Victor Nunes Leal, no STF. Obiter dictum O ministro Joaquim Barbosa, aposentado, declarou, em entrevista ao Programa do Jô, que hoje se sente um espírito livre quanto a uma eventual disputa político-partidária. O primeiro corpo-a-corpo já aconteceu. Ao entrar no estúdio do programa, as pessoas da plateia se levantaram e começaram a gritar e aplaudi-lo de pé. À medida que o ministro se aproximava do Jô, mais aplausos e mais gritos eram notados, já competindo com a música do Quarteto. "Olha que recepção, ministro!", disse Jô, atento às pessoas. No que o ministro Joaquim respondeu: "Que maravilha de música, hein, Jô?!". Falava do jazz que tocava. A plateia sentou e calou.
sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Conversa Constitucional nº 17

Opinião: O voto do ministro Barroso e a descriminalização do aborto: O nascimento desperta fascínio. É o pontapé inicial da jornada da existência. Além disso, nós, brasileiros, celebramos grandiosamente a vida tanto quanto choramos copiosamente a morte. Talvez por isso, a manifestação do ministro do STF, Luís Roberto Barroso, no HC 124.306/RJ, tenha gerado tamanha catarse. Acompanhado de dois colegas - ministros Edson Fachin e Rosa Weber, a única mulher a votar -, o ministro entendeu que viola a Constituição considerar crime o aborto feito até o terceiro mês de gestação, limite temporal reconhecido por organismos médicos e sistemas jurídicos onde a prática não é considerada crime. A manifestação, num habeas corpus fruto de uma prisão preventiva, só se aplica ao caso em julgamento, mas antecipa a compreensão de três de onze juízes constitucionais. "O aborto é uma prática que se deve procurar evitar, pelas complexidades físicas, psíquicas e morais que envolve", ressalvou o ministro, explicando que "não se está a fazer a defesa da disseminação do procedimento". Reconhecendo ser uma "decisão trágica", disse que "ninguém em sã consciência suporá que se faça um aborto por prazer". O ministro Barroso ainda reconheceu: "a reprovação moral do aborto por grupos religiosos ou por quem quer que seja é perfeitamente legítima". Todavia, para muitos, a arena política é quem deveria ter introduzido o tema. É difícil. No Brasil, direitos humanos chegam como ponta de estoque. Discutimos cotas raciais em 2012, décadas depois dos países terem implementado suas políticas de forma muito mais abrangente do que nós. Em 2006, o continente africano, tido como homofóbico, já tinha país reconhecendo, pela via legal, o casamento gay. As uniões homoafetivas só entraram na nossa agenda em 2011, pela via judicial. Na África do Sul, a legalização do aborto veio em 1996, em lei assinada por Nelson Mandela. Outro que a encampou foi o líder religioso e arcebispo Desmond Tutu, também Nobel da Paz. Talvez seja a mais liberal do planeta. O "Choice on Termination of Pregnancy Act" reconhece "o direito de as pessoas tomarem decisões relativas à reprodução, à segurança e controle sobre seus corpos" e enfatiza que "a interrupção da gravidez não é uma forma de contracepção ou controle populacional". No Brasil, no final de 2016, um juiz da Suprema Corte disse, considerando dispositivos constitucionais, que delegacia de polícia não é lugar para curar as cicatrizes do aborto. Sentimo-nos ultrajados com a afirmação? Vamos falar de ultraje. Quando criança, tive contato com um aborto. Lembro o cenário: quarto de empregada trancado, porta derrubada, cartela de Cytotec no chão, lençol banhado em sangue, febre, alucinações, contorções, dor e desespero. Preta, pobre, com pouco estudo e sozinha, ela trouxera do Forró algo além das lembranças. Ultraje seria ver essa garota sair trôpega do hospital - onde, como punição, foi a última a ser atendida pelos médicos, homens - conduzida por policiais para prestar depoimento diante de um delegado. O mundo ideal difere muito das clínicas clandestinas ou quartinhos dos fundos. Ter o direito de decidir entre interromper ou não uma gestação até o terceiro mês é ter poder. Isso impõe responsabilidades. Todo direito traz seus limites. Liberdades também. A crítica especializada já denuncia os "abortos seletivos", quando, por exemplo, em países de liberação, se aborta somente fetos do sexo feminino, porque filhos homens são mais desejados. Poder optar por abortar é uma escolha tão grave quanto a de ter um filho. Ambas mudam a vida de todos os envolvidos. No aborto, um potencial da humanidade terá o seu trajeto interrompido. A vida não foi sequer um sopro. Por isso, quanto mais livre e consciente a decisão, mais sereno o espírito. A decisão do ministro Barroso, que cogita, no caso, a descriminalização do aborto, traz prognoses legislativas, análise de direitos fundamentais, controle de constitucionalidade, exame de proporcionalidade, aferição da eficácia de políticas públicas cerceadoras da liberdade..., enfim, toda a matéria-prima que alimenta Cortes Supremas. Na Câmara dos Deputados, o parlamentar Edmar Arruda (PSD/PR) disse ser contra a decisão por ser cristão. Não virá daí a luz que buscamos para solucionar a questão. No nosso país, em nome do Código Penal, a mulher é condenada. Também é condenada em nome da Constituição, da Justiça, da honra, da moral e dos bons costumes. Ela é condenada em nome da família, da vida, do feto, dos céus..., e em seu próprio nome. A Constituição de 1988, essa heroína generosa, dá fundamento a isso? Para o ministro Luís Roberto Barroso, e dois dos seus colegas, não. Para mim, também não. Liberado para pauta diferimento da compensação fruto da correção monetária das demonstrações financeiras no período-base de 1990 O ministro Gilmar Mendes liberou para inclusão em pauta o RE 545.796/RJ, cujo tema 298 da repercussão geral é: diferimento da compensação tributária advinda da correção monetária das demonstrações financeiras no período-base de 1990. Precedente com repercussão geral precisará mensurar oficialmente impacto financeiro no RGPS Os impactos de decisões judiciais começam a ser mensurados em precedentes da Suprema Corte com repercussão geral. O ministro Gilmar Mendes determinou a intimação da AGU para que informe à Corte "quanto ao impacto financeiro no RGPS resultante da pretensão de não aplicabilidade do fator previdenciário nas hipóteses das regras de transição da EC 20/98". A medida foi adotada no RE 639.856/RS, contra o INSS, tendo como amici curiae o Instituto dos Advogados de São Paulo - IASP, o Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário e o Sindicato Nacional dos Aposentados Pensionistas e Idosos da Força Sindical - SINDNAPI. O tema 616 da repercussão geral é: incidência do fator previdenciário (lei 9.876/99) ou das regras de transição trazidas pela EC 20/98 nos benefícios previdenciários concedidos a segurados filiados ao Regime Geral até 16/12/1998. Parecer da PGR se opõe à regulamentação judicial do IGF A PGR se manifestou no MI 6389/DF (min. Teori Zavascki), impetrado por membro do MPF contra os representantes dos Poderes Executivo e Legislativo com a finalidade de obter a regulamentação do art. 153, VII, da Constituição (IGF - Imposto sobre Grandes Fortunas). A manifestação é, na verdade, contrarrazões ao agravo regimental interposto contra decisão do ministro Teori Zavascki, que negou o pedido. Segundo a PGR, "não se está aqui a defender nem a investir contra a instituição do imposto, cuja conveniência fiscal e extrafiscal compete ao Executivo e ao Legislativo avaliar. Apenas se registra que, jurídica e politicamente, não há dever, mas potencialidade, de a União o criar e cobrar". Ação sobre omissão na aplicação de fundo ligado a telecomunicações terá rito abreviado O ministro Ricardo Lewandowski dispensou a análise de liminar para levar a julgamento definitivo a ADO 37, que discute a aplicação de recursos do Fust. A ação foi ajuizada pela OAB, que aponta omissão administrativa do Executivo Federal e da Anatel quanto à aplicação dos recursos, conforme a lei 9.998/2000, que o instituiu. A OAB argumenta que tanto o Fust quanto a Cide foram criados para fomentar investimentos em telefonia fixa, mas que tal modalidade de serviço vem caindo em desuso, sem que os programas de universalização das telecomunicações sejam implementados e as respectivas verbas orçamentárias aplicadas. Alega ainda que a cobrança da Cide deveria ser suspensa por medida liminar, até o julgamento definitivo da ação. O caso ainda não foi liberado para inclusão em pauta. Destaque da semana O STF julgou procedente a ADO 25 e fixou prazo de 12 meses para que o Congresso Nacional edite lei complementar regulamentando os repasses de recursos da União para os estados e o Distrito Federal em decorrência da desoneração das exportações do ICMS. De acordo com a decisão, se ainda não houver lei regulando a matéria quando esgotado o prazo, caberá ao TCU fixar regras de repasse e calcular as cotas de cada um dos interessados. Foram analisadas duas outras ações nas quais se discute a questão dos repasses aos estados relativos à desoneração das exportações (ACO 1044/MT e ACO 779/RJ). Tá na pauta Está pautada para da 7/12, quarta-feira, o exame da medida cautelar na ADI 5581/DF (min. Cármen Lúcia), ajuizada pela Associação Nacional dos Defensores Públicos (ANADEP), contra o art. 18, caput, §§ 2º e 3º da lei 13.301/2016 que "dispõe sobre a adoção de medidas de vigilância e saúde quando verificadas situação de iminente perigo à saúde pública pela presença do mosquito transmissor do virus da dengue, do virus chikungunya e do vírus da Zika", bem como de atos administrativos do poder público nacional. Sustenta-se a necessidade de interpretação conforme a Constituição do referido art. 18 por entender que "não é possível restringir a concessão do benefício pelo prazo máximo de três anos, pois as crianças afetadas pela síndrome sofrerão impactos e consequências por toda a vida, o que está cientificamente demonstrado". Também que é necessário o reconhecimento de que a concessão do Benefício de Prestação Continuada é devida não apenas para "criança vítima de microcefalia em decorrência de sequelas neurológicas decorrentes de doenças transmitidas pelo Aedes aegypti", mas também àquelas que sofrem de outras desordens neurológicas causadas pela síndrome congênita do vírus zika, que venham ainda a serem comprovadas cientificamente". Ainda, que se deve determinar a concessão do benefício às pessoas com sequelas da síndrome congênita do vírus zika independente da comprovação da miserabilidade ou, no mínimo, fixando presunção de miserabilidade do grupo familiar". Diz que "o gozo do salário maternidade não pode produzir a restrição de outro direito constitucional: Benefício de Prestação Continuada". Antes da análise de mérito, a Corte precisará definir se a requerente tem legitimidade ativa para propor a ADI. Global Constitutionalism Prêmio Nobel da Paz, o arcebispo Desmond Tutu percorre o globo defendendo ser possível remendar laços sociais esgarçados pela violação às leis por meio de uma justiça que, não sendo vingativa, enxergue no outro um traço de humanidade a ser resgatado por uma ética que não destrua, mas restaure. É a justiça restaurativa, que guiou a Comissão da Verdade e Reconciliação da África do Sul. Ela tem habitado a mente da presidente do STF, ministra Cármen Lúcia. Essa semana, uma delegação de seis juízes e seis promotores da Guiné-Bissau se reuniu com a presidente para discutir a experiência brasileira com a conciliação. "Queremos usar esse sistema no nosso país para acalmar mais a sociedade e apaziguar os conflitos", afirmou o magistrado Gássimo Djaló, porta-voz da delegação. A experiência brasileira é, para a presidente Cármen Lúcia, "um verdadeiro trabalho de justiça restaurativa". Antes, em sua primeira reunião como presidente, diante de 26 governadores ansiosos para saberem qual a saída para a guerra fiscal, já havia respondido sem medo: "a Justiça restaurativa". Evento Será lançada a coleção Comentários ao Código de Processo Civil, dirigida por Luiz Guilherme Marinoni e coordenada por Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero. A coleção será apresentada pelo ministro Sérgio Kukina, do STJ. Será dia 6 de dezembro, próxima terça-feira, a partir das 18h30, no Espaço Cultural do STJ. Obiter dictum Durante o julgamento do recebimento da denúncia contra o presidente do Congresso, senador Renana Calheiros, o ministro Gilmar Mendes começou a repetir uma história relativa a um magistrado da Justiça Federal que havia sido perseguido pelo Ministério Público. "Só não imputaram a ele a derrubada do World Trade Center", disse. De repente, o ministro revela o que foi de fato encontrado nas investigações. "Que ele, colecionador, tinha uma caneta-revólver em casa". Daí passou a repetir: "Uma caneta-revólver, uma caneta-revólver...". O decano, ministro Celso de Mello, vermelho, olhou para o ministro, se segurando. "Caneta-revólver, uma caneta-revólver...", o ministro Gilmar repetia. Foi quando o ministro Celso de Mello não se aguentou, pôs a mão na boca e gargalhou. Olhado pelo ministro Gilmar, que, enfático, repetia "caneta-revólver, uma caneta-revólver", o decano se recompôs e o julgamento seguiu seu curso.
segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Conversa Constitucional nº 16

Fidel e a dialética constitucional da liberdade e igualdade Fidel Castro, o comandante, morreu. Sua biografia expôs a dialética que domina a geopolítica desde que eu nasci. No Brasil, é a contraposição entre os artigos 5º e o 6º da Constituição Federal. O primeiro, voltado às individualidades, traz direitos de liberdade. O outro, firma compromissos sociais que se exige do Estado quanto à coletividade, tais como saúde, educação, moradia e alimentação, concretizando a igualdade. O constitucionalismo tem mostrado que o ideal é tentar equilibrar liberdade e igualdade, mas Fidel e o seu socialismo não conseguiram enxergar isso. Quando, em seus discursos, dizia que em Cuba nenhuma criança dormia na rua - uma conquista coletiva - não tinha condições de falar sobre liberdade de expressão, uma necessidade individual. Seu narcisismo e megalomania - características comuns a rebeldes corajosos - impôs a sua gente sacrifícios não em nome da pátria, mas dele, Fidel. O mero capricho de fazer cidadãos ouvi-lo falar por mais de sete horas já mostra vaidade e egoísmo sem limites. Recentemente, médicos cubanos vieram ao Brasil salvar vidas e amenizar o sofrimento de irmãs e irmãos em vilarejos abandonados pelos nossos líderes. Seus salários eram vertidos ao Projeto Castrista. Eles não eram vistos por sua pátria como indivíduos, mas como propriedade estatal. Isso é cruel, porque é anti-humano. Apaixonados insensíveis, mergulhados em seu romantismo sádico, enaltecem Cuba como o último bastião de um socialismo que "quase" deu certo. Falam que a razão do fracasso é o embargo econômico, dando razão a Sartre quando dizia que "o inferno são os outros". Fidel, mesmo sendo um ditador, não se iguala a um Kadafi em crueldade, nem a um Saddam em tirania. Também não fez com os cubanos o que os antepassados soviéticos fizeram com sua gente. É de igual modo tolo comparar uma Cuba historicamente repleta de turistas com uma Coréia do Norte isolada. Fidel foi um homem de coragem que fez um contraponto histórico aos Estados Unidos. Graças ao seu tirocínio, jovens barbudos e garotas rebeldes mostraram ao Império que era melhor deixar aquela pequena ilha em paz. Arriscou sua vida nisso. Seu legado é o de ter enfrentado oponentes poderosos, soberbos e oportunistas. Ironicamente, morreu no ano em que os laços diplomáticos do seu país foram retomados com os Estados Unidos. Antes, em sua psicose conspiratória, havia elegido como espiã do Império uma mulher franzina, cubana, que passa o dia diante de um laptop atualizando um blog. Deixou como herdeiros ideológicos jovens, numa maioria, sem sua coragem, convicção, estratégia e liderança. A farda deu lugar a camisas com a imagem do conterrâneo ilustre, Che. No lugar das armas eles têm iphones. Vivendo em conforto, muitos são meninos e meninas que, buscando uma alternativa à miséria de uma vida sem causas cochilam em barraquinhas nas universidades e exigem achocolatado e leite condensado em suas revoluções. A morte do comandante me fez recordar a famosa entrevista que ele concedeu a Erick Durschmied. "É uma revolução para que em Cuba não tenhamos, no futuro, outras revoluções. Queremos instituir um sistema constitucional de longa duração, com um governo dedicado como condição essencial para o progresso e a felicidade de nosso país", disse o jovem revolucionário, fardado, no topo da montanha em Sierra Maestra. Cumpriu quase tudo. Faltou, todavia, prosperidade e felicidade. Fidel foi grandioso ao evitar que um país como Cuba se tornasse mais um brinquedo dos Estados Unidos. Jogou tudo fora, contudo, ao transformar a ilha, e sua gente, em meros objetos de seus próprios caprichos. Liberado para pauta voto-vista sobre imunidade de IPTU sobre bens da União utilizados pela Petrobras Foi liberado para pauta, após pedido de vista do ministro Luís Roberto Barroso, o RE 594.015/SP, da Petrobras contra o município de Santos, tendo, como amicus curiae, a Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários - ANTF, tratando do tema 385 da repercussão geral: "Reconhecimento de imunidade tributária recíproca a sociedade de economia mista ocupante de bem público". O relator, ministro Marco Aurélio, lembrou do seu posicionamento no julgamento do RE 580.264, ocasião em que salientou que tanto a sociedade de economia mista quanto as empresas públicas submetem-se ao disposto no artigo 173, parágrafo 2º da Constituição Federal, segundo o qual "as empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado". O ministro Edson Fachin votou para reformar a decisão do TJ/SP, seguindo precedentes do Supremo no sentido de não ser cabível a cobrança do imposto. O ministro sugeriu a seguinte tese: "a sociedade de economia mista arrendatária de bem público Federal não pode ser eleita, por força de lei municipal, para figurar como parte passiva de obrigação tributária referente ao IPTU". Com o retorno do caso à pauta, saberemos qual a posição do ministro Barroso na matéria. IPI na base do PIS/COFINS das montadoras de veículos em ST e portaria 655/93 do MF no radar da Fazenda Agendaram audiência, com o ministro Ricardo Lewandowski, os procuradores responsáveis pelo acompanhamento dos temas tributários no Supremo para tratar do RE 605.506/RS (min. Rosa Weber), sobre o Tema 303 da repercussão geral: "IPI na base de cálculo do PIS e da COFINS exigida e recolhida pelas montadoras de veículos em regime de substituição tributária". Também trataram do RE 640.905/SP (min. Ricardo Lewandowski), sobre o Tema 573: "Ofensa aos princípios da isonomia e do livre acesso à Justiça pela Portaria 655/93, do Ministério da Fazenda (LC 70/91. Parcelamento de Dívida. Depósitos Judiciais)". O caso da ministra Rosa Weber está pautado para dia 14/12 e o outro aguarda inclusão. ETCO pede preferência em ADI contra decreto-lei de cancelamento do registro especial de fabricantes de cigarros O Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial - ETCO, amicus curiae, requereu preferência de julgamento na sessão da Suprema Corte do dia 30/11 (quarta-feira), de modo que a ADI 3952 tenha seu julgamento complementado frente ao julgamento da ADI 4874, e das ADPFs 183 e 131, que ainda não tiveram início, mediante a inversão da pauta. A ADI 3952, que versa sobre a pretensa inconstitucionalidade do decreto-lei 1.593/77, em virtude de contemplar a possibilidade de cancelamento do registro especial de fabricantes de cigarros, em decorrência de descumprimento de obrigações fiscais, foi ajuizada em 2007. O julgamento foi iniciado em 2010, sob a relatoria do ministro Joaquim Barbosa. Agora, o processo retorna à pauta. AGU defende legislação de SP sobre ICMS em software A Advocacia-Geral da União encaminhou manifestação na ADI 5576 (min. Roberto Barroso) que ataca leis do Estado de São Paulo sobre ICMS em operações com programas de computador. Segundo a ação, ao exigir o ICMS sobre as operações com softwares as leis incorrem em bitributação, criando nova hipótese de incidência do imposto. A CNS, autora, explica que as operações com programas de computador jamais poderiam ser tributadas pelo ICMS, por já estarem arroladas no âmbito de incidência do ISS, conforme a LC 116/2003. Pede, liminarmente, a suspensão da eficácia do artigo 3º, inciso II, da lei 8.198/1992 e dos decretos 61.522/2015 e 61.791/2016, todos do Estado de São Paulo. Liberado para pauta submissão dos conselhos de fiscalização profissional à execução pelo regime de precatórios Foi liberado para inclusão em pauta de julgamento o RE 938.837/SP (min. Edson Fachin), cujo tema 877 da repercussão geral trata da submissão dos conselhos de fiscalização profissional à execução pelo regime de precatórios. ADI questiona incidência da contribuição previdenciária sobre licença-maternidade O procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, ajuizou a ADI 5626 contra dispositivos da lei 8.212/1991 que fazem incidir a contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade. Segundo o procurador, os parágrafos 2º e 9º (alínea "a", parte final) do artigo 28 da lei são incompatíveis com as garantias constitucionais de proteção à maternidade e ao direito das mulheres de acesso ao mercado de trabalho. Argumenta-se que as normas imputam ao empregador parte do ônus do afastamento da gestante devido à maternidade e contribuem para o aumento do custo de sua mão de obra, em comparação à masculina. "Essa dupla contribuição pelo mesmo posto de trabalho encarece a mão de obra feminina e contraria a norma constitucional e a internacional", sustenta, referindo-se à Convenção 103 da Organização Internacional do Trabalho. O relator é o ministro Celso de Mello. Aconteceu Teve início no STF a discussão sobre a compensação dos Estados pela desoneração das exportações do ICMS. O tema é tratado na ADO 25 e na ACO 1044, ajuizadas respectivamente pelos Estados do Pará e Mato Grosso, colocando em questão a metodologia aplicada pela "Lei Kandir" (LC 87/1996) e legislação subsequente. Na ADO, há outros 15 Estados admitidos como amicus curiae, ao lado do Estado do Pará, que ajuizou a ação questionando a demora do Congresso Nacional em regulamentar o tema, e pedindo a aprovação de nova norma em até 120 dias. A desoneração foi constitucionalizada pela Emenda Constitucional 42/2003, que acrescentou ao ADCT o artigo 91, no qual se prevê edição de nova lei complementar definindo os termos das compensações feitas aos estados. Na ACO 1044, o Estado de Mato Grosso alega ser prejudicado por perdas de arrecadação devido ao coeficiente utilizado pela União para os repasses às unidades da federação. Tá na pauta O STF liberou todos os temas tributários pautados para dezembro, até o dia 20/12, data do recesso. Dia 14/12 (quarta-feira) estão na pauta: (i) ADI 4281/SP (min. Rosa Weber), da ABRACEEL tendo como amicus curiae a Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Elétrica - APINE: ICMS. Energia Elétrica. Substituição Tributária. Ambiente de Contratação Livre. Decreto 54.177-SP. Saber se os dispositivos ofendem os princípios do equilíbrio federativo, da legalidade, da capacidade contributiva, da legalidade tributária e da livre concorrência. No caso, após a ministra Ellen Gracie julgar procedente a ação, pediu vista a ministra Cármen Lúcia, que trará o seu voto-vista. Não votam a ministra Rosa Weber e os ministros Luiz Fux e Dias Toffoli; (ii) RE 605.506/RS (min. Rosa Weber), sobre o tema 303 da repercussão geral: Cobrança de IPI na base de cálculo do PIS e da COFINS exigida e recolhida pelas montadoras de veículos em regime de substituição tributária. Dia 15/1 (quinta-feira), o RE 640.905/SP (min. Luiz Fux) que visa saber se a portaria 655/93 do Ministério da Fazenda, que proibiu o parcelamento de débitos relativos à Cofins que tenham sido objeto de depósito judicial, ofende os princípios da isonomia e do livre acesso à Justiça. Global Constitutionalism Num julgamento divulgado pelo Chief Justice Mogoeng Mogoeng na última terça-feira, Jacobus Kruger foi reputado racista por usar a palavra "k" em agosto de 2007, que, na África do Sul, é terminantemente proibida. "Kaffir" era a forma como o regime do apartheid se referia à comunidade negra quando queria agredi-la. Com o fim do regime e o nascimento da nova democracia constitucional, falar a palavra se tornou um crime gravíssimo. Kruger' que era um fiscal de contrabando e descaminho no Aeroporto Internacional de Cape Town, chamou seu chefe, Abel Mboweni, de kaffir. Num processo administrativo que sofreu, ele se declarou culpado e foi suspenso de suas atividades sem remuneração, mas em outubro de 2007 sua punição foi revertida e ele foi exonerado. A partir daí deu-se uma longa disputa judicial que terminou na Corte Constitucional. O presidente da Corte, ao manter a demissão de Kruger, mas determinar o pagamento de seis meses de salário em razão de erros por parte da própria SARS (espécie de Receita Federal), enfatizou que o uso do termo kaffir está no coração do racismo sul-africano e é calculado para nulificar a dignidade dos negros. "É algo usado para deslegitimar, para desumanizar", anotou. Obter dictum Não raramente as sessões do pleno do STF recebem alunos de faculdades de Direito de todo o país. Eles costumam assistir aos debates, maravilhados. Um dia desses, lá estava mais uma caravana de estudantes no plenário da Suprema Corte, observando as discussões, quando o ministro Roberto Barroso, fechando o seu raciocínio, emendou: "last but not least". Uma garota, empolgada, cutucou a outra: "Uau! Parece o Suits, amiga". Referia-se à célebre série jurídica norte-americana.
segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Conversa Constitucional nº 15

Opinião: O caso dos sacrifícios de animais em religiões de matrizes africanas Após mais de 10 anos tramitando no STF, foi liberado para inclusão em pauta o RE 494.601/RS, cujo resultado pode vir a ser a criminalização da liturgia adotada pelas religiões de matrizes africanas nas "comidas sagradas" que eventualmente levam carne à cada divindade. No Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ/RS), de onde se origina o recurso, as seguintes entidades pediram para ser ouvidas: Maria Mulher - Organização de Mulheres Negras; Cedrab - Congregação em defesa das Religiões afro-brasileiras; Unegro - União dos Negros pela Igualdade; Ilê Axé Yemonja Omi-Olodo e C.E.U Cacique Tubinambá; Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades - CEERT; e o Movimento Negro Unificado - MNU. Nenhuma foi aceita. Suas petições e documentos, contudo, foram aproveitados. Já no Supremo, formularam pedido semelhante a Sociedade Religiosa Cultural e Beneficente São Salvador Ilê Axé Oxumarê; o Coletivo de Entidades Negras - CEN; a Comunidade Terreira Ilê Axé Yemonjá Omi Olodô; o C.E.U Cacique Tupinambá; e a Congregação em Defesa das Religiões Afro-Brasileiras - CEDRAB/RS. Optou-se por não dar voz a nenhuma delas. Além disso, o relator determinou que suas petições e documentos foram devolvidos. No TJ/RS, de 25 desembargadores que votaram, havia uma única mulher. Uma só. Era a desembargadora Maria Berenice Dias. Antevendo um amanhã humanista, a Desembargadora não só assegurava o direito às religiões de matrizes africanas como também para todas as religiões que eventualmente tivessem no preparo de animais para alimentação um elemento de suas liturgias. Ficou sozinha, contudo. Mas o seu raciocínio emancipador foi o que prevaleceu no parecer do Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, no recurso que está no STF. No TJ/RS, por maioria, rejeitou-se integralmente a ação. As religiões de matrizes africanas deveriam ser deixadas em paz. Mas a briga não parou. Vale contextualizar. Dia 1º de outubro de 2011, um sábado, ocorria mais uma Marcha para Jesus em Porto Alegre. Ela contaria com a presença de José Fortunati, evangélico prefeito da capital. Na praça da matriz, diante do Palácio Piratini, em cima do trio elétrico, olhando para os quase oito mil fiéis, o prefeito entregou simbolicamente a chave da cidade a três líderes religiosos - pastores - e afirmou: "Nós estamos entregando, de forma definitiva, o comando da nossa cidade ao nosso Senhor Jesus Cristo". Três anos depois, sua esposa, a evangélica Regina Fortunati, era eleita deputada estadual. Com o slogan "Pelos animais. Por todos nós", tão logo tomou posse, a primeira dama apresentou o PL 21/2015, propondo a criminalização do consumo de carne nos moldes das liturgias das religiões de matrizes africanas. É o "sacrifício de animais". Na audiência pública realizada na Assembleia Legislativa, homens e mulheres vestidos de branco dançavam animados pelos sons dos tambores, envoltos em ritmos que compõem a nossa identidade. Eram os representantes religiosos. As mulheres, já de certa idade, com um ar de realeza, giravam o corpo sem deixar cair seus turbantes ornamentados, com colares ao redor do pescoço, batas longas e bordadas, anéis e brincos com búzios. O retrato vivo do Brasil imortalizado por Jorge Amado com a alegria que sentimos quando estamos unidos em nossa diversidade. Mas nem todos festejavam. Vestida de preto, com a face manchada de vermelho e uma sombra preta sobre as pálpebras de um rosto alvo, uma jovem urbana mantinha preso o seu liso cabelo louro enquanto gritava no megafone sem parar: "o Rio Grande do Sul está manchado de sangue!". "Tenham vergonha!". Outra mulher, mais velha, batia uma panela. Aquele vestuário preto, performático, se notabilizou pelos seguidores do "Libertação Animal", movimento cuja ideologia radicaliza a extraordinária obra do filósofo australiano Peter Singer. Foi o mesmo usado por jovens da classe média de São Paulo ao invadirem o Instituto Royal e levarem cães beagles usados em pesquisas. Com a invasão, os cientistas foram embora e o Instituto encerrou suas atividades. Parte dos beagles foi abandonada em seguida. Depois de muita discussão, a Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul enterrou o PL 21/2015. Noutras palavras, as religiões de matrizes africanas, e suas liturgias, mais uma vez, mereciam ser deixadas em paz. No STF, o RE 494.601/RS é fruto da ação ajuizada, em 2004, pelo então procurador-Geral de Justiça do Rio Grande do Sul. O mote é, basicamente, um respeito muito grande pelos animais. Em abril de 2014, nove anos após o julgamento do TJRS, esse amor pelos bichos teve um recreio. Em uma das mais tradicionais casas de carnes de Porto Alegre, o Autor da ação concedeu uma entrevista cuja chamada dizia "Churrascaria Barranco recebe homenagem da AL e do Ministério Público por 45 anos de sucesso". Diante de um senhor alto, de olhos verdes, vestido em seu elegante terno, que o entrevistava, o autor disse: "Isso aqui vai bombar na Copa!". Por trás dele, homens se revezavam entre risadas e pedaços sangrentos de carne bovina mastigados por bocas já cheias. Espetos giravam e uma faca amolada cortava um pedaço de carne mal passada. O ambiente era bem diferente de um terreiro. Até porque, em terreiros, a comida segue princípios, tem finalidade sacral, deve ser respeitada e não pode ser desperdiçada. Não é o que acontece em churrascarias. Discussões constitucionais não raramente revelam lutas de classes, tramas ideológicas, guerras santas, batalhas políticas, revanches de derrotados ou um certo messianismo juvenil. Conhecer o contexto de alguns casos dá a paz de consciência necessária para, pelo menos, conhecer mais sobre a nossa comunidade e o duelo de forças que a move. É o caso do RE 494.601/RS. ANJ questiona controle acionário de sites por capital estrangeiro A Associação Nacional de Jornais - ANJ ajuizou a ADI 5613 tendo por objeto a fixação de interpretação conforme a Constituição da locução "empresas jornalísticas" constante dos arts. 2º, 3º, 4º e 5º da lei 10.610/2002. Referido diploma regulamentou o art. 222 da Constituição e dispôs "sobre a participação de capital estrangeiro nas empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens". Para a ANJ, o referido dispositivo se aplicaria aos portais da internet que operam no Brasil. A relatoria é do ministro Celso de Mello. Pedida suspensão dos casos sobre ISS sobre materiais empregados na construção civil, O Município de Betim/MG e a Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais Brasileiras - ABRASF, pediu à ministra Rosa Weber que, nos termos do CPC/2015, suspenda todos os processos que tramitem no território nacional quanto ao Tema 247 da Repercussão Geral - ISS sobre materiais empregados na construção civil -, versado no RE 603.497/MG. Ajuizada ADI contra majoração de 2% para 4% sobre taxas do preparo de apelação e de recurso adesivo do TJSP Ajuizada a ADI 5612 que visa derrubar o art. 4º, II, da lei 15.855/15 do Estado de São Paulo, que alterou a lei estadual 11.608/03, para majorar de 2% para 4% sobre o valor da causa, as taxas judiciárias relativas ao preparo de apelação e de recurso adesivo, ou, nos processos de competência originária do TJ/SP, como preparo dos embargos infringentes. A ação é do Conselho Federal da OAB. Questionado decreto que considerou telecomunicações como indústria O governador do Paraná ajuizou a ADPF 427 contra o art. 1º do decreto 640/1962, do Conselho de Ministros, que considerou o serviço de telecomunicações como indústria básica, de interesse para o fomento da economia do país e de relevante significado para a segurança nacional. Para o governador, o dispositivo é inconstitucional por representar ingerência da União sobre matéria exclusiva dos estados-membros, pois dispõe sobre atividade econômica que se encontra sob competência tributária das unidades da federação. Segundo ele, a CF deixou claro que a atividade econômica de telecomunicações enquadra-se como serviço. Dessa forma, é de competência dos estados e pode ser tributado pelo ICMS, que é estadual, e não pelo IPI, de competência da União. Há pedido de liminar no sentido de se suspender todas as ações que discutem a aplicabilidade do decreto 640/1962. O relator é o ministro Marco Aurélio. Substituído leading case sobre IR sobre os resultados financeiros verificados na liquidação de contratos de swap para fins de hedge O ministro Marco Aurélio, relator do RE 596.286/RJ, leading case do tema 185 da repercussão geral - IR sobre os resultados financeiros verificados na liquidação de contratos de swap para fins de hedge -, determinou que se oficie ao TRF da 2ª região para que este remeta à Presidência do STF, para substituição do paradigma, recursos extraordinários representativos do referido Tema 185, ou, não havendo processos, para informar a respeito. Destaque da Semana: União não precisa compensar municípios por desonerações de impostos de sua competência Na quarta-feira, o STF negou pedido do município de Itabi/SE para excluir benefícios, incentivos e isenções fiscais, concedidos pela União, dos repasses ao orçamento local. O RE 705.423/SE (min. Edson Fachin) pretendia que as desonerações de IR e IPI concedidos pelo governo federal não fossem computadas na cota do FPM destinado a Itabi. Apreciando o tema 653 da repercussão geral, por maioria e nos termos do voto do Relator, negou-se provimento ao RE, vencidos os ministros Luiz Fux e Dias Toffoli. O Tribunal deliberou fixar a tese da repercussão geral dia 23/11. Segundo o relator, o poder de arrecadar atribuído à União implica também o poder de isentar. Assim, quando a Constituição Federal determina que o FPM será composto pelo produto dos dois impostos, isso inclui o resultado das desonerações. De acordo com o inciso I do artigo 159 da Constituição Federal, a União deve entregar 22,5% do "produto da arrecadação" do IR e do IPI ao FPM. Tá na pauta: Quarta-feira Próxima quarta-feira, dia 23/11, estão pautados os seguintes casos tributários no STF: ADO 25/DF (min. Gilmar Mendes), do governador do Pará, com vários Estados participando como amici curiae, discutindo a eventual mora do Congresso Nacional em editar a lei complementar prevista no art. 91 do ADCT sobre compensação financeira aos Estados quanto ao ICMS desonerado nas operações de exportação; ACO 1044/MT (min. Luiz Fux), do Estado de MT contra a União, visando saber se é devida a ampliação na participação do total de recursos repassados pela União a título de compensação por perdas decorrentes da desoneração do ICMS incidente sobre produtos e serviços destinados ao exterior; e ACO 779/RJ (min. Dias Toffoli), do Estado do RJ x União: sobre compensações financeiras aos Estados em decorrência das desonerações das operações de exportação à luz da LC 87/96, LC 115/2002 e EC 42/2003. Global Constitutionalism A Corte Constitucional de Uganda reverteu o dispositivo que permitia que a Comissão de Iguais Oportunidades rejeitasse pedidos de providências de pessoas consideradas imorais ou socialmente inaceitáveis. O caso Jjuuko Adrian v Attorney General questionou a constitucionalidade da seção 15(6)(d) da lei que instituiu a Equal Opportunities Commission. A alegação era de que o dispositivo alcançava grupos vulneráveis, a exemplo das profissionais do sexo, algumas mulheres, pessoas que vivem com HIV e portadores de deficiências. A lei trazia tal dispositivo para evitar que membros da comunidade LGBTI ajuizassem pedidos de apuração de casos de discriminação. A ação vem sendo acompanhada nos últimos sete anos pelo ONG Human Rights Awareness and Promotion Forum (HRAPF). A vitória foi celebrada. Evento Acontecerá dia 23/11, às 18h30, no Salão Nobre do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o lançamento do livro "Novos Paradigmas do Direito Eleitoral", de autoria do ministro Luiz Fux e do jurista Carlos Eduardo Frazão. A publicação é da editora Fórum. Obter dictum No julgamento do caso relativo ao Fundo de Participação dos Municípios, o ministro Luís Roberto Barroso, sempre muito gentil, fez um breve contraponto a um dos argumentos do voto do ministro Luiz Fux, vencido na matéria. Respondendo, o ministro Luiz Fux afirmou: "Mas eu só discuto aqui o que é importante, ministro. Só o que é importante". Foi a deixa que o ministro Marco Aurélio precisava para questionar: "E o que não é importante no plenário da Suprema Corte? Aqui tudo é importante, ministro".
sexta-feira, 11 de novembro de 2016

Conversa Constitucional nº 14

Opinião: respostas constitucionais à vitória de Trump Donald Trump foi eleito presidente dos Estados Unidos. Imediatamente, choveu aulas aos estadunidenses, cá do Brasil e do mundo, sobre como deve ser uma verdadeira democracia. Alegou-se, primeiramente, que os eleitores eram culpados pelo resultado da eleição. Depois, que parte do resultado se deve ao fato de pessoas mais engajadas politicamente terem feito a diferença num cenário de voto facultativo. Duas obviedades. Não bastando, veio a crítica ao suposto eleitorado de Trump. Ele seria formado por pessoas empobrecidas, desempregadas, cidadãs e cidadãos sem esperança, idosos magoados, veteranos queixosos, uma classe trabalhadora angustiada, pessoas que não tiveram condições de persistir nos estudos e por aí vai vai. Pergunta-se: não teria sido, a democracia, feita exatamente para esse grupo? Ou seria, ela, o governo dos intelectuais, dos professores universitários influentes, dos veículos poderosos como o The New York Times, de artistas que vivem em conforto, dos institutos de pesquisas e outros? Quem é, de fato, o povo, senão essa massa que carrega nas costas a certeza de uma vida real e, não raramente, muito dura? O voto em Trump foi, pelo menos em parte, uma nova rebeldia, uma manifestação anti-establishment. Houve um tempo em que rebeldia era contrariar a Igreja. Isso porque, a Igreja, tendo montado suas pautas morais, espalhava seu séquito fiscalizando se o povo estava alinhado. Quem não estava era pecador, libertino, homem de pouca fé, ovelha desgarrada, herege, fariseu, excomungado, pagão, desvirtuado, falso profeta e tudo o mais. Viver era culpa e sacrifício. Apesar de todo o serviço prestado pela Igreja à sociedade, ainda assim, o véu um dia se rasgou. Pessoas precisam respirar, errar, cometer atos falhos. É assim que somos. Hoje, não é mais a Igreja que entra nas casas das pessoas simples impondo pautas morais e fiscalizando comportamentos. São as manipulações ideológicas da luta por direitos. Não os direitos em si, mas a manipulação ideológica feita sobre eles. Aqueles que são indiferentes a isso passam a suportar estigmas graves como os de serem xenófobos, homofóbicos, racistas, fascistas, nazistas, misóginos, opressores, agressores, conservadores, reacionários e tudo o mais. Trivializar adjetivos é uma tragédia pois, agora, canalhas podem passar impunes, já que as palavras não têm mais poder. Se alguém hoje chamar uma criança de herege, ela gargalhará. O mesmo acontecerá no futuro ao se chamar alguém de machista. E isso é horrível, porque há, entre nós, extremo machismo mas, banalizar isso, entendendo que, para ser machista, basta ter nascido homem, é um erro colossal. Além disso, esse autoritarismo moral foi tão longe a ponto de, por exemplo, exigir que anciãos de vilarejos rurais tivessem a mesma compreensão de mundo de jovens urbanos das universidades. Estigmatizou-se inocentes. Como é possível construir uma comunidade coesa assim? Marginalizar pessoas porque vestem suas filhas como princesas, comem carne, sacrificam carreiras pela criação das filhas e filhos, matam insetos, acreditam em Deus, aplaudem policiais ou cantam o Hino Nacional é machucá-las em convicções profundas. É impor o capricho de uns sobre os outros. Isso gera ressentimento. Quem lida com a implementação de direitos precisa ter mais empatia para perceber que somos uma comunidade. O correto é restaurar os laços sociais esgarçados. No Brasil, se a avó ou o avô de muitos de nós entrar numa universidade pública e disser numa assembleia estudantil o que acha de boa parte das pautas da nova geração provavelmente verá jovens urbanos, escolarizados e cosmopolitas defecando, urinando ou cuspindo nela ou nele. Acontece que ninguém se lembrou que essas pessoas têm emoções e que elas votam. Acuadas, elas se unem. União de massas machucadas e urna aberta têm sido o motor das democracias. Trump não foi eleito por um punhado de ordinários radicais. Em democracias, punhados não elegem presidentes. Uma parte considerável do eleitorado dos Estados Unidos encontrou alguém que, em seu narcisismo e estupidez retórica, catalisou toda a mágoa coletiva de parcela considerável do país. A ressaca deixa a lição de que o ciclo de conquista de direitos não pode se converter em uma guerra ideológica. Em guerras, vence o mais forte. Trump, com sua pouca deferência aos melhores escrúpulos, foi mais forte. Homenagem ao ministro Cezar Peluso Quarta-feira, dia 9/11, o STF homenageou, numa sessão solene, o ministro Cezar Peluso, aposentado em agosto de 2012. Coube ao ministro Celso de Mello, decano, fazer o discurso. O ministro lembrou que o primeiro voto do ministro Cezar Peluso no STF foi proferido no dia seguinte ao de sua posse, quando julgou o caso Ellwanger (HC 82.424/RS), processo em que a Corte proclamou ser o antissemitismo expressão odiosa de uma prática abominável: a prática do racismo. No voto que proferiu, o ministro Peluso foi enfático ao assinalar que "a discriminação é uma perversão moral, que põe em risco os fundamentos de uma sociedade livre". Governo de SP apresenta informações sobre ICMS softwares O governo do Estado de SP juntou informações na ADI 5576 (min. Roberto Barroso), ajuizada pela Confederação Nacional de Serviços, contra leis do Estado que instituem a incidência do ICMS sobre operações com programas de computador. Para a confederação, ao exigir o ICMS sobre as operações com softwares as leis incorrem em bitributação, criando nova hipótese de incidência do imposto, por já estarem arroladas no âmbito de incidência do ISS, conforme a LC 116/2003. Pede-se a declaração de inconstitucionalidade do art. 3º, II, da lei 8.198/1992 e dos decretos 61.522/2015 e 61.791/2016, todos do Estado de SP. Pende de análise, nesse caso, o pedido de ingresso como amicus curiae da Brasscom, Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação. Esgotamento de instâncias é condição da reclamação para aplicar decisão com repercussão geral A 2ª Turma do STF, julgando a Rcl 24.686/RJ (min. Teori Zavascki), entendeu que, nos casos em que se busca garantir a aplicação de decisão tomada em recurso extraordinário com repercussão geral, somente é cabível Reclamação ao STF quando esgotados os recursos cabíveis nas instâncias antecedentes. No caso, isso não ocorreu, pois houve interposição de recurso especial eleitoral ao TSE contra o acórdão do TRE/RJ. Para o ministro Teori Zavascki, a expressão "instâncias ordinárias", contida no dispositivo do CPC/2015, deve ser interpretada de forma restritiva, sob pena de fazer com que o Supremo, por meio de Reclamações, assuma a competência de pelo menos três tribunais superiores - STJ, TST, TSE -, para onde devem ser dirigidos recursos contra decisões de tribunais de segundo grau de jurisdição. Diferencial de alíquota de ICMS à optante pelo Simples Nacional A FECOMÉRCIO/RS, amicus curiae, apresentou memoriais ao RE 970.821/RS (min. Edson Fachin), de Jefferson Schneider de Barros & Cia Ltda - ME x Estado do RS, cujo tema 517 da repercussão geral trata da "aplicação de diferencial de alíquota de ICMS à empresa optante pelo Simples Nacional". Nesse caso, o relator, ministro Edson Fachin, indeferiu pedido de ingresso de amicus curiae e recusou o agravo por meio do qual se tentava recorrer da referida decisão. Para o ministro, "se trata de competência do relator admitir ou negar ingresso no feito de amicus curiae, assim como a petição referida considera-se recebida como memorial". Lei de Repatriação e FPE Um bloco de ações ajuizadas por estados diversos, a maior parte sob a relatoria, por prevenção, da ministra Rosa Weber, pede a destinação de receitas oriundas da Lei de Repatriação (lei 13.254/2016) para os cofres locais. Alega-se que a lei não cumpre o estipulado pela Constituição ao deixar de destinar a multa de 100% do imposto devido sobre os recursos repatriados ao Fundo de Participação dos Estados (FPE). Pelo pedido, a lei inclui nos recursos destinados ao fundo a alíquota de 15% de IR incidente sobre os valores, mas deixa de fora a multa. Isso contrariaria o conceito de "produto da arrecadação", conforme o artigo 159, I, da Constituição, que trata do FPE. Na terça-feira, dia 8/11, a presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, recebeu um grupo de governadores e representantes de 23 Estados e do Distrito Federal para tratar do assunto. São pelo menos 22 Estados questionando a legislação. As ações são: ACO 2941/DF; ACO 2931; ACO 2935/PB; ACO 2936/DF; e ACO 2943/RJ. Reconciliação fiscal A propósito, a presidente Cármen Lúcia participou na manhã da quinta-feira, dia 10/11, de reunião de secretários estaduais de Fazenda na ESAF, em Brasília. Entre os pontos abordados estão a guerra fiscal, a judicialização da saúde, as execuções fiscais e a proposta de súmula vinculante que trata do quórum do Confaz para aprovar benefício fiscal. Destaque da semana: Protesto de certidões de dívida ativa é constitucional O Plenário do STF julgou improcedente a ADI 5135, em que a CNI questionou norma que incluiu, no rol dos títulos sujeitos a protesto, as CDAs da União, dos Estados, do DF, dos municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas. Por maioria, entendeu-se que a utilização do protesto pela Fazenda para promover a cobrança extrajudicial de CDAs e acelerar a recuperação de créditos tributários é constitucional. O Plenário seguiu o voto do relator, ministro Luís Roberto Barroso, fixando a seguinte tese: "O protesto das certidões de dívida ativa constitui mecanismo constitucional e legítimo por não restringir de forma desproporcional quaisquer direitos fundamentais garantidos aos contribuintes e, assim, não constituir sanção política". Tá na pauta: quarta-feira (i) ADI 2545 (min. Cármen Lúcia), da CONFENEN: "FIES. Obrigação de aplicação do equivalente à contribuição de que trata o art. 22 da lei 8.212/91 na concessão de bolsas de estudo. Imunidade tributária: alcance e exigência de lei complementar. Condições para resgate antecipado de certificados junto ao Tesouro Nacional. Lei 10.260/2001"; (ii) ADI 2905 (min. Eros Grau), da CONSIF: "Competência legislativa. União. Normas para regularização da venda de títulos de capitalização e similares no Estado de MG. Matéria reservada à lei complementar. Lei Estadual 14.507". Colher-se-á o voto de desempate do ministro Gilmar Mendes; (iii) RE 593.068/SC (min. Roberto Barroso): "Servidor público Federal. Leis 9.783/1999 e 10. 887/2004. Saber se exigível contribuição previdenciária incidente sobre adicionais e gratificações temporárias, tais como 'terço de férias', 'serviços extraordinários', 'adicional noturno' e 'adicional de insalubridade'". O caso volta com o voto-vista da ministra Cármen Lúcia; (iv) ADI 4420 (min. Marco Aurélio), do PSOL: "Competência legislativa. União. Carteira de previdência das serventias não oficializadas da Justiça do Estado de SP: extinção. Lei 14.016/2010"; (v) ADI 3077 (min. Cármen Lúcia), da PGR: "Competência legislativa. Poder constituinte estadual derivado. Parecer prévio do Tribunal de Contas competência da Assembleia Legislativa para julgar as contas do Executivo estadual. Ministério Público Estadual. Recondução ao cargo de Procurador-Geral de Justiça. Limite para reinvestidura. Superintendência da polícia civil. Delegado de polícia. Constituição de Sergipe"; (vi) ADI 4070 (min. Cármen Lúcia), da ANAPE: "LC rondoniense 399/2007. Lei que cria e organiza a Procuradoria-Geral do Tribunal de Contas do Estado. Saber se houve descumprimento do art. 132 da Constituição. Saber se é constitucional a norma que autoriza a Procuradoria do Tribunal de Contas estadual a cobrar judicialmente as multas impostas em decisões definitivas do Tribunal". Tá na pauta: quinta-feira (i) RE 786.540/DF (min. Dias Toffoli): "Saber se é possível a aplicação da aposentadoria compulsória ao servidor público ocupante exclusivamente de cargo em comissão. Saber se é possível ao servidor público efetivo, aposentado compulsoriamente, vir a assumir cargos ou funções comissionadas"; (ii) RE 705.423/SE (min. Edson Fachin): "Saber se a concessão de benefícios, incentivos e isenções fiscais relativos ao IR e ao IPI podem ser deduzidos do valor devido aos municípios a título de participação na arrecadação dos referidos tributos"; (iii) ACO 758/SE (min. Marco Aurélio), de Sergipe: "Saber se os descontos do PIN e PROTERRA da base de cálculo do Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal - FPE caracterizam afronta à Constituição Federal, no seu art. 159". O caso volta com o voto-vista do ministro Gilmar Mendes; (iv) RE 592.891/SP (min. Rosa Weber), da União: "Saber se há direito ao creditamento do IPI na entrada de insumos provenientes da Zona Franca de Manaus adquiridos sob o regime de isenção". O caso volta com o voto-vista do ministro Teori Zavascki; (v) HC 119.775/DF (min. Marco Aurélio): "Extradição. Deferimento. Retirada do extraditando do território nacional. Alegação de descumprimento do prazo. Lei 6.815/1980, art. 86. Saber se existe constrangimento ilegal a ser sanado pela via do habeas corpus"; (vi) RE 553.710/DF (min. Dias Toffoli), da União: "Anistiado político. Pagamento retroativo de prestação mensal legalmente concedida. Alegação de ausência de disponibilidade orçamentária e de violação ao regime de precatórios. Lei 10.559/2002. Saber se é constitucional o pagamento imediato de reparação econômica a anistiados políticos". Global Constitutionalism O Bundesrat alemão, equivalente ao nosso Senado da República, requereu ao Tribunal Constitucional Federal que banisse o Partido Democrático Nacional da Alemanha (National Democratic party of Germany - NPD). O argumento é o de que o partido é racista, antissemita e constitui uma ameaça para a ordem democrática alemã. Dia 17/11, próxima quinta-feira, às 10h, será divulgada a decisão pelo Segundo Senado do Tribunal, baseado nos hearings ouvidos entre os dias 1, 2 e 3 de março de 2016, em Karlsruhe. Segundo o art. 21, seção 2, da Lei Fundamental, compete à Corte Constitucional esse tipo de julgamento. A Corte baniu, em 1952, o Socialist Reich Party (SRP) e, em 1956, o Partido Comunista da Alemanha (The Communist Party of Germany, KPD). Uma ação para banir o NPD já havia tramitado entre 2001 e 2003, mas o caso não teve seguimento devido a questões processuais. Evento Acontecerá dia 23/11, às 18h30, no Salão Nobre do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o lançamento do livro "Novos Paradigmas do Direito Eleitoral", de autoria do ministro Luiz Fux e do jurista Carlos Eduardo Frazão. A publicação é da editora Fórum. Obiter dictum No julgamento sobre a constitucionalidade dos protestos de CDAs, o ministro Luiz Fux pediu para seguir seu raciocínio, que havia sido interrompido pelo ministro Marco Aurélio. Antes que tivesse início uma discussão entre os dois, a presidente, ministra Cármen Lúcia, disse: "O regimento interno fala em 'casos vistos, relatados e discutidos', então nós temos que discutir para decidir. Está certinho". Foi quando o ministro Fux prosseguiu: "Então eu vou pedir para discutir de novo, senhora presidente". Novamente, foi interrompido pelo ministro Marco Aurélio: "Mas Vossa Excelência discute pouco". Respondendo sem dar muita importância, o ministro Fux disse: "É, eu discuto pouco".
segunda-feira, 31 de outubro de 2016

Os bastidores de Albie Sachs em Brasília

Poucos minutos após as 22h da quarta-feira, dia 26 de outubro, aquela mulher risonha, de pele morena e estatura mediana, com o seu cabelo curto escuro com discretas mechas claras, apareceu no portão 10 do Aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek, tendo, logo atrás, dela, um homem muito branco, mais velho, alto, usando chapéu panamá e vestindo suas conhecidas camisas estampadas sul-africanas parecidas com as de Nelson Mandela. Vanessa e Albie Sachs pisavam pela primeira vez em Brasília. Jamais tinham estado na capital. Juntos, eles passariam pouco mais de três dias cumprindo uma intensa agenda, que começaria dia seguinte, logo cedo, com uma fala na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, a convite do ministro Roberto Barroso, passando por uma conferência no IX Congresso Internacional de Direito Constitucional do IDP, a convite do ministro Gilmar Mendes, seguido do lançamento do livro "Vida e Direito: Uma Estranha Alquimia" e, ao final, já à noite, um encontro com o presidente da República e seu staff, para receber a comenda Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul, na qualidade de "comendador". Foi exatamente no mais protocolar evento do qual participou que Albie mostrou a sagacidade de sua alma de revolucionário. Na presidência da República, após longas horas envolvido com rigorosos protocolos palacianos, eu lhe disse que ele não deveria se sentir obrigado a jantar conosco, afinal de contas, aquela quinta-feira havia sido exaustiva. "Você está livre, Albie". Sem titubear, ele levanta o braço esquerdo e o que restou do direito: "Livre? Sim, finalmente livre! Eu estou livre! Viva! Viva!", falou, como fazia após ser libertado das prisões, enquanto caminhava sacudindo os braços para cima, ao lado do staff do Planalto, que gargalhava com a espontaneidade daquele ilustríssimo homenageado. Dia seguinte, sexta-feira, a jornada continuou. Logo cedo, ele falou numa sala abarrotada de estudantes no IDP e, em seguida, fez uma nova rodada de autógrafos do seu livro, cuja apresentação coube ao ministro Gilmar Mendes. Foi a terceira em menos de 24 horas. A primeira havia sido no próprio STF, na presença dos ministros Roberto Barroso, Edson Fachin, Rosa Weber e Carlos Ayres Britto, além da pequena multidão que lotou o plenário da Primeira Turma ouvindo-o falar e trazendo o livro em suas mãos. Na sala de aula, perguntado por um estudante muito jovem sobre o que achava das homenagens que recebia, mais uma vez a alma do revolucionário aflora: "Agora eu sou Comendador! Mais respeito, por favor!", disse em português, fazendo a juventude que o ouvia gargalhar e cair de amor por ele. À tarde, no Salão Nobre do Supremo, exausto, Albie tirou um cochilo de meia hora deitado num dos sofás imperiais, enquanto jornalistas, produtores e editores preparavam o ambiente. Com a cabeça no colo de Vanessa, que acariciava seus cabelos, aquele homem de mais de 80 anos se preparava para mais uma entrevista, dessa vez para o programa Ciência Sem Fronteiras, da TV Justiça. Assim como fizera antes, iniciaria falando em português para, bem depois, passar a desenvolver suas ideias em inglês, sua língua-mãe. No sábado, quem apareceu em sua viagem foi um dos seus heróis: Oscar Niemeyer. Albie tentou, de todas as formas, encontrar um livro em inglês que tratasse do arquiteto, sua obra e legado. Andamos em todas as livrarias da cidade. Nada à altura foi encontrado. "Frustrante", desabafou. Depois, convencido de que em Minas Gerais, Rio de Janeiro ou São Paulo, para onde seguiria, teria melhor sorte, Albie soube que há críticas a Niemeyer no sentido de que seus prédios não são funcionais. Ele, contudo, não se impressionou com os ataques. "Geoffrey Bawa, arquiteto do Sri Lanka que compôs o júri que escolheu o projeto da Corte Constitucional da África do Sul, certo dia me disse que beleza também é uma das funções de um prédio", justificou em defesa do seu herói. E foi exatamente pela arte de Oscar Niemeyer que Albie Sachs teve sua mais profunda experiência nessa temporada. Sábado, fazendo um passeio turístico pela cidade, parou diante da Catedral de Brasília, ou Catedral Metropolitana Nossa Senhora Aparecida. Sendo ele um homem que não abraça fortemente qualquer religião, não viu nada de mais na entrada. Então, atravessou o pequeno corredor que dá acesso ao recinto sem dar atenção às pessoas que gritavam "água, água", tentando vender algo para os visitantes. Cruzando a porta, imediatamente tirou o chapéu. Sua face mudou. Caminhando lentamente até o centro, sorria sozinho, enquanto olhava para cima e via os três anjos - Miguel, Gabriel e Rafael - pendurados por cabos de aço. Cantos de pássaros penetravam o ambiente como se estivéssemos numa floresta. A Catedral, iluminada pela luz do sol, mostrava magnificência. Albie pôs seus ouvidos sobre as paredes, passou as mãos sobre elas, tocando-as, demonstrando profundo respeito pela construção. Olhando para cima, viu os espelhos d'água refletidos nos vitrais com desenhos coloridos. A luz natural, combinada com os reflexos da água e enriquecida pelos cantos dos pássaros faziam sua face resplandecer. Ele caminhou de um lado para o outro, segurando, com o seu único braço, o chapéu. Seus olhos fitavam o recinto. Depois de cruzar de volta o corredor de entrada, driblando vendedores que tentavam negociar água ou imagens de Brasília, aquele homem que não pratica ativamente qualquer religião se sentou no ônibus do passeio. Suspirando, disse: "Eu devo confessar: eu fiz uma homenagem secular a Deus. O que eu senti dentro daquela catedral é algo transcendente". Pergunto-lhe se havia sido, então, a melhor experiência em Brasília. "Não só de Brasília. De toda a minha vida", responde. Albie Sachs provou, repetiu e elogiou o nosso café. "É melhor do que o café americano". Também comeu coxinha de frango. Já Vanessa preferiu aventuras mais suculentas. "Waw, hum, waw...", murmurava, enquanto os garçons se revezavam exibindo os espetos de carne que os rodízios brasileiros gostam de exibir. A cada espeto, boa parte da carne ficava em seu prato. Cordeiro foi o seu favorito. Já quanto ao brigadeiro, como sobremesa, preferiu não abusar. "É muito doce, não?", perguntava, enquanto terminava de comer mais um. Nas casas por onde passou, Albie manteve viva a regra que aplica em seu bangalô, na praia de Clifton, na Cidade do Cabo. Ficou de meias, com os sapatos deixados logo na porta de entrada. Também manteve inquebrantável seu compromisso com a diversidade, que consta do preâmbulo da Constituição da África do Sul. Chamou a sua atenção as fotos dos presidentes que viu no Palácio do Planalto. "Homem branco, homem branco, homem branco, homem branco..., eu olho e não vejo o Brasil que o mundo conhece", disse. No sábado, dentro do elevador da Torre de TV de Brasília, espremido pelos populares que faziam seus passeios, ele cochichou: "Esse, sim, é o Brasil da diversidade". A estada de Albie e Vanessa em Brasília contou com alguns improvisos, com agendas, compromissos e horários alterados. "Parece uma desorganização muito organizada", disse numa de suas falas a estudantes, provocando gargalhadas. "Mas, no final, tudo dá certo", emendou. Já perto de encerrarmos o passeio do sábado, diante do Memorial Juscelino Kubitschek, enquanto Albie posava para fotos tendo o monumento em forma de foice ao fundo, Vanessa, deitada na grama do outro lado da rua, checava as fotos em seu celular. Um casal simples. Por isso mesmo, tão elegante. À noite, em sua quarta rodada de autógrafos, dessa vez para um grupo de intelectuais e juristas, Albie disse que estar em Brasília provocou nele emoções muito intensas, e que muito do que ele acredita vem de idealistas da América do Sul, como Gabriel García Márquez, Jorge Amado e Oscar Niemeyer. Domingo, dia 30 de outubro, às 8h, o casal caminhava apressado rumo ao portão de embarque no Aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek. Dali seguiriam para Belo Horizonte, depois Rio de Janeiro e, então, São Paulo, destino final antes do retorno à África do Sul. Conversavam entre eles, com Vanessa rindo e Albie enamorando-a. Ela, uma arquiteta apaixonada por liberdade. Ele, um guerreiro da liberdade apaixonado por arquitetura. Quando os companheiros do ANC enviaram um bilhete prometendo vingar o atentado que Albie sofrera e lhe custou um braço e a visão de um olho, ouviram uma imediata resposta: "Vingar-me? Vocês vão matar pessoas? Vão arrancar os seus olhos? Vão cortar os seus braços? Não! Se vivermos juntos numa África do Sul democrática, eu terei a minha vingança suave e rosas e tulipas florescerão no meu braço decepado". Ele estava certo. A mensagem poderosa deixada por esta grande figura pública tocou as mentes e os corações daqueles que, em Brasília, puderam ouvir um pouco da compreensão de mundo profundamente transformadora que Albie Sachs acredita e pratica. E, dessa mensagem, florescerão as rosas e tulipas que um dia ele anteviu nascer da sua própria dor e sofrimento. Assim ele muda o mundo por onde passa. E esse é o seu grande legado. Um legado que, agora, é nosso também.
segunda-feira, 24 de outubro de 2016

Conversa Constitucional nº 13

Opinião: Barbárie prisional e os "danos constitucionais" Com um exemplar da Constituição Federal nas mãos, a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, fez, na última sexta-feira, uma "visita surpresa" a cadeias do Rio Grande do Norte. Em Mossoró, visitou um presídio Federal. Tudo em ordem. Já no presídio feminino de Parnamirim, disse faltar "condições mínimas de execução da pena". Viver a verdade é uma experiência mais intensa do que simplesmente conhecê-la. Todavia, há mais desafios à presidente. Não tão longe dali, em Pernambuco, no bairro do Sancho, na Zona Oeste do Recife, há o "complexo do Curado", maior unidade carcerária do país, com mais de 7.000 detentos onde deveriam estar menos de 1.800. Foi de lá que partiram os vídeos gravados por celulares de prisioneiros reproduzidos recentemente pelo Fantástico. Neles, presos travavam lutas sangrentas. É o "MMA das cadeias". A regra, segundo eles mesmos, é lutar "até o último suspiro, até a enfermaria". As imagens mostram uma multidão de encarcerados vibrando, em êxtase, a pulsão sádica de uma violência sem limites. Enquanto os prisioneiros se atracam no chão, as apostas são feitas. Presos endinheirados patrocinam os lutadores. Há também a briga de facões. Se, no murro e no chute, o resultado é a barbárie, imagina com facões. Essa espécie de Clube da Luta da vida real expõe a miséria humana cuja dignidade restou degradada. É a selvageria do nosso tempo. Os poucos agentes penitenciários que lá estão não interferem. Não são loucos. Os "chaveiros" - que são prisioneiros - ficam com as chaves dos pavilhões. Ao lado do complexo do Curado, há residências, escolas e comércios. Em junho, a cadeia recebeu a inspeção da comitiva da Organização dos Estados Americanos (OEA), formada por juízes da Corte Interamericana de Direitos Humanos. A Corte já havia requerido que o Brasil tomasse medidas para garantir a integridade física dos presos. Segundo uma das denúncias, um detento homossexual recebeu como "sanção" de outros presos passar por estupro coletivo numa cela de isolamento com mais de 30 detentos. Com o estupro, contraiu HIV. Não sei se o inferno é real. Mas, se ele existir, não pode ser pior do que o complexo do Curado. A jurisprudência do Supremo, responsabilizando o Estado pelo colapso dos presídios, teve seu ápice com a emblemática ADPF 347, por meio da qual se reconheceu o "estado de coisas inconstitucional". Não tardará ao Tribunal começar a receber pedidos de condenação em "danos constitucionais" (constitutional damages). Na África do Sul, a Corte Constitucional tratou pela primeira vez do assunto no caso Foe (1997 3 SA 786). Apesar de não tê-lo aplicado, definiu-se que, quando a violação a direitos humanos passa a assumir a forma de delito persistente, a concessão de altos valores como dano constitucional em acréscimo ao dano tradicional (moral e material) assume o papel de punitive damages, cuja pretensão é dar exemplo a quem, insistentemente, viola direitos: nesse caso, o Estado. Danos constitucionais vindicam o próprio direito fundamental violado, visando a deter e prevenir infrações futuras pelos órgãos estatais. São controvertidos em sua essência e sua aplicabilidade no Brasil também. Contudo, do jeito que a coisa vai, pode ser algo que a presidente do Supremo, com a Constituição nas mãos, será chamada, ao lado dos seus pares, a considerar. Não deve demorar. Descriminalização dos jogos de azar Não é incomum, no Brasil, temas submetidos ao debate legislativo terminarem sendo definidos pelo Supremo. Os jogos de azar e sua capitulação como contravenção penal é a bola da vez. No Congresso Nacional, tramita o projeto de lei 186/2014, de autoria do senador Ciro Nogueira, dispondo sobre a exploração de jogos de azar e definindo as infrações administrativas e os crimes em decorrência da violação das regras concernentes à sua exploração. Mesmo assim, o STF já tem votos suficientes reconhecendo a repercussão geral do tema 924 trazido pelo RE 966.177/RS (min. Luiz Fux), cujo debate toca à recepção, ou não, pela Constituição, do art. 50 do decreto-lei 3.688/1941, reintroduzido pelo decreto-lei 9.215/46, que prevê a contravenção penal do jogo de azar. Uma eventual não-recepção pode implicar na opção estatal, no plano administrativo, de não tornar legal a atividade, sem que tal opção, contudo, alcance a esfera penal. A recepção de dispositivos da Lei de Contravenções Penais foi analisada no RE 583.523/RS (min. Gilmar Mendes), descriminalizando a posse não justificada de instrumento de emprego usual na prática de furto (artigo 25 do decreto-lei 3.688/1941). Também no reconhecimento do tema 857 da repercussão geral com o RE 901.623/SP (min. Edson Fachin) sobre o uso de "arma branca". Essa tendência da Corte em descriminalizar condutas, também foi sentida no julgamento do RE 635.659/SP (min. Gilmar Mendes), aferindo a constitucionalidade art. 28 da lei 11.343/2006 que trata, dentre outras coisas, do uso pessoal de maconha. Seguindo essa tendência, não tardará para a Corte admitir discutir, como tema da repercussão geral, a descriminalização de quem opera as chamadas rádios irregulares. É o renascimento de uma espécie de jurisprudência das liberdades. Inimigo da Corte Tem sido lugar comum ouvir ministros do Supremo questionando o grau de lealdade de amici curiae que se apresentam perante o Tribunal. Não raramente usa-se expressões fortes como "inimigos da Corte". Essa semana, o ministro Marco Aurélio recusou três iniciativas de amigos da Corte. No RE 594.435/SP (Tema 149), indeferiu o ingresso. O caso trata do alcance do art. 114 da Constituição considerado conflito a envolver a complementação de proventos e de pensões, disciplinada por lei estadual, e a incidência da contribuição previdenciária. No RE 570.122/RS, o ministro entendeu não caber recurso contra o ato mediante o qual o relator decide sobre a admissibilidade, ou não, de amicus curiae. Por fim, no RE 566.622/RS, o ministro recusou a admissão ao Aeroclube do Rio Grande do Sul Escola Aeronáutica Civil. Não está sendo fácil. Semana intensa para os tributaristas A semana foi agitada quanto a teses tributárias no Supremo. Na terça-feira, o ministro Dias Toffoli recebeu, em audiência, procuradores da Fazenda Nacional para tratar das teses relativa à isenção de Cofins às sociedades civis de profissões regulamentadas (RREE 377457/PR e 381964/MG) e o caso sobre alargamento da base de cálculo e majoração da alíquota da COFINS pela MP 135/2003 convertida na lei 10.833/2003 (RE 570.122/RS). Dia seguinte, a procuradora do município de Belo Horizonte esteve com o ministro Roberto Barroso tratando do RE 603.136/RJ (Tema 300: ISS sobre os contratos de franquia). Nesse dia, o ministro Dias Toffoli recebeu colegas advogados tratando do referido RE 570.122/RS. Quinta-feira, o ministro Dias Toffoli recebeu representantes da Fiesp tratando do RE 946.648/SC, cuja tese 906 cuida do IPI na saída do estabelecimento importador de mercadoria para a revenda, no mercado interno, considerada a ausência de novo beneficiamento no campo industrial. Foi uma semana inteiramente dedicada a temas tributários na Corte. Suspensão Nacional O ministro Edson Fachin determinou a suspensão nacional de todos os casos que tratem do tema 160 da repercussão geral: "Contribuição previdenciária sobre pensões e proventos e militares inativos entre a EC 20/98 e a EC 41/2003". A medida se deu no RE 596.701/MG, liberado para inclusão em pauta desde 1º/12/2015. Destaque da semana I Semana intensa na Corte. No RE 570.122/RS, o min. Marco Aurélio, relator, entendeu que a tributação da Cofins pela MP 135/2003, convertida na lei 10.833/2003, não poderia ter sido introduzida por medida provisória, e enxergou violação ao princípio da isonomia. Em seguida, veio cinco votos contrários (ministros Luís Roberto Barroso, Teori Zavascki, Rosa Weber e Luiz Fux). O julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Dias Toffoli, relator de outro recurso que trata do PIS de empresas prestadoras de serviço. Outro desfecho foi a suspensão, por pedido de vista do ministro Ricardo Lewandowski, dos embargos opostos ao RE 400.479/RJ, sobre incidência de PIS/Cofins sobre a atividade das seguradoras. Os embargos são contra acórdão que confirmou decisão do relator, ministro Cezar Peluso (aposentado), no sentido do provimento parcial ao recurso somente para excluir da base de incidência do PIS/Cofins receita estranha ao faturamento da seguradora. O ministro Marco Aurélio, em voto-vista, acolheu os embargos. Em seguida, o ministro Ricardo Lewandowski pediu vista por ter, sob sua relatoria, o RE 609.096/RS, com repercussão geral, que trata da incidência do PIS/Cofins sobre receitas financeiras das instituições bancárias. Por fim, a Corte recusou os embargos de declaração que pretendiam modular os efeitos da decisão que, numa linha contrária ao que dispunha súmula do STJ, revogou a isenção de COFINS concedida às sociedades civis de profissão regulamentada. Os embargos, opostos aos RREE 377457/PR e 381964/MG (min. Rosa Weber), traziam uma interessante discussão relativa ao quórum necessário à modulação em caso de mudança de jurisprudência. Todavia, a rejeição pura e simples dos embargos prejudicou essa discussão. Destaque da semana II Nessa intensa semana, o STF fixou ainda duas teses tributárias com repercussão geral. No RE 838.284/SC (min. Dias Toffoli), a tese foi: "Não viola a legalidade tributária a lei que, prescrevendo o teto, possibilita o ato normativo infralegal fixar o valor de taxa em proporção razoável com os custos da atuação estatal, valor esse que não pode ser atualizado por ato do próprio conselho de fiscalização em percentual superior aos índices de correção monetária legalmente previstos". O pedido de modulação foi rejeitado. A segunda foi firmada no RE 704.292/PR (min. Dias Toffoli): "É inconstitucional, por ofensa ao princípio da legalidade tributária, lei que delega aos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas a competência de fixar ou majorar, sem parâmetro legal, o valor das contribuições de interesse das categorias profissionais e econômicas, usualmente cobradas sob o título de anuidades, vedada, ademais, a atualização desse valor pelos conselhos em percentual superior aos índices legalmente previstos". Também foi indeferido o pedido de modulação. Tá na pauta: quarta-feira Volta a julgamento na próxima quarta-feira (26/10), com o voto-vista do ministro Ricardo Lewandowski, os recursos relativos à aposentadoria pelo regime geral da previdência social e o retorno à atividade pelo mesmo regime. Também quanto à renúncia ao benefício previdenciário e a concessão de nova aposentadoria sem a devolução dos valores recebidos. A primeira discussão consta do RE 381.367/RS (min. Marco Aurélio), que conta com o voto do relator dando provimento ao recurso e dos ministros Dias Toffoli e Teori Zavascki negando. O segundo, apreciado em conjunto, é o RE 661256/DF (min. Roberto Barroso), cujo relator deu provimento integral tendo sido acompanhado pelos ministros Teori Zavascki e Dias Toffoli. Há, por fim, o RE 827.833/SC (min. Roberto Barroso), sobre renúncia à benefício, nova aposentadoria, aposentadoria por tempo de contribuição e aposentadoria por idade urbana (art. 18, § 2º, da lei 8213/91). Na sequência, vem a ADI 2545/DF (min. Cármen Lúcia) sobre o FIES e a obrigação de aplicação do equivalente à contribuição de que trata o art. 22 da lei 8.212/91 na concessão de bolsas de estudo. Também se discute a imunidade tributária e o alcance e exigência de lei complementar. Por fim, as condições para resgate antecipado junto ao Tesouro Nacional. Tá na pauta: quinta-feira Dia 27/10, está na pauta a ADI 5062/DF (min. Luiz Fux), submetendo o ECAD à fiscalização do Ministério da Cultura. Mantendo a lei atacada em vigor e abrindo espaço à transparência já votaram seis ministros (Luiz Fux, Edson Fachin, Roberto Barroso, Teori Zavascki, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia). O caso retorna com a vista do ministro Marco Aurélio. A ADI 5065/DF será apreciada conjuntamente. No mesmo dia, uma questão de ordem interessante será apresentada pelo ministro Roberto Barroso no RE 584.247/RR, relativa à necessidade de temas anteriormente reputados com repercussão geral possam, agora, passar por uma nova análise pelo pleno da Corte e, eventualmente, terem cassado esse reconhecimento da repercussão geral. Por fim, o RE 693.456/RJ (min. Dias Toffoli), sobre saber se é válido o desconto em folha de pagamento de servidores públicos dos dias não trabalhados pela adesão ao movimento grevista. O caso volta com o voto-vista do ministro Roberto Barroso, após o relator ter conhecido parcialmente do recurso e, nessa parte, ter dado provimento e o ministro Edson Fachin também ter conhecido parcialmente, mas para negar-lhe provimento. Global Constitutionalism Enquanto o Brasil segue debruçado, depois do estrago feito, sobre se o certo é controlar as contas públicas ou tocar-lhes fogo, a Venezuela já matou essa questão. Literalmente. A Suprema Corte do país permitiu que o presidente Nicolás Maduro implemente o orçamento nacional de 2017 sem se submeter ao Congresso, como determina a Constituição. Isso porque, na Assembleia Nacional, o presidente encontraria oposição. Preferiu fazer sem ela. Numa heterodoxia hermenêutica, a Suprema Corte determinou que o presidente submeta a proposta orçamentária à ela, Corte, e não ao Congresso. Um dos fundamentos para a peripécia foi o de garantir "a ordem constitucional". A proposta orçamentária de Maduro viola a Lei Anual de Endividamento e, mesmo assim, entrará em vigor. Se, antes, faltava o que comer, imagina agora. Evento Como as novas tecnologias influenciam o Direito Constitucional? Qual o impacto da Internet na Constituição Brasileira? O que se espera do Direito na era Digital? Para responder essas e outras perguntas, o XIX Congresso Internacional de Direito Constitucional do IDP contará, nesse ano, com a participação de renomados especialistas em Direito e Internet. Entre os palestrantes, Albie Sachs, ativista e ex-Juiz da Corte Constitucional da África do Sul, que lançará sua obra "Vida e Direito: Uma Estranha Alquimia". Os participantes terão acesso a 15 painéis, atividades paralelas, grupos de trabalho, trilhas temáticas, distribuídos nos três dias de evento (de 26 a 29.10). Inscrições aqui. Obiter dictum Julgando a ADI 3745, que atacava lei do estado de Goiás que estipulava uma cota para nepotismo, permitindo-se empregar o cônjuge e mais dois parentes, o ministro Dias Toffoli, sem se aguentar, declarou sua inconstitucionalidade, já aos risos. Foi quando o ministro Marco Aurélio perguntou: "Vossa Excelência não propõe a modulação não, né?". A pergunta deu a deixa para a ministra Cármen Lúcia emendar: "Modulação nos efeitos ou no número de parentes?". Até o então presidente, Joaquim Barbosa, explodiu em gargalhada.
sexta-feira, 14 de outubro de 2016

Conversa Constitucional nº 12

Opinião: sem precisar, STF toca em questões sobre o MMA Em 1997, enquanto a Suprema Corte bania a "Farra do Boi", de Santa Catarina, ao julgar o RE 153.531, o ministro Francisco Rezek anteviu o amanhã: "Há uma prática abertamente violenta e cruel para com os animais, e a Constituição não deseja isso", disse. O ministro abrangeu "animais", dando espaço para que, quase 10 anos depois, a Corte banisse as brigas de galos ao julgar a ADI 2514, firmando um precedente que foi aplicado, em 2011, à ADI 1856, do Estado do Rio de Janeiro. Neste último, foi o ministro Ricardo Lewandowski quem abriu caminho: "(...) há um movimento mundial nesse sentido. Proibiram-se, agora, as touradas em Barcelona", anotou. Era a sinalização da chance de um novo precedente. E ele veio. Há poucas semanas, o STF baniu as vaquejadas, ao julgar a ADI 3963, a partir de uma lei do Ceará. Durante a deliberação, o ministro Luiz Fux, sem pretender, abriu outro debate. Faixa-preta de jiu-jitsu há mais de 25 anos e praticante de artes marciais há mais de 30, o ministro foi homenageado, há dois anos, pela Comissão Atlética Brasileira de MMA (CABMMA). Ele falou: "Há esportes de confronto regulados pela lei que se encartam dentro da autorização do titular do bem jurídico ofendido, os esportes de contato, em geral. (...) São esportes que são engendrados por seres humanos, e são regulados, mas com regras que levam a que não se ultrapasse os limites da razoabilidade". Dando sequência ao julgamento, o ministro Teori Zavascki, também sem intenção, terminou contrapondo: "Tenho horror a tratamentos cruéis também a humanos. (...) Até hoje, para mim, é chocante certos esportes entre humanos, como é o caso dessas lutas de MMA, ou lutas de boxe. Pode-se dizer que, em eventos dessa natureza, em esportes dessa natureza, pelo menos entre humanos, há um consentimento de participação, mas é um consentimento que importa, de certo modo, em abrir mão de um direito inalienável, que é o direito à integridade física", disse. Vale perguntar: seria, o MMA, ou a sua transmissão pela tevê, indevida? Há quem diga que sim. O deputado Federal José Mentor (PT/SP) é uma dessas pessoas. Ele é autor do projeto de lei 5.534/2009, que proíbe a transmissão de lutas de MMA na tevê, visando "coibir a naturalização de ações violentas e brutais na televisão". O Estado de Nova Iorque, nos Estados Unidos, passou a admitir as lutas somente em março desse ano. Até então, elas estavam banidas. Falava-se de uma "natureza brutal e potenciais associações com violência doméstica e homofobia". Na França, o esporte profissional é proibido. Na Alemanha, contudo, a Corte Administrativa de Munique declarou, ano passado, a inconstitucionalidade da vedação imposta à Autoridade de Mídia do Estado da Baviera quanto à transmissão das lutas. Tudo isso mostra que a troca de impressões em julgamentos colegiados constitui um precioso material a partir do qual se é possível fazer prognósticos. Disposições constitucionais como a da dignidade da pessoa humana, da integridade física e do dever da família, da sociedade e do Estado de colocar a criança, o adolescente e o jovem, a salvo de toda forma de violência e crueldade, dão base para que a Corte possa, no futuro, ser convidada a tratar de aspectos relativos ao MMA, uma discussão complexa. Hoje, soa precipitado. Assim como parecia um exagero, em 2011, por um comentário do ministro Lewandowski sobre touradas, supor o banimento das vaquejadas no Brasil. E deu no que deu. Presidência a mil A semana foi corrida para a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia. Na terça-feira, a presidente esteve em audiência com o governador da Bahia, Rui Costa, e com a senadora Kátia Abreu, além de, ao lado do presidente da República, Michel Temer, para assinar o Acordo de Cooperação Técnica com o TSE. Ontem, quinta-feira, foi a vez do ministro da Defesa, Raul Jungmann e da governadora de Roraima, Suely Campos. Hoje, sexta-feira, a presidente encerra a semana recebendo em seu gabinete o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. FECOP paranaense A Assembléia Legislativa do Estado do Paraná apresentou informações relativas à ADI 5589, ajuizada pela Associação dos Fabricantes de Refrigerantes do Brasil (Afrebras), com pedido de liminar, contra a lei 18.573/2015, do Paraná, que instituiu o Fundo Estadual de Combate à Pobreza (Fecop) composto, dentre outros recursos, da receita advinda do aumento de dois pontos percentuais na alíquota de ICMS de produtos e serviços supérfluos, entre os quais refrigerantes, bebidas isotônicas e energéticas, conforme legislação sobre o tema. Plenário Virtual Tributário I Estará em votação até dia 20/10 a repercussão geral do tema 923: "Efeito repristinatório pela declaração de inconstitucionalidade dos incisos I e II do art. 25 da lei 8.212/91 alterada pelas leis 8.540/92 e 9.528/97". O relator é o ministro Dias Toffoli que já votou pela ausência de índole constitucional da matéria, tendo sido acompanhado pelo ministro Ricardo Lewandowski. O caso é tratado pelo RE 959870/PR e a discussão toca na contribuição previdenciária sobre a comercialização da produção rural e do empregador rural pessoa física. Plenário Virtual Tributário II Também está no Plenário Virtual o tema 922, quanto a desligamento de associado condicionado à quitação de débitos e/ou multas, tratado pelo RE 820.823/DF, sob a relatoria do ministro Luiz Fux. Até agora, já há três votos pela repercussão geral e um contra. A votação segue até dia 20/10. Destaque da semana Teve início o julgamento do RE 593.849/RJ, cujo tema, com repercussão geral, versa sobre à restituição de valores pagos a mais pelo contribuinte em regime de substituição tributária do ICMS. Após o elogiado voto do ministro Edson Fachin, o julgamento foi suspenso, devendo retornar na sessão extraordinária convocada para a manhã da quarta-feira. O caso tem mais de 1,3 mil processos suspensos na origem. A tese proposta pelo ministro Fachin foi a seguinte: "De acordo com o artigo 150, parágrafo 7º, da Constituição Federal, há direito à restituição do imposto pago antecipadamente sempre que o fato gerador presumido não se concretize empiricamente, o que se dá nas hipóteses em que o fato gerador definitivo se realiza de forma distinta daquela tributada na etapa inicial do ciclo produtivo". O ministro também propôs que os efeitos da decisão se restrinjam às ações judiciais pendentes e aos casos futuros, após a fixação do entendimento, a fim de permitir o realinhamento das administrações tributárias. Antes do julgamento desse caso, o STF definiu que o ICMS incide sobre a assinatura básica mensal de telefonia (RE 912.888/RS). Por 7 x 2, prevaleceu a seguinte tese: "O ICMS incide sobre a tarifa de assinatura básica mensal cobrada pelas prestadoras de serviços de telefonia, independentemente da franquia de minutos concedida ou não ao usuário". Tá na pauta Dia 20/10, quinta-feira, o pleno do STF traz os seguintes casos tributários em sua pauta: (i) RE 570.122/RS (min. Marco Aurélio): Saber se constitucional a ampliação da base de cálculo e da majoração da alíquota da COFINS instituída pela lei 10.833/2003, resultante da conversão da MP 135/2003; (ii) ED no RE 400.479/RJ (min. Marco Aurélio): Saber se receitas decorrentes das atividades das empresas de seguro estão sujeitas à exação da contribuição social para o PIS E COFINS; (iii) RE 605.506/RS (min. Rosa Weber): Saber se o IPI pode compor a base de cálculo das contribuições PIS e COFINS recolhidas pelas montadoras de veículos em regime de substituição tributária. Global Constitutonalism A Suprema Corte dos Estados Unidos manteve decisão inferior a respeito do uso policial de taser contra o qual pendia uma acusação de ter sido utilizado de maneira inconstitucional em razão do uso excessivo da força num caso envolvendo um homem mentalmente doente que faleceu após ter sido alvejado com choques da arma cinco vezes em dois minutos. Segundo a corte inferior, houve, de fato, uso abusivo da arma. Os juízes da Suprema Corte se recusaram a ouvir o recurso da fabricante do equipamento. Evento O professor Marcelo Novelino fará uma participação no Grupo de Estudos Constitucionalismo Fraternal, coordenado pelo ministro Carlos Ayres Britto, no dia 20/10/2016, à partir das 11h30, na sala 3006, localizada no Térreo do bloco 3 do UniCeub em Brasília. Novelino falará sobre "A eficácia obrigatória dos precedentes do STF ante a sistemática do Novo CPC". Imperdível. Obiter dictum Durante o julgamento que baniu as vaquejadas, o ministro Luiz Fux, amante das artes marciais, fez uma analogia entre a prática e os esportes de contato. O ministro Luís Roberto Barroso, que acabara de pedir vista, segurando o riso, não se aguentou: "Eu achei interessante a analogia com os esportes de contato onde, realmente, há uma, digamos, autorização do contendor, mas, aqui, no caso do boi, eu teria dificuldade em aplicar a analogia". A ministra Rosa Weber, rindo para não chorar, tomou partido pelo boi e emendou: "Coitado!".
terça-feira, 11 de outubro de 2016

Conversa Constitucional nº 11

Opinião: fim das vaquejadas traz falhas teóricas Por 6 x 5, a Suprema Corte pôs fim às vaquejadas, entendendo que elas, necessariamente, acarretam tratamento cruel aos animais, violando à Constituição Federal. O voto do ministro Luís Roberto Barroso, um dos mais influentes, citou o filósofo australiano Peter Singer, em sua obra "Libertação Animal", de 1975, onde ele desenvolve o raciocínio do filósofo inglês Jeremy Bentham, segundo o qual, o compromisso ético entre os seres não vem da capacidade de raciocinar ou falar, mas de sentir dor. Na versão mais recente da obra, contudo, Singer diz que demandas formuladas na base do "tudo ou nada" na defesa dos animais não conquistaram a maioria em nenhum país. Contrariamente, o número de animais que sofrem continuou crescendo. "Os avanços resultaram do trabalho de pessoas que abriram um caminho entre a mentalidade do 'tudo ou nada' que efetivamente significava 'nada' no que tange aos animais", revelou o filósofo. Outro equívoco foi comparar, em teoria, baratas e camundongos a minorias sociais. O combate à crueldade com os animais não equivale ao movimento contra a escravidão, à luta pelo empoderamento das mulheres, às marchas pelo fim da discriminação a afrodescendentes ou às paradas em defesa da comunidade LGBT. Uma sociedade saudável terá maior empatia às minorias sociais do que a ostras, lesmas, cupins ou minhocas. Ainda bem. Muitos animais devoram nossas casas e plantações. Há os que nos fazem coçar, sangrar, adoecer e até morrer. Sabe-se que vários são vetores de graves doenças. Steve Pinker, cientista de Harvard, alerta que, sem a participação dos animais na ciência, a medicina não avançaria e bilhões de pessoas vivas e ainda não nascidas sofreriam e morreriam. Igualar o ser humano a animais não humanos, ou dar-lhes igual valor moral, não é, necessariamente, um traço civilizatório. No nazismo, a Europa viu as mais enérgicas leis de proteção dos animais. Hitler e sua entourage eram vegetarianos não porque eram bonzinhos, "mas em razão da obsessão com a pureza, pelo desejo pagão de reintegrar-se com a terra e em reação ao antropocentrismo e aos rituais da carne praticados pelo judaísmo", destaca Steve Pinker. Em Roma, Calígula nomeou senador seu cavalo Incitatus e a história o tem como um monstro, não como um humanista. Que miséria seria viver numa sociedade onde, se uma pessoa estiver dirigindo um carro sem freios e tiver de fazer uma escolha trágica, entre passar por cima de uma vara de porcos, ou de uma garotinha, ela deve mirar a garotinha, já que, moralmente, estar-se-ia salvando-se o maior número de vidas de igual valor. Recentemente, a organização "People for the Ethical Treatment of Animals" remeteu um ofício ao presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, se queixando que Sua Excelência teria esmagado um mosquito durante uma entrevista. Num país tropical de mais de 200 milhões de habitantes que lida com dengue, doença de chagas, zika, chikungunya e outros, quantos ofícios seriam necessários? Essas elucubrações mostram que o banimento, pelo STF, das vaquejadas, trouxe falhas de raciocínio. Isso em razão do precipício teórico no qual se atirou. Na virtuosa jornada em defesa dos animais, deve-se diminuir o sofrimento deles, já que isso, em regra, traz um custo reduzido aos seres humanos. É forçoso, ainda, combater barbarismos motivados por prazeres sádicos, que ao contrário de nos elevar, mostra quão primitivos são muitos dos nossos instintos. Ir além disso, contudo, é crer num horizonte mais romântico do que real. É também partir para um "tudo ou nada" que mais atrapalha do que ajuda.  IPI na revenda Deu-se vista à Procuradoria-Geral da República para que se manifeste sobre o RE 946.648/SC, cujo tema, com repercussão geral, cuida da dupla incidência do IPI na saída do estabelecimento importador de mercadoria para a revenda, no mercado interno, considerada a ausência de novo beneficiamento no campo industrial. O ministro Marco Aurélio, relator, já recebeu, em audiência, interessados formalmente admitidos no feito, a exemplo dos patronos da FIESP. Presidente Temer lança pacto pela federação O presidente da República, Michel Temer, dia 5 de outubro, falou na Suprema Corte por ocasião da comemoração do aniversário da promulgação da Constituição Federal de 1988. O presidente deu foco à federação e afirmou que, do jeito que é, ela não é verdadeira. As palavras foram as seguintes: "A nossa vocação centralizadora vem desde o Império, com as capitanias hereditárias. A prática é centralizadora. Foi assim em 1964. Proponho que, ao lado do Poder Judiciário, lancemos um Pacto Federativo assim como ocorreu com o Pacto Republicano, por meio do qual projetos de lei que eram trabalhados no Poder Legislativo". Dirigindo-se à presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, arrematou: "Se Vossa Excelência concordar, talvez pudéssemos formalizar uma federação efetiva e real no nosso país". A ideia não deixa de ser animadora. Homenagem a Albie Sachs O juiz aposentado da Corte Constitucional da África do Sul, Albie Sachs, ganhador do prêmio Tang de Defesa do Estado de Direito, recebeu a comenda Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul, na qualidade de "Comendador". O decreto presidencial foi publicado no Diário Oficial da União do dia 7 de outubro. É uma demonstração de reconhecimento da nossa comunidade ao esforço empreendido pelo jurista na consolidação de valores fundamentais para a sociedade, tais como a diversidade e a democracia. Destaque da semana Teve início, no STF, o julgamento do leading case, com repercussão geral, sobre a imunidade do livro eletrônico. Na sustentação oral da Procuradoria da Fazenda Nacional cometido um pequeno equívoco ao se deixar entender que "e-readers", necessariamente, têm múltiplas funções, tais como acesso à internet, modo bluetooth, transferência de arquivos, alarme, editor de texto, jogos, tradutor, acesso a redes sociais, dentre outros. Segundo a Procuradoria, a imunidade constitucional deve ter interpretação restrita. O ministro Dias Toffoli negou provimento ao RE 330.817/RJ, do Estado do Rio de Janeiro, admitindo a imunidade do livro eletrônico, e, no RE 595.676/RJ, acompanhou o ministro Marco Aurélio, relator, admitindo a imunidade tributária do componente eletrônico. Como o julgamento foi adiado, o ministro não justificou detidamente sua posição. Não se sabe ainda quando esse julgamento será retomado. Tá na pauta Próxima quinta-feira, dia 13/10, a pauta do pleno do STF traz vários casos tributários importantes. São eles: (i) RE 912.888/RS (min. Teori Zavascki): Saber se o ICMS incide sobre o valor pago pelo consumidor às concessionárias de telefonia, a título de tarifa de assinatura básica mensal, de forma permanente e contínua, durante toda a vigência do contrato de prestação de serviços; (ii) RE 593.849/MG (min. Edson Fachin): Saber se é constitucional a devolução do ICMS pago adiantadamente no regime de substituição tributária, quando a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida; (iii) ADI 2675/PE (min. Ricardo Lewandowski): Saber se norma que fixa a restituição do ICMS pago a maior está em conformidade com o art. 150, § 7º, da CF. Sustenta-se que o dispositivo, ao assegurar a restituição do ICMS caso o fato gerador venha a se realizar com valor inferior ao presumido, ofende o referido dispositivo, que estabelece a obrigatoriedade de devolução na hipótese da não realização do fato gerador presumido; (iv) ADI 2.777/ SP (min. Cezar Peluso): Saber se norma que fixa a restituição do ICMS pago a maior está em conformidade com o art. 150, § 7º, da CF. Ainda, saber se a restituição do ICMS pago a maior é benefício que deve ser fixado observando-se os requisitos do art. 155, § 2º, XII, "g", da CF; (v) ADI 5.244/PE (min. Dias Toffoli): saber se os dispositivos impugnados violam a CF, uma vez que concedem benefícios fiscais relativos ao ICMS sem prévia autorização dos demais Estados-membros e do Distrito Federal, mediante celebração de convênio no âmbito do CONFAZ; (vi) ACO 779/RJ (min Dias Toffoli): possibilidade da cobrança de valores correspondentes às compensações financeiras pelas perdas decorrentes da desoneração do ICMS sobre as exportações. Global constitutionalism Um Tribunal de Justiça do Zimbábue derrubou a proibição imposta pelo governo contra manifestações populares em desfavor das precárias condições econômicas do país e que, não raramente, terminam culminando em violações a direitos humanos por parte da polícia. A tensão é fruto do colapso sócio-econômico após a implementação de uma reforma agrária racista baseada no ódio, obra do presidente Robert Mugabe, no poder desde 1980. A reação a esta grande divisão social baseada na revanche veio pela via judicial, graças à coragem de ativistas políticos que encontraram na independência do Poder Judiciário a imparcialidade da juíza Priscilla Chigumba, que declarou a inconstitucionalidade da proibição dos protestos populares. Evento O professor Marcelo Novelino fará uma participação no Grupo de Estudos Constitucionalismo Fraternal, coordenado pelo ministro Carlos Ayres Britto, no dia 20/10/2016, à partir das 11h30, na sala 3006, localizada no Térreo do bloco 3 do UniCeub em Brasília. Novelino falará sobre "A eficácia obrigatória dos precedentes do STF ante a sistemática do Novo CPC". Imperdível. Obiter dictum No julgamento, pelo STF, da ação direta de inconstitucionalidade que culminou com o banimento da vaquejada, a ministra Cármen Lúcia percebeu que o ideal era um pedido de vista, pelo menos para amainar os ânimos do plenário. Persuadindo seus colegas, a hoje presidente da Corte emendou: "Como se trata de vaquejadas, eu acho que nós deveríamos conceder o pedido de vista, porque como disse Chico Buarque: 'o boi ainda dá bode'". O pedido de vista terminou se concretizando.
sexta-feira, 30 de setembro de 2016

Conversa Constitucional nº 10

Opinião: o presidente precisa, pela Constituição, pacificar o país O presidente da República, Michel Temer, tem dito que um de seus propósitos nesse curto mandato é a pacificação do país. Está na hora de colocar a mão na massa. A engenharia do ódio ideológico coletivo ganhou força superior à que se supunha. Até agora, pelo menos seis candidatos foram mortos, a tiros, durante as eleições municipais desse ano. Ontem, perdeu a vida o ex-prefeito e candidato à prefeitura de Intumbiara/GO, José Gomes da Rocha (PTB). Fora essa barbaridade, há ainda o desejo de revanche. Semana passada, o senador Lindberg Farias (PT/RJ) foi encurralado por uma claque nas ruas no Rio de Janeiro. Acabara de dividir uma refeição com a esposa. O vídeo que circulou é para se indignar. Esse novo tipo de duelo ideológico urbano ganhou escala e a toda semana há uma nova vítima. Se, em 2000, o então presidente do PT, José Dirceu, bradou "eles apanharão nas ruas e nas urnas", fazendo com que o governador Mário Covas (PSDB) - tratando um câncer que tiraria sua vida - fosse ferido por pedras e cadeiras arremessadas por professores na praça da República, hoje são os Lindbergs que, por razões diversas, são hostilizados. O ódio é como o fogo, não se deve brincar com ele. Na mesma semana do acerto de contas com o senador, outro vídeo mostrou partidários do PSOL, na PUC de São Paulo, fazendo um mini debate. Nele, uma garota pega o microfone e diz: "E também vem o ódio, e esse ódio é importante". Em seguida, enaltece o sentimento que a motiva: "Esse ódio é o que nos coloca em movimento". Encerrando a fala, ela cerra o punho e grita coisas como "Viva o socialismo!" e "Viva a revolução!". É, então, aplaudida pelo pequeno grupo que, em seguida, parte para o botequim. A cena mata de vergonha qualquer revolucionário. Mesmo o então jovem guerrilheiro Fidel Castro, em 1977, fardado e com arma em punho no topo da montanha de Sierra Maestra, em entrevista a Erik Durschmied, disse ter uma causa e que a emoção que o motivava não era o ódio. Fidel afirmou, ao tempo, que buscava o progresso e a felicidade da sua gente. No Brasil, uma parcela da juventude fala em ódio. E eles são o futuro do país. E quanto à promessa constitucional de resolução pacífica das controvérsias? Será trabalhoso curar mentes perturbadas pela revanche, pelo chamamento à briga e pelo desejo de acertos de contas. Precisaremos de quantos cadáveres até que um líder estenda a mão a outro esboçando um gesto de reconciliação? Só líderes de verdade são capazes disso e está na hora de o presidente Michel Temer mostrar se é, ou não, um líder desses. Número significativo de jovens das metrópoles está disposto a entregar ao ódio uma vida sem propósitos. Além disso, há, ainda, os crimes de encomenda tirando, à bala, a vida de candidatos. Passa da hora de neutralizar tudo isso. É uma missão para quem, por dever constitucional, deve pacificar a nação. Suspensão de processos no STJ sobre ressarcimento de ICMS por benefício fiscal O Ministério Público da União pediu a suspensão dos processos que tramitam no STJ quanto a pedidos de ressarcimento, aos Estados e ao Distrito Federal, de benefícios fiscais de ICMS reputados inconstitucionais. O pedido se deu na AC 3.802/DF (min. Marco Aurélio), que deu efeito suspensivo ao RE 851.421/DF (min. Marco Aurélio), cujo tema 817, com repercussão geral, trata da possibilidade de os Estados e o Distrito Federal, mediante consenso alcançado no CONFAZ, perdoarem dívidas tributárias surgidas em decorrência do gozo de benefícios fiscais, implementados no âmbito da chamada guerra fiscal do ICMS, reconhecidos como inconstitucionais pelo STF. O ministro Marco Aurélio ainda não se manifestou. Imunidade das beneficentes de assistência social Todos na expectativa da retomada do julgamento, com o voto-vista do ministro Teori Zavascki, do RE 566.622/RS, cujo tema 32 da repercussão geral trata sobre reserva de lei complementar para instituir requisitos à concessão de imunidade tributária às entidades beneficentes de assistência social. Em junho, o relator, ministro Marco Aurélio, nos termos do art. 1.035, § 5º, do CPC/2015, suspendeu o curso de processos sobre o tema, impedindo o acionamento, pela Administração Pública, do art. 55 da lei 8.212/1991. Na última quarta-feira, os procuradores à frente da Coordenação de Atuação da PGFN no STF agendaram audiência com o ministro Dias Toffoli para tratar do caso. O ministro estava justificadamente ausente no início do julgamento, em 4/6/2014. Já há quatro votos favoráveis à contribuinte. Cofins sociedades civis Expectativa também para o julgamento, dia 19/10, dos embargos de declaração ao RE 377.457/PR (min. Rosa Weber), que, definindo o tema 71 da repercussão geral, reconheceu a constitucionalidade do art. 56 da lei 9.430/96, assentando que a COFINS deve incidir sobre as sociedades prestadoras de serviços profissionais e, tendo em vista o disposto no art. 27 da lei 9.868/99, rejeitando pedido de modulação de efeitos. Alegam os embargantes que não houve declaração de inconstitucionalidade de lei, motivo pelo qual não seria o caso de incidência do art. 27 da lei 9.868/99, e, em consequência, não haveria de se exigir o quórum qualificado de dois terços de votos favoráveis à modulação. Esclarecendo "que cinco ministros votaram pela modulação dos efeitos da decisão, enquanto cinco outros Ministros a negaram", requereram a suspensão do julgamento para que se aguardasse o voto da ministra Rosa Weber, para desempate. Tratando do assunto, ontem tiveram audiência agendada com a ministra Rosa Weber, o Presidente do Conselho Federal da OAB, Cláudio Lamachia e o chefe jurídico do Conselho, Oswaldo Pinheiro Ribeiro Júnior. Liberados para pauta "ICMS Imunidade Exportação", "PIS/COFINS Sistema FUNDAP/ES" e "Imunidade para optantes pelo SIMPLES" A procuradoria-Geral da República juntou parecer no RE 754.917/RS (min. Dias Toffoli), cujo tema 475 da repercussão geral trata da extensão da imunidade relativa ao ICMS para a comercialização de embalagens fabricadas para produtos destinados à exportação. Esse caso foi liberado para inclusão em pauta. Também foi liberado o RE 598.468/SC (min. Marco Aurélio), cujo tema 207 da repercussão geral trata da possibilidade de se reconhecer a contribuinte optante pelo SIMPLES as imunidades previstas nos arts. 149, § 2º, I, e 153, § 3º, III, da CF. Ministro Dias Toffoli libera temas tributários para pauta E, a propósito, o ministro Dias Toffoli liberou inúmeros temas tributários com repercussão geral, de sua relatoria, para inclusão em pauta. São eles: (i) RE 656.089/MG - Tema 515: Reserva de lei para a majoração da alíquota da COFINS de 3% para 4% pela Lei 10.684/2003; (ii) RE 630.898/RS - Tema 495: Referibilidade e natureza jurídica da contribuição para o INCRA, em face da EC 33/2001; (iii) RE 611.601/RS - Tema 281: Contribuição para a seguridade social a cargo das agroindústrias sobre a receita bruta prevista na Lei 10.256/2001; (iv) RE 608.872/MG - Tema 342: Imunidade de ICMS sobre produtos e serviços adquiridos por entidade filantrópica; (v) RE 605.552/RS - Tema 379: Imposto a incidir em operações mistas realizadas por farmácias de manipulação; (vi) RE 578.846/SP - Tema 665: Constitucionalidade das modificações efetuadas na base de cálculo e na alíquota da contribuição ao PIS, destinada à composição do Fundo Social de Emergência e devida pelos contribuintes a que se refere o § 1º do art. 22 da Lei 8.212/1991, no período de vigência do art. 72, V, do ADCT; (vii) RE 635.443/ES - Tema 391: incidência do PIS e da COFINS nas importações realizadas por conta e ordem de terceiros no contexto do Sistema Fundap; e (viii) RE 607.642/RJ - Tema 337: Majoração da alíquota de contribuição para o PIS mediante medida provisória. Julgamento conjunto sobre Coisa Julgada de CSL A procuradoria-Geral da Fazenda Nacional pediu ao ministro Edson Fachin, relator do RE 949.297/CE (CSL - Coisa Julgada), que o caso, já liberado para inclusão em pauta, seja apreciado em conjunto com o RE 955.227/BA (min. Roberto Barroso), da Braskem (Tema 885), que trata da mesma questão, mas sob a ótica da rescindibilidade da coisa julgada face decisão posterior operada em sede de controle difuso de constitucionalidade. O ministro ainda não se manifestou. Reconhecida repercussão geral quanto à Taxa de fiscalização de torres de antenas O voto favorável do ministro Marco Aurélio à repercussão geral do tema 919 (RE 776.564/SP, min. Luiz Fux), sobre a taxa de fiscalização de torres de antenas, somou quatro votos, quórum suficiente para garantir a admissibilidade do recurso. Ainda assim, a votação segue até dia 6/10. PGR aponta falhas processuais em leading case sobre diferencial de alíquota de ICMS à empresa optante pelo SIMPLES A procuradoria-Geral da República juntou parecer no RE 970.821/RS (min. Edson Fachin), cujo tema 517 da repercussão geral versa sobre a aplicação de diferencial de alíquota de ICMS à empresa optante pelo Simples Nacional. A manifestação afirma ser necessária a juntada ao autos do pronunciamento resultante do julgamento no Plenário Virtual e das manifestações dos amici curiae no paradigma substituído, bem como a apreciação da irresignação contra a inadmissão do ingresso como amicus curiae de uma das Associações. Destaque da semana Na quarta-feira, o pleno deu continuidade ao julgamento dos REs 566.471/RN e 657.718/MG, que tratam do fornecimento de remédios de alto custo não disponíveis na lista do SUS e de medicamentos não registrados na Anvisa. Depois dos votos dos ministros Marco Aurélio, Roberto Barroso e Edson Fachin, cada um sugerindo teses diferentes para os casos, veio o pedido de vista do ministro Teori Zavascki. A questão é complexa e deve levar algum tempo até que a Corte a defina. Tá na pauta I Dia 6/10 está na pauta a ADI 4697/DF (min. Edson Fachin), sobre a natureza tributária da Anuidade e Taxa de Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) enquanto contribuições devidas aos conselhos profissionais. Visa saber se se trata de matéria reservada à edição de lei complementar de iniciativa legislativa da União bem como a alegação de ofensa aos princípios da legalidade e da capacidade contributiva. Há oito votos pela improcedência. O ministro Ricardo Lewandowski votou pela procedência por vício formal. O caso volta com a vista do ministro Marco Aurélio. Será julgado conjuntamente com a ADI 4.762/DF (min. Edson Fachin); RE 838.284/RS (min. Dias Toffoli); e RE 704.292/PR (min. Dias Toffoli). Análise O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), divulgou recentemente o acórdão 954.027, de relatoria do desembargador Cruz Macêdo, que, dia 2/6/2016, na 4ª Turma Cível da Corte, tratou do direito à atendimento escolar especializado à criança portadora de síndrome de down. Como ativas cidadãs constitucionais que são, as jovens pesquisadoras Mayara Pitanga e Najara De Paula Cipriano, acadêmicas de Direito da UnB, contribuindo com a comunidade, dividem suas compreensões sobre o caso e o tema que o reveste. O material pode ser acessado aqui. Global constitutionalism A Corte Constitucional da Romênia adiou novamente a análise do caso que requer o reconhecimento de uma união homoafetiva entre um cidadão norte-americano e um romeno. A Romênia não reconhece as uniões homoafetivas ou quaisquer relacionamentos que se oponham à Igreja Romena Ortodoxa. A questão envolve Claibourn Robert Hamilton, um design gráfico norte-americano e Adrian Coman, ativista de direitos humanos. Eles se casaram há seis anos, na Bélgica, onde as uniões homoafetivas são reconhecidas. Em 2012, deram início à disputa judicial na Romênia quando a recusa das autoridades de imigração em reconhecerem o status deles os impediu de viver na Romênia. A Corte reagendou o caso para dia 27 de outubro. A homossexualidade foi descriminalizada na Romênia somente em 2001. Evento Confirmada a presença dos professores Gunther Teubner e Albie Sachs no XIX Congresso Internacional de Direito Constitucional do Instituto Brasiliense de Direito Público - IDP, cujo tema é: "Constituição, Internet e Novas Tecnologias: Interfaces para um novo Direito Constitucional". O evento ocorrerá no Auditório do IDP, entre os dias 26 e 28 de outubro. Inscreva-se aqui. Obiter dictum Perguntando recentemente por uma jornalista a respeito da falta de celeridade do Poder Judiciário, o ministro aposentado do STF, Carlos Ayres Britto, espirituoso que é, responde de imediato: "É que a Justiça não pode ir 'lavrando à jato' as decisões, não!". Nem a jornalista se segurou.
sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Conversa Constitucional nº 9

Opinião: Justiça restaurativa para curar as cicatrizes da Guerra Fiscal Há quem viva pela revanche, pelo desejo incontrolável de promover acertos de contas intermináveis. Em regra, quem entrega sua vida ao ódio e à divisão termina colhendo os frutos dessa combinação odiosa. O contrário também é verdadeiro. O perdão alcançado quando se busca a reconciliação tem sido um instrumento poderoso na reconstrução de laços sociais esgarçados. Nesse sentido, a proposta da presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, dando o primeiro passo quanto a uma possível solução à guerra fiscal entre os Estados, deve ser saudado. Dia 13 de setembro, a presidente se reuniu com governadores de 24 Estados e do Distrito Federal para construir uma agenda que promova a resolução de conflitos federativos estimulando suas resoluções por meio da Justiça restaurativa. Segundo registrou o governador do Estado de Santa Catarina, Raimundo Colombo: "Foi feito um apelo para que houvesse um entendimento entre os Estados. E nós vamos, por 60 dias, construir um detalhamento desta pauta e voltaremos a nos reunir". Fruto de experiências exitosas em países como a África do Sul, a Justiça restaurativa pode, agora, sob a liderança da Suprema Corte, pacificar conflitos e resgatar relações maltratadas por disputas internas. Nas palavras da jurista norte-americana Drucilla Cornell, quanto à aplicação da Justiça restaurativa na África do Sul: "a Justiça restaurativa busca, primordialmente, restabelecer a integridade da comunidade". Espera-se, verdadeiramente, ver pacificadas as disputas entre irmãos federados que devem prosperar juntos, não separados; e com concórdia, não com guerras, ainda que fiscais. CSL Coisa Julgada liberado para julgamento Foi liberado para inclusão em pauta o RE 949.297/CE (min. Edson Fachin), cujo tema 881 da repercussão geral é: "Limites da coisa julgada em matéria tributária, notadamente diante de julgamento, em controle concentrado pelo STF, que declara a constitucionalidade de tributo anteriormente considerado inconstitucional, na via do controle incidental, por decisão transitada em julgado". É a célebre tese da "CSL coisa julgada". O jurista Américo Lacombe tem poderes no caso. Criminalização da política Uma delegação de colegas advogados de pelo menos três diferentes Estados (RJ, SP e DF) se reuniu com a ministra Rosa Weber ontem para tratar da ADI 5586/DF, ajuizada pelo partido Solidariedade, visando à declaração de inconstitucionalidade do art. 11 da lei 13.254/16 (Lei de Repatriação - RERCT), que dispõe: "Art. 11. Os efeitos desta Lei não serão aplicados aos detentores de cargos, empregos e funções públicas de direção ou eletivas, nem ao respectivo cônjuge e aos parentes consanguíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, na data da publicação desta Lei". A ação sustenta que foi estabelecido tratamento discriminatório aos contribuintes detentores de cargos, empregos e funções públicas, na medida em que o dispositivo os exclui do benefício, em afronta ao art. 150, II, da CF. O dispositivo revela uma potencialização daquilo a que a literatura tem chamado de "criminalização da política". Amicus curiae A CNC foi admitida como amicus curiae no RE 591.340/SP (min. Marco Aurélio), cujo tema 117 da repercussão geral é: "Limitação em 30%, para cada ano-base, do direito de o contribuinte compensar os prejuízos fiscais do IRPJ e a base de cálculo negativa da CSLL - arts 42 e 58 da lei 8.981/95 e 15 e 16 da lei 9.065/95". Associação ataca FECOP paranaense A AFREBRAS - Associação dos Fabricantes de Refrigerantes do Brasil ajuizou a ADI 5589/PR, contra dispositivos da lei 18.573/15, do Estado do Paraná, que instituiu o Fundo Estadual de Combate à Pobreza (FECOP), especificamente em relação aos arts. 1º a 6º, em sua integralidade, com a CF. A lei majora em dois pontos percentuais as alíquotas de ICMS previstas para operações internas destinadas a consumidor final com os produtos relacionados no art. 14-A da lei 11.580/96. A instituição do FECOP seria inconstitucional, pois não observaria a regra prevista no art. 82, §1º do ADCT, que impõe lei complementar para sua instituição. O relator é o ministro Teori Zavascki. Plenário Virtual Tributário I O ministro Roberto Barroso se manifestou contrariamente ao reconhecimento da repercussão geral do tema 918, tratado no RE 940.769/RS. Já o relator, ministro Edson Fachin, votou pelo reconhecimento. Questiona-se o art. 49, IV, §3° e §4° do decreto municipal 15.416/09, que, em tese, afrontaria as normas gerais previstas pelo decreto-lei 406/68 e feriria a distribuição de competência em matéria tributária prevista na CF (art. 145). Trata-se da competência do município para estabelecer impeditivos à submissão de sociedades profissionais de advogados ao regime de tributação fixa ou per capita em bases anuais prevista no art. 9º, §§1º e 3º do decreto-lei 406/1968, por sua vez recepcionado pela ordem constitucional vigente com status de lei complementar nacional. A votação segue até dia 6/10. Plenário Virtual Tributário II Agora são dois votos pela repercussão geral (mins. Luiz Fux e Gilmar Mendes) contra um rejeitando (min. Roberto Barroso) e um impedimento (min. Teori Zavascki) no tema 919, tratado no RE 776.564/SP (min. Luiz Fux). Pelo recurso, a Taxa de Fiscalização de Licença para o Funcionamento das Torres e Antenas de Transmissão e Recepção de Dados e Voz, instituída pelo município de Estrela D'Oeste/SP (lei municipal 2.344/2006), e cobrada à razão de 450 EFESPS, equivalentes a mais de R$ 6.000,00, viola a distribuição constitucional de competências tributárias, tendo em vista que apenas a União teria competência para fiscalizar a atividade de telecomunicação (art. 22, IV, da CF). Argumenta ainda que a atividade municipal alegadamente custeada pela referida exação não se enquadraria nos incisos I, II, III e VIII, do art. 30 da CF, pois não se subsumiria ao conceito de planejamento e controle do uso, do parcelamento, e da ocupação do solo urbano, representando verdadeira tentativa de fiscalização pelo município de atividade concedida e regulada pela União Federal. Além disso, a lei instituidora da referida taxa não conteria discriminação, ainda que breve, do seu fato gerador, tornando difícil a sua identificação, em afronta direta ao princípio da legalidade em matéria tributária. Por fim, destaca que a base de cálculo da exação, além de não corresponder aos efetivos custos de uma fiscalização sobre suas estações de rádio-base (ERB's), rompendo com a retributividade inerente a essas espécies tributárias, apresenta nítido caráter confiscatório, se comparada com as demais taxas pagas pelo setor à ANATEL. A votação quanto à repercussão geral segue até dia 6/10. Destaque da semana Em 2011, eu assisti, com satisfação, à Suprema Corte brasileira reconhecer todos os consectários jurídicos das uniões homoafetivas, num julgamento que rompeu paradigmas pela forma de lidar com a diversidade. Na oportunidade, um dos argumentos utilizados foi o "direito à busca da felicidade", tendo, uma das bases teóricas apontadas, vindo, para a minha honra, da tese de doutoramento que apresentei perante a PUC/SP. Cinco anos depois, vi, com igual orgulho, outra decisão ampliar a dimensão dos direitos fundamentais. O STF apreciou essa semana o RE 898.060/SC (min. Luiz Fux), cujo tese fixada com repercussão geral foi a seguinte: "A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios". Reconheceu-se a simultaneidade dos vínculos parentais, permitindo que uma criança seja protegida, ao mesmo tempo, tanto pelo pai "biológico" como pelo pai "afetivo", reputando ambos como pais legítimos. Novamente, um dos fundamentos essenciais da decisão foi o direito à busca da felicidade. Fechando o histórico julgamento, o decano da Suprema Corte, ministro Celso de Mello, fez uma singela homenagem à minha tese de doutorado, referindo-se a ela, dentre outras qualificações, como "uma precisa e preciosa monografia". A menção, antes de envaidecer, emociona. Na minha infância, e na minha família, há crianças que foram "dadas" por suas mães/pais biológicos para serem criadas por aqueles que se tornariam mães/pais afetivos. Era uma prática comum - e às vezes um ato de sobrevivência - diante do quadro social no interior do Piauí, e não só lá, entre as décadas de 1940 e 1980. A partir daí, muitas dessas crianças se viam lidando com esses dois vínculos: um biológico, e o outro afetivo. "Ambos são meus pais/mães", eu ouvi muitas vezes. Agora, o STF afirmou que, na verdade, essas crianças, agora adultas, estavam certas. Muitos desses pais e mães não estão mais entre nós. Mas suas filhas e filhos estão. E, em nome deles e de muitas outras pessoas que viveram situações semelhantes, eu celebro a decisão. Tá na pauta I Numa iniciativa jamais vista no STF, a presidente Cármen Lúcia liberou todas as pautas de julgamento do pleno da Corte dos meses de setembro e outubro. Há muitos temas tributários pautados. Dia 28/9, há o referendo na medida cautelar na ADPF 190/SP (min. Edson Fachin), que cuida da exclusão do ISSQN da base de cálculo do IRPJ, da CSLL, PIS/PASEP e COFINS. Dia 29/9, há os seguintes casos: (i) RE 651.703/PR (min. Luiz Fux): Incidência de ISS sobre as atividades desenvolvidas por operadoras de planos de saúde diante da alegação de inexistência de prestação de serviço, mas, sim, a de obrigação de dar. O ministro Fux havia negado provimento ao recurso do contribuinte e o caso volta com o voto-vista do ministro Marco Aurélio; (ii) RE 330.817/RJ (min. Dias Toffoli): Saber se a imunidade tributária prevista na alínea 'd' do inciso VI do art. 150 da CF alcança os livros eletrônicos gravados em CD-ROM; (iii) RE 595.676/RJ (min. Marco Aurélio): Saber se a importação de fascículos educativos acompanhados de componentes eletrônicos está sujeita à tributação. Há 4 votos pela imunidade. O caso volta com o voto-vista do ministro Teori Zavascki. Dia 6/10: ADI 4697/DF (min. Edson Fachin): Natureza tributária da Anuidade e Taxa de Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) enquanto contribuições devidas aos conselhos profissionais. Saber se se trata de matéria reservada à edição de lei complementar de iniciativa legislativa da União bem como a alegação de ofensa aos princípios da legalidade e da capacidade contributiva. Há oito votos pela improcedência. O min. Ricardo Lewandowski votou pela procedência por vício formal. O caso volta com a vista do ministro Marco Aurélio. Julgado conjuntamente: ADI 4762/DF (min. Edson Fachin); RE 838.284/RS (min. Dias Toffoli); RE 704292/PR (min. Dias Toffoli). Tá na pauta II Dia 13/10, os casos são os seguintes: (i) RE 912.888/RS (min. Teori Zavascki): Saber se o ICMS incide sobre o valor pago pelo consumidor às concessionárias de telefonia, a título de tarifa de assinatura básica mensal, de forma permanente e contínua, durante toda a vigência do contrato de prestação de serviços; (ii) RE 593.849/MG (min. Edson Fachin): Saber se é constitucional a devolução do ICMS pago adiantadamente no regime de substituição tributária, quando a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida. Julgamento conjunto com as ADIs 2675 e 2777; (iii) ADI 5244/DF (min. Dias Toffoli): ICMS. Concessão de benefícios fiscais e financeiros de ICMS para incrementar a arrecadação e a economia estadual. Programa de Desenvolvimento de Pernambuco (PRODEPE). Saber se as normas impugnadas tratam de matéria que exigem prévia deliberação no âmbito do CONFAZ; (iv) Agravo Regimental na ACO 779/RJ (min. Dias Toffoli): ICMS. Operações de exportação. Compensação financeira. Leis complementares 87/96 e 115/2002. EC 42/2003. Por fim, dia 20/10, são esses: (i) RE 570.122/RS (min. Marco Aurélio): Saber se constitucional a ampliação da base de cálculo e da majoração da alíquota da COFINS instituída pela lei 10.833/2003, resultante da conversão da MP 135/2003; (ii) ED no RE 400.479/RJ (min. Marco Aurélio): Saber se receitas decorrentes das atividades das empresas de seguro estão sujeitas à exação da contribuição social para o PIS E COFINS; (iii) RE 605.506/RS (min. Rosa Weber): Saber se o IPI pode compor a base de cálculo das contribuições PIS e COFINS recolhidas pelas montadoras de veículos em regime de substituição tributária. A liberação dessas pautas é um feito. Aos poucos, a ministra Cármen Lúcia começa a alterar hábitos institucionais negativos que haviam se enraizado na Suprema Corte. Análise Foi incluído na pauta do pleno do dia 29/9 (quinta-feira), o RE 330.817/RJ (min. Dias Toffoli), cujo tema da repercussão geral é o seguinte: Saber se a imunidade tributária prevista na alínea 'd' do inciso VI do art. 150 da CF alcança os livros eletrônicos gravados em CD-ROM. Como cidadão constitucional que é, Eduardo Lourenço Gregório Júnior, um dedicado advogado tributarista, expressa suas compreensões sobre esse assunto tão importante na atual quadra. O material pode ser acessado aqui. Global constitutionalism A Corte Constitucional da Ucrânia declarou a inconstitucionalidade da imposição segundo a qual seria necessária uma permissão estatal para que se fizesse manifestações ou passeatas religiosas. A exigência seria discriminatória e ilógica a partir do momento em que a Constituição ucraniana prevê que as pessoas devem simplesmente notificar a Administração sobre seus planos de dar suporte a uma passeata ou encontro pacífico. A Corte Constitucional anunciou sua decisão dia 13 de setembro, para o público do Conselho Ucraniano de Igrejas e Organizações Religiosas, o Instituto de Liberdade Religiosa, a imprensa e pessoas do povo. Tanto a Constituição ucraniana, como a Convenção Europeia de Direitos Humanos, serviram de base da decisão. Evento A Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) realiza hoje, em sua sede, em Brasília, o "Seminário Jurídico de Direito Cooperativo da OCB". A intenção é debater as principais questões jurídicas ligadas ao Direito Cooperativo atualmente em discussão no âmbito do Poder Judiciário. O evento trará um painel internacional específico sobre a questão do tratamento do capital de cooperativas e normas mundiais de contabilidade, que contará com a presença dos professores Dante Cracogna e Oscar Alpa, da Argentina. Já o advogado Tiago Severo Gomes falará sobre aspectos relativos ao direito do consumidor e seus impactos no cooperativismo. Obiter dictum Durante o julgamento do caso que discutia a multiparentalidade, o ministro Luiz Fux cometeu um ato falho: "Porque, como acontece com todos, o casal se separou", disse, a respeito do divórcio dos pais da parte no caso. Não demorou para o ministro Teori Zavascki se opor. "Todos não!". Foi quando o ministro Fux retomou a palavra e acusou o ato falho, afirmando estar, inclusive, casado há muitas décadas com a mesma mulher. A presidente Cármen Lúcia elogiou: "O esclarecimento veio a bom tempo, ministro!". Todos gargalharam.
sexta-feira, 16 de setembro de 2016

Conversa Constitucional nº 8

Opinião: Ninguém melhor do que uma mulher para falar pelas mulheres Na última terça-feira, a ministra Cármen Lúcia, já à frente da Suprema Corte, se reuniu com os presidentes dos Tribunais de Justiça do país. Na foto da reunião, tirando uma única presidente participante, todo o restante era formado por homens. No mesmo dia, a presidente esteve com mais de 20 governadores. Havia somente uma mulher, a governadora de Roraima, Suely Campos. Não é que as outras faltaram. Não há outras. Dia seguinte, na sessão do pleno do Tribunal, a ministra Cármen teve de ouvir alguns colegas, homens - num colegiado cuja proporção de gênero é de nove homens para duas mulheres - falarem sobre como as mulheres ocupam lugares de destaque na sociedade. Foi a gota que faltava para derramar toda a água do copo. A presidente desabafou: "Há tanta discriminação contra a mulher, ao contrário do que aqui foi dito, - que temos mulheres conduzindo Boeing e isso e aquilo -... a simples referência disso, já demonstra a discriminação, porque ninguém fala que tinha um homem sentado aqui desde 1828 nesse Supremo Tribunal de Justiça e que isso era novidade". Diante do silêncio eloquente do pleno, a ministra continuou: "Há, sim, discriminação contra a mulher. Há, sim, a discriminação mesmo em casos de nós, juízas, que conseguimos chegar a posições de igualdade. Há, sim, enorme preconceito contra nós, mulheres, em todas as profissões. Eu convivo com mulheres que o tempo todo são discriminadas", arrematou. A discriminação contra a mulher, no Brasil, não tem cor, partido político, classe social ou ideologia. Ela tanto habita a natureza criminosa do agressor brutal, como a face envergonhada de engravatados das altas rodas com suas piadas e estereótipos. A esperança a ser alimentada por nós nessa questão é a mesma frisada pela escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, no seu "We should all be feminists", quando diz: "Gênero importa em todos os lugares do mundo. E eu gostaria, hoje, de dizer que nós deveríamos começar a sonhar e planejar um mundo diferente. Um mundo mais justo. Um mundo de homens mais felizes e mulheres mais felizes que sejam mais fiéis a si mesmo". A presidente da Suprema Corte está fazendo a parte dela. Mulheres em todo o mundo também estão. Resta, a nós, homens, demonstrarmos toda a nossa empatia a essa causa e, alimentando os anjos bons da nossa natureza, rasgarmos esse manto tenebroso que ainda cobre a nossa vista: o manto do machismo e, ao lado dele, da discriminação contra a mulher. FIESP pede ingresso no debate sobre CSL - Coisa Julgada A FIESP pediu ingresso como amicus curiae no RE 955.227/BA (min. Luís Roberto Barroso), com repercussão geral, que visa "saber se e como as decisões do STF em controle difuso fazem cessar os efeitos futuros da coisa julgada em matéria tributária, quando a sentença tiver se baseado na constitucionalidade ou inconstitucionalidade do tributo". É a importante tese da "CSL - Coisa Julgada". Esclarecimento quanto tese dos resíduos domiciliares Foram opostos embargos de declaração ao RE 847.429/SC (min. Dias Toffoli), apontando que, na decisão embargada, que reconheceu a repercussão geral, "a possibilidade de delegação, mediante contrato de concessão, do serviço de coleta e remoção de resíduos domiciliares" não está sendo questionada, devendo, o julgamento, ater-se à forma de remuneração de tais serviços concedidos. IPI na revenda O ministro Marco Aurélio despachou as petições apresentadas no RE 946.648/SC, cujo tema, com repercussão geral, versa sobre a eventual dupla incidência de IPI na revenda de bem industrializado. A FIESP foi admitida como terceira interessada. Quanto à alegação de que o quórum necessário para o reconhecimento da repercussão geral não teria sido atingido, o ministro anotou: "O quórum de 2/3, referente ao afastamento da repercussão geral, não foi alcançado. Há de aguardar-se a liberação do processo para inserção na pauta do Plenário físico e, aí, ocorrer a apreciação de aspectos ligados ao extraordinário". Por fim, quanto ao pedido de suspensão de todos os casos que versem sobre a matéria na jurisdição nacional, o ministro Marco Aurélio recusou a aplicação do CPC/2015: "A cláusula do inciso II do artigo 1.037 do Código de Processo Civil há de ser observada com extremo cuidado, surgindo própria em casos excepcionais, o que não se verifica na espécie. Uma coisa é, ante a repercussão geral admitida, suspender-se o envio de processos que, em Tribunais, estejam prontos para exame do Supremo. Algo diverso é implementar-se, de forma linear, a suspensão, seja qual for a fase, de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem o tema em debate", fundamentou. Vida nova Começaram as redistribuições para o ministro Ricardo Lewandowski de recursos com repercussão geral da relatoria da ministra Cármen Lúcia. O AI 837.409/SE, por exemplo, trata do seguinte: "IPTU. Execução fiscal. Competência tributária ativa. Declaração de inconstitucionalidade de dispositivo que definia limites territoriais de município. Requisitos contidos no art. 18, § 4º, da CF. Mitigação. Discussão quanto à correta aplicação do art. 96 da CF". Também o RE 590.186/RS: "IOF nas operações de mútuo praticadas entre pessoas jurídicas ou entre pessoas jurídicas e pessoas físicas segundo as mesmas regras aplicáveis às operações praticadas pelas instituições financeiras. Art.13 da lei 9.779/99". Mais casos são liberados Foi liberada para inclusão em pauta a ADI 3.144/DF (min. Edson Fachin), ajuizada pela CNC contra a Lei 10.833/2003 (COFINS não-cumulatividade). Também a ADI 2.237/DF (min. Cármen Lúcia), da Confederação Nacional das Profissões Liberais, cujo tema é: "Arts. 625-D e 625-E da CLT, inseridos pela lei 9.958/2000. Obrigatoriedade de submissão de demanda trabalhista a Comissão de Conciliação Prévia (CCP). Inocorrência. Inafastabilidade da jurisdição. Eficácia geral de termo de conciliação firmado por CCP. Efeito restrito aos direitos objeto da demanda". Foi liberada ainda a ADI 3.692/SP, ajuizada pelo governador do DF contra o art. 36, §3º, da lei 6.374/89, do Estado de SP, que veda o aproveitamento de créditos provenientes de operações ou prestações realizadas com contribuintes que fruem de benefícios fiscais em outras Unidades da Federação, sem a devida autorização do CONFAZ, sob o fundamento de que não houve recolhimento na etapa anterior. ICMS na base da Cofins A Fazenda Nacional segue com sua pretensão de ver suspensos todos os casos que, na jurisdição nacional, tratem da exclusão do ICMS na base de cálculo da Cofins. Os procuradores da Fazenda Cláudio Seefelder e Alexandra Carvalho, que fizeram o pedido de sobrestamento para a ministra Cármen Lúcia, relatora do leading case do tema com repercussão geral, o RE 574.706/PR, agendaram semana passada audiência com o ministro Gilmar Mendes, no TSE e, essa semana, com o ministro Roberto Barroso, no Salão Branco do STF. A suspensão seria providencial à coerência interna da jurisprudência nacional. Destaque da semana O governador do DF ajuizou no STF a ADC 46 arguindo a constitucionalidade dos artigos 6º, § 7º e 57 da lei 11.101/2015, bem como do artigo 191-A do CTN. O relator é o ministro Celso de Mello. Segundo a ação, a jurisprudência vem restringindo os direitos do fisco de providenciar o regular processamento dos executivos fiscais em face de devedores em recuperação judicial, pela argumentação de que em última análise reconhecem uma inconstitucionalidade dos artigos 6º, §7º e 57 da lei 11.101/05 (Lei de Recuperação Judicial e Extrajudicial), que não prevalece, tendo em vista que tais dispositivos são perfeitamente constitucionais, perante, principalmente, o art. 191-A do CTN. Também foi ajuizada, pelo governador do DF, a ADI 5.590/DF, visando o reconhecimento da inconstitucionalidade do § 4º ao art. 128 da Lei Orgânica do DF, tanto na sua redação original quanto na redação conferida pela Emenda à Lei Orgânica 80/2014. A referida norma prevê que os projetos de lei que instituam ou majorem tributos somente podem tramitar no âmbito da Câmara Legislativa em um determinado exercício financeiro se tiverem sido encaminhados antes de 90 dias do encerramento do correlato exercício. A relatoria é do ministro Teori Zavascki. Tá na pauta Consta como primeiro item da pauta do pleno do STF, para a próxima quarta-feira (21/9), o RE 898.060/SC (min. Luiz Fux), cujo tema, com repercussão geral, é o seguinte: "Família. Filiação. Direito Civil. Paternidade Biológica. Paternidade Socioafetiva". Quanto ao assunto, veja a análise feita pelas jovens pesquisadoras Isabela Oliveira Pannunzio e Cássia Kinoshita. O item seguinte é a ADI 3792/RN (min. Dias Toffoli), que trata da "constitucionalidade da obrigatoriedade de Plantão no escritório de prática jurídica mantido pelo curso de Direito da UERN". Análise Tramita no STF o ARE 743.485/SP (min. Marco Aurélio), do Consórcio Intermunicipal da Bacia do Juquery contra a Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo, cujo tema, com repercussão geral (nº 854) é o seguinte: "Possibilidade de implementação da prestação de serviço público de transporte coletivo, considerado o art. 175 da Constituição Federal, mediante simples credenciamento, sem licitação". Como cidadã constitucional que é, Luísa de Almeida Andrade, uma dedicada jovem pesquisadora, acadêmica de Direito da UnB, expressa suas compreensões sobre o assunto, tão importante na concretização do direito à cidade. O material pode ser acessado aqui. Global constitutionalism A Suprema Corte de Israel entendeu ser constitucional uma lei que permite a alimentação forçada de prisioneiros que se impõem greve de fome. A Corte negou pedidos da Associação de Médicos de Israel e de inúmeros grupos de defesa de direitos humanos. Para os juízes, a lei em análise, que lidava com questões relativas a pacientes médicos - vedando o procedimento - não abordava perfeitamente a situação dos prisioneiros que, em greve de fome, estavam numa situação extraordinária, não contemplada na legislação, que havia sido emendada. O vice-presidente do Tribunal, Elyakim Rubinstein, acompanhado dos juízes Noam Sohlberg e Meni Mazuz, permitiram a intervenção estatal em favor da vida daqueles que, geralmente abraçando causas políticas, usam a greve de fome como arma ideológica que coloca em risco a vida e a saúde. Para a Associação de Médicos de Israel, a alimentação forçada equivale à tortura e os médicos serão orientados a não fazerem a intervenção forçada. Evento Dia 28/9 (quarta-feira), às 19h, no Auditório da Biblioteca do UniCeub, em Brasília, o Instituto de Diálogos Constitucionais (IDCON), num convite feito pelo ministro Luís Roberto Barroso, receberá os professores Carlos Bernal Pulido (Macquire Law School - Austrália) e Richard Albert (Boston College Law School - EUA) para falarem sobre aspectos do Constitucionalismo Global. O professor Carlos discorrerá sobre o "Princípio da Proporcionalidade e Direitos Fundamentais" e o professor Richard sobre "Como as Cortes se tornam supremas: o poder de invalidares emendas constitucionais". Obiter dictum Na quarta-feira, durante o julgamento do RE 658.312/SC, que discute a recepção, pela Constituição Federal de 1988, do art. 384 da CLT, que prevê o intervalo de 15 minutos para mulheres antes da jornada extraordinária, a ministra Cármen Lúcia, aparteando o ministro Gilmar Mendes, exortava a necessidade de respeito aos direitos das mulheres. Foi quando um diálogo entre os dois quebrou o clima tenso da sessão: Ministra Cármen: "A identidade de cada um é diferente entre homens e mulheres, graças a Deus. Dá certinho esse negócio de homem e mulher. É ótimo!". Ministro Gilmar: "Ninguém nega isso, ministra". Ministra Cármen: "Claro! Pelo amor de Deus. Só falta Vossa Excelência pedir vista disso também".
sexta-feira, 9 de setembro de 2016

Conversa Constitucional nº 7

Opinião: 20 perguntas antes do salto do STF Ontem, a força dos homens. Hoje, a virtude das Constituições. Todos nós tentamos escapar da dor e do sofrimento para que sigamos guiando nossas vidas em busca da felicidade. Por isso, é um alento saber que, diante das sombras do arbítrio, há a luz da Constituição a nos dar refúgio. No Brasil, esse refúgio há de ser preservado, pelo menos idealmente, pelo Supremo Tribunal Federal. Exatamente por isso é que parece passar da hora de a Corte dar vazão a todo o seu potencial. Não em seu próprio proveito, mas em benefício da comunidade. Apesar de o Tribunal fazer muito, tem-se a impressão de haver hábitos institucionais que poderiam ser reavaliados. Talvez o verdadeiro salto qualitativo só seja dado quando a Corte deixar de fazer muito para, fazendo menos, fazê-lo com toda a excelência que deseja. Nesse sentido, como um convite à reflexão, deixo 20 perguntas sobre o funcionamento da sessão do pleno. São questionamentos elementares a respeito do mais solene, litúrgico e relevante espaço de deliberação e decisão do Tribunal. Enquanto a Suprema Corte não tiver respostas orgulhosas para essas perguntas, o novo salto de qualidade almejado jamais será dado. É que, no Direito, como na vida, "primeiro as coisas primeiras". Vamos lá! 1) A que horas, exatamente, tem início a sessão? 2) Quais ministros estarão presentes? 3) Os ministros presentes no início permanecerão até o final? 4) Será obedecida a ordem da pauta? 5) O caso pautado será apreciado? 6) Membros da comunidade, até os muito idosos, viajarão várias vezes a Brasília para acompanhar casos que, pautados, não serão chamados? 7) Se um caso, pautado e com advogados presentes, não for julgado no dia agendado, quando ele voltará à pauta? 8) É possível que um amicus curiae peça, e a Corte conceda, o adiamento de caso pautado sem consultar às partes? 9) Uma vez liberado para julgamento pelo relator, quando o processo será apreciado pelo pleno? 10) Havendo análise, no pleno, de uma cautelar, quando se julgará o mérito? 11) Haverá pedido de vista no pleno? 12) Havendo vista, quando o processo voltará à pauta? 13) Tendo sido iniciado o julgamento, quando ele será concluído? 14) Qual é o fundamento determinante da decisão? 15) É fácil saber, objetivamente, o que foi decidido? 16) O pleno aprecia casos "em listas" e "em bloco"? 17) Quando o acórdão do julgamento será publicado? 18) É possível que uma decisão do pleno não seja cumprida internamente ou que seja revertida rapidamente? 19) Cabe recurso da decisão do pleno e, caso caiba, é possível que seja proferida nova decisão diversa da anterior? 20) Transitado em julgado o caso, pode, o pleno, num curto espaço de tempo, apreciar a mesma matéria, noutro processo, proclamando novo resultado? Relatoria preservada A ministra Cármen Lúcia, que assume na próxima segunda-feira a presidência da Suprema Corte, liberou inúmeros casos relevantes para julgamento preservando, assim, sua relatoria sobre eles. Nessa última semana, eis alguns: ADI 3.962/SP, ajuizada pelo governo do Distrito Federal, imersa no grande debate da guerra fiscal de ICMS; ADI 5.095/TO, ajuizada pela Confederação Nacional da Agricultura, atacando Lei do Estado de Tocantins que impugna valores de emolumentos para registro notarial; ADI 5.228/CE, sobre guerra fiscal de ICMS (PROINEX do Ceará); ADI 5.417/DF, ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio, cuidando de PLR de empresas estatais e alegação de que a lei 10.101/2000 viola o art. 7º da CF, porque não prevê imposição de concessão da PLR; ADI 5.439/DF, sobre guerra fiscal do e-commerce (EC 87/2015); e a ADI 5.475/AP, sobre licença ambiental única e exigência de EIA. A inclusão definitiva desses casos na pauta depende do presidente da Corte. Como a presidente será a própria ministra Cármen Lúcia, o caminho para a apreciação está, portanto, mais do que aberto. Casos liberados para julgamento O ministro Dias Toffoli liberou para inclusão em pauta a ADI 1.763/DF, ajuizada pela Confederação Nacional do Comércio, que ataca a lei 9.249/95, na parte em que regula a incidência de IOF sobre as operações de factoring. Já o ministro Edson Fachin liberou o RE 705.423/SE, do município de Itabi contra a União, cujo tema, com repercussão geral, é o seguinte: "Repartição de receitas tributárias. IR e IPI. Fundo de participação dos municípios. Cálculo. Exclusão dos benefícios, incentivos e isenções fiscais concedidos pela União". A inclusão na pauta do pleno depende, como já dissemos, da presidente da Corte. Parecer da PGR sobre CSL - coisa julgada A procuradoria-Geral da República apresentou parecer opinando quanto ao RE 955.227/BA (min. Luís Roberto Barroso), leading case do Tema 885 da repercussão geral, que discute os "efeitos das decisões do STF em controle difuso de constitucionalidade sobre a coisa julgada formada nas relações tributárias de trato continuado". O parecer sugere a seguinte tese a ser adotada pela Corte: "A coisa julgada em matéria tributária, quando derivada de relação jurídica de trato continuado, perde sua eficácia no momento da publicação do acórdão do Supremo Tribunal Federal contrário ao sentido da sentença individual, ainda que exarado no âmbito do controle difuso de constitucionalidade". É, sem dúvida, uma discussão importante cuja base reside na essência garantista da própria Constituição. Destaque da semana Entrou em pauta no pleno ontem, mais uma vez, sem que tenha sido chamado para julgamento, o RE 592.891/SP (min. Rosa Weber), que visa saber se há direito ao creditamento do IPI na entrada de insumos provenientes da Zona Franca de Manaus adquiridos sob o regime de isenção. O caso voltaria com o voto-vista do ministro Teori Zavascki. Tá na pauta Consta na pauta da sessão do pleno na próxima quinta-feira (15/9), um bloco de casos sobre aspectos diversos do direito à saúde. São eles: (i) RE 566.471/RN (min. Marco Aurélio): Saber se ofende os arts. 5º, 6º, 196, e 198, §1º e §2º, da Constituição Federal o acórdão que condenou o recorrente a fornecer medicamento de alto custo que não consta do programa de dispensação de medicamentos em caráter excepcional; (ii) RE 657.718/MG (min. Marco Aurélio): Saber se o Estado tem o dever de fornecer medicamento sem registro na ANVISA; e (iii) ED no RE 855.178/PE (min. Luiz Fux): Embargos de declaração. Pedido de efeito modificativo. Direito à saúde. Tratamento médico adequado aos necessitados. Responsabilidade solidária dos entes federados. Alegação de obscuridade em relação à abrangência do tema de fundo e necessidade de deliberação pelo plenário presencial. É de fundamental importância saber qual a posição da Corte quanto à concretização de direitos sociais nesse período de recessão econômica. Análise Está pautado para a próxima quinta-feira (13/9), no pleno do STF, o julgamento do ARE 898.060/SC (min. Luiz Fux), A N x F G, tendo, como amici curiae, a Associação de Direito de Família e das Sucessões - ADFAS e o Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM. Tratando do Tema nº 622 da repercussão geral, tem-se o seguinte debate: "Prevalência da paternidade sócio-afetiva em detrimento da paternidade biológica". Como cidadãs constitucionais que são, as jovens pesquisadoras Isabela de Oliveira Pannunzio e Cássia Kinoshita, acadêmicas de Direito da UnB, fazem a diferença ao expressarem suas compreensões sobre a seminal discussão a ser travada no âmbito da jurisdição constitucional. O material pode ser acessado aqui. Global Constitutionalism O Congresso da Colômbia cassou a imunidade e suspendeu um juiz da Corte Constitucional envolvido num escândalo de propina. Nunca, desde a entrada em vigor da Constituição colombiana, em 1991, uma medida como essa foi adotada. Jorge Pretelt se viu no olho do furacão com inúmeras alegações de corrupção e, mesmo assim, se negou a renunciar ao cargo de juiz constitucional. Ele era acusado de extorquir a companhia de petróleo Fidupetrol que se socorreu da Corte Constitucional para reverter uma multa de $17 milhões por violação à regulação ambiental do país. Ao tempo, Pretelt era o presidente da Corte. Agora, o caminho está aberto para que o juiz responda pelas acusações que têm enfrentado. Evento Dia 16/9, uma sexta-feira, a partir das 19h30, terei a alegria de estar na companhia do professor Alexandre Freire, doutor em Direito Processual Civil pela PUC/SP, no evento organizado pela ESA/DF: "Metodologia Decisória das Cortes Constitucionais - Diálogo Brasil e África do Sul". Falaremos, sempre numa análise comparada, sobre amicus curiae, modulação de efeitos, ações constitucionais, casos paradigmáticos, diálogos institucionais e muito mais. Eu, como ex-clerk da Corte Constitucional da África do Sul. O professor Alexandre Freire, como ex-assessor da Suprema Corte brasileira. As inscrições podem ser feitas aqui. Obiter dictum Num julgamento no plenário do STF, o ministro Carlos Ayres Britto pediu um aparte ao ministro Marco Aurélio. A discussão era intensa e os ânimos estavam acirrados. De surpresa, ouviu em resposta: "Claro! Desde que Vossa Excelência adira. O ministro vai aderir ao meu voto?", brincou o ministro Marco Aurélio. A plateia não se conteve e caiu na gargalhada.
segunda-feira, 5 de setembro de 2016

Conversa Constitucional nº 6

Opinião: junto à Constituição, fatiaram as nossas esperanças Um destaque para Votação em Separado (DVS) apresentado no final da votação do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff operou, no Senado Federal, um milagre: a mandatária, cassada, não sofreu a inabilitação de oito anos. O art. 52, parágrafo único, da Constituição Federal determina que a eventual condenação gera "perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis". Interpretaram o que não cabe interpretação. É como se o TSE, cassando um governador por compra de voto, entendesse que, apesar do crime eleitoral, o mandatário, cassado, tinha um bom coração e, portanto, não deveria sofrer a inelegibilidade de oito anos. No caso do impeachment, a medida provou que, no Brasil, não há limites jurídicos que contenha a força da política historicamente provinciana. E não foi a primeira vez. Em 2002, o então presidente do TSE, ministro Nelson Jobim, encontrou, no art. 17, I, da Constituição, a expressão "caráter nacional", em referência aos partidos. Interpretando-a, fez nascer a chamada verticalização das coligações partidárias que, ao tempo, militava em favor do então candidato a presidente José Serra (PSDB). Pela interpretação, "os partidos políticos que ajustarem coligação para eleição de presidente da República não poderão formar coligações para eleição de governador de Estado ou do Distrito Federal, senador, deputado Federal e deputado estadual ou distrital com outros partidos políticos que tenham, isoladamente ou em aliança diversa, lançado candidato à eleição presidencial". Esse estatuto, ausente do texto constitucional, estava, segundo o ministro Jobim, contido na expressão "caráter nacional". De nada adiantou. Quando as urnas foram abertas, estava eleito Luís Inácio Lula da Silva (PT). Essas posturas mostram que, diante do capricho dos homens e mulheres que fazem política no país, sucumbem a certeza das leis e a segurança do Direito. No Senado, não se fatiou somente a Constituição. Fatiou-se, também, a esperança de que não precisamos temer pois vivemos, qualquer que seja a circunstância, sob um governo das leis. Ficou claro que não, não vivemos.  Ministro Fachin suspende casos que tratem de CSL - coisa julgada O ministro Edson Fachin determinou a suspensão de todos os casos que tramitam na jurisdição nacional tratando do Tema 881 da repercussão geral, que é o seguinte: "Limites da coisa julgada em matéria tributária, notadamente diante de julgamento, em controle concentrado pelo STF, que declara a constitucionalidade de tributo anteriormente considerado inconstitucional, na via do controle incidental, por decisão transitada em julgado". No RE 949.297/CE, o ministro Fachin anotou: "Reconhecida a repercussão geral, impende a suspensão do processamento dos feitos pendentes que versem sobre a presente questão e tramitem no território nacional, por força do art. 1.035, §5º, do CPC". Ministra Cármen Lúcia libera casos tributários e preserva sua competência Preservando a relatoria de importantes disputas tributárias, a ministra Cármen Lúcia, prestes a assumir a presidência do STF, tem liberado para julgamento casos de relevo. Primeiramente, a ADI 2.044/RS, da CNC, cuja cautelar foi indeferida décadas atrás, tratando de ICMS - substituição tributária autorizada pelo § 7º acrescentado ao art. 150 da Constituição pela Emenda 3/93, tendo como base de cálculo o valor do estoque de mercadorias. Ainda, a ADI 2.446/DF, também da CNC, que impugna o art. 116 do CTN, que admite à autoridade administrativa desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, a título de combater a elisão fiscal. Também a ADI 5.165/DF, do Conselho Federal da OAB, sobre a supressão do efeito suspensivo automático nos embargos à execução (incidência do art. 739-A do CPC/73 na execução fiscal). Por fim, a ADI 5.002/MG, da Federação Brasileira de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais - FEBRAFITE, questionando o Código de Defesa dos Contribuintes do Estado de Minas Gerais. A ministra Cármen Lúcia assume a presidência da Suprema Corte dia 12/9. ABIA pleiteia suspensão de casos sobre glosa unilateral de ICMS fruto de benefício fiscal A ABIA - Associação Brasileira de Indústria de Alimentação protocolou, no STF, pedido de suspensão, nos termos do CPC/2015, de todos os casos que tramitem na jurisdição brasileira sobre o seguinte tema com repercussão geral: Glosa unilateral de crédito de ICMS fruto de benefício fiscal supostamente inválido. O tema, tratado no RE 628.075/RS, é da relatoria do ministro Edson Fachin, que ainda não se manifestou quanto à suspensão. Fecomércio/PR, CNC e Fecomércio/RJ são amigas da Corte O ministro Dias Toffoli admitiu amici curiae em ADIs diversas. Na ADI 5.469/DF, ajuizada pela Associação Brasileira de Comércio Eletrônico - ABCOMM, admitiu a Fecomércio/PR. A ação ataca as cláusulas 1ª, 2ª, 3ª, 6ª e 9ª do Convênio ICMS 93/2015 do Confaz, que dispõe sobre "os procedimentos a serem observados nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte do ICMS, localizado em outra unidade federada". Já na ADI 5.464/DF, ajuizada pelo Conselho Federal da OAB, a Fecomércio/RJ, após ter apresentado procuração com poderes específicos para o ingresso como amicus curiae, teve seu ingresso deferido. Também a CNC foi admitida. A ação tem como objeto a cláusula nona do Convênio Confaz 93/2015, a qual determinou às empresas optantes do Simples Nacional, quando remetentes de bem ou prestadoras de serviço, o recolhimento do diferencial de alíquotas em relação às operações e às prestações que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte do ICMS localizado em outra unidade federada, em relação ao imposto devido à unidade federada de destino. Plenário Virtual Tributário: Reconhecida a repercussão geral de debate sobre Cide Transferência de Tecnologia Encerrou-se dia 1º/9 a análise, pelo Plenário Virtual, da repercussão geral do tema tratado no RE 928.943/SP (min. Luiz Fux). Com dois votos contrários (ministros Teori Zavascki e Roberto Barroso) e oito favoráveis (ministros Luiz Fux, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Edson Fachin, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Celso de Mello), o Tema 914 foi reputado constitucional e com repercussão geral. Trata da "delimitação do perfil constitucional da contribuição incidente sobre os valores pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos, a cada mês, a residentes ou domiciliados no exterior, a título de remuneração decorrente de contratos que tenham por objeto licenças de uso e transferência de tecnologia, serviços técnicos e de assistência administrativa e semelhantes, bem como royalties de qualquer natureza, instituída pela lei 10.168/2000, e posteriormente alterada pela lei 10.332/2001". Destaque da semana Um pedido de vista do ministro Dias Toffoli suspendeu o julgamento do RE 878.694/MG, que discute a legitimidade do tratamento diferenciado dado a cônjuge e a companheiro, pelo artigo 1.790 do Código Civil, para fins de sucessão. O relator, ministro Luís Roberto Barroso, sugeriu a aplicação da seguinte tese: "no sistema constitucional vigente é inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros, devendo ser aplicado, em ambos os casos, o regime estabelecido no artigo 1.829 do Código Civil de 2002". Além da inconstitucionalidade do artigo 1.790, o ministro votou pela modulação dos efeitos da decisão para que não alcance sucessões que já tiveram sentenças transitadas em julgado ou partilhas extrajudiciais com escritura pública. Acompanharam-no os ministros Edson Fachin, Teori Zavascki, Rosa Weber, Luiz Fux, Celso de Mello e Cármen Lúcia. Tá na pauta Consta como sétimo item da pauta do Pleno do STF dia 8/9 (quinta-feira), o RE 592.891/SP (min. Rosa Weber), que visa saber se há direito ao creditamento do IPI na entrada de insumos provenientes da Zona Franca de Manaus adquiridos sob o regime de isenção. Já há dois votos negando provimento ao recurso da União. O caso volta com o voto-vista do ministro Teori Zavascki. Global Constitutionalism A Corte Constitucional da África do Sul comunicou os Poderes Executivo e Legislativo de que eles não podem demorar em seus deveres de emendar legislações reputadas inconstitucionais com o uso, pela Corte, do "apelo ao Legislador", por meio do qual se exorta os Poderes a modificarem a lei ou o ato normativo inconstitucional. A Corte concedeu a terceira extensão de prazo para que o Departamento de Agricultura, Floresta e Pesca, modifique a Lei de Proteção dos Animais (Performing Animals Protection Act). O departamento sofreu tal determinação em razão do julgamento de um caso ajuizado pela Sociedade Nacional para a Prevenção contra Crueldade com os Animais. Eventos Estão abertas as inscrições do IX Congresso Internacional de Direito Constitucional do IDP. Dentre os palestrantes, estará o jurista Albie Sachs, juiz da Corte Constitucional da África do Sul indicado por Nelson Mandela. Sachs fará o lançamento da sua obra "Vida e Direito: Uma Estranha Alquimia". O evento se dará nos dias 26, 27 e 28 de outubro. Obiter Dictum "Não fui eu!", disse o ministro Teori Zavascki, na inauguração do IDCON, no auditório do UniCeub, em Brasília, após esbarrar a mão no microfone, fazendo um forte estrondo e assustando a plateia. _________ Convite O autor convida os leitores que queiram escrever textos de até quatro páginas analisando casos ou julgamentos do STF. As análises devem ser enviadas por e-mail. (Clique aqui)
sexta-feira, 26 de agosto de 2016

Conversa Constitucional nº 5

Opinião: modulação de efeitos no STJ O STJ é uma Corte Suprema considerada a competência constitucional de guardião da harmonia da legislação Federal. Nesse sentido, o parágrafo 3º do art. 927 do CPC/2015 diz que, havendo alteração de jurisprudência pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos, poderá haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica. O dispositivo torna ainda mais clara a prerrogativa da qual sempre se revestiu o STJ. A Corte, ao definir a interpretação da lei Federal, garante a sua unidade no território nacional. Ela firma e supera precedentes, mas sempre conferindo estabilidade às suas decisões, assegurando isonomia e segurança jurídica. Nesse sentido, Luiz Guilherme Marinoni diz: "não há como ignorar o significado da revogação do precedente para a sociedade", uma vez que "os atos alicerçados em precedente dotado de autoridade em determinado momento histórico - e, assim, irradiador de confiança justificada - não podem ser desconsiderados pela decisão que o revoga, sob pena de violação à segurança jurídica e à confiança nos atos do Poder Público". O CPC/2015 fortaleceu os precedentes judiciais ao estabelecer, em seu art. 927, que a jurisprudência deverá balizar, de forma vinculante, a atuação dos juízes e tribunais, por meio de súmulas e decisões proferidas no âmbito de recursos especiais repetitivos. Logo, para que os jurisdicionados não tenham expectativas legítimas frustradas e sua segurança jurídica violada, é recomendada a modulação dos efeitos. Inconstitucionalidade do CPC/2015? O ministro Marco Aurélio indeferiu o pedido feito pelo Estado do Rio de Janeiro que requeria, à luz do CPC/2015, a suspensão de todos os processos que tramitem no território nacional discutindo tema relativo ao ICMS. A decisão se deu nos seguintes termos: "(...) 3. Consubstancia cláusula pétrea o acesso ao Judiciário, a pressupor a tramitação regular do processo: '(...) A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito' - inciso XXXV do artigo 5º da Constituição Federal. O Tribunal tem elevado resíduo de recursos extraordinários com repercussão geral admitida. Ante o desenvolvimento dos trabalhos no Plenário, o número de processos alvo de exame por assentada, há prognóstico segundo o qual será necessária uma dezena de anos para julgar-se os casos, isso sem cogitar-se da admissão de novos recursos, sob o ângulo da repercussão geral. Então, reconhecido o fato de o § 5º do artigo 1.035 do Código de Processo Civil preceituar 'a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional', uma vez reconhecida a repercussão geral, há de merecer alcance estrito. 4. Indefiro o pedido formalizado pelo Estado do Rio de Janeiro". Se, por um lado, ficou clara a persuasão dos recentes estudos do ministro Luís Roberto Barroso sobre o pensamento do ministro Marco Aurélio, que passa a reconhecer a necessidade de uma releitura da aplicação da repercussão geral, por outro a decisão dispara uma pergunta: sendo, o art. 1.035, § 5º do CPC/2015, norma existente, válida e eficaz, afastar-lhe a incidência não seria o mesmo que declarar-lhe a inconstitucionalidade, algo vedado pela súmula vinculante 10? Ajuste SINIEF-CONFAZ nº 8/2016 Foi ajuizada no STF a ADI 5582 (min. Celso de Mello), pelo governador do DF, contra o Ajuste SINIEF-CONFAZ nº 8/2016, que estabelece procedimentos relacionados com a entrega de bens e mercadorias a terceiros, adquiridos por órgãos ou entidades da Administração Pública Direta da União, Estados, DF e municípios, bem como suas autarquias e fundações públicas. Além de suscitar violação ao preceito da circulação de mercadoria, sustenta-se ter havido alteração indevida do sujeito ativo da relação tributária, já que, em razão do Ajuste, o ICMS relativo ao Estado de destino, introduzido pela EC 87/15, seria devido ao ente para o qual o bem/mercadoria for fisicamente encaminhado, e não para o destino jurídico da mercadoria. Lei 9.250/1995 (IRPF) Também foi ajuizada, pelo Conselho Federal da OAB, a ADI 5583 (min. Marco Aurélio), atacando a lei 9.250/1995, que altera a legislação do imposto de renda das pessoas físicas, ao fundamento de que o dispositivo legal afasta da qualidade de dependente o deficiente que exerce atividade laborativa ou possui capacidade para o trabalho, o que, não necessariamente, implica na sua independência financeira, pois, muitas vezes, permanecem recebendo auxílio dos pais e/ou familiares. A norma violaria o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), o direito ao trabalho (art. 6º, da CF) e à inclusão dos deficientes em sociedade (art. 24, XIV, da CF). Plenário Virtual Tributário Por um arrebatador placar de 11 x 0, foi recusada a repercussão geral da tese tributária sobre a incidência de IRPJ e de CSLL sobre os valores relativos aos créditos escriturais apurados no regime não-cumulativo da contribuição ao PIS e à COFINS. A votação se encerrou ontem, dia 25/8. Trata-se do ARE 957.842/AL (min. Teori Zavascki). Mas segue no Plenário Virtual o Tema 914/RG, sobre CIDE - remessas ao exterior com transferência de tecnologia. Pelo placar atual (5 x 2), já foi reconhecida a repercussão geral. Votaram pela presença os seguintes ministros: Luiz Fux, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Edson Fachin. Contra a repercussão geral, se manifestaram os ministros Roberto Barroso e Teori Zavascki. É o RE 928.943/SP. Não se sabe, ainda, se o ministro Luiz Fux acionará, imediatamente, o dispositivo do CPC/2015 que determina a suspensão de todos os casos que tratem do tema. Destaque da semana A semana foi marcada por movimentações quanto a um tema então reputado esquecido no STF: a tributação do licenciamento ou cessão de direitos por softwares. Primeiro, há o RE 688.223/PR (min. Luiz Fux), cujo tema, com repercussão geral, cuida da incidência de ISS sobre licenciamento ou cessão de direito por programas de computador personalizados (software). Em seguida, a ABRASF protocolou petição pedindo que este recurso seja apreciado em conjunto com a ADI 1945/MT (min. Cármen Lúcia) que trata da incidência, no Estado de Mato Grosso, de ICMS "sobre as operações com programa de computador - software -, ainda que realizadas por transferência eletrônica de dados", tendo como base de cálculo qualquer "parcela debitada do destinatário, inclusive o suporte informático, independentemente de sua denominação". Essa semana, a Confederação Nacional de Serviços (CNS) ajuizou uma ADI com pedido de cautelar visando a declarar a inconstitucionalidade da incidência de ICMS sobre programas de computador - software, com base na interpretação conforme a Constituição da LC 87/96 e da lei 6.374/89 do Estado de São Paulo, e suspender a eficácia e declarar a inconstitucionalidade do artigo 3º, II, da lei 8.198/1992, do decreto 61.522/2015 e do decreto 61.791/2016, todos do Estado de São Paulo, que instituem a incidência do ICMS sobre as operações com programas de computador - software. Trata-se da ADI 5576/SP, distribuída ao ministro Roberto Barroso. Tá na pauta Foi incluído como terceiro item da pauta na próxima quarta-feira (31/8), no Pleno, o RE 603.136/RJ, da Venbo Comércio de Alimentos Ltda contra o município do RJ, tendo, como amici curiae: (i) a ABRASF, (ii) o município de SP, (iii) a Associação Brasileira de Franchising, (iv) o município de BH e (v) a ABRAPOST. Discute-se a constitucionalidade da incidência do ISSQN sobre o contrato de franquia. Estão impedidos os ministros Luix Fux e Teori Zavascki. Nesse caso, o relator e as partes foram surpreendidos com o pedido extemporâneo de ingresso como amicus curiae da APOST - Associação Nacional das Entidades Regionais de Agências de Franquias Postais. O pedido foi indeferido pelo relator, ministro Gilmar Mendes. Análise Em 30/3/2016, o STF, julgando o RE 841.526/RS (min. Luiz Fux), decidiu que a morte de detento em estabelecimento penitenciário gera responsabilidade civil do Estado quando houver inobservância do seu dever específico de proteção. Trata-se do Tema 592/RG, cujos fatos trazem a condenação do Estado ao pagamento de indenização pela morte de um detento ocorrida na Penitenciária Estadual de Jacuí/RS. A morte ocorreu por enforcamento, entretanto, a necropsia não foi conclusiva a mostrar se em decorrência de homicídio ou suicídio. Como cidadã constitucional que é, a nossa jovem pesquisadora Karine Jordana, acadêmica de Direito do IDP, divide impressões sobre o caso num consistente material. Leia. Global Constitutionalism A Corte Constitucional da Coréia do Sul irá analisar a constitucionalidade da lei que obriga operadores de serviços móveis de telecomunicação a bloquearem quaisquer dados relativos a pornografia infantil. A Corte do Distrito de Suwon afirmou que um caso deverá ser encaminhado à Corte Constitucional contra a Lei de Proteção da Criança e do Adolescente contra Abuso Sexual. Um diretor de uma companhia foi indiciado por negligência ao permitir que pornografia infantil fosse compartilhada no Kakao Group, um serviço de mensagens. Esse é o primeiro caso no qual o chefe de uma operadora de serviço de telecomunicação móvel sofre uma acusação dessa natureza. A Corte Constitucional deverá definir se o dispositivo legal viola a liberdade de expressão e comunicação. Pela lei, operadores podem ser condenados em até três anos de prisão, além de sofrerem multas pesadas. Eventos Dia 2/9, das 9 às 12h e das 13 às 16h, os servidores da área jurídica e magistrados que atuam no STF contarão com a notável presença do colega Alexandre Freire, que, no Programa de Capacitação para o Novo CPC, ministrará a oficina: "Recursos Extraordinários Repetitivos: Juízo de admissibilidade, decisão e afetação, estrutura, procedimento e metodologia decisória". Doutor em Direito Processual Civil pela PUC/SP, Alexandre Freire é uma autoridade no assunto. Obiter Dictum Presidindo a sessão do Pleno ontem, e finalizando o demorado julgamento das ações diretas de inconstitucionalidade sobre a participação dos partidos chamados "nanicos" em debates televisivos, a ministra Cármen Lúcia começou a ver seus colegas e o douto representante do Ministério Público divergirem quanto à proclamação do resultado. Percebendo que não havia base no Regimento Interno da Corte para uma das manifestações, a vice-presidente alertou: "Vossa Excelência está regimentalmente nu!". A discussão se encerrou ali mesmo.
sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Conversa Constitucional nº 4

Opinião: novos dramas na repercussão geral Cidadãos vulneráveis passam a expor seus dramas gerados pela falta de celeridade no desfecho de temas com repercussão geral. A Associação dos Funcionários Aposentados e Pensionistas do Banco Nossa Caixa - AFACEESP, se manifestou no RE 594.435/SP que discute o alcance do art. 114 da Constituição Federal quanto a conflito de competência para processar e julgar causas que tratem da incidência de contribuição previdenciária instituída por Estado membro sobre complementação de proventos e de pensões. A Associação requer "seja dada prioridade ao presente recurso por encontrarem-se suspensos milhares de processos, cuja tutela jurisdicional tem natureza alimentar". Ela destaca "ter sido reconhecida a relevância da matéria há quase 7 anos, levando a que inúmeros processos estejam suspensos aguardando o seu julgamento". Noutro caso, alegando que o desfecho de um inventário está paralisado há cinco anos no TJ/SP em razão do não julgamento do RE 605.481/SP, um particular requereu a análise do tema 266 da repercussão geral, que trata da citação da Fazenda Pública para expedição de precatório complementar. A iniciativa teve por base o Estatuto do Idoso. Pessoas, dramaticamente impactadas pela não definição, célere, de temas com repercussão geral, tentam fazer suas vozes serem ouvidas perante a Corte, mostrando o peso da demora no julgamento de leading cases. Esse é um desafio sobre o qual a ministra Cármen Lúcia, prestes a assumir a presidência da Corte, há de se debruçar. Parecer da PGR sobre multa fiscal qualificada A Procuradoria-Geral da República apresentou parecer ao RE 736.090/SC (min. Luiz Fux) que trata do Tema 863/RG: limites da multa fiscal qualificada em razão de sonegação, fraude ou conluio, tendo em vista a vedação constitucional ao efeito confiscatório. O parecer opina pelo desprovimento do recurso, sugerindo a seguinte tese: "A multa fiscal qualificada de 150% sobre a diferença do imposto ou da contribuição submetidos a lançamento de ofício e não adimplidos ou não declarados, por força de sonegação, fraude ou conluio - prevista no art. 44, § 1º, da lei 9.430/1996, com a redação da lei 11.488/2007 -, não pode ser considerada abstratamente agressiva aos postulados da razoabilidade, proporcionalidade e capacidade contributiva nem vulnera o princípio da vedação ao caráter confiscatório, dependendo exclusivamente da análise do caso concreto a constatação de que o efeito cumulativo dos tributos e penalidades incidentes afeta, substancialmente e de maneira imoderada, o patrimônio e/ou a renda do contribuinte". SP pede ingresso como amicus O município de São Paulo pediu ingresso como amicus curiae no RE 928.902/SP (min. Teori Zavascki), da Caixa Econômica Federal contra o município de São Vicente, cujo tema cuida da existência, ou não, de imunidade tributária (CF, art. 150, VI, "a"), para efeito de IPTU, no tocante a bens imóveis mantidos sob a propriedade fiduciária da CEF, mas que não se comunicam com seu patrimônio, segundo a lei 10.188/01, porque integrados ao Programa de Arrendamento Residencial - PAR, criado e mantido pela União, nos termos da referida lei. Liberada ADI contra lei fluminense do petróleo O ministro Dias Toffoli liberou para inclusão em pauta de julgamento o pedido de medida cautelar na ADI 5481 ajuizada pela ABEP - Associação Brasileira de Empresas de Exploração e Produção de Petróleo e Gás. A ação visa à declaração de inconstitucionalidade da Lei do Estado do Rio de Janeiro nº 7.183/2015, cujo art. 1º institui a cobrança de ICMS sobre a "circulação de petróleo desde os poços de sua extração para a empresa concessionária". A ABEP já havia reiterado o pedido de exame da cautelar, mostrando os drásticos impactos da legislação no setor petrolífero. Plenário Virtual Tributário Já são três os ministros que entendem haver repercussão geral no Tema 914/RG, que discute a contribuição incidente sobre os valores pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos, a cada mês, a residentes ou domiciliados no exterior, a título de remuneração decorrente de contratos que tenham por objeto licenças de uso e transferência de tecnologia, serviços técnicos e de assistência administrativa e semelhantes, bem como royalties de qualquer natureza, instituída pela lei 10.168/2000, e posteriormente alterada pela lei 10.332/2001. O ministro Luís Roberto Barroso recusou a presença de repercussão geral, divergindo dos ministros Luiz Fux (relator), Dias Toffoli e Gilmar Mendes. A votação segue até dia 1/9. Além desse caso, também está no Plenário Virtual o ARE 957.842/AL, que discute a incidência de IRPJ e de CSLL sobre os valores relativos aos créditos escriturais apurados no regime não cumulativo da contribuição ao PIS e à COFINS. Neste, já são sete votos recusando a presença de natureza constitucional da discussão. A votação segue até dia 25/8. Destaque da semana O STF recusou os embargos de declaração opostos ao RE 599.362/RJ (min. Dias Toffoli), da Uniway - Cooperativa de Profissionais Liberais Ltda contra a União. Ao fazê-lo, a Corte firmou a seguinte tese: "a receita auferida pelas cooperativas de trabalho decorrentes dos atos (negócios jurídicos) firmados com terceiros se insere na materialidade da contribuição ao PIS/PASEP". As questões remanescentes quanto à tributação do ato cooperativo serão definidas no RE 672.215/CE, de relatoria do ministro Luís Roberto Barroso. Tá na Pauta Dois casos tributários importantes estão na pauta do STF para a quarta-feira da próxima semana. O primeiro deles, o RE 592.891/SP (min. Rosa Weber), da União contra a Nokia, visa saber se há direito ao creditamento do IPI na entrada de insumos provenientes da Zona Franca de Manaus adquiridos sob o regime de isenção. Já há dois votos negando provimento ao recurso da União. O caso volta com o voto-vista do ministro Teori Zavascki. Além dele, há o RE 651.703/PR (min. Luiz Fux), que visa saber se incide ISS sobre as atividades desenvolvidas por operadoras de planos de saúde. Neste, já há um voto contra o contribuinte. O caso volta com o voto-vista do ministro Marco Aurélio. Os referidos recursos são o sétimo e o oitavo da pauta, respectivamente. Análise O STF declarou a inconstitucionalidade da proibição de tatuagem a candidato em concurso público, num julgamento liderado pelo ministro Luiz Fux, que, contudo, fez algumas ressalvas. Trata-se do Tema 838/RG, que analisava a constitucionalidade da proibição contida em edital de concurso público de ingresso em cargo, emprego ou função pública para candidatos que tenham certos tipos de tatuagem em seu corpo. Como cidadã constitucional que é, a nossa jovem pesquisadora Jéssica Guedes, acadêmica de Direito do IDP, divide impressões sobre o caso num consistente material. Leia. Global Constitutionalism Na Zâmbia, o presidente do país, Edgar Lungu, após sofrer um grande revés político, viu o Parlamento ser dissolvido, com a consequente saída de todos os que formam o chamado "gabinete". Por meio de uma emenda constitucional, ele articulou a possibilidade de o gabinete permanecer atuando até o desfecho das novas eleições. A Corte Constitucional do país, contudo, entendeu que todos os membros devem deixar suas posições imediatamente. A iniciativa perante a Corte veio do Partido oposicionista Unidos por Desenvolvimento Nacional, que noticiou episódios de abuso eleitoral durante o período de campanha. As eleições estão em curso. Eventos A Escola Superior da Magistratura de Alagoas (Esmal), em parceria com a Enfam e o CEJ/CJF, promove o Seminário de Direito Constitucional e Administrativo, nos dias 18 e 19 de agosto, no auditório do CJF, em Brasília/DF. O ministro Gilmar Mendes, do STF, proferirá a aula magna. Obiter dictum Durante o julgamento dos dois recursos extraordinários que tratavam sobre a competência das câmaras de vereadores para julgar contas de prefeitos, chamado a se manifestar sobre o próprio voto previamente proferido, o ministro Luís Roberto Barroso emendou: "Eu, sem surpresa, estou acompanhando o meu próprio voto. Só não vou elogiar, porque não ficaria bem". O Plenário gargalhou.
sexta-feira, 12 de agosto de 2016

Conversa Constitucional nº 3

Opinião: O fim do poder e a atuação judicial Os fatos recentes da política brasileira mostram a marca desse século: o fim do poder; não em sua essência, mas na forma pela qual ele é exercido. Em março, o juiz Federal Itagiba Catta Preta suspendeu a nomeação do ex-presidente Lula para a Casa Civil. Um advogado havia feito o pedido numa ação popular. Em seguida, a juíza Federal Solange Salgado suspendeu o decreto presidencial de nomeação, para o Ministério da Justiça, de Wellington César. Dessa vez, foi um deputado Federal quem havia ajuizado a ação popular. O substituto, Eugênio Aragão, subprocurador-Geral da República, não teve melhor sorte. A juíza Federal Luciana Raquel, atendendo ao pedido feito por um cidadão em mais uma ação popular, suspendeu sua nomeação. É uma tendência. O intelectual venezuelano radicado nos Estados Unidos, Moisés Naím, em sua obra O Fim do Poder (Leya), recorda que "desde a eclosão da crise de 2008, aumentou o número de governos derrubados, gabinetes desfeitos, coalizões desgarradas, ministros demitidos e chefes de partido antes intocáveis que de repente viram-se forçados a renunciar" (p. 44). Na Tailândia, ao final de 2008, a Corte Constitucional dissolveu o partido que governava e que fora acusado de fraude eleitoral. Isso pôs fim à agitação popular e abriu espaço para um governo de coalizão. No Brasil, o pluralismo político, um dos fundamentos da República (art. 1º, V), abraça o pluripartidarismo (art. 17), resultando nos 35 partidos registrados no TSE. Tamanha complexidade também é vista na Índia, um gigante que, nas eleições de 2009, viu as cadeiras do parlamento serem divididas com 35 partidos. Nenhum deles obtém maioria absoluta desde 1984. "Maiorias absolutas estão em queda no mundo inteiro", alerta Moisés Naím, lembrando que, na Índia, a Suprema Corte aproveitou o vazio de poder fruto da medonha coalizão do primeiro-ministro Manmohan Singh e passou a controlar mais as ações estatais, chegando a investigar as nomeações presidenciais (p. 132). No Brasil, o pedido de impeachment contra a presidente Dilma foi formulado por cidadãos. A conclusão é que, agora, o poder é mais fácil de alcançar, mais complicado de exercer e mais provável de perder. E, no meio disso, está, sempre, o Judiciário. Quem se recusar a compreender isso não manterá o poder em suas mãos por muito tempo. A presidente Dilma está aí para provar isso. Aliás, já não está mais. Água mole em pedra dura O ministro Luís Roberto Barroso, imbuído de ideias de racionalização dos trabalhos da Suprema Corte e de uma cultura de valorização dos precedentes, está prestes a ganhar um aliado. Na sessão do Pleno na quarta-feira, o ministro Marco Aurélio registrou: 'Presidente, tenho refletido muito sobre a teoria dos precedentes, muito embora o nosso sistema seja do civil law. Isso, até mesmo diante de algumas vozes desse plenário. E dizem que eu sou muito rebelde quanto aos pronunciamentos do Supremo. Nem tanto assim!". Posteriormente, dirigindo-se diretamente ao ministro Barroso, o ministro Marco Aurélio arrematou: "É pena Vossa Excelência não ter ouvido eu dizer que estou refletindo sobre a teoria dos precedentes". Da união vem a força, sem dúvida. Plenário Virtual Tributário O Plenário Virtual conta com três votos (ministros Teori Zavascki, Edson Fachin e Celso de Mello) recusando a natureza constitucional na disputa quanto à incidência de IRPJ e de CSLL sobre os valores relativos aos créditos escriturais apurados no regime não cumulativo da contribuição ao PIS e à COFINS. Trata-se do ARE 957.842/AL, cujo relator, o min. Teori Zavascki, anotou: "não há matéria constitucional a ser analisada. Isso porque o Tribunal de origem decidiu a controvérsia (...) tão somente a partir da interpretação e aplicação das normas infraconstitucionais pertinentes". A votação quanto ao reconhecimento, ou não, da repercussão geral, segue até dia 25/8. Substituição de leading case sobre ICMS de empresa optante pelo Simples Nacional, em diferencial de alíquota O ministro Edson Fachin substituiu o RE 632.783/RO, da D'grife Comércio de Importação e Exportação Ltda, pelo RE 970.822/RS, da BP Comasa Comércio de Tecidos Ltda, para ser o leading case da repercussão geral sobre a cobrança do ICMS de empresa optante pelo Simples Nacional, na modalidade de cálculo diferencial de alíquota. O ministro contava com outros dois recursos vindos do Rio Grande do Sul para possível substituição: (i) o RE 970.819/RS, da Dismaco Distribuidora Médica Ltda - ME; (ii) e o RE 970.821/RS, de Jefferson Schneider de Barros & CIA Ltda - ME. A substituição é fruto de um equívoco anterior. É que o RE 632.783/RO tratava da substituição tributária, isto é, da possibilidade de impor-se ao optante do Simples Nacional o recolhimento da exação devida em momento anterior da cadeia produtiva, mesmo com nova retenção do ICMS no bojo do recolhimento nos termos do referido modelo simplificador e sem a possibilidade de uso dos créditos resultantes da operação. Contudo, a tese reconhecida pelo Plenário Virtual calca-se na necessidade de, em operações interestaduais, o optante do Simples Nacional, independentemente da destinação da mercadoria, recolher a diferença entre a alíquota interna e a internacional. Esta, passa a ser tratada no RE 970.822/RS. A tese conta com a participação dos seguintes amici curiae: Estado de SP; ABAPLAT - Associação Brasileira de Assessoria e Planejamento Tributário, Fiscal e Proteção aos Direitos do Consumidor e do Contribuinte; e FECOMÉRCIO/RS. Federalismo e telecomunicação A ACEL, ao lado da Abrafix, ajuizou seis ADIs contra leis estaduais que, no seu entender, violam a competência legisferante da União. São elas: (i) ADI 5568 (min. Teori Zavascki), contra a lei 10.572/2015, da Paraíba, que determina a obrigatoriedade de envio de contratos de adesão das empresas de telecomunicações para os consumidores por meio de carta registrada. Leia a inicial; (ii) ADI 5569 (min. Rosa Weber), contra a lei 4.824/2016, de Mato Grosso do Sul, que obriga as empresas prestadoras de serviços de internet móvel e de banda larga, na modalidade pós-paga, a apresentar ao consumidor, na fatura mensal, gráficos que informem a velocidade diária média de envio e recebimento de dados. Leia a inicial; (iii) ADI 5570 (min. Celso de Mello), contra a lei 15.637/2015, de Pernambuco, que obriga os estabelecimentos comerciais que vendem chips e aparelhos celulares a disponibilizar para o consumidor um mapa demonstrativo de qualidade do sinal por município. Leia a inicial; (iv) ADI 5572 (min. Teori Zavascki), contra a lei 18.572/2016, do Paraná, que obriga as empresas prestadoras de serviços de internet a apresentar ao consumidor, na fatura mensal, gráficos que informem a velocidade diária média de envio e recebimento de dados entregues no mês. Leia a inicial; (v) ADI 5574/PB (min. Edson Fachin), contra a lei 10.519/2015, da Paraíba, que determina o Bloqueio da Identidade Internacional do Equipamento Móvel - IMEI em até 24 horas. Leia a inicial; (vi) ADI 5575/PB (min. Luiz Fux), contra a lei 10.513/2015, da Paraíba, que dispõe sobre mensagem de advertência da operadora de telefonia fixa e celular, no âmbito do Estado da Paraíba, nas chamadas telefônicas originadas para outras operadoras. Leia a inicial. As ADIs pedem a concessão de cautelar para suspender as leis questionadas. Destaque da semana Em razão do julgamento, pelo STF, dos recursos extraordinários sobre a competência da Câmara de Vereadores para julgar contas de prefeitos, alguns casos tributários terminaram não sendo chamados. O primeiro foi o RE 592.891/SP (min. Rosa Weber) discutindo se há direito ao creditamento do IPI na entrada de insumos provenientes da Zona Franca de Manaus adquiridos sob o regime de isenção. Após o voto da ministra Rosa Weber (relatora), negando provimento ao recurso, no que foi acompanhada pelos ministros Edson Fachin e Roberto Barroso, por argumentos distintos, pediu vista o ministro Teori Zavascki. Declarou suspeição o ministro Luiz Fux. Também não foi chamado o RE 651.703/PR (min. Luiz Fux), cuja tese, com repercussão geral, é saber se incide ISS sobre as atividades desenvolvidas por operadoras de planos de saúde. Nesse caso, após o voto do relator, negando provimento ao recurso, pediu vista dos autos o ministro Marco Aurélio. Tá na pauta Consta como sexto item da pauta da sessão plenária do dia 17/8 (quarta-feira), o RE 688.223/PR (min. Luiz Fux), com repercussão geral, visando definir se é constitucional a incidência de ISS sobre contratos de licenciamento ou de cessão de programas de computador (software) desenvolvidos para clientes de forma personalizada. Dia seguinte, 18/8 (quinta-feira), estão pautados como quarto item os EDs no RE 599.362/RJ (min. Dias Toffoli), com repercussão geral, opostos em face de acórdão que, por unanimidade, declarou a incidência da contribuição ao PIS/PASEP sobre os atos (negócios jurídicos) praticados pela cooperativa com terceiros tomadores de serviço. Análise O PSB ajuizou, dia 7/6/2016, a ADI 5543, em face do ministro da Saúde e da ANVISA, sob a relatoria do ministro Edson Fachin. A ADI contesta o art. 64, IV, da portaria 158/2016 do Ministério da Saúde e o art. 25, XXX, "d", da resolução da Diretoria Colegiada - RDC 034/2014 da ANVISA. Esses dispositivos consideram homens que tiveram relações sexuais com outros homens e/ou as parceiras sexuais destes como inaptos temporários para a doação de sangue pelo período de 12 meses contados a partir da última relação sexual. Como cidadã constitucional que é, a nossa jovem pesquisadora Jéssica Guedes, acadêmica de Direito do IDP, divide impressões sobre o caso num consistente material. Leia aqui. Global Constitutionalism A Suprema Corte dos Estados Unidos suspendeu uma decisão judicial que determinava ao Conselho Escolar do município de Gloucester que permitisse que Gavin Grimm, de 17 anos, usasse o banheiro compatível com a sua identidade de gênero. A Suprema Corte definirá se o caso é consistente o suficiente para ser julgado. Pela decisão, o Conselho Escolar da Virgínia fica autorizado a impedir um transgênero de usar o banheiro dos garotos quando o período escolar se iniciar, próximo mês. Grimm, que nasceu com toda a anatomia feminina, mas se identifica como garoto, teve a permissão de usar o banheiro masculino por algumas semanas em 2014. Contudo, após a reclamação de pais e mães de alunos, o Conselho Escolar decidiu adotar a política segundo a qual os estudantes devem utilizar o banheiro que corresponda ao gênero biológico, ou um banheiro individual destinado a qualquer gênero. Na mesma semana, na Alemanha, um painel de magistrados do Tribunal Federal de Justiça rejeitou a adoção de "inter" como sendo um terceiro gênero. O painel definiu que a legislação alemã não permite uma terceira opção de gênero como "inter" ou "diverso" na certidão de nascimento. O grupo Terceira Opção (Third Option) prometeu levar a questão para a Corte Constitucional em setembro. No Brasil, uma aluna conseguiu na Justiça o direito de ser chamada pelo nome social em cerimônia de colação de grau. Após iniciativa da Comissão de Diversidade Sexual da OAB/DF, a liminar foi deferida pelo juiz Federal substituto Eduardo Santos da Rocha Penteado, da 14ª vara do DF. A aluna relatou que, em setembro de 2015, assumiu sua identidade de gênero (transexual feminino) e iniciou os procedimentos médicos e psicológicos para adequação. Por fim, no STF, pende de julgamento o RE 845.779/SC (min. Roberto Barroso), que visa saber se uma pessoa pode ou não ser tratada socialmente como se pertencesse a sexo diverso do qual se identifica e se apresenta publicamente. O tema e suas nuances, como se vê, são universais. Eventos Dia 15/8 (quinta-feira), às 10h, o ministro Edson Fachin ministrará a conferência "Federalismo Cooperativo e Jurisdição Constitucional" no Salão Nobre da Faculdade de Direito da UFPR. Dia seguinte, 16/8 (terça-feira), das 9h30 às 12h, ocorrerá na Sala das Sessões da 1ª Turma do STF a conferência "Eficácia dos Direitos Fundamentais em Relação aos Particulares: A jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal do Caso Lüth ao caso Flashmob". A conferencista será Sibylle Kessal-Wulf, ministra do Tribunal Constitucional Federal da Alemanha. O ministro Dias Toffoli presidirá a mesa. É um evento de inverno. Obiter Dictum No julgamento dos recursos extraordinários sobre a competência das câmaras de vereadores para julgar contas de prefeitos, o ministro Gilmar Mendes se pôs a criticar a ampliação do alcance da inelegibilidade de políticos. "Logo mais estarão tornando inelegível o filiado ao Corinthians", comentou. Quando viu o ministro Barroso perguntar sobre o Santos Futebol Clube, o ministro Gilmar, santista de carteirinha, não titubeou: "Não, não! O Santos, não".