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Conexão Suíça

Temas contemporâneos de Direito a partir da Suíça.

Rafael Carlsson Custódio
Após idas e vindas nas negociações para composição do novo governo alemão, finalmente foi selado o acordo necessários entre os novos eleitos e o novo líder, Olaf Scholz, oficialmente inaugura a era pós Merkel. A ex-chanceler, que ficou no poder por 16 anos, é agora sucedida por uma coalizão de forças que possui como característica fundante a agenda da sustentabilidade e mudanças climáticas. Na Alemanha, o Partido Verde representa a principal voz na agenda verde e, assim como em outros países europeus, a força de seus representantes tem crescido nas eleições legislativas. E após as eleições de novembro, o PV agora se tornou a terceira maior força política do pais, que é a maior economia da Europa. Assim é que o novo chanceler teve que negociar de modo amplo a adesão dos verdes em seu governo para lhe garantir governabilidade. O resultado? Os verdes comandarão nada menos do que 4 ministérios - e acho importante destacar que um deles é o das Relações Exteriores. O que isso significa? Partindo do pressuposto que dentro das principais funções da diplomacia nas economias de mercado estão as transações comerciais com outros países, significa que a partir de agora a agenda das relações internacionais alemã será pautada pelo diálogo entre economia e sustentabilidade. A maior economia europeia mais uma vez aponta para onde devem ir as relações comerciais entre países, e aqueles que pretendem participar desse novo momento das relações internacionais irão ter que se mexer e comprovar compromissos com o meio ambiente, especialmente aqueles voltados aos impactos socioambientais de suas produções. Quem não quiser participar do jogo verde alemão/europeu, irá perder mercado. Como já escrevi nesta coluna anteriormente, a Alemanha, mesmo antes das eleições, já indicava um interesse e foco na agenda da economia verde como indicou a recente aprovação da chamada Lei da Cadeia de Suprimentos (Supply Chain Act), que busca melhorar a proteção dos direitos humanos e normas ambientais nas cadeias de abastecimento globais. Para isso, a nova lei deposita nas empresas alemãs importadoras e exportadoras uma série de obrigações para que esses direitos sejam respeitados por suas cadeias de abastecimento. Assim, a nova coalizão que vira a página da Era Merkel nasce com a marca verde estampada em seu núcleo duro. E, sendo a maior economia europeia, ela puxará os demais parceiros - em especial da União Europeia - para o mesmo caminho. Por aqui trata-se, a meu ver, de mais uma evidência concreta para as empresas brasileiras (e autoridades públicas!) inseridas na economia de mercado da importância de se mexerem e buscarem aprimorar suas práticas com enfoque nas agendas de sustentabilidade, impactos sociais e governança (environmental, social and governance - ESG).
A questão não é mais de se o mercado de ESG valerá a pena para os principais escritórios de advocacia do Brasil, mas quando é o momento de abrir a área. A semana da COP261 repercute globalmente como um momento chave na discussão sobre sustentabilidade e sobre o compromisso dos países mais poluidores em mudarem de postura e investirem em práticas menos danosas ao meio ambiente e à comunidade em geral. Se, até o momento, algumas análises apontam grandes avanços em alguns dos pontos discutidos em Glasgow2, outras indicam erros e falta de compromisso real de vários atores3. Sem querer entrar na discussão de mérito sobre avanços e retrocessos - o que pretendo abordar em outro texto - o que me parece indiscutível é que a agenda da sustentabilidade não pode mais ser acusada de ser uma "moda" ou algo lateral aos principais atores do mercado. Ao contrário, na Europa, países como Alemanha, França, Reino Unido e Suíça, tem dado respostas concretas através de novas leis à pressão cada vez maior da sociedade para que 1) empresas apliquem concretamente medidas voltadas ao meio ambiente, à comunidade e de governança e 2) bancos financiem somente clientes que comprovem práticas de ESG. Os Estados Unidos, por sua vez, não só mudaram radicalmente de postura anti clima da administração Trump, como se colocam como liderança na agenda pelo clima, anunciando um pacote de investimentos nesta agenda de mais de 500 bilhões de dólares, ainda a ser votado pelo Congresso nacional4. Esses dois elementos, juntos, implicam em uma grande oportunidade para escritórios de advocacia ou consultorias especializadas na área, pois indicam que os investimentos verdes vieram para ficar, ao mesmo tempo que os investimentos tradicionais (= que não exigem critérios de ESG) se tornarão cada vez mais raros e, por isso, mais caros. Nesse sentido, as empresas no Brasil precisarão fazer a sua parte para participarem do jogo - ou, pode-se dizer, para surfarem a onda verde. E as bancas de advocacia que se preparam para isso certamente consumarão grandes negócios e parcerias, pois a demanda já existe e ficará ainda maior. É verdade que nem toda empresa ou investidor se convenceu da importância de mudar práticas antigas e criar novas práticas de ESG, mas o fato é que 1) seja pela pressão do mercado consumidor - cada vez mais atento aos produtos que compra e seu impacto na sociedade -, 2) seja pela pressão de atores externos como o poder público ou os bancos - que passarão a incorporar critérios de ESG em seus financiamentos -, a mudança fatalmente ocorrerá. A questão é quem irá largar na frente, e a advocacia especializada na área não conseguirá ignorar esse cenário. ____________ 1 A Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima de 2021 é a 26.ª conferência das partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, realizada entre 1 e 12 de novembro de 2021 na cidade de Glasgow, na Escócia. 2 https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2021/11/02/ambientalistas-veem-avancos-na-adesao-do-brasil-a-acordos-na-cop26-mas-dizem-que-e-preciso-garantir-resultados.ghtml 3 Greta Thunberg e COP26: as duras críticas da jovem ativista à cúpula sobre mudanças climáticas: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-59190477 4 https://www.poder360.com.br/internacional/setor-climatico-ultrapassa-us-500-bilhoes-no-plano-de-gastos-de-biden/
A Suíça estará com suas maiores autoridades políticas na 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP26), que acontecerá em Glasgow (Reino Unido) de 31 de outubro a 12 de novembro de 2021. O objetivo da conferência é adotar regras robustas para a implementação do Acordo de Paris. Os participantes também discutirão como os países podem intensificar seus esforços para reduzir suas emissões de gases de efeito estufa, de modo que o aquecimento global possa ser limitado a um aumento máximo de 1,5 grau. O financiamento de projetos de proteção do clima em países em desenvolvimento para o período posterior a 2025 é outro tema da agenda. No aguardado encontro serão discutidos acordos e regras para a efetiva implementação do Acordo do Clima de Paris, adotado em 2015. Um dos pontos centrais da discussão é como os países podem ser creditados pelas reduções de emissões alcançadas por meio de projetos de proteção do clima no exterior. Além disso, as partes pretendem chegar a acordo sobre uma nova meta de financiamento conjunto para apoiar medidas de proteção do clima nos países em desenvolvimento. A Suíça pretende reforçar seu comprometimento com o financiamento de projetos de proteção climática para países em desenvolvimento, como o Brasil. Nesse ponto, aliás, é que há maior pressão ao Governo Federal, que se vê demandado a ser mais "generoso", já que se trata de um dos países mais ricos do mundo. "Os 10% mais ricos do mundo são responsáveis ??por mais de 50% das emissões globais. Uma vez que dispõem dos meios para o fazer, os países ricos devem assumir a maior parte da responsabilidade para definir metas de redução ambiciosas e respeitar o Acordo de Paris", escreveram em recente artigo os representantes do Swiss Youth for Climate, uma associação independente criada em 2015 por jovens locais para pressionar o governo por mudanças mais efetivas à luz do Acordo de Paris.  Para os jovens pelo clima, espera-se "metas ainda mais ambiciosas e uma rápida implementação de políticas climáticas para reduzir as emissões na Suíça e em todo o mundo". Na semana final do encontro, o principal tema de discussão na COP26 será finanças sustentáveis e o governo suíço também quer mostrar força nessa agenda. Um dos pontos que será levado pelo país é da necessidade de aprimoramento dos dados do mercado financeiro no que tange à aspectos socioambientais dos investimentos. Isso porque, como já tratei em outro texto nesta coluna, a Suíça tem sofrido grande pressão para que fiscalize melhor os bancos e empresas instalados no país que têm sido acusados de greenwashing ao reportar supostos financiamentos verdes que, na verdade, seriam pouco sustentáveis. No país, os financiamentos que levam em conta critérios de ESG (environmental, social and governance) já são mais de 50% do total, e as autoridades políticas locais almejam que o impressionante volume de capital nesta agenda venha acompanhado de métricas claras de qualidade. E, para que isso aconteça, estarão na COP26 em peso mostrando caminhos.
Em mais um exemplo que evidencia a importância e o crescimento das políticas focadas em ESG (environmental, social and governance) na Europa, desta vez foi a Alemanha que inovou, ao aprovar recentemente a chamada Lei da Cadeia de Suprimentos (Supply Chain Act). O objetivo é melhorar a proteção dos direitos humanos nas cadeias de abastecimento globais, focando o cumprimento de normas básicas de direitos humanos, como a proibição do trabalho infantil e do trabalho forçado, e normas ambientais. Para isso, a nova lei deposita nas empresas alemãs com mais de três mil funcionários uma série de obrigações para que esses direitos sejam respeitados por suas cadeias de abastecimento. Ao definir a cadeia de suprimentos como todas as etapas necessárias para a fabricação de produtos e prestação de serviços, desde a extração da matéria-prima até a entrega ao cliente final, a nova lei estabelece critérios e impõe medidas para que sejam realizadas as devidas diligencias (due diligence). A lei ainda indica autoridade fiscalizatória especifica para verificar o cumprimento da lei, o Escritório Federal de Economia e Controle de Exportações. A autoridade passará a analisar os relatórios das empresas em relação ao cumprimento da norma e também terá capacidade de receber e investigar reclamações recebidas. No caso de violação aos termos da lei, o Escritório poderá impor multas de até 2% do faturamento anual da empresa e impugnar a sua participação em licitações públicas. A lei acabará impactando centenas empresas ao redor do mundo e com ainda mais relevância aquelas que exportam produtos agrícolas e minerais, dado o impacto que suas produções podem gerar no meio ambiente de origem, como o Brasil (um dos maiores exportadores de produtos agrícolas àquele país) e China. A Lei da Cadeia de Suprimentos (Supply Chain Act) alemã reposiciona o país na agenda da sustentabilidade e, tratando-se da maior economia da Europa, certamente orienta não só países como o Brasil enquanto agroexportador, mas também os vizinhos do velho continente, que percebem a movimentação como o novo caminho a ser traçado para aqueles que pretendem continuar realizando negócios com o país.
O direito de não produzir provas, comumente traduzido como o direito de um acusado ficar em silêncio durante seu interrogatório policial ou judicial, teve uma interpretação atualizada em território suíço. O Supremo Tribunal Federal do país decidiu em agosto deste ano (caso 1B_277/2021)  que o acusado, quando alvo de medida de busca e apreensão, pode, como reflexo direto de seu direito de não produzir prova contra si, requerer em tempo razoável que as provas apreendidas em seu domicílio sejam lacradas e, por isso, sejam declaradas inacessíveis aos órgãos de investigação. Se realizado o pedido, apenas uma nova decisão judicial específica sobre a questão pode determinar a perda desse direito do investigado. Na Suíça, a pessoa investigada que é alvo de busca e apreensão possui o direito de, durante a execução da medida, requerer à autoridade executora que determinados objetos sejam lacrados, como celulares, computadores, entre outros. E, ao realizar esse pedido, referidos objetos não podem ser acessados pelos órgãos investigativos - ao menos até que nova decisão judicial seja proferida nesse sentido. Esse pedido do acusado não é visto como obstáculo às investigações e sim como medida que assegura a legalidade da produção de provas e da cadeia de custódia das provas colhidas. A jurisprudência estabelece que se o investigado não exercer esse direito imediatamente - durante a apreensão dos objetos e dados - considera-se sua anuência ao acesso do material. No caso tratado pela Corte suíça, o investigado somente formalizou seu pedido de lacre das provas dois dias após a busca, e o tribunal local negou o pedido, alegando que tal manifestação estaria preclusa. Todavia, a Suprema Corte suíça considerou nova interpretação da norma no sentido de declarar ser legítimo aguardar um prazo razoável a partir da realização da busca e apreensão para que o investigado se manifeste formalmente sobre a questão. No país, após a coleta de provas em busca e apreensão as autoridades têm o ônus de indicar porque determinado objeto ou prova coletada deve ser "desselada" (= acessada) e possuem o prazo de 20 dias para realizar esse pedido ao judiciário local. Se não o fizerem, perdem o direito de acessar as informações, caso tenha havido pedido do investigado pelo sigilo. Nesse julgamento, o tribunal local decide também pela legalidade da própria medida de busca e apreensão, em um importante e ágil mecanismo de controle dos atos policiais e da produção de provas - que, aliás, lembra a ideia do chamado "juiz de garantias" no Brasil, uma importante inovação legislativa que, infelizmente, ainda se encontra suspensa por decisão do Min. Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal.
Não é segredo que o sistema financeiro suíço quer se colocar como o centro global dos financiamentos sustentáveis. Basta dizer que os financiamentos que levam em conta critérios de ESG (environmental, social and governance) já são mais de 50% do total no país. O outro lado da moeda é que com isso tem aumentado a pressão para que os bancos e investidores sejam melhor fiscalizados em relação aos critérios de ESG que utilizam e aos dados que produzem sobre preencherem ou não esses requisitos. Denúncias de práticas de greenwashing ("lavagem verde" = estratégia que busca vender falsamente ao consumidor a prática de sustentabilidade) são cada vez mais comuns e os bancos e empresas respondem que não há critérios claros sobre como definir o que é, de fato, uma prática sustentável. E que não há de se falar em greenwashing quando também não se tem parâmetros pré-definidos sobre seu conceito. Diante da falta de clareza sobre quais são os elementos mínimos que caracterizam práticas sustentáveis e suas fraudes, a Autoridade Supervisora do Mercado Financeiro da Suíça (FINMA) - entidade governamental responsável pela regulação financeira no país - e o Governo Federal decidiram trabalhar juntos na criação de métricas e parâmetros que padronizem as informações dos bancos e fundos de investimento relativas aos investimentos alinhados à sustentabilidade. Outro foco central do projeto, que deve ter seus resultados apresentados em 2022, é também definir o que é a fraude nessa área (greenwashing), já que também não há uma definição legal sobre o conceito. Com esses movimentos, a Suíça espera não só se consolidar como o mais importante centro de financiamento de práticas sustentáveis do mundo, mas principalmente se colocar como modelo em relação a boas práticas de prevenção e fiscalização fraudes de "lavagem verde". No Reino Unido o movimento é semelhante. A Autoridade de Concorrência e Mercados (CMA), principal autoridade de concorrência e do consumidor local, esquenta as mãos para deflagrar investigações nos próximos meses contra práticas de greenwashing. Seu alvo são as empresas britânicas ou estrangeiras que vendem para consumidores britânicos produtos alegadamente verdes, mas que são, na verdade, "normais". Para isso, a CMA elaborou e publicou recentemente um guia com parâmetros e diretrizes para orientar as empresas a não cometerem desvios ao anunciarem produtos supostamente sustentáveis e ajudar os consumidores a identificarem eventuais fraudes. O guia, CMA guidance on environmental claims on goods and services: Helping businesses comply with their consumer protection law obligations possui quase sessenta páginas e é baseado em seis princípios: i) As declarações dos produtos sobre sustentabilidade devem ser verdadeiras e precisas; ii) As reivindicações dos produtos serem sustentáveis devem ser claras e inequívocas; iii) As reivindicações também não devem omitir ou ocultar informações relevantes e importantes; iv) As comparações entre o produto verde e outros não verdes devem ser justas e significativas; v) As reivindicações dos produtos serem sustentáveis devem considerar todo o ciclo de vida do produto ou serviço; e, por fim, vi) As reivindicações devem ser fundamentadas. O guia não tem propriamente força de lei, mas a expectativa da CMA é que ele ajude a identificar más práticas do mercado, e ao fazê-lo, sua apuração pode ser considerada elemento de prova em ações contra as empresas perante agências reguladoras e o judiciário. Com foco na proteção ao consumidor e de seu direito de não ser vítima de greenwashing, a agência estabelece um incentivo/pressão fundamental às empresas, que precisarão acelerar seus processos internos para que evitem exposição e eventuais punições.  O guia, em inglês, pode ser encontrado aqui.
quarta-feira, 6 de outubro de 2021

Quem pagará a conta do home office na Suíça?

Uma decisão da Suprema Corte suíça em abril de 2019 passou relativamente desapercebida pela imprensa em geral à época, sendo considerada apenas um referencial para uma situação de trabalho até então incomum: a dos empregados em home office. No entanto, no atual contexto de discussão sobre o "novo normal", a decisão da mais alta Corte do país proferida no mundo pré-pandêmico ressurgiu com força, assustando as empresas no país e gerando grande debate na mídia jurídica. É que ao discutir o caso de um ex-empregado que alegava ter usado um dormitório de sua casa como escritório e arquivo/depósito e que, por isso, considerava justo o ressarcimento com os custos de seu aluguel residencial, o tribunal constitucional deu razão ao autor da ação. No caso, consta do acordão, o funcionário começou a trabalhar de casa pois a empresa ainda não tinha disponibilizado a ele um espaço no escritório e não havia em seu contrato de trabalho a possibilidade ou obrigatoriedade do trabalho de casa. Os meses foram passando sem qualquer novidade por parte da empresa e, após o término de seu contrato de trabalho - ele havia sido contratado por um período de tempo determinado -, decidiu então processar seu ex-empregador para que parte de seus custos do aluguel residencial durante o tempo do contrato fosse ressarcido. Apesar de os fatos do caso representarem uma situação muito específica - e principalmente, de não refletirem toda a discussão atual no pós pandemia e que obviamente mudou a percepção muitos sobre o tema -, boa parte dos jornais suíços tem trazido esse caso de volta ao debate público, gerando grande discussão entre empresas, advogados e compliance officers, pois alguns pontos da decisão poderiam ser utilizados por analogia a situações mais atuais e, por consequência, impactar os custos das empresas. Exemplo dos pontos em abertos: o Supremo Tribunal Federal suíço argumenta em um dos pontos do acordão que pouco importa quais os custos exatos que um empregado tem ao trabalhar em sua própria casa (e que ele não precisa fixar um montante específico), e sim a constatação que os custos são do interesse direto ou indireto do empregador. O debate de hoje, a partir desse raciocínio, é como definir e monetizar "interesses diretos" e "interesses indiretos". A decisão não traz pistas sobre isso. Segundo exemplo: outro ponto do acordão que tem gerado grande discussão no país é sobre o uso de parte do imóvel do empregado para "benefício da empresa" e se isso mereceria algum tipo de compensação. No caso julgado, o ex-funcionário alegou que os materiais de arquivo da empresa ocupavam muito espaço de sua casa, o que reforçou para a Corte a necessidade da indenização sobre o aluguel. Ainda que a questão de arquivo físico esteja cada vez menos presente com a digitalização do trabalho, se discute como se resolveriam situações diferentes de uso/ocupação do espaço da casa que gerariam impacto diferentes na vida do empregado. Por exemplo, nos casos de funcionários que moram com suas famílias X que moram sozinhos, esses impactos seriam diferentes e mereceriam respostas diferentes do empregador? Claro que essas discussões de hoje relativas ao caso de 2019 partem da premissa de ter havido obrigação ao funcionário de trabalhar ao menos parte de suas horas em regime home office. Para a legislação suíça, se a empresa disponibiliza espaço adequado para o trabalho presencial, mas o empregado opta por trabalhar de casa, não há qualquer ônus para o empregador - e não há grandes dúvidas sobre isso. Mesmo assim, diante de tantas novas dúvidas e também da constatação que o regime de trabalho híbrido (parte presencial e parte home office) será o novo normal pelo país, há grande expectativa sobre a necessidade de uma nova lei Federal regulamentando a questão, ao menos disciplinando pontos básicos para orientar as empresas e empregadores. A decisão do Supremo Tribunal Federal suíço no caso 4A_533/2018 pode ser acessada na íntegra, em alemão, aqui.