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Com a palavra, o consumidor

Análise dos principais problemas de consumo. O Direito do Consumidor de forma simples e didática.

Fernando Capez
terça-feira, 29 de junho de 2021

CDC, art. 68: Publicidade abusiva qualificada

O Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 67, prevê genericamente o crime de publicidade enganosa ou abusiva, com pena de detenção de  três meses a um ano, e multa. Enganosa é a que tem potencial para enganar e induzir a erro o consumidor, por falsear ou omitir a verdade (CDC, art. 37, § 1°). Abusiva é a discriminatória, que incite à violência, explore medo ou superstição, desrespeite valores ambientais, abuse da inexperiência de crianças ou induza o consumidor a se comportar de forma perigosa a sua saúde ou segurança (CDC, art. 37, § 2°). Em geral, tanto a publicidade enganosa, quanto a abusiva estão previstas no art. 67 do CDC. Quando se tratar, no entanto, especificamente de publicidade abusiva que induza o consumidor ao perigo, o crime será mais grave. É o que diz o art. 68 do CDC:  fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança - Pena: detenção de seis meses a dois anos e multa. Embora prevista em tipo autônomo, configura verdadeira qualificadora, elevando os patamares mínimo e máximo da pena abstratamente prevista no art. 67. É o caso, por exemplo, da publicidade que incentiva o uso de automóvel em excesso de velocidade e ultrapassagens  arriscadas, ou ainda, que induz ao uso excessivo de álcool. O sujeito ativo será tanto o fornecedor, quanto os profissionais de publicidade e veiculação. Sujeito passivo direto é o consumidor impactado pela publicidade e indireto, a coletividade. Não se admite modalidade culposa, mas apenas dolo direto (quando o agente sabe), ou indireto, quando (deveria saber). Admitir-se culpa implicaria em violar o princípio da proporcionalidade, punindo com a mesma pena infração dolosa e culposa.  Trata-se de crime formal, que se consuma com a veiculação, sendo desnecessária a ocorrência do dano. Exige-se, porém, probabilidade mínima de perigo, o qual deve ser capaz de induzir ao risco, sob pena de configurar crime impossível pela ineficácia absoluta do meio (CP, art. 17). A tentativa é admissível em tese, quando, debalde a publicidade potencialmente perigosa, nenhum consumidor a ela tenha acesso. É crime de ação penal pública incondicionada e de menor potencial ofensivo (lei 9.099/95), admitindo transação penal (art. 76) e suspensão condicional do processo (art. 89).
terça-feira, 22 de junho de 2021

Publicidade enganosa é crime

É crime contra o consumidor fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber enganosa ou abusiva - pena: detenção de 3 meses a 1 ano, mais multa. Previsto no art. 67 do CDC, a infração tutela o direito básico de informação do consumidor e a proteção contra a publicidade inverídica ou apelativa (CDC, art. 6º, IV). Enganosa é a informação falsa ou capaz de induzir o consumidor a erro (CDC, art. 37, § 1º). Abusiva é a publicidade discriminatória, que incite à violência, explore o medo ou superstição, se aproveite da deficiência de julgamento da criança, desrespeite valores ambientais, ou seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial à sua saúde ou segurança (CDC, art. 37, § 2º). A conduta pode ser praticada mediante ação ou omissão. Neste último caso, quando o fornecedor deixa de inserir a informação sobre dado essencial do produto ou serviço (CDC, art. 37, § 3º). O sujeito ativo será o fornecedor e os profissionais de publicidade, inclusive a agência terceirizada, quando tiver ciência dos vícios ou quando estes forem evidentes. O sujeito passivo será a sociedade e os consumidores especificamente lesados pela informação falsa ou abusiva. O elemento subjetivo é o dolo, direto, quando a publicidade é feita com a consciência de ser enganosa ou abusiva, ou eventual, quando o agente não tem certeza, mas não se importa. Trata-se de delito formal, cuja consumação ocorre no momento da veiculação da publicidade, independentemente do resultado. Caso seja verificado dano efetivo ao consumidor, o sujeito responderá também pelo crime do art. 7º, VII, lei 8.137/90 em concurso. A tentativa é admissível, quando, elaborada a publicidade, a mesma deixar de ser veiculada por circunstâncias alheias à vontade do agente. É infração de menor potencial ofensivo (lei 9.099/95, art. 61). A competência para julgamento é dos Juizados Especiais Criminais, sendo cabível a transação penal com o MP. Também é cabível a suspensão condicional do processo, quando frustrada a transação penal (lei 9.099/95, art. 89).
Consiste em fazer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir informação relevante sobre a natureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços. Incorre nas penas cominadas aquele que patrocinar tais ofertas (§1º). O consumidor tem direito a informações adequadas e claras sobre produtos e serviços, acompanhado da descrição da quantidade, característica, composição, qualidade, incidência de tributos e preços (CDC, art. 6º, III). Do mesmo modo, a oferta e a apresentação do produto devem conter informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em português sobre suas características, qualidade, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem e outros que influenciem na saúde e segurança do consumidor (CDC, art. 31). Por essa razão, a lei proíbe que o fornecedor faça afirmação falsa sobre o produto ou omita informações relevantes. É o caso do vendedor que intencionalmente omite o vencimento do prazo de validade do produto. O núcleo da figura típica compreende as condutas de "fazer", "patrocinar" e "omitir", tratando-se, portanto, de crime comissivo ou omissivo. O sujeito ativo é o fornecedor ou patrocinador do produto ou serviço. Por sua vez, os sujeitos passivos são todos os consumidores alcançados pela propaganda potencialmente enganosa. O crime é formal e se consuma com a mera realização da ação ou omissão, sendo desnecessário que o consumidor efetivamente receba a informação enganosa. A tentativa é incabível. O elemento subjetivo do tipo é o dolo, consistente na vontade livre e consciente de iludir o consumidor acerca das reais condições do produto ou serviço que está adquirindo, mediante informação falsa ou omissão relevante. Admite-se a modalidade culposa, prevista em seu § 2º. A pena prevista para a modalidade dolosa é de seis meses a dois anos, e multa, e da culposa, um a seis meses ou multa. Ambas configuram infração de menor potencial, admitida a transação penal e suspensão condicional do processo.
Este crime consiste em executar serviço de alto grau de periculosidade, contrariando determinação de autoridade competente. Pena: 6 meses a 2 anos e multa. Trata-se de um crime de desobediência, qualificado pela prestação de um serviço capaz de expor a vida e a saúde do consumidor a grave, iminente elevado risco de lesão. Em tempos de pandemia, no qual existe alto risco de contágio da Covid-19, incorre neste crime quem promove festas clandestinas sem autorização governamental, sendo este delito mais grave, que prevalece sobre o tipificado pelo art. 268 do Código Penal, face ao princípio da especialidade. A lei pretende proteger a incolumidade dos consumidores, individual ou coletivamente considerados. Trata-se de crime de perigo abstrato, não sendo necessário que o consumidor efetivamente sofra algum gravame para que se perfaça, bastando, desta forma, a mera exposição do consumidor ao risco. O sujeito ativo é o fornecedor que presta o serviço. Por sua vez, os sujeitos passivos são os consumidores diretamente relacionados à contratação do serviço e terceiros que também forem expostos a perigo em razão deste. No caso das festas clandestinas, além dos participantes, todos os demais que vierem a ser expostos ao risco potencial de contágio de Covid-19 pela aglomeração. Em caso de dano físico ou morte, o executor do serviço responderá cumulativamente por lesão corporal ou homicídio culposo (CDC, art. 65, parág. único). Trata-se de crime de ação penal pública incondicionada e de menor potencial ofensivo, admitida a transação penal.
O delito consiste em "deixar de comunicar à autoridade competente e aos consumidores a nocividade ou periculosidade de produtos, cujo conhecimento seja posterior à sua colocação no mercado". A pena será de detenção de 6 meses a 2 anos, e multa. Nas mesmas penas incorre quem deixar de retirar produtos nocivos ou perigosos do mercado imediatamente após determinação da autoridade competente. O fornecedor, ciente dos riscos do produto, tem o dever de informar todos os interessados, de modo que responderá pelo crime se avisar as autoridades, mas não os consumidores, e vice-versa. Alertado pela autoridade, deve retirá-lo imediatamente do mercado. Nocividade e periculosidade constituem os elementos normativos do tipo. Nocivo é o produto, cujo malefício é intrínseco, como, por exemplo, aquele que pode gerar doenças degenerativas ou outro problema de saúde. Perigoso é o produto que, em si, não contém nenhum mal, mas cuja utilização pode por em risco a vida do consumidor, como peças pequenas que podem ser engolidas por crianças. Caso ocorra a constatação de periculosidade ou nocividade de grande dimensão, onde a mera comunicação não será suficiente para excluir o risco ao consumidor, far-se-á necessária a imediata retirada do produto de circulação, situação que levará o fornecedor a incorrer nas penas do § 1º, caso assim não proceda. O sujeito ativo é o fornecedor, sendo sujeitos passivos os consumidores que efetivamente adquiriram o produto e a sociedade exposta ao risco potencial de adquirir produtos nocivos ou perigosos. Não há transcurso de prazo definido para que o crime se consuma, sendo garantido prazo razoável ao fornecedor para tomar as atitudes necessárias no sentido de informar consumidores e autoridades sobre o perigo detectado. Quando a periculosidade ou nocividade do produto for de grande proporção (CP, art. 64, § 1º), o crime se consumará se a retirada do produto de circulação não for imediata. Por tratar-se de crime de omissivo próprio, cuja consumação ocorre no momento da omissão, sendo incabível a tentativa. A infração é considerada de menor potencial ofensivo, admitida a transação penal.
Previsto no art. 63, caput do CDC, o delito consiste em o fornecedor deixar de inserir sinais ou dizeres ostensivos acerca da nocividade ou periculosidade de um produto ou serviço em embalagens, invólucros, recipientes e publicidade. Nocivo é aquilo cujo uso por si só, causa um dano à saúde, como produto químico. Perigoso é o que pode provocar algum acidente, como peças soltas de brinquedo que podem ser engolidas (seu uso em si, não é nocivo, mas potencialmente danoso). Para sua caracterização, basta a falta da informação em um dos lugares, a qual deverá estar presente na embalagem, invólucro, recipiente e também na publicidade. Trata-se de delito omissivo (não fazer) e formal (consuma-se com a mera omissão, independentemente de eventual dano, pelo qual o agente também responderá).             Em seu § 1º, o art. 63 prevê outro crime, relacionado agora à prestação de serviço, o qual consiste em o fornecedor deixar de alertar, mediante recomendações escritas ostensivas, a periculosidade ou nocividade do serviço que foi contratado. Aqui também a forma é omissiva, aplicando-se, por exemplo, a empresas de limpeza ou dedetizadoras, que deixam de informar os riscos e cuidados a serem tomados pelo consumidor. O sujeito ativo é o fabricante, a quem incumbem os alertas sobre os riscos do produto e o comerciante, caso este tenha retirado o aviso do invólucro, recipiente ou embalagem, deixando de informar o consumidor da periculosidade ou nocividade. Os sujeitos passivos são os consumidores que adquirem o produto e a coletividade como um todo, exposta ao risco, sendo crime de dupla subjetividade passiva. A infração é de perigo abstrato, sendo incabível, a tentativa. Consuma-se com a disponibilização do produto sem os avisos, ou com o início da prestação de serviço. O elemento subjetivo do tipo é o dolo, consistente na vontade livre e consciente do agente em não informar ao consumidor sobre o perigo do produto, admitindo-se também a forma culposa com pena mais leve. A pena será de 6 meses a 2 anos e multa, na modalidade dolosa, e de 1 a 6 meses ou multa, quando se tratar de crime culposo. O crime é de menor potencial ofensivo, admitindo-se a transação penal e a suspensão condicional do processo (Lei n. 9.99;1995). A ação penal é pública incondicionada, não dependendo de representação do ofendido.
terça-feira, 18 de maio de 2021

Tutela penal das relações de consumo

A defesa do consumidor é garantia constitucional do cidadão, derivação dos direitos humanos de terceira geração, não pode ser abolida por emenda constitucional, sendo considerada cláusula pétrea (CF, art. 5º, XXXII e 60, § 4º, IV) e constitui princípio da ordem econômica (CF, art. 170). Defender o consumidor é também defender o fornecedor contra a concorrência desleal de quem age com má-fé. No Código de Defesa do Consumidor as infrações penais estão previstas nos artigos 63 a 74, protegendo a regularidade das relações de consumo e os interesses do consumidor. As penas máximas não excedem a dois anos, sendo infrações de menor potencial ofensivo, às quais se aplicam o art. 61 da lei 9.099/1995, que prevê a transação penal. Muito embora o CDC, em seu art. 3º, seja expresso quanto à possibilidade de responsabilização administrativa e civil das pessoas jurídicas, ele não alcança a responsabilidade penal, que somente é possível em matéria de crime ambiental (CF, art. 225, § 3º). No sistema acusatório, a base da responsabilidade penal é a vontade humana, mediante exigência de dolo e culpa e de culpabilidade. A regra é de que só pessoas físicas cometem crimes. De acordo com o art. 75 do CDC "quem, de qualquer forma, concorrer para os crimes referidos neste Código, incide nas penas a esses cominadas na medida de sua culpabilidade, bem como o diretor, administrador ou gerente da pessoa jurídica que promover, permitir ou de qualquer forma aprovar o fornecimento, oferta, exposição à venda ou manutenção em depósito de produtos ou a oferta de prestação de serviços nas condições por ele proibidas". Nesse caso, são necessários elementos idôneos de prova e demonstração de dolo ou culpa na conduta. Na esfera criminal, não existe inversão do ônus da prova, nem presunção de culpa. Quem acusa, deve provar - princípio da não culpabilidade (CF, art. 5º, LVII). A responsabilidade penal difere da civil e administrativa, nas quais estão presentes as garantias ao consumidor da inversão do ônus da prova, presunção de veracidade das alegações e da responsabilidade objetiva e solidária do fornecedor em toda a cadeia produtiva, ressalvadas apenas as hipóteses de culpa exclusiva da vítima, de terceiro, inexistência do defeito ou negativa de autoria (CDC, art. 12, § 3º).