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Processo Disciplinar no Sistema OAB e atualidades jurídicas

Análise de casos e questões do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB.

Antonio Alberto do Vale Cerqueira
Conforme já exposto na primeira parte desse artigo (clique aqui para ler) o procedimento previsto no artigo 70, §3º da Lei Federal 8.906/94 é cautelar e não se confunde com o processo administrativo disciplinar. Eventual suspensão não tem natureza jurídica de sanção disciplinar, todavia, autoriza a realização da detração caso o advogado seja suspenso preventivamente e à frente sofra também a condenação à suspensão. A imposição da suspensão preventiva exige não só o cumprimento dos requisitos objetivos lançados no texto da norma (clique aqui), mas também subjetivos. São requisitos subjetivos exigidos para a cautelar: a tipicidade administrativa, a lesividade, a publicidade negativa livre e a contemporaneidade. Tipicidade administrativa: A norma do artigo 70, §3º do EAOAB possui natureza híbrida, pois embora tenha em sua maioria carga adjetiva processual, também é norma material, pois exige para a aplicação da suspensão preventiva que: (i) o fato se amolde à hipótese do tipo administrativo, ou seja, que esteja presente a tipicidade; e que (ii) a conduta obrigatoriamente seja causadora de "repercussão prejudicial à dignidade da advocacia". Entende-se por tipicidade administrativa que o evento ocorrido no mundo dos fatos encontre perfeito encaixe à norma administrativa repressiva, nesse caso as hipóteses legais arroladas pelo sistema OAB para as infrações ético-disciplinares. O conceito de tipicidade é originário do direito penal, derivado do princípio da legalidade. Nelson Hungria explica: "O fato elementar do crime deve corresponder fielmente à descrição contida no preceito legal incriminador (considerado em si mesmo ou em conexão com a regra geral sobre a tentativa). A esse caráter do fato chama-se tipicidade"1. Isso posto, sempre que se estiver diante de algum evento onde potencialmente seria aplicável a suspensão preventiva, deve o Tribunal de Ética inicialmente analisar se o fato encontra previsão legal nas normas repressivas do sistema OAB. Somente após essa checagem, deve-se passar à exegese do segundo critério, melhor visto à frente, que é a repercussão negativa da conduta. Ainda sobre a tipicidade administrativa, o ato não precisa necessariamente estar vinculado à atividade da profissão. Na verdade, embora seja essa a hipótese legal mais comum como ocorreu no exemplo onde o advogado, no exercício de sua função, foi preso em flagrante delito repassando drogas a seu cliente no interior do presídio, não é sempre que ocorrerá. Imagine-se assim que advogado seja preso em flagrante praticando o estupro de uma criança com 12 anos de idade. Indubitavelmente estava ali muito afastado do exercício da profissão, todavia, inequivocamente, praticou o crime infamante tratado no artigo 34, inciso XXVIII do EAOAB, tornando perfeita, possível e absolutamente recomendável a suspensão preventiva do profissional. A assertiva é ratificada pela exegese dos incisos do artigo 34 em comento, haja vista que as condutas mais graves lá previstas não estão relacionadas ao exercício da profissão, conforme os incisos XXV (conduta incompatível com a advocacia); XXVII (torna-se inidôneo) e XXVII (praticar crime infamante). Lesividade: decorre da necessidade do fato ocorrido no mundo dos fatos, além de encontrar a necessária tipicidade administrativa, também ser suficientemente grave para reverberar socialmente com força tal que cause "repercussão prejudicial à dignidade da advocacia", o que importa reconhecer que não será qualquer fato administrativamente típico e reprovável apto à suspensão cautelar. É dizer que ainda que haja o enquadramento do fato à conduta; que ela seja prejudicial à dignidade da advocacia e se torne pública, deverá a OAB avaliar se possui lesividade suficiente para que o advogado seja submetido a tão extrema medida como a suspensão preventiva. Essa análise, por óbvio, é altamente subjetiva e caberá ao Tribunal de Ética e Disciplina avaliar com absoluta responsabilidade e isenção se o fato foi suficientemente lesivo para atacar os bens jurídicos que a norma tenta resguardar, ou seja, a grandeza, a integridade, a respeitabilidade e a credibilidade da advocacia. Em regra, as normas repressivas exigem para sua aplicação a lesividade: "A tipicidade penal exige uma ofensa de alguma gravidade aos bens jurídicos protegidos, pois nem sempre qualquer ofensa a esses bens ou interesses é suficiente para configurar o injusto típico. Segundo esse princípio, que Klaus Tiedemann chamou de princípio de bagatela, é imperativa uma efetiva proporcionalidade entre a gravidade da conduta que se pretende punir e a drasticidade da intervenção estatal. Amiúde, condutas que se amoldam a determinado tipo penal, sob o ponto de vista formal, não apresentam nenhuma relevância material. Nessas circunstâncias, pode-se afastar liminarmente a tipicidade penal porque em verdade o bem jurídico não chegou a ser lesado".2 Na suspensão preventiva não é diferente e o pensamento do nobre doutrinador se encaixa perfeitamente ao procedimento ora em estudo, ou seja, deve o Tribunal de Ética e Disciplina perquirir a lesividade do fato em relação aos bens jurídicos protegidos pela norma. Nesse sentido, a título de exemplo, após o advento do provimento 205/2021 do Conselho Federal da OAB são comuns vídeos vexatórios realizados por advogados nas mais diversas redes sociais, como Instagram e TikTok, que embora sejam públicos e revelem conteúdo absolutamente inapropriado à conduta que se espera da nobreza da profissão, não têm o suficiente potencial lesivo à advocacia como um todo, limitando-se a exposição negativa à esfera pessoal do próprio autor do vídeo. Nesse sentido, já decidiu o TED OAB/GO: "(...) 2. A suspensão preventiva é fato excepcional, extraordinário, e não deve ser banalizada, deve ser aplicada para condutas cuja magnitude possa prejudicar a dignidade da advocacia, que possa envolver imediatas repercussões no exercício profissional do representado, cujas repercussões ultrapassam as pessoas envolvidas e causem dano à dignidade coletiva da advocacia. 3. É notório que qualquer fato que envolva advogado pode alcançar proporções midiáticas, muitos meios de comunicação fazem questão de dar ênfase ao termo "ADVOGADO", no entanto, temos que tomar cuidado para não abrir precedentes para que qualquer notícia de cunho inconveniente que envolva advogado seja passível de suspensão preventiva" (Processo nº 202209943, com Relatoria de Gesner Souto de Souza, TED/OAB/GO, julgado em 14/10/2022).  Por outro lado, já se decidiu cabível a suspensão preventiva em caso de advogado acusado de tentativa de homicídio por haver atropelado servidora pública após briga de trânsito; advogado que realizou o exame de Ordem para bacharel, declarando-se como o candidato; que utilizou-se de carro de som para angariar clientela em determinado bairro; que arregimentou vendedores para, munidos de procurações e contratos, visitar moradores de empreendimento narrando falsos e fazendo promessas de resultados para angariar clientela3, de advogado que realizou audiência de instrução no TED, fazendo se passar pelo próprio pai, também advogado e representado4, de advogado que apropriou-se de verbas alimentares de cliente, praticando locupletamento5, tentativa de entrega de drogas em presídio a cliente preso6 e diversos outros. Publicidade negativa livre: Não basta o fato ser grave, deve ser público e extravasar a pessoa do advogado e daqueles diretamente envolvidos. O evento tem obrigatoriamente que se tornar conhecido por um número indeterminado de pessoas, sendo indiferente que sejam da comunidade jurídica do local onde ocorreu ou da população. Ensina a doutrina que "não basta qualquer ofensa ou infração, por mais grave que seja, ou a autoridade do ofendido. A suspensão preventiva, por envolver imediatas repercussões no exercício profissional, apenas é admissível em situações notórias e públicas, cujas repercussões ultrapassem as pessoas envolvidas e causem dano à dignidade coletiva da advocacia".7 Cumpre também afirmar que é absolutamente prescindível que o fato seja veiculado por veículos de mídia conhecidos, como os jornais, canais de televisão, o rádio ou portais de notícia na internet, pois a norma é aberta, exigindo somente a ampla divulgação da matéria. Nessa esteira, basta imaginar que em uma cidade de população média existam 10.000 advogados com cerca de 500 diferentes grupos no aplicativo "whatsapp": "Advocacia de família"; "Amigos Advogados"; "Penalistas" etc. Em determinado dia da semana, passam a circular em todos esses grupos vídeos que revelam um conhecido advogado da cidade, na saída do Fórum, espancando uma colega advogada adversa em um processo, após a realização de uma audiência de acordo onde acabaram discutindo perante o Juiz.    Ora, é patente que o fato se tornará conhecido não só por toda a advocacia da cidade, mas também será divulgado em milhares de outros grupos nacionalmente. Uma vez tendo o evento se tornado fato notório, é dever do Tribunal de Ética agir rapidamente, até porque, como se verá à frente, exige-se a contemporaneidade para a suspensão preventiva. Ainda sobre as mídias tradicionais e para reafirmar sua prescindibilidade para a suspensão preventiva, hoje é muito comum que referidos veículos de comunicação venham a obter suas matérias via das redes sociais, especialmente o whatsapp, cuja velocidade de divulgação de uma notícia é a uma das mais rápidas hoje conhecidas, ao menos no Brasil que tem predileção pelo aplicativo de mensagens. Assim, no exemplo, provavelmente haveria notícias posteriormente na mídia, todavia, não seriam exigíveis para a instauração do procedimento de suspensão preventiva. A publicidade não pode ser provocada pela vítima ou terceiros com o objetivo de prejudicar o advogado, salvo se após a veiculação provocada a notícia passar a circular de forma livre. No exemplo fornecido, se a filmagem fosse realizada por uma colega vítima e divulgada em todos os seus grupos de "whatsapp", mas não fosse reverberada, repassada e não houvesse comentários e discussões sobre o fato, não estariam presentes os elementos aptos à suspensão preventiva. Em regra, todavia, todas as vezes em que o fato for suficientemente grave, a notícia irá inevitavelmente se espalhar de forma natural. Contemporaneidade: também é elemento inarredável da suspensão preventiva a velocidade entre a ocorrência do fato e a ação do Tribunal de Ética e Disciplina, inclusive para a realização da Sessão Especial prevista no artigo 70, §3º, ou seja, não basta que o Tribunal instaure o procedimento, é necessário que consiga notificar o autor da ação e realize a Sessão em interregno temporal razoável em relação ao fato ou será injustificada a suspensão. Exatamente por essa razão somos críticos à atual posição do CFOAB sobre a competência para a suspensão preventiva ser exclusivamente da Seccional que mantém a inscrição originária do advogado e não daquela onde o fato ocorreu, haja vista se tratar de competência concorrente, conforme já explicamos anteriormente (clique aqui para ler) sendo perfeitamente possível e até recomendável que a OAB detentora da originária inscrição só venha a agir em caso de omissão daquela onde o fato ocorreu. Nesse sentido, será muito difícil que a OAB da inscrição mantenha a contemporaneidade se o fato ocorreu em outra Seccional e o advogado objeto da suspensão preventiva estiver preso ou mesmo arrolar testemunhas que presenciaram o evento, que, portanto, estarão no local onde ocorreu a infração e não onde reside a Seccional originária. É praticamente certo que, uma vez tendo pertinência a prova testemunhal e, portanto, não podendo ser indeferida, o requisito da contemporaneidade será perdido, em face da dificuldade da OAB intimar o advogado e/ou ouvir as testemunhas. É claro que a Seccional poderia contar com a ajuda daquela onde o fato ocorreu, todavia, deve-se lembrar que não há no sistema OAB regulamentação efetiva sobre colaboração entre Seccionais, carta precatória administrativa ou atos análogos que viessem a suprir tal carência, além do que deve ser considerado o custo para tais ações. Em conclusão, para a ocorrência da suspensão preventiva, devem estar presentes ao caso concreto os requisitos objetivos da competência, da correta intimação, do contraditório, a ampla defesa e o prazo legal; também os requisitos subjetivos da tipicidade administrativa, da lesividade, a publicidade negativa livre e a contemporaneidade. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) __________ 1 HUNGRIA, Nelson, 1891-1969. Comentários ao Código Penal, Volume I, Tomo II: Arts. 11 ao 27. Por Nelson Hungria e Heleno Fragoso. 5ª ed. Rio de Janeiro, Forense, 1978, p. 20; 2 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, Volume 1. 26ª ed. rev e at. São Paulo: Saraiva, 2020, p. 140; 3 Decisões do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB, Seccional do Distrito Federal; 4 Processo 202208090, julgado em 25/08/2022, TED OAB/DF; 5 Processo 202000059, julgado em 09/03/2020, TED OAB/DF; 6 Processo 2022.004221-5, julgado em 20/09/2022, TED OAB/RO; 7 PAULO, Lôbo. Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 290;
Entre os artigos 68 e 77 parágrafo único, a Lei Federal 8.906/94 trata de regras gerais aos processos na OAB, sendo que no artigo 70, §3º faz referência à suspensão preventiva: "§ 3º O Tribunal de Ética e Disciplina do Conselho onde o acusado tenha inscrição principal pode suspendê-lo preventivamente, em caso de repercussão prejudicial à dignidade da advocacia, depois de ouvi-lo em sessão especial para a qual deve ser notificado a comparecer, salvo se não atender à notificação. Neste caso, o processo disciplinar deve ser concluído no prazo máximo de noventa dias". Vale anotar que não havia previsão legal para a suspensão preventiva na lei Federal 4.512/1963, o antigo estatuto, ou seja, o instituto jurídico nasce em 1994 com a entrada em vigor da Lei 8.906, pujantes, portanto, os elevados valores constitucionais de nossa recente Constituição de 1988. É dizer que mesmo vigentes os preceitos da Carta Maior, dentre os quais o livre exercício da profissão previsto no artigo 5º, inciso XIII, ainda assim o legislador ordinário entendeu haver casos de gravidade tal que justificariam medida tão extrema quanto a suspensão cautelar do advogado. Ainda sobre a importância do instituto à OAB, em data recente a Casa da Advocacia teve a chance de mitigar ou majorar os efeitos e alcance da norma, via da resolução 02/2015, o novo Código de Ética e Disciplina da OAB. O novo CED reforçou a mais valia do instituto da suspensão preventiva, ratificando em seu artigo 71, inciso IV, que cabe aos Tribunais de Ética e Disciplina "IV - suspender, preventivamente, o acusado, em caso de conduta suscetível de acarretar repercussão prejudicial à advocacia, nos termos do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil". A suspensão preventiva não tem natureza jurídica de sanção disciplinar, ou seja, não se confunde com aquela prevista nos artigos 35, II e 37 do Estatuto da Advocacia. Aqui, contrariamente, trata-se de medida cautelar garantida à OAB contra o advogado e a favor da advocacia e da população. Exatamente por essa razão, não se pode concordar com a construção de que a suspensão preventiva só terá cabimento quando a sanção administrativa possível para o fato for a suspensão ou a exclusão, haja vista que tratando-se de medida cautelar, deve ser plenamente cabível para qualquer infração ético-disciplinar, desde que a conduta esteja a causar repercussão prejudicial à dignidade da advocacia. Aqui, aliás, vale chamar atenção à redação do artigo 144-A do Regulamento Geral da OAB que declara que o recurso cabível da decisão que decreta a suspensão preventiva deve ser formado por instrumento, todavia, inapropriadamente, se utiliza da expressão "pena preventiva" para definir a medida cautelar. Pois bem, há requisitos objetivos e subjetivos para a possibilidade da suspensão preventiva, alguns decorrentes da Lei Federal e outros da jurisprudência. Como requisitos objetivos temos a competência, a correta intimação, o contraditório, a ampla defesa e o prazo legal. Competência: conforme tivemos oportunidade de abordar em outra oportunidade (clique aqui para ler) a competência para o julgamento da suspensão preventiva não será da Seccional onde o fato ocorrer, mas daquela em que o advogado tiver sua inscrição principal. Não há qualquer dúvida que o dispositivo legal do §3º é absolutamente incoerente e incorreto, diga-se. Nesse sentido, vale idealizar o seguinte exemplo: advogada inscrita na OAB de Minas Gerais é presa em flagrante realizando prova do exame de ordem em Brasília para favorecer bacharel em direito mediante recebimento de valores, notícia que toma conta dos jornais do Distrito Federal, mas não tem repercussão nacional, assim como também não em Minas Gerais. A hipótese é a do artigo 70, §3º do EAOAB, podendo até mesmo ser considerada crime infamante apto a processo de exclusão, entretanto, a OAB/DF só poderá instaurar o processo disciplinar, nada podendo fazer quanto à suspensão preventiva, pois nesse caso o ato caberá à Seccional de Minas Gerais. Nesse caso, a Seccional competente não vivenciou o problema, está afastada das provas e a advocacia local não sofreu a "repercussão prejudicial à dignidade da advocacia", ou seja, a norma acaba por mitigar seu próprio valor e alcance, assim como se distancia da vontade do legislador.  Na verdade, impressiona a incoerência legal, ou seja, enquanto a OAB do local da infração - que no exemplo seria a OAB/DF - instaura processo disciplinar contra o advogado, fica à mercê da OAB onde está a inscrição originária para eventual suspensão preventiva, continuando a sofrer as consequências diretas da "repercussão prejudicial à dignidade da advocacia". Não há qualquer resposta social e é imposto grave prejuízo à comunidade jurídica onde o fato ocorreu. A própria OAB já reconheceu o desacerto da norma na proposição n.º 2011.19.05768-01/COP (SGD: 49.0000.2011.002369-2/COP), confira-se: "Proposta de alteração da redação do art. 70, § 3º do estatuto da advocacia. nos casos em que o advogado cometeu falta ética que cause repercussão prejudicial à dignidade da advocacia, é possível, desde logo, ser o profissional suspenso preventivamente, pelo prazo máximo de noventa dias, pelo Tribunal de Ética e Disciplina da Seccional onde o acusado tenha inscrição principal (art. 70, § 3º da lei 8.906/94). Determinação que conflita com o caput do art. 70, que determina seja o processo instaurado, processado e julgado pelo Tribunal de Ética e Disciplina da Seccional em cuja base territorial tenha ocorrido a infração. Proposta de alteração na redação do § 3º do art. 70, modificando a expressão 'onde o acusado tenha inscrição principal' para 'onde o acusado estiver sendo processado'. Proposição aprovada. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda, os Senhores Conselheiros integrantes do Conselho Pleno do CFOAB, por maioria, em aprovar a proposição de alteração da redação do art. 70, § 3º do Estatuto da Advocacia, modificando a expressão 'onde o acusado tenha inscrição principal' para 'onde o acusado estiver sendo processado'". (Ementa n. 040/2012/COP. Relator Conselheiro Federal Romeu Felipe Bacellar Filho (PR), DOU. S. 1, 09/10/2012, p. 124). Nada obstante, o Conselho Federal ratificou a aplicação da redação legal no Conflito de Competência n.º 49.0000.2018.002527-8/OEP: "Processo disciplinar. Tramitação. Conselho Seccional em cuja base territorial se tenha constatado a prática da infração disciplinar. Suspensão preventiva. Competência do Conselho em que o advogado mantém inscrição principal. Necessidade de sobrestamento do processo disciplinar enquanto o Conselho Seccional de inscrição principal analisa a suspensão preventiva. Desnecessidade do trânsito em julgado para prosseguimento do processo disciplinar, visto que o art. 77 do EAOAB não atribui efeito suspensivo a recurso interposto em sede de processo de suspensão preventiva, hipótese em que, seja qual for a decisão proferida na sessão especial do Tribunal de Ética e Disciplina, deve o processo disciplinar em trâmite no outro Conselho Seccional retomar seu curso regular (...)". (Relator: Conselheiro Federal Daniel Blume Pereira de Almeida (MA). Ementa 082/2019/OEP. Conflito de competência. DEOAB, a. 1, n. 194, 3.10.2019, p. 6). A posição mais correta é a da proposição n.º 2011.19.05768-01/COP (SGD: 49.0000.2011.002369-2/COP) do CFOAB, ou seja, não se trata de competência exclusiva apta a gerar nulidade, mas concorrente. A razão exsurge da hermenêutica das normas aplicáveis, pois o artigo 70 trata de norma de competência geral, onde o legislador determina que cabe exclusivamente à Seccional onde o fato ocorreu, a instauração do processo disciplinar, sendo que no §3º a expressão utilizada é que a Seccional detentora da inscrição originária pode realizar a suspensão preventiva. Esse entendimento, aliás, para além da clara interpretação gramatical, é facilmente alcançável pela interpretação lógica e teleológica da norma, pois faz muito mais sentido que a OAB onde o advogado tenha a inscrição, face à eventual omissão daquela Seccional onde ocorreu o fato, tenha interesse na suspensão preventiva do advogado, daí utilizando-se de sua faculdade em realizar o procedimento cautelar. Essa coerência hermenêutica exsurge claríssima quando se imagina situações em que haja diligências a serem realizadas onde o fato ocorreu e não na Seccional onde o advogado tenha a inscrição. Imagine-se, assim, que havendo interesse na suspensão preventiva pela Seccional da inscrição originária, o advogado esteja preso na Seccional onde o fato ocorreu; que, em sua defesa na cautelar arrole testemunhas que estão onde o fato ocorreu. Somente esses dois critérios, quase por certo, acarretarão uma enorme perda de tempo para a realização da Sessão, o que provavelmente importará em custos para a OAB e na perda do critério da contemporaneidade do ato, razão pela qual é inimaginável a dificuldade processual para dar efetividade ao entendimento estabelecido no Conflito de Competência n.º 49.0000.2018.002527-8/OEP. Por todas essas razões, a lei trata de uma faculdade da Seccional da inscrição originária ter a possibilidade (poder/dever) de imputar ao advogado responsabilidade por fatos ocorridos fora de sua extensão territorial, caso a OAB que sofreu a conduta não tome as necessárias providências. Assim, no exemplo, caso a Seccional do DF ficasse inerte em suspender a advogada, poderia Minas Gerais fazê-lo, de forma a moralizar a advocacia local.  Daí a aplicação do jargão jurídico de quem pode o mais, pode o menos, para entender que as competências são concorrentes, ou seja, se a OAB do local do fato é competente para a instauração do processo disciplinar, muito mais para a suspensão preventiva. Assim, caso estabelecido conflito de competência, deverá a questão ser resolvida pelas regras gerais do Código de Processo Penal, em especial a prevenção.   Em conclusão, embora presente a competência concorrente, a OAB e a advocacia perderam a ótima oportunidade de inclusão no texto da lei 14.365/2022 das alterações aprovadas pela proposição n.º 2011.19.05768-01/COP, à nova redação da 8.906/94. Seria um bom caminho que no projeto de lei para reparar o erro legislativo que glosou da redação do Estatuto da Advocacia o artigo 7º, §2º, que estabelecia a imunidade profissional do advogado, também fosse incluída a nova redação ao §3º do artigo 70. Intimação: o §3º também estabelece que o advogado objeto do processo cautelar deverá ser notificado a comparecer à Sessão extraordinária de suspensão preventiva, o que deverá ocorrer na forma do quanto prescreve o Regulamento Geral da OAB: "Art. 137-D A notificação inicial para a apresentação de defesa prévia ou manifestação em processo administrativo perante a OAB deverá ser feita através de correspondência, com aviso de recebimento, enviada para o endereço profissional ou residencial constante do cadastro do Conselho Seccional'. Essa notificação deverá conceder ao advogado um interregno mínimo de 15 dias úteis entre a data da notificação válida e a Sessão especial, conforme redação do artigo 139 do Regulamento Geral da OAB, alterado pela Resolução 09/2016 do Conselho Federal: "Art. 139. Todos os prazos processuais necessários à manifestação de advogados, estagiários e terceiros, nos processos em geral da OAB, são de quinze dias, computados somente os dias úteis e contados do primeiro dia útil seguinte, seja da publicação da decisão no Diário Eletrônico da OAB, seja da data do recebimento da notificação, anotada pela Secretaria do órgão da OAB ou pelo agente dos Correios". Vale lembrar que é comezinho no processo disciplinar que a notificação enviada ao endereço do advogado cadastrado na OAB retorne sem cumprimento, todavia, nesse caso, a intimação será considerada cumprida, conforme previsão do §1º do mesmo artigo do Regulamento Geral: "Incumbe ao advogado manter sempre atualizado o seu endereço residencial e profissional no cadastro do Conselho Seccional, presumindo-se recebida a correspondência enviada para o endereço nele constante". Apenas quando a notificação não for cumprida por circunstâncias outras, como não se encontrar o endereço fornecido, o ato será realizado por edital, conforme prevê o "§ 2º Frustrada a entrega da notificação de que trata o caput deste artigo, será a mesma realizada através de edital, a ser publicado na imprensa oficial do Estado". Como a suspensão preventiva é caso sui generis cabível apenas quando a infração a ser apurada tem relevante gravidade, é comum que o autor da conduta esteja preso. Nesses casos, a OAB deverá enviar um representante ao presídio para realizar a intimação pessoal do advogado, cabendo-lhe então patrocinar sua defesa, conforme já decidiu o Conselho Federal: "RECURSO N. 49.0000.2018.009428-4/SCA-TTU. (...) 1) Ao advogado é assegurado o direito de comparecer à sessão especial para análise de sua suspensão preventiva, conforme preconiza o art. 70, § 3º, do EAOAB. Contudo, estando recolhido o advogado ao cárcere, a notificação para a sessão deve ser feita por meio de requisição ao Diretor do estabelecimento prisional, que deverá avaliar as possiblidades de apresentação do advogado preso ao Tribunal de Ética e Disciplina, não sendo um direito subjetivo absoluto, razão pela qual não configura qualquer violação ao sigilo do processo disciplinar. (...). 4) Na hipótese em que o advogado está preso, recolhido em estabelecimento prisional, por ausência de regulamentação específica, deve ser adotada a legislação processual penal comum, de forma subsidiária. E, nesse ponto, o artigo 360 do Código de Processo Penal estabelece que se o réu estiver preso, será pessoalmente citado. Ou seja, na hipótese em que o advogado estiver recolhido ao cárcere, sua notificação para a defesa prévia - que possui natureza de citação - deverá ser feita de forma pessoal, por servidor da OAB, ainda mais nos casos em que o advogado patrocina sua defesa em causa própria. 5) Recurso parcialmente provido, para anular o processo desde o despacho que decretou a revelia do advogado e, consequentemente, declarar extinta a punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva". (EMENTA N. 017/2019/SCA-TTU.DEOAB, Relator: Conselheiro Federal Charlles Sales Bordalo (AP). a. 1, n. 25, 4.2.2019). Uma vez intimado o advogado, caso não compareça, cabe ao Tribunal de Ética e Disciplina nomear defensor dativo, por aplicação analógica dos artigos 73, §4º da 8.906/94 e 59, §2º do CED, sob pena de violação do direito de defesa, passível de invalidação do ato em caso de prova de prejuízo processual, aplicável o entendimento da Súmula 523 do STF. Ao defensor, todavia, é assegurada toda a independência funcional, para optar ou não por atos de defesa, como a realização de sustentação oral ou o arrolamento de testemunhas. Na ausência de qualquer desses atos por opção da defesa dativa, não há se falar em nulidade. Contraditório: no ato da notificação do advogado para comparecimento à Sessão especial, o instrumento de intimação deve vir obrigatoriamente acompanhado da cópia da decisão ou portaria de abertura do procedimento de suspensão preventiva, sendo que referido documento deve permitir que o advogado entenda as razões pelas quais tem contra si o pedido cautelar de suspensão de seus direitos de advogado. Outrossim, imediatamente após requerer vista dos autos, deve ser garantido amplo acesso, inclusive a mídias que eventualmente acompanhem o procedimento. Em face da digitalização dos processos, é muito comum que alguns Tribunais optem por não levar uma cópia impressa da decisão originária, mas no documento de notificação enviar um link de acesso a todo o conteúdo do processo, bastando ao advogado acessar para ter acesso ao inteiro teor dos autos. Ampla defesa: embora o processo de suspensão preventiva tenha sua concepção pela celeridade, sendo cautelar e com rito sumaríssimo, inclusive exigindo-se a contemporaneidade da decisão em relação ao fato, deve sempre ser resguardado ao advogado o amplo direito à defesa, inclusive com a possível produção de provas, na forma do quanto prescreve o Código de Ética e Disciplina: "Art. 63. Na hipótese prevista no art. 70, § 3º, do EAOAB, em sessão especial designada pelo Presidente do Tribunal, serão facultadas ao representado ou ao seu defensor a apresentação de defesa, a produção de prova e a sustentação oral". Nesse caso, é facultada à defesa a ampla prova, que não só venha a atacar as motivações para a suspenção preventiva, como a eventual repercussão negativa à advocacia, mas também a própria tipicidade administrativa da conduta, por exemplo, para provar que o fato é atípico em relação às hipóteses do artigo 34 da lei Federal 8.906/94 ou para provar que o enquadramento está incorrendo em tese de desclassificação, obrigando assim o Tribunal à análise da conduta, ainda que na forma perfunctória característica do rito cautelar. A regulação da amplitude probatória é pela aplicação supletiva do artigo 369 do CPC, que declara que as "partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz", ou seja, na Sessão especial poderá o advogado requerer todo e qualquer tipo de prova que entender pertinente, como a testemunhal, a documental, a pericial, a inspeção, etc. Caberá ao Julgador, motivadamente, decidir quais provas irá deferir ou indeferir, expondo suas razões. Prazo legal: o último requisito objetivo é o prazo da suspensão. O §3º do artigo 70 do EAOAB declara que o processo disciplinar deve ser concluído no prazo máximo de noventa dias, o que entendeu-se ser o prazo máximo possível para a suspensão preventiva, conforme Consulta n.º 2010.27.04699-0 do CFOAB. Em recente data o Conselho Federal ratificou esse posicionamento: "Art. 70, § 3º, do EAOAB é norma cogente. Suspensão preventiva. Prazo de suspensão preventiva. Máximo de 90 (noventa) dias. Consulta n. 2010.27.04699-0/OEP. Proteção da dignidade da advocacia. Medida Cautelar deferida para limitar o prazo de suspensão ao máximo estabelecido". (Medida Cautelar n. 49.0000.2019.010185-6/SCA. EMENTA n.º 037/2019/SCA. Relator: Conselheiro Federal Luiz Tadeu Guardiero Azevedo (TO). DEOAB, a. 1, n. 244, 13.12.2019, p. 3). Considerando tratar-se de prazo máximo, assim como da natureza cautelar do procedimento, o Tribunal de Ética e Disciplina não deve se prender à obrigatoriedade de suspensão pelos noventa dias, podendo aplicar a medida cautelar de suspensão preventiva pelo prazo que entender necessário e suficiente à interrupção da conduta, limitando-se somente ao teto dos noventa dias. Assim, entendendo que uma cautelar de suspensão de trinta dias pode ser suficiente para alcançar o objetivo desejado, ou seja, compelir o advogado a não mais fazer e/ou a interromper a prática do ato causador da repercussão prejudicial à dignidade da advocacia, não há nenhum óbice para essa redução, ainda mais porque está a beneficiar o representado. Outro ponto importante são os noventa dias como prazo máximo para a conclusão do processo disciplinar, o que é uma utopia. Ora, conforme a já referida redação do artigo 139 do Regulamento Geral da OAB, os prazos dos processos internos da OAB passaram a ser todos de quinze dias úteis. Se assim é, então apenas a soma dos prazos para apresentação de defesa prévia; para alegações finais; e para o julgamento já alcança 45 dias úteis, cerca de 72 dias corridos. Isso sem contar nos prazos internos para a instrução, agenda de Sessões, tempo de análise do processo pelo relator, pedidos de vista, quantidade de processos e outros. Vale ressaltar que não há qualquer previsão legal para invalidação das decisões, decadência, prescrição e outros institutos a atacar a persecutio administrativa em caso de extravasamento desse prazo legal, ou seja, não há qualquer consequência legal prevista, salvo, claro, se por ato doloso e deliberado que vise prejudicar ou beneficiar o representado. Para além, a prática na atuação dos Tribunais de Ética e Disciplina bem revela a dinâmica do processo cautelar de suspensão preventiva com o processo administrativo. Realizada a Sessão Especial e determinada a suspensão do advogado, é instaurado o processo disciplinar. Paralelamente, ao advogado suspenso é resguardado o direito a recurso sem efetivo suspensivo, conforme o artigo 77 do EOAB. Enquanto isso, o processo disciplinar avança em sua marcha normal, até que advenha eventual decisão colegiada para condenar ou absolver administrativamente o representado, independente do prazo de noventa dias. Quando do julgamento do processo disciplinar, aliás, pode ser que o advogado há muito já tenha cumprido a medida cautelar dos noventa dias ou prazo menor, o que lhe garantirá o direito à detração, conforme já explicamos em outro artigo (clique aqui). __________ Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui)
Conforme nossos escritos, a OAB avançou muito no tema publicidade e marketing jurídico na advocacia, principalmente com a entrada em vigor do Provimento 205/21, conforme bem demonstrado no artigo conjunto "Marketing jurídico e o processo disciplinar na OAB", escrito com a advogada especialista na matéria Professora Juliana Pacheco (clique aqui para ler). O provimento é estruturado a partir do artigo 2º, que conceitua diversos termos inseridos pela norma no ordenamento jurídico do sistema OAB: "Art. 2º Para fins deste provimento devem ser observados os seguintes conceitos: I - Marketing jurídico: Especialização do marketing destinada aos profissionais da área jurídica, consistente na utilização de estratégias planejadas para alcançar objetivos do exercício da advocacia; II - Marketing de conteúdos jurídicos: estratégia de marketing que se utiliza da criação e da divulgação de conteúdos jurídicos, disponibilizados por meio de ferramentas de comunicação, voltada para informar o público e para a consolidação profissional do(a) advogado(a) ou escritório de advocacia; III - Publicidade: meio pelo qual se tornam públicas as informações a respeito de pessoas, ideias, serviços ou produtos, utilizando os meios de comunicação disponíveis, desde que não vedados pelo Código de Ética e Disciplina da Advocacia; IV - Publicidade profissional: meio utilizado para tornar pública as informações atinentes ao exercício profissional, bem como os dados do perfil da pessoa física ou jurídica inscrita na Ordem dos Advogados do Brasil, utilizando os meios de comunicação disponíveis, desde que não vedados pelo Código de Ética e Disciplina da Advocacia; V - Publicidade de conteúdos jurídicos: divulgação destinada a levar ao conhecimento do público conteúdos jurídicos; VI - Publicidade ativa: divulgação capaz de atingir número indeterminado de pessoas, mesmo que elas não tenham buscado informações acerca do anunciante ou dos temas anunciados; VII - Publicidade passiva: divulgação capaz de atingir somente público certo que tenha buscado informações acerca do anunciante ou dos temas anunciados, bem como por aqueles que concordem previamente com o recebimento do anúncio; VIII - Captação de clientela: para fins deste provimento, é a utilização de mecanismos de marketing que, de forma ativa, independentemente do resultado obtido, se destinam a angariar clientes pela indução à contratação dos serviços ou estímulo do litígio, sem prejuízo do estabelecido no Código de Ética e Disciplina e regramentos próprios. Após realizar a classificação acima, a norma passa a descrever o que é permitido ou proibido à advocacia, exatamente à luz desses novos conceitos. O artigo 4º, foco do presente estudo, trata da hipótese do artigo 2º, inciso II, ou seja, o marketing de conteúdos jurídicos, que poderá ser realizado com as seguintes balizas: "poderá ser utilizada a publicidade ativa ou passiva, desde que não esteja incutida a mercantilização, a captação de clientela ou o emprego excessivo de recursos financeiros, sendo admitida a utilização de anúncios, pagos ou não, nos meios de comunicação, exceto nos meios vedados pelo art. 40 do Código de Ética e Disciplina e desde que respeitados os limites impostos pelo inciso V do mesmo artigo e pelo Anexo Único deste provimento". Ao final, o Provimento contém seu anexo único, que dispõe que a criação de conteúdos deve "ser orientada pelo caráter técnico informativo, sem divulgação de resultados concretos obtidos, clientes, valores ou gratuidade". A fusão das normas permissivas acima leva o exegeta à seguinte conclusão: é possível ao advogado se utilizar do marketing de conteúdos jurídicos via da divulgação em ferramentas de comunicação - preponderantemente na atualidade pelas redes sociais - desde que tal estratégia seja voltada para informar o público e para sua consolidação profissional ou de seu escritório, ou seja, não há, em absoluto, qualquer traço de angariamento ou captação de clientes. É ato de construção de autoridade e nada mais. Esse ato de marketing de conteúdos jurídicos via de publicidade ativa ou passiva, poderá ser realizado até mesmo com anúncios pagos, todavia, não poderão esses conteúdos conter nem mesmo de forma subliminar a intenção de mercantilização do trabalho ou captação de clientela, vedados também a divulgação de resultados obtidos, clientes, valores ou gratuidade. Pois bem, inarredável assumir que a inserção no micro ordenamento jurídico do sistema OAB de norma legal com tamanha riqueza de conteúdos e novos conceitos, teve como consequência direta o surgimento de novas interpretações decorrentes da hermenêutica jurídica, inclusive com o nascimento de novos conceitos, que vão além daqueles inseridos no próprio Provimento. Nesse sentido, nasce aqui o conceito de fishing, que é exatamente a conduta do advogado que, na exploração do marketing de conteúdos jurídicos, extravasa os limites permissivos da norma para praticar, ainda que de forma dissimulada, ato de captação de clientela. Esse ato, embora discreto, dissimulado e proibido pela norma, tem sido recorrente nas redes sociais e quase sempre realizado sobre o mesmo molde, ou seja, o(a) advogado(a) expõe o tema jurídico de interesse comum e, ao final, oferta seus serviços para atrair o potencial cliente com uma frase discretamente colocada: " ­- quer saber mais sobre o assunto? Entre em contado que iremos ajudá-lo", ou algo análogo. Vale anotar que em momento algum o Provimento n.º 205/2021 ou o Código de Ética e Disciplina autorizam referida conduta, que é sim uma forma discreta de atrair o potencial cliente, de chamar sua atenção, ou seja, inequivocamente o ato tem o interesse de "fisgar" a atenção do potencial cliente, atraindo-o à esfera de atuação do profissional, ou seja, é ato de captação de clientela, expressamente proibido por todas as normas que regulam a matéria. Nesse sentido, o próprio Provimento conceitua em seu artigo 2º, inciso VIII a captação de clientela, destacando ser aquela prática destinada a atrair clientes pela indução à contratação dos serviços. O conceito é aberto e genérico, exatamente porque o legislador administrativo tinha como escopo tornar a norma ampla para comportar toda e qualquer conduta com tal finalidade, ainda que velada ou dissimulada. Da mesma forma, o artigo 39 do novo Código de Ética e Disciplina, a recente Resolução 02/15, proclama: "A publicidade profissional do advogado tem caráter meramente informativo e deve primar pela discrição e sobriedade, não podendo configurar captação de clientela ou mercantilização da profissão." De forma idêntica, prevê o artigo 34, inciso IV da Lei Federal 8.906/94, tratar-se de falta disciplinar o ato de "angariar ou captar causas, com ou sem a intervenção de terceiros". Em conclusão, muito embora o Provimento 205/21 seja elogiosa norma de auxílio à advocacia nesses tempos difíceis da explosão do número de advogados no país, assim como tenha caráter permissivo, não alterou em definitivo a reprovação de qualquer prática - ainda que dissimulada - de captação de clientela, aí incluído o fishing. Aliás, contrariamente, o Provimento faz questão de ratificar expressamente essa proibição, reforçando conceitos que já faziam parte da Lei 8.906/94 e do Código de Ética e Disciplina da OAB.  ___________ *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui)
Na oportunidade da confecção da PARTE 1 desse estudo (clique aqui para ler), tratamos das regras gerais de competência do processo disciplinar da OAB, além de outros temas. Foram estabelecidas questões legais, processuais e jurisprudenciais para (a) o recebimento, processamento e a delegação de poderes originários no âmbito da OAB para as representações disciplinares; (b) organização funcional dos órgãos do processo disciplinar na OAB; (c) competência das Comissões de Admissibilidade e o conflito de interesse com a Presidência da Seccional, apontando como ideal a delegação de referida competência aos Tribunais de Ética e Disciplina; (d) regra geral de competência na forma do artigo 70 da Lei Federal 8.906/94 e algumas de suas exceções; (e) foro por prerrogativa de função; (f) regras de competência no pedido de revisão; (g) regras de competência no pedido de reabilitação, além de outras notas sobre matérias correlatas. Nessa PARTE 2, entretanto, iremos nos ater a questões práticas do cotidiano do processo disciplinar. Publicidade irregular veiculada nacionalmente em rede social a partir da OAB originária do advogado, que acaba sendo representado em outra Seccional: entendemos que diante dessa hipótese, a competência caberá à Seccional que primeiro realizar a representação e estabelecer a prevenção, segundo a regra do artigo 70 da Lei Federal 8.906/94: "Art. 70. O poder de punir disciplinarmente os inscritos na OAB compete exclusivamente ao Conselho Seccional em cuja base territorial tenha ocorrido a infração, salvo se a falta for cometida perante o Conselho Federal". O artigo 70 do EAOAB, aliás, encontra sintonia com o quanto prescreve o artigo 70 do Código de Processo Penal, que estabelece como regra geral de competência para a ação penal o lugar em que se consumar a infração. A regra é idêntica. Para o caso, imagine-se como exemplo que advogado realiza publicidade irregular com veiculação de anúncio em todo o território nacional. Sua inscrição originária é de São Paulo, todavia, é representado perante a OAB/BA. A competência para processamento da representação disciplinar será da Seccional Bahia. Na verdade, a dúvida que surge no caso acima é sobre a prevenção, ou seja, se outra OAB e/ou a própria detentora da inscrição originária também processar o advogado haverá competência prevalente? Da mesma forma, e nos casos de conexão ou continência? A resposta é encontrada pela aplicação supletiva dos artigos 76 e seguintes do Código de Processo Penal, conforme autoriza o artigo 68 da Lei 8.906/94, ou seja, nesses casos, em regra, a questão será resolvida pelas regras gerais do Código de Processo Penal, inclusive aquela afeta à prevenção, definida na forma do artigo 83 do Código adjetivo: "Art. 83.  Verificar-se-á a competência por prevenção toda vez que, concorrendo dois ou mais juízes igualmente competentes ou com jurisdição cumulativa, um deles tiver antecedido aos outros na prática de algum ato do processo ou de medida a este relativa, ainda que anterior ao oferecimento da denúncia ou da queixa". Por óbvio, para aplicação no sistema OAB a norma legal deve sofrer interpretação, o que já foi realizado pelo Conselho Federal no recurso n.º 49.0000.2016.011008-2/SCA-PTU, de Relatoria do Eminente Conselheiro Federal Alexandre Cesar Dantas Socorro (RR), fixando o entendimento de que: "(...) Competência. Prevenção. Matéria afetada ao Plenário da Segunda Câmara. A competência será fixada pela prevenção do relator que tiver antecedido aos outros na prática de algum ato do processo ou de medida a ele relativa. (...)" (DOU, S.1, 29.06.2017, p.67, Ementa n.º 014/2017/SCA).  Nesse sentido, muito embora a r. decisão tenha se utilizado da expressão relator, entende-se que a fixação da prevenção se dará pela primeira decisão relevante no feito, que poderá ser, por exemplo, o parecer de admissibilidade, a decisão de arquivamento ou a decisão de abertura do PAD, sem a fase prévia de admissão. Havendo controvérsia acerca da competência, essa deverá ser resolvida pelo Conselho Federal da OAB em sede de conflito, conforme artigo 85, inciso V do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB, confira-se a posição da jurisprudência: "49.0000.2021.003502-1/OEP (...) 01) O artigo 85, inciso V, do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB, estabelece que a este Órgão Especial do Conselho Pleno do Conselho Federal da OAB compete deliberar, privativamente e em caráter, irrecorrível, sobre conflitos ou divergências entre órgãos da OAB. No caso dos autos, resta instaurado o conflito negativo de competência entre Tribunal de Ética e Disciplina da OAB e este Conselho Federal da OAB, devendo ser acolhido o conflito. 02) No tocante à competência disciplinar, este Órgão Especial do Conselho Pleno do Conselho Federal da OAB já resolveu diversos conflitos de competência, sempre destacando que a competência para instaurar e julgar o processo disciplinar restará fixada na base territorial do Conselho Seccional da OAB em que tenha ocorrido a infração ético-disciplinar, consoante interpretação do artigo 70, caput, da Lei nº. 8.906/94. (...)" (Relator: Conselheiro Federal Paulo Cesar Salomão Filho (RJ). Ementa n. 062/2022/OEP - DEOAB, a. 4, n. 911, 05.08.2022, p. 19). Caso de suspensão preventiva de Advogado por ato praticado em base territorial diferente de sua inscrição originária: a suspensão preventiva do advogado será cabível na forma do artigo 70, §3º da Lei Federal 8.906/94 "§ 3º O Tribunal de Ética e Disciplina do Conselho onde o acusado tenha inscrição principal pode suspendê-lo preventivamente, em caso de repercussão prejudicial à dignidade da advocacia, depois de ouvi-lo em sessão especial para a qual deve ser notificado a comparecer, salvo se não atender à notificação. Neste caso, o processo disciplinar deve ser concluído no prazo máximo de noventa dias". Conforme transcrição da norma federal acima, por mais inapropriado e incorreto que possa parecer, nos casos de suspensão preventiva, a competência será exclusiva da seccional onde o advogado tiver sua inscrição principal. Imagine-se exemplificativamente que advogado com OAB do Maranhão é preso em flagrante tentando repassar um quilograma de maconha a preso em presídio no Distrito Federal, notícia veiculada amplamente pela mídia local. Trata-se de caso clássico de aplicação do artigo 70, §3º do EAOAB, todavia, a OAB/DF não poderá fazer nada contra o advogado, exatamente porque a competência cabe à Seccional do Maranhão, que não viveu o problema, está afastada das provas e não sofreu a "repercussão prejudicial à dignidade da advocacia", ou seja, a norma acaba por mitigar seu próprio valor e alcance e não alcança a vontade do legislador.  Salta aos olhos a incoerência legal, ou seja, enquanto a OAB do local da infração - que no exemplo seria a OAB/DF - instaura processo disciplinar contra o advogado, fica à mercê da OAB onde está a inscrição originária para eventual suspensão preventiva, continuando a sofrer as consequências diretas da "repercussão prejudicial à dignidade da advocacia". Não há resposta à sociedade e, contrariamente, vê-se grave prejuízo à comunidade jurídica onde o fato ocorreu. A própria OAB reconhece o desacerto da norma na proposição n.º 2011.19.05768-01/COP (SGD: 49.0000.2011.002369-2/COP), confira-se: "Proposta de alteração da redação do art. 70, § 3º do estatuto da advocacia. nos casos em que o advogado cometeu falta ética que cause repercussão prejudicial à dignidade da advocacia, é possível, desde logo, ser o profissional suspenso preventivamente, pelo prazo máximo de noventa dias, pelo Tribunal de Ética e Disciplina da Seccional onde o acusado tenha inscrição principal (art. 70, § 3º da lei nº 8.906/94). Determinação que conflita com o caput do art. 70, que determina seja o processo instaurado, processado e julgado pelo Tribunal de Ética e Disciplina da Seccional em cuja base territorial tenha ocorrido a infração. Proposta de alteração na redação do § 3º do art. 70, modificando a expressão 'onde o acusado tenha inscrição principal' para 'onde o acusado estiver sendo processado'. Proposição aprovada. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda, os Senhores Conselheiros integrantes do Conselho Pleno do CFOAB, por maioria, em aprovar a proposição de alteração da redação do art. 70, § 3º do Estatuto da Advocacia, modificando a expressão 'onde o acusado tenha inscrição principal' para 'onde o acusado estiver sendo processado'" (Ementa n. 040/2012/COP. Relator Conselheiro Federal Romeu Felipe Bacellar Filho (PR), DOU. S. 1, 09/10/2012, p. 124). Nada obstante o conteúdo da proposição acima, o Conselho Federal ratificou a aplicação da redação legal no Conflito de Competência n.º 49.0000.2018.002527-8/OEP: "Processo disciplinar. Tramitação. Conselho Seccional em cuja base territorial se tenha constatado a prática da infração disciplinar. Suspensão preventiva. Competência do Conselho em que o advogado mantém inscrição principal. Necessidade de sobrestamento do processo disciplinar enquanto o Conselho Seccional de inscrição principal analisa a suspensão preventiva. Desnecessidade do trânsito em julgado para prosseguimento do processo disciplinar, visto que o art. 77 do EAOAB não atribui efeito suspensivo a recurso interposto em sede de processo de suspensão preventiva, hipótese em que, seja qual for a decisão proferida na sessão especial do Tribunal de Ética e Disciplina, deve o processo disciplinar em trâmite no outro Conselho Seccional retomar seu curso regular (...)". (Relator: Conselheiro Federal Daniel Blume Pereira de Almeida (MA). Ementa 082/2019/OEP. Conflito de competência. DEOAB, a. 1, n. 194, 3.10.2019, p. 6) Em conclusão, a OAB e a advocacia perderam a ótima oportunidade de inclusão no texto da lei 14.365/22 das alterações aprovadas pela proposição n.º 2011.19.05768-01/COP, à nova redação da 8.906/94. Seria um bom caminho que no projeto de lei para reparar o erro legislativo que glosou da redação do Estatuto da Advocacia o artigo 7º, §2º, que estabelecia a imunidade profissional do advogado, também fosse incluída a nova redação ao §3º do artigo 70. Ofensa em grupo nacional do aplicativo whatsapp: a competência segue a inteligência do artigo 70, já tendo entendido a OAB que "Ofensas que foram dirigidas a recorrida em grupo de WhatsApp criado para debater assuntos pertinentes ao exercício da advocacia enquanto Conselheiros Seccionais. O ambiente de trabalho se estende ao virtual, quando este for criado com tal finalidade, devendo manter a urbanidade que são reguladas pelo Estatuto da OAB" (Ementa n. 016/2022/PCA, Relator Juliana Hoppner Bumachar Schmidt, DEOAB, a. 4, n. 828, 07.04.2022, p. 1). *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) 
As muitas mudanças na sociedade atual, especialmente nas redes sociais e processo eletrônico, nacionalizaram a atuação do advogado. Nos dias de hoje a figura do correspondente jurídico, do advogado dos Tribunais Regionais Federais e de Tribunais Superiores, se torna, do ponto de vista ordinário, cada vez mais específica, haja vista que os despachos, distribuição de memoriais, sustentação oral, vista dos autos, extração de cópias, peticionamento e muitos outros são atos que passaram a integrar o processo eletrônico latu sensu. No ponto, vale ainda frisar que após a pandemia da COVID-19, vivemos também a normalização de audiências e sessões de julgamento on line por sistemas de vídeo conferência, o que também afasta o advogado do fórum comum, lançando referidos atos no ambiente virtual. Nada obstante a decisão aprovada no dia 8/11/22 na 359ª Sessão Ordinária do CNJ - Conselho Nacional da Justiça para o retorno das atividades dos Tribunais na forma presencial, o fato é que os procedimentos virtuais vieram para ficar. Lado outro, o desenvolvimento do uso das redes sociais para fomento da carreira jurídica da advocacia e o advento do provimento 205/21 da OAB, que trata especificamente da publicidade do advogado, da mesma forma, trouxeram um novo universo na atuação profissional e nos atos que podem ser espectro de infrações disciplinares. A partir dessas constatações, além de outras do cotidiano do processo disciplinar no sistema OAB, surgem importantes questões quanto à competência legal para julgamento, por exemplo, advogado que realiza publicidade irregular com veiculação de anúncio com oferta de descontos em honorários em todo o território nacional. O advogado contrata o anúncio em São Paulo, todavia, é representado perante a OAB/BA por outro colega que visualizou a publicidade na Bahia. De quem é a competência para julgamento? Advogado com OAB do Maranhão é flagrado tentando repassar drogas a seu cliente preso em presídio no Distrito Federal, notícia veiculada amplamente pela mídia. Caso de suspensão preventiva do artigo 70, §3º da Lei Federal 8.906/94. De quem é a competência para julgamento, da OAB na qual o advogado tem sua inscrição ou a do local do fato? Competência para julgamento de suspensão preventiva de Presidente de Subseção, a competência é do Conselho Pleno Seccional pelo quanto prescreve o artigo 58, §6º do Código de Ética e Disciplina ou também do Conselho Pleno? Processo de revisão disciplinar, a competência será sempre do Tribunal de Ética e Disciplina? Ofensas em grupo nacional do aplicativo whatsapp, de quem é a competência? São muitas as questões. Conforme já mencionamos em outros escritos, o processo disciplinar no sistema OAB é regulamentado por uma série de dispositivos que têm início na Lei Federal 8.906/94, passam pelo Regulamento Geral da OAB, pelo Código de Ética e Disciplina, Regimentos Internos das Seccionais e Regimentos Internos dos Tribunais de Ética e Disciplina. Trata-se, pois, de um verdadeiro micro ordenamento jurídico, que tratou de criar um sistema processual completo para o processo disciplinar na OAB. Assim sendo, pode-se dizer que a riqueza de suas normas importa em total autonomia à legislação processual penal e civil, todavia, em suas lacunas, poder-se-á utilizar como fonte legal referidas normas adjetivas, conforme prescreve o artigo 68 da lei 8.906/94: "aplicam-se subsidiariamente ao processo disciplinar as regras da legislação processual penal comum e, aos demais processos, as regras gerais do procedimento administrativo comum e da legislação processual civil, nessa ordem". A primeira autoridade competente para conhecer da representação é o Presidente do Conselho Seccional, na forma do artigo 56 do Código de Ética e Disciplina. Essa competência, todavia, pode ser deslocada ao Tribunal de Ética, conforme o parágrafo único: "Nas Seccionais cujos Regimentos Internos atribuírem competência ao Tribunal de Ética e Disciplina para instaurar o processo ético disciplinar, a representação poderá ser dirigida ao seu Presidente ou será a este encaminhada por qualquer dos dirigentes referidos no caput deste artigo que a houver recebido" Uma das mais importantes competências do processo disciplinar da OAB é aquela de organização funcional dos órgãos da OAB, especialmente a que cria a Comissão de Admissibilidade e permite seu deslocamento para a estrutura dos Tribunais de Ética e Disciplinar, conforme explicamos em artigo anterior (clique aqui para acessar). A resolução n.º 02/2015 da OAB, conhecida como Código de Ética e Disciplina, disciplinou em seu artigo 58, §7º a possibilidade dos Conselhos Seccionais instituírem as Comissões de Admissibilidade no âmbito dos Tribunais de Ética e Disciplina para "análise prévia dos pressupostos de admissibilidade das representações ético-disciplinares", o que é ideal para se manter a imparcialidade de tais decisões, haja vista que o TED é, por sua própria natureza, órgão isento e imparcial, diferente do Presidência da Seccional, onde claramente reside conflito de interesses político. Quanto à competência para processar, a regra geral é que o advogado responderá por seus atos perante o Conselho Seccional onde foram realizados e não aquele que comporta a inscrição originária, conforme artigo 70 da Lei Federal 8.906/94: "Art. 70. O poder de punir disciplinarmente os inscritos na OAB compete exclusivamente ao Conselho Seccional em cuja base territorial tenha ocorrido a infração, salvo se a falta for cometida perante o Conselho Federal". Essa competência, todavia, é alterada quando a infração ocorrer no âmbito do Conselho Federal, que terá a competência para julgamento in casu. Outra exceção à regra do artigo 70 é aquela estabelecida pelo foro por prerrogativa de função, conforme artigo 58, §5º do Código de Ética e Disciplina: "§ 5º A representação contra membros do Conselho Federal e Presidentes de Conselhos Seccionais é processada e julgada pelo Conselho Federal, sendo competente a Segunda Câmara reunida em sessão plenária. A representação contra membros da diretoria do Conselho Federal, Membros Honorários Vitalícios e detentores da Medalha Rui Barbosa será processada e julgada pelo Conselho Federal, sendo competente o Conselho Pleno." Assim, a competência para processar o Presidente da Seccional, os Conselheiros e Diretores Federais e as outras autoridades citadas, é do Conselho Federal. O foro por prerrogativa de função também se aplica no âmbito das Seccionais. A competência para processar os dirigentes de Subseções é do Conselho Seccional e não dos Tribunais de Ética, ainda que por delegação, conforme §6º do mesmo artigo 58: "§ 6º A representação contra dirigente de Subseção é processada e julgada pelo Conselho Seccional". No ponto vale destacar a imprecisão na norma com o uso da expressão "dirigente", pois deixa grave dúvida sobre sua abrangência, ou seja, se estaria o texto legal estabelecendo o foro por prerrogativa de função apenas à figura do Presidente da Subseção ou se referida garantia também seria extensível à diretoria. A questão foi resolvida pelo Conselho Federal na Consulta n.º 49.0000.2019.004170-3/OEP, assim respondida: "Consulta. Art. 58, § 6º, Código de Ética e Disciplina da OAB. Representação contra dirigente. Abrangência do termo dirigente. Consulente: Ricardo Breier - Presidente do Conselho Seccional da OAB/Rio Grande do Sul - Gestão 2019/2021. Consulta. Subseção. Abrangência do termo dirigente para os fins do artigo 58, § 6º, do Código de Ética e Disciplina. Dirigentes da Subseção são os integrantes da sua Diretoria, é dizer, o Presidente, o Vice-Presidente, o Secretário-Geral, o Secretário-Geral Adjunto e o Tesoureiro. Inteligência dos artigos 60, § 2º, 59 e 55 da Lei nº 8.906/94, em referência aos artigos 98 'usque' 104 do Regulamento Geral. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros do Órgão Especial do Conselho Pleno do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, observado o quorum exigido no art. 92 do Regulamento Geral, por maioria, em responder à consulta, nos termos do voto do Relator" (Brasília, 25 de novembro de 2020. Relator: Conselheiro Federal Guilherme Octávio Batochio (SP). EMENTA N. 065/2020/OEP. (DEOAB, a. 2, n. 494, 10.12.2020, p. 4). À regra geral, ainda existe a exceção do pedido de revisão previsto no artigo 73, §5º da Lei Federal 8.906/94, medida análoga à revisão criminal e cabível quando no acórdão ético-disciplinar transitado em julgado existir erro de julgamento ou condenação baseada em falsa prova, valendo a menção que a expressão erro de julgamento contempla também decisões contrárias ao ordenamento jurídico pátrio, assim como aos normativos da OAB1. Para o pedido de revisão a competência será sempre do órgão de onde emanou a condenação final, conforme prescreve o artigo 68, §2º do Código de Ética e Disciplina: "§ 2º A competência para processar e julgar o processo de revisão é do órgão de que emanou a condenação final". Aqui, novamente, grande imprecisão da norma, que deixa dúvida se eventual acórdão em sede de recurso que mantém a condenação do a quo seria considerando como "condenação final". A dúvida é agravada quando se analisa, por exemplo, a recentíssima Súmula 13/2022/OEP do Conselho Federal da OAB, que estabelece o seguinte: "Interrompem a prescrição as decisões do Conselho Federal da OAB que inadmitam recursos interpostos contra acórdão condenatório ou mantenham a sua inadmissibilidade por ausência de violação à Lei n. 8.906/94, ausência de contrariedade à decisão do Conselho Federal ou de outro Conselho Seccional e, ainda, ausência de violação ao Regulamento Geral, ao Código de Ética e Disciplina e aos Provimentos (art. 75, da Lei 8.906/94), por ostentarem caráter condenatório, nos termos do art. 43, § 2º, II, do Estatuto da Advocacia e da OAB". Da mesma forma, o tema 1.100 proferido pelo STJ sob o rito dos recursos repetitivos que estabelece que o acórdão que confirma sentença penal condenatória também interrompe a prescrição. Sobre o tema já se manifestou a doutrina, conforme escólio de Marcus Vinicius Furtado Coelho: "O órgão competente para julgá-la é aquele que emanou da decisão final (art. 68, § 2º). É uma hipótese de competência funcional, ao presumir-se que esse órgão tem maior capacidade para reconsiderar sua própria decisão, se for o caso. Veja, porém, que a competência é do órgão que decidiu, por último, o mérito. Caso o representado recorra e seu recurso sequer seja conhecido, por ausência de pressupostos formais, a competência permanece do órgão a quo. Se for o Conselho Federal o último a decidir sobre o mérito da questão, o CED já direciona a revisão para o Plenário da Segunda Câmara (art. 68, § 3º)"2. Embora com a nota sobre a imprecisão legal da norma, entendemos exatamente conforme o nobre Jurista. Ora, se o pedido de revisão pede exatamente que o órgão revisite os temas que já foram objeto de apreciação, não faria sentido estabelecer a competência a órgão superior que não houvesse se debruçado sobre a matéria. Vale chamar a atenção que a competência será atraída ao órgão que analisar a matéria, ainda que mantenha o decisum recorrido. Nesse sentido, por exemplo, se recurso agitado ao Conselho Federal contra acórdão do Pleno da Seccional foi conhecido e, no mérito, não providos seus pedidos, mantendo-se a condenação na forma imposta pelo "a quo", será do CFOAB a competência para o julgamento da revisão. Ainda temos o procedimento da reabilitação, conforme previsão legal no artigo 41 da lei 8.906/94: "Art. 41. É permitido ao que tenha sofrido qualquer sanção disciplinar requerer, um ano após seu cumprimento, a reabilitação, em face de provas efetivas de bom comportamento" e 69 do Código de Ética e Disciplina da OAB. A competência é estabelecida pelo 69, §1º: "§ 1º A competência para processar e julgar o pedido de reabilitação é do Conselho Seccional em que tenha sido aplicada a sanção disciplinar. Nos casos de competência originária do Conselho Federal, perante este tramitará o pedido de reabilitação". *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) ___________ 1 CONSELHO FEDERAL DA OAB, Manual de Procedimentos do processo ético-disciplinar, Segunda Parte, item 28, "e", p. 17; 2 COÊLHO, Marcus Vinicius Furtado, Comentários ao Novo Código de Ética dos Advogados. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 77;
Já tivemos oportunidade de tratar dos institutos da prescrição e da decadência no sistema OAB. O artigo 43 da Lei Federal 8.906/94 trata da prescrição trienal, também chamada de prescrição intercorrente (clique aqui para nosso artigo sobre o tema) e da prescrição quinquenal, considerada a prescrição da pretensão punitiva (clique aqui para nosso artigo sobre o tema). Da mesma forma, há construção jurisprudencial do Conselho Federal da OAB sobre a existência da decadência em nosso processo disciplinar (clique aqui para nosso artigo sobre o tema). Pois bem, acerca da prescrição, com o advento da pandemia do COVID-19, foi promulgada a lei Federal 14.010/2020 que cuidou de instituir normas de caráter transitório e emergencial para a regulação de relações jurídicas de direito privado em virtude da pandemia do coronavírus. Seu artigo 3º tem a seguinte redação: "Art. 3º Os prazos prescricionais consideram-se impedidos ou suspensos, conforme o caso, a partir da entrada em vigor desta lei até 30 de outubro de 2020". Como se vê, a norma jurídica tratou de suspender e impedir a contagem da prescrição em todo o sistema legal brasileiro nas relações que alcança, conforme decisão do TJDFT que ratifica a aplicação dos efeitos legais da norma: "(...) 5. Consoante a lei 14.010/2020, que dispôs sobre o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET) no período da pandemia do coronavírus (Covid-19), os prazos prescricionais foram impedidos ou suspensos, conforme o caso, entre 12/06/2020 e 30/10/2020". (Acórdão 1626046, 07038948220218070018, Relator: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, 7ª Turma Cível, data de julgamento: 5/10/2022, publicado no PJe: 21/10/2022) Por óbvio, imediatamente exsurge quaestio iuris se referido comando legal suspensivo dos prazos prescricionais afetaria os processos disciplinares do sistema OAB, sendo a resposta negativa, por exclusão legal da própria norma. Conforme o artigo 1º da Lei, seu conteúdo é aplicável apenas e tão somente às relações jurídicas de direito privado, o que não contempla o processo disciplinar do sistema OAB, confira-se: "Esta Lei institui normas de caráter transitório e emergencial para a regulação de relações jurídicas de Direito Privado em virtude da pandemia do coronavírus (Covid-19)". No mesmo sentido, aliás, se posicionou o Conselho Federal da OAB em reposta à Consulta n.º 49.0000.2020.005420-1/OEP, in verbis: "Assunto: Consulta. Aplicabilidade da suspensão de prescrição prevista pela Lei n. 14.010/2020 aos procedimentos disciplinares da OAB. Consulente: Corregedor-Geral Adjunto do Conselho Federal da OAB - Fernando Calzza de Salles Freire (SP). Relatora: Conselheira Federal Valentina Jungmann Cintra (GO). Ementa n. 018/2021/OEP. CONSULTA. PROCESSO DISCIPLINAR NO ÂMBITO DA OAB. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA SUSPENSÃO/IMPEDIMENTO DO CURSO DOS PRAZOS PRESCRICIONAIS PREVISTOS NA LEI FEDERAL Nº 14.010/2020 (REGULAÇÃO DE RELAÇÕES JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO). MATÉRIAS AFETAS À prescrição DEVEM SER REGULADAS PELO DISPOSTO NA LEI FEDERAL Nº 8.906/1994 (ESTATUTO DA ADVOCACIA E DA OAB). A OAB NÃO ESTÁ VINCULADA À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, DIRETA E INDIRETA, TRATANDO-SE DE ENTIDADE COM PERSONALIDADE JURÍDICA, PRÓPRIA, AUTÔNOMA E INDEPENDENTE. EXERCÍCIO DO PODER PUNITIVO SANCIONADOR. ATUAÇÃO EQUIPARADA À DE AUTARQUIA FEDERAL. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA LEI Nº 9.873/1999. MEDIDA PROVISÓRIA Nº 928/2020, DE FORMA SUBSIDIÁRIA, DURANTE A SUA VIGÊNCIA E EM SENDO MAIS BENÉFICA, POSSIBILIDADE DE SUA APLICAÇÃO. 1) Não há possibilidade de aplicação da Lei Federal nº 14.010/2020, que institui normas de caráter transitório e emergencial para a regulação de relações jurídicas de direito privado, em virtude da pandemia do coronavírus (COVID-19), aos processos disciplinares em curso perante à OAB, por prever expressamente que a aplicação da suspensão/impedimento ocorrerá especificamente no campo do direito privado e nas relações havidas entre particulares (art. 1º). 2) Nos processos disciplinares em curso perante à Ordem dos Advogados do Brasil, as matérias afetas à prescrição devem observar o disposto na Lei Federal nº 8.906/1994. Sendo que ante eventual controvérsia sobre aplicação de lei geral ou de lei especial, em princípio, deve prevalecer o critério da especialidade. Precedente (Ementa nº 015/2020/OEP, na Consulta n. 49.0000.2019.011574-0/OEP, Relator Maurício Gentil Monteiro, DEOAB, a 1, n. 303, 10.3.2020, p. 6). 3) Tem-se entendido que a OAB atua, no âmbito dos processos disciplinares, enquanto Administração Pública, com atuação equiparada à de autarquia federal, o que induz à possibilidade de aplicação da Lei nº 9.873/1999, que estabelece prazo de prescrição para o exercício de ação punitiva pela Administração Pública Federal, direta e indireta, e dá outras providências. Precedentes (RECURSO N. 49.0000.2013.002210-3/OEP, Relator Maurício Gentil Monteiro, DOU, S.1, 04.05.2016, p. 178; REPRESENTAÇÃO N. 49.0000.2016.012373-1/PCA, Relator Ary Raghiant Neto, DEOAB, a. 1, n. 28, 7.2.2019); e pela possibilidade de se aplicar a Lei nº 9.873/1999, quando dela resultar situação mais vantajosa ao(à) advogado(a) que responde ao processo disciplinar. Precedente (Ementa nº 015/2020/OEP, na Consulta n. 49.0000.2019.011574-0/OEP, Relator Maurício Gentil Monteiro, DEOAB, a 1, n. 303, 10.3.2020, p. 6). 4) A Ordem dos Advogados do Brasil não está vinculada à Administração Pública, Direta ou Indireta, tratando-se de entidade com personalidade jurídica própria, autônoma e independente (ADI 3.026, Plenário, Rel. Ministro Eros Grau, DJ 20/9/2006), sendo que o exercício do seu poder punitivo se aproxima do poder punitivo estatal, sobretudo na esfera sancionatória administrativa. 5) A Medida Provisória nº 928/2020, de forma subsidiária, durante a sua vigência e em sendo mais benéfica, pode ser aplicada em eventual processo administrativo disciplinar em curso perante à Ordem dos Advogados do Brasil, para se estabelecer a não fluência de prazo em desfavor do(a) advogado(a) representado(a). Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros do Órgão Especial do Conselho Pleno do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, observado o quórum exigido no art. 92 do Regulamento Geral, por unanimidade, em responder à consulta, nos termos do voto da Relatora. Brasília, 09 de fevereiro de 2021. Afeife Mohamad Hajj, Presidente em exercício. Valentina Jungmann Cintra, Relatora" (DEOAB, a. 3, n. 610, 28.05.2021, p. 1). Desta forma e em conclusão, aos processos disciplinares da OAB não há suspensão de prazo prescricional em face da Covid-19. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui)
quinta-feira, 27 de outubro de 2022

Detração da pena no processo disciplinar da OAB

Disciplina a lei Federal 8.906/94 a aplicação subsidiária de normas ordinárias nas lacunas do sistema OAB: "Art. 68. Salvo disposição em contrário, aplicam-se subsidiariamente ao processo disciplinar as regras da legislação processual penal comum e, aos demais processos, as regras gerais do procedimento administrativo comum e da legislação processual civil, nessa ordem". Na verdade, extremamente infeliz a redação do dispositivo, pois não só são aplicáveis as normas adjetivas acima, mas também aquelas materiais, como é o caso do Código Penal brasileiro. Nesse sentido, por exemplo, é comum que em defesas ético-disciplinares o representado utilize como argumento a falta de adequação de sua conduta à hipótese legal do artigo 34 e incisos do EAOAB, oportunidade onde, claramente, está a levantar a tese de atipicidade, lastreado exatamente do princípio da reserva legal do artigo 1º do Código Penal, também de previsão constitucional. Lado outro, também a título de exemplo, seria válido que a defesa sustentasse a favor de seu cliente representado que - no caso concreto posto de julgamento - não haver cumprido prazo judicial não seria hipótese de mácula ao artigo 34, inciso IX, pois, naquela situação, estaria a conduta do advogado representado acobertada pelo manto da causa justificante do exercício regular de direito, pois seria uma estratégia da defesa a de retardar a realização de algum ato. Nesse caso, claro, seria da defesa o ônus da prova. São inúmeros os exemplos. Pois bem, outro instituto válido e pouco utilizado pelo sistema OAB, mas capaz de importar em grandes vantagens à defesa, é o da detração. Disciplina o artigo 42 do Código Penal que: "Art. 42 - Computam-se, na pena privativa de liberdade e na medida de segurança, o tempo de prisão provisória, no Brasil ou no estrangeiro, o de prisão administrativa e o de internação em qualquer dos estabelecimentos referidos no artigo anterior". Entende-se por detração da pena a possibilidade de abatimento "do tempo em que o sentenciado sofreu prisão provisória, prisão administrativa ou internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, ou mesmo em outro estabelecimento similar" (DOTTI, R. A. Curso de Direito Penal: parte geral. 1ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 605) à sua pena final.  Isso posto, perante o sistema OAB, exsurge nítida a aplicação do instituto jurídico no que toca às penas de suspensão previstas no artigo 37 da lei 8.906/94, que, quando por tempo limitado, podem perdurar até 12 (doze) meses. Assim, exemplificativamente, imagine-se o caso de um advogado que tenha sido suspenso preventivamente na forma do artigo 70, §3º pelo prazo de 90 dias. Paralelamente ao processo de suspensão, tramita seu feito disciplinar, cujo prazo para término é também de 90 dias, onde, todavia, acaba suspenso pelo prazo de 120 dias. Desta feita, considerando que a primeira suspensão não é pena, mas medida cautelar, seria correto admitir que além dos 90 dias iniciais, teria o representado/condenado que cumprir mais 120 dias de suspensão. Ocorre que in casu aplica-se em seu favor o instituto da detração, para permitir que da pena administrativa principal seja glosado, decotado, o período já cumprido a título de suspensão preventiva, ou seja, teria o advogado que cumprir apenas mais 30 dias de suspensão. Destaque para o fato de que o Conselho Federal da OAB tem jurisprudência mansa e pacífica sobre a matéria, amplamente admitida: "(...) Possibilidade de detração do tempo de suspensão preventiva cumprido pela advogada. Recurso parcialmente provido. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros da Segunda Turma da Segunda Câmara do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, observado o quórum exigido no art. 92 do Regulamento Geral, por unanimidade, em dar parcial provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator". (RECURSO N. 49.0000.2015.001183-7/SCA-STU. Relator: Conselheiro Federal André Luis Guimarães Godinho (BA). EMENTA N. 110/2017/SCA-STU. DOU, S.1, 29.06.2017, p.70). No mesmo sentido: "(...). Conhecido o presente recurso e parcialmente provido para excluir a pena de multa e manter a pena de suspensão, declarando-se já cumprida essa pena diante da incidente detração, vez que já cumprida pena de suspensão preventiva por igual prazo, 03 meses, estipulado na condenação, oriundo dos mesmos fatos e mesmo procedimento. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em epígrafe, acordam os membros da Segunda Turma da Segunda Câmara do CFOAB, por unanimidade, em conhecer e dar parcial provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator, que integra o presente". (RECURSO 49.0000.2012.001551-0/SCA-STU. Relator: Conselheiro Federal João Bezerra Cavalcante (GO). EMENTA 090/2012/SCA-STU.. (DOU, 19.07.2012, S. 1, p. 145). Por último, vale pontuar que não é ônus da OAB o de invocar em favor da parte o instituto da detração na fase de cumprimento da pena administrativa, mas sim da defesa interessada. Nada obstante, todavia, referido benefício, como vem em benefício da defesa, poderá ser concedido de ofício pela OAB. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui)
Em recente data nos deparamos com tema singular no processo disciplinar da OAB, que é a diferenciação conceitual entre o que seria uma falta ética e uma falta disciplinar. Para o Conselho Federal, nos termos do brilhante voto da lavra do Conselheiro Leon Deniz Bueno da Cruz, é assim estabelecida a diferença: "EMENTA N. 008/2018/SCA-STU. Recurso ao Conselho Federal. (...) 2) A seu turno, o Provimento n. 83/96 estabelece que os processos de representação, de advogado contra advogado, envolvendo questões de ética profissional, devem ser encaminhados ao Conselho Seccional, para tentativa de conciliação entre as partes. Não se aplica o referido provimento, pois, nos casos de prática de infração disciplinar, ainda que envolvendo representação de advogado contra advogado. Precedentes. Preliminar de nulidade processual que não prospera (....)". (49.0000.2017.005793-0/SCA-STU. Interessado: Conselho Seccional da OAB/São Paulo. Relator: Conselheiro Federal Leon Deniz Bueno da Cruz (GO). (DOU, S.1, 01.02.2018, p.185)). A síntese do quanto estabelecido no voto é que quando a conduta encontrar tipicidade administrativa no artigo 34 e incisos da Lei Federal n.º 8.906/94, estaremos diante de uma falta disciplinar; quando, todavia, se amoldar a preceito encontrado no Código de Ética e Disciplina, estaremos diante de uma falta ética. De fato, a diferenciação guarda pertinência quando analisada a pena administrativa, pois para as faltas previstas no Código de Ética, a pena máxima cominada será a de censura, na forma do artigo 36, inciso II do Estatuto da Advocacia. A doutrina também define como diferentes as normas: "Prevaleceu, no CFOAB, quando da discussão do projeto do Estatuto, a tese fortemente defendida pelo Conselheiro Evandro Lins e Silva, de que as infrações disciplinares, por constituírem restrições de direito, deveriam ser taxativamente indicadas em lei, não podendo ser remetidas ao Código de Ética e Disciplina que as regulamentasse"1. Como não encontramos nenhum precedente anterior a 1996, entendemos que referida diferenciação tem sua importância marcada pelo provimento nº 83/1996 da OAB, que estabelece um microssistema processual diferenciado nos processos "de advogado contra advogado, envolvendo questões de ética profissional", cuja vigência, atualmente, pode até ser discutida em função do advento no novo Código de Ética e Disciplina da OAB, que veio ao mundo jurídico pela resolução  02/2015. Pelo provimento nº 83/1996 da OAB, nesses processos específicos, ou seja, quando há um representante advogado e um representado advogado e o primeiro acusa o segundo em "questões de ética profissional", portanto, de uma violação ao Código de Ética e Disciplina da OAB, uma vez comunicada a Casa da Advocacia, o processo iria ao Tribunal de Ética e Disciplina que já notificaria o representando para apresentação de defesa prévia, excluída, portanto, a fase preliminar de admissibilidade; após, haveria um procedimento de conciliação entre as partes, produção de provas e o feito imediatamente remetido a julgamento, glosados, portanto, o parecer preliminar e o parecer da instrução. A questão é normatizada pelo artigo 1º do provimento: "Art. 1º. Os processos de representação, de advogado contra advogado, envolvendo questões de ética profissional, serão encaminhados pelo Conselho Seccional diretamente ao Tribunal de Ética e Disciplina, que: I - notificará o representado para apresentar defesa prévia; II - buscará conciliar os litigantes; III - acaso não requerida a produção de provas, ou se fundamentadamente considerada esta desnecessária pelo Tribunal, procederá ao julgamento uma vez não atingida a conciliação". Vale destacar, todavia, que nem todos os casos envolvendo representação de advogado contra advogado serão regulamentados pelo provimento nº 83/1996. Imagine-se, por exemplo, que determinado advogado procura diretamente a parte contrária em vez de seu colega advogado para realizar uma oferta de acordo, violando, assim, o quanto prescreve o artigo 34, inciso VIII da lei Federal 8.906/94: "VIII - estabelecer entendimento com a parte adversa sem autorização do cliente ou ciência do advogado contrário". Tal fato, gravíssimo, conforme supracitado, importa em violação disciplinar e não em violação ética, ou seja, uma vez realizada representação pelo advogado prejudicado contra seu colega, o trâmite do processo disciplinar deve se dar pelo rito normal previsto nos artigos 57 e seguintes do Código de Ética e normas correlatas e não pela sua forma sumária, prevista no provimento em comento. E acertou a OAB em excluir as violações disciplinares do rito sumário do Provimento, haja vista que as condutas previstas no artigo 34 da lei Federal 8.906/94 podem impor ao advogado penas de suspensão e expulsão, ou seja, é natural que o trâmite processual resguarde à parte que se defende um processo mais robusto, com mais formas de defesa. E que não se diga que a hipótese da audiência estabeleceria um rito melhor à defesa, pois sempre é facultado à parte o acordo fora dos autos. Por último, chama a atenção o fato de que eventual confusão no processamento do feito pela OAB não importará em nulidade, ainda mais quando o trâmite se der pelo rito normal e não pelo do provimento, exatamente em face da ausência de prejuízo à parte. Quando o contrário, será necessária a prova do prejuízo processual. Vale também destacar que nos termos do inciso II do Art. 1º do provimento nº 83/1996 não está prevista a audiência de conciliação, mas tão somente que o Tribunal de Ética e Disciplina "buscará conciliar os litigantes", o que, claro, pode ser realizado via dessa audiência. Assim, a ausência da audiência não é capaz de gerar nulidade no processo. O que exsurge claramente é a necessidade da OAB ofertar às partes a possibilidade de um acordo. Assim, por exemplo, se o Tribunal está com falta de funcionários para a realização da audiência de conciliação, poderá a OAB simplesmente intimar as partes para manifestação sobre a possibilidade de um acordo, estabelecendo prazo legal para a posição.   No sentido da provocação pela manifestação das partes, já decidiu o CFOAB pela ausência de nulidade: "EMENTA 202/2011/SCA-STU. Locupletamento - Suspensão - Audiência de Conciliação - Ausência voluntária das partes após notificação - Nulidade Processual Inexistente - (...) 1. Não se verifica nulidade processual pela não realização de audiência de conciliação se as partes, devidamente notificadas, não comparecem de forma voluntária. (...)" (2011.08.03025-05/SCA-STU. Interessado: Conselho Seccional da OAB/Paraná. Relator: Conselheiro Federal Valmir Macedo de Araújo (SE). (DOU, S.1, 16/08/2011 p. 123) Diante do exposto, a inarredável conclusão é que o provimento nº 83/1996 da OAB só será aplicável aos casos de demandas entre advogados, quando a representação tratar de mácula em tese ao Código de Ética e Disciplina, o que, por consequência, obriga a exegeta ao entendimento de que será necessário à OAB, ao receber a comunicação do fato, proferir decisão fundamentada que venha a fornecer classificação legal da falta em tese investigada, exatamente para apuração do rito a ser adotado. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) __________ 1 LÔBO, Paulo. Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 181.
quinta-feira, 29 de setembro de 2022

Como evitar processos disciplinares na OAB

A conduta ético-profissional na advocacia está regulada no Estatuto da OAB, lei Federal 8.906/1994, pelo Regulamento Geral, também pelo Código de Ética e Disciplina, resolução 02/2015 do Conselho Federal da OAB e via dos Provimentos expedidos pelo mesmo órgão. O Código de Ética, embora estabeleça em alguns de seus dispositivos normas objetivas a indicar o que seriam práticas violadoras de seus preceitos, em muitas vezes contém conceitos vagos, abertos, que dependerão de hermenêutica do exegeta, sempre, claro, respeitando o princípio constitucional da reserva legal ou da legalidade, que determina, na interpretação analógica cabível ao processo disciplinar à luz do artigo 68 da lei 8.906/94, que não há falta ética-disciplinar sem norma que a preveja. Ainda no que toca ao tema, importante destacar que em geral a ética é considerada um objeto de estudo filosófico, organizado e crítico e tem como escopo a conduta humana e suas relações. Há duas concepções fundamentais a respeito desse campo de conhecimento: a ciência do móvel ou variações da conduta humana, que objetiva determinar a finalidade de dirigir ou disciplinar o agir humano; e a corrente que considera a ética como ciência da conduta humana voltada aos meios para atingir um fim. Uma vertente determinista e outra que se aproxima mais do indeterminismo. Assim sendo, à OAB cabe fiscalizar a atividade de seus inscritos perante a sociedade, garantindo que o comportamento profissional e social dos advogados esteja sempre em obediência às normas de regência que regulam a carreira. Uma vez violados referidos preceitos e a OAB tomando ciência do fato, haverá perante a seccional e/ou no Conselho Federal a instauração de um procedimento prévio de avaliação, nominado de fase da admissibilidade, conforme artigo que já publicamos.   O procedimento ético-disciplinar no âmbito dos Tribunais de Ética e Disciplina da OAB será sempre instaurado de duas formas: de ofício ou mediante representação da parte interessada, que pode ser um advogado, uma pessoa física ou jurídica. Sempre que uma autoridade requerer a abertura de processo disciplinar, como é o caso de juízes, membros do Ministério Público, autoridades policiais e outros, será realizado um prévio juízo de valor sobre a conduta, que, merecendo avançar, se transformará em procedimento ex officio, ou seja, a OAB assume o papel de titular do direito à persecutio sancionatória administrativa e passa a figurar no polo ativo da questão, conforme disciplinam os artigos 55, caput e § 1º, 56 e 57 do Código de Ética e Disciplina. Esse modelo é análogo ao que ocorre no processo penal. A suposta vítima de um crime registra um boletim de ocorrência perante a autoridade policial onde o fato ocorreu. Esse procedimento, avançando, será encaminhado ao Ministério Público que avaliará eventual/potencial existência de crime, momento no qual tomará o lugar da parte interessada para assumir a investigação ou, mais à frente, o papel de titular da ação penal. Essa instauração, nominada ex officio pela OAB, dispensa o juízo de valor que é realizado na fase de admissibilidade, ou seja, o processo disciplinar é instaurado diretamente a partir da comunicação de eventual infração ética pela autoridade competente. No entanto, ainda assim, havendo entendimento posterior pela inexistência de infração ético-disciplinar, poderá ocorrer o indeferimento liminar, nos termos do artigo 73, §2º, do Estatuto. Não há, todavia, nulidade e/ou prejuízo se a OAB optar pela instauração prévia da fase de admissibilidade, o que muitas vezes se recomenda para estabelecimento do contraditório antes da instauração do processo disciplinar. De outro lado, o processo pode também ser iniciado via de representação da parte interessada. Nesse caso, deverá ser formulada por fonte idônea, por escrito ou verbalmente, sendo vedada a denúncia anônima na forma do art. 55, §2º do CED. Deverá a petição conter a identificação do representante, narração dos fatos, documentos necessários para sua instrução, indicação de outras provas a serem produzidas, assinatura do representante ou certificação de quem tomou por termo as declarações da parte, consoante o artigo 57, da norma ética. Em conclusão e conforme demonstrado, a OAB está munida de um complexo sistema punitivo, ainda municiado por Comissões de Fiscalização da Atividade da Advocacia em todas as seccionais, trabalhando como verdadeiros órgãos investigativos para os Tribunais de Ética e Disciplina, ou seja, é de suma importância que no exercício da advocacia cotidiana, os advogados e advogadas implementem em seu agir medidas preventivas para evitar infrações éticas disciplinares. Vale ainda destacar que as infrações mais recorrentes nos Tribunais de Ética e Disciplina da OAB em geral são: locupletamento, ausência de prestação de contas, abandono de processo e captação ilícita de clientela, as quais com medidas simples podem ser evitadas. Portanto, visando proteger profissionais da advocacia de eventuais infrações éticas pela simples ausência de mecanismos de proteção, sugere-se algumas medidas simples de prevenção, tais como: termo detalhado de prestação de contas, contrato pormenorizado que descreva os serviços, os honorários contratuais, os percentuais de êxito e tantos mais detalhes quanto possível. Também se recomenda a confecção de uma ficha de atendimento onde o cliente narre o fato ao advogado e, posteriormente, assine seu conteúdo, evitando assim futura afirmação de que o profissional afirmou o que não disse ou deixou de dizer o que teria afirmado. Também é importante que durante a condução do processo o profissional sempre preste informações de forma registrada, com o uso do aplicativo whatsapp ou por e-mail, fazendo assim a prova de que a comunicação com o cliente sempre esteve presente. No contrato, também é de suma importância a confecção de cláusula de rescisão, que tenha previsão de rescisão unilateral para ambas as partes e que contenha equilíbrio financeiro. Isso irá evitar, por exemplo, que após um desentendimento com o cliente, o advogado não possa rescindir o contrato, obrigado a representar a parte até o fim do processo. Uma das violações éticas mais comuns ao advogado é o abandono do processo. Na grande maioria dos casos, não se está diante daquele advogado que vinha sendo intimado e, propositalmente, se manteve inerte. Aqui, embora existam inúmeras possibilidades de ocorrência do fato, a mais comum é a hipótese em que o advogado deixou a banca em que trabalhava, mas não renunciou as procurações outorgadas em seu nome; o ex-sócio, cuja causa foi repassada ao sócio remanescente e outros nesse sentido, ou seja, o advogado com poderes outorgados nos autos deixa o processo aos cuidados de um colega. Recomenda-se, assim, sempre, ao sair de um escritório, ao deixar um processo com outro colega, renunciar aos poderes outorgados. Nesse momento, claro, vem a pergunta: mas se estou nos autos com perspectiva de receber honorários, como renunciar a procuração? Simples, renuncie parcialmente aos poderes. Uma petição, simples e em nome próprio, que narre ao Juiz a saída do advogado da responsabilidade direta do processo, com expressa renúncia de poderes para receber intimações e cumprir ordens é capaz de resolver o problema e afastar qualquer responsabilidade do advogado. Esse proceder com mais cautela tem como fundamento a mudança de pequenos comportamentos, que, todavia, importarão em significativo aprimoramento da qualidade dos serviços do advogado. São medidas simples que podem ser aprimoradas tanto pessoalmente por cada advogado(a), como também no âmbito de cada escritório, existindo atualmente suporte tecnológico para otimizar a prestação do serviço, contribuindo com um maior nível de qualidade sem perder de vista os aspectos éticos que regem a profissão liberal. Por último, vale lembrar ainda que se o advogado que se retirou de uma banca tem contra si instaurado processo ético disciplinar por culpa de antigo processo, tem potencial ação indenizatória por danos morais contra quem deu causa ao fato, razão pela qual estar atento às condutas defensivas aqui expostas, não é uma obrigação apenas do advogado(a), mas também do escritório de advocacia e/ou do advogado ao qual aquele estava prestando serviços.  __________ *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui)
Assim como a legislação processual penal trata dos institutos da prescrição e da decadência, também verificamos no sistema OAB a presença de ambos. O artigo 43 da lei Federal 8.906/94 prevê dois tipos de prescrição para o processo disciplinar na OAB, que são a prescrição trienal, também chamada de prescrição intercorrente (clique aqui para nosso artigo sobre o tema) e a prescrição quinquenal, considerada a prescrição da pretensão punitiva (clique aqui para nosso artigo sobre o tema). A decadência também encontra campo no processo disciplinar da OAB, todavia, para esse fenômeno processual, não há previsão legal, mas construção da jurisprudência com base na aplicação supletiva de normas federais que tratam do tema, notoriamente o Código Civil, o Penal, o Código de Processo Civil e o Código de Processo Penal, conforme é autorizado ao aplicador do direito pelo artigo 68 da lei 8.906/94, nominado de Estatuto da Advocacia. Pois bem, de forma geral, aplicável o conceito de decadência fornecido por Maria Helena Diniz, para quem o fenômeno pode ser explicado como " a extinção do direito pelo seu titular, que deixa escoar o prazo legal ou voluntariamente fixado pelo seu exercício"1. No sistema OAB, a decadência terá o mesmo prazo da prescrição quinquenal, de cinco anos, e estará presente todas as vezes em que o titular do direito não o executar dentro do quinquídio legal, contado da data em que tomar conhecimento do fato, conforme ratificado pelo Conselho Federal da OAB, que estabeleceu "Decadência. Construção jurisprudencial deste Conselho Federal da OAB no sentido de que a parte interessada decai do direito de representação em 05 (cinco) anos, contados da data em que tomou conhecimento dos fatos tidos por infracionais, uma vez que o advogado não pode permanecer eternamente submetido ao poder disciplinar da OAB. Inexistência, no presente caso, visto que a representação restou formalizada dentro do prazo de cinco anos a contar do conhecimento dos fatos pela parte interessada" (25.0000.2021.000056-0/SCA-TTU. Relatora: Conselheira Federal Adriana Caribé Bezerra Cavalcanti (PE). Ementa n.º 037/2022/SCA-TTU, DEOAB, a. 4, n. 862, 27.05.2022, p. 23). Desta forma, imagine-se que determinando advogado vem se locupletando de diversos clientes no bairro onde trabalha, todavia, os fatos não são levados à OAB ou as autoridades responsáveis pela segurança pública. Entretanto, após lesar determinado cliente, esse leva o caso à OAB e à mídia local, que o veicula amplamente. Após alcançar as mídias locais, diversas vítimas passam a ir a Ordem dos Advogados do Brasil, buscando responsabilizar o advogado. Nesse caso, apenas os fatos que estiverem dentro dessa janela de cinco anos poderão ser apreciados, pois todos os outros estarão abarcados pela decadência. Exatamente por essa razão é que diante de erros graves cometidos por profissional da advocacia, erros que a parte/cliente/lesada entenda passíveis de punição ética por enquadramento no Código de Ética e Disciplina ou nos incisos do artigo 34 do Estatuto da Advocacia, deve a parte, ainda que não venha a romper com o advogado, imediatamente buscar a ajuda da OAB ou de outro advogado especializado.   *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) __________ 1 DINIZ, Maria Helena. Manual de Direito Civil. São Paulo. 2020. 3ª ed. Saraiva, p. 79.
Com o advento do Provimento 205/2021, que atualizou as regras sobre o marketing jurídico, houve também a conceituação do termo: "Art. 2º  I - Marketing jurídico: Especialização do marketing destinada aos profissionais da área jurídica, consistente na utilização de estratégias planejadas para alcançar objetivos do exercício da advocacia". Tal definição cessa muitas discussões acerca do escopo ético para a utilização de ferramentas de marketing no meio jurídico, na medida que afirma explicitamente que o marketing jurídico é composto por ações planejadas estrategicamente com o intuito de alcançar objetivos no exercício da advocacia, ou seja, o estudo do mercado para melhor interagir com ele e a publicidade intencional são sim aceitos no universo jurídico. Se por um lado confirmamos que a publicidade profissional jurídica não deve ser obra do acaso, por outro, temos que compreender que nem a publicidade profissional, nem o marketing de conteúdos jurídicos (conceitos explicados em nosso artigo: Conceitos no Novo Provimento da OAB, clique aqui para ler) podem induzir explícita ou implicitamente à contratação dos serviços jurídicos ou ao litígio. Portanto, a publicidade meramente informativa é permitida, enquanto a propaganda indutiva é proibida. A compreensão sobre a distinção entre Publicidade x Propaganda pode evitar muitas discussões, infrações e processos disciplinares. Ao superarmos estes conceitos e fixarmos a proibição da propaganda, avançamos também com a assimilação do maior pecado de todos no marketing jurídico, que é a captação de clientela, conceituada como "a utilização de mecanismos de marketing que se destinam a angariar clientes pela indução à contratação dos serviços ou estímulo do litígio", ou seja, captação de clientela é o mesmo que propaganda. Além destes conceitos basilares, que realmente colaboram quando analisamos se algo é ou não uma infração ética, precisamos ainda nos atentar a alguns meios explicitamente vedados no artigo 40 do Código de Ética e Disciplina da OAB: rádio, TV, cinema, outdoors, muros, paredes, veículos, elevadores ou em qualquer espaço público. Excetuando estes meios vedados, a regra geral é que o meio não importa, mas sim o conteúdo da divulgação. Então, o TikTok, por exemplo, não é proibido, o que tem ocorrido em alguns casos é o desrespeito ao conteúdo, à moderação e discrição inerentes à publicidade ética dos advogados e escritórios de advocacia. Ademais, é importante deixarmos claro que o mal gosto, além de ser subjetivo, não é uma infração ética, mesmo que caia em um senso comum. Portanto, uma divulgação "feia" ou que não retorna bons resultados, apenas por estes motivos, não poderá ser punida pela OAB. Também caracterizam infração ética a divulgação de valores de honorários, forma de pagamento, gratuidade, descontos e reduções de preços; anunciar especialidades para as quais não possua título certificado ou notória especialização; criar slogan com expressões persuasivas ou de autoengrandecimento: "O melhor escritório em..." "O mais bem preparado para atender..." "O Rei da aposentadoria!"; distribuir brindes ou qualquer material impresso ou digital de maneira indiscriminada. De forma idêntica, comprar contatos de WhatsApp ou listas de e-mails para divulgar serviços; divulgar lista de clientes, realizar referência ou menção a decisões judiciais, resultados, promessa de resultados e casos concretos; fazer publicidade ativa de qualquer informação relativa às dimensões, qualidades ou estrutura física do escritório; vincular os serviços advocatícios com outras atividades; pagar, direta ou indiretamente, para ser listado em rankings ou qualquer tipo de destaque. A intenção em listar as proibições neste artigo é justamente para confirmarmos que há poucas vedações, já que as ações de marketing são muito mais volumosas do que as regras citadas acima. O planejamento deve ser uma etapa a ser cuidadosamente cumprida no Marketing Jurídico a fim de que advogados e escritórios de advocacia de fato alcancem seus objetivos através do marketing ético, sem, todavia, haver violação ética contra a carreira. Pergunta muito comum entre aqueles que buscam mais informações sobre o tema é a seguinte: "E se, por um descuido, eu ou meu escritório incorrermos em uma infração e formos processados?" Nesse caso, com o aprimoramento dos mecanismos de controle e fiscalização que hoje funcionam praticamente on line, é bem possível que a OAB tome conhecimento do ato. No ponto, destaque para o fato de que simultaneamente à vigência do Provimento 205/2021, o Conselho Federal da OAB também incrementou suas ferramentas de controle de fiscalização, seja com o fomento da Coordenação Nacional de Fiscalização da Atividade Profissional, que determinou a todas as Seccionais a criação de Comissões fixas de fiscalização, seja como o Comitê de Regulamentação do Marketing Jurídico. Para além, exatamente porque parte das ações de marketing são realizadas no ambiente virtual, via de aplicativos como o facebook, instagram, tiktok, google adds e análogos, a fiscalização também segue o mesmo padrão, ou seja, o fiscal da OAB ao visualizar ou ser alertado do anúncio irregular, realiza o print da tela e já ativa a Comissão de Fiscalização para início do processo, que acarretará na comunicação ao Tribunal de Ética e Disciplina para instauração da ação disciplinar, ou seja, o processo fiscalizatório atual é muito mais simples e menos burocrático do que outrora, o que resulta em maior eficiência da OAB como órgão de controle. De forma a tornar a fiscalização mais pedagógica, a OAB também fez alterações na Resolução 2/2015, o Código de Ética e Disciplina, para inserir eu seu conteúdo os artigos 47-A e 58-A, que tratam do TAC - Termos de Ajuste de Conduta na OAB. Será cabível para "para fazer cessar a publicidade irregular praticada por advogados e estagiários", cabível apenas quando a infração ético-disciplinar for punível com censura, desde que o fato não tenha "gerado repercussão negativa à advocacia". Outrossim, o Provimento 200/2020 também regulamenta condições objetivas para a celebração do TAC, pois o advogado não poderá ter contra si "condenação transitada em julgado por representação ético-disciplinar", assim como o TAC "não se aplica às hipóteses em que ao advogado ou estagiário seja imputada a prática de mais de uma infração ético-disciplinar ou conduta que caracteriza violação simultânea de outros dispositivos" da lei Federal 8.906/94, como, por exemplo, a captação ilegal de clientela. Em conclusão, se de um lado a OAB atendeu as necessidades da advocacia e atualizou a carreira dos advogados no que toca ao marketing jurídico com o provimento n.º 205/2021, de outro tratou de criar mecanismos de fiscalização de controle, para que referidas ações sejam sempre realizadas à luz dos ideais éticos e morais estabelecidos pelo Código de Ética e Disciplina e pela lei Federal 8.906/94. __________ *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui)
Conforme explicamos no artigo sobre a prescrição trienal, também chamada de prescrição intercorrente (clique aqui para ler), no processo disciplinar do sistema OAB temos em regra dois tipos de prescrições, ou seja, a trienal e a quinquenal, de cinco anos. Essa última, que interessa a esse escrito, está expressamente descrita no artigo 43 da Lei Federal 8.906/94, com a seguinte redação: "Art. 43. A pretensão à punibilidade das infrações disciplinares prescreve em cinco anos, contados da data da constatação oficial do fato".  Nesse caso, assim como ocorre no processo penal, o reconhecimento da prescrição afeta todos os efeitos do processo disciplinar, fulminando a pretensão da OAB em julgar o advogado acusado de conduta antiética. Como já defendemos, a prescrição ataca o titular do direito, no caso a OAB, que deve exercer sua pretensão dentro do interregno de tempo legal, pois fere a dignidade da pessoa humana que indivíduo tenha eternizados os efeitos do processo, razão exata pela qual o órgão competente deve exercer sua pretensão no espaço de tempo determinado pela norma e fornecer a devida prestação jurisdicional dentro de razoável limite temporal. Pois bem, vê-se muitos equívocos quanto ao marco temporal do início da prescrição, que deve ser sempre o momento em que a OAB toma conhecimento do fato. Nesse sentido, a título de exemplo, se advogado se locupletou de seu cliente em 8/22 e a vítima vem à OAB apenas três anos depois, quando acaba por desistir de um prometido acordo com aquele que o representava, o início da contagem do prazo de prescrição será o ano de 2025, quando o fato for comunicado à Ordem dos Advogados do Brasil. A prescrição, portanto, dar-se-á em 2030. Sobre o ponto, inclusive, há o entendimento da súmula 1/11 do Conselho Federal, que declara como marcos iniciais da contagem "o protocolo da representação ou a data das declarações do interessado tomadas por termo perante órgão da OAB". O artigo 43 do EAOAB contém em seu §2º os marcos interruptivos da prescrição dos incisos I e II, que merecem considerações.   O inciso I estabelece que a prescrição será interrompida "pela instauração do processo disciplinar" ou "pela notificação válida feita diretamente ao representando". Ao ler o inciso, o exegeta menos acostumado com o processo disciplinar no sistema OAB pode entender que a redação estaria trocada, pois, em tese, o procedimento de notificação será sempre realizado à frente da instauração do processo disciplinar, principalmente porque há tempos a OAB vem adotando o procedimento prévio de admissibilidade, que antecede a instauração do processo disciplinar, conforme artigo que já publicamos (clique aqui para ler). Na verdade, a ordem está correta, pois quando o legislador afirma "pela instauração do processo disciplinar" está a apontar para os casos em que a OAB instaura diretamente o processo disciplinar de ofício. Vale pontuar que a OAB pode também, de ofício, não instaurar diretamente o feito disciplinar, optando por ouvir o advogado antes para formação de sua convicção em sede de procedimento prévio de admissibilidade, todavia, nada impede que em casos mais graves a OAB já supere essa fase e instaure diretamente o processo. Isso posto, será a instauração do processo disciplinar o marco interruptivo da prescrição do inciso I. A segunda parte do inciso, após o uso da conjunção alternativa de escolha "ou" declara a interrupção da prescrição "pela notificação válida feita diretamente ao representando". Aqui, diferente da primeira hipótese, o marco interruptivo se dará no momento da primeira notificação ao advogado, seja qual for, mas que em regra se dará em sede de procedimento prévio de admissibilidade, quando ainda não instaurado o "processo disciplinar" da primeira parte do inciso.   Ambas as hipóteses do inciso I serão consideradas apenas uma única vez para a interrupção da prescrição, presente aquela que ocorrer em primeiro lugar. Assim, por exemplo, advogado é representado em 1/22 e notificado para prestar esclarecimentos iniciais em sede de procedimento de admissibilidade em 8/22. Nesse mês de agosto verifica-se o primeiro e único marco interruptivo da prescrição durante o trâmite do processo, até o momento da decisão. Ainda seguindo o exemplo, se no mês de 12/22 é vencida a fase de admissibilidade e instaurado o processo disciplinar, não estará presente novo marco de interrupção. Outro marco interruptivo é aquele do inciso II, verificável "pela decisão condenatória recorrível de qualquer órgão julgador da OAB". Nesses casos, o processo disciplinar do sistema OAB prevê diversas decisões que desafiam recursos, como é o caso daquelas proferidas nas Turmas dos Tribunais de Ética e Disciplina, que podem ser recorridas aos Tribunais Plenos dos próprios Tribunais; e dessas, que podem ser confrontadas perante os Conselhos Plenos das Seccionais; decisões que também desafiam recursos ao Conselho Federal, na forma do artigo 75 do EAOAB. Cada uma dessas interromperá a prescrição, fazendo reiniciar o prazo.  A combinação do artigo 68 da Lei Federal 8.906/94 com o artigo 61 do Código de Processo Penal, permite que uma vez suscitada a prescrição por uma das partes, deve o julgador apreciar a alegação em qualquer fase do processo. De outro lado, se for verificada pelo próprio Juiz ético, deve ele, de ofício, a declarar. Embora não haja jurisprudência consolidada sobre a matéria, o Conselho Federal da OAB já decidiu que a interposição de recursos e procedimentos protelatórios pode obstar o reconhecimento da prescrição, conforme julgado 49.0000.2013.002491-7/OEP-ED (DOU, S.1, 06.04.2015, p. 88/89), o que entendemos correto também pela mais valia à vedação do comportamento contraditório ou nemo potest venire contra factum proprium. Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui)
É certo que o artigo 68 da lei 8.906/94, dispõe que "aplicam-se subsidiariamente ao processo disciplinar as regras da legislação processual penal comum e, aos demais processos, as regras gerais do procedimento administrativo comum e da legislação processual civil", e que também são aplicáveis as regras de direito material penal como é o caso da possibilidade de uso em defesas administrativas de institutos como as causas justificantes, a dosimetria da pena administrativa, assim como a prescrição, essa última regra de direito material prevista nos artigos 109 e seguintes do Código Penal Brasileiro. Ocorre que, no que toca à prescrição, há expressa disposição legal no artigo 43 da lei Federal 8.906/94 que afasta praticamente toda a necessidade de hermenêutica suplementar pelas leis federais citadas no mencionado artigo 68. O interesse desse artigo é analisar a prescrição trienal, chamada de prescrição intercorrente e prevista no §1º da norma em comento. Como ideia geral o instituto da prescrição ataca o titular do direito, que deve exercer sua pretensão dentro de uma janela temporal estipulada pela norma aplicável, pois fere a dignidade da pessoa humana que indivíduo sob a proteção do estado tenha por tempo indeterminado uma espada sobre sua cabeça, ameaçando eternamente o exercício de determinado direito. Por outro lado, a prescrição intercorrente, tem como fundamento princípio da duração razoável do processo previsto no artigo 5º, inciso LXXVIII da Constituição Brasileira. Da mesma forma que o titular do direito deve exercer sua pretensão no espaço de tempo determinado pela norma, o órgão competente para o julgamento também deve fornecer a devida prestação jurisdicional dentro de razoável limite temporal, para que não se eternize o processo. Esse fenômeno ocorre nos processos judiciais e nos processos administrativos disciplinares, em face de sua natureza punitiva. Assim, a prescrição da pretensão punitiva ocorre na forma do caput do artigo 43 e é de 5 anos e a prescrição intercorrente ou prescrição trienal ocorre no caso de paralização do processo pelo prazo de 3 anos, desde que "pendente de despacho ou julgamento", que são atos processuais aptos à interrupção da prescrição. O Conselho Federal da OAB, em sua função de unificação da jurisprudência disciplinar dos advogados do Brasil, tem clara tendência a reconhecer a prescrição intercorrente somente em casos em que o processo "permaneceu absolutamente paralisado" pelo prazo de 3 anos, conforme se apura do julgado (25.0000.2021.000057-8/SCA-STU. Relator: Conselheiro Federal Emerson Luis Delgado Gomes (RR). Emente n.º 046/2022/SCA-STU, DEOAB, a. 4, n. 886, 1º.07.2022, p. 17). A expressão "absolutamente paralisado" que consta do acórdão e é repetida em pelo menos dez julgados recentes, tem muita importância na configuração da prescrição intercorrente, pois valoriza sobremaneira o que seria o ato de despacho, haja vista não restar dúvida quanto à interpretação da expressão julgamento. Segundo a atual jurisprudência da OAB qualquer andamento no processo que importe em mínima alteração de seu status, será causa interruptiva da prescrição intercorrente, conforme, inclusive, resta reforçado pelo inciso III da Súmula 01/2011 do Conselho Federal, com a seguinte redação: "a prescrição intercorrente de que trata do §1º do art. 43 do EAOAB, verificada pela paralisação do processo por mais de três (3) anos sem qualquer despacho ou julgamento, é interrompida e recomeça a fluir pelo mesmo prazo, a cada despacho de movimento do processo".  Importante dar atenção ao seguinte fato: embora a prescrição da pretensão punitiva, prescrição quinquenal, admita somente uma interrupção na forma do artigo 43, §2º, inciso I e outras nas decisões condenatórias na forma do inciso II, o mesmo não ocorre com a prescrição intercorrente, que contém inúmeras interrupções, sempre presentes a qualquer ato do processo. O marco inicial de início da contagem da prescrição sempre será a data de protocolo da representação ou do conhecimento oficial do fato pela OAB, também conforme a Súmula 01/2011. Fale com o colunista e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui)
O sistema OAB contém ampla e vasta legislação que trata de praticamente todos os temas afetos à profissão do advogado, a seu comportamento profissional e nas suas relações com clientes, com as autoridades e em sua vida em sociedade, estabelecendo obrigações, deveres, direitos, posturas e muito mais. Esse micro-ordenamento jurídico, para além de encontrar escora em normas Federais, como é o caso da Constituição e da lei 8.906/94, também possui suas próprias normas materiais e processuais para exercer funções regulatórias, incluindo um poderoso sistema punitivo que é manejado nos tribunais de ética e disciplina das seccionais, ponto de interesse deste artigo. O processo ético-disciplinar contra advogado na OAB pode ter início via de representação realizada por uma parte, por um colega advogado ou por uma autoridade, como um delegado de polícia, um membro do MP ou um magistrado; ou ainda de ofício pela OAB por qualquer de seus membros, pelo próprio Tribunal de Ética e Disciplina ou por suas comissões, com destaque para as de Fiscalização da Atividade da Advocacia. Essa regulamentação decorre do art. 55 do código de ética e disciplina da OAB ou CED, resolução 2/15 do Conselho Federal. Assim, se a Comissão da Mulher Advogada tem conhecimento de que determinado advogado é um agressor de mulheres, pode perfeitamente realizar representação ao Tribunal de Ética e Disciplina, apontando o enquadramento de referida conduta na norma repressora do art. 34, incisos XXV, XXVII e XXVIII da 8.906/94. Embora formalmente a representação deva ser formulada ao Presidente Nacional da OAB, aos presidentes das seccionais, aos presidentes das subseções ou dos Tribunais de Ética e Disciplina a depender da competência para julgamento, na prática basta ao interessado comunicar o fato à OAB que tomará todas as providências necessárias à apuração do fato. Ao receber a representação, tem início a fase da admissibilidade do processo disciplinar nos termos do art. 58, §4º do Código de Ética e Disciplina, onde a autoridade competente realiza análise do conjunto probatório que já consta dos autos e, com base nesse conteúdo, determina o arquivamento da representação ou a instauração do processo ético disciplinar, inaugurando, aí sim, a fase do administrative law sanctioning, onde a OAB passará a cogitar a aplicação de pena administrativa ao representado, assegurando-lhe o contraditório e o direito à ampla defesa. Como o ato de instauração do processo disciplinar tem grande influência na vida do advogado e dos seus, como, por exemplo, do escritório de advocacia onde trabalha, entendemos haver conflito de interesse na manutenção do poder de arquivamento liminar pelo Presidente eleito, revestindo-se de maior imparcialidade que a decisão caiba ao órgão correcional da OAB, o que, inclusive, foi objeto de alteração no CED, com a inclusão do §7º à redação do art. 58 pela resolução 4/16 do Conselho Federal da OAB que agregou à competência dos Tribunais de Ética as Comissões de Admissibilidade, in verbis: "§ 7º Os Conselhos Seccionais poderão instituir Comissões de Admissibilidade no âmbito dos Tribunais de Ética e Disciplina, compostas por seus membros ou por Conselheiros Seccionais, com atribuição de análise prévia dos pressupostos de admissibilidade das representações ético-disciplinares, podendo propor seu arquivamento liminar". Embora nessa fase pré-processual não esteja presente o amplo direito de defesa com todas as provas a ele inerentes, entendemos respeitar os princípios da celeridade e eficiência que o relator faculte à parte representada o acesso aos autos e manifestação em sede de esclarecimentos preliminares. Muitas vezes, o mero estabelecimento do contraditório é capaz de aclarar determinada situação ao relator que em vez de instaurar um longo processo disciplinar, pode antecipadamente entender pelo arquivamento do feito.  Cumpre destacar não caber à OAB o papel de aprimoramento da peça de acusação ou a produção de provas em qualquer fase da persecução disciplinar, haja vista que, assim atuando, estará anexando à sua competência de julgadora, também a de acusadora, o que é absolutamente inaceitável no direito repressivo. Nesse sentido, caso a representação não reúna os requisitos do art. 57 do CED para avançar, seu destino deve ser o arquivamento, ou seja, a representação deve conter minimamente a identificação das partes representadas, seu endereço, a narração dos fatos que motivam a representação e vir acompanhada de todos os documentos capazes de provar os fatos objetos da representação, caso existam. Aqui, todavia, cabem duas exceções: caso a parte representante seja um particular e padeça, claramente, de hipossuficiência técnica, não sendo capaz de elaborar uma representação com os requisitos do art. 57 do CED e destinada ao arquivamento, deve o relator da fase de admissibilidade permitir a emenda à inicial, ainda indicando o que falta à peça de ingresso para que suas alegações possam ser conhecidas. Seria o exemplo de pessoa idosa e muito simples, de parca leitura, que acabou lesada por advogado que recebeu valores para propositura de uma ação e quedou-se inerte, locupletando-se com a quantia. São casos que infelizmente chegam todos os dias à OAB, que não pode padecer imparcial diante de tais injustiças. Esse dever da OAB decorre da função social da instituição, assim como do papel constitucional do advogado, que é essencial à administração da Justiça na forma do art. 133 da CF/88. Seria, assim, um contrassenso que a OAB permitisse a advogado se locupletar de qualquer pessoa nessas condições ou outras análogas. A segunda exceção é quando o relator da admissibilidade agir em benefício da defesa. Imagine-se, assim, que o advogado é representado por violação do art. 34, inciso XV da lei Federal 8.906/94, porque em defesa de seu cliente imputou à parte ex adversa a prática de crime. Instado à apresentação de seus esclarecimentos preliminares em sede de admissibilidade, o advogado afirma que as imputações que realizou na peça objeto da representação lhe foram narradas por seu cliente e com sua autorização, todavia, deixa de juntar à sua defesa a procuração com tais poderes, documento capaz de lhe absolver imediatamente do quanto é acusado. Ao relator, é perfeitamente possível intimar o representado à juntada da procuração especial, que implicará no arquivamento do feito, evitando assim o constrangimento de todo o processo disciplinar. Desta forma e em conclusão, o arquivamento da representação na fase da admissibilidade e sem a instauração do processo ético-disciplinar é importantíssimo ao advogado, porque além de lhe evitar o natural constrangimento e os riscos do processo disciplinar, ainda não causa qualquer mácula em seus assentamentos, que remanescem sem registros, não podendo o arquivamento sequer ser considerado como mau antecedente para fins do art. 40, parágrafo único da lei 8.906/94.