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Processo Disciplinar no Sistema OAB e atualidades jurídicas

Análise de casos e questões do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB.

Antonio Alberto do Vale Cerqueira
Como já mencionado em outras oportunidades é bastante comum o desconhecimento das nuances do processo administrativo disciplinar da OAB não só para a população, mas para a própria advocacia.  A título de exemplo, nos processos judiciais em que antigos clientes que representaram advogados no Tribunal de Ética e Disciplina por ato de locupletamento ingressam com ações cíveis para ressarcimento de seus prejuízos, nunca se vê, entre tais iniciativas, a utilização de outras ações da mesma natureza como prova subsidiária de um modus operandi ou comportamento reiterado, mas muito pelo contrário, tal iniciativa é praticamente inédita.  Isso não é feito porque o atual advogado da parte lesada, que patrocina a ação cível e a ação disciplinar, desconhece que pode ter acesso aos processos disciplinares findos contra o representado/requerido. Nas ações indenizatórias dessa natureza contra advogado, o magistrado a julgar o feito sempre se vê diante de um difícil dilema sobre os fatos que julga, duvidoso entre as alegações do antigo cliente e do profissional que se defende, que, claro, terá contundentes argumentos para sua defesa, como acerto de honorários verbal acima do pactuado em contrato; compensação de créditos adiantados; pagamento de outras atuações e inúmeras outras teses de grande relevância.  Em regra, são ações longas e difíceis de se vencer, que exigem a atuação de advogados capacitados e acostumados com a lida com esse tipo de processo.  Ora, nesses casos, certamente seria um grande reforço à atividade judicante daquele que julga o feito ter como prova, por exemplo, diversos outros casos em que o mesmo advogado respondeu pela mesma falta disciplinar.  Isso posto, não se olvida quanto ao sigilo dos processos disciplinares no sistema OAB, nos termos do art. 72 da lei Federal 8.906/94, entretanto, aqui se destaca a expressão "até seu término" que consta do §2º: Art. 72. O processo disciplinar instaura-se de ofício ou mediante representação de qualquer autoridade ou pessoa interessada. § 1º O Código de Ética e Disciplina estabelece os critérios de admissibilidade da representação e os procedimentos disciplinares. § 2º O processo disciplinar tramita em sigilo, até o seu término, só tendo acesso às suas informações as partes, seus defensores e a autoridade judiciária competente. Como se vê pela inequívoca redação, o sigilo dos autos terá sua duração até o trânsito em julgado administrativo do feito, devendo, a posteriori, ser aberto seu acesso às partes que o solicitarem. 
É bastante comum que advogados reclamem da divulgação de seus nomes nos processos disciplinares do sistema OAB. Afirmam tratar-se de violação de sua privacidade, exposição da intimidade e prejuízo profissional, todavia, claramente, há um enorme desconhecimento da norma no que toca à matéria.  O primeiro ponto, todavia, é se destacar que nesses casos o advogado está realizando sua própria defesa, um dos maiores erros que pode cometer. Daí, se seu nome não é divulgado, sustenta como tese a violação da ampla defesa, porque não tomou conhecimento do processo disciplinar, no que obviamente lhe assiste razão. Confira-se: Recurso ao Conselho Federal da OAB. Notificações. Art. 137-D do Regulamento Geral. As notificações, no curso do processo disciplinar, podem ser feitas através de publicação no Diário Eletrônico da OAB, devendo, as publicações observar que o nome e o nome social do(a) representado(a) deverão ser substituídos pelas suas respectivas iniciais, indicando-se o nome completo do(a) procurador(a) ou os seus, na condição de advogado(a) em causa própria. Assim, veiculando-se publicação da qual não constou o nome da advogada por extenso, eis que patrocinava a defesa em causa própria, tem-se a nulidade do ato de notificação. Anulação do processo disciplinar desde a publicação de fls. 240. (...) (Recurso n. 25.0000.2023.000076-4/SCA-PTU. EMENTA 113/24/SCA-PTU. Relator: Conselheiro Federal Caio Cesar Vieira Rocha (CE). (DEOAB, a. 6, n. 1401, 23.07.2024, p. 4). Como muitas vezes já afirmado, não há local mais preciso para a aplicação do entendimento de que todo advogado que atua em causa própria tem em seu cliente o maior dos tolos, haja vista que a pessoalidade de sentimentos no processo é extremamente desvantajosa para a boa técnica, sem falar no constrangimento para despachos, sustentação oral e outros atos que obrigatoriamente uma boa defesa deve agregar, e que são altamente prejudicados quando o próprio representado é o advogado. Ora, hipoteticamente, basta imaginar situação em que advogado representado é acusado de agredir brutalmente colega de trabalho, advogada. Embora os julgadores dos tribunais de ética de todo o país mereçam todos os elogios, pois exercem trabalho de tamanha responsabilidade de forma graciosa, é inegável se admitir certo constrangimento em tal ato, que só prejudica a defesa.  Pois bem, diante do "dilema" acima, ou seja, publicar o nome do advogado nos processos disciplinares para preservar a ampla defesa ou não publicar, a OAB nunca teve escolha, sendo, claro, a única opção possível a primeira, pois garantir o contraditório é o pilar de todo processo em um estado democrático de direito, sendo, no Brasil, garantia fundamental da pessoa humana. Com tais parâmetros foi que o Conselho Federal da OAB criou o art. 137-D do regulamento geral, cujo §4º dá solução ao caso: § 4º As demais notificações no curso do processo disciplinar serão feitas através de correspondência, na forma prevista no caput deste artigo, ou através de publicação na imprensa oficial do Estado ou da União, quando se tratar de processo em trâmite perante o Conselho Federal, devendo, as publicações, observarem que o nome do representado deverá ser substituído pelas suas respectivas iniciais, indicando-se o nome completo do seu procurador ou o seu, na condição de advogado, quando postular em causa própria.  É a última parte do parágrafo que bem explica a solução aplicada pela OAB. Em todas as publicações dos processos disciplinares em que o advogado estiver atuando em causa própria e realizado sua autodefesa, seu nome será publicado duas vezes. A primeira, completo, como advogado. A segunda, só com as iniciais, como representado.  Não se olvida que referida publicação pode, de fato, expor o advogado, pois ao mais atento que realizar pesquisas de publicações por seu nome pode realmente encontrar o PAD, realizado a correlação com as iniciais, todavia, não há alternativa à OAB, cuja norma apenas e tão somente seguiu a lógica legal de publicações, respeitando os princípios maiores da publicidade, do contraditório e da ampla defesa. A norma é corretíssima no ponto. Isso posto, o ensinamento é que não bastasse ser altamente desaconselhável que o advogado opte pela autorrepresentação em processos disciplinares, de fato seu nome será exposto em processos em que atuar em causa própria, recomendando-se, sempre, a contratação de profissional técnico e capacitado (afinal é o nome e a carreira do representado que está em jogo) para o patrocínio de sua defesa.
O anonimado não é bem recebido no ordenamento jurídico brasileiro, conforme faz constar o art. 5º, inciso IV da CF/881. No sistema OAB não é diferente, pois há expressa previsão legal no código de ética e disciplina que declara não se considerar fonte idônea aquela que consistir em denúncia anônima: Art. 55. O processo disciplinar instaura-se de ofício ou mediante representação do interessado. § 1º A instauração, de ofício, do processo disciplinar dar-se-á em função do conhecimento do fato, quando obtido por meio de fonte idônea ou em virtude de comunicação da autoridade competente. § 2º Não se considera fonte idônea a que consistir em denúncia anônima. Em recente decisão o CFOAB ratificou a dimensão da expressão "fonte idônea" que consta do §2º acima transcrito, declarando que o processo com fundamento em denúncia anônima violaria o direito de defesa, fulminando, assim, a pretensão punitiva administrativa a gerar o arquivamento. Recurso ao Conselho Federal da OAB. Denúncia anônima. Vedação. Recurso provido. 1) A Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso IV, assegura a todos a livre manifestação do pensamento, vedando o anonimato. Referida norma constitucional encontrava-se reproduzida no art. 51 do Código de Ética e Disciplina da OAB anterior, e, atualmente, está regulada pelo artigo 55, § 2º, do Código de Ética e Disciplina da OAB, a qual dispõe que não se constitui em prova idônea aquela que tiver por origem exclusivamente a denúncia anônima. 2) No caso dos autos, o processo disciplinar foi instaurado de ofício, com base em cópias de páginas de site de internet, sem informações a respeito de eventuais diligências realizadas e da origem dos documentos, constituindo-se situação de instauração de processo disciplinar em decorrência de denúncia anônima, restando prejudicado o exercício do contraditório e da ampla defesa. 3) Recurso provido, para determinar o arquivamento do processo disciplinar. (Recurso n. 49.0000.2023.005172-8/SCA-PTU. EMENTA N. 195/2024/SCA-PTU. Relator: Conselheiro Federal Ricardo Souza Pereira (MS). DEOAB, a. 6, n. 1444, 23.09.2024, p. 26). No mesmo sentido: Recurso ao Conselho Federal da OAB. Artigo 75, caput, do Estatuto da Advocacia e da OAB. Acórdão unânime do Conselho Seccional da OAB/Minas Gerais. Revisão de processo disciplinar. Art. 73, § 5º, EAOAB c/c art. 68 CED. Denúncia anônima. Vedação. Recurso provido. 1) A Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso IV, assegura a todos a livre manifestação do pensamento, vedando o anonimato. Referida norma constitucional encontrava-se reproduzida no artigo 51 do Código de Ética e Disciplina da OAB anterior, e, atualmente, está regulada pelo artigo 55, § 2º, do Código de Ética e Disciplina da OAB, a qual dispõe que não se constitui em prova idônea aquela que tiver por origem exclusivamente a denúncia anônima. 2) No caso dos autos, o processo disciplinar foi instaurado de ofício, por Presidente de Subseção da OAB, ao fundamento de que recebeu diversas denúncias de outros advogados imputando aos advogados ora recorrentes a prática de diversos atos de angariação de causas por meio de publicidade irregular e, embora tenha declinado o Presidente da Subseção que houve a apuração, não constam dos autos documentos ou elementos relativos às diligências eventualmente instauradas, apenas a relação de processos judiciais patrocinados pelos advogados, retirada do site do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, bem como um panfleto apócrifo, sem identificação ou menção aos advogados, não permitindo concluir que fora por eles confeccionado, circunstâncias que ensejariam, na origem, a não instauração de processo disciplinar. 3) Recurso provido, para deferir a revisão do processo disciplinar n. 9117/2014 e ali julgar improcedente a representação, determinando-se o arquivamento dos autos. (Recurso n. 49.0000.2021.010050-1/SCA-STU. EMENTA N. 026/2023/SCA-STU. Relator: Conselheiro Federal Luiz Augusto Reis de Azevedo Coutinho (BA). DEOAB, a. 5, n. 1074, 03.04.2023, p. 18). De outro lado, a jurisprudência também se coloca favorável ao papel dos tribunais de ética ao atuarem de ofício, com impulsionamento próprio, na forma do quanto prescrevem os art. 70, §1º e 72 do EAOAB: Art. 70. O poder de punir disciplinarmente os inscritos na OAB compete exclusivamente ao Conselho Seccional em cuja base territorial tenha ocorrido a infração, salvo se a falta for cometida perante o Conselho Federal. § 1º Cabe ao Tribunal de Ética e Disciplina, do Conselho Seccional competente, julgar os processos disciplinares, instruídos pelas Subseções ou por relatores do próprio conselho.  Art. 72. O processo disciplinar instaura-se de ofício ou mediante representação de qualquer autoridade ou pessoa interessada. Confira-se a posição do Conselho Federal: Recurso ao Conselho Federal da OAB. Artigo 75, caput, do Estatuto da Advocacia e da OAB. Acórdão unânime do Conselho Seccional da OAB/São Paulo. Composição de órgão julgador recursal. Participação de Conselheiros Seccionais suplentes. Possibilidade. Inexistência de nulidade. Diferentemente deste Conselho Federal da OAB, no âmbito dos Conselhos Seccionais da OAB os Conselheiros Seccionais suplentes, ao tomarem posse, são detentores dos mandatos de Conselheiros Seccionais nas mesmas condições que os titulares. O tema de relevância citado pelos advogados, no julgamento realizado pela Segunda Câmara do Conselho Federal da OAB, não tem a ver com a vedação à convocação de conselheiros suplentes para composição de órgãos julgadores, mas sim que sejam valorados apenas os votos proferidos em processo de exclusão e desfavoráveis ao advogado, circunstância diversa do presente caso. Arguição de nulidade sob a alegação de tratar-se de denúncia anônima. Inexistência. Processo disciplinar instaurado de ofício, devidamente instruído pelo Presidente do TED com página de site comprovando a publicidade irregular. Violação ética de conhecimento público e poder-dever da OAB de apurar a conduta de seus inscritos. Teor das publicações veiculadas que não foram contestadas. Angariação de causas (Art. 34, IV, EAOAB), por meio da rede social facebook. Infração disciplinar configurada. Inobstante qualquer regulamentação específica, o Código de Ética e Disciplina da OAB já assevera que a publicidade profissional do advogado tem caráter meramente informativo e deve primar pela discrição e sobriedade, não podendo configurar captação de clientela ou mercantilização da profissão (art. 39, CED), o que restou constatado nos autos. Recurso não provido. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros da Primeira Turma da Segunda Câmara do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, observado o quorum exigido no art. 92 do Regulamento Geral, por unanimidade, em rejeitar a preliminar arguida e no mérito negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator, com os acréscimos do Conselheiro Stalyn Paniago Pereira (MT). Brasília, 27 de fevereiro de 2024. Rafael Braude Canterji , Presidente em exercício. Lara Diaz Leal Gimenes, Relatora ad hoc. (Recurso n. 25.0000.2022.000587-7/SCA-PTU EMENTA N. 027/2024/SCA-PTU. Relator: Conselheiro Federal Márcio Brotto de Barros (ES). DEOAB, a. 6, n. 1315, 20.03.2024, p. 7). Exsurge, portanto, a óbvia dúvida: quais os limites para atuação de ofício e em que situações estar-se-ia diante de denúncias anônimas, e, portanto, inválidas. A solução é simples. Os Tribunais de Ética e Disciplina de todo o país recebem diariamente centenas de denúncias de violações ético disciplinares e têm, como dever, apurar seu conteúdo. Pois bem, para alguns casos, não há se falar em anonimato, como em representações realizadas por autoridades, representações formalizadas por uma parte etc. O problema reside sempre nos casos em que o tribunal toma conhecimento de alguma irregularidade e instaura o procedimento preliminar sem a devida investigação, sem os cabíveis registros, configurando, assim, de fato, violações à necessária transparência do processo. É o caso, com recorrência, da publicidade irregular realiza em redes sociais e sites patrocinados, como o google ads. Nesses casos, a depender da construção do processo, haverá a violação do direito de defesa por via indireta, porque, em verdade, viola-se o contraditório, pois à defesa, em regra, deve-se facultar conhecer seu acusador, até porque muitas vezes a identidade daquele que acusa pode ser fato gerador de teses resistivas. Isso posto e em resumo, cabe aos tribunais de ética e disciplina, nos processos instaurados de ofício, provocar, antes, a Comissão de Fiscalização da Atividade da Advocacia de suas Seccionais (quando houver) ou setores do próprio tribunal para que registrem as máculas disciplinares de forma correta, assumindo, assim, a legitimidade processual para a representação e afastando o quanto eventualmente tenha sido informado por fonte anônima. Em outras palavras, a fonte anônima é reconhecida como apta para levar os fatos ao conhecimento do tribunal, todavia, tudo o que informar deverá ser desprezado, utilizado apenas e tão somente como guia para busca, identificação e registro pelo órgão do TED, que, a partir do que apurar, poderá dar início a procedimento de ofício. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira ________ 1 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
O último ponto a se abordar nesse estudo é a clara responsabilidade civil do advogado, em relação a seu cliente, por danos causados em função de invalidação de seus atos, porquanto advogando enquanto suspenso. Antes, todavia, cumpre relembrar que a relação entre advogado e cliente não é de consumo. O acórdão paradigma abaixo, do Colendo STJ, já tem mais de uma década desde sua produção, mas ainda é o condutor da posição jurisprudencial no país:  RECURSO ESPECIAL. SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS. CONTRATO. NÃO INCIDÊNCIA DO CDC. DEFICIÊNCIA NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. NEGATIVA DE QUE FORA EFETIVAMENTE CONTRATADO PELO CLIENTE. DANOS MORAIS. CARACTERIZAÇÃO. SÚMULA 7/STJ. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO. 1.- As relações contratuais entre clientes e advogados são regidas pelo Estatuto da OAB, aprovado pela Lei n. 8.906/94, a elas não se aplicando o Código de Defesa do Consumidor. Precedentes. 2.- A convicção a que chegou o Tribunal de origem quanto ao nexo de causalidade entre a conduta do advogado que negou que fora contratado e recebera procuração do cliente para a propositura de ação de cobrança e os danos morais suportados por esse decorreu da análise do conjunto fático-probatório, e o acolhimento da pretensão recursal demandaria o reexame do mencionado suporte, obstando a admissibilidade do especial à luz da Súmula 7 desta Corte. 3.- Sendo a ação de indenização fundada no direito comum, regular a aplicação do art. 177 do Código Civil, incidindo a prescrição vintenária, pois o dano moral, na presente hipótese, tem caráter de indenização, de reparação de danos e pela regra de transição (art.2.028 do Novo Código Civil) há de ser aplicado o novo prazo de prescrição, previsto no art. 206, § 3º, IV do mesmo diploma legal. 4.- Recurso Especial improvido. (REsp n. 1.228.104/PR, relator Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 15/3/2012, DJe de 10/4/2012.)  Desta forma, eventual direito indenizatório será regulado pela lei Federal 8.906/94 (EAOAB), pelas normas administrativas do sistema OAB e pelo Código Civil, artigos 186 e 927.  Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.    Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.  Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.  O EAOAB estabelece que:  Art. 32. O advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa.  Pois bem, como já explicamos em artigo anterior (clique aqui para ler) a sanção disciplinar de suspensão retira do advogado toda sua capacidade postulatória, além de suas prerrogativas. Exatamente por essa razão, estabelece o artigo 4º do EAOAB que:  Art. 4º São nulos os atos privativos de advogado praticados por pessoa não inscrita na OAB, sem prejuízo das sanções civis, penais e administrativas. Parágrafo único. São também nulos os atos praticados por advogado impedido - no âmbito do impedimento - suspenso, licenciado ou que passar a exercer atividade incompatível com a advocacia.  Vê-se, pois, que, uma vez peticionando enquanto suspenso e sendo o fato descoberto por uma das partes do processo, os atos do advogado naquele feito serão considerados nulos de pleno direito. A questão já foi vista e revista por Tribunais de todo o país, especialmente porque impõe prejuízo a terceiro que desconhecia a situação, o cliente. Nada obstante, ainda prevalece o entendimento de que ausente a capacidade postulatória do advogado, o ato será nulo. Assim, por exemplo, eventual recurso assinado por advogado suspenso, não será conhecido. O assunto já chegou ao STF, que pacificou a matéria com o seguinte entendimento:  RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PENAL. PROCESSUAL PENAL. RECURSO INTERPOSTO POR ADVOGADO COM A INSCRIÇÃO SUSPENSA NA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. AUSÊNCIA DE CAPACIDADE POSTULATÓRIA. NÃO CONHECIMENTO. ILEGALIDADE FLAGRANTE. INOCORRÊNCIA. PACIENTE CONDENADO PELO DELITO DE RECEPTAÇÃO QUALIFICADA. REGIME INICIAL ABERTO. IMPOSSIBILIDADE. NULIDADE NA SESSÃO DE JULGAMENTO DO WRIT MANEJADO NO STJ. INEXISTÊNCIA. RECURSO NÃO CONHECIDO. I - O advogado que subscreveu a petição de interposição do recurso ordinário está com a inscrição suspensa na OAB/MG, não possuindo, portanto, capacidade postulatória para a prática do ato. II - Esta Corte entende que o recorrente deve possuir capacidade postulatória para interpor recurso ordinário em habeas corpus, ainda que tenha sido o impetrante originário, por tratar-se de ato privativo de advogado. III - Nos termos do art. 4º, parágrafo único do Estatuto da Advocacia e da OAB, são nulos os atos privativos de advogado praticados por aquele que esteja com a inscrição suspensa. IV - A fixação do regime inicial semiaberto parece estar devidamente justificada, nos termos do art. 33, § 2º, b, do CP. V - Não se verifica, de plano, a alegada nulidade na sessão de julgamento na qual foi apreciado o writ manejado em favor do ora recorrente no STJ, uma vez que o ato parece ter atendido aos ditames do Regimento Interno daquela Corte Superior. VI - Recurso ordinário não conhecido. (RHC 121722, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 20/05/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-194 DIVULG 03-10-2014 PUBLIC 06-10-2014)  O entendimento se espalhou pelo país e hoje é amplamente aplicado:  PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DO DEVEDOR. APELAÇÃO CÍVEL. NECESSIDADE DE RECONHECER DE OFÍCIO AUSÊNCIA DE UM DOS PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS. FALTA DE PROCURAÇÃO. ADVOGADA COM INSCRIÇÃO SUSPENSA NA OAB. SUBSTABELECIMENTO INVÁLIDO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. REMESSA DE CÓPIA DOS AUTOS À OAB. RECURSO PREJUDICADO. Por se tratar de matéria de ordem pública deve ser reconhecida ex officio a ausência de um dos pressupostos processuais, no caso em tela a falta de capacidade postulatória para litigar em juízo. Isto porque, não existe procuração nos autos da advogada que subscreveu a petição inicial, além disso sua inscrição estava suspensa perante a OAB, o que torna todos os seus atos nulos. O juízo a quo, atendendo ao disposto no art. 13 do Código de Processo Civil, determinou à embargante que nomeasse outro patrono para a causa, todavia, esta quedou-se inerte, vindo a advogada a "substabelecer" poderes que não possuía. Assim, diante da ausência de capacidade postulatória, a extinção do processo sem resolução do mérito é medida que se impõe, com fulcro no art. 267, IV do Código de Processo Civil, restando prejudicado o presente apelo. (TJPR - 15ª Câmara Cível - AC - Manoel Ribas. Rel.: DESEMBARGADOR FABIO HAICK DALLA VECCHIA - Unânime -  J. 11.07.2007)  APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL E PROCESSO CIVIL. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS PARA PROPOSITURA E ACOMPANHAMENTO DE QUEIXA-CRIME. AÇÃO PENAL PRIVADA. ATIVIDADE MEIO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO ADVOGADO. DECADÊNCIA DO DIREITO DE AÇÃO. COMPROVAÇÃO DE CULPA. TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE APLICÁVEL. DANO MATERIAL E DANO MORAL CONFIGURADOS. REDUÇÃO DO QUANTUM DA COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. PARCIAL PROVIMENTO. 1. O mandato é uma das formas de contrato previstas no Código Civil e impõe responsabilidade de natureza contratual do advogado perante os seus clientes (arts. 653 e 667 do CC). 2. A obrigação assumida por advogado para prestação de serviços jurídicos é de meio e não de resultado e sua responsabilidade civil é subjetiva, sendo imprescindível que o cliente descreva e comprove a culpa ou dolo do advogado no patrocínio de sua causa, a fim de alcançar a indenização pelos danos sofridos. 3. Para aplicação da teoria da perda de uma chance, no caso de responsabilidade de profissionais de advocacia por condutas apontadas como negligentes ou imperitas, a incerteza da vantagem não experimentada deve ser ponderada a partir de detida análise acerca das reais possibilidades de êxito do postulante, eventualmente perdidas em razão da desídia do causídico. Embora isso não signifique que o advogado seja obrigado a garantir o sucesso da demanda, implica dizer que, no exercício do seu mister, o profissional deverá ser diligente, técnico, eficaz, comprometido com o êxito da demanda e procurar sempre buscar a melhor forma de solucioná-la, sem causar prejuízos ao mandante. 4. Se a decadência do direito de propositura de ação penal privada, com plausível possibilidade de êxito, decorreu exclusivamente dos graves e sucessivos equívocos cometidos pelos advogados contratados especificamente para esse fim, deve ser reconhecida a responsabilidade dos causídicos pelos danos materiais e morais causados à outorgante. 5. Deve ser reduzido o quantum arbitrado a título de compensação por danos morais quando o valor fixado se mostrar excessivo, diante das peculiaridades do caso concreto. 6. Recurso conhecido e parcialmente provido. (Acórdão 1418741, 07114156620208070001, Relator(a): JOSAPHA FRANCISCO DOS SANTOS, 5ª Turma Cível, data de julgamento: 4/5/2022, publicado no DJE: 11/5/2022. Pág.: Sem Página Cadastrada.)  Nesses casos, claro, é inegável o prejuízo ao cliente, o que lhe pode ser fato gerador de indenização. Entretanto, se de um lado houve o prejuízo processual, de outro é impossível prever que sua tese, caso conhecida, fosse vitoriosa. Para exemplificar, imagine que concurseiro seja impedido de ingressar na sala para prestar a prova do concurso por um atraso de um minuto, encontrando os portões fechados. Via processo judicial, posteriormente, acaba conseguindo provar que o relógio do fiscal de prova que fechou os portões estava adiantado em dois minutos, sendo reconhecida, assim, a ilicitude no ato que lhe impediu realizar a prova. Nesse exemplo, nunca se poderia afirmar que o candidato seria aprovado, todavia, é certo afirmar que perdeu a oportunidade naquela disputa. Aplica-se, então, em seu favor, o que se convencionou ser a teoria da perda de uma chance, de forma a poder ser indenizado em valor que o Judiciário, na análise do caso concreto, entender pertinente.  No caso do advogado, da mesma forma, a questão também pode ser resolvida pela perda de uma chance, ou seja, não é certo que o cliente prejudicado ganharia a demanda que acabou não sendo conhecida em face da suspensão de seu advogado, todavia, é certo que por culpa do advogado não teve a oportunidade de ver sua questão discutida junto ao judiciário. __________ *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui (clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira
A conduta de burlar sanção administrativa prevista por órgão é sempre gravíssima, como restou bem demonstrado pelo exemplo do Código de Trânsito brasileiro, exatamente porque a sanção disciplinar é a norma coercitiva que deve ter o poder de reprimir, retificar e punir a conduta daquele a ela sujeito, seja como indivíduo da sociedade, como é o condutor de veículo automotor; seja de profissional, como são os servidores públicos e profissionais ligados a conselhos de classe, advogados, engenheiros, contadores, médicos, enfermeiros e outros. Caso se desprestigie o poder da norma sancionadora disciplinar, estar-se-á a atacar direitamente o poder de regulação do aplicador do direito. Não é comum apenas à OAB a previsão de punição em caso de desobediência de suas decisões, também o CRM1 e outros Conselhos e/ou órgãos têm dispositivos análogos. Essas conclusões vêm apenas reforçar a ideia de que a aplicação do art. 34, inciso I do EAOAB para os casos em que o profissional suspenso mantenha-se realizando atos privativos de advogado compromete em absoluto a efetividade e a eficiência do sistema OAB, haja vista a previsão de sanção administrativa mais branda do que aquela que está a desobedecer. Isso, claro, sem se falar no prestígio e grandeza da advocacia, que acabam altamente desvalorizados à luz da aparente impunidade decorrente da desobediência. Não bastasse, portanto, ser gravíssima do ponto de vista administrativo a nova mácula disciplinar decorrente dessa desobediência, a jurisprudência do STJ se consolidou definindo que tal prática configura o crime previsto no art. 205 do Código Penal, o que, de forma idêntica, reforça a incorreção da interpretação por aplicação de sanção administrativa tão branda como a do inciso I. Exercício de atividade com infração de decisão administrativa Art. 205 - Exercer atividade, de que está impedido por decisão administrativa: Pena - detenção, de três meses a dois anos, ou multa. A decisão paradigma para se definir por esse crime para os casos dessa conduta foi tomada no Conflito de Competência CC 165.781/MG, de relatoria da ministra Laurita Vaz: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. PENAL E PROCESSUAL PENAL. EXERCÍCIO DA ADVOCACIA COM A INSCRIÇÃO NA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SUSPENSA. CONFIGURAÇÃO DO DELITO DO ART. 205 DO CÓDIGO PENAL. CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR COMPETENTE O JUÍZO FEDERAL SUSCITANTE. 1. Hipótese em que a controvérsia apresentada cinge-se à definição do tipo penal a que se amolda a conduta da Interessada, a qual teria exercido a advocacia com a inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil suspensa, em razão de infração reconhecida pelos órgãos disciplinares competentes. 2. A questão difere daquela relativa ao inadimplemento de anuidade, na qual esta Corte tem entendido que se configura a contravenção penal do art. 47 do decreto-lei 3.688/41, porque "não representa verdadeira punição disciplinar, mas apenas mero ato administrativo de saneamento cadastral e, por consequência, não se amolda ao conceito penal de decisão administrativa proibitiva do exercício da profissão" (CC 164.097/SP, rel. min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 11/03/2019). 3. Tendo sido a suspensão da inscrição determinada pela autoridade competente, qual seja, no caso, a OAB, em processo administrativo, está configurado o crime do art. 205 do Código Penal, qual seja, "Exercer atividade, de que está impedido por decisão administrativa". 4. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo Federal, o Suscitante. (CC 165.781/MG, rel. ministra LAURITA VAZ, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 14/10/2020, DJe 21/10/2020) No ano seguinte, novamente, o STJ confirmou o acerto da decisão, também em conflito de competência, tendo o ministro Antonio Saldanha Palheiro aplicado o aresto acima como referência: CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 169078 - MG (2019/0319513-3). DECISÃO Trata-se de conflito negativo de competência no qual figuram como suscitante o JUÍZO FEDERAL DA 1A VARA DE POÇOS DE CALDAS - SJ/MG e como suscitado o JUÍZO DE DIREITO DA 1A VARA DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. Consta dos autos ter sido lavrado termo circunstanciado pela Polícia Civil de Minas Gerais contra advogada que supostamente exercera a profissão mesmo estando suspensa dos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil em razão de processo administrativo disciplinar. O Juízo estadual acatou o parecer ministerial e declarou-se incompetente ao argumento de que os fatos narrados eram tipificados no art. 205 do Código Penal, praticado contra autarquia federal especial, motivo pelo qual, nos termos do art. 109, IV e VI, da Constituição Federal, competiria à Justiça Federal processar e julgar o feito. O Juízo federal, por sua vez, também acolheu a manifestação ministerial, declarou-se igualmente incompetente e suscitou o conflito de competência por concluir que "o STJ assentou o entendimento de que o advogado que, após sofrer suspensão disciplinar pela OAB, pratica o exercício da profissão, não comete o crime previsto no artigo 205 do Código Penal, mas sim a contravenção penal do artigo 47 do decreto-lei 3.688/41" (e-STJ fl. 210), o que afastaria a competência da Justiça Federal. O Ministério Público Federal manifestou-se pela competência do Juízo estadual (e-STJ fls. 226/230). É, em síntese, o relatório. Decido. Conheço do conflito, pois trata-se de controvérsia instaurada entre juízes vinculados a tribunais distintos, a teor do que preceitua o art. 105, inciso I, alínea d, da Constituição Federal. Como antes relatado, a investigação penal apura a prática de ilícito envolvendo advogada que exerceu a profissão mesmo estando suspensa dos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil em razão de processo administrativo disciplinar. Conforme relatado pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais, há indícios de habitualidade delitiva, uma vez que "não remanesce aqui uma simples situação de exercício irregular de profissão ou de atividade econômica (art. 47 da LCP), e sim de uma casuística mais gravosa, qual seja, a de uma advogada, já suspensa de suas funções por força de decisão administrativa da OAB, que continuava postulando em vários processos, infringindo, assim, o poder disciplinar de seu próprio órgão de classe" (e-STJ fl. 189). Levando-se em conta os elementos constantes do presente conflito de competência suscitado no curso de investigação em andamento, a conduta imputada à acusada, ao que parece, e na linha da orientação firmada no âmbito desta Corte, subsome-se ao tipo previsto no art. 205 do Código Penal, da competência da Justiça Federal, senão vejamos: "CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. PENAL E PROCESSUAL PENAL. EXERCÍCIO DA ADVOCACIA COM A INSCRIÇÃO NA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SUSPENSA. CONFIGURAÇÃO DO DELITO DO ART. 205 DO CÓDIGO PENAL. CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR COMPETENTE O JUÍZO FEDERAL SUSCITANTE.(...) 1. Hipótese em que a controvérsia apresentada cinge-se à definição do tipo penal a que se amolda a conduta da Interessada, a qual teria exercido a advocacia com a inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil suspensa, em razão de infração reconhecida pelos órgãos disciplinares competentes. 2. A questão difere daquela relativa ao inadimplemento de anuidade, na qual esta Corte tem entendido que se configura a contravenção penal do art. 47 do Decreto-Lei n. 3.688/1941, porque "não representa verdadeira punição disciplinar, mas apenas mero ato administrativo de saneamento cadastral e, por consequência, não se amolda ao conceito penal de decisão administrativa proibitiva do exercício da profissão" (CC n. 164.097/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 11/03/2019). 3. Tendo sido a suspensão da inscrição determinada pela autoridade competente, qual seja, no caso, a OAB, em processo administrativo, está configurado o crime do art. 205 do Código Penal, qual seja, "Exercer atividade, de que está impedido por decisão administrativa". 4. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo Federal, o Suscitante. (CC 165.781/MG, rel. Ministra LAURITA VAZ, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 14/10/2020, DJe 21/10/2020)" Ante o exposto, conheço do conflito e dou por competente o Juízo suscitante. (CC n. 169.078, Ministro Antonio Saldanha Palheiro, DJe de 09/02/2021.) Como se vê, é indiscutível à luz da jurisprudência atual que referida conduta é tão grave a ponto de desafiar a aplicação da ultima ratio, seja entendendo-a como a contravenção penal do art. 47 da lei de contravenções penais, 3.688/41 ou como o crime previsto no art. 205 do Código Penal: Art. 47. Exercer profissão ou atividade econômica ou anunciar que a exerce, sem preencher as condições a que por lei está subordinado o seu exercício: Pena - prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa, de quinhentos mil réis a cinco contos de réis. Exercício de atividade com infração de decisão administrativa Art. 205 - Exercer atividade, de que está impedido por decisão administrativa: Pena - detenção, de três meses a dois anos, ou multa. Não há dúvida que os limites da tipicidade são bem próximos nesse caso, todavia, como visto, o STJ pacificou a matéria, entendendo que referida prática configura crime e não contravenção penal, o que parece ser a posição mais acertada, pois na comparação entre os tipos punitivos, a dolosa violação da decisão de suspensão encontra melhor enquadramento no preceito primário do art. 205 do Código Penal. Pois bem, embora com poucos casos no Brasil, cumpre afirmar que a prática pode também configurar outros crimes, como os patrimoniais. Ora, em situação hipotética, imagine-se que homem vai até escritório de advocacia e contrata advogado para a elaboração de recurso de apelação, sem saber que o profissional está suspenso. O advogado se apresenta, escuta o problema, fornece algumas opiniões e cobra o valor de seus honorários; as partes assinam contrato e o agora cliente também assina a procuração, ou seja, todos até aqui atos privados da advocacia. O advogado não informa que está com sua OAB suspensa, e, portanto, não tem capacidade postulatória para o exercício da advocacia. Nada obstante, confecciona o recurso, assina e o protocoliza no Tribunal, acabando o órgão por dele não conhecer, uma vez ciente da sanção administrativa aplicada. Ora, considerando que a advocacia não se restringe à atuação nos Tribunais, todos os atos acima foram realizados em direta afronta à suspensão aplicada, desde a apresentação do infrator como advogado, passando pela primeira reunião, cobrança de honorários, assinatura do contrato e da procuração, até o protocolo do recurso. Como visto, esse proceder pode configurar o crime previsto no art. 205 do Código Penal, todavia, não é só, pois o advogado também pode haver cometido contra o cliente o crime de estelionato, haja vista que dolosamente o manteve em erro ao não informar sua impossibilidade de advogar, obtendo vantagem ilícita.   Estelionato Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento: Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, de quinhentos mil réis a dez contos de réis Também pode estar presente o crime de falsidade ideológica, porque ao produzir e assinar documentos estando impedido de fazê-lo, o ato pode se amoldar ao preceito primário do art. 299 do Código Penal: Falsidade ideológica Art. 299 - Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante: Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, de quinhentos mil réis a cinco contos de réis, se o documento é particular. Parágrafo único - Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de registro civil, aumenta-se a pena de sexta parte. Nos casos de suspensão, como já mencionado, o advogado perde todos os seus direitos junto ao Judiciário, incluindo sua capacidade postulatória:   PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NA PETIÇÃO. ADVOGADO COM INSCRIÇÃO NA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SEÇÃO JUDICIÁRIA DE MINAS GERAIS -OAB/MG SUSPENSA. AUSÊNCIA DE CAPACIDADE POSTULATÓRIA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO CONHECIDO. 1. A decisão agravada não identificou qualquer ilegalidade na decisão proferida por desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais - TJMG que impediu o ora agravante de encaminhar petições àquele Tribunal Estadual, por estar com sua inscrição na OAB/MG suspensa. 2. Referida suspensão foi confirmada em resposta a ofício encaminhado ao Diretor Secretário Geral da OAB/MG, em 12/4/2024. Diante disso, o presente agravo regimental é inadmissível por ausência de capacidade postulatória do agravante. 3. Agravo regimental não conhecido. (AgRg na Pet n. 16.216/MG, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 1/7/2024, DJe de 3/7/2024.) Os efeitos da suspensão são tão contundentes na vida do profissional, que suas prerrogativas também são suspensas, como o diferenciado direito de ser recolhido à sala de Estado maior em caso de prisão: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. DECISÃO ADEQUADAMENTE FUNDAMENTADA. REITERAÇÃO DELITIVA. ACUSADA CONDENADA EM OUTRO PROCESSO E QUE RESPONDE A VÁRIOS FATOS DELITUOSOS. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE MANIFESTA. RECOLHIMENTO EM SALA DE ESTADO MAIOR. DIREITO DO ADVOGADO NÃO SUSPENSO DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE. 1. A prisão é medida extrema sujeita à existência de elementos concretos de comprovação da necessidade de proteção da ordem pública, garantia de aplicação da lei penal e conveniência da instrução criminal. 2. Na hipótese, não há patente ilegalidade a ser reconhecida, pois a custódia preventiva restou firmada para o resguardo da ordem pública pelo risco da reiteração delitiva, na medida em que a acusada tem contra si outros processos criminais e é conhecido por ser traficante de drogas. 3. Quanto ao direito ao recolhimento em sala de Estado Maior, o advogado só faz jus a essa prerrogativa se estiver no livre exercício da profissão, o que não é o caso dos autos porque a pretendente encontra-se suspensa dos quadros da OAB. 4. Ordem denegada. (HC 368.393/MG, rel. ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 20/09/2016, DJe 30/09/2016) Até aqui, portanto, pode-se expor as seguintes conclusões: (a) embora a OAB entenda que a conduta de advogar enquanto suspenso configure a mácula disciplinar prevista no art. 34, inciso I da lei federal 8.906/94, melhor interpretação é que o inciso I, que estabelece a mais branda das infrações disciplinares, trate apenas dos impedimentos do art. 30. Assim, a conduta gravíssima em debate estaria enquadrada nas hipóteses mais graves da lei, incisos XXV, XXVII e XXVIII. Ademais, essa interpretação corrige a inegável distorção advinda da desproporcionalidade por se punir de forma igual aquele que viola o art. 30 do EAOAB com aquele que, por exemplo, está suspenso por 12 meses porque se apropriou indevidamente de elevada quantia de cliente, cometendo potencialmente o crime de apropriação indébita e ainda assim continua a advogar. Esse exemplo revela às escâncaras o problema aqui exposto, pois se esse último advogado mantém sua advocacia em desprezo à decisão da OAB, ficará sujeito à mesma sanção daquele que apenas viola o art. 30 do EAOAB. A outra conclusão é que (b) referida conduta é tão grave que pode configurar diferentes crimes praticados pelo infrator, incluindo o tipo penal do art. 205 do CP, além de estelionato e falsidade ideológica. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira __________ 1 Art. 18. Desobedecer aos acórdãos e às resoluções dos Conselhos Federal e Regionais de Medicina ou desrespeitá-los.
Após os parâmetros traçados na primeira parte deste escrito, que trouxeram não só visão geral sobre o tema, mas os efeitos da sanção disciplinar de suspensão da carreira do advogado, passa-se agora às consequências daquele profissional que, suspenso pela OAB, continua a advogar, ignorando a sanção que lhe foi imposta. De início, cumpre declarar que há nova infração disciplinar cometida, haja vista a gravidade do fato, ou seja, após a OAB impor seu poder disciplinar por falta tão grave a ponto de decretar a suspensão, essa sanção é ignorada e o profissional continua a praticar atos privativos à advocacia, à revelia do comando de seu órgão de classe. No ponto, a jurisprudência do Conselho Federal se formou de forma extremamente branda para tal prática, haja vista que pacificamente entende violado o inciso I do art. 34 da lei federal 8.906/94, ou seja, a mais branda de todas as infrações disciplinares. Art. 34. Constitui infração disciplinar: I - exercer a profissão, quando impedido de fazê-lo, ou facilitar, por qualquer meio, o seu exercício aos não inscritos, proibidos ou impedidos; O precedente abaixo, de recente data, bem reflete a posição do CFOAB sobre a matéria: Recurso ao Conselho Federal da OAB. Artigo 75, caput, do Estatuto da Advocacia e da OAB. Decisão definitiva e unânime de Conselho Seccional da OAB. Prescrição. Inocorrência. Exercer a advocacia enquanto suspenso do exercício profissional (art. 34, I, EAOAB). Infração disciplinar configurada. 1) No caso dos autos, não se constata a prescrição arguida pelo advogado, face à ausência de transcurso de lapso temporal superior a 05 (cinco) anos de tramitação do processo disciplinar entre as causas interruptivas do curso da prescrição quinquenal, ou a paralisação do processo disciplinar por mais de 3 anos, pendente de despacho ou julgamento, razão pela qual deve ser rejeitada. 2) Advogado que promove atos privativos da advocacia durante o período em que se encontrava suspenso. 3) Recurso improvido. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros da Segunda Turma da Segunda Câmara do Conselho Federal da OAB, observado o quorum exigido no art. 92 do Regulamento Geral, por unanimidade, em negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. Brasília, 23 de maio de 2023. Emerson Luis Delgado Gomes, Presidente e Relator. (Recurso n. 25.0000.2022.000126-7/SCA-STU. EMENTA N. 056/2023/SCA-STU. Relator: Conselheiro Federal Emerson Luis Delgado Gomes (RR). DEOAB, a. 5, n. 1116, 05.06.2023, p. 9). O entendimento coloca-se em posição diametralmente oposta à hermenêutica jurídica, no que toca às interpretações lógica1 e teleológica. A primeira, deseja entender o alcance na norma segundo sua lógica e a segunda sua finalidade social. É um grande contrassenso punir o advogado que, uma vez suspenso, continua a advogar em desprezo à ordem emanada por seu órgão de classe com uma mácula disciplinar mais amena do que a sanção original. Trata-se de um grave antagonismo que leva a uma quimera jurídica, porque basta que o advogado suspenso deixe de se preocupar com a sanção de suspensão que lhe foi imposta e continue normalmente a exercer sua profissão, pois será punido apenas com a pena de censura. Não faz sentido. Não se olvida, claro, à redação do art. 37, inciso II do EAOB, que permite a aplicação da suspensão em caso de reincidência em infração disciplinar, todavia, nesse caso, a aplicação da sanção mais severa dependerá de interpretação jurídica do aplicador do direito, que nem sempre é utilizada. Art. 37. A suspensão é aplicável nos casos de:     II - reincidência em infração disciplinar. A título de exemplo, vale a analogia com o Código de Trânsito Brasileiro, cujo art. 263 prevê a cassação da CNH do condutor que dirige seu veículo estando suspensa seu autorização para condução de veículo automotor: Art. 263. A cassação do documento de habilitação dar-se-á: I - quando, suspenso o direito de dirigir, o infrator conduzir qualquer veículo; O mesmo código torna crime tal desobediência: Art. 307. Violar a suspensão ou a proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor imposta com fundamento neste Código: Penas - detenção, de seis meses a um ano e multa, com nova imposição adicional de idêntico prazo de suspensão ou de proibição. Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre o condenado que deixa de entregar, no prazo estabelecido no § 1º do art. 293, a Permissão para Dirigir ou a Carteira de Habilitação. Em ambos os casos, como resta claro, há uma valorização das ordens emanadas pelo órgão, de forma a valorizar o órgão, seu poder disciplinar e sua missão institucional, o que é logicamente correto. É certo que o exegeta se apegará ao princípio da legalidade e à reserva legal para afirmar um aprisionamento interpretativo ao inciso I em comento, todavia, data venia, não é o caso. Parece mais adequado entender que o impedimento citado pelo inciso I não seria o cumprimento de sanção disciplinar de suspensão, mas aquele previsto no art. 30 da lei 8.906/942, ou seja, o impedimento profissional não comunicado à OAB decorrente do exercício de outra profissão, como a de servidor público. Ter-se-ia, assim, para os casos de advogados que uma vez suspensos venham a desprezar a sanção disciplinar aplicada pela OAB, a capitulação em artigos previstos para condutas mais graves, sem que isso viesse a ser considerado marginalização da lei para satisfação do caso concreto.3 E isso porque, tipos administrativos com a conduta incompatível do inciso XXV; o de tornar-se inidôneo para o exercício da advocacia do inciso XXVII; ou até a prática de crime infamante do inciso XXVIII, são abertos, exatamente para que em caso de violações gravíssimas à grandeza da advocacia, possa o intérprete aplicar o direito com a correta interpretação da norma. Para além, como se verá à frente, tal prática pode configurar diferentes tipos de crimes. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira __________ 1 FERRAZ Jr., Tercio Sampaio. A Ciência do Direito. São Paulo: Atlas, 1980, p. 77-79. 2 Art. 30. São impedidos de exercer a advocacia: I - os servidores da administração direta, indireta e fundacional, contra a Fazenda Pública que os remunere ou à qual seja vinculada a entidade empregadora; II - os membros do Poder Legislativo, em seus diferentes níveis, contra ou a favor das pessoas jurídicas de direito público, empresas públicas, sociedades de economia mista, fundações públicas, entidades paraestatais ou empresas concessionárias ou permissionárias de serviço público. Parágrafo único. Não se incluem nas hipóteses do inciso I os docentes dos cursos jurídicos. 3 FRANÇA, R. Limongi. Hermenêutica Jurídica. Rio de Janeiro: Editora Saraiva, 1997, p.14-15
Os muitos anos de prática junto ao Tribunal de Ética e Disciplina ensinam que ainda há uma parcela de advogados que acredita em uma OAB conivente a condutas antiéticas, que seja classista e omissa para proteger infratores, o que é o maior dos enganos. A OAB sempre foi rigorosa na aplicação do Direito e na manutenção dos elevados valores que norteiam a advocacia, todavia, nos últimos anos, talvez na última década, esse rigor vem aumentando exponencialmente. Não há razões claras para esse movimento, pode ser, por exemplo, que seja um fenômeno ligado à absoluta e completa distorção do Brasil em relação ao número de advogados por habitante, pois tem-se um advogado para cada grupo de 146 pessoas, somando cerca de 1.300.000 advogados.1 Comparativamente, em 2024 estima-se que a China tenha 1,4 bilhão de pessoas, com cerca de 200.000 advogados. É um fato que esse crescimento causou distorções severas na qualidade da atuação do advogado, o que, incondicionalmente, afeta a população atendida, especialmente em face do valor dos bens jurídicos vinculados ao exercício da profissão, como o patrimônio, a liberdade, a família e outros. Assim, uma possível motivação para esse recrudescimento seja a necessidade da OAB, como nunca foi tão importante, exercer seu papel constitucional previsto no art. 133 da Carta Maior2, o que contemplaria também punir de forma mais rigorosa advogados transgressores das normas regentes da carreira. O que é certo é que os Tribunais de Ética e Disciplina nunca estiveram tão preparados e trabalharam tanto. Ainda sobre esse ponto, não é sem razão que em 29/10/19 o Conselho Federal fez editar a portaria 1.473/19 para criar a Coordenação Nacional de Fiscalização da Atividade Profissional da Advocacia, ligada à Corregedoria da OAB. Esse novo órgão da OAB gerenciou em todas as Seccionais a criação de Comissões de Fiscalização, cuja missão é diariamente fiscalizar não só a advocacia no mundo dos fatos (delegacias do trabalho, postos no INSS e análogos), mas também a atividade do advogado on line, seja nas redes sociais, em sites institucionais, na criação das chamadas landing pages, assim como, claro, na fase de execução das sanções disciplinares, especialmente a atividade de advogados suspensos. Pois bem, as sanções disciplinares de suspensão são bastante comuns nos Tribunais de Ética e Disciplina, porque podem ser imputadas em todas as faltas disciplinares, à exceção daquelas punidas com exclusão. Primeiramente, serão cabíveis naquelas previstas no art. 37, inciso I3, todavia, em caso de prévia condenação por falta disciplinar punida com censura, poderá também ser aplicada a suspensão em face da reincidência prevista no inciso II4 do mesmo artigo. Neste ponto, importante destacar que a reincidência só poderá ser considerada a partir do trânsito em julgado do processo anterior, face à presunção de inocência, e desde que o enquadramento legal tenha sido por infração disciplinar (EAOAB) e não por infração ética (CED). Já diferenciamos os tipos de infrações em escrito anterior.5 Nesse sentido também entendem Beatriz Gaguer e Rafael Júnior Soares.6 Os efeitos da suspensão não despem o profissional de sua condição de advogado, mas suspendem todos os seus direitos referentes ao exercício da advocacia, inclusive e especialmente suas prerrogativas, ou seja, não fica apenas impedido de advogar, mas efetivamente deixa de gozar dos direitos inerentes à profissão, como por exemplo ter a presença de alguém da OAB em caso de sua prisão em flagrante7, conforme incisos IV do art. 7º do EAOAB. Essa é a posição pacífica do Conselho Federal: VIOLAÇÃO DE PRERROGATIVAS. ADVOGADO SUSPENSO. Os direitos e prerrogativas conferidas aos advogados pressupõem o exercício da profissão, o que não se coaduna com a aplicação de sanção disciplinar, já que, estando suspenso, o advogado está impedido de exercer a profissão, sob pena de incidir em infração (art. 34, I, EAOAB). (RECURSO 49.0000.2015.007964-5/PCA. Ementa 021/2016/PCA. Relator: Conselheiro Federal André Francelino de Moura (TO). DOU, S.1, 04.03.2016, p. 271) Consulta. Advogado suspenso ou licenciado de seu exercício profissional. Cabimento de assistência em situação de violação às prerrogativas. Consulta. A defesa quanto à violação das prerrogativas profissionais praticada antes da aplicação da penalidade de suspensão ou da determinação do licenciamento, pode ser objeto de defesa e atuação dos órgãos da OAB, sobretudo quando transcenderem o interesse subjetivo do advogado. Aquelas garantias que são ínsitas ao exercício profissional não devem ser objeto de atuação dos órgãos da OAB na hipótese de terem sido violadas durante o prazo da pena aplicada, em razão da suspensão ou diante do licenciamento, por força do parágrafo único do art. 4º e do §1º, art. 37, do Estatuto da Advocacia e da OAB. Consulta respondida. (CONSULTA 49.0000.2020.001819-0/OEP. Ementa 007/2021/OEP. Fábio Jeremias de Souza, Relator. DEOAB, a. 3, 550, 03.03.2021, p. 3). Conforme o art. 37, §1º do EAOAB8, a suspensão poderá ser aplicada por no mínimo trinta dias até o máximo de doze meses, entretanto, na hipótese de condenação pelo inciso XXI9 do art. 34, a suspensão irá perdurar até que o advogado satisfaça a dívida na forma do §2º.10 Embora o preceito secundário da norma punitiva estabeleça que o pagamento deve ser acrescido de correção monetária, o Conselho Federal já decidiu que também são cabíveis os juros de mora - acesse aqui.11 Como se vê, são funestos os efeitos à carreira do advogado a sanção de suspensão aplicada pelos Tribunais de Ética e Disciplina, todavia, nada obstante, vê-se como prática rotineira que o advogado suspenso ignore essa condição e continue, despreocupadamente, a exercer a profissão, peticionando em processos, realizando reuniões, assinando contratos, audiências etc. Falaremos mais em nosso próximo encontro. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira __________ 1 Disponível aqui. 2 Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei; 3 I - infrações definidas nos incisos XVII a XXV e XXX do caput do art. 34 desta Lei; 4 II - reincidência em infração disciplinar. 5 Disponível aqui. 6 WINTER, Marilena Indira, Luiz Fernando Casagrande Pereira, Marion Bach. Organizador: Ricardo Miner Narravo. Comentários às Normas da Advocacia: Constituição Federal, Estatuto da Advocacia e OAB: Vol. I. Londrina, PR: Troth, 2023. P. 631; 7 IV - ter a presença de representante da OAB, quando preso em flagrante, por motivo ligado ao exercício da advocacia, para lavratura do auto respectivo, sob pena de nulidade e, nos demais casos, a comunicação expressa à seccional da OAB; 8 § 1º A suspensão acarreta ao infrator a interdição do exercício profissional, em todo o território nacional, pelo prazo de trinta dias a doze meses, de acordo com os critérios de individualização previstos neste capítulo. 9 XXI - recusar-se, injustificadamente, a prestar contas ao cliente de quantias recebidas dele ou de terceiros por conta dele; 10 § 2º Nas hipóteses dos incisos XXI e XXIII do art. 34, a suspensão perdura até que satisfaça integralmente a dívida, inclusive com correção monetária. 11 Disponível aqui.
Dúvida comum perante a advocacia, assim como da sociedade, é se o advogado pode responder perante o Tribunal de Ética e Disciplina por atos de sua vida privada.  Ainda é comum observar decisões de arquivamento de representações com o uso desse pensamento, ou seja, se o ato do advogado não se deu no exercício da advocacia, faltaria ao Tribunal de Ética e Disciplina competência legal para conhecer da matéria, porque, tanto as infrações éticas como as infrações disciplinares estariam sempre ligadas ao exercício da profissão. Esse entender é incorreto e não deve haver dúvidas sobre isso. Primeiro porque desde os primórdios da advocacia brasileira já havia previsão legal para punição do advogado por ato da vida privada, conforme o revogado artigo 110, parágrafo único, alíneas "a", "b" e "c" da lei federal 4.215/63, o antigo Estatuto da OAB: Art. 110. A pena de suspensão é aplicável: Parágrafo único. Considera-se conduta incompatível com o exercício da profissão: A prática reiterada de jogo de azar, como tal definido em lei; A incontinência pública e escandalosa; A embriaguez habitual. Da redação da norma resta de clareza solar que o legislador arrolou nas alíneas do parágrafo exemplos de condutas que poderiam imputar responsabilização ao advogado por atos de sua vida privada, pois, obviamente, ninguém praticará jogos de azar no exercício da advocacia. Aquele rol, ademais, era exemplificativo.  A lei federal 8.906/94, o EAOAB, revogou a norma 4.215/1963, todavia, ainda assim, manteve a regra material em seu artigo 34, §1º, alíneas "a", "b" e "c": Art. 34. Constitui infração disciplinar: XXV - manter conduta incompatível com a advocacia; §1º Inclui-se na conduta incompatível:    Prática reiterada de jogo de azar, não autorizado por lei; Incontinência pública e escandalosa; Embriaguez ou toxicomania habituais. Prescindível qualquer outra regra de hermenêutica que não a interpretação gramatical jurídica para entender que ao menos desde 1963, portanto há quase 60 anos, a OAB permite que o advogado seja responsabilizado por seus atos da vida privada, não se limitando, vale destacar, às condutas previstas na norma legal, pois, como dito, trata-se de rol exemplificativo.  Sobre este mérito, vale mencionar que entender de forma contrária é cercear o poder disciplinar da OAB para os casos mais graves, haja vista que, os crimes mais abjetos, como o estupro, o tráfico de drogas, a pedofilia, a agressão às mulheres, o feminicídio e outros análogos, nunca são cometidos com a respeitável toga de tão grandiosa profissão. Em data recente o Conselho Federal ratificou essa interpretação ao criar a súmula 9/19, com a seguinte redação: INIDONEIDADE MORAL. VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER. ANÁLISE DO CONSELHO SECCIONAL DA OAB. Requisitos para a inscrição nos quadros da OAB. Inidoneidade moral. A prática de violência contra a mulher, assim definida na "Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher - 'Convenção de Belém do Pará' (1994)", constitui fator apto a demonstrar a ausência de idoneidade moral para a inscrição de bacharel em Direito nos quadros da OAB, independente da instância criminal, assegurado ao Conselho Seccional a análise de cada caso concreto. Ora, por óbvio, se a violência contra a mulher, independente de atuação no exercício da profissão e de instância criminal e, portanto, do trânsito em julgado da decisão penal condenatória, é fato apto a retirar a idoneidade necessária para a inscrição nos quadros da advocacia brasileira, na forma do quanto prescreve o artigo 8º, inciso VI do EAOAB, também será apta a promover contra o advogado processo ético disciplinar por esse fato pelo inciso XXVII do art. 34 da lei, cuja pena é a exclusão dos quadros da advocacia: Art. 34. Constitui infração disciplinar: XXVII - tornar-se moralmente inidôneo para o exercício da advocacia; Art. 38. A exclusão é aplicável nos casos de: II - infrações definidas nos incisos XXVI a XXVIII do art. 34. Nesse sentido, é recentíssimo julgado abaixo: Recurso ao Conselho Federal da OAB. Art. 75, caput, do Estatuto da Advocacia e da OAB. Acórdão unânime de Conselho Seccional da OAB. (...) Tornar-se moralmente inidôneo para o exercício da advocacia (art. 34, XXVII, EAOAB). Violência contra a mulher. Os atos de agressão contra a mulher, ainda mais atos de agressão física, praticados pelo advogado devidamente inscrito na OAB, resultam a perda de inidoneidade moral para o exercício da advocacia, e, consequentemente, infração disciplinar (art. 34, XXVII, EAOAB), independentemente de decorrerem ou tiverem qualquer relação com o exercício da profissão. A OAB não pode permitir a permanência de agressores de mulheres em seus quadros. Precedentes do Conselho Federal da OAB, no sentido de que a infração disciplinar de tornar-se moralmente inidôneo para o exercício profissional não demanda o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, pois não está vinculada à prática de crime (art. 34, XXVIII, EAOAB), mas dela também podendo decorrer, ressalvada a hipótese de decisão que negue a existência do fato ou sua autoria. Recurso não provido. (Recurso n. 49.0000.2021.003027-7/SCA-TTU. EMENTA N. 084/2022/SCA-TTU. Relatora: Conselheira Federal Ana Cláudia Pirajá Bandeira (PR). DEOAB, a. 4, 949, 29.09.2022, p. 46). Vale destaque para o trecho "Os atos de agressão contra a mulher, ainda mais atos de agressão física, praticados pelo advogado devidamente inscrito na OAB, resultam a perda de inidoneidade moral para o exercício da advocacia, e, consequentemente, infração disciplinar (art. 34, XXVII, EAOAB), independentemente de decorrerem ou tiverem qualquer relação com o exercício da profissão", restando inarredável o entendimento ora defendido. Mas, não bastasse, em 2020, portanto depois do advento da súmula, mas antes do julgado acima, o CFOAB respondeu à consulta 49.0000.2018.012292-5/OEP, da seguinte forma: Consulta. Fatos cometidos por advogado sem estar no desempenho da profissão, dentro ou fora do território brasileiro. Notícia jornalística, redes sociais ou blogs. Possibilidade de instauração de representação junto ao competente TED - Tribunal de Ética e Disciplina. Limites de atuação da OAB. (...) Fatos co-metidos por advogado sem estar no desempenho da profissão, dentro ou fora do território brasileiro. Notícia jornalística, redes sociais ou blogs. Possibilida-de de instauração de representação junto ao competente TED. 1. Conduta incompatível para fins disciplinares, significa qualquer ato omissivo ou comissivo, que não se coadune com a postura exigida para o exercício da advocacia. Não se escusa o advogado, sob o argumento de que tenha adotado esta ou aquela conduta na qualidade de cidadão comum, e não no efetivo exercício da profissão, porquanto é impossível separar estas duas situações, no que respeita a advocacia. 2. Um advogado deverá, em todo momento, manter a honra e a dignidade de sua profissão. Deverá, tanto em sua atividade profissional como na sua vida privada, abster-se de ter con-duta que possa redundar em descrédito da profissão a que pertence. 3. Espera-se do advogado atitudes condizentes com a sua função social, não sendo aceitável ambiguidades entre o exercício da profissão e sua vida pessoal, vez que devem atender aos preceitos éticos inerentes à advocacia, que não venham a denegrir e/ou manchar a dignidade da profissão. Consulta respondida. (CON-SULTA 49.0000.2018.012292-5/OEP. EMENTA N. 041/2020/OEP. Relator: Conselheiro Federal Luiz Cláudio Silva Allemand (ES). DEOAB, a. 2, 427, 3.09.2020, p. 4) Em conclusão, é plenamente possível que o advogado venha a responder administrativamente junto aos Tribunais de Ética e Disciplina do Brasil, caso, em sua vida privada, venha a cometer atos que não se coadunem com a grandeza da profissão e com a honra e a dignidade que se exige do advogado em sua postura pessoal.   *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira
quinta-feira, 1 de agosto de 2024

A quebra do sigilo profissional do advogado

Representações de clientes por quebra do sigilo profissional são bem comuns aos Tribunais de Ética e Disciplina, porque, de fato, são rotineiramente violadas. Isso ocorre muito em face de interesses pessoais, o que, acertadamente, deve ser objeto de atenção da OAB, todavia, com muita frequência se verifica a ocorrência de tais infrações disciplinares em face da falta de conhecimento dos parâmetros, limites e exceções do instituto, que são pouco conhecidos pelos operadores do direito, incluindo a advocacia, a magistratura e o Ministério Público. Como se verá à frente, ocorrem, em sua grande maioria, nos casos de demandas que tiveram início com potencial acordo entre as partes e que depois se tornaram litigiosas, optando o advogado por atender uma das partes, mas ciente dos segredos de outra; assim como em casos de advogados ex-empregados de pessoas jurídicas ou que tiveram seus contratos de prestação de serviços rescindidos, e passam a advogar contra essas empresas, representando ex-funcionários demitidos em face das informações privilegiadas que possam possuir.   O conceito de sigilo profissional não está expresso na lei, mas pode ser alcançado por exercício de hermenêutica, especialmente pela leitura do capítulo VII do Código de Ética e Disciplina, arts. 35 ao 38:   CAPÍTULO VII DO SIGILO PROFISSIONAL Art. 35. O advogado tem o dever de guardar sigilo dos fatos de que tome conhecimento no exercício da profissão. Parágrafo único. O sigilo profissional abrange os fatos de que o advogado tenha tido conhecimento em virtude de funções desempenhadas na Ordem dos Advogados do Brasil. Art. 36. O sigilo profissional é de ordem pública, independendo de solicitação de reserva que lhe seja feita pelo cliente. § 1º Presumem-se confidenciais as comunicações de qualquer natureza entre advogado e cliente. § 2º O advogado, quando no exercício das funções de mediador, conciliador e árbitro, se submete às regras de sigilo profissional. Art. 37. O sigilo profissional cederá em face de circunstâncias excepcionais que configurem justa causa, como nos casos de grave ameaça ao direito à vida e à honra ou que envolvam defesa própria. Art. 38. O advogado não é obrigado a depor, em processo ou procedimento judicial, administrativo ou arbitral, sobre fatos a cujo respeito deva guardar sigilo profissional. É tão importante para o exercício da advocacia que o legislador o elegeu como prerrogativa da profissão, na letra do artigo 7º, inciso XIX1 da lei federal 8.906/94. A doutrina2 anota que: "O sigilo profissional é de ordem pública, implícito, presumido e natural da relação entre advogado e cliente, que está justamente pautada na confiança. O sigilo profissional interessa à própria sociedade, tendo em vista que assegura o pleno direito de defesa do cidadão, garantindo ao cliente a inviolabilidade dos fatos por ele expostos ao seu advogado, daí seu status de ordem pública. A privacidade se dá não só em relação aos fatos de que o advogado tome conhecimento no exercício da profissão, mas também aos fatos a que tenha tido acesso em razão de funções desempenhadas dentro da OAB, não apenas no que toca às correspondências escritas, mas de qualquer ordem, e-mail, telefonemas, mensagens etc. O dever de sigilo profissional é ainda mais forte do que o dever de sigilo em geral, pois no caso da advocacia decorre de expressa disposição de lei, enquanto no trato da vida civil diária, decorre da cláusula geral da boa-fé e dos deveres de consideração a ela inerentes (quando não previstos em contrato)". Os arts. 20 e 21 do CED estão a tratar das relações do advogado com seu cliente, mas têm mérito específico em disciplinar o dever de sigilo profissional com ex-clientes. Como dito, são essas hipóteses que, à toda evidência, causam a maioria das representações ético-disciplinares pela quebra do sigilo profissional. Art. 20. Sobrevindo conflito de interesses entre seus constituintes e não conseguindo o advogado harmonizá-los, caber-lhe-á optar, com prudência e discrição, por um dos mandatos, renunciando aos demais, resguardado sempre o sigilo profissional. Art. 21. O advogado, ao postular em nome de terceiros, contra ex-cliente ou ex-empregador, judicial e extrajudicialmente, deve resguardar o sigilo profissional. Esse dever de sigilo profissional do advogado em relação a seu ex-cliente é tão sério que há duas potenciais condutas criminais previstas no Código Penal que podem se amoldar a tais infrações, a violação do segredo profissional do art. 1573 e o crime de patrocínio infiel, conforme a redação do art. 355 caput4 do Código Penal brasileiro. Muito já se fala no papel institucional dos Tribunais de Ética e Disciplina em contribuir como o Judiciário, tornando-se cada vez mais comum decisões que determinam seja oficiado o Ministério Público local para apuração dos fatos. O art. 20 do CED tutela contratações que têm início com partes que se entendem e o advogado é buscado por duas ou mais, não interessando se pessoas físicas ou jurídicas. São exemplos dissolução societária, divórcio, acordo de alimentos, réus ou partes requeridas comuns em ações penais ou cíveis, fusões empresariais e outros. Vale ponderar que a norma classifica expressamente as partes como "constituintes", ou seja, deve haver uma formalização da contratação, como uma consulta jurídica prestada pelo advogado, um contrato ou a outorga de uma procuração de forma a tornar vigente entre as partes a regra do sigilo. No decorrer do serviço, as partes constituintes do trabalho do advogado entram em conflito de interesse, sendo-lhe impossível atuar para ambas. Deverá, então, optar por uma delas, todavia, não terá o direito de utilizar-se de segredos revelados pela outra, sob pena da infração disciplinar em comento. É muito comum no cotidiano dos Tribunais de Ética e Disciplina representações disciplinares por essa razão, que não raro vêm acompanhadas de boletins de ocorrência pela prática dos citados crimes, razão pela qual é ideal, se possível, que ao deixar o cliente, o advogado com ele assine um termo de confidencialidade acerca os segredos sob os quais não poderá utilizar em sua atuação, ou seja, quais informações foram partilhadas que estejam classificadas no sigilo profissional. Por óbvio, haverá casos em que o ex-cliente não desejará assinar, daí surge a necessidade de uma notificação com esse conteúdo. É uma garantia ao advogado para evitar um longo e duradouro processo disciplinar. Assim, por exemplo, em um divórcio que tenha iniciado de forma consensual, optando o advogado por atuar para a mulher posteriormente ao conflito de interesses entre as partes, não poderá divulgar que o homem tem uma amante, algo que lhe foi confidenciado por seu então constituinte; não poderá divulgar seus impostos de renda, que lhe foram disponibilizados sem o conhecimento da então esposa; uma eventual renda extra; um sociedade em imóvel que esteja em nome do sócio, desconhecida da mulher etc. É fato que omitir tudo isso, no papel de advogado que estará a representar a parte ex adversa, é uma árdua missão, todavia, faz parte do compromisso de advogar. Caso o advogado não se sinta apto para bem representar a parte que escolheu em razão do conflito pelo sigilo profissional que deve manter, o mais correto é que abandone a causa, recomendando a contratação de outro colega. A situação do art. 21 é mais comum nas relações de trabalho, quando ex-empregador deseja responsabilizar advogado que atuava para a empresa. Quase sempre se trata de representações que vêm acompanhadas da acusação de infração aos incisos III e IV do art. 34, ou seja, o advogado é acusado de captar clientes demitidos da empresa, sendo beneficiado pelo conhecimento de informações sigilosas decorrentes do trabalho que exercia, chamadas de inside information, o que seria facilmente solucionado pela assinatura de um termo de quarentena remunerado. Esse problema é bastante comum na atividade empresarial e, de fato, o advogado que acaba de ser demitido de uma empresa tem realmente uma vantagem sobre os outros, sendo bastante comum ser procurado para demandas trabalhistas, entretanto, isso não quer dizer que esteja a captar clientes ou a revelar segredos em benefício próprio. Nesse sentido, recomenda-se fortemente que a empresa realize um acordo de quarentena trabalhista no momento de sua saída, onde mediante a paga de determinado valor o advogado se comprometa a não advogar, não prestar consultoria, não auxiliar ou indicar outros advogados, não estabelecer parcerias e não receber profissionalmente ex-funcionários da empresa para questões trabalhistas e outras disposições, durante determinado período de tempo, sob pena do pagamento de uma multa.   Aqui, o sigilo profissional está ligado apenas a informações não públicas, sigilosas e apenas de conhecimento da empresa, confidenciadas ao advogado para o exercício de seu trabalho. Nesse sentido, se o advogado toma conhecimento que durante determinado ano a empresa deixou de pagar o FGTS de funcionários por seis meses, em eventual contratação para reclamação trabalhista posterior, poderá utilizar-se dessa informação, que é pública, bastando ao futuro reclamante pedir na CEF o extrato de depósitos de seu fundo de garantia. Não é disso que se trata o sigilo profissional no caso concreto. Cabe pontuar que na infração disciplinar em comento o advogado, sem justa causa, quebra o dever de sigilo acima tratado, divulgando dados dos quais tomou conhecimento pelo exercício da profissão. A justa causa tem status de causa justificante administrativa, ou seja, caso a quebra do sigilo profissional ocorra nessa perspectiva, não há se falar em infração disciplinar. Conforme transcrito acima, o art. 37 do CED conceitua a justa causa como "circunstância excepcional" mencionando como hipóteses justificantes a "grave ameaça ao direito à vida e à honra ou que envolvam defesa própria". Esse rol é exemplificativo em face da preposição "como" que consta no artigo, ou seja, pode haver outras situações que autorizem a quebra do sigilo profissional que não estejam expressamente citadas no artigo, especialmente se tratar-se de questões ilícitas ou moralmente inaceitáveis. A título de exemplo, se hipoteticamente advogado demitido de empresa passa a advogar para seus ex-funcionários sem um contrato de quarentena e revela conta corrente secreta em nome de gerente da empresa, funcionária, utilizada para se esquivar de débitos trabalhistas, tornando a empresa insolvente aos olhos de seus credores e da justiça nas execuções que sofre, poder-se-ia estar diante de uma causa justificante, exatamente porque referida prática estaria potencialmente classificada como o crime de fraude à execução previsto no art. 179 do Código Penal5, sem falar na potencial litigância de má-fé e ato atentatório à dignidade da justiça, institutos do processo civil. O Conselho Federal da OAB é bastante resistente em condenar advogados pelo inciso VII do EAOAB, exatamente porque seu enfrentamento perpassa muito pelo livre exercício da profissão e pelas prerrogativas. Ora, no exemplo acima, resta claríssima a profunda discussão jurídica que tomaria palco no processo, no embate entre a liberdade de advogar, a função constitucional de auxiliar na administração da Justiça6 e os limites do sigilo profissional. Por essa exata razão, em casos de clientes pessoas físicas ou jurídicas que se entendam lesadas por referida prática, é fundamental a contratação de profissional especializado para patrocinar a representação ético-disciplinar, assim como, no caso dos advogados, sempre importante se resguardar para não infringir o inciso. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira _________ 1 Art. 7º São direitos do advogado: (...) XIX - recusar-se a depor como testemunha em processo no qual funcionou ou deva funcionar, ou sobre fato relacionado com pessoa de quem seja ou foi advogado, mesmo quando autorizado ou solicitado pelo constituinte, bem como sobre fato que constitua sigilo profissional; 2 GONZAVA, Álvaro de Azevedo, Karina Penna Neves, Roberto Beijado Júnior, Estatuto da Advocacia e Novo Código de Ética e Disciplina da OAB, 5ª ed., Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. p. 122; 3 Violação do segredo profissional. Art. 154 - Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem: Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa de um conto a dez contos de réis.   4 Patrocínio infiel. Art. 355 - Trair, na qualidade de advogado ou procurador, o dever profissional, prejudicando interesse, cujo patrocínio, em juízo, lhe é confiado: Pena - detenção, de seis meses a três anos, e multa. 5 Fraude à execução. Art. 179 - Fraudar execução, alienando, desviando, destruindo ou danificando bens, ou simulando dívidas: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa. Parágrafo único - Somente se procede mediante queixa. 6 Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.
Há inúmeros precedentes do Conselho Federal que punem advogados com as gravíssimas infrações de locupletamento e falta de prestação de contas, porque, ao receberem valores em seus nomes por seus clientes, via do levantamento de alvarás ou pagamento de acordos, por exemplo, realizaram a glosa de seus honorários ou despesas processuais devidas.  (...) Recurso ao Conselho Federal. Decisão não unânime do Conselho Seccional. Advogado que recebe valores pertencentes ao cliente e promove o desconto de despesas processuais, sem demonstrar sua natureza e sem qualquer autorização ou expressa previsão contratual. Locupletamento e recusa à prestação de contas. Infrações disciplinares configuradas. Recurso não provido. (...) (RECURSO N. 49.0000.2016.010587-1/SCA-PTU. EMENTA N. 095/2017/SCAPTU. Relator: Conselheiro Federal Alexandre Mantovani (MS). DOU, S.1, 07.04.2017, p. 127)  (...) Recurso ao Conselho Federal. Decisão não unânime do Conselho Seccional. Advogado que recebe valores pertencentes ao cliente e promove o desconto dos honorários advocatícios e alegadas despesas processuais, sem qualquer autorização do cliente ou expressa previsão contratual. Condenação por violação ao art. 34, XXI, do EAOAB. Recurso não provido. (...) (RECURSO N. 49.0000.2016.007598-5/SCA-PTU.  EMENTA N. 065/2017/SCA-PTU. Relator: Conselheiro Federal Valdetário Andrade Monteiro (CE). DOU, S.1, 20.03.2017, p. 154)  Como visto, a prática não é autorizada e, não bastasse, capaz de gerar consequências gravíssimas, inclusive a prorrogação de eventual sanção de suspensão até que o advogado devolva ao cliente todos os valores que forem apurados como glosados indevidamente. Os precedentes estão corretos, pois em face da hipossuficiência técnica do contratante em relação a seu advogado, assim como da grandeza da profissão e responsabilidade social atribuída à advocacia, é de suma importância a mais absoluta transparência e correção na lida com o dinheiro de outrem, o que justifica a dura postura do sistema OAB. A norma explicativa a justificar tais condenações fazia parte do antigo Código de Ética e Disciplina da OAB, na letra de seu artigo 35, §2º1 e acabou sendo incorporada à redação da Resolução n.º 02 de 2015 do CFOAB, o novo CED, agora no artigo 48, §2º2, com pequenas alterações. A exegese do dispositivo revela que embora o novo CED tenha validado os contratos verbais com a inserção da expressão "preferentemente" no caput, eventuais descontos e glosas em valores recebidos em nome do cliente, a que título ocorrerem, devem ter como espeque expressa autorização contratual, que, claro, só pode ser realizada em contratos escritos. Outra exigência jurisprudencial é a específica e detalhada prestação de contas no momento do repasse, que deve afastar qualquer dúvida sobre as glosas, ou seja, não basta apenas o contrato prever a possibilidade do desconto, que deve ser realizado com minuciosa descrição da operação para bem demonstrar o que se está a descontar. Já falamos sobre o tema em artigo anterior (clique aqui para ler) Vale lembrar, por oportuno, que nada impede que o advogado ou até o cliente alterem seus contratos em vigor via de aditivo para fazer constar referida cláusula, de forma a deixar registradas as tratativas, valores, autorizações e demais disposições em relação ao trabalho que vem sendo realizado. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) ou pelo Instagram @antonioalbertocerqueira __________ 1 Art. 35. Os honorários advocatícios e sua eventual correção, bem como sua majoração decorrente do aumento dos atos judiciais que advierem como necessários, devem ser previstos em contrato escrito, qualquer que seja o objeto e o meio da prestação do serviço profissional, contendo todas as especificações e forma de pagamento, inclusive no caso de acordo. (...) § 2º A compensação ou o desconto dos honorários contratados e de valores que devam ser entregues ao constituinte ou cliente só podem ocorrer se houver prévia autorização ou previsão contratual. 2 Art. 48. A prestação de serviços profissionais por advogado, individualmente ou integrado em sociedades, será contratada, preferentemente, por escrito. (...) § 2º A compensação de créditos, pelo advogado, de importâncias devidas ao cliente, somente será admissível quando o contrato de prestação de serviços a autorizar ou quando houver autorização especial do cliente para esse fim, por este firmada.
O art. 34, inciso V da lei federal 8.906/94 criou tipo administrativo pouco utilizado pela advocacia, talvez por falta de conhecimento sobre a matéria, que é a mácula disciplinar decorrente do plágio, da cópia, da reprodução fiel como menor esforço, do "furto" intelectual.   O preceito primário da norma é assim redigido: "V - assinar qualquer escrito destinado a processo judicial ou para fim extrajudicial que não tenha feito, ou em que não tenha colaborado". A conduta nuclear é "assinar", ou seja, via de assinatura com sua escrita ou por meio digital, o infrator atesta a terceiros tratar-se de obra de sua autoria, nas formas previstas na lei.  A principal vontade do legislador foi a de evitar a delegação extrema de atos privativos do advogado infrator e o plágio de petições ou documentos extrajudiciais.  A conduta é aberta e pode ser realizada de várias formas, todavia, a prova nesses casos é sempre muito difícil, conforme atesta o Conselho Federal, que exige ser cabal e conclusiva para eventual condenação (RECURSO 49.0000.2013.009269-2/SCA-STU. EMENTA 015/2014/SCA-STU. Relator: Conselheiro Federal Luciano Demaria (SC). DOU, S.1, 25.02.2014, p. 161/164). O principal caso a demonstrar referida conduta seria o plágio de petições, bastante comum atualmente. Com a disseminação do processo eletrônico, hoje, à distância de poucos cliques de mouse, a advocacia tem acesso a qualquer petição, de qualquer advogado, de qualquer matéria.  Pois bem, não há mácula disciplinar se o advogado se utiliza de teses criadas por colegas para reforçar suas defesas e petições, como seria o caso de aproveitar tese de exceção de incompetência realizada por outro colega em ação penal com muitos réus, para o próprio cliente, não é disso que trata a norma. Nesse caso, o que a lei proíbe é que o advogado copie o incidente, levando-o aos autos do feito como se seu fosse. Deve, portanto, aproveitar a tese, escrevendo sua petição.  Também é caso dessa infração o advogado que exige que outros trabalhando para seu escritório criem teses e apresentem petições ou proponham ações e não possam assinar em nome próprio ou conjuntamente, desde que nenhum desses trabalhos tenha contado com a colaboração do pretenso infrator.  Essa colaboração, todavia, pode ser ínfima, porque não há gradação na lei. Assim, a mera orientação do advogado sobre qual petição fazer, uma especificação de provas, por exemplo, já seria considerada colaboração, ainda que não tenha sequer visto a petição pronta e protocolizada.  Esse tipo administrativo bem admite a aplicação do princípio da insignificância, haja vista a possibilidade de enquadramento de situações do cotidiano da advocacia que acabem por se amoldar às condutas previstas, todavia, praticadas em um contexto sem reprovabilidade, não alcançando assim a nominada tipicidade material.  Também é possível o cometimento da infração em escritos extrajudiciais, como seria o caso de um escritório de advocacia copiar o contrato de outro para passar a utilizar com seus clientes, ou um termo de confidencialidade e assim por diante.  Por óbvio, a autorização do escritório proprietário do contrato exclui a mácula disciplinar. Vale ainda pontuar que a expressão "fim extrajudicial" que consta da lei não se limita à atividade da advocacia, podendo estar vinculada à vida privada do advogado. Nesse sentido, por exemplo, se em curso de pós-graduação o advogado compra tese de monografia ou copia outra, já pronta, estaremos diante da conduta do inciso V, caso não esteja configurada outra mais grave, lembrando que há muitos anos o Conselho Federal já pacificou a ideia que as infrações ético/disciplinares podem ocorrer fora da atividade da advocacia, por atos da vida privada do advogado.  Assim, se sua advocacia já foi vítima desse tipo de conduta há menos de cinco anos, ainda há possibilidade de responsabilização do eventual infrator.   *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui)
O drama do sistema OAB para manutenção da qualidade dos julgados disciplinares é de todos conhecido, especialmente no desproporcional duelo entre a multiplicação descontrolada no número de advogados e a falta de recursos disponibilizada aos Tribunais de Ética e Disciplina espalhados pelo Brasil. Literalmente, uma disputa entre Davi e Golias, todavia, nesse caso, Davi não tem a iluminação divina. Nunca é demais lembrar que os Membros dos Tribunais de Ética e Disciplina são bravos e valorosos advogados e advogadas que optam por trabalhar de forma graciosa para o sistema OAB, sem qualquer incentivo, remuneração e, às vezes, até mesmo reconhecimento. Exatamente por essa situação, muitas vezes falta ao intérprete da lei em sua nobre e difícil missão de bem aplicar o direito administrativo repressivo a necessária capacitação técnica para cargo de tamanha responsabilidade, o que acarreta algumas distorções em julgamentos, aprimorados, posteriormente, pela via recursal acessada apenas por experientes advogados de defesa especializados no processo disciplinar na OAB. São raros. Isso posto, é bastante comum condenações tratadas pela jurisprudência como dupla capitulação, que ocorrem quando apenas uma conduta no mundo dos fatos é duplamente punida pelos Tribunais de Ética e Disciplina, que capitulam o ato em duas ou mais hipóteses do CED ou do EAOAB. Essa interpretação não é válida, por configurar o bis in idem, conforme julgados abaixo: Recurso ao Conselho Federal. Preliminares. Mérito. Locupletamento, facilitação do exercício profissional a pessoa não inscrita nos quadros da OAB, captação de causas e conduta incompatível com a advocacia. Fatos não negados pelo advogado. Alegação de nulidades processuais ocorridas no curso da instrução, somente arguidas após a condenação pelo Tribunal de Ética e Disciplina. Vedação à utilização dos meios processuais como instrumentos difusores de estratégias, de modo a arguir nulidades processuais somente no momento em que for oportuno à parte. Ausência de qualquer prejuízo à defesa. Pleno exercício do contraditório e ciência dos fatos objeto de apuração, tanto que o advogado informou que houve posterior acordo judicial entre as partes. Dupla capitulação pelos mesmos fatos. Vedação ao bis in idem. Afastamento da condenação por conduta incompatível com o exercício da advocacia, tipificada no artigo 34, XXV, do EAOAB. Consequente redução da pena de suspensão de 12 (doze) para 10 (dez) meses. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros da Terceira Turma da Segunda Câmara do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, observado o quorum exigido no art. 92 do Regulamento Geral, por maioria, em dar parcial provimento ao recurso, nos termos do voto divergente do Conselheiro Federal Silvio Pessoa de Carvalho Júnior (PE). Brasília, 8 de maio de 2017. (RECURSO N. 49.0000.2016.005131-9/SCA-TTU, EMENTA N. 095/2017/SCA-TTU. Relator: Conselheiro Federal José Agenor Dourado (MA). Relator para o acórdão: Conselheiro Federal Silvio Pessoa de Carvalho Júnior (PE). DOU, S.1, 11.05.2017, p.171)  Capitulação do mesmo fato como dupla infração disciplinar. Arbitrária subsunção punitiva. Desrespeito ao princípio do bis in idem. Impossibilidade. Se a conduta do recorrente vem tipificada como hipótese de angariação de clientela, não se pode identificar tal conduta, concomitantemente, como incompatível com a advocacia, sob pena de arbitrária subsunção punitiva e inaceitável bis in idem. Recurso admitido e provido em parte para restringir a condenação apenas à infração disciplinar prevista no inc. IV, do art. 34, do EAOAB, com aplicação da pena de suspensão de trinta (30) dias, tendo em vista condenação anterior pelo mesmo fato, de acordo com o disposto no art. 37, II do Estatuto. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os Senhores Conselheiros integrantes da 1ª Turma da Segunda Câmara do CFOAB, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto do Relator. Brasília, 06 de dezembro de 2010. Gilberto Piselo do Nascimento, Presidente da 1ª Turma da Segunda Câmara. Carmelino de Arruda Rezende, Relator. (RECURSO 2009.08.07008-05/SCA. EMENTA 282/2010/SCA-PTU. Rel.: Conselheiro Federal Carmelino de Arruda Rezende (MS). DJ. 23/12/2010, p. 11)  Nesses casos, umas das possíveis soluções é a aplicação do princípio da especialidade, via de interpretação gramatical à norma legal, ou seja, compara-se a conduta do mundo real às hipóteses legais cujo enquadramento seja possível, classificando a infração disciplinar na redação normativa que encontrar a mais perfeita tipicidade administrativa, descartando-se a outra. Também é bastante comum que a dupla condenação advenha da realização de infração ética ou disciplinar que tenha sido um meio para levar o infrator ao cometimento de outra, mais grave. Exemplo ipsis litteris do que aqui se trata foi objeto de escrito anterior (clique aqui para ler), onde se demonstrou que até mesmo infrações disciplinares mais brandas, como a captação de clientela dos incisos III e IV do artigo 34 da Lei Federal 8.906-94, podem, na verdade, estar a esconder conduta muito mais grave, como a conduta incompatível com a advocacia prevista no inciso XXV, sujeita à suspensão disciplinar e muitas vezes até à suspensão preventiva prevista no artigo 70, §3º do EAOAB. Em casos análogos, é comum aos Tribunais de Ética a condenação por todos os incisos, ou seja, no caso acima, pelo III, IV e XXV do artigo 34. Não é essa a solução correta em face do princípio da consunção, também chamado de absorção ou lex consumens derogat legi consumptaetem, que se verifica quando o cometimento de um crime, ou, em caso, de uma infração disciplinar, é estritamente funcional1 para o advogado cometer outra, mais grave, hipótese na qual a última absorve a mais branda. Analogamente ao direito penal, são as hipóteses dos chamados crimes progressivos, como ensina o mestre Nelson Hungria "Crime progressivo: ocorre quando, da conduta inicial que realiza um tipo de crime, o agente passa a ulterior atividade, realizando outro tipo de crime, de que aquele é etapa necessária ou elemento constitutivo (reconhecida a unidade jurídica, segundo a regra do ubi major, minor cessai). Distingue-se do crime continuado poque o crime anterior (menos grave) insere-se na própria estrutura do crime subsequente (mais grave)"2. Desta forma, cabe sempre à defesa, e posteriormente ao Julgador, perquirir se há intersecção nas condutas em julgamento, de forma a evitar o bis in idem. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) _____________ 1 MARINUCCI, Giorgio; DOLCINI, Emilio. Manuale di diritto penale. 3. ed. Milano: Giuffrè, 2009. 2 HUNGRIA, Nélson e Heleno Cláudio Fragoso. Comentários ao Código Penal, Volume I, Tomo II. Arts. 11 ao 27. 5ª Ed. Rio de Janeiro, Forense, 1978. p. 47.
Uma das mais severas punições disciplinares previstas no sistema OAB é exatamente a ausência de prestação de contas, que consta do inciso XXI da Lei Federal 8.906/94, logo após a repudiada prática do locupletamento. Em que pese o senso comum acreditar que a pior das práticas a ser atribuída a um colega advogado seja exatamente locupletar-se às custas de seu cliente, a verdade é que a negativa de prestação de contas é tida pelo legislador como muito mais grave e séria, tanto assim que a lei apenas autoriza, nesses casos, que a sanção de suspensão aplicada perdure até que a dívida seja integralmente satisfeita, inclusive com juros de mora e correção monetária, conforme já dissemos (clique aqui para ler)   É dizer que, ao advogado que se locupleta, mas presta contas, não caberia, em tese, a temida prorrogação da suspensão, haja vista que o artigo 37, §2º do EAOAB1, trata apenas dos incisos XXI e XXIII do artigo 34, todavia, o STF declarou a inconstitucionalidade quanto ao inciso XXIII no RE 647885, o que inclusive fez gerar o tema de repercussão geral 7322. Restou, assim, a possibilidade de prorrogação da suspensão apenas para o inciso em comento. Na aplicação prática dos processos disciplinares no sistema OAB, entretanto, é comum que ambas as condutas caminhem juntas, ou seja, o locupletamento unido da ausência de prestação de contas, o que ocorre, em regra, porque o advogado indisciplinado que comete o locupletamento, por exemplo nos casos de apropriação indébita de valores de cliente, não irá prestar contas confessando o crime potencial, o que se revela um dos casos mais comuns de condenações. Nada obstante a hipótese acima, há uma infinidade de outros casos de condenação por locupletamento que acabam arrastando a condenação por ausência de prestação de contas, impondo ao advogado a severa prorrogação. Os exemplos mais comuns são o recebimento de valores sem a contraprestação dos serviços e diferenças quanto ao percentual dos honorários. O cliente afirma que restaram pactuados 20%, todavia, o advogado reteve 30%, além de outros. Para os casos acima, uma correta e transparente prestação de contas afastaria a imputação do inciso XXI, e, portanto, a prorrogação da suspensão para além do prazo do acórdão, ainda que sobreviesse a condenação por locupletamento. Importante ainda lembrar da alteração legal trazida ao EAOAB pela lei 11.902/09, que criou a prescrição quinquenal para a prestação de contas. Em outras palavras, a Lei limitou a prorrogação da suspensão do artigo 37, §2º ao prazo de 5 (cinco) anos. Não há dúvida, todavia, que suspensão tão longa do direito de advogar é suficiente para afetar gravemente a advocacia de qualquer um, acarretando danos irreparáveis à profissão condenado. Assim, é de singular importância ao advogado que em casos de divergências com o cliente, realize a correta prestação de contas, para que, na eventual hipótese de representação disciplinar por locupletamento, possa ser afastado o inciso que trata da prestação de contas.     *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) ______________ 1 Art. 37. A suspensão é aplicável nos casos de: (...) § 2º Nas hipóteses dos incisos XXI e XXIII do art. 34, a suspensão perdura até que satisfaça integralmente a dívida, inclusive com correção monetária 2 Tese: É inconstitucional a suspensão realizada por conselho de fiscalização profissional do exercício laboral de seus inscritos por inadimplência de anuidades, pois a medida consiste em sanção política em matéria tributária.
O pior e mais injusto labeling atribuído à OAB e aos Tribunais de Ética e Disciplina é a funesta ideia de conveniência em seus julgamentos, como se os órgãos de fiscalização e controle da Ordem dos Advogados do Brasil fossem redutos de políticas menores e convenientes. Contrariamente, assim como ocorre no CNMP e no CNJ por exemplo, a OAB tem um fortíssimo sistema de controle de seus administrados, que ao longo do tempo e especialmente pelo fenômeno de multiplicação dos advogados, tem se tornado cada vez mais rígido. É missão da Ordem dos Advogados do Brasil não perder controle sobre a advocacia, posicionando-se sempre como um farol guia para manutenção das boas práticas, da ética e da disciplina no exercício profissional, principalmente em face da importância e grandeza da profissão, bem definidas no artigo 133 da Constituição Federal de 19881. A garantir essa qualidade na atuação, até pelo quanto disciplina do artigo 68 do EOAB2, têm aplicação no processo disciplinar da OAB todos os princípios de regência aplicáveis aos Juízes, com especial ênfase à imparcialidade e ao princípio do juiz natural decorrente do art. 5º, inciso XXXVII da Constituição Federal3. Realizados os destaques sobre o eficaz sistema fiscalizatório punitivo da OAB, ganha importância e relevância a defesa técnica, onde a sustentação oral é ato essencial. O ato de realizar a sustentação oral carrega importantes valores ao direito de defesa e ao direito público, pois é capaz de (a) aperfeiçoar o processo de adjudicação da causa, pela reflexão coletiva dos julgadores e oportunidade das partes explicarem pessoalmente suas versões sobre a defesa; (b) assegurar o direito de audiência (day in court) das partes, em decorrência da atenção pessoal dispensada pelos integrantes do colegiado votante à questão quando o advogado está presente a sustentar; (c) legitimar o julgamento recursal aos olhos da sociedade; e (d) educar as partes sobre os critérios decisórios dos julgadores, o que leva ao aumento da qualidade da litigância recursal a longo prazo4.  O STJ também ratifica o valor do ato à defesa, conforme se vê pela recente decisão no HC n. 666.179/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, citando decisão já firmada no Tribunal Cidadão pelo julgamento do HC 364.512/RJ ainda em 2017, esse com relatoria do Ministro Rogério Schietti Cruz: HABEAS CORPUS ORIGINÁRIO. NULIDADE DA SESSÃO DE JULGAMENTO DO RECURSO DE APELAÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO. NEGATIVA DE SUSTENTAÇÃO ORAL PERANTE O TRIBUNAL DE ORIGEM. NÃO ATENDIMENTO AO PEDIDO DE INSCRIÇÃO PARA SUSTENTAÇÃO ORAL FEITO 48 HORAS ANTES DA SESSÃO VIRTUAL DE JULGAMENTO. ORDEM CONCEDIDA. 1. Não há falar em habeas corpus substitutivo do recurso próprio quando o constrangimento ilegal apontado pelo impetrante teria sido praticado pelo próprio Tribunal de origem, ao negar o direito à sustentação oral defensiva no julgamento do recurso apelatório, o que possibilita a impetração do habeas corpus originário (art. 105, inciso I, alínea "c", da Constituição Federal de 1988). 2. Como é de conhecimento, o direito de sustentar oralmente constitui prerrogativa de essencial importância, cuja frustração afeta o princípio constitucional da amplitude de defesa (HC 364.512/RJ, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Sexta Turma, julgado em 15/12/2016, DJe de 6/2/2017). 3. Conforme o art. 5º, parágrafo único, da Resolução n. 314 do Conselho Nacional de Justiça, eventuais pedidos de inscrição prévia para sustentação oral podem ser feitos após a disponibilização da pauta na imprensa oficial, mediante requerimento a ser enviado, preferencialmente, com 72 horas de antecedência ao início da sessão, observado o limite de 24 horas que a antecederia. 4. Na hipótese, afigura-se ilegal a fundamentação da Corte local para negar ao advogado do paciente o direito de realizar sustentação oral, visto que, 48 horas antes do julgamento virtual da apelação, dentro, portanto, do prazo mínimo de 24 horas, o causídico enviou o seu pedido, no endereçamento correto ([email protected]), para sustentar oralmente, conforme o documento trazido à e-STJ fl. 9. 5. Ordem concedida para anular o julgamento do Apelação Criminal n. 0001132-39.2018.8.26.0624 para que outro seja proferido, dessa vez, com a sustentação oral da defesa, determinando, ainda, a revogação da custódia cautelar do paciente, com o restabelecimento do comando contido na sentença para que o réu possa recorrer em liberdade. (HC n. 666.179/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 28/9/2021, DJe de 4/10/2021.) Para além dos critérios técnicos a valorar a importância da sustentação oral, os anos de prática na Presidência do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/DF ensinaram que todos os julgamentos de processos disciplinares em órgãos colegiados têm um forte apelo emocional, pois aqueles que julgam estão decidindo o futuro de seus pares. Na OAB não é diferente. Embora impere no sistema OAB a correção nos julgamentos e a imparcialidade dos julgadores, vale lembrar que esse direito não é sinônimo de neutralidade. Como ensina CASARA, enquanto a imparcialidade do juiz é uma garantia do jurisdicionado; a neutralidade é impossível, um mito5. No ponto, é inafastável assumir que a atuação do julgador sofrerá influências conscientes ou inconscientes por suas experiências pessoais e condicionantes internos, como valores e aprendizados ao longo da vida sobre os campos socioeconômicos, político-ideológicos, morais, estéticos, religiosos, vieses cognitivos e outros. De forma idêntica, influências externas, somadas às internas já citadas, também podem ser mecanismo influenciador de decisões, como ocorre com a pressão da mídia6. Para melhor ilustrar vale o seguinte exemplo: um julgador do Tribunal de Ética, no passado, teria sido condenado à sanção disciplinar de suspensão por 60 (sessenta) dias pelo inciso XVII do artigo 34 do EAOAB7, pois supostamente influenciou seu cliente a erigir construção em área verde onde o ato era proibido. À época, em sua defesa, sustentou que nunca incentivou o cliente, mas, contrariamente, sempre o orientou sobre os riscos de referida ação. De nada adiantou e adveio a condenação, que sempre causou grande revolta e sentimento de indignação no profissional. Agora, imagine que referido julgador é designado relator de um caso praticamente idêntico, onde o advogado representado sustenta tese análoga àquela que utilizou no passado em sua própria defesa. É de rigor assumir que inevitavelmente suas experiências passadas irão influenciar no julgamento, sem que com isso esteja impedido ou suspeito para o julgamento. De igual forma, a Julgadora que já tenha sido vítima de violência doméstica terá uma visão diferente de um processo com esse mérito daquela de outro julgador, homem, ainda não desmascarado, que cometa esse triste ato de violência no silêncio de sua casa.   Estabelecido que imparcialidade não é neutralidade, advém o inexorável reconhecimento da importância da sustentação oral, que será o momento em que a parte que é julgada terá condição de expor suas razões de defesa a seus pares, julgadores e julgadoras, que também vivem em seu cotidiano as agruras e dificuldades da advocacia. Assim e em conclusão, dentre os atos da defesa no processo disciplinar da OAB a sustentação oral é importantíssima, devendo sempre ser realizada por advogado da confiança do representado, apto à lida nos Tribunais de Ética e Disciplina e preparado para bem expor as teses resistivas. *Se tiver dúvidas sobre o processo disciplinar na OAB ou quiser sugerir algum tema fale direto com o advogado. Acesse o perfil no Instagram: @antonioalbertocerqueira __________ 1 Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei. 2 Art. 68. Salvo disposição em contrário, aplicam-se subsidiariamente ao processo disciplinar as regras da legislação processual penal comum e, aos demais processos, as regras gerais do procedimento administrativo comum e da legislação processual civil, nessa ordem. 3 XXXVII - não haverá juízo ou tribunal de exceção; 4 MALAN, Diogo. Disponível em https://www.conjur.com.br/2021-abr-07/diogo-malan-advocacia-criminal-arte-sustentacao-oral apud AMERICAN ACADEMY OF APPELLATE LAWYERS. Oral Argument Task Forte Report (2015)). Disponível aqui. 5 CASARA, Rubens R. R. Mitologia Processual Penal. São Paulo: Saraiva, 2015, p.144; 6 CRUZ, Álvaro Ricardo de Souza. DUARTE, Bernardo Augusto Ferreira. Além do Positivismo Jurídico. Belo Horizonte: Arraes Editores, 2013, p. 165. 7 XVII - prestar concurso a clientes ou a terceiros para realização de ato contrário à lei ou destinado a fraudá-la.
Conforme exposto nos comentários referentes ao princípio da publicidade no processo disciplinar da OAB (clique aqui para ler), aplicam-se todas as regras processuais e legais relacionadas, especialmente à luz do quanto prescrevem os normativos constitucionais sobre a matéria e a lei federal 13.668/18 que criou o Diário Eletrônico da Ordem dos Advogados do Brasil. Pois bem, referidas normas são para dar publicidade extra-autos, mas o princípio da publicidade também guarda correlação com o que é inserido no processo disciplinar. Nesse sentido, para além da juntada aos autos de todas as provas produzidas e manifestação das partes, assim como das decisões proferidas, também é imprescindível que quando existentes, sejam juntados aos autos tanto o voto-vista, quanto eventualmente o voto divergente, harmonizando no processo publicidade, contraditório e ampla defesa. Para reforçar a premissa, cumpre destacar que há recursos no sistema OAB que têm seu cabimento exatamente relacionado ao resultado dos julgamentos. Quando há julgamento por maioria, eventualmente pode ser admissível recurso, como é o caso daquele previsto no artigo 89-A, §3º do Regulamento Geral da OAB:  Art. 89-A. A Segunda Câmara será dividida em três Turmas, entre elas repartindo-se, com igualdade, os processos recebidos pela Secretaria. § 3º Das decisões não unânimes das Turmas caberá recurso para o Pleno da Segunda Câmara. Esse modelo recursal em regra é copiado internamente nas Seccionais pelos regimentos internos dos Tribunais de Ética e Disciplina, valendo como exemplo o artigo 8º, inciso III do Regimento Interno do TED OAB/DF:  Art. 8º - Compete ao Tribunal Pleno: III- julgar em grau de recurso, as decisões proferidas pelo Presidente e não unânimes das Turmas;  Vê-se, pois, a necessidade da juntada de ambos ao processo, ou seja, tanto do voto-vista quando do voto divergente. O Regulamento Geral da OAB trata das Sessões dos órgãos colegiados do Conselho Federal, sendo que seus normativos inspiram também as Sessões dos órgãos das Seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil, que têm liberdade para disciplinar regimentalmente alterações na forma de julgamento de seus processos via de seus regimentos internos, mas que, todavia, não podem fazê-lo no que toca ao processo disciplinar, por força do quanto determina o parágrafo único do artigo 154.  Art. 154. Os Provimentos editados pelo Conselho Federal complementam este Regulamento Geral, no que não sejam com ele incompatíveis. Parágrafo único. Todas as matérias relacionadas à Ética do advogado, às infrações e sanções disciplinares e ao processo disciplinar são regulamentadas pelo Código de Ética e Disciplina.  Por sua vez, o CED OAB, Resolução 02/15, disciplina a forma do voto no processo disciplinar da OAB em seus artigos 61 e 62:  Art. 61. Do julgamento do processo disciplinar lavrar-se-á acórdão, do qual constarão, quando procedente a representação, o enquadramento legal da infração, a sanção aplicada, o quórum de instalação e o de deliberação, a indicação de haver sido esta adotada com base no voto do relator ou em voto divergente, bem como as circunstâncias agravantes ou atenuantes consideradas e as razões determinantes de eventual conversão da censura aplicada em advertência sem registro nos assentamentos do inscrito. Art. 62. Nos acórdãos serão observadas, ainda, as seguintes regras: § 1º O acórdão trará sempre a ementa, contendo a essência da decisão. § 2º O autor do voto divergente que tenha prevalecido figurará como redator para o acórdão. § 3º O voto condutor da decisão deverá ser lançado nos autos, com os seus fundamentos. § 4º O voto divergente, ainda que vencido, deverá ter seus fundamentos lançados nos autos, em voto escrito ou em transcrição na ata de julgamento do voto oral proferido, com seus fundamentos. § 5º Será atualizado nos autos o relatório de antecedentes do representado, sempre que o relator o determinar.  Como bem se vê, não é necessária a juntada aos autos do voto divergente ou do voto-vista que não tenham prevalecido no julgamento. Essa prescindibilidade decorre da menor formalidade ligada a esses votos e ao incentivo aos debates e à celeridade processual. Ora, pode ser que eventual divergência surja no momento da sustentação oral e um dos julgadores tome a palavra na fase de debates para realizar um voto divergente instantâneo, ou seja, naquele momento. É absolutamente prescindível e seria altamente ineficaz exigir daquele julgador que se manifestou a confecção de um voto escrito sobre sua manifestação para ser juntado aos autos. A óbvia e única consequência seria o desestímulo aos debates e o prejuízo à qualidade do julgamento. De outro lado, todavia, é direito daquele que está sendo julgado, na forma da publicidade já comentada, ter acesso ao conteúdo dos debates e do julgamento. A forma de solucionar o problema é tornar imperioso que o Presidente da Sessão conceda o tempo necessário, assim como auxílio técnico, para que o secretário do ato tome notas cuidadosas sobre o teor de referidas manifestações, evitando assim incorreções ou omissões e, portanto, nulidades. Daí também exsurgir a conclusão de que a gravação da Sessão é importantíssima ferramenta ao bom trabalho do órgão da OAB, pois sempre será fonte de consulta em caso de alguma dúvida sobre o conteúdo do voto. No caso de não juntada do voto e sua substituição pelo extrato do julgamento na ata da Sessão, o norte sobre o quanto deve constar na ata é exatamente permitir que a fundamentação seja suficiente para o manejo do recurso. Se no momento administrativo posterior à Sessão, quando for realizada a confecção, a formalização e a revisão para o fechamento da ata, o secretário da Sessão de julgamento não estiver apto à reprodução de tudo quanto foi julgado, votado e decidido, deverá pedir que o relator do voto-vista ou do voto-divergente forneça suas razões por escrito, evitando assim prejuízo à parte e, portanto, nulidade; caso seja medidas mais simples, poderá apenas consultar a gravação da Sessão.  Exigir-se-á, todavia, a juntada do voto-vista ou do voto divergente integral quando seu conteúdo prevalecer totalmente, pois nesse caso altera-se o relator natural do processo. Nessa hipótese, obrigatoriamente, devem compor os autos ambos os votos. No caso de voto divergente que tenha fração prevalente no julgamento, como, hipoteticamente, um caso em que são julgadas concomitantemente cinco infrações disciplinares cometidas pela parte representada e há voto divergente vencedor que sustenta apenas a prescrição de uma delas, acompanhando o relator quanto às demais, também será prescindível a juntada do voto, bastando as referências completas na ata de julgamento da sessão quanto à parte vencedora. Por último, vale lembrar que eventual publicação que dê início ao prazo recursal sem que os autos estejam completos na forma acima, será causa de nulidade processual por violação do direito de defesa e do contraditório, pois não é possível o exercício de recurso sem a materialização do julgamento no processo, com a presença de todos os votos e manifestações, dependendo, sempre, à luz dos artigos 68 do EAOAB e 563 do CPP, da prova do prejuízo, que deverá ser demonstrada pela defesa em face da aplicação no Brasil do princípio  pas de nullité sans grief. ____________ *Se tiver dúvidas sobre o processo disciplinar na OAB ou quiser sugerir algum tema fale direto (clique aqui) com o advogado.
Um dos princípios mais importantes ao estado democrático de direito é o da publicidade dos atos públicos, tanto assim que para além de encampar todos os códigos de processo do ordenamento jurídico brasileiro, encontra previsão constitucional não só no artigo 371 da Carta Maior, mas no rol das garantias individuais, cláusulas pétreas, citado diretamente nos incisos LX2, XXXIII3 do artigo 5º. Esse princípio é de tamanha envergadura que se torna corolário de todo o sistema de garantias, pois sem a publicidade, não há se falar em ampla defesa, no contraditório, na necessidade de fundamentação das decisões e no devido processo legal, todos pilares de sustentação do processo. Na OAB não é diferente, pois sempre se respeitou a necessidade da publicidade dos atos. Antes de 2018, todavia, a observância à básica regra processual era um fardo ao processo disciplinar da OAB, pois para se dar a publicidade dos atos, fazia-se necessário a intimação pessoal do representado por correspondência, para todo e qualquer ato. Com o advento da lei Federal 13.668/2018, a OAB criou o Diário Eletrônico da Ordem dos Advogados do Brasil, que muito otimizou os processos. A norma alterou o EAOAB, cujo artigo 69, §2º passou a ter a seguinte redação: Art. 69. Todos os prazos necessários à manifestação de advogados, estagiários e terceiros, nos processos em geral da OAB, são de quinze dias, inclusive para interposição de recursos. (...) § 2º No caso de atos, notificações e decisões divulgados por meio do Diário Eletrônico da Ordem dos Advogados do Brasil, o prazo terá início no primeiro dia útil seguinte à publicação, assim considerada o primeiro dia útil seguinte ao da disponibilização da informação no Diário.  A nova ferramenta foi um divisor de águas no processo disciplinar, pois importou em grande incremento na celeridade do processo e é reconhecida pelo Conselho Federal como mecanismo de publicidade das sanções disciplinares: Recurso ao Conselho Federal da OAB. Artigo 75, caput, do Estatuto da Advocacia e da OAB. Acórdão unânime de Conselho Seccional da OAB. Revisão de processo disciplinar. Indeferimento. Ausência dos pressupostos de admissibilidade do artigo 73, § 5º, do Estatuto da Advocacia e da OAB. Edital de suspensão. Publicação no Diário Eletrônico da OAB. Advogado recolhido em sala de Estado Maior ao tempo da publicação do edital de suspensão do exercício profissional. Irrelevância. Ato administrativo que tem por finalidade dar publicidade ao ato de execução da sanção disciplinar, dando publicidade à punição imposta pela OAB, materializando-se o princípio da publicidade dos atos administrativos. (...). Brasília, 21 de junho de 2022. (Recurso n. 16.0000.2021.000113-9/SCA-STU. EMENTA N. 050/2022/SCA-STU. Relator: Conselheiro Federal Emerson Luis Delgado Gomes (RR). DEOAB, a. 4, n. 886, 1º.07.2022, p. 20). Nada obstante, o princípio da publicidade não está apenas e tão somente na comunicação dos atos oficiais, mas também na materialização de seu conteúdo no processo, especialmente pela juntada das decisões proferidas nos julgamentos, sejam elas favoráveis ou desfavoráveis à parte. Nesse sentido, para dar validade ao processo e se observar a necessária publicidade, sempre que se for dar cumprimento a qualquer decisão, é necessário que seu conteúdo componha os autos, como, por exemplo, um acórdão. Assim, a título de exemplo e embora vigente com vigor no sistema OAB o princípio pas de nullité sans grief4, não se pode dar efetividade ao quanto decidido por órgão colegiado da OAB sem que o referido acórdão esteja nos autos, não sendo suficiente a publicação do extrato de julgamento no Diário Eletrônico da OAB, haja vista o claro prejuízo do direito ao recurso, o que violaria por consequência a ampla defesa e o contraditório. Outro exemplo bastante importante são os votos vista, assim como os votos divergentes. Embora não encontrem previsão legal para juntada física no processo disciplinar, ou seja, sua juntada completa é prescindível e podem ser lançados nos autos por simples extrato na ata de julgamento que reflita e contenha os fundamentos mínimos do voto, não há como o processo avançar sem referido conteúdo, tanto assim que é comum no sistema OAB o cabimento de recurso de decisões não unânimes, o que encontra previsão em quase todos os regimentos internos Seccionais e também no artigo 89-A, §3º do Regulamento Geral da OAB: Art. 89-A. A Segunda Câmara será dividida em três Turmas, entre elas repartindo-se, com igualdade, os processos recebidos pela Secretaria. (...) § 3º Das decisões não unânimes das Turmas caberá recurso para o Pleno da Segunda Câmara Em conclusão, o princípio da publicidade foi integralmente recepcionado pelo sistema OAB e não se materializa apenas e tão somente na publicação dos atos no Diário Eletrônico, mas também na imperiosa necessidade de que todas as decisões que gerem efeitos no mundo dos fatos estejam previamente à publicação, a compor os autos, façam parte do processo, incluídas as decisões monocráticas, colegiadas, os votos divergentes e os votos vista. *Se tiver dúvidas sobre o processo disciplinar na OAB ou quiser sugerir algum tema fale direto com o advogado (clique aqui). __________ 1 Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: 2 LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem; 3 XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado; 4 Recurso a Terceira Câmara do Conselho Federal da OAB. (...) Supressão das alegações finais, aplicação do princípio "pas de nullité sans grief", não se declara a nulidade de um ato sem que seja evidenciado o prejuízo causado por ele, aplicação do art. 277 do Código de Processo Civil, a finalidade das alegações finais foi alcançada pela sustentação oral, aplicação do princípio da finalidade e economia processual. (...) Brasília, 21 de junho de 2022. (RECURSO N. 49.0000.2022.000359-7/TCA. EMENTA N. 035/2022/TCA. Relatora: Conselheira Federal: Silvia Virginia Silva de Souza (SP). DEOAB, a. 4, n. 881, 24.06.2022, p. 8).
Dentre as mais graves condutas disciplinares praticadas pelo advogado contra seus clientes estão o locupletamento previsto no artigo 34, inciso XX1 e a consequente ausência de prestação de contas, ainda mais grave, prevista no inciso XXI2, ambos da lei Federal 8.906/94. Tecnicamente, o verbo locupletar-se do inciso não quer dizer apenas apropriar-se de dinheiro do cliente. Seria exemplo de locupletamento todo ato que violasse gravemente as regras negociais normais, como por exemplo cobrar honorários excessivamente altos e perenes de pessoa idosa e hipossuficiente técnica, como haver para si, a título de honorários, 40% do valor da aposentaria mensal da aposentada por atuação em causa dessa natureza.  Nada obstante, no dia a dia dos Tribunais de Ética, vê-se que praticamente todos os casos de locupletamento estão intimamente ligados a condutas que beiram ou alcançam o crime de apropriação indébita com aumento de pena por exercício da profissão, previsto no artigo 168, §1º, inciso III do Código Penal3. Pois bem, em absolutamente todos os casos esse tipo de conduta é omitido da vítima, ou seja, do cliente, causando imediatamente e por consequência o também enquadramento da conduta lesiva no inciso XXI do artigo 34, pela ausência da prestação de contas. Ora, não se espera (e isso não ocorre) que um advogado retenha indevidamente do cliente o valor de seu alvará e confesse o crime. No sistema OAB a conduta de não prestar contas prevista no inciso XXI pode importar em grave sanção disciplinar, que imponha, para além de uma potencial suspensão de trinta dias até doze meses, a manutenção dessa sanção até a satisfação integral da dívida, conforme artigo 37, §2º do EAOAB:  Art. 37. A suspensão é aplicável nos casos de:      I - infrações definidas nos incisos XVII a XXV do art. 34; II - reincidência em infração disciplinar. § 1º A suspensão acarreta ao infrator a interdição do exercício profissional, em todo o território nacional, pelo prazo de trinta dias a doze meses, de acordo com os critérios de individualização previstos neste capítulo. § 2º Nas hipóteses dos incisos XXI e XXIII do art. 34, a suspensão perdura até que satisfaça integralmente a dívida, inclusive com correção monetária. (Vide RE 647885) § 3º Na hipótese do inciso XXIV do art. 34, a suspensão perdura até que preste novas provas de habilitação. Da redação da norma repressiva vê-se que a suspensão só será levantada no caso de pagamento integral da dívida, com correção monetária. Pois bem, embora a norma seja silente quanto à incidência dos juros de mora, é importantíssimo destacar seu cabimento, haja vista sua indissociabilidade da ideia de valores devidos, ainda mais quando ligados ao locupletamento do advogado. Nesse sentido, por força do artigo 684 do EAOAB, já que não há vedação no sistema OAB para a cobrança dos juros de mora, é imediatamente aplicável a regra do artigo 4065 do Código Civil, que, ligada ao artigo 161, §1º6 do Código Tributário Nacional, impõe a fixação dos juros de mora em 1% ao mês. É esse, também, o entendimento do Conselho Federal da OAB: Recurso ao Conselho Federal. Locupletamento. Levantamento de valores de alvará. Repasse de valor em percentual superior a 30%, sem contrato escrito, fazendo-se compensação referente a outros processos, de modo não autorizado pelo cliente. Inteligência do art. 35, caput, e 35, § 2º do Código de Ética e Disciplina. 1) Advogado que recebe valores constantes de alvará judicial e não repassa imediatamente os valores destinados a seu cliente, havendo controvérsia quanto ao percentual descontado e recusando-se o cliente a receber, comete a infração disciplinar prevista no art. 34, inciso XX, da Lei nº 8.906/94. (...) 3) Juros e correção monetária incidirão sobre os valores devidos e não pagos, a teor do art. 37, § 2º do Estatuto, sendo os juros o consectário decorrente da mora. 4) Dosimetria da pena que não merece alteração, por força do atraso na prestação de contas e na ausência de devolução dos valores devidos e não pactuados com o cliente, já revistos na instância de base. Recursos conhecidos, mas improvidos. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, acordam os membros da 3ª Turma da Segunda Câmara do CFOAB, observado o quorum exigido no art. 92 do Regulamento Geral, por unanimidade, em acolher o voto da relatora, parte integrante deste, conhecendo e negando provimento aos recursos. Brasília, 2 de dezembro de 2014. Renato da Costa Figueira, Presidente. Valéria Lauande Carvalho Costa, Relatora. (RECURSO N. 49.0000.2014.006372-3/SCA-TT, EMENTA N. 151/2014/SCA-TTU. Relatora: Conselheira Federal Valéria Lauande Carvalho Costa (MA), DOU, S.1, 10.12.2014, p. 180/182).  Reiterada retenção indevida de valores do cliente, enseja suspensão do exercício profissional pelo prazo de doze meses cumulada com multa no valor correspondente a 6 (seis) anuidades, face as circunstâncias agravantes, perdurando a suspensão até a data do efetivo repasse à Recorrida do valor retido acrescido de juros de mora e correção monetária. Inteligência dos arts. 34, XXI c/c 37, I e II e § 2º c/c 39, todos da Lei 8.906/94. ACÓRDÃO: Vistos, examinados e relatados os presentes autos, acordam os integrantes da 1ª Turma da Segunda Câmara do Conselho Federal, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso para manter a decisão recorrida pelos seus próprios fundamentos. Brasília. 08 de dezembro de 2007. Romeu Felipe Bacellar Filho. Presidente "ad hoc" da 1ª Turma da Segunda Câmara. Reginaldo Santos Furtado. Relator. (RECURSO Nº 2007.08.03222-05/1ª Turma - SCA, EMENTA Nº 113/2007/1ªTSCA, Relator: Conselheiro Federal Reginaldo Santos Furtado (PI). DJ, 20.12.2007, p. 41, S1) O início da incidência dos juros será a data do evento danoso pela aplicação da Súmula 54 do STJ, haja vista que a responsabilidade in casu é extracontratual. *Se tiver dúvidas sobre o processo disciplinar na OAB ou quiser sugerir algum tema fale direto com o advogado. (Clique aqui) __________ 1 XX - locupletar-se, por qualquer forma, à custa do cliente ou da parte adversa, por si ou interposta pessoa; 2 XXI - recusar-se, injustificadamente, a prestar contas ao cliente de quantias recebidas dele ou de terceiros por conta dele; 3 Art. 168 - Apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a posse ou a detenção: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. § 1º - A pena é aumentada de um terço, quando o agente recebeu a coisa: (...) III - em razão de ofício, emprego ou profissão. 4 Art. 68. Salvo disposição em contrário, aplicam-se subsidiariamente ao processo disciplinar as regras da legislação processual penal comum e, aos demais processos, as regras gerais do procedimento administrativo comum e da legislação processual civil, nessa ordem. 5 Art. 406. Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional. 6 Art. 161. O crédito não integralmente pago no vencimento é acrescido de juros de mora, seja qual for o motivo determinante da falta, sem prejuízo da imposição das penalidades cabíveis e da aplicação de quaisquer medidas de garantia previstas nesta Lei ou em lei tributária. § 1º Se a lei não dispuser de modo diverso, os juros de mora são calculados à taxa de um por cento ao mês.
O estudo dos normativos do sistema OAB revela que a competência para apreciar a tempestividade de recurso caberia apenas e tão somente ao relator ad quem, ou seja, aquele que conhecerá do recurso, superada a autoridade recorrente. É essa a interpretação que exsurge dos artigos 71, §6; 138, §1, e 140, todos do Regulamento Geral da OAB, confira-se: Art. 71. Toda matéria pertinente às finalidades e às competências do Conselho Federal da OAB será distribuída automaticamente no órgão colegiado competente a um relator, mediante sorteio eletrônico, com inclusão na pauta da sessão seguinte, organizada segundo critério de antiguidade. § 6º Compete ao relator manifestar-se sobre as desistências, prescrições, decadências e intempestividades dos recursos, para decisão do Presidente do órgão colegiado.  Art. 138. À exceção dos embargos de declaração, os recursos são dirigidos ao órgão julgador superior competente, embora interpostos perante a autoridade ou órgão que proferiu a decisão recorrida. § 1º O juízo de admissibilidade é do relator do órgão julgador a que se dirige o recurso, não podendo a autoridade ou órgão recorrido rejeitar o encaminhamento.  Art. 140. O relator, ao constatar intempestividade ou ausência dos pressupostos legais para interposição do recurso, profere despacho indicando ao Presidente do órgão julgador o indeferimento liminar, devolvendo-se o processo ao órgão recorrido para executar a decisão. Parágrafo único. Contra a decisão do Presidente, referida neste artigo, cabe recurso voluntário ao órgão julgador. Não suficiente, vale ainda lembrar a conhecida redação do artigo 77 da lei 8.906/94, que concede a todos os recursos do sistema OAB, salvo as exceções que cita, efeito suspensivo.  Art. 77. Todos os recursos têm efeito suspensivo, exceto quando tratarem de eleições (arts. 63 e seguintes), de suspensão preventiva decidida pelo Tribunal de Ética e Disciplina, e de cancelamento da inscrição obtida com falsa prova. Parágrafo único. O regulamento geral disciplina o cabimento de recursos específicos, no âmbito de cada órgão julgador. A conjugação desses dispositivos leva à inarredável conclusão de que uma vez interposto qualquer recurso, a decisão anterior, que, por exemplo, tenha suspendido o advogado, não poderá ser levada a efeito até que se instale o selo de imutabilidade da última decisão, ou seja, o trânsito em julgado administrativo. Considerando a amplitude recursal do sistema OAB, muitas vezes isso significará anos de trâmite processual. Pois bem, postas as regras acima, está criada uma grave falha jurídico processual no sistema recursal do processo disciplinar OAB, pois todo e qualquer recurso intempestivo, e, portanto, processo resolvido pelo trânsito em julgado, terá idêntico trâmite aqueles normais, cujos recursos são interpostos de forma tempestiva. Essa conclusão decorre da combinação do §1º do artigo 138, que veda à autoridade que proferiu a decisão recorrida a rejeição do encaminhamento do recurso ao ad quem, assim como o parágrafo único do 140, que declara que mesmo reconhecida a intempestividade posterior e liminar pelo Presidente do órgão ad quem, é facultado ao representado o recurso voluntário, que, na forma do quanto prescreve o artigo 77 do EAOAB, obrigatoriamente terá efeito suspensivo. Na prática cotidiana do trabalho na OAB, isso quer dizer exatamente o quanto afirmado acima, ou seja, qualquer processo com recurso maculado pela intempestividade, terá o mesmo trâmite processual de outro, regular. Essa ideia gera gravíssimas distorções, bastando imaginar exemplo de Tribunal de Ética e Disciplina que por suas inúmeras ocupações demora mais de sessenta dias para publicar o acórdão condenatório de advogado suspenso até a satisfação integral da dívida[1]. O advogado que deveria estar suspenso protocoliza seu recurso com quarenta e cinco dias de intempestividade. Nessa hipótese, embora seja clara e indiscutível a intempestividade do recurso, o Tribunal de Ética não poderia conhecer da matéria, sendo obrigado à remessa do recurso ao ad quem para processamento, dando início à cadeia processual já descrita acima. Isso não está correto. Tais distorções podem ser corrigidas por estratégias processuais de trâmite interno dos órgãos da OAB, como a declaração de preclusão do ato com fundamento no artigo 507 do Código de Processo Civil:  Art. 507. É vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão. Assim, aos TED's,e aos Conselhos Plenos basta baixar normativo interno de que toda juntada de recurso deve ser precedida de certidão do Tribunal de eventual trânsito em julgado. Dessa forma, o recurso intempestivo seria oposto ou interposto após a declaração formal no feito de fim do processo, o que obstaria o processamento do recurso, pois precluso o ato. Nada obstante, todavia, a problemática bem revela a ineficácia do sistema recursal nesse ponto e a necessidade de reforma. Solução possível seria a revogação do §1º do artigo 138 do Regulamento Geral e a extensão das possibilidades do "agravo" do artigo 144-A, também do Regulamento, hoje cabível apenas contra a decisão de suspensão preventiva:  Art. 144-A. Para a formação do recurso interposto contra decisão de suspensão preventiva de advogado (art. 77, lei 8.906/94), dever-se-á juntar cópia integral dos autos da representação disciplinar, permanecendo o processo na origem para cumprimento da pena preventiva e tramitação final, nos termos do artigo 70, § 3º, do Estatuto. (NR)153   Tal reforma impactaria imediatamente em todo o sistema recursal OAB, otimizando o trâmite processual de milhares de recursos e incrementando em muito a eficiência do processo. *Se tiver dúvidas sobre o processo disciplinar na OAB ou quiser sugerir algum tema fale direto com o advogado (Clique aqui). __________ 1 Art. 37. A suspensão é aplicável nos casos de: (...) § 2º Nas hipóteses dos incisos XXI e XXIII do art. 34, a suspensão perdura até que satisfaça integralmente a dívida, inclusive com correção monetária.
O sistema punitivo do processo disciplinar da OAB está previsto entre os artigos 35 e 42 da lei Federal 8.906/94. Tem início com a previsão das sanções disciplinares existentes para, a partir desse ponto, estabelecer a forma como deverão ser impostas.  É lá que o legislador ordinário estabelece quando será cabível cada sanção. A sanção de censura será cabível para as infrações definidas nos incisos I a XVI e no XXIX, assim como para violações ao Código de Ética e Disciplina. Outrossim, essa sanção poderá ser convertida em advertência de ofício reservado. A suspensão terá lugar para as infrações previstas nos incisos XVII a XXV, assim como para a reincidência em infração disciplinar. A mais severa das punições, a exclusão caberá quando existirem três suspensões ou para as infrações dos incisos XXVI a XXVIII. Também nesses artigos situam-se as causas administrativas atenuantes e as agravantes. Não é só, as regras adjetivas e materiais também estabelecem regras sobre a aplicação da multa, do pedido de reabilitação, do impedimento do exercício profissional e outros. Outras normas do sistema OAB estabelecem regras adjetivas para o processo, como ocorre com o Código de Ética e Disciplina, com o Regulamento Geral e com os Regimentos Internos de cada Seccional.   Não há, contudo, nada sobre a unificação de processos, sobre eventual concurso material, formal ou sobre a continuidade infracional, todos institutos aplicáveis ao processo disciplinar pelo quanto estabelece o artigo 68 do EAOAB1. É muito comum na atividade judicante dos Tribunais de Ética e Disciplina o recebimento de representações sequenciais por atos idênticos e/ou análogos, realizados dentro do mesmo contexto fático e espaço de tempo. Tratar-se-á agora da continuidade delitiva infracional, ou seja, hipóteses em que o advogado comete, por mais de uma vez o mesmo ato, podendo ser os demais considerados uma extensão do primeiro. Exemplo bastante contemporâneo desse fenômeno deu-se em tempos de COVID-19 no Distrito Federal. A Seccional da OAB/DF celebrou com a SESIPE - Secretaria de Estado de Administração Penitenciária do Distrito Federal acordo de colaboração nominado de parlatório virtual, uma importantíssima ferramenta que passou a permitir que o advogado atendesse seu cliente virtualmente, por uma ligação de vídeo, realizada do interior de seu escritório e/ou de qualquer lugar onde quisesse levar seu computador ou seu celular. O ato de entrevista entre advogado e cliente, por óbvio, é personalíssimo, sigiloso e reservado, ou seja, naquele ato, só podem estar o advogado e seu cliente, preso. Ocorre que muitos advogados, por ocasião da aplicação da nova ferramenta, passaram a colocar parentes dos presos em frente à tela no momento das entrevistas, de forma a lhes permitir um mínimo contato com o encarcerado. Embora fosse ato humanitário, essa conduta violou grosseiramente a portaria que criou o parlatório virtual e o Código de Ética e Disciplina, passando a ser entendida como infração ética, até porque, para ofertar o "benefício" aos parentes, os advogados envolvidos cobravam valores da família, ou seja, estavam a praticar atos de mercancia sobre algo proibido. Tais fatos deram início à remessa ao TED OAB/DF de dezenas de representações disciplinares. Pois bem, em um dos casos levados à apreciação do Tribunal, o advogado permitiu que três diferentes pessoas conversassem com o preso na mesma entrevista. Esse fato gerou representação disciplinar enviada pela SESIPE capaz de bem demonstrar a aplicação do instituto ora em comento. Não há qualquer dúvida da presença de três infrações ético-disciplinares praticadas pelo advogado, uma para cada pessoa que permitiu tivesse contato com o preso, todavia, a discussão é se as sanções disciplinares deveriam ser somadas para aplicação de uma pena mais dura, como ocorre com o concurso material do artigo 69 do Código Penal2. A resposta é negativa, pois a correta interpretação do direito repressivo no caso concreto desafia o reconhecimento da continuação infracional, pela aplicação analógica do artigo 71 do Código Penal, que trata do crime continuado: Crime continuado Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.          Parágrafo único - Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70 e do art. 75 deste Código.   A grande diferença é que em vez de ter as sanções disciplinares somadas, o representado/condenado as terá reconhecidas, todavia, na fase da dosimetria, o aplicador do direito aplicará apenas uma delas, com o acréscimo de um sexo a dois terços. Vale atentar que a tese da continuidade delitiva deve sempre que possível encampar as defesas disciplinares quando a representação envolve mais de uma infração disciplinar, todavia, é raríssimo vislumbrar a construção dessa tese em qualquer manifestação, ficando, assim, o representado sempre à mercê do reconhecimento de ofício pelo Tribunal.   *Se tiver dúvidas sobre o processo disciplinar na OAB ou quiser sugerir algum tema fale direto com o advogado. __________ 1 Art. 68. Salvo disposição em contrário, aplicam-se subsidiariamente ao processo disciplinar as regras da legislação processual penal comum e, aos demais processos, as regras gerais do procedimento administrativo comum e da legislação processual civil, nessa ordem. 2 Art. 69 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido. No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção, executa-se primeiro aquela. 
Não é sem motivo que a Ordem dos Advogados do Brasil sempre figura em pesquisas populares como uma das instituições mais confiáveis da sociedade civil brasileira. Essa titulação, aliás, vem apenas ratificar à sociedade a importância concedida à OAB pelo legislador constitucional, que fez inserir no artigo 133 de nossa Carta Maior o seguinte: Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei. E, de fato, vê-se ser a Ordem sempre vanguardista no que toca aos direitos sociais e à proteção dos maiores valores da sociedade, tanto assim que foram em suas fileiras os primeiros passos da paridade de gênero, com iniciativas para a divisão de seus Conselhos de forma paritária entre homens e mulheres. Também foi uma grande luta da OAB a alteração da lei Federal 8.906/94, pela lei 13.353/2016, para garantir direitos especiais às mulheres advogadas, e, inclusive, tornar criminosa sua violação: Art. 7º-A. São direitos da advogada:                I - gestante:              a) entrada em tribunais sem ser submetida a detectores de metais e aparelhos de raios X;           b) reserva de vaga em garagens dos fóruns dos tribunais;           II - lactante, adotante ou que der à luz, acesso a creche, onde houver, ou a local adequado ao atendimento das necessidades do bebê;           III - gestante, lactante, adotante ou que der à luz, preferência na ordem das sustentações orais e das audiências a serem realizadas a cada dia, mediante comprovação de sua condição;           IV - adotante ou que der à luz, suspensão de prazos processuais quando for a única patrona da causa, desde que haja notificação por escrito ao cliente.           § 1º Os direitos previstos à advogada gestante ou lactante aplicam-se enquanto perdurar, respectivamente, o estado gravídico ou o período de amamentação.          § 2º Os direitos assegurados nos incisos II e III deste artigo à advogada adotante ou que der à luz serão concedidos pelo prazo previsto no art. 392 do Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943 (Consolidação das Leis do Trabalho § 3o O direito assegurado no inciso IV deste artigo à advogada adotante ou que der à luz será concedido pelo prazo previsto no § 6o do art. 313 da Lei no 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil).          Art. 7º-B Constitui crime violar direito ou prerrogativa de advogado previstos nos incisos II, III, IV e V do caput do art. 7º desta Lei:       Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.     Pena - detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.     Pois bem, incansável na defesa do quanto é certo, das boas práticas e especialmente dos direitos daqueles menos afortunados (como são as vítimas dos atos aqui tratados), no dia 13/03/2023 o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil acabou por aprovar proposta encaminhada pela Comissão Nacional da Mulher Advogada, presidida pela Conselheira Federal pela OAB/DF, Cristiane Damasceno, também coautora desse escrito, no sentido de conclamar o legislativo nacional a realizar nova reforma no EAOAB, desta vez para fazer inserir no rol das sanções disciplinares o inciso XXX, com a seguinte redação: XXX - Praticar assédio moral, sexual ou discriminação. O primeiro acerto da norma foi o de não realizar diferenciação de gênero, ou seja, a proteção é para todos. Por óbvio, são conceitos abertos o assédio moral, o sexual e a discriminação, todavia, a proposta de alteração legislativa também veio com carga explicativa normativa, para inserir um §2º no texto legal, assim idealizado: § 2° Para os fins desta Lei, considera-se: I - Assédio moral, no exercício profissional ou em razão dele, a repetição deliberada de gestos, palavras (orais ou escritas) e/ou comportamentos os quais expõem o (a) estagiário (a), o advogado (a), ou qualquer outro profissional que esteja prestando seus serviços, a situações humilhantes e constrangedoras, capazes de lhes causar ofensa à personalidade, à dignidade, à integridade psíquica ou física, com o objetivo de excluí-los (as) das suas funções, desestabiliza-lo emocionalmente, deteriorando o ambiente de trabalho. II - Assédio sexual, no exercício profissional ou em razão dele, a conduta de conotação sexual manifestada fisicamente, por palavras, gestos ou outros meios, propostas ou impostas às pessoas contra sua vontade, causando-lhes constrangimento e violando a sua liberdade sexual. III - Discriminação a conduta que consiste em ação comissiva ou omissiva que dispense um tratamento diferenciado (inferiorizado) a uma pessoa ou grupo de pessoas, em razão da sua pertença a uma determinada raça, cor, sexo, nacionalidade, origem étnica, orientação sexual, identidade de género, etária, religiosa ou outro fator. Como se vê, as explicações fornecidas pela norma são bem completas e suficientes à boa delimitação das condutas, valendo destaque para o fato de que, aparentemente, a conduta de assédio moral exigirá habitualidade, enquanto no assédio sexual ou na discriminação, apenas uma única conduta poderá configurar a falta comportamental. Vale ainda destacar que o grande mérito da OAB foi a aprovação do texto inicial, que, sem embargos, poderá ainda sofrer aprimoramentos com o amadurecimento da questão perante as casas legislativas. As novas sanções disciplinares serão punidas com a pena de suspensão, pois a proposta sugere a alteração do artigo 37, inciso I para a seguinte: Art. 37. A suspensão é aplicável nos casos de:   I - Infrações definidas nos incisos XVII a XXV e XXX do art.34. Sem prejuízo, todavia, vale lembrar o quanto já mencionado sobre a tipificação administrativa das condutas e a possibilidade de seu agravamento. Em comentário anterior à matéria, destaca-se a possibilidade de que condutas mais brandas sujeitas à censura sejam reclassificadas, a depender da lesividade do ato, para conduta incompatível com a advocacia, impondo ao infrator a suspensão em vez da pena de censura. Pois bem, ao caso concreto, não é diferente. Em caso de alteração da lei, que já se declara muito desejada, aquele que cometer o assédio moral, o sexual ou ato de discriminação em regra ficará sujeito à pena de suspensão, todavia, a depender da gravidade do caso, não há dúvida que também pode ser realizada a reclassificação da conduta para a imediatamente mais grave, ou seja, a sanção disciplinar de exclusão, pela combinação entre os artigos 34, XXVII e XXVIII e 38, II da lei 8.906/94. Nesse sentido, imagine-se exemplo onde advogado proprietário de escritório passe a contratar jovens estagiárias para lhe auxiliar, todavia, de forma recorrente, lhes ataca com o crime de assédio sexual. Em determinado dia uma delas resolve quebrar o silêncio e registrar uma ocorrência policial sobre o fato, sendo seguida de outras cinco colegas, com as mais graves narrativas sobre propostas de ascensão profissional ou prejuízo no trabalho, sempre vinculadas a favores sexuais. Ao final das investigações, ouvidas diversas testemunhas, há comprovação cabal dos crimes. No exemplo acima, aparentemente as condutas foram de gravidade tal que se amoldam muito mais ao conceito de crime infamante, sendo que sem dúvidas esse advogado não terá mais a inidoneidade apta ao exercício da profissão, sujeitando-se, assim, ao processo de exclusão.   Em conclusão e com essas simples considerações, parabeniza-se a OAB pela elogiosa iniciativa, que vem premiar toda a sociedade. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui)  
No processo disciplinar da OAB o prazo era contado a partir recepção da correspondência de notificação, com aviso de recebimento, conforme antiga redação do artigo 69, §1º da lei Federal 8.906/94: Art. 69. Todos os prazos necessários à manifestação de advogados, estagiários e terceiros, nos processos em geral da OAB, são de quinze dias, inclusive para interposição de recursos. § 1º Nos casos de comunicação por ofício reservado, ou de notificação pessoal, o prazo se conta a partir do dia útil imediato ao da notificação do recebimento. No mesmo sentido estabelece o Regulamento Geral da OAB acerca da contagem do prazo recursal: Art. 139. O prazo para qualquer recurso é de quinze dias, contados do primeiro dia útil seguinte, seja da publicação da decisão na imprensa oficial, seja da data do recebimento da notificação, anotada pela Secretaria do órgão da OAB ou pelo agente dos Correios. Pois bem, a lei 14.365/2022 alterou a regra do §1º do artigo 69 do EAOAB, cuja atual redação é a seguinte: § 1º Nos casos de comunicação por ofício reservado ou de notificação pessoal, considera-se dia do começo do prazo o primeiro dia útil imediato ao da juntada aos autos do respectivo aviso de recebimento. Como se vê, a alteração legislativa tem natureza de novatio legis in melius, pois majorou o prazo de defesa, cujo dia de início, agora, não é mais a data posterior ao recebimento da notificação, mas o dia posterior à sua juntada aos autos, alinhando-se, assim, à redação do artigo 231, inciso I do Código de Processo Civil1. Como se trata de norma processual, não há se falar em sua retroatividade, vigorando o princípio tempus regit actum na forma do quanto prescreve o artigo 2º do Código de Processo Penal2, emprestado de forma supletiva ao processo disciplinar da OAB pelo artigo 68 do EAOAB3. Embora o prazo tenha sido mantido na quinzena legal, é fácil concluir que o lapso temporal agora é muito maior, haja vista que dependerá da eficiência dos correios devolverem à OAB o aviso de recebimento devidamente cumprido, o que antes não ocorria. Aliás, é bem comum que o AR sequer retorne.   É normal no dia a dia dos Tribunais de Ética e Disciplina da OAB que defesas cheguem aos autos muito antes dos AR's, exatamente em face da exagerada demora dos correios para essa devolução. Também não é incomum o AR de notificação do advogado representado chegar aos autos com o processo em avançado estágio, já na fase de instrução. A nova redação soluciona um recorrente problema processual que era resolvido com base na aplicação do princípio da ampla defesa, a resposta intempestiva. Muitas vezes, a parte representada fazia juntar sua defesa ainda sem qualquer notícia do AR nos autos. Dias depois, até meses em alguns casos, com a chegada do documento ao processo, verificava-se que a resposta havia sido protocolizada de forma intempestiva, exatamente porque o prazo havia se iniciado a partir do dia útil imediato ao da notificação do recebimento, nos termos do revogado §1º do artigo 69 do EAOAB. Nesses casos, claro, admitia-se a defesa, pois de qualquer forma o feito seria encaminhado a Defensor Dativo, na forma do artigo 73, §4º também do Estatuto4, todavia, por óbvio, trata-se de fonte de insegurança jurídica. Com a nova redação esse problema acabou. Agora, entretanto, outro problema nascerá, mais grave que o de outrora, pois agora importará em real prejuízo à defesa. Com a nova redação, o advogado deve ser muito mais diligente, haja vista não existir previsão legal para que o TED alerte o advogado sobre o início do prazo, ou seja, sobre o momento em que o Tribunal recebe o AR dos correios e realiza sua juntada ao processo. Já se antevê muitos colegas perdendo o prazo para a defesa, exatamente porque lhes faltará o cuidado e a necessária diligência para acompanhar esse momento. Assim, se na situação anterior não havia prejuízo da defesa intempestiva, porque o TED só tomava conhecimento do dia de início do prazo quando o AR era juntado, agora, uma vez perdido o prazo, o processo avançará para a defesa dativa, estabelecendo-se prejuízo processual à defesa não passível de invalidação. Sugere-se como melhor estratégia à parte representada que o benefício adjetivo criado pela novatio seja desconsiderado para fins de apresentação da resposta, continuando aquele que deve se defender a contar o prazo do dies a quo do recebimento da correspondência. Vale também ponderar a revogação tácita parcial do artigo 139 do Regulamento Geral da OAB no trecho "da data do recebimento da notificação", pois aqui deve-se adotar a norma mais favorável à defesa, ou seja, há uma sobreposição normativa do quanto prescreve a nova redação do §1º do artigo 69 da Lei 8.906/94, do quanto está previsto no Regulamento Geral da OAB. Isso posto, nas raras ocasiões em que existir notificação por correspondência via AR para apresentação de recurso, pois atualmente é preponderante a intimação pelo DEOAB, o início do prazo recursal deverá ser contabilizado a partir da juntada do AR aos autos. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) __________ 1 Art. 231. Salvo disposição em sentido diverso, considera-se dia do começo do prazo: I - a data de juntada aos autos do aviso de recebimento, quando a citação ou a intimação for pelo correio; 2 Art. 2º A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior. 3 Art. 68. Salvo disposição em contrário, aplicam-se subsidiariamente ao processo disciplinar as regras da legislação processual penal comum e, aos demais processos, as regras gerais do procedimento administrativo comum e da legislação processual civil, nessa ordem. 4 Art. 73. Recebida a representação, o Presidente deve designar relator, a quem compete a instrução do processo e o oferecimento de parecer preliminar a ser submetido ao Tribunal de Ética e Disciplina. (...) § 4º Se o representado não for encontrado, ou for revel, o Presidente do Conselho ou da Subseção deve designar-lhe defensor dativo.
Conforme já explicado, o processo disciplinar no sistema OAB possui fases bem definidas em seus regramentos legais, sendo que a primeira delas é pré-processual, chamada fase da admissibilidade onde o processo ainda não foi instaurado.   É bem definida pelo artigo 58, §§ 3º e 4º da Resolução n.º 2/2015 da OAB, também conhecida como Código de Ética e Disciplina: Art. 58. Recebida a representação, o Presidente do Conselho Seccional ou o da Subseção, quando esta dispuser de Conselho, designa relator, por sorteio, um de seus integrantes, para presidir a instrução processual. (...) § 3º O relator, atendendo aos critérios de admissibilidade, emitirá parecer propondo a instauração de processo disciplinar ou o arquivamento liminar da representação, no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de redistribuição do feito pelo Presidente do Conselho Seccional ou da Subseção para outro relator, observando-se o mesmo prazo. § 4º O Presidente do Conselho competente ou, conforme o caso, o do Tribunal de Ética e Disciplina, proferirá despacho declarando instaurado o processo disciplinar ou determinando o arquivamento da representação, nos termos do parecer do relator ou segundo os fundamentos que adotar. Como se vê, embora a representação já tenha relator designado, seu primeiro ato será emitir parecer que verifique os critérios de admissibilidade da peça, dentre os quais aqueles do artigo 57 do CED1, sem prejuízo de outros. Caso não estejam presentes, seu destino será o arquivamento liminar; caso, todavia, a peça inicial seja adequada, aí sim a representação se transformará em processo disciplinar. Nessa fase inicial não há se falar em ampla defesa e contraditório plenos, pois embora a parte possa peticionar nos autos e trazer alguns argumentos de defesa, não poderá, por exemplo, ouvir testemunhas. Na fase de admissibilidade, portanto, caso a parte seja ouvida, o que entendemos sempre recomendável, lhe caberá apenas trazer argumentos que possam dar causa ao arquivamento liminar, como a ausência dos requisitos do artigo 57 acima transcrito, a decadência, a prescrição, falta de tipicidade administrativa do ato narrado etc. Para essa fase, caso o relator da admissibilidade opte por ouvir o advogado, essa notificação para os esclarecimentos preliminares pode ser realizada pelo Diário Eletrônico da OAB e quase sempre é respondida. Pois bem, a experiência na atuação em mais de 10.000 (dez mil) processos ético-disciplinares ensina que a maior das fontes de problema do processo disciplinar da OAB - e não da fase de admissibilidade - é a notificação inicial do advogado para comparecer aos autos, realizada exatamente por correspondência com aviso de recebimento, modalidade determinada pelo artigo 137-D do Regulamento Geral da OAB: Art. 137-D A notificação inicial para a apresentação de defesa prévia ou manifestação em processo administrativo perante a OAB deverá ser feita através de correspondência, com aviso, enviada para o endereço profissional ou residencial constante do cadastro do Conselho Seccional. § 1º Incumbe ao advogado manter sempre atualizado o seu endereço residencial e profissional no cadastro do Conselho Seccional, presumindo-se recebida a correspondência enviada para o endereço nele constante. É exageradamente comum que o advogado se mude de endereço e não comunique tal fato rapidamente à OAB; também é muito comum que o advogado não utilize seu escritório com tanta frequência, por diversas razões, como, exemplo, porque resolveu trabalhar mais no sistema "home office" deixando o espaço físico para uso somente em reuniões; porque está realizando uma longa viagem; porque passou a exercer um cargo público que demanda todo o seu tempo etc. São infinitos os exemplos. Nesses casos, com muita frequência, a correspondência AR chega ao endereço cadastrado e é recebida pelo porteiro ou zelador, sendo assim válida, todavia, acaba não alcançando seu destinatário no tempo esperado, o que obriga a OAB a nomear um defensor dativo na forma do artigo 72, §4º da lei Federal 8.906/942, com todos os problemas inerentes, como uma defesa técnica mais carente, incremento dos custos para a OAB etc. Nesses casos, como o defensor dativo não tem acesso aos argumentos do advogado que podem fundamentar a defesa, é raro que sejam requeridas provas, dentre elas a sempre importante prova oral. Por consequência, a próxima intimação da parte será para a apresentação das alegações finais, último ato da fase de instrução após a juntada do parecer preliminar ou parecer da instrução previsto no artigo 59, §7º do CED3. Essa intimação, todavia, após a criação do Diário Eletrônico da OAB ou DEOAB pela Lei Federal 13.688/2018 e sua regulamentação pelo Conselho Federal4, é realizada por publicação em órgão oficial, conforme o artigo 137-D, §4º do Regulamento Geral: § 4º As demais notificações no curso do processo disciplinar serão feitas através de correspondência, na forma prevista no caput deste artigo, ou através de publicação na imprensa oficial do Estado ou da União, quando se tratar de processo em trâmite perante o Conselho Federal, devendo, as publicações, observar que o nome e o nome social do representado deverão ser substituídos pelas suas respectivas iniciais, indicando-se o nome completo do seu procurador ou os seus, na condição de advogado, quando postular em causa própria. E é exatamente nesse ponto onde se vê a mais valia da ferramenta eletrônica, pois publicada notificação em seu nome, o advogado vem aos autos tomar ciência do quanto é acusado. Invariavelmente, portanto, em sede de alegações finais, a primeira tese preliminar de defesa técnica é a invalidação de todo o processo por nulidade na intimação originária, o que trará aos autos uma infindável discussão jurídica sobre a matéria, que inclusive permitirá recurso ao Conselho Federal. Não se discute aqui a rígida - e correta - posição jurisprudencial do sistema OAB quanto à valoração do citado artigo 137-D, §1º do RG OAB, todavia, é inafastável se reconhecer que como hoje está disposto o Regulamento Geral, há prejuízo da qualidade do processo, que acaba se materializando exatamente nas mais diferentes teses de nulidade da comunicação do advogado, sem falar no trabalhoso, caro e lento processo logístico de utilização dos correios para envio da correspondência por aviso de recebimento, AR. Nos dias de hoje, o envio de correspondência pelo correio é algo atrasado, em desuso e o mais grave: tem menos eficácia que a via eletrônica. Esse problema é tão latente nos processos disciplinares que as Seccionais passaram a adotar estratégias para mitigá-lo. O TED da OAB/DF, por exemplo, percebeu que grande parte dos advogados notificados por AR entra em contato por e-mail com o Tribunal para requerer cópia integral dos autos meses antes da chegada do AR, que em alguns casos têm demorado até 90 (noventa) dias para seu retorno à OAB, quando isso acontece, pois muitas vezes o AR se perde no eficiente serviço dos correios. Observando esse fato o TED OAB/DF passou a responder essas solicitações com o envio da cópia completa e a informação ao advogado da juntada de seu pedido aos autos e abertura de seu prazo para defesa com a remessa da cópia, por aplicação analógica do artigo 239, §1º do Código de Processo Civil, que trata do comparecimento espontâneo da parte: Art. 239. Para a validade do processo é indispensável a citação do réu ou do executado, ressalvadas as hipóteses de indeferimento da petição inicial ou de improcedência liminar do pedido. § 1º O comparecimento espontâneo do réu ou do executado supre a falta ou a nulidade da citação, fluindo a partir desta data o prazo para apresentação de contestação ou de embargos à execução.  Uma outra estratégia também utilizada pelo TED da OAB/DF é o defensor dativo nomeado ligar para o advogado processado administrativamente para solicitar provas para a confecção de sua própria defesa. Em praticamente todos os casos em que se consegue falar com o advogado, sua opção é abdicar da defesa dativa e juntar a sua própria nos autos, também comparecendo espontaneamente. Nesse caso, não há se falar em não recepção da defesa extemporânea, exatamente porque estamos no processo disciplinar e porque, de qualquer forma, o prazo estava aberto para a defesa dativa. Vale lembrar que a lei 14.195/2021 alterou a redação do artigo 246 do CPC5 para tornar a citação eletrônica a preferencial no rito do processo civil brasileiro, sendo os correios apenas a modalidade supletiva na forma do §1º-A, inciso I do mesmo artigo6, ou seja, é chegada a hora da OAB também avançar sobre a matéria e aprimorar o sistema de comunicação ao advogado, que deveria ser exclusivamente via DEOAB. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) __________ 1 Art. 57. A representação deverá conter: I - a identificação do representante, com a sua qualificação civil e endereço; II - a narração dos fatos que a motivam, de forma que permita verificar a existência, em tese, de infração disciplinar; III - os documentos que eventualmente a instruam e a indicação de outras provas a ser produzidas, bem como, se for o caso, o rol de testemunhas, até o máximo de cinco; IV - a assinatura do representante ou a certificação de quem a tomou por termo, na impossibilidade de obtê-la. 2 § 4º Se o representado não for encontrado, ou for revel, o Presidente do Conselho ou da Subseção deve designar-lhe defensor dativo; 3 § 7º Concluída a instrução, o relator profere parecer preliminar, a ser submetido ao Tribunal de Ética e Disciplina, dando enquadramento legal aos fatos imputados ao representado. 4 Provimentos 182/2018 e 183/2018 do CFOAB. 5 Art. 246. A citação será feita preferencialmente por meio eletrônico, no prazo de até 2 (dois) dias úteis, contado da decisão que a determinar, por meio dos endereços eletrônicos indicados pelo citando no banco de dados do Poder Judiciário, conforme regulamento do Conselho Nacional de Justiça. 6 § 1º-A A ausência de confirmação, em até 3 (três) dias úteis, contados do recebimento da citação eletrônica, implicará a realização da citação: I - pelo correio.
Conforme já sustentado, em recente data a OAB editou a Súmula 12/2022 OEP1, que declara que a ausência do parecer preliminar do artigo 59, §7º do Código de Ética e Disciplina2 é fato gerador de nulidade no processo disciplinar (clique aqui para ler). Pois bem, é no parecer preliminar que o órgão julgador da OAB finalizará a instrução, oportunidade na qual deve ser realizado um apanhado de tudo o quanto foi objeto do processo disciplinar. É nesse arremate processual que são reunidos todos os argumentos e provas da parte representante, inclusive naqueles feitos onde a OAB atua de ofício, assim como também se reunirá a avaliará todo o material fático/probatório da parte representada, que se defende das imputações. Após esse parecer, o único ato processual relevante antes da designação de novo relator para o julgamento, conforme o artigo 60 do Código de Ética e Disciplina3, é a apresentação das alegações finais na forma do artigo 59, §8º do CED4, primeiro para a parte que acusa e por último pela defesa. Vale ponderar a importância dessa peça nos processos em geral, especialmente naqueles repressivos, exemplos do processo penal e o processo administrativo sancionatório, como é o caso dos afetos ao sistema disciplinar da OAB. É na peça de alegações finais que cabe ao réu do processo penal ou ao representado do processo disciplinar sintetizar tudo o que houver a seu favor no feito após o encerramento da fase de instrução, ou seja, calhe-se apontar os defeitos da representação; as teses de defesa; as provas apresentadas e suas últimas conclusões, de forma a condensar tudo o que interessa ao julgamento do feito nessa peça. As alegações finais são de tamanha importância ao processo penal, que antes das alterações impostas ao Código de Processo Penal lei 11.719/2008, praticamente não havia resposta à acusação, pois de forma contumaz as defesas limitavam-se a realizar petição de um parágrafo, que dizia que o réu ser reservaria à construção de suas teses de defesa "(...) após a instrução, na fase de razões finais". Acreditava-se ser uma boa estratégia processual não se adiantar teses defensivas ao Ministério Público ainda no início do processo, antes da instrução. Pois bem, diferente das razões expostas quando se tratou do parecer preliminar (clique aqui para ler), onde se relativizou a potencial nulidade tratada pela Súmula da OAB, a supressão da fase de alegações finais no processo disciplinar geralmente ocasionada pela não intimação para apresentação da peça, é fato gerador de nulidade absoluta, desafiando inclusive ato de ofício, por macular o direito à ampla defesa, haja vista ser cerceado àquele que se defende apresentar suas conclusões ao fim da instrução. É essa também a posição da jurisprudência: "(...) 1) Decisão monocrática de indeferimento liminar de recurso ao Conselho Federal da OAB, por ausência de seus pressupostos de admissibilidade (art. 75, caput, EAOAB). Decisão devidamente fundamentada. Matéria de ordem pública. Ausência de intimação para alegações finais. Nulidade absoluta. Anulação do processo. (...)" (Recurso n. 49.0000.2020.001442-2/SCA-PTU. EMENTA N. 063/2020/SCA-PTU. Relatora: Conselheira Federal Graciela Iurk Marins (PR)DEOAB, a. 2, n. 467, 3.11.2020, p. 13) "(...) Decisão definitiva e não unânime de Conselho Seccional da OAB. Falta de intimação do representado para apresentar alegações finais. Nulidade. Retorno dos autos para que seja intimado para apresentação de suas alegações finais. Recurso parcialmente provido (...)" (Recurso n. 49.0000.2019.006287-1/SCA-TTU. EMENTA N. 166/2019/SCA-TTU. Relator: Conselheiro Federal Luiz Tadeu Guardiero Azevedo (TO). DEOAB, a. 1, n. 244, 13.12.2019, p. 27) Vale ainda apontar que para ausência de apresentação das alegações finais não se aplica o entendimento hoje predominante no Conselho Federal da OAB sobre a necessidade de comprovação de prejuízo processual, conforme brilhante voto da Conselheira Federal Daniela Rodrigues Teixeira: "(...) 2) Alegação de inobservância do prazo mínimo de 15 (quinze) dias de antecedência do recebimento da notificação para as sessões de julgamento do Tribunal de Ética e Disciplina e do Conselho Seccional e da realização dos atos processuais. Matéria arguida somente perante esta instância, demonstrando ausência de prejuízo à defesa. No tema das nulidades no processo administrativo-disciplinar da OAB segue-se a ótica da legislação processual penal comum, adotada aos processos disciplinares de forma subsidiária (art. 68 do EAOAB), de modo que, sob esse enfoque, somente será declarado nulo ato processual do qual decorra prejuízo à acusação ou à defesa (art. 563 CPP), consagrando-se o princípio do prejuízo - pas de nullité sans grief (...)". (Recurso n. 49.0000.2019.008454-9/SCA-TTU. EMENTA N. 031/2020/SCA-TTU. Relatora: Conselheira Federal Daniela Rodrigues Teixeira (DF). DEOAB, a. 2, n. 401, 29.07.2020, p. 21). No caso ora em estudo, diferentemente, caso não haja apresentação da peça de defesa, o prejuízo processual é presumido e acarretará a nulidade total do processo. Assim, caso a parte representada, uma vez intimada, não apresente as alegações finais, ainda que por omissão de advogado de defesa eventualmente constituído, é de boa prudência (a) reabrir o prazo para o ato via de uma segunda publicação; ou (b) conclamar defensor dativo à realização da peça, que recomenda-se nesse caso não seja genérica ou de reafirmação dos termos da defesa prévia, mas, contrariamente, ainda que suscinta, analise tudo o quanto consta do processo, inclusive eventuais provas produzidas na fase de instrução. Essas medidas mitigarão eventual tese de nulidade. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) __________ 1 Súmula 12/2022 OEP OAB: A ausência do parecer preliminar previsto no art. 59, §7º, do Código de Ética e Disciplina da OAB, gera nulidade relativa, a ser reconhecida se comprovado o prejuízo causado; 2 § 7º Concluída a instrução, o relator profere parecer preliminar, a ser submetido ao Tribunal de Ética e Disciplina, dando enquadramento legal aos fatos imputados ao representado. 3 Art. 60. O Presidente do Tribunal de Ética e Disciplina, após o recebimento do processo, devidamente instruído, designa, por sorteio, relator para proferir voto; 4 § 8º Abre-se, em seguida, prazo comum de 15 (quinze) dias para apresentação de razões finais.
Uma das grandes dificuldades dos órgãos julgadores do sistema OAB, incluídos os Tribunais de Ética e Disciplina, é a fase da dosimetria da sanção disciplinar, que deve obedecer à redação dos artigos 36 a 40 da lei 8.906/94: Art. 36. A censura é aplicável nos casos de: I - infrações definidas nos incisos I a XVI e XXIX do art. 34; II - violação a preceito do Código de Ética e Disciplina; III - violação a preceito desta lei, quando para a infração não se tenha estabelecido sanção mais grave. Parágrafo único. A censura pode ser convertida em advertência, em ofício reservado, sem registro nos assentamentos do inscrito, quando presente circunstância atenuante. Art. 37. A suspensão é aplicável nos casos de: (Vide ADI 7020) I - infrações definidas nos incisos XVII a XXV do art. 34; II - reincidência em infração disciplinar. § 1º A suspensão acarreta ao infrator a interdição do exercício profissional, em todo o território nacional, pelo prazo de trinta dias a doze meses, de acordo com os critérios de individualização previstos neste capítulo. § 2º Nas hipóteses dos incisos XXI e XXIII do art. 34, a suspensão perdura até que satisfaça integralmente a dívida, inclusive com correção monetária. § 3º Na hipótese do inciso XXIV do art. 34, a suspensão perdura até que preste novas provas de habilitação. Art. 38. A exclusão é aplicável nos casos de: I - aplicação, por três vezes, de suspensão; II - infrações definidas nos incisos XXVI a XXVIII do art. 34. Parágrafo único. Para a aplicação da sanção disciplinar de exclusão, é necessária a manifestação favorável de dois terços dos membros do Conselho Seccional competente. Art. 39. A multa, variável entre o mínimo correspondente ao valor de uma anuidade e o máximo de seu décuplo, é aplicável cumulativamente com a censura ou suspensão, em havendo circunstâncias agravantes. Art. 40. Na aplicação das sanções disciplinares, são consideradas, para fins de atenuação, as seguintes circunstâncias, entre outras: I - falta cometida na defesa de prerrogativa profissional; II - ausência de punição disciplinar anterior; III - exercício assíduo e proficiente de mandato ou cargo em qualquer órgão da OAB; IV - prestação de relevantes serviços à advocacia ou à causa pública. Parágrafo único. Os antecedentes profissionais do inscrito, as atenuantes, o grau de culpa por ele revelada, as circunstâncias e as consequências da infração são considerados para o fim de decidir: a) sobre a conveniência da aplicação cumulativa da multa e de outra sanção disciplinar; b) sobre o tempo de suspensão e o valor da multa aplicáveis. Conforme inequívoca redação do artigo 37, inciso II, a reincidência é fato motivador para aplicação de sanção mais grave, ou seja, aquele advogado punido anteriormente com uma pena de censura, poderá ser punido com a suspensão caso venha a realizar nova conduta prevista no regramento disciplinar da OAB, incluído o Código de Ética e Disciplina. Para a configuração da reincidência, todavia, faz-se necessário não só que a condenação anteriormente imposta esteja abarcada pelo selo de imutabilidade da decisão condenatória, ou seja, pelo trânsito em julgado administrativo da decisão que impôs a sanção disciplinar, mas também que tal fenômeno processual tenha ocorrido antes do fato apurado no novo processo. Assim, por exemplo, advogado condenado à sanção disciplinar de censura por captação ilegal de clientela em 2020, cujo trânsito em julgado, após recurso ao Conselho Seccional, deu-se em 10/2022. Se em 09/2022 comete nova infração disciplinar, processo cuja instrução ultrapassa 10/2022, não poderá ser considerado reincidente para fins da dosimetria na nova condenação, exatamente porque à data da infração o fim do processo da punição ainda não havia chegado. Esse é entendimento pacífico perante o Conselho Federal da OAB: "Embargos de declaração. Artigo 138 do Regulamento Geral c/c artigos 619 e 620 do Código de Processo Penal c/c artigo 68 do Estatuto da Advocacia e da OAB. Reincidência. Inexistência. Entendimento de que somente se pode cogitar de agravamento da sanção disciplinar com fundamento na reincidência se houver condenação disciplinar anterior transitada em julgado na data em que ocorreram os fatos objeto de apuração do novo processo disciplinar, vale dizer, só se cogita de reincidência se à data em que o advogado pratica nova conduta antiética ou infracional já houve contra si condenação ético-disciplinar anterior, com o trânsito em julgado. Ausência de comprovação de que, na data da prática dos novos fatos tidos por infracionais, havia condenação disciplinar anterior transitada em julgado. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos parcialmente modificativos, para reduzir o prazo de suspensão ao mínimo legal de 60 (sessenta) dias, em razão da condenação por infração aos incisos I, IV e XX, do artigo 34 do Estatuto da Advocacia e da OAB" (Recurso n.º 49.0000.2016.005131-9/OEP - Embargos de Declaração. Ementa n. 102/2022/OEP. Relator: Conselheira Federal Milena da Gama Fernandes Canto (RN) (DEOAB, a. 4, n. 999, 13.12.2022, p. 5). Vale destacar que a mencionada redação do artigo 37, inciso II do EAOB torna possível a imposição da suspensão em detrimento de sanção mais branda, quando o advogado já possui condenação com o trânsito em julgado, exatamente pela reincidência. Assim, por exemplo, para uma infração disciplinar de censura, poderia ser suspenso. Ocorre que a sanção disciplinar de suspensão, conforme o artigo 37, §1º acima transcrito, tem o limite mínimo de 30 (trinta) dias, podendo alcançar até 12 (doze) meses, dosimetria que deverá ser realizada à luz do artigo 40, parágrafo único, alíneas "a" e "b", considerando a conveniência da aplicação cumulativa da multa e o tempo de suspensão somado do valor pecuniário imposto. Como se vê, há um longo espaço para o julgador atuar de forma discricionária na fixação do quantum da suspensão, devendo, todavia, fundamentar sua decisão, o que pode ocorrer exatamente com fundamento na reincidência. Do quanto exposto acima, portanto, vê-se que a reincidência administrativa poderá: (a) impor ao representado a fixação de sanção de suspensão quando prevista censura; (b) agravar o tempo da suspensão; e (c) justificar a imposição concomitante de multa. Pois bem, muito embora a reincidência possa influenciar em diversos momentos na dosimetria da pena, deverá ser aplicada apenas uma única vez, sob pena de verificar-se o bis in idem. Nesse sentido: "(...) Desacordo na dosimetria. Sanção disciplinar de censura. Reincidência. Agravamento para suspensão do exercício profissional e cominação de multa. Incidência de bis in idem. A infração disciplinar praticada, inicialmente, demandaria a imposição de censura, no entanto, foi agravada para suspensão de 30 dias, considerada a reincidência, e ainda cominada multa de uma anuidade. Assim, considerando que já houve a utilização da circunstância agravante para majorar a sanção, com a aplicação de multa, esta mesma circunstância não poderia ser utilizada para aplicar a suspensão, sob pena de incidir em bis in idem. Recurso parcialmente provido para aplicar a sanção de censura, mantendo a multa cominada". (Recurso n. 49.0000.2019.010368-9/SCA-STU. EMENTA N. 047/2020/SCA-STU. Relator: Conselheiro Federal Bruno Reis de Figueiredo (MG). DEOAB, a. 2, n. 420, 25.08.2020, p. 13). "(...) Reincidência. Prazo de suspensão do exercício profissional fixado acima do mínimo legal, utilizando-se a mesma circunstância agravante para cominação da multa, qual seja, a reincidência. Incidência de bis in idem. 1) Advogado que recebe valores para ajuizamento de ação, promove o protocolo, mas não realiza o pagamento das custas processuais, ocasionando o arquivamento da demanda judicial, sem restituir os valores a seu cliente e tampouco prestar as contas devidas, comete infração disciplinar. 2) A utilização da reincidência para majoração do prazo de suspensão do exercício profissional e para cominação de multa resulta bis in idem, conforme precedentes deste Conselho Federal. (...)" (RECURSO N. 49.0000.2017.006065-8/SCA-PTU. EMENTA N. 028/2018/SCA-PTU. Relator: Conselheiro Federal Alexandre Mantovani (MS). DOU, S.1, 21.03.2018, p. 77) Em conclusão, uma vez verificada a presença da reincidência e optando o Relator por sua aplicação na dosimetria, deverá escolher, e bem fundamentar, onde deverá influenciar no julgado. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui)  
  Pirataria na advocacia. A captação de clientela e o uso de agenciadores de causas, também conhecidos como puxadores, atravessadores, captadores, paqueiros ou coiotes. Infrações do artigo 34, incisos III e IV da lei 8.906/94 podendo, todavia, configurar infração mais grave prevista nos incisos XXV ou XXVII.  As infrações administrativas previstas nos incisos III1 e IV2 do artigo 34 da Lei 8.906/94 são das mais vis praticadas pelo advogado contra sua classe, ainda mais nos tempos atuais, onde o excesso de oferta de serviços jurídicos prejudica sobremaneira colegas que muitas vezes acabam por abandonar a profissão em face das dificuldades do início da carreira. Assim, já de início, entendemos ser possível a depender do fato o enquadramento da conduta nos incisos XXV ou XXVII do artigo 34 do EAOAB, configurando conduta incompatível com a advocacia ou até o decreto de inidoneidade, a sujeitar o infrator às sanções disciplinares de suspensão ou exclusão, tudo a depender da gravidade da conduta, o que à frente será melhor exposto.  Anota Paulo Lôbo sobre a infração do inciso III que "é uma infração frequente promovida de forma sutil, especialmente nas ações plúrimas, que danifica o prestígio da advocacia. O agenciador atua de modo organizado, cobrando participação nos honorários, amesquinhando o trabalho do profissional"3. Essa conduta já encontrava previsão legal no revogado artigo 103, inciso IV da lei 4.215/1963, o antigo EAOAB, hoje substituído pela lei 8.906/94, ou seja, não é de hoje a tentativa da OAB em proteger a boa advocacia contra práticas predatórias e aviltantes à carreira. Aqui, as condutas administrativas que causam a mácula disciplinar estão sempre voltadas ao próprio interesse e não à grandeza da profissão. São atos egoísticos, onde o advogado beneficiado pela prática cria estratégias - ou é nelas auxiliado ou alimentado - para cooptar causas para sua advocacia de uma forma artificial, comercial, mercantilizada, que não está ligada aos valores da profissão, que nunca deve ser exercida com o objetivo no lucro. No inciso III há terceiro que entrega novas causas ao advogado, sendo remunerado por isso. Essa violação é tão conhecida da boa advocacia que as Seccionais criaram apelidos pejorativos para esses angariadores. No Distrito Federal são chamados de puxadores; no Ceará e em Minas Gerais, de laçadores; São Paulo os nomeia paqueiros; Rondônia, Santa Catarina e Rio Grande do Norte, captadores; no Amapá são coiotes e em algumas Seccionais atravessadores. Sempre, a alimentar esse tipo de pessoa, há um advogado que age dolosa e maliciosamente contra (i) toda a classe, (ii) contra os preceitos éticos de regência da carreira, (iii) contra os elevados valores da profissão e (iv) contra o compromisso legal do artigo 20 do Regulamento Geral da OAB, que o advogado solenemente assume perante o Conselho da OAB quando da sua inscrição: "Prometo exercer a advocacia com dignidade e independência, observar a ética, os deveres e prerrogativas profissionais e defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado Democrático, os direitos humanos, a justiça social, a boa aplicação das leis, a rápida administração da justiça e o aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas". Analogamente, poderia se dizer que os paqueiros ou puxadores estão para os advogados infratores como os ladrões ou assaltantes estão para os receptadores. É uma relação promíscua e muito triste para a advocacia, pois são esses que alimentam aqueles, que nada teriam sem advogados capazes de tais práticas. Tal relação, de forma idêntica, é sempre lesiva também ao cliente, que uma vez sendo seduzido à contratação de profissional que se presta a tais atos, certamente não será bem atendido, como mereceria ser. A conduta do inciso IV se confunde bastante com a do III, pois aqui o advogado também realiza a captação de causas, podendo ser auxiliado por terceiro. Ambas têm a mesma sanção disciplinar de censura. A diferença prática é que no caso do inciso III o advogado tem na figura do agenciador uma espécie de sócio, que é remunerado mediante pecúnia para a captação. Esse pagamento, embora atrelado aos "honorários a receber", tem forma aberta, ou seja, pode ser pago em adiantado; por causa; em percentual futuro sobre o êxito da demanda, valor fixo por procuração assinada etc. Anota a doutrina: "Também se equipara à situação do inciso, aquele que recebe 'gratificações' ou valores fixos, por cada cliente que indicar, os vulgarmente chamados de 'paqueiros'"4. Já na hipótese do inciso IV, o advogado realiza a conduta ou terceiro a realiza, todavia, não há necessariamente participação em honorários ou pagamento em pecúnia, ou seja, não se faz necessária qualquer vantagem. Aparentemente, na construção legal que levou à redação final de ambos os incisos, o legislador optou pela separação por razões de organização da norma, para incremento de sua clareza e técnica legislativa, todavia, ambas as condutas estão intimamente ligadas. Importante destacar que o agenciador pode ser qualquer pessoa física ou jurídica, conforme já decidiu o CFOAB: "Conduta incompatível com a advocacia, locupletamento, prejuízo causado a interesse de cliente, angariação de causas e utilização de agenciador (empresa) de causas. Infrações disciplinares configuradas. (...) 3) O advogado, ao utilizar-se de empresa que tem por objeto a intermediação de compra e venda de precatórios, obteve dos credores procurações para intervir nos processos originários, já em fase de execução, hipótese em que o processo não havia sido extinto, mas ainda em trâmite, sendo certo que a constituição como advogado nos processos judiciais revela nítido exercício da profissão e, consequentemente, angariação das causas por meio de interposta pessoa, no caso, a empresa da qual o advogado também é sócio e que tem por finalidade abordar credores de precatórios para adquirir os créditos. (...) (RECURSO N. 49.0000.2016.005074-2/SCA-STU, EMENTA N. 098/2018/SCA-STU, Arnaldo de Aguiar Machado Junior, Relator.  DOU, S. 1, 29.06.2018, p. 175)." Outrossim, nada impede que seja advogado, situação na qual, provavelmente, ambos responderão pelos incisos III e IV do artigo 34 em comento, aplicando-se analogamente os institutos penais do concurso de agentes e de concurso crimes, material ou formal. Esse entendimento não se opõe às novas alterações do EAOAB promovidas pelas Lei 14.365/2022, que incentivam a realização de parcerias e associações entre advogados e entre sociedades, inclusive com destaque à tributação sobre percentuais cabíveis à cada parte. Ao advogado é perfeitamente possível que, diante de uma causa que lhe chegue às mãos, conclame um outro colega, especialista na demanda, para com ele celebrar uma parceria, amealhando com isso honorários. Aqui, não há se falar na mácula disciplinar, pois o advogado não está a agenciar causas àquele que fará a demanda. A sanção disciplinar para ambos os casos é a de censura, que não poderá ser objeto de publicidade pelo limitador do artigo 35, parágrafo único5 da lei. Também poderá ser convertida em advertência em ofício reservado, quando presente qualquer circunstância atenuante, conforme o artigo 36, parágrafo único. As circunstâncias atenuantes estão previstas no artigo 406 e são direito subjetivo do representado, ou seja, sempre que estiver presente circunstância que autorizar sua aplicação, o Tribunal deve aplicar. Vale ressaltar que a infração disciplinar prevista nos incisos III e IV estará presente somente quando não constituir outra, mais grave, como é o caso do inciso XXV, hipótese sujeita à sanção de suspensão para o caso de conduta incompatível com a advocacia. O Conselho Federal da OAB, inclusive, tem precedente nesse sentido: "Ementa 125/2002/SCA. Comete a infração contida no inciso III, IV e XXV, do art. 34, do EOAB, o advogado que se utiliza de agenciador de causas, dividindo com este, o resultado financeiro auferido, meio a meio, comprovado por demonstrativos contábeis assinados pelo advogado e o interveniente. O advogado que assim procede, mantém conduta incompatível com a advocacia. Mantida a decisão prolatada pela Seccional da OAB/São Paulo. (Recurso nº 0317/2002/SCA-SP. Relatora: Conselheira Ana Maria de Farias (RN), julgamento: 10.12.2002, por unanimidade, DJ 20.12.2002, p. 62, S1)". Para ilustrar, vale citar o seguinte caso hipotético, que é baseado em caso real julgado pelo Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/DF. Em uma Subseção do DF com 50.000 habitantes e 350 advogados inscritos, uma obra entregue pelo programa do governo federal "minha casa, minha vida" sofria com vários vícios construtivos. O empreendimento continha cerca de 700 unidades imobiliárias, ou seja, 700 ações indenizatórias contra a construtora e conta a União, responsável pelo programa, cada uma delas com valor da causa aproximado de R$ 30.000,00 e, portanto, com honorários contratuais e de êxito na casa dos R$ 9.000,00. Ciente desse fato, determinado advogado alugou uma "equipe de vendas", colocou um carro de som na porta do condomínio e passou a anunciar que os moradores das unidades poderiam receber aqueles R$ 30.000,00 sem nada pagar, "de graça". Simultaneamente, a "equipe de vendas" corria de porta em porta, colhendo procurações e contratos dos moradores maravilhados com aquela oferta "de graça". O profissional angariou aproximadamente 600 causas em um ou dois dias desse movimento, com um potencial de honorários de R$ 5.400.000,00, subtraindo de seus 350 colegas que adotam boas práticas toda essa carteira de clientes e processos. Nesse caso, à toda evidência, não se está somente diante da conduta dos incisos III e IV, mas de algo gravíssimo, que lesou gravemente e de forma irreversível centenas de advogados e suas famílias, podendo assim configurar conduta incompatível com a advocacia, ou até mesmo a declaração de inidoneidade do infrator. São inúmeros os exemplos, como advogados que constituem empesas de fachada para captar clientes lesados por companhias aéreas, por fabricantes de automóveis e outros. Outro grupo de infratores conhecidos são aqueles que fiscalizam ações coletivas de Sindicatos e, no momento da propositura dos cumprimentos de sentença, passam a assediar os sindicalizados beneficiados com a oferta de seus serviços por honorários baixíssimos, de forma a subtrair tal clientela dos advogados que propuseram a ação ou de outros, que por escolha do beneficiado pudessem vir a ser procurados. Todas essas condutas, que muitas vezes subtraem do mercado milhares de causas que serviriam a milhares de advogados, constituem um ataque contra toda a advocacia e merecem punição exemplar, pois condutas que extrapolam os limites dos incisos III e IV. Em conclusão, quando a situação concreta revela manobras sutis de captação de clientela, as condutas administrativas estarão previstas nos incisos acima, todavia, quando os fatos tiverem gravidade apta a lesar gravemente a advocacia, caracterizando verdadeira ação predatória, estaremos diante da pirataria na advocacia, conduta punível com sanções mais graves, de suspensão ou exclusão dos quadros da OAB. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui)   __________ 1 Art. 34. Constitui infração disciplinar: (...) III - valer-se de agenciador de causas, mediante participação nos honorários a receber; 2 Art. 34. Constitui infração disciplinar: (...) IV - angariar ou captar causas, com ou sem a intervenção de terceiros; 3 LÔBO, Paulo. Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB. 10ª ed, São Paulo: Saraiva, 2017. p. 182; 4 GONZAGA, Álvaro de Azevedo. Estatuto da Advocacia e Código de Ética e Disciplina da OAB Comentados. Álvaro de Azevedo Gonzaga, Karina Penna Neves e Roberto Beijato Júnior. 5ª ed. Rio de Janeiro: Forense, São Paulo: Método, 2019. p. 182; 5 Art. 35. As sanções disciplinares consistem em: I - censura; II - suspensão; III - exclusão; IV - multa. Parágrafo único. As sanções devem constar dos assentamentos do inscrito, após o trânsito em julgado da decisão, não podendo ser objeto de publicidade a de censura. 6 Art. 40. Na aplicação das sanções disciplinares, são consideradas, para fins de atenuação, as seguintes circunstâncias, entre outras: I - falta cometida na defesa de prerrogativa profissional; II - ausência de punição disciplinar anterior; III - exercício assíduo e proficiente de mandato ou cargo em qualquer órgão da OAB; IV - prestação de relevantes serviços à advocacia ou à causa pública. Parágrafo único. Os antecedentes profissionais do inscrito, as atenuantes, o grau de culpa por ele revelada, as circunstâncias e as consequências da infração são considerados para o fim de decidir: a) sobre a conveniência da aplicação cumulativa da multa e de outra sanção disciplinar; b) sobre o tempo de suspensão e o valor da multa aplicáveis.
O Código de Processo Civil de 2015 inaugurou em sentido estrito o princípio da não surpresa no direito brasileiro. Por certo, com aplicação mais genérica, essa ideia já existia em outras legislações, como previa, por exemplo, o artigo 308 do antigo Código Adjetivo1, lei 5.869/1973. Na nova regra, todavia, o instituto ganhou destaque na redação do artigo 10: Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício. Não há dúvida que a não surpresa expressa no artigo em comento concedeu nova dimensão ao contraditório, conforme fez constar o Ministro Luis Felipe Salomão em seu voto no julgamento do Recurso Especial n.º 1.755.266, ao afirmar que o direito de se manifestar tornou possível a real influência da parte em todo o processo, afetando assim seu resultado. Pois bem, o Conselho Federal da OAB, via da resolução n.º 02/2019 de 21/08/2019, promoveu alteração no Regulamento Geral para também inserir o princípio da não surpresa de forma expressa do sistema OAB: Art. 144-B. Não se pode decidir, em grau algum de julgamento, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar anteriormente, ainda que se trate de matéria sobre a qual se deva decidir de ofício, salvo quanto às medidas de urgência previstas no Estatuto. Essa alteração na norma legal, em verdade, veio apenas ratificar o quanto já se difundia na jurisprudência administrativa, por aplicação analógica do CPC, conforme precedentes do CFOAB: "(...) Condenação em primeira instância por locupletamento e recusa à prestação de contas (art. 34, XX e XXI, do EAOAB). Absolvição em segunda instância, face ao pagamento dos valores devidos ao cliente e à prestação de contas no curso do processo. Condenação, contudo, pela infração disciplinar de manter conduta incompatível com a advocacia (art. 34, XXV, EAOAB), pelo fato de os advogados responderem a outros processos disciplinares. Condutas essas que não foram objeto de delimitação pelo despacho de admissibilidade da representação nem submetidas ao contraditório durante a instrução processual. Tipificação que somente surgiu com o parecer preliminar, quando não mais era possível aos advogados exercerem o contraditório. Violação do princípio da correlação entre a acusação e a sentença, ou princípio da não surpresa. Tipificação sobre a qual aos advogados não foi dada oportunidade de exercer o contraditório e a ampla defesa. Vedação. Precedentes deste Conselho Federal da OAB. Hipótese em que, surgindo nova capitulação, deve ser reaberta a instrução para que o acusado possa exercer o contraditório sobre a nova capitulação surgida no curso do processo disciplinar. Adoção do princípio favor rei, para julgar improcedente a representação. Recurso provido, para julgar improcedente a representação (RECURSO N. 49.0000.2017.002344-6/SCA-TTU. EMENTA N. 070/2018/SCA-TTU. Relator: Conselheiro Federal Nelson Ribeiro de Magalhães e Souza (PA). DOU, S.1, 24.05.2018, p. 140)". Como se vê no trecho em negrito acima, o acórdão em referência trata da necessária correlação entre a acusação e a sentença, ou, no processo disciplinar, entre eventual capitulação legal do despacho da admissibilidade ou do parecer da instrução com a condenação. Aqueles devem fornecer à parte a capitulação pela qual está sendo processada, de forma a permitir um contraditório mais apurado e uma condenação previsível. Por óbvio, referido entendimento também implica no enfrentamento de outros princípios como a independência, a autonomia, a livre apreciação das provas e a livre convicção, todos profundamente atrelados à atividade judicante, temas que tratados superficialmente (clique aqui para ler). Ora, não pode o julgador final do processo, aquele que detém o poder de julgar, acabar atrelado ao quanto se estabeleceu por atores do processo disciplinar que servem para o auxiliar em seu julgamento, razão pela qual essa vinculação obrigacional não é absoluta. Determina o artigo 59, §7º2 do Código de Ética e Disciplina que o Relator emita o parecer da instrução onde deve realizar o "enquadramento legal aos fatos imputados ao representado", ou seja, deverá indicar no parecer quais dispositivos repressivos entende violados pela conduta do representado, sejam do Código de Ética e Disciplina ou aqueles previstos nos 29 (vinte e nove) incisos do artigo 34 da lei Federal 8.906/94. A partir desse parecer, será o representando convocado à apresentação de suas alegações finais. Por certo, pode ser que no despacho de admissibilidade tenha a Comissão de Admissibilidade fornecido capitulação legal diferente daquela do parecer da instrução, o que poderia importar, em favor da defesa, no argumento de lesão ao direito resistivo, pois a apresentação da defesa prévia e toda a instrução teriam sido construídas com fundamento na capitulação originária, havendo, portanto, prejuízo em novo enquadramento apenas na manifestação que antecede as alegações finais. De início, já cumpre apontar que o despacho de admissibilidade não deve conter capitulação legal, pois, como visto, isso engessará o desenvolvimento do processo. Ainda nessa fase embrionária, sem um contraditório pleno, deve prevalecer a ideia de que a parte se defende dos fatos narrados na representação ética a ele imputados e não do enquadramento legal, conforme a regra do artigo 383 do Código de Processo Penal.3 Nada obstante, dificilmente alteração posterior na capitulação da admissibilidade será fato gerador de nulidade, pois com toda instrução pela frente, assim como as alegações finais, raramente haverá prejuízo. De todo modo, se a defesa entender presente prejuízo em capitulação diferente no parecer da instrução, deverá requerer na primeira oportunidade a reabertura de prazo para defesa sobre as alterações, sob pena de preclusão. Do mesmo modo, se no julgamento o Relator entender por capitulação diferente daquela fornecida do despacho de admissibilidade e no parecer da instrução, deve abrir vistas ao Representado para que se manifeste sobre a potencial nova capitulação legal, exatamente em respeito ao princípio da não surpresa, conforme tratado anteriormente (clique aqui para ler), todavia, como dito, eventual mácula nessa ordem de eventos processuais não importa em nulidade absoluta, devendo haver prova concreto de prejuízo processual à parte. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) __________ 1 Art. 398. Sempre que uma das partes requerer a juntada de documento aos autos, o juiz ouvirá, a seu respeito, a outra, no prazo de 5 (cinco) dias. 2 § 7º Concluída a instrução, o relator profere parecer preliminar, a ser submetido ao Tribunal de Ética e Disciplina, dando enquadramento legal aos fatos imputados ao representado 3 Art. 383.  O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave.  
A lei Federal 8.906/94 estabelece entre os artigos 35 e 42 o regime de punições disciplinares do sistema OAB: Art. 35. As sanções disciplinares consistem em: I - censura; II - suspensão; III - exclusão; IV - multa. Parágrafo único. As sanções devem constar dos assentamentos do inscrito, após o trânsito em julgado da decisão, não podendo ser objeto de publicidade a de censura. Art. 36. A censura é aplicável nos casos de: I - infrações definidas nos incisos I a XVI e XXIX do art. 34; II - violação a preceito do Código de Ética e Disciplina; III - violação a preceito desta lei, quando para a infração não se tenha estabelecido sanção mais grave. Parágrafo único. A censura pode ser convertida em advertência, em ofício reservado, sem registro nos assentamentos do inscrito, quando presente circunstância atenuante. Art. 37. A suspensão é aplicável nos casos de: I - infrações definidas nos incisos XVII a XXV do art. 34; II - reincidência em infração disciplinar. § 1º A suspensão acarreta ao infrator a interdição do exercício profissional, em todo o território nacional, pelo prazo de trinta dias a doze meses, de acordo com os critérios de individualização previstos neste capítulo. § 2º Nas hipóteses dos incisos XXI e XXIII do art. 34, a suspensão perdura até que satisfaça integralmente a dívida, inclusive com correção monetária. § 3º Na hipótese do inciso XXIV do art. 34, a suspensão perdura até que preste novas provas de habilitação. Art. 38. A exclusão é aplicável nos casos de: I - aplicação, por três vezes, de suspensão; II - infrações definidas nos incisos XXVI a XXVIII do art. 34. Parágrafo único. Para a aplicação da sanção disciplinar de exclusão, é necessária a manifestação favorável de dois terços dos membros do Conselho Seccional competente. Art. 39. A multa, variável entre o mínimo correspondente ao valor de uma anuidade e o máximo de seu décuplo, é aplicável cumulativamente com a censura ou suspensão, em havendo circunstâncias agravantes. Art. 40. Na aplicação das sanções disciplinares, são consideradas, para fins de atenuação, as seguintes circunstâncias, entre outras: I - falta cometida na defesa de prerrogativa profissional; II - ausência de punição disciplinar anterior; III - exercício assíduo e proficiente de mandato ou cargo em qualquer órgão da OAB; IV - prestação de relevantes serviços à advocacia ou à causa pública. Parágrafo único. Os antecedentes profissionais do inscrito, as atenuantes, o grau de culpa por ele revelada, as circunstâncias e as consequências da infração são considerados para o fim de decidir: a) sobre a conveniência da aplicação cumulativa da multa e de outra sanção disciplinar; b) sobre o tempo de suspensão e o valor da multa aplicáveis. Art. 41. É permitido ao que tenha sofrido qualquer sanção disciplinar requerer, um ano após seu cumprimento, a reabilitação, em face de provas efetivas de bom comportamento. Parágrafo único. Quando a sanção disciplinar resultar da prática de crime, o pedido de reabilitação depende também da correspondente reabilitação criminal. Art. 42. Fica impedido de exercer o mandato o profissional a quem forem aplicadas as sanções disciplinares de suspensão ou exclusão. As sanções disciplinares são a de censura, que pode ser convertida em advertência em ofício reservado; de suspensão; exclusão e multa. Essa última é objeto do quanto segue. A sanção de multa está prevista no artigo 39 e será aplicável cumulativamente à censura e à suspensão, ou seja, não pode ser aplicada sozinha e será sempre acessória. Seu valor irá variar entre uma anuidade e seu décuplo, não podendo a fixação ser menor ou maior do que referidas quantias, conforme expressos limites do artigo 39. É condição para sua incidência a presença de circunstâncias agravantes ao tipo administrativo, portanto, não basta que a conduta do infrator encontre tipicidade nas infrações que tenham como punição a censura ou suspensão e o julgador realize análise absolutamente subjetiva da conduta para avaliar a conveniência da multa. Exige-se análise dos antecedentes profissionais do inscrito, de eventuais atenuantes, do grau de culpa da ação, das circunstâncias e das consequências da infração, conforme estabelece o parágrafo único do artigo 40 supratranscrito. Anota a doutrina: "As circunstâncias agravantes são aquelas que necessariamente potencializam os efeitos da infração cometida, não só quanto à violação em si, mas quanto ao dano à ética profissional e à dignidade da advocacia em geral. O Estatuto refere-se a dois tipos, não excludentes de outros: a reincidência em infração disciplinar e a gravidade da culpa. Mas, se a tipicidade legal das circunstâncias agravantes é aberta, suas consequências encerram-se em numerus clausus. Ou seja, quando comprovada a circunstância agravante, as consequências apenas serão: I - aplicação da sanção imediatamente mais grave, sendo que para a exclusão exige-se dupla reincidência; II - aplicação cumulativa de multa com outra sanção; III - gradação do valor da multa, dentro dos limites legais; IV - gradação do tempo de suspensão, nesse caso variando do tempo médio ao máximo"1. Para além da análise do caso concreto, a presença das agravantes também se fará pelas provas juntadas aos autos relativas à ficha pregressa do advogado nos registros da OAB, conforme determina o artigo 58, §2º do Código de Ética e Disciplina2. Com tais documentos, é possível ao Julgador adicionar à formação de sua convicção elementos objetivos sobre o comportamento anterior do infrator, auxiliando-o na análise, por exemplo, dos antecedentes, do grau de culpa na infração julgada, nas suas circunstâncias etc. Não é necessária a cumulação das circunstâncias agravantes, bastando apenas a presença de uma para a aplicação da multa, o que, todavia, irá influenciar diretamente no quantum pecuniário a ser fixado, conforme previsão do artigo 40, parágrafo único, alínea "b". Na análise das circunstâncias agravantes deverá o julgador fundamentar sua presença, assim como justificar a necessidade de aplicação e o quantum da multa, sob pena da sanção acessória ser posteriormente glosada da condenação em caso de recurso. Nesse sentido é a posição da jurisprudência: "(...) 4. A aplicação do artigo 39 para embasar a cumulação de multa com as penas de censura ou suspensão depende de abordagem objetiva da decisão no que tange às circunstâncias agravantes. No caso, a afirmação da existência de agravantes foi genérica e, aparentemente, subjetiva, razão pela qual merece reforma o decisum nesse ponto. 5. Recurso provido em parte. (CFOAB, RECURSO n.º 49.0000.2014.008836-6/SCA-PTU. EMENTA n.º 156/2014/SCA-PTU. Wilson Sales Belchior, Relator. DOU, S.1, 17.11.2014, p. 92/93)". O tema é, inclusive, objeto de Súmula da OAB do Espírito Santo:  "2. SÚMULA Nº 002/TED-OAB/ES PLENO: CONCURSO DE INFRAÇÕES. EXASPERAÇÃO DE PENA. NECESSÁRIA FUNDAMENTAÇÃO. A exaspera­ção do tempo de suspensão acima do mínimo legal e a cumulação da mul­ta e do valor correspondente a esta última sanção devem ser devidamente fundamentados, sob pena de nulidade, sendo permitido ao julgador se va­ler da infração de menor gravidade para exasperar a de maior gravidade. Sessão do Plenário: 25.02.2019". Aliás, trata-se de entendimento pacífico de nossa jurisprudência a necessidade de fundamentação para imposição de qualquer incremento ao mínimo previsto para as sanções disciplinares de suspensão e multa, conforme o aresto que segue:"(...) 2) Quanto à dosimetria, o art. 40, parágrafo único, da Lei nº 8.906/94, estabelece que os antecedentes profissionais do inscrito, as atenuantes, o grau de culpa por ele revelada, as circunstâncias e as consequências da infração serão consideradas para o fim de decidir sobre o tempo de suspensão. 3) Assim, a majoração do tempo de suspensão do exercício profissional, sem a devida fundamentação, impõe a reforma da decisão e a redução para o mínimo legal de 30 (trinta) dias. (...) (RECURSO N. 49.0000.2014.008835-8/SCA-TTU. EMENTA N. 139/2014/SCA-TTU.  Cícero Borges Bordalo Júnior, Relator. DOU, S.1, 17.11.2014, p. 96/97)" Não é necessário, todavia, que a fundamentação seja exauriente, longa, doutrinária e venha a analisar todos os pormenores do caso concreto, podendo ser simples e suscinta, desde que apta a evidenciar as razões do convencimento do julgador, ou seja, a decisão não pode padecer de falta de fundamentação, aplicando-se aqui, de forma supletiva, o quanto constou no HC 105349 AgR STF de Relatoria do Ministro Ayres Britto: "(...) 3. A falta de fundamentação não se confunde com fundamentação sucinta. Interpretação que se extrai do inciso IX do art. 93 da CF/88"3.  Vale ainda anotar que como as circunstâncias agravantes, na forma do artigo 40, parágrafo único, alínea "b", serão utilizadas tanto para a fixação do tempo de suspensão quanto para o valor da multa, sua dupla aplicação importa em bis in idem, e, portanto, em nulidade. Assim, presentes duas ou mais causas agravantes devem ser utilizadas separadamente, à conveniência e fundamentação do julgador, para majorar o tempo de suspensão, assim como para a fixação do quantum da multa. Presente apenas uma, deverá ser realizada escolha sobre sua incidência, se para a suspensão ou para a multa.   Por último, pode haver situações em que vão se verificar a presença de circunstâncias agravantes e atenuantes, como seria, por exemplo, o caso de infrator reincidente que já tenha prestado relevantes serviços à advocacia. Nesse caso, corretamente, posiciona-se a jurisprudência no sentido de que ambas devem ser consideradas. Na decisão abaixo o CFOAB enfrenta os dois temas acima tratados, ou seja, tanto o bis in idem na dupla consideração de causa agravante quanto a necessidade de valoração das agravantes e das atenuantes, em situações em que ambas estiverem presentes: "(...) Presença de circunstâncias atenuantes e agravantes. Necessidade de valoração de ambas. Mérito. Reanálise de provas. Impossibilidade. 1) A infração disciplinar praticada, inicialmente, demandaria a imposição de suspensão de trinta dias, no entanto, foi agravada e ainda cominada a multa de uma anuidade, face ao grau de culpa. Assim, considerando que já houve a utilização da reincidência para majorar a sanção, com a aplicação de multa, esta também não poderia ser utilizada para aplicar a suspensão acima do mínimo legal, sob pena de incidir em bis in idem. 2) A existência de atenuantes não pode ser desconsiderada pelo julgador, ainda mais como sendo causa legal de redução de punição. Demonstrada a presença da atenuante a que alude o art. 40, inciso IV, da lei 8.906/94, é de rigor a sua valoração na dosimetria da sanção imposta. Precedentes. 3) A via extraordinária do recurso ao Conselho Federal não admite o reexame de fatos e provas. Precedentes do Conselho Federal 4) Recurso parcialmente provido para reduzir a sanção de suspensão ao mínimo legal, e excluir a multa cominada. (RECURSO N. 49.0000.2017.012173-1/SCA-STU, EMENTA N. 096/2018/SCA-STU, João Paulo Tavares Bastos Gama, Relator. DOU, S.1, 24.05.2018, p. 139)." Em conclusão, a multa é importante ferramenta correcional do sistema OAB e deve ser utilizada sempre que presentes as circunstâncias que a autorizarem, entretanto, sua aplicação depende da boa aplicação do direito, com a observação dos requisitos legais da lei 8.906/94. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui)   __________ 1 LÔBO, Paulo. Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB. 10ª ed, São Paulo: Saraiva, 2017. p. 206; 2 § 2º Antes do encaminhamento dos autos ao relator, serão juntadas a ficha cadastral do representado e certidão negativa ou positiva sobre a existência de punições anteriores, com menção das faltas atribuídas. Será providenciada, ainda, certidão sobre a existência ou não de representações em andamento, a qual, se positiva, será acompanhada da informação sobre as faltas imputadas. 3 HC 105349 AgR, Relator(a): AYRES BRITTO, Segunda Turma, julgado em 23/11/2010, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-032 DIVULG 16-02-2011 PUBLIC 17-02-2011.
É antigo o pleito da advocacia quanto à posição topográfica dos atores do processo nas audiências, visto que, em regra, o Magistrado e o Membro do Ministério Público sempre estiveram acima das partes e dos advogados, esse à direita daquele, revelando, simbolicamente, uma maior hierarquia frente à advocacia, o que contrariava diretamente o quanto disposto no caput do artigo 6º da Lei 8.906/941. No dia 28/12/2022 foi publicada a Lei n.º 14.508/2022, com o seguinte teor: Art. 1º  Esta Lei altera o art. 6º da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994, que "Dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)", para estabelecer normas sobre a posição topográfica dos advogados durante as audiências de instrução e julgamento realizadas no Poder Judiciário. Art. 2º O art. 6º da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994, passa a vigorar acrescido do seguinte § 2º, numerando-se o atual parágrafo único como § 1º: "Art.6º §1º § 2º Durante as audiências de instrução e julgamento realizadas no Poder Judiciário, nos procedimentos de jurisdição contenciosa ou voluntária, os advogados do autor e do requerido devem permanecer no mesmo plano topográfico e em posição equidistante em relação ao magistrado que as presidir." (NR) Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.  Como se vê, o parágrafo único foi substituído pelo §1º, sem alteração de sua redação2;  e foi inserido o §2º, que determina alteração na posição dos Magistrados em audiência, que agora devem permanecer no mesmo plano topográfico dos advogados e esses na mesma distância em relação ao Juiz. Na prática, já se respeitava a equidistância em ações não penais, pois os advogados das partes se sentavam na mesma distância em relação ao Juiz, todavia, a alteração do local de assento do Magistrado, de um plano superior para a mesma altura, é de absoluta relevância. O simbolismo que tais alterações irão representar é importantíssimo ao bom e regular desenvolvimento da aplicação do direito, haja vista que vêm a ratificar o quanto já era disposto na Lei Federal, cuja redação do artigo 6º caput data do texto legislativo original, ou seja, de 1994. Foram 28 (vinte e oito) anos até a almejada reforma. A nova redação do EAOAB deve também influenciar na posição em audiência do membro do Ministério Público, que tem como prerrogativa, à luz do quanto determina o inciso XI do artigo 41 da Lei Orgânica do MP3 e o artigo 18, inciso I, alínea "a" da Lei Complementar n.º 75/19934, assento do lado direito do Juiz.  O Conselho Federal da OAB discutiu a constitucionalidade de referido dispositivo perante o STF na ADI n.º 4.768, pois ao estabelecer que o lugar do Membro do Parquet é sempre "à direita" dos Magistrados, ao menos no processo penal, não só garante que a acusação tenha assento mais próximo, mas também que se sente no mesmo plano topográfico, violando, assim, a paridade de armas que é corolário dos princípios da isonomia, da igualdade, do devido processo legal e do contraditório e ampla defesa, todos encampados no artigo 5º do texto constitucional, pois entender-se-ia nesse caso o MP como parte do processo. Os pedidos da ADI foram jugados improcedentes, ratificando-se, portanto, a constitucionalidade da prerrogativa ministerial, ainda que com votos divergentes dos Ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes, que entenderam, com as peculiaridades de seus votos, que no processo penal o Ministério Público se distancia do papel de fiscal da Lei, para assumir caraterística de parte acusatória do processo, até porque indiscutivelmente abandona a parcialidade. Com a nova redação legal, todavia, resolve-se em parte a questão, pois estando o Magistrado no mesmo plano topográfico que o advogado, obviamente isso implicará também na descida do Membro do Ministério Público para o mesmo plano físico de atuação da defesa. Nada obstante, quanto à ideia de que o Ministério Público seria parte no processo penal, e, portanto, sua situação estaria abarcada - por analogia - no trecho legal que declara que as partes devem ficar em posição equidistante em relação ao magistrado, obrigando assim o Parquet a tomar assento na mesma distância do Juiz que a parte ré, não deve prosperar. Foi essa exata discussão um dos temas nucleares da mencionada ADI, prevalecendo a ideia de que ainda que no papel acusatório o MP tem função de Estado, daí a prerrogativa. Esse entendimento, respeitosamente, é equivocado, tendo mais acerto a antiga e clássica posição de Carnelutti: "De fato os juristas dizem que o juiz é supraparte: por isso ele está no alto e o acusado embaixo, sob ele; um na jaula, o outro sobre a cátedra. Semelhantemente o defensor está embaixo, em cotejo com o juiz; ao invés, o ministério público, ele está ao lado. Isto constitui um erro, que com uma maior compreensão em tomo da mecânica do processo terminará por se corrigir. Entretanto, também ele, o juiz, é um homem e, se é um homem, é também uma parte. Esta, de ser ao mesmo tempo parte e não parte, é a contradição, na qual o conceito do juiz se agita"5. Assim, em conclusão, a alteração legal no EAOAB, Lei 8.906/94, é importantíssima para a advocacia e para o direito de defesa, pois vem ratificar a mais valia da redação do artigo 6º da norma, no sentido de diminuir o abismo legal existente - de forma empírica - entre o Estado/Juiz e aquele que se defende. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui)   ___________ 1 Art. 6º Não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos. 2 Parágrafo único. As autoridades e os servidores públicos dos Poderes da República, os serventuários da Justiça e os membros do Ministério Público devem dispensar ao advogado, no exercício da profissão, tratamento compatível com a dignidade da advocacia e condições adequadas a seu desempenho, preservando e resguardando, de ofício, a imagem, a reputação e a integridade do advogado nos termos desta Lei. 3 Art. 41. Constituem prerrogativas dos membros do Ministério Público, no exercício de sua função, além de outras previstas na Lei Orgânica: XI - tomar assento à direita dos Juízes de primeira instância ou do Presidente do Tribunal, Câmara ou Turma. 4 Art. 18. São prerrogativas dos membros do Ministério Público da União: I - institucionais: a) sentar-se no mesmo plano e imediatamente à direita dos juízes singulares ou presidentes dos órgãos judiciários perante os quais oficiem; 5 CARNELUTTI, Francesco. As misérias do Processo Penal, tradução José Antonio Cardinalli. 2015, ed. São Paulo, Servanda. p. 26
O Órgão Especial do Conselho Pleno do Conselho Federal da OAB entendeu por bem editar a Súmula 12/2022 OEP, com a seguinte redação: "A ausência do parecer preliminar previsto no art. 59, §7º, do Código de Ética e Disciplina da OAB, gera nulidade relativa, a ser reconhecida se comprovado o prejuízo causado". O §7º resta assim redigido: "§ 7º Concluída a instrução, o relator profere parecer preliminar, a ser submetido ao Tribunal de Ética e Disciplina, dando enquadramento legal aos fatos imputados ao representado". Pois bem, no sistema OAB o §7º é representativo do parecer da instrução, ou seja, após a realização da instrução do processo ético-disciplinar, com a juntada da manifestação das partes, oitivas de eventuais testemunhas e documentos, caberá ao relator da instrução a elaboração desse parecer. Somente após a juntada dessa peça as partes irão apresentar suas alegações finais e o processo avançará à fase de julgamento, onde será designado novo relator, na forma do quanto prescreve o artigo 60 e seu §1º1 do Código de Ética e Disciplina. Desta forma, a partir da edição da Súmula - que não tem caráter vinculante - se reconhece a potencial nulidade na fase do parecer de instrução, que poderá tomar palco diante de duas circunstâncias: (i) não apresentação do parecer nos autos do processo ou (ii) sua produção com vício de forma, ambas condicionadas à demonstração de prejuízo à defesa. A primeira situação prescinde de maior análise, todavia, a segunda merece atenção. Segundo o §7º é requisito legal do parecer da instrução que o relator realize o "enquadramento legal aos fatos imputados ao representado", ou, em outras palavras, deverá o relator da instrução indicar no parecer quais dispositivos repressivos entende violados pela conduta do representado, sejam do Código de Ética e Disciplina ou dentre aqueles previstos nos 29 (vinte e nove) incisos do artigo 34 da Lei Federal n.º 8.906/94. Referida imposição processual, de fato, concede ao representado maior clareza para se defender, pois poderá apresentar sua peça de alegações finais baseada exclusivamente nas conclusões do parecer. Nada obstante, em uma apressada análise, pode o exegeta entender que a regra jurisprudencial se coloca no sentido contrário da direção de importantes pressupostos processuais que são basilares da estrutura do processo punitivo no ordenamento jurídico pátrio. O primeiro deles é a ideia de que o réu, ou, in casu, o representado, se defende dos fatos narrados na representação ética a ele imputados e não do enquadramento legal, conforme a regra do artigo 383 do Código de Processo Penal2. Em outro norte, entender que o julgador do processo deverá estar vinculado às conclusões do relator da instrução, também viola a própria essência da atividade judicante, que deve sempre estar galgada na autonomia, na independência e livre convicção, conforme, aliás, preceitua o artigo 155 do Código de Processo Penal3. Embora sejam importantes esses apontamentos, a lógica hermenêutica faz exsurgir, contrariamente, a harmonia entre a nova regra jurisprudencial e as prerrogativas da atividade judicante, haja vista condicionar que eventual nulidade dependerá da prova de prejuízo. Assim, embora o representado possa contar com a possibilidade do julgador acabar limitando sua cognição quanto ao enquadramento legal apontado pelo relator da instrução, nunca deve deixar de considerar os institutos do processo penal acima expostos, todos aplicáveis ao processo disciplinar em face do quanto prescreve o artigo 68 da Lei Federal 8.906/94. Desta forma e em síntese, embora o relator da instrução deva direcionar o representado ao potencial enquadramento legal, que deve, na medida do possível, ser seguido pelo julgador, esse pode, ao cabo e ao fim, dar enquadramento legal diverso, com fundamento nos princípios regentes de sua atividade, assim como na regra adjetiva do artigo 383 do Código de Processo Penal. Vale lembrar ainda que a OAB inseriu em seu micro ordenamento jurídico o princípio da não surpresa, que passou a encampar a redação do artigo 144B4 do Regulamento Geral, determinando que deverá o julgador conceder à parte a oportunidade para se manifestar sobre assunto inédito no processo, como seria, por exemplo, um novo enquadramento legal ao fato. Em conclusão, a regra jurisprudencial aparentemente é um referencial, todavia, não torna nulo o processo em caso do julgador não obedecer ao enquadramento legal dado pelo relator da instrução, desde que não haja prejuízo à parte. Ainda nesse sentido, caso o julgador, em sua análise, possa entender por novo enquadramento legal, é recomendável que abra vista à parte representada, afastando assim a surpresa que se deseja evitar com o artigo do artigo 144B do Regulamento Geral.  *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) __________ 1 Art. 60. O Presidente do Tribunal de Ética e Disciplina, após o recebimento do processo, devidamente instruído, designa, por sorteio, relator para proferir voto. § 1º Se o processo já estiver tramitando perante o Tribunal de Ética e Disciplina ou perante o Conselho competente, o relator não será o mesmo designado na fase de instrução. 2 Art. 383.  O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em consequência, tenha de aplicar pena mais grave.      3 Art. 155.  O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.  4 Art. 144B. Não se pode decidir, em grau algum de julgamento, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar anteriormente, ainda que se trate de matéria sobre a qual se deva decidir de ofício, salvo quanto às medidas de urgência previstas no Estatuto.
Nas partes 1 (clique aqui para ler) e 2 (clique aqui para ler ) desse estudo foram trabalhados conceitos gerais sobre a suspensão preventiva, assim como os requisitos objetivos (competência, correta intimação, contraditório, ampla defesa e prazo legal) e subjetivos (tipicidade administrativa, lesividade, publicidade negativa livre e contemporaneidade). Nesse capítulo a análise será sobre o procedimento. O procedimento de suspensão preventiva, por tratar-se de medida cautelar excepcional, tem seu regramento próprio, regulado pelo §3º do artigo 70 da Lei Federal 8.906/94 em conjunto com o microssistema legal da OAB. Exatamente como ocorre com qualquer processo disciplinar no sistema OAB, a Seccional irá tomar ciência de determinado evento ocorrido no mundo dos fatos, o que pode ocorrer por qualquer meio, valendo citar, sem exaurimento, os meios de comunicação, as redes sociais, denúncia de terceiro, denúncia de advogado, entre outros. Pois bem, recebida a comunicação ou ciente do fato, caberá ao Presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da Seccional e somente a ele, na forma do artigo 70, §3º da Lei Federal n.º 8.906/94 e sem ingressar em qualquer mérito e/ou juízo de valoração, realizar a análise primária sobre a gravidade do evento para formar seu convencimento sobre a submissão do caso à suspensão preventiva, ou seja, deverá avaliar se estão presentes a tipicidade administrativa,  a lesividade e a publicidade negativa livre. Entendendo pela potencial presença desses elementos nessa análise superficial, proferirá despacho do qual não caberá recurso, haja vista se tratar de mero encaminhamento para julgamento, sem cunho decisório. Vale apontar que, embora seja mais comum que a suspensão preventiva seja instaurada por ocasião do ato infracional, como, por exemplo, advogado preso em flagrante em ato de traficância, pode ocorrer de forma incidental ao processo disciplinar. Nesse sentido, imagine-se por exemplo que o TED esteja a processar advogado por suposto locupletamento, e, durante o trâmite desse feito, o profissional seja condenado em processo criminal que sofria pelo mesmo fato, apenado por apropriação indébita. O fato então ganha grande publicidade e causa a "repercussão prejudicial à dignidade da advocacia". Nessa situação hipotética, o nascedouro da pretensão à suspensão preventiva não foi o conduta, mas o momento posterior, quando a infração do advogado se tornou pública e reverberou negativamente à advocacia. Daí o dever do Tribunal de Ética na instauração incidental da suspensão preventiva, ou seja, a contemporaneidade não é contada apenas do ato, mas do momento em que a advocacia for exposta por sua repercussão negativa. Em face do caráter cautelar e excepcional da suspensão preventiva, independentemente da existência de uma parte representante na comunicação do fato, essa medida cautelar terá sempre a OAB atuando de ofício. Exatamente por essa razão, nas raras vezes em que houver uma parte representante, ela ficará dependente da decisão do Tribunal para o processamento da cautelar preventiva, entretanto, processada a medida, terá a parte representante direito a participar da sessão especial, inclusive para fazer a sustentação oral, por aplicação analógica do quanto prescrevem os artigos 59 e seguintes do Código de Ética e Disciplina para o processo disciplinar.   A razão é que embora os elementos de convicção que autorizam eventual suspensão preventiva sejam aqueles que tornaram o fato público e notório, e, portanto, conhecidos, eventual decisão que indefira a suspensão preventiva pode apreciar o próprio mérito da infração, abrindo-se discussão, por exemplo, acerca da existência do fato, autoria ou sua tipicidade administrativa. O avanço nesse nível de cognição no julgamento da suspensão preventiva, assegurado ao representado em face da ampla defesa, pode prejudicar o próprio processo disciplinar e, portanto, afastar a pretensão da parte representante, que, a partir de então, poderá recorrer da decisão. Assim, o direito a participação na sessão especial lhe deve ser assegurado nesses casos. Embora fosse recomendável que simultaneamente ao despacho para processamento da suspensão preventiva também já se determinasse a abertura do processo disciplinar, em função do prazo máximo de 90 dias para sua duração e do fato de que tratando-se de processo OAB de ofício é prescindível a fase de admissibilidade (clique aqui para ler ), a melhor opção é que o TED aguarde a sessão especial da cautelar para a instauração do processo disciplinar. A razão é simples, pois considerando a necessidade de contemporaneidade entre o fato, a repercussão prejudicial à advocacia e a sessão especial, o tempo até a sessão será extremamente curto, podendo se aproveitar o conjunto probatório colecionado no ato formal para a melhor instrução do processo disciplinar. Exatamente pela brevidade desse prazo, o juízo de valoração entre o amadurecimento da questão após o julgamento da suspensão preventiva e a necessidade de agilização do processo pelo exíguo prazo de 90 (noventa) dias para o trâmite do processo administrativo, faz prevalecer a primeira opção. Essa noventena, que já era prazo impróprio, tornou-se praticamente impossível após as alterações promovidas ao artigo 139 do Regulamento Geral da OAB, que estabeleceu que os prazos dos processos internos da OAB são todos de quinze dias úteis. Essa imposição leva à inevitável admissão de que apenas para as fases da defesa prévia; de alegações finais; e de intimação para o julgamento, terão se passado cerca de 72 (setenta e dois) dias corridos, dos 90 (noventa) previstos na norma, ou seja, como o prazo é impróprio e seu cumprimento é praticamente impossível, não há necessidade de antecipação do ato de instauração do processo disciplinar anteriormente à sessão especial de suspensão preventiva. A razão principal, todavia, é a preservação da parte representada, que eventualmente possa não ter cometido a falta ética. Como a instauração do processo disciplinar já repercute gravemente na esfera pessoal de direitos do representado, pois o registro constará em seus assentamentos da OAB, não há qualquer prejuízo que se aguarde a brevíssima realização da sessão de suspensão preventiva, para então instaurar o processo disciplinar. Nesse sentido, como já tivemos a oportunidade de abordar (clique aqui para ler) e como citado acima, uma vez sendo facultada ao representando a ampla defesa, poderá, por exemplo, suscitar tese de negativa de autoria, afirmando que o ato que lhe foi imputado não foi por ele realizado, mas pelo proprietário do escritório onde trabalha, por exemplo. Nessa esteira, embora raro, pode o TED entender na sessão especial que não é o caso de suspensão preventiva e que também não é o caso de processo disciplinar contra aquele representado. Nessa clara situação hipotética, poupou-se ao advogado o constrangimento e o prejuízo da instauração do processo disciplinar. Pois bem, após realizada a correta intimação e marcada a sessão especial para a suspensão preventiva, terá o advogado todo o interregno temporal entre a data de sua intimação e a data da sessão para a juntada de seus argumentos de defesa, provas e arrolamento de testemunhas. Sobre a defesa na cautelar, vale alertar que embora o §3º do artigo 70 declare que na sessão deverá o TED ouvir o advogado, a norma contém impropriedade, pois será facultada ao advogado a ampla defesa, com todos os meios a ela inerentes na exata extensão do artigo 369 do Código de Processo Civil, ou seja, todas as provas em direito válidas, valendo mencionar, a título hipotético, defesa escrita, prova documental, prova testemunhal, depoimento pessoal da parte apontada como lesada etc. A problemática aqui reside no fato de que a norma não alerta à parte representada que a defesa poderá ser juntada ao processo em qualquer momento. Diante disso, é muito comum que o advogado compareça à sessão especial sem haver juntado previamente sua defesa e a documentação pertinente, tornando-se praticamente impossível que, no rito sumário e célere da suspensão preventiva, o relator e os julgadores tenham condições de apreciar com maior segurança e profundidade esse conteúdo. Assim sendo, é altamente recomendável que os argumentos resistivos à suspensão preventiva sejam trazidos aos autos com toda a brevidade possível após a intimação para a sessão especial, permitindo ao relator da suspensão preventiva conhecer com antecedência as teses de defesa. Ainda sobre a defesa na suspensão preventiva, cabe pontuar que tratando-se de um procedimento cautelar, e, portanto, de cognição sumária, terá o relator do processo ainda mais autonomia e independência para avaliar eventuais pedidos probatórios e indeferir aqueles que entender impertinentes, por exemplo, porque se referem à tese de defesa da conduta disciplinar e no caso concreto não irão auxiliar na questão apreciada na suspensão preventiva. Essa valoração é baseada no artigo 59, § 6º1 do Código de Ética e Disciplina, que embora trate do processo disciplinar é também aplicável à cautelar, assim como pela aplicação supletiva dos 370, § único2 do Código de Processo Civil e especialmente no artigo 400, §1º3 do Código de Processo Penal, com a autorização legal do artigo 68 da lei Federal 8.906/94. Na avaliação das provas na suspensão preventiva, assim como no posterior processo disciplinar, prevalece o princípio do livre convencimento motivado ou da persuasão racional. No momento da valoração do acervo probatório, o julgador do Tribunal de Ética e Disciplinar exercerá sua livre cognição sobre as provas constantes nos autos via de um processo crítico-racional, utilizando-se da hermenêutica jurídica e de experiências pessoais e comuns para decidir a matéria. É a aplicação de parte da normativa contida no artigo 155 do Código de Processo Penal4. A sessão especial deve ser realizada exclusivamente para o fim da suspensão preventiva, de forma sigilosa e sem o julgamento de outros processos. Na prática, todavia, de forma a otimizar os trabalhos do Tribunal, é comum que se marquem na sequência duas sessões. A primeira, extraordinária, para a suspensão preventiva; a posterior, ordinária, para o julgamento dos processos do TED. A competência para julgamento da suspensão preventiva no Tribunal de Ética e Disciplina é de livre definição do Tribunal e deverá seguir o quanto prescrevem os respectivos regimentos internos. Os regimentos internos dos Tribunais de Ética e Disciplina têm bastante autonomia para a distribuição orgânica dos órgãos do Tribunal, podendo, por exemplo, criar uma Turma de julgamento exclusivamente para a suspensão preventiva; designar uma Turma para acumular essa função; atribuir a uma Câmara esse julgamento ou atribuir exclusivamente ao Plenário do Tribunal essa obrigação. Qualquer regra orgânica de distribuição dessa competência é de livre iniciativa do TED, desde que não viole o Regulamento Geral da OAB e esteja em sintonia com os demais regramentos de micro ordenamento jurídico em face do quanto prescreve o artigo 90, inciso V, que permite ao Conselho Federal rever item de regimento de Seccional que esteja em contrariedade com o Regulamento. Se é possível a revisão da regra da própria Seccional, muito mais a do Tribunal de Ética e Disciplina. Na sessão, após a abertura dos trabalhos, o julgamento ocorrerá na forma do artigo 94 e incisos do Regulamento Geral da OAB, com destaque para o seguinte: o relator narrará o relatório, após, proferirá seu voto e a sugestão da ementa; somente depois, por último, é dada a palavra à defesa para a sustentação oral pelo prazo de 15 (quinze) minutos. Como se vê, no sistema OAB a sustentação oral vem após o voto, diferente da prática adotada na grande maioria dos Tribunais do Judiciário, onde se realiza a sustentação oral antes do voto. A sistemática da OAB claramente é a que melhor prestigia a defesa, pois permite que o advogado conheça do voto do relator antes de se dirigir aos demais julgadores, permitindo que a parte tenha tempo para criar a melhor estratégia para sua sustentação de acordo com a direção do julgamento. O ideal é que a sessão de suspensão preventiva tenha início e fim na mesma assentada, todavia, por muitas razões, pode tomar mais tempo. Nesse caso, ao Presidente da sessão caberá encerrar ou suspender o ato. No primeiro caso, a subsequente deverá obedecer ao prazo legal dos 15 dias úteis do artigo 139 do Regulamento Geral para a realização. No caso de suspensão dos trabalhos, poderá ser reiniciada no prazo conveniente ao Tribunal, por exemplo, no outro dia, lembrando que o ideal é que já saiam todos intimados da nova data, pois a pretensão de suspensão preventiva poderá sempre ser mitigada pela ausência da necessária contemporaneidade. Como, em regra e com nossas críticas (clique aqui para ler), é mais comum que a suspensão preventiva seja processada pela OAB onde o advogado mantém sua inscrição principal e como, à luz do artigo 59, §4º5 do Código de Ética e Disciplina, é obrigação da parte trazer suas testemunhas, entendemos que presentes pessoas de outros estados, o ideal é que seja marcada para o outro dia ou o prazo mais breve possível, aproveitando assim essa presença e facilitando a prova para o advogado. Voltando ao rito do julgamento, irá o Tribunal decretar o resultado. A decisão deverá declarar incabível a suspensão preventiva, indeferindo a cautelar ou reconhecer a necessidade da suspensão e julgar procedente a medida urgente. O acórdão que indefere a medida cautelar tem amplo espectro e variações, por exemplo: (i) pode apenas indeferir a cautelar, sem ingressar no mérito do ato em si e sem se imiscuir no processo disciplinar; (ii) pode declarar que embora não seja o caso de suspensão, deve o processo ser instaurado; ou também (iii) pode indeferir a cautelar e ingressar no mérito, declarando que o ato não constituiu infração disciplinar; (iv) que embora constitua infração disciplinar, não foi causado pela parte que está ali sendo julgada, adotando tese de negativa de autoria etc. Se, todavia, o acórdão concluir pelo deferimento da medida cautelar, então será obrigatória a instauração do processo disciplinar, ainda que referida providência não conste do voto. Também será necessário ao acórdão determinar o prazo da medida cautelar, conforme comentários sobre o prazo legal (clique aqui para ler). O Conselho Federal da OAB já decidiu que o prazo máximo e possível para a suspensão preventiva são os 90 (noventa) dias previstos na norma para finalização do processo disciplinar, todavia, não há previsão legal de um prazo mínimo: "Art. 70, § 3º, do EAOAB é norma cogente. Suspensão preventiva. Prazo de suspensão preventiva. Máximo de 90 (noventa) dias. Consulta n. 2010.27.04699-0/OEP. Proteção da dignidade da advocacia. Medida Cautelar deferida para limitar o prazo de suspensão ao máximo estabelecido. (...)". (Medida Cautelar n. 49.0000.2019.010185-6/SCA DEOAB, EMENTA N. 037/2019/SCA. Relator: Conselheiro Federal Luiz Tadeu Guardiero Azevedo (TO). a. 1, n. 244, 13.12.2019, p. 3) Por óbvio, considerada a complexidade das relações sociais no mundo dos fatos e as infinitas possibilidades de atos aptos à suspensão preventiva, da exegese do dispositivo se extrai a possibilidade de dosimetria na cautelar, para que o Tribunal avalie a conveniência e a necessidade da duração da suspensão. Para melhor demonstrar, se um gravíssimo crime infamante deve imputar a suspensão preventiva em sua medida máxima de 90 (noventa) dias, pode ser que para uma conduta mais branda, amena, o prazo de suspensão não necessite ser idêntico, justificando-se em alguns casos suspensões menores, como 30 (trinta) dias, por exemplo. Por outro lado, também não quer dizer que a citada conduta mais branda não mereça a suspensão dos 90 (noventa) dias. Na verdade, o que se deve entender é a necessidade de análise casuística da conveniência/utilidade da medida cautelar de suspensão preventiva, considerada sempre sua função primordial de compelir o advogado a não mais fazer e/ou a interromper a prática do ato, de forma a restaurar ou fazer cessar sua consequência, ou seja, a "repercussão prejudicial à dignidade da advocacia". Contra o acórdão que decretar a suspensão preventiva, caberão os recursos de embargos de declaração ou recurso ao Conselho Seccional, na forma dos artigos 138, §3º do Regulamento Geral da OAB e 76 e 77 da lei Federal 8.906/94: Art. 138. À exceção dos embargos de declaração, os recursos são dirigidos ao órgão julgador superior competente, embora interpostos perante a autoridade ou órgão que proferiu a decisão recorrida. (...) § 2º O recurso tem efeito suspensivo, exceto nas hipóteses previstas no Estatuto. § 3º Os embargos de declaração são dirigidos ao relator da decisão recorrida, que lhes pode negar seguimento, fundamentadamente, se os tiver por manifestamente protelatórios, intempestivos ou carentes dos pressupostos legais para interposição.  § 4º Admitindo os embargos de declaração, o relator os colocará em mesa para julgamento, independentemente de inclusão em pauta ou publicação, na primeira sessão seguinte, salvo justificado impedimento.   Art. 76. Cabe recurso ao Conselho Seccional de todas as decisões proferidas por seu Presidente, pelo Tribunal de Ética e Disciplina, ou pela diretoria da Subseção ou da Caixa de Assistência dos Advogados. Art. 77. Todos os recursos têm efeito suspensivo, exceto quando tratarem de eleições (arts. 63 e seguintes), de suspensão preventiva decidida pelo Tribunal de Ética e Disciplina, e de cancelamento da inscrição obtida com falsa prova. Parágrafo único. O regulamento geral disciplina o cabimento de recursos específicos, no âmbito de cada órgão julgador. Embora o artigo 77 estabeleça não existir efeito suspensivo em recurso contra o acórdão que determina a suspensão preventiva, a regra não se aplica aos embargos de declaração, pois, uma vez opostos, interromperão a consolidação do próprio acórdão, que, portanto, diante da possibilidade de integração, não está formado e apto a produzir efeitos. Ademais, também sujeito a aprimoramento via de decisão substitutiva, inclusive com efeito infringente, pelo mesmo relator, ou seja, para além de não haver finalização do acórdão, também não há exaurimento da cognição do julgador, razão pela qual, na prática, haverá o efeito suspensivo. Na linha do acima exposto, o recurso aclaratório sempre será cabível quando ausente fundamentação adequada para atribuição da cautelar em seu prazo máximo, de 90 (noventa) dias. O recurso aclaratório deverá ser julgados na primeira sessão posterior ao julgamento da suspensão preventiva não existindo, portanto, afetação na contemporaneidade. Uma vez amadurecido o acórdão, caberá recurso ao Conselho Seccional na forma do artigo 144-A do Regulamento Geral da OAB: Art. 144-A. Para a formação do recurso interposto contra decisão de suspensão preventiva de advogado (art. 77, lei 8.906/94), dever-se-á juntar cópia integral dos autos da representação disciplinar, permanecendo o processo na origem para cumprimento da pena preventiva e tramitação final, nos termos do artigo 70, § 3º, do Estatuto. Como se vê, o recurso será formado por instrumento ao Conselho Seccional, não dotado de efeito suspensivo. Nesse particular, todavia, excepcionalmente, entendemos que diante da possibilidade de dano irreparável decorrente da iminente suspensão, assim como da detecção prima facie de grave vício no julgado do Tribunal de Ética, poderá o Relator conceder efeito suspensivo à decisão, em caráter liminar e extraordinário, por aplicação supletiva do quanto prescreve o artigo 1.019, inciso I do Código de Processo Civil6, com a autorização legal do artigo 68 do EAOAB. Nesses casos, contudo, deverá o Relator bem fundamentar sua decisão e levar o processo a julgamento no mais exíguo prazo possível, na sessão imediatamente posterior na verdade, pois a demora no julgamento do recurso sob o efeito suspensivo extraordinário concedido monocraticamente pode implicar na perda do critério da contemporaneidade. Em face da natureza repressiva do processo disciplinar, é aplicável a fungibilidade, inclusive para a fase recursal. Nesse sentido, caso o advogado recorrente venha a incorrer em erro formal em seu recurso, nada impede que o relator permita a emenda e/ou determine a adequação pela própria OAB, tudo de forma a prestigiar a ampla defesa. O critério da fungibilidade recursal, entretanto, não encontra campo fértil no Regulamento Geral da OAB, haja vista indicar o artigo 140 que quando o relator verificar falha nos requisitos aptos ao conhecimento do recurso, deverá indeferir liminarmente a pretensão7. A saída para a aplicação da fungibilidade é a via jurisprudencial. Caso o Conselho Seccional mantenha a decisão do Tribunal de Ética e Disciplina, em regra não caberá recurso ao Conselho Federal, pois trata-se de medida cautelar, ou seja, não é decisão definitiva conforme regra adjetiva do artigo 758 da lei 8.906/94. Nesse sentido: "Artigo 140, parágrafo único, do Regulamento Geral. Decisão monocrática de indeferimento liminar de recurso, por ausência de seus pressupostos de admissibilidade (art. 75, EAOAB). Decisão fundamentada. Suspensão preventiva. Decisão não definitiva. Não cabimento de recurso ao CFOAB. Precedentes. (...)" (Recurso n.º 09.0000.2021.000011-0/SCA-PTU DEOAB, Fernanda Marinela de Sousa Santos, Presidente em exercício. José Carlos de Oliveira Guimarães Junior, Relator ad hoc a. 3, n. 691, 22.09.2021, p. 6). A medida cautelar de suspensão preventiva afeta os direitos do advogado, inclusive suas prerrogativas. Nesse sentido, já decidiram o STJ e o STF: "PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. DECISÃO ADEQUADAMENTE FUNDAMENTADA. REITERAÇÃO DELITIVA. ACUSADA CONDENADA EM OUTRO PROCESSO E QUE RESPONDE A VÁRIOS FATOS DELITUOSOS. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE MANIFESTA. RECOLHIMENTO EM SALA DE ESTADO MAIOR. DIREITO DO ADVOGADO NÃO SUSPENSO DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE. 1. A prisão é medida extrema sujeita à existência de elementos concretos de comprovação da necessidade de proteção da ordem pública, garantia de aplicação da lei penal e conveniência da instrução criminal. 2. Na hipótese, não há patente ilegalidade a ser reconhecida, pois a custódia preventiva restou firmada para o resguardo da ordem pública pelo risco da reiteração delitiva, na medida em que a acusada tem contra si outros processos criminais e é conhecido por ser traficante de drogas. 3. Quanto ao direito ao recolhimento em sala de Estado Maior, o advogado só faz jus a essa prerrogativa se estiver no livre exercício da profissão, o que não é o caso dos autos porque a pretendente encontra-se suspensa dos quadros da OAB. 4. Ordem denegada"9. "ADVOGADO - CONDENAÇÃO PENAL MERAMENTE RECORRÍVEL - PRISÃO CAUTELAR - RECOLHIMENTO A 'SALA DE ESTADO-MAIOR' ATÉ O TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA - PRERROGATIVA PROFISSIONAL ASSEGURADA PELA LEI Nº 8.906/94 (ESTATUTO DA ADVOCACIA, ART. 7º, V) - (...) O Estatuto da Advocacia (Lei nº 8.906/94), em norma não derrogada pela Lei nº 10.258/2001 (que alterou o art. 295 do CPP), garante, ao Advogado, enquanto não transitar em julgado a sentença penal que o condenou, o direito de 'não ser recolhido preso (...), senão em sala de Estado-Maior (...) e, na sua falta, em prisão domiciliar' (art. 7º, inciso V). - Trata-se de prerrogativa de índole profissional - qualificável como direito público subjetivo do Advogado regularmente inscrito na OAB - que não pode ser desrespeitada pelo Poder Público e por seus agentes, muito embora cesse com o trânsito em julgado da condenação penal. Doutrina. Jurisprudência. Essa prerrogativa profissional, contudo, não poderá ser invocada pelo Advogado, se cancelada a sua inscrição (Lei nº 8.906/94, art. 11) ou, então, se suspenso, preventivamente, o exercício de sua atividade profissional, por órgão disciplinar competente (Lei nº 8.906/94, art. 70, § 3º). (...)"10. Por último, se durante o trâmite dos recursos cabíveis for cumprida a suspensão preventiva, ocorrerá o fenômeno processual da perda superveniente do objeto recursal, o que deve fulminar a pretensão do recorrente. Ao final do processo disciplinar, caso o representado que tenha cumprido a suspensão preventiva seja condenado à sanção disciplinar de suspensão, poderá requerer a detração do período cumprido na cautelar do prazo a ser cumprido, conforme já explicamos (clique aqui para ler). É, inclusive, processualmente recomendável que na defesa do processo disciplinar o representando construa tese subsidiária para que, uma vez condenado à sanção de suspensão, seja ela limitada ao quanto já cumprido, evitando assim que seja novamente suspenso. Há um conflito aparente de normas entre a suspensão preventiva e o sigilo tratado pelo artigo 72, §2º11 da lei 8.906/94, razão pela qual o sigilo deve ser parcialmente mitigado se deferida a suspensão preventiva. Essa conclusão, primeiramente, decorre da interpretação lógica e teleológica da norma do artigo 70, §312 da lei, pois não faz o menor sentido que a suspensão preventiva deva ser realizada "em caso de repercussão prejudicial à dignidade da advocacia" e a OAB não possa dar uma resposta que venha a resgatar sua boa imagem à classe e à comunidade. Em segundo lugar e pelas mesmas razões acima, a conduta do advogado no mundo dos fatos será, por sua própria responsabilidade, de todos conhecida, pública e notória, o que por si só também já mitiga a ideia de sigilo. Em terceiro lugar e tecnicamente, a regra do sigilo prorrogado até o término do processo estabelecida no artigo 72, §2º da lei 8.906/94 está galgada no efeito suspensivo dos recursos do sistema OAB, que não existe na suspensão preventiva, ou seja, uma vez deferida a cautelar seus efeitos serão imediatos, conforme já se abordou acima pela aplicação do quanto prescreve o artigo 77 da 8.906/94. E, por último, porque o trâmite sigiloso é do processo como um todo, onde consta a acusação (que já será fato notório e público) contra o advogado, onde residem as provas, as razões de defesa e a decisão, mas não há óbice para a divulgação apenas do resultado. É dizer que não poderá o Tribunal de Ética e Disciplina, nunca, divulgar o conteúdo do processo de suspensão preventiva, todavia, é seu dever divulgar o resultado da suspensão, especialmente tendo o advogado sido suspenso, exatamente para que a cautelar cumpra seu objetivo, que é o de compelir o advogado a não mais fazer e/ou a interromper a prática do ato causador da repercussão prejudicial à dignidade da advocacia, assim como o de resgatar perante a sociedade a grandeza, a integridade, a respeitabilidade e a credibilidade da profissão. Em conclusão, não há violação do artigo 72, §2º da lei 8.906/94 se a divulgação é apenas do resultado da suspensão preventiva, sendo inclusive dever da OAB dar publicidade ao fato. *Fale com o advogado e envie suas dúvidas e temas que gostaria de ver por aqui. (Clique aqui) __________ 1 § 6º O relator somente indeferirá a produção de determinado meio de prova quando esse for ilícito, impertinente, desnecessário ou protelatório, devendo fazê-lo fundamentadamente; 2 Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito. Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias. 3 § 1º As provas serão produzidas numa só audiência, podendo o juiz indeferir as consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias. 4 Art. 155.  O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas 5 § 4º O representante e o representado incumbir-se-ão do comparecimento de suas testemunhas, salvo se, ao apresentarem o respectivo rol, requererem, por motivo justificado, sejam elas notificadas a comparecer à audiência de instrução do processo; 6 Art. 1.019. Recebido o agravo de instrumento no tribunal e distribuído imediatamente, se não for o caso de aplicação do art. 932, incisos III e IV, o relator, no prazo de 5 (cinco) dias: I - poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão; 7 Art. 140. O relator, ao constatar intempestividade ou ausência dos pressupostos legais para interposição do recurso, profere despacho indicando ao Presidente do órgão julgador o indeferimento liminar, devolvendo-se o processo ao órgão recorrido para executar a decisão. Parágrafo único. Contra a decisão do Presidente, referida neste artigo, cabe recurso voluntário ao órgão julgador. 8 Art. 75. Cabe recurso ao Conselho Federal de todas as decisões definitivas proferidas pelo Conselho Seccional, quando não tenham sido unânimes ou, sendo unânimes, contrariem esta lei, decisão do Conselho Federal ou de outro Conselho Seccional e, ainda, o regulamento geral, o Código de Ética e Disciplina e os Provimentos. 9 (HC 368.393/MG, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 20/09/2016, DJe 30/09/2016) 10 (HC 109213, Relator(a): CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 28/08/2012, publicado em 17/09/2012). 11 § 2º O processo disciplinar tramita em sigilo, até o seu término, só tendo acesso às suas informações as partes, seus defensores e a autoridade judiciária competente. 12 § 3º O Tribunal de Ética e Disciplina do Conselho onde o acusado tenha inscrição principal pode suspendê-lo preventivamente, em caso de repercussão prejudicial à dignidade da advocacia, depois de ouvi-lo em sessão especial para a qual deve ser notificado a comparecer, salvo se não atender à notificação. Neste caso, o processo disciplinar deve ser concluído no prazo máximo de noventa dias.