Na séria série "esqueçam o que eu escrevi", ontem trouxemos a informação de um artigo do professor Celso Antonio Bandeira de Mello sobre interceptação telefônica. Eram argumentos que respaldavam a divulgação de conversas vazadas, na época (1999), de FHC. Hoje a informação é de um voto-vista do ministro Gilmar Mendes num HC do caso Banestado (HC 95.518). A autoridade coatora: Sérgio, sempre ele, Moro. A ementa do remédio heroico é autoexplicativa:
"Atua com inequívoco desserviço e desrespeito ao sistema jurisdicional e ao Estado de Direito o juiz que se irroga de autoridade ímpar, absolutista, acima da própria Justiça, conduzindo o processo ao seu livre arbítrio, bradando sua independência funcional."
"Revelam-se abusivas as reiterações de prisões desconstituídas por instâncias superiores e as medidas excessivas tomadas para sua efetivação, principalmente o monitoramento dos patronos da defesa, sendo passíveis inclusive de sanção administrativa."
No voto-vista, o ministro Gilmar Mendes de 2013 não deixa dúvidas:
"O Tribunal tem-se manifestado várias vezes em relação a essa questão, que o juiz é órgão de controle no processo criminal. Tem uma função específica. Ele não é sócio do Ministério Público e, muito menos, membro da Polícia Federal, do órgão investigador, no desfecho da investigação."
"Penso que não pode ser diferente o papel desta Corte e de nós juízes, pois é inaceitável, sob qualquer fundamento ou crença, tergiversar com o Estado de Direito, com a liberdade do cidadão e com os postulados do devido processo legal."
Os magistrados de 2013 e 1016 são os mesmos. Já as partes...
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Editorial
Platão ensinou que tudo o que o espírito humano faz ou sofre levará à felicidade quando é guiado pela sabedoria, mas ao oposto quando guiado pela insensatez. Nesse sentido, é preciso emitir com parcimônia as opiniões acerca dos magistrados. Primeiro, sem extremismos. Ou melhor, ficando na temática filosófica, nem tanto ao céu, nem tanto à terra. O juiz Moro parece ser daqueles homens bem intencionados. É verdade que exagera aqui e ali (e como !), mas não se vislumbra nele um viés ideológico. Não o vemos rodeado de grupos políticos ou econômicos. De modo que, até onde sabemos, é movido por uma certa sanha de justiça, um tanto quanto exacerbada. Condenável na terra, sim, mas talvez Ele o absolva no juízo final. O certo seria os tribunais superiores, sempre que instados, lembrassem a ele da observância das regras.
No entanto, como é forçoso convir, passaram apenas a falar amém (há exceções, como a decisão de ontem do ministro Teori). Quem sabe as Cortes estejam imbuídas do mesmo interesse, qual seja, da efetividade da Justiça. Tudo isso seria ótimo, não fosse o fato de que ao transpor limites, eles deixam de existir. Por isso, é chegado o momento de restabelecê-los, sob pena de não avançarmos no processo civilizatório. Certos pontos da excelente decisão acima, de 2013, servem como uma luva para 2016. O juiz não pode ir além de suas competências de controle do processo crime. Não é sócio do MP, nem muito menos parceiro da PF. E não pode ter animosidade com as partes, por mais que estas tenham com ele. Nesse sentido, auguramos novos ventos na operação Lava Jato. Operação que tem no juiz Moro um excelente condutor, o qual, incontestavelmente, descortinou inúmeras mazelas que grassam desde os tempos coloniais. Mas estes panegíricos, por si sós, não justificam, por outro lado, práticas condenáveis. Cada coisa em seu lugar.
Ademais, basta ver algumas últimas operações para perceber que nitidamente a Lava Jato deu uma guinada e começou a ser uma caça de provas para corroborar o impeachment ou a cassação do mandato da presidente da República. Esse direcionamento é nefasto e pode jogar por terra todo o hercúleo trabalho até aqui realizado. É bem o momento de voltar para uma investigação ecumênica. E doa a quem doer. A propósito, a delação premiada da Odebrecht pode ser a tábua de salvação da operação, pois ali - segundo consta - há corrupção para todos os paladares. Incluindo, provavelmente, a necessidade de o Judiciário cortar na própria pele. E se depois de aberta essa caixa de pandora o impeachment ou a cassação forem consequência, isso será algo normal, e não forçado, como querem alguns grupos que passaram a soltar maviosos cantos no ouvido de Sérgio Moro, e que podem o estar inebriando. Não se esqueça, magistrado, a mesma mão que o afaga hoje, é a que lhe beliscará amanhã. Ou já beliscou ontem.