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Band e Marcia Goldschmidt são condenadas por propaganda enganosa

A 10ª câmara Cível do TJ/RJ, por unanimidade de votos, condenou a TV Bandeirantes, a empresa Quality Construtora Negócios Empreendimentos Ltda e a apresentadora Márcia Goldschmidt a pagarem R$ 20 mil, por danos morais e materiais, a um telespectador, vítima de propaganda enganosa.

10/11/2009


A hora da verdade

TJ/RJ - Propaganda enganosa: Band e Marcia Goldschmidt são condenadas

A 10ª câmara Cível do TJ/RJ, por unanimidade de votos, condenou a TV Bandeirantes, a empresa Quality Construtora Negócios Empreendimentos Ltda e a apresentadora Márcia Goldschmidt a pagarem R$ 20 mil, por danos morais e materiais, a um telespectador, vítima de propaganda enganosa.

Atraído por um anúncio da construtora no programa "A Hora da Verdade", comandado pela apresentadora, o suboficial da Marinha Paulo Rodrigues Oliveira, de 64 anos, celebrou contrato com a Quality para liberação de crédito imobiliário no valor de R$ 80 mil. Após pagar R$ 10 mil, ele descobriu que os cheques emitidos pela empresa, referentes ao financiamento, não tinham fundos. Morador de Campo Grande, na Zona Oeste do Rio, a vítima declarou nos autos que ligou para o programa e obteve a garantia da apresentadora sobre a segurança do empreendimento.

"Todos os que participam de alguma forma da publicidade e obtiveram vantagens com isso, respondem pelo evento danoso e são responsáveis solidários pelo ocorrido", afirmou o relator do processo, desembargador Bernardo Moreira Garcez Neto. Segundo ele, a apresentadora do programa, a emissora de TV e a construtora se beneficiaram do "engodo".

O relator disse também que o veículo da publicidade, no caso, a TV Bandeirantes, é responsável solidário com o anunciante, uma vez que é o instrumento de contato com o público e, conseqüentemente, responsável por qualquer dano causado. Ele lembrou que a emissora de televisão poderia conferir a idoneidade do anunciante, antes de veicular a propaganda, ainda mais pelo fato de o endereço fornecido pela Quality Construtora não pertencer a ela no período em que a publicidade foi ao ar.

"Como reconhece a emissora, ocorreu uma cessão onerosa de espaço. Aplica-se, portanto, a teoria do risco do empreendimento", ressaltou o relator. Ele considerou que houve crime previsto no artigo 67 do Código de Defesa do Consumidor.

Quanto à Márcia Goldschmidt, o relator afirmou que a situação da apresentadora não é diferente dos demais réus. "Em um programa de nome "A Hora da Verdade", no qual os participantes têm suas vidas orientadas pela apresentadora, a publicidade de um produto ou um serviço tem um apelo acima do comum. A fama da apresentadora atua como veículo de publicidade", finalizou.

Goldschmidt não conseguiu provar nos autos de que não participa do faturamento do horário. A decisão foi publicada no Diário da Justiça Eletrônica na última terça-feira, dia 3/11. Os réus têm até o dia 18/11 para entrar com recurso.

Confira abaixo o acórdão.

_______________

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DÉCIMA CÂMARA CÍVEL

APELAÇÃO CÍVEL N.º 2009.001.52.233.

Apelantes: 1.RÁDIO E TELEVISÃO BANDEIRANTES LTDA..

2.PAULO RODRIGUES OLIVEIRA (RECURSO ADESIVO)

3.QUALITY CONSTRUTORA NEGÓCIOS E EMPREENDIMENTOS LTDA REP/P/CURADORIA ESPECIAL.

Apelados: 1. OS MESMOS.

2. MÁRCIA GOLDSCHMIDT.

Relator: Desembargador BERNARDO MOREIRA GARCEZ NETO (10.866)

CLASSIFICAÇÃO REGIMENTAL : 1

Publicidade enganosa. Oferta, através de programa televisivo, de financiamento para casa própria. Responsabilidade solidária entre a empresa anunciante, o canal de televisão e a apresentadora. Condutas movidas pelo intuito de lucro em razão da fraude contra consumidor. Incidência dos artigos 18, 30, e 35 da Lei Federal 8078. Dever solidário de repararem o dano imaterial. Dano moral ensejado tanto pela dor íntima quanto pela frustração do lesado, que perde sua poupança. Arbitramento correto: vinte mil reais. Prazo para recorrer do curador especial começa a fluir com a intimação pessoal do defensor público. Desnecessário, para a citação por editais, que o autor esgote os meios para localizar a empresa-ré. Cabível o recurso adesivo, uma vez que houve sucumbência parcial do recorrente. Preliminares rejeitadas. Desprovidos os apelos das fornecedoras. Provido o recurso adesivo.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.º 2009.001.52.233 contra a sentença de fls.157/160, oriunda da 2.ª Vara Cível Regional de Campo Grande, em que são apelantes RÁDIO E TELEVISÃO BANDEIRANTES LTDA., PAULO RODRIGUES OLIVEIRA e QUALITY CONSTRUTORA NEGÓCIOS EMPREENDIMENTOS LTDA., representada pela CURADORIA ESPECIAL, e apelados OS MESMOS e MÁRCIA GOLDSCHMIDT.

A C O R D A M os Desembargadores da Décima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em votação unânime, REJEITAR AS PRELIMINARES e, no mérito, NEGAR PROVIMENTO aos recursos do 1ª e 3ª apelantes e DAR PROVIMENTO ao recurso do 2º apelante (autor), nos termos do voto do Relator.

R E L A T Ó R I O

Recorrem, tempestivamente, Rádio e Televisão Bandeirantes Ltda., Paulo Rodrigues Oliveira e Quality Construtora Negócios Empreendimentos Ltda., representada pela Curadoria Especial, da sentença de fls.157/160, oriunda da 2.ª Vara Cível Regional de Campo Grande, a qual, em ação ajuizada por Paulo Rodrigues Oliveira contra Quality Construtora Negócios Empreendimentos Ltda. (1ª ré), Rádio e Televisão Bandeirantes Ltda. (2ª ré) e Márcia Goldschmidt (3ª ré), que rescindiu o contrato entre o autor e a 1ª ré, condenando-a à devolução dos valores pagos, tendo 10.ª Câmara Cível – APELAÇÃO CÍVEL N.º 2009.001.52.233 – Fls.3 condenado a 1ª e a 2ª rés a indenizarem, solidariamente, os danos morais com vinte mil reais, além de julgar improcedente o pedido quanto a 3ª ré (Márcia).

2. Alega, em síntese, a Rádio e Televisão Bandeirantes Ltda. (1ª recorrente) que não é titular passiva da obrigação, pois apenas cedeu, onerosamente, espaço para a publicidade da 1ª ré. Diz que o dano deve ser reparado por aquele que tirou vantagem do fato lesivo. Afirma que o anúncio é autônomo e independente de sua atuação. Menciona o artigo 30 do CDC.

Pede a reforma da sentença (fls.169/176).

3. Recorreu, adesivamente, o autor (2º recorrente), alegando que se certificou que o empreendimento tinha inteiro apoio do programa e da apresentadora. Rechaça a improcedência do pedido quanto a 3ª ré. Defende a inversão probatória e a teoria da carga dinâmica da prova. Pede a reforma do decisum para que a 3ª ré seja condenada solidariamente a pagar danos morais (fls.189/194).

4. Recorre, também, Quality Construtora Negócios Empreendimentos Ltda., representada pelo Curador Especial (3ª recorrente). Alega, em síntese, que a citação por edital é nula. Afirma que não foi atendido o artigo 232, incisos I e II, do CPC.

Sustenta que não foram empregados meios para localizar a ré antes da citação. Pede a reforma da sentença (fls. 208/211).

5. Contra-razões a fls.181/188, fls.197/201, fls.202/205, e fls. 215/221.

6. Os autos vieram conclusos em 08 de setembro de 2009, sendo devolvidos no mesmo dia com este relatório e encaminhamento ao revisor (fls.234).

V O T O

7. Recurso contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos, condenando a ré Quality a devolver os valores que recebeu do autor e a indenizar danos morais de vinte mil reais, solidariamente, com a ré Bandeirantes. Quanto à ré Márcia, o pedido foi julgado improcedente. Daí os apelos.

8. De saída, o recurso da Curadoria, que representa a ré Quality Construtora Negócios Empreendimentos Ltda. é tempestivo. Isso porque a contagem do prazo para a Defensoria Pública inicia-se apenas com a remessa dos autos ao Defensor. O que ocorreu em 29 de junho de 2009 (fls. 207-verso), sendo a apelação interposta em 02 de julho de 2009. Sobre o tema, confiramse os julgados 2009.002.09632, 2006.001.26268 e 2005.002.03476.

9. Observa-se, também, que não há nulidade no patrocínio da defensoria à ré revel. No Estado do Rio de Janeiro, é a Defensoria Pública quem tem atribuições para atuar como curador especial.

10. Também não é acolhida alegação de nulidade de citação por edital. Isso porque, além da citação via postal (fls. 50), foi tentada, sem sucesso, a citação por carta precatória (102/103). Somente depois disso tudo, foi feita a citação por editais (fls. 109). Ademais, a defesa das outras rés aproveita à Quality Ltda..

11. Em contra-razões, as rés Rádio e Televisão Bandeirantes Ltda e Márcia Goldschmidt alegam que o recurso adesivo do autor não preenche requisitos de admissibilidade, cabimento e legitimidade. Alegam que, para pretender a condenação da ré Márcia Goldschimdt a pagar danos morais em solidariedade com demais réus, teria que interpor recurso de apelação independente, pois esse pedido foi julgado improcedente.

12. Estão presentes os requisitos de admissibilidade do recurso adesivo (artigo 500 do CPC). A jurisprudência do STJ considera que “(...) o pressuposto do cabimento do recurso adesivo quanto à existência de vencido e vencedor na demanda deve ser entendido em relação à totalidade dos pedidos formulados na ação e não a apenas um deles isoladamente (...)” ( in Resp. 535.125-PR, DJ 23.08.2004). Considerados todos os pedidos, o autor sucumbiu em parte, razão pela qual cabível o adesivo. Confirase, também, no STJ, o REsp. 1.076.522-AL (DJe 12/12/2008).

13. Rejeitadas as preliminares e conhecido do recurso adesivo, passa-se ao mérito.

14. O consumidor narra que foi atraído pela publicidade da Quality Construtora Negócios Empreendimentos Ltda, realizada no programa apresentado pela ré Márcia Goldschmidt e transmitido pela Rádio e Televisão Bandeirantes Ltda. Diante da garantia da apresentadora sobre a segurança do empreendimento, o autor telefonou para o programa, certo do sucesso do contrato de financiamento para a compra de casa própria (fls. 20/24).

15. Porém, após pagar dez mil reais (fls. 25/36, 38/42 e 44) para a liberação de um crédito de oitenta mil reais, ele descobriu que os cheques que lhe deram não tinham fundos.

16. Trata-se de evidente publicidade enganosa, pela qual o fornecedor contratado não é o único responsável, como se verificará a seguir:

17. O veículo da publicidade, no caso a emissora de televisão, é responsável solidário com o anunciante. Isso porque, como ensina Rizzatto Nunes, “ele é o instrumento de contato com o público. Logo, é agente responsável por qualquer dano causado” (Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, 4. ed., Saraiva, 2009, p. 473).

18. Observa-se que, no caso, a emissora de TV poderia conferir a idoneidade da anunciante, antes de veicular seu anúncio. Um exemplo disso está no fato de o endereço fornecido pela Quality Ltda. não pertencer a ela no período em que foi 10.ª Câmara Cível – APELAÇÃO CÍVEL N.º 2009.001.52.233 – Fls.7 realizado o reclame publicitário, como se verifica na certidão do oficial de justiça (fls. 103).

19. Dessa maneira, também, não se pode admitir a inexistência de vantagens na veiculação da publicidade. Como reconhece a emissora, ocorreu uma cessão onerosa de espaço.

Aplica-se, portanto, a teoria do risco do empreendimento.

20. Recorde-se que tal conduta, em tese, tipifica o crime do artigo 67 do CDC.

21. Não é diferente a situação da apresentadora do espetáculo, Márcia Goldschmidt. Em um programa de nome “A hora da Verdade”, no qual os participantes têm suas vidas orientadas pela apresentadora, a publicidade de um produto ou um serviço tem um apelo acima do comum. A fama da apresentadora atua como veículo de publicidade.

22. Sobre o tema, destaque-se a lição de Claudia Lima Marques (Contratos no Código de Defesa do Consumidor, 5.ed. Revista dos Tribunais, 2006, p. 800): “com a entrada em vigor do CDC, vários aspectos da publicidade comercial passaram a ser juridicamente importantes. Examinamos anteriormente(...) o efeito vinculativo que a publicidade passa a ter, seja contratualmente, como oferta (art.30), seja como informação obrigatoriamente clara e correta, a responsabilizar quem a veicula (art. 35) e a responsabilizar solidariamente toda a cadeia de fornecedores (art. 18).”

Mais adiante, a professora gaúcha afirma que ”as novas exigências deste paradigma objetivo da boa-fé, (...) teve conseqüências importantes também no relacionamento entre empresas (fornecedores diretos) e anunciantes, que viram aumentada sua responsabilidade de bem orientar e servir seus clientes, como já previa o Código Brasileiro de Auto-regulamentação Publicitária ”.

24. A apresentadora não demonstrou ser mera empregada. Isso poderia ser feito através da prova de que não participa do faturamento do horário, sendo simples contratada autônoma ou celetista.

25. Todos os que participaram de alguma forma da publicidade e obtiveram vantagens com isso, respondem pelo evento danoso e são responsáveis solidários pelo ocorrido (artigo 7º do CDC). Nesse sentido, já decidiu o STJ, afirmando que “É solidária a responsabilidade entre aqueles que veiculam publicidade enganosa e os que dela se aproveitam, na comercialização de seu produto”(in Resp 327.257-SP, DJ 16/11/2004).

26. Portanto, a ré Márcia Goldschmidt é incluída como devedora solidária, uma vez que, nos termos da Lei Federal 8078, beneficiou-se do engodo, tanto quanto a Televisão Bandeirantes e a Quality Ltda.. Incidem aqui os artigos 18, 30 e 35 do CDC.

27. Por fim, cabe alteração na condenação das verbas de sucumbência. O juiz condenou “os dois primeiros réus em 2/3 das custas e honorários advocatícios em 10% da condenação (...). Condenou o autor em 1/3 das custas e honorários advocatícios arbitrados em R$2.000,00”. Contudo, com a condenação solidária dos três réus ao pagamento de indenização por dano moral, incide aqui o artigo 20, § 3º, do CPC, devendo eles suportarem as despesas processuais e verbas honorárias, estas fixadas em 10% do valor da condenação.

28. Assim sendo, REJEITAM-SE AS PRELIMINARES e, no mérito, NEGA-SE PROVIMENTO aos recursos do 1ª (Televisão Bandeirantes) e 3ª apelantes (Quality) e DÁ-SE PROVIMENTO ao recurso do autor, para condenar a ré Márcia Goldschmidt a pagar os danos morais adequadamente estabelecidos em sentença, solidariamente em relação aos demais réus. Alterada a sucumbência, nos termos do voto do relator.

29. Remetam-se cópias integrais dos autos ao Ministério Público para apurar responsabilidades por eventuais crimes (artigo 40 do CPP) contra o consumidor ou a fé pública.

Rio de Janeiro, 21 de outubro de 2009.

Desembargador BERNARDO MOREIRA GARCEZ NETO

P R E S I D E N T E E R E L A T O R

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