Desabafo
Em carta, pai de Liana Friedenbach critica tratamento dado ao Champinha na unidade de saúde da Fundação Casa
Em novembro de 2003, Champinha, na época com 16 anos, e Paulo César Marques, o Pernambuco, mataram o casal Liana Friedenbach, de 16 anos, e Felippe Caffé, de 19, em Embu-Guaçu.
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Leia abaixo a carta na íntegra e um histórico do caso.
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"Minha Indignação"*
Meu nome é Ari Friedenbach, sou advogado e pai da jovem Liana Friedenbach, assassinada em novembro de 2003, aos dezesseis anos de idade.
A Liana, juntamente com seu namorado Felipe, foram seqüestrados por uma quadrilha constituída de 4 indivíduos maiores de idade e um menor de idade a época do crime, Roberto A.A.C., vulgo “champinha”, tendo o Felipe sido assassinado no mesmo dia.
Os maiores de idade envolvidos nos crimes foram condenados a penas severas, e se encontram cumprindo suas penas em penitenciárias do Estado.
No caso de Roberto A.A.C., vulgo “champinha”, a situação é distinta, pois, de acordo com a Legislação Brasileira aplicável, qual seja o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o seqüestro, tortura, reiterados estupros e homicídio, não constituem nenhum crime!!! Apenas Ato-Infracional de natureza grave!!!
Atos estes, puníveis com internação para tratamento e medidas de sócio-educativas, por até, no máximo três anos de internação, ou até que complete 21 anos de idade, quando deverá obrigatoriamente ser colocado em liberdade.
Importante que fique claro que o indivíduo Roberto A.A.C., vulgo “champinha”, nada mais deve à justiça ou à sociedade, eis que já cumpriu todos os prazos de internação, previstos pelas leis.
No entanto, chegado o momento de colocar Roberto A.A.C., vulgo “champinha”, em liberdade, diante dos laudos psiquiátricos que apresentam relatórios que constatam doença de ordem neurológica de natureza grave e incurável, determinou o judiciário que fosse encaminhado para Unidade de Saúde, na qual seja possível efetuar tratamento que amenize sua patologia, sendo necessário que a unidade apresente condições de segurança, para impossibilitar nova fuga do interno.
No último dia 14/12/2007, vieram a público, cenas apresentadas pelo Departamento de Jornalismo da Rede Bandeirantes, cenas do que o Estado decidiu por chamar de Unidade de Saúde, onde encontra-se Roberto A.A.C., vulgo “champinha”, em tratamento.
A referida unidade constitui-se de 5 casas, cada uma com: 1 quarto com 4 camas de madeira, com cabeceira e criado-mudo também em madeira, sala de jantar com mesa e 8 cadeiras, sala de estar com sofás em couro bege, aparelho de televisão de 29 polegadas; cozinha com pia de aço inox, fogão e geladeira Brastemp (marca mais cara do mercado); área de serviço com maquina de lavar (!!!) também Brastemp; banheiros com pias de granito bege. TUDO RECÉM TIRADO DAS EMBALAGENS!!!
A referida unidade que passou da FEBEM para Secretária de Saúde do Estado, sob o comando do Secretário Dr. Luiz Roberto Barradas Barata, médico de formação, a um custo declarado de R$12.000,00 (Doze Mil Reais) por mês, em uma unidade projetada, digo mal projetada, para abrigar no mínimo 20 internos, sendo que de acordo com a ex-FEBEM, atual Fundação CASA, pelo menos 61 internos tem as mesmas necessidades do interno Roberto A.A.C., vulgo “champinha”, que, no entanto reside numa unidade 5 estrelas, ao custo referido, absolutamente sozinho, sem qualquer acompanhamento, tratamento, ocupação ou responsabilidade.
Ainda que eu não tenha a formação médica, como é o caso do Sr. Secretário da Saúde, Dr. Barradas Barata, acredito que terapias ocupacionais seriam mais indicadas, do que o ócio a que está submetido o interno.
Não é admissível que, qualquer pessoa, seja cidadão de bem, criminoso, doente mental, ou seja lá o que for, possa acordar a hora que quiser, fazer o que quiser, inclusive passando o dia inteiro, deitado num sofá de couro assistindo televisão, tudo as custas do contribuinte, cidadão de bem, pagador de seus impostos e cumpridor de suas obrigações.
A chamada Unidade de Saúde, não seria mais eficiente, se ao invés de possuir uma quadra poli esportiva coberta, fosse equipada com uma horta, onde os internos houvessem de cuidar da produção de seus próprios alimentos???
Após a divulgação das referidas imagens pela Rede Bandeirantes, as reações foram as mais surpreendentes. As autoridades, como se o que estava sendo apresentado no vídeo fosse a coisa mais natural e óbvia, não se abalaram.
Declarou o governador José Serra: “Não vejo problema de ele estar assistindo televisão!!!”.
Já o Secretário da Saúde, parece ter enfiado a cabeça num buraco, preferindo o silêncio.
Outra reação inusitada foi o profundo silêncio dos órgãos de imprensa, eis que somente uma rede de televisão viu nos fatos narrados, alguma notícia a ser divulgada.
Será que a má aplicação dos já escassos recursos destinados à saúde não devem ser divulgados e combatidos???
Restou à população, que paga essa conta, ficar indignada, sem ao menos ouvir, sequer uma explicação aceitável das autoridades incompetentes.
Em um país que seguramente 99% da população, vive em condições muito inferiores às constatadas nas imagens apresentadas, resta a pergunta: Não estaríamos incentivando os jovens a cometer crimes como o praticado por Roberto A.A.C., vulgo “champinha”, recebendo como punição e tratamento, um salvo conduto para uma estadia em um Spa 5 estrelas???
Para finalizar, quero deixar claro de que, ainda que minha vivência permitisse, não somos favoráveis a aplicação de quaisquer tratamentos que não preservem a dignidade do interno, ainda que, no caso presente, trata-se de um perigoso reincidente, conforme vem sendo noticiado nos últimos dias, apenas pretendemos que sejam submetidos a tratamento adequado e compatível com as leis, a realidade do país, das instituições.
*Ari Friedenbach
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Histórico do caso - (Fonte : Folha de S.Paulo - 14/11/2003)
A estudante Liana Friedenbach, 16, morta com o namorado Felipe Silva Caffé, 19, em Embu-Guaçu, na Grande São Paulo, foi violentada e torturada pelos acusados de envolvimento na morte do casal, segundo afirmaram policiais que investigam o crime. O resultado do laudo pericial sobre o estupro, no entanto, ainda não foi concluído. O adolescente R.A.C, 16, o Champinha, apontado como o líder do grupo, "idealizou o abuso contra Liana, oferecendo-a aos outros comparsas", disse o delegado Silvio Balangio Júnior, da Delegacia Seccional de Taboão da Serra.
Felipe morreu com um tiro na nuca no último dia 2, e Liana, a facadas, na madrugada de quarta-feira, segundo a polícia. Ainda segundo a polícia, Champinha foi o responsável por matar Liana e ajudou Paulo César da Silva Marques, 32, o Pernambuco, a matar Felipe.
Além de Pernambuco e de R.A.C., estão detidos Antonio Matias de Barros, 48, Antônio Caetano Silva, 50, e Aguinaldo Pires, 41.
Crime
Os namorados estavam desaparecidos desde o último dia 31, quando foram acampar em um sítio abandonado em Embu-Guaçu, na Grande São Paulo. No dia 1º, Champinha e Pernambuco seguiram para pescar na região quando viram o casal. "Quando viu Liana, Champinha disse para Pernambuco: 'Olha que menina gostosa'. Depois, teve a idéia de roubar os estudantes", disse o delegado.
Na tarde do mesmo dia, Pernambuco e Champinha abordaram os estudantes enquanto eles dormiam na barraca. A dupla, no entanto, se decepcionou ao não encontrar armas nem muito dinheiro e decidiu levar os namorados para a casa de Barros, na mesma região.
Durante o trajeto, Liana disse aos criminosos que sua família tinha dinheiro. A garota sugeriu que a dupla pedisse resgate e, depois, libertasse ela e seu namorado. Segundo a polícia, nesse momento, Champinha decidiu matar Felipe e ficar com a menina.
Barros não estava em sua casa e os quatro seguiram, então, para a casa de Silva, que também não estava. No entanto, Pernambuco e Champinha decidiram ficar e usar o local como cativeiro. Conforme a polícia, na noite do dia 1º, Pernambuco violentou Liana, enquanto Felipe permanecia em outro quarto. A garota, disseram os acusados, estava em estado de choque e não reagiu.
Tiro
Na manhã do dia seguinte, os quatro saíram para caminhar no meio do matagal. Pernambuco seguiu na frente com Felipe e matou o estudante, com um tiro na nuca. Liana, que estava com Champinha, ouviu o tiro, mas não viu seu namorado morrer. Ao perguntar sobre Felipe, Champinha disse para ela que o rapaz havia sido libertado.
No mesmo dia, Pernambuco fugiu para São Paulo e Liana ficou com o adolescente na casa de Silva. Conforme a polícia, ela foi violentada por Champinha.
No dia 3, Silva chegou em casa acompanhado por Pires e viram a estudante no local. Champinha, então, apresentou-a como sua namorada, e ofereceu a menina para os colegas. A estudante foi violentada por Pires, segundo a polícia.
No mesmo dia, um irmão de Champinha disse para ele voltar para casa, porque sua mãe estava preocupada e havia "muita polícia" na região. Champinha disse ao irmão que Liana era sua namorada. Disse também que a garota iria embora e que ele precisava acompanhá-la até a rodoviária.
Matagal
Na madrugado do dia 5, Champinha levou a estudante até o matagal, onde tentou degolá-la. Depois, ainda de acordo com a polícia, golpeou a cabeça de Liana com uma peixeira. Quando a estudante caiu no chão, o adolescente ainda desferiu diversos golpes nas costas e no tórax da menina.
Os corpos das vítimas foram encontrados na última segunda-feira (10). Liana e Felipe mentiram sobre a viagem para os pais. Liana havia dito que iria para Ilhabela, no litoral, com um grupo de jovens da comunidade israelita. A família de Felipe disse que sabia que o rapaz iria acampar, mas acreditava que ele estaria com amigos.
Envolvimento
Saiba qual foi o envolvimento de cada um dos acusados no crime, segundo a Polícia Civil:
- Champinha: idealizou a abordagem ao casal, participou do assassinato de Felipe, abusou sexualmente de Liana, e ofereceu a estudante para Pernambuco e para Agnaldo. Matou Liana a facadas.
- Pernambuco: participou do sequestro dos estudantes, abusou sexualmente de Liana, matou Felipe com um tiro na nuca e fugiu.
- Antônio Caetano: dono da casa usada como cativeiro, forneceu alimentos para Liana e Champinha e presenciou atos de violência sexual contra a estudante.
- Agnaldo Pires: abusou sexualmente de Liana.
- Antônio Matias: caseiro da primeira casada procurada para servir de cativeiro. Responsável por esconder a espingarda que matou Felipe, ele soube dos abusos sexuais contra Liana, mas não procurou a polícia.
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