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CNJ abre PAD contra magistrados que disseram que assédio virou "moda"

Decisão unânime busca apurar a conduta dos magistrados e o possível desrespeito à política de perspectiva de gênero no Judiciário.

5/11/2024

O CNJ decidiu, de forma unânime, instaurar processo administrativo disciplinar para investigar a conduta dos desembargadores Silvânio Divino de Alvarenga e Jeová Sardinha, do TJ/GO, em julgamento realizado pela 6ª câmara Cível, em março deste ano.

Os magistrados, durante sessão, teriam se manifestado de maneira preconceituosa em um caso de assédio sexual, utilizando expressões que, segundo o corregedor nacional de Justiça, ministro Mauro Campbell Marques, extrapolam os limites da análise jurisdicional e podem violar a perspectiva de gênero defendida pelo próprio Judiciário.

Segundo o ministro Campbell, as declarações dos magistrados, que insinuaram que a vítima seria “sonsa” e sugeriram que o assédio se tornou um “modismo” numa “caça aos homens”, precisam ser averiguadas para verificar se ferem a Constituição Federal e as normativas do CNJ, incluindo a Resolução CNJ 492/23. Esta resolução estabelece a obrigatoriedade da perspectiva de gênero em todas as esferas de julgamento no país.

Para o corregedor, a palavra “modismo” usada pelos desembargadores desconsidera a luta social contra o assédio e sugere um descompasso com os avanços na promoção da equidade de gênero. “O termo ‘modismo’, utilizado pelo reclamado, para além de fundamentar seu voto, excede e denota uma desconsideração do Judiciário nacional pelas lutas sociais contra o assédio sexual”, declarou o ministro Mauro Campbell em seu voto.

O presidente do CNJ e do STF, ministro Luís Roberto Barroso, também se posicionou sobre o caso, defendendo que a conduta dos magistrados deve ser avaliada com rigor para combater o machismo estrutural que ainda prevalece na sociedade brasileira. Para Barroso, o Conselho tem a responsabilidade de promover a superação de estereótipos que prejudicam a equidade de gênero e reforçar uma mudança de paradigma.

A conselheira Renata Gil, supervisora da Política Judiciária Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, ressaltou que o CNJ tem intensificado o treinamento de juízes de 1º grau quanto ao Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero. Contudo, ela pontuou que ainda é necessário um esforço maior para que a política também seja compreendida e aplicada entre os magistrados de 2º grau.

A decisão pela abertura do PAD reforça o compromisso do CNJ com a igualdade de gênero e a adequação do Judiciário às demandas sociais, em especial as que dizem respeito à proteção das vítimas de assédio e à necessidade de respeito nas manifestações judiciais. O processo disciplinar dará seguimento à apuração dos fatos e poderá resultar em sanções aos desembargadores, dependendo do desfecho das investigações.

Relembre

Durante julgamento de caso envolvendo assédio sexual, dois desembargadores da 6ª câmara Cível do TJ/GO proferiram falas questionando a postura da suposta vítima e denúncias relativas a esse tipo de crime.

O desembargador Silvânio de Alvarenga pontuou que atualmente há uma “caça aos homens” impedindo relações entre homens e mulheres. Também disse que, por namorar um estudante de Direito, a suposta vítima poderia estar planejando ação penal contra o denunciado. 

“Essa caça às bruxas, caça aos homens. Daqui a pouco não vai ter nenhum encontro. Como você vai ter relacionamento com uma mulher, se não tiver um ‘ataque’? Vamos colocar ‘ataque’ entre aspas.

Depois, insinuou que a denunciante seria “sonsa”.

Uma outra pergunta também que eu faço, essa moça aí, ela mesma falou que é ‘sonsa’, ela mesma usou essa expressão, que não está compreendendo a coisa. Se ela não foi muito sonsa nesse…? No século que a gente está. É outra dúvida”.

O desembargador Jeová Sardinha, na mesma oportunidade, afirmou ser “cético” em denúncias de assédio sexual e racismo. Acresceu que vê certo “modismo” nesses tipos de acusações. 

Eu, particularmente, tenho uma preocupação muito séria com o tal do assédio moral – como gênero sexual, como espécie do gênero – e racismo. Então, esses dois temas viraram modismos. Não é à toa, não é brincadeira, que estão sendo usados e explorados com muita frequência.

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