Ministro Gilmar Mendes votou, nesta sexta-feira, 29, para que o STF revisite hipóteses de foro privilegiado na Corte e amplie a regra.
Para S. Exa., no caso de crimes funcionais, o foro deve ser mantido mesmo após a saída do cargo. Nesse sentido, o investigado apenas perderia o foro se os crimes forem praticados antes de assumir o cargo ou se não possuíssem relação com o exercício da função.
Rachadinha
O voto foi proferido em caso da relatoria do ministro. Trata-se de um HC impetrado pelo senador Zequinha Marinho, pedindo que sua situção seja analisada pelo Supremo.
O ex-deputado Federal se tornou réu por suposta prática de “rachadinha” quando estava no cargo. Segundo a denúncia, Zequinha teria exigido que servidores de seu gabinete, entre 2007 e 2014, depositassem mensalmente 5% dos salário nas contas de seu partido, sob pena de exoneração.
A defesa alega que o STF é competente para julgar o caso pois o réu exerceu, seguidamente, os mandatos de deputado Federal, de vice-governador do Pará e de senador da República.
O inquérito foi aberto em 2013, inicialmente sob supervisão do STF, mas foi remetido ao TRF da 1ª região, em 2015, após renúncia do parlamentar.
Desde então, a denúncia foi oferecida e a ação penal tramitou por quase quatro anos no TRF da 1ª região, por três anos na seção Judiciária do Pará e por mais dois anos na Seção Judiciária do DF.
Transcorrida mais de uma década, a instrução processual não foi concluída.
Entendimento atual
Desde 2018 o STF entende que há foro privilegiado - remetendo os autos para análise pela Corte - nos crimes cometidos por parlamentares no mandato e em função do cargo, segundo a regra da contemporaneidade (AP 937).
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Se o mandato for encerrado por renúncia, cassação ou não reeleição, a apuração é enviada para 1ª instância (regra da atualidade).
Assim, a única possibilidade para perpetuação da competência da Corte é após o fim da instrução do processo, com a publicação do despacho para apresentação de alegações finais.
Em seu voto, Gilmar pontuou que o atual entendimento do STF reduz, indevidamente, o alcance da prerrogativa de foro e é contraproducente por causar flutuações de competência na causas criminais, trazendo instabilidade ao sistema de Justiça.
“O parlamentar pode, por exemplo, renunciar antes da fase de alegações finais, para forçar a remessa dos autos a um juiz que, aos seus olhos, é mais simpático aos interesses da defesa”, afirmou Gilmar.
Ampliação do entendimento
No caso de Zequinha Marinho, o ministro relator, ao propor a ampliação do entendimento do STF, destacou que seu posicionamento não altera a essência da atual jurisprudência da Corte, mas “apenas avança para firmar o foro especial mesmo após a cessação das funções”.
“Em termos práticos, a aprovação da proposta estabilizaria o foro nos Tribunais quando estiverem presentes os requisitos da contemporaneidade e da pertinência temática”, afirmou.
O ministro ressaltou que o critério deve ser mais abrangente e focar na natureza do fato criminoso e não em elementos que podem ser manobrados pelo acusado, como é a permanência no cargo.
“[...] ela estabiliza o foro para julgamento de crimes praticados no exercício do cargo e em razão dele, ao mesmo tempo que depura a instabilidade do sistema e inibe deslocamentos que produzem atrasos, ineficiência e, no limite, prescrição.”
Ao final, votou por conceder o HC e reconhecer a competência do STF para processar e julgar a ação penal, propondo a seguinte tese:
"a prerrogativa de foro para julgamento de crimes praticados no cargo e em razão das funções subsiste mesmo após o afastamento do cargo, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados depois de cessado seu exercício."
Também propôs a aplicação imediata da nova interpretação aos processos em curso, com a ressalva de todos os atos praticados pelo Supremo e pelos demais juízos nos moldes da jurisprudência anterior.
- Processo: HC 232.627
Veja o voto do ministro.