A capital de Rondônia, Porto Velho, enfrenta entraves na solução do manejo do lixo urbano. O município iniciou, no ano passado, um transparente e moderno processo licitatório para definir uma empresa, por meio de PPP - Parceria Público-Privada, que realize o controle do lixo urbano, assumindo a concessão de coleta, transporte, reciclagem e disposição final de resíduos sólidos no município.
Como se não bastasse de argumentos para que a cidade tenha, enfim, um correto tratamento do lixo, há um fator de interesse global. Com efeito, Porto Velho, a capital do Estado de Rondônia, está localizada na Amazônia Legal. Como se sabe, a Amazônia Legal é uma área definida pelo governo brasileiro que engloba os Estados do Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e parte do Maranhão. Essa região foi estabelecida com o objetivo de promover o desenvolvimento sustentável na Amazônia.
Nas vésperas da COP30, a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025, prevista para ocorrer em novembro do ano que vem, na cidade de Belém, no Pará, não vai ficar bonito para o país dizer que uma das capitais da Amazônia não tem nem sequer tratamento de lixo.
A licitação, planejada para durar 20 anos - o tempo de vida útil estimado para o aterro sanitário - representa um marco para o saneamento básico da capital, que atualmente carece de um aterro sanitário próprio. O processo incluiu medidas de educação ambiental e aproveitamento de materiais recicláveis, abrangendo tanto a sede do município quanto seus distritos.
A iniciativa foi considerada fundamental pela prefeitura, visto que o município não possui aterro sanitário. O edital foi lançado após o TCE ter feito questionamentos, cujos apontamentos foram sanados.
Aliás, a capital é administrada pelo prefeito Hildo Chaves, ex-membro do Ministério Público, que conhece bem das leis e, por conta disso, certamente levou tudo na ponta do lápis.
Entraves
Muito embora a publicidade do processo tenha sido ampla, e a iniciativa seja admirável, o processo licitatório foi, inopinadamente, travado por decisão monocrática de integrante do Tribunal de Contas do Estado. De fato, em decisão monocrática, a Corte de Contas deliberou suspender a licitação, alegando "indícios de ilegalidades" (decisão monocrática 0057/2023 - GCJVA).
Tal suspensão, todavia, foi contestada judicialmente em mandado de segurança, e o TJ/RO, sensível à relevância da questão, concedeu liminar para permitir a continuação da licitação, reconhecendo a importância e a urgência da iniciativa para a cidade (processo: 0800034-16.2024.8.22.0000).
O relator, desembargador José Jorge Ribeiro da Luz, observou que, conforme a CF, a licitação é o princípio básico a ser observado pela Administração Pública, e que também pela Carta é assegurado o direito constitucional à razoável duração do processo.
Concretizando esse princípio, a nova lei de licitações estabeleu prazo de 25 dias úteis para que o Tribunal de Contas se pronuncie sobre o mérito de irregularidade apontada.
"Consigne-se que o procedimento licitatório está suspenso desde maio de 2023, sem que tenha havido manifestação definitiva pelo Colegiado da Corte de Contas, o que não se pode admitir em razão da urgência que o caso requer."
O magistrado também considerou evidenciado o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.
Recurso ao STF
Agora, num imbróglio que mais parece político, a procuradoria-Geral do Estado de Rondônia recorre ao STF contra o município. A petição solicita a suspensão da decisão que permitiu o prosseguimento da licitação, alegando risco de lesão à ordem e à economia públicas.
O caso, uma chamada Suspensão de Segurança, está sob análise do presidente da Corte, ministro Luís Roberto Barroso.
Em manifestação enviada ao presidente do Supremo, Porto Velho/RO apresentou o histórico da licitação para o manejo de resíduos, que começou em 2018 e passou por várias fases de aprovação e análise por órgãos de controle. E, estando tudo certo, sobreveio inexplicavelmente uma decisão monocrática do TCE, em maio do ano anterior.
O município argumenta em favor da retomada da licitação, salientando a urgência de regularizar os serviços de manejo de resíduos, e critica a demora e inércia do TCE, além de questionar a legalidade de sua intervenção. Ressalta a importância de garantir serviços essenciais e afirma que a suspensão da licitação não apenas prejudica a população, mas também vai contra o interesse público.
“E não é como se o TCE nunca tivesse analisado esse Edital. Na realidade, ele anuiu com seu teor (finalmente após quase 1 ano e 3 meses de ‘análise prévia’) em 12 de janeiro de 2023, sua área técnica ratificou a adequação de seu teor.”
Em uma região tão sensível e crucial como a Amazônia, a gestão eficaz do lixo assume uma importância global, podendo servir de modelo para outras áreas com desafios semelhantes.
A decisão acerca do tema está, agora, nas mãos da Suprema Corte.
- Processo: SS 5.674
Tentativa de sair do ranking negativo
Com mais de 100 anos, a cidade de Porto Velho ainda não possui um aterro sanitário para a destinação correta dos resíduos sólidos domiciliares. Atualmente, a cidade tem mais de 500 mil habitantes e é apontada há 10 anos consecutivos como uma das piores cidades do Brasil em saneamento básico.
Segundo ranking do Instituto Trata Brasil, Porto Velho tem:
- o menor percentual de atendimento urbano de água: 28,57%
- conta com 0% do esgoto tratado
- e obteve 84,01% de perdas na distribuição de água no último ano
Ainda segundo o instituto, Porto Velho aparece com somente 26% da população com acesso à água potável, e cerca de 6% com coleta de esgoto.
“É diante desse cenário histórico que a prefeitura tem encarado o desafio para resolver de uma vez a questão do saneamento básico, garantindo saúde e água tratada para toda a capital e distritos de Porto Velho”, afirmou o alcaide Hildon Chaves.