O IEPTB - Instituto de Estudos de Protesto de Títulos, que reúne cartórios de todo o país, fez um levantamento em conjunto com o IEPTB-SP - Instituto paulista que aponta que, juntas, as duas instituições receberam 432 liminares determinando que os cartórios ocultem informações sobre protestos movidos contra empresas inadimplentes.
Somente as liminares atualmente acolhidas pelo IEPTB-SP somam R$ 76,5 bilhões em dívidas de empresas que os cartórios paulistas estão sendo obrigados, por determinação judicial, a ocultar em consultas feitas por interessados.
No IEPTB nacional, os protestos ocultos por decisões liminares, alguns coincidentes com os de São Paulo, somam R$ 27,05 bilhões.
Esse movimento decorre de ações movidas pela chamada “Indústria do Limpe Seu Nome”, em que ações coletivas vem sendo movidas por associações de fachada para retirar dos cartórios e dos birôs de crédito, como o Serasa e o Boa Vista, por exemplo, a relação de CNPJs de empresas devedoras.
Isso significa que, um cedente de crédito, seja um banco, uma fintech ou uma empresa de fomento comercial, por exemplo, ao consultar um CNPJ inadimplente, não terá acesso à informação.
Os dados, até então inéditos, foram apresentados durante o 3º Congresso da Abrafesc - Associação Brasileira de Factoring, Securitização e Empresas Simples de Crédito, pelo presidente do Instituto de Protesto de São Paulo, José Carlos Alves, em apuração conjunta com o IEPTB nacional.
José Carlos apontou que essa indústria “nefasta e deletéria”, se vale de, basicamente, três Tribunais de Justiça “escolhidos pelos fraudadores, por pretensas associações de defesa do consumidor”: os TJs do Piauí, da Paraíba e de Pernambuco que determinam, por decisão liminar, a ocultação de dívidas de inadimplentes de todo o país.
“O credor é de São Paulo e o devedor é de São Paulo, a obrigação deveria ser paga em São Paulo, mas eles vão obter liminares lá nesses Estados”, cita como exemplo. “E não são só os cartórios que são afetados, mas a sociedade como um todo porque há muito crédito sendo dado no escuro por bancos, financeiras e comerciantes, a empresas que estão com uma grande quantidade de dívidas e que, com essas liminares, deixam de ter o seu nome no cadastro restritivo”, complementa.
Segundo ele, a prática também ameaça a credibilidade de uma das grandes conquistas da sociedade brasileira, a Lei do Cadastro Positivo, que atribui um score alto para os bons pagadores.
“Quando o devedor consegue a liminar, automaticamente o score dele sobe, mesmo que tenha um histórico de inadimplência recorrente. Ou seja, da noite para o dia, ele fica habilitado a conseguir créditos comerciais ou financeiros que, provavelmente, serão inadimplidos novamente em círculo vicioso que prejudica toda a economia e é uma grande injustiça com a sociedade como um todo”, avalia Hamilton de Brito Jr., presidente da Abrafesc e do Sinfac-SP.
A Corregedoria Nacional de Justiça iniciou uma investigação para apurar a “atuação de juízes e juízas na concessão de liminares sigilosas em processos judiciais que beneficiariam associações ligadas a esquema de ocultação de protestos e cadastros de inadimplentes, conhecido como ‘limpa-nome’, nas bases de consultas em todo o país”, com determinação do corregedor nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão, para que as corregedorias dos TJ/SP, TJ/PE, TJ/PI e TJ/PB prestassem informações sobre os processos envolvendo pedidos de liminares.
“Depois disso, já observamos um ‘revogaço’, tímido perto da quantidade de liminares ainda ativas, mas que parece ser efeito dessa investigação. Nossa expectativa é de que essa determinação do ministro Salomão, ao menos, iniba a concessão de novas liminares”, comenta Alexandre Fuchs das Neves, consultor jurídico da Abrafesc e do Sinfac-SP.
Das 432 liminares que chegaram aos Institutos de Protestos Nacional e Paulista, 106 já foram revogadas, conforme os quadros abaixo apresentados pelo IEPTB durante o Congresso.
O presidente do IEPTB nacional, André Gomes Netto, compartilhou dessa visão em entrevista feita durante o Congresso.
“Infelizmente, apesar de uma atuação muito enérgica, muito bem-vinda da Corregedoria Nacional de Justiça, através de uma atuação muito profícua do ministro Luis Felipe Salomão, infelizmente não se viu um movimento de reversão dessas liminares. Apenas oito bilhões que conseguiram ser revertidos, ou seja, que voltaram para o conhecimento dos agentes econômicos. É algo muito diminuto, temos ainda um grande caminho pela frente”, lamentou.
Para Hamilton de Brito Jr., essas decisões afetam não só as concessões de crédito, mas a economia do país como um todo: “Na medida que quem concede crédito passa a desconfiar da principal ferramenta de análise, que são as consultas ao histórico de adimplência dos clientes, ficamos cegos. O resultado é a retração do mercado, com juros mais altos e menos crédito circulando para empresas que precisam, principalmente as micro, pequenas e médias que são as maiores empregadoras e geradoras de impostos do país”, alerta.