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Indulto natalino perdoa multas e exclui condenados por 8 de janeiro

Benefício não inclui crimes com violência ou grave ameaça às vítimas.

23/12/2023

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva publicou nesta sexta-feira, 22, no DOU, o primeiro decreto de indulto natalino assinado de seu terceiro mandato. Previsto na Constituição, o ato equivale a um perdão presidencial coletivo, com a extinção da sentença em determinados casos. 

O indulto foi concedido a condenados por crimes sem violência ou grave ameaça às vítimas, em diferentes condições, a depender do tempo de condenação dos presos e outras situações específicas.

O indulto se aplica aos que tenham cumprido ao menos um quarto da pena.(Imagem: Ricardo Stuckert / PR)

Casos perdoados

Para condenados com sentença inferior a oito anos de reclusão, o indulto se aplica aos que tenham cumprido ao menos um quarto da pena. Se for reincidente, o condenado precisa ter cumprido um terço da pena. 

Pessoas condenadas a mais de oito anos e menos de 12 anos de prisão precisam ter cumprido um terço da pena até 25 de dezembro de 2023, ou metade, caso sejam reincidentes.

O indulto também se estende a presos com mais de 60 anos de idade que tenham cumprido um terço da pena, ou metade, se reincidentes. Caso tenham passado dos 70 anos, a exigência é ter cumprido um quarto da pena se não forem reincidentes, ou um terço, se forem. 

Mulheres com filhos menores de 18 anos, ou com filhos com doenças crônicas graves ou deficiências também foram incluídas no indulto, em condições específicas caso as condenações sejam superiores ou inferiores a oito anos.

Entre outros casos citados no indulto, pessoas com deficiências permanentes anteriores aos delitos, doenças graves permanentes ou crônicas e transtorno do espectro autista severo também foram beneficiadas a depender do tempo de condenação e do cumprimento da pena.

Exceções

Como a cada ano, desta vez o decreto trouxe várias exceções. Ficam de fora, por exemplo, pessoas condenadas por crimes contra o Estado Democrático de Direito. Isso impede a liberação de pessoas sentenciadas por participação nos atos golpistas de 8 de janeiro. Até o momento, o Supremo Tribunal Federal (STF) condenou 30 pessoas com envolvimento nos atos antidemocráticos. 

Elaborados pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), os termos do decreto preveem ainda o perdão a multas impostas por condenação judicial de até R$ 20 mil. Para valores maiores, é preciso que a pessoa comprove não ter capacidade econômica de arcar com a dívida. 

O decreto também não beneficia os condenados por crimes ambientais ou por crimes contra mulher, incluindo violações à Lei Maria da Penha, como violência doméstica, importunação sexual, violência política contra mulheres e descumprimento de medidas protetivas.

Outras exclusões incluem os crimes contra a administração pública, como corrupção passiva, peculato e mau uso de verbas públicas, para os casos em que as penas superam quatro anos de reclusão. 

Assim como em outros anos, o indulto não beneficia condenados por: violações ao Estatuto da Criança e do Adolescente, racismo, crime hediondo, tortura, estupro, latrocínio, fraudes em licitação, integrar organização criminosa e terrorismo, entre outros. 

No Brasil, é tradição que o decreto seja publicado perto de 25 de dezembro e beneficie pessoas presas. A liberação, contudo, não é automática, e cada beneficiado deve pedir em separado sua soltura. 

O indulto tem inspiração humanitária e existe em grande parte das repúblicas, como Brasil, Portugal, França e EUA, entre outras. A ideia é perdoar crimes menores e beneficiar idosos e pessoas com doença grave, por exemplo. 

Em ao menos duas ocasiões, o STF suspendeu trechos do indulto de Natal na história recente. 

Em 2017, o decreto editado por Michel Temer foi suspenso na parte em que beneficiava pessoas condenadas por crimes do colarinho branco, como corrupção. Cerca de um ano em meio depois, entretanto, o plenário do Supremo decidiu validar todo o decreto, por entender se tratar de ato privativo do presidente da República. 

Em janeiro deste ano, o decreto editado em 2022 pelo então presidente Jair Bolsonaro também foi suspenso, na parte em que concedia o indulto aos policiais militares condenados pelo massacre do Carandiru. 

Leia o decreto completo.

Nota do IDD

O IDDD - Instituto de Defesa do Direito de Defesa divulgou nota na qual comemora o indulto de Natal publicado no último dia 23, no Diário Oficial da União. Leia a nota completa:

"Depois de quatro anos de concessão do perdão de penas restrito a alguns grupos, em 2023, a finalidade legal do indulto foi resgatada e o benefício voltou a ser impessoal, destinado à população carcerária no Brasil, com cerca de 832 mil presos, a terceira maior do mundo. 

Reconhecemos, em especial, o indulto às pessoas condenadas ao pagamento da pena de multa. O benefício será aplicado para aqueles que possuem dívidas inferiores ao valor mínimo para o ajuizamento de execuções fiscais de débitos com a Fazenda Nacional (aproximadamente R$ 20 mil), ou que não tenham capacidade econômica de quitá-las, ainda que a dívida supere tal valor. A decisão representa um passo importante para enfrentar um dos maiores empecilhos para a retomada da vida de pessoas sobreviventes do cárcere. 

Hoje, nossas leis preveem a aplicação da pena de multa de forma isolada ou somada à pena privativa de liberdade, ou restritiva de direitos em condenações por diversos delitos, tais como tráfico de drogas, roubo e furto, por exemplo - crimes que mais levam pessoas à prisão. 

Quando é aplicada junto à pena de prisão, sua cobrança ocorre após a saída do cárcere. Enquanto a dívida não é quitada, a pena não é considerada cumprida. Dessa forma, a pessoa continua com a anotação em sua ficha criminal e direitos básicos - como os direitos políticos - permanecem suspensos. 

Tal situação acaba por obstruir o acesso a serviços essenciais, como ser titular de um serviço residencial, de uma conta bancária ou de uma matrícula em instituições de ensino superior. Para se somar a esse cenário de exclusão, o recebimento de benefícios sociais governamentais tampouco é permitido. Para além dos estigmas que dificultam a reintegração após a passagem pelo cárcere, a pena de multa impõe uma verdadeira situação de subcidadania, que priva a pessoa condenada de garantias essenciais e do processo democrático. 

Desde 2020, o IDDD trabalha para dar visibilidade ao debate sobre o tema e em busca de mudanças. O poder punitivo estatal não pode seguir sendo utilizado para manter grupos perseguidos historicamente privados do acesso a direitos básicos.

Por fim, vale frisar que o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins é insuscetível de abrangência de indulto (Lei nº 8.072/1990, art. 2º), o que gera uma infeliz exclusão de parcela significativa da população carcerária brasileira. O/a preso/a só tem direito a este perdão se foi condenado por tráfico privilegiado - réus primários, pegos com pequena quantidade e sem qualquer envolvimento com o crime organizado. Atualmente, 30% dos presos/as por tráfico se enquadram nesse perfil, mas, ainda assim, boa parte dessas pessoas permanece excluída da possibilidade do perdão presidencial, por não ter tido a conduta que ensejou sua condenação enquadrada no tráfico privilegiado."

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