Nesta quinta-feira, 30, em sessão plenária, STF declarou, por unanimidade, a inconstitucionalidade de vedação a posse em cargo público de candidato aprovado e acometido por doença grave, quando não apresente sintomas ou não possua restrição relevante que impeça o exercício do cargo.
A tese, proposta pelo ministro relator, Luis Roberto Barroso, foi acompanhada pelos demais ministros da Corte. Assim, foi dado provimento ao recurso, para condenar o Estado de Minas Gerais a nomear e dar posse à recorrente.
Fixou-se a seguinte tese, de repercussão geral:
"É inconstitucional a vedação a posse em cargo público de candidata aprovada que embora tenha sido acometida por doença grave, não apresenta sintomas incapacitantes, nem possui restrição relevante que impeça o exercício da função pretendida."
O caso
Uma candidata, aprovada para o cargo de oficial judiciário do TJ/MG, passou por cirurgia, quimioterapia e radioterapia para tratar um carcinoma mamário.
Após a nomeação, a junta médica responsável pelo exame admissional a considerou inapta para assumir o cargo com base em dispositivo do Manual de Perícias Médicas do Tribunal mineiro, que veda a admissão de portadoras de carcinomas ginecológicos de qualquer localização. As que já passaram por cirurgias, segundo o manual, só poderão ser admitidas cinco anos após o término do tratamento, desde que estejam livres de doença neoplásica na data do exame admissional.
Por ser impedida de tomar posse, a candidata ajuizou ação contra o Estado de Minas Gerais, e seu pedido foi julgado procedente em primeira instância.
No entanto, ao julgar apelação, a sentença foi reformulada pelo TJ/MG sob o argumento de que a candidata havia realizado cirurgia mamária 18 meses antes do exame admissional e não poderia ser considerada apta para o cargo, por não preencher o lapso temporal de cinco anos exigido.
A candidata então interpôs o recurso extraordinário no Supremo alegando ofensa ao princípio constitucional da isonomia. Ela argumenta que o carcinoma mamário pode acometer homens e mulheres, ao passo que o carcinoma ginecológico, no qual diz ter sido equivocadamente enquadrada, não poderia atingir homens.
Sustentou ainda haver ofensa ao princípio da dignidade da pessoa humana, uma vez que a decisão questionada lhe retira trabalho merecidamente conquistado, e violação do seu direito ao trabalho, tendo em vista que há uma limitação desarrazoada à posse no cargo público.
Voto do relator
Segundo o relator do recurso, ministro Luis Roberto Barroso, a matéria em debate, além de estar relacionada a direitos fundamentais de inegável interesse jurídico, possui repercussão geral sob os pontos de vista político, por envolver diretrizes de contratação de servidores públicos, e social, pois são inúmeras as pessoas já acometidas de doenças graves que prestam concursos públicos.
Em seu voto, o ministro destacou que requisitos que restrinjam o acesso a cargos públicos apenas se legitimam quando em conformidade com o princípio da legalidade e estritamente relacionados à natureza e às atribuições inerentes ao cargo público a ser provido.
Barroso afirmou que no caso, além de haver uma discriminação em razão de condição de saúde, houve uma discriminação de gênero, pois a candidata foi enquadrada, equivocadamente, em um tipo de câncer que não poderia atingir homens.
O relator ressaltou que a carência é absurda, tanto que o próprio Estado de MG reviu esse critério no manual. E acrescentou que se tratava de uma perspectiva antiga, já que no passado a doença alijava a vida, mas hoje, houve uma evolução da consciência social na percepção do que é, ou não, limitação.
Os demais ministros acompanharam o voto do relator, tendo ministro Edson Fachin sugerido o acréscimo do termo "incapacitante" na tese. Ministra Cármen Lúcia ressaltou que "preconceitos são mais maléficos e sintomas de doença do que qualquer câncer".
Sustentação oral
Em sustentação oral diante da Corte, a advogada da estudante, Marilda de Paula Silveira, sustenta que a vedação de concursos nesses casos ofende o princípio da dignidade da pessoa humana.
"Nesse caso, a recorrente, em repercussão geral, pede mais. Pede que essa corte estabeleça como inconstitucional qualquer critério que esteja vinculado à expectativa de vida, a pretensão de se prever qual é a extensão da vida humana. Permitir que isso aconteça é medir a dignidade pela estatística."
Veja uma parte da defesa:
- Processo: RE 886.131