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STF: Maioria derruba regra do CPC que amplia impedimento de juízes

Texto considerado inconstitucional por ministros impede juízes de atuarem em causas em que sejam parte clientes de escritórios de familiares, mesmo que processo seja patrocinado por advogado de outro escritório.

20/8/2023

A maioria dos ministros do STF considerou inconstitucional regra do CPC/15 que impede juízes de atuarem em causas em que sejam parte clientes de escritórios de familiares do magistrado – cônjuge ou parente de até terceiro grau –, mesmo que o processo seja patrocinado por advogado de outro escritório.

Ministros destacaram possíveis reflexos nos Tribunais Superiores, cujo principal interesse não é a solução do caso concreto, mas a formação de precedente para orientar julgamentos futuros. “Prevalece o interesse coletivo de que o precedente formado represente a opinião da Corte, não a opinião de uma maioria eventual.

Até o momento, o placar é de quatro votos pelo impedimento, e seis pela possibilidade da atuação.

Juiz pode julgar causa de cliente de escritório de parente? STF decide.(Imagem: Charles Sholl/Brazil Photo Press)

Pedido

A ação foi ajuizada pela AMB contra a regra do CPC que trata do impedimento de juízes. Segundo o art. 144, inciso VIII, do CPC, há impedimento do juiz nos processos em que figure como parte cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge, companheiro ou parente, consanguíneo, mesmo que patrocinado por advogado de outro escritório.

A associação afirma que a lei exige uma conduta impossível de ser observada por parte do magistrado e, por este motivo, a regra fere o princípio constitucional da proporcionalidade.

Segundo a entidade, o juiz não tem como saber que uma das partes é cliente de advogado que se enquadre na regra de impedimento porque não há no processo nenhuma informação quanto a esse fato objetivo. “É um impedimento que o juiz não pode, sozinho, verificar quando o processo lhe é submetido à conclusão para exame e julgamento.

O relator, ministro Edson Fachin, aplicou ao caso o rito abreviado, que possibilita o julgamento pelo plenário diretamente no mérito, sem prévia análise de liminar, em razão da relevância da matéria.

Impedido

Para o relator, ministro Edson Fachin, a regra é válida. O ministro considerou que a finalidade do dispositivo é garantir um julgamento justo e imparcial. Para o relator, o CPC apenas presume um ganho, econômico ou não, a um membro da família do juiz, materializado na vitória de cliente do escritório de advocacia. Nesses casos, cabe ao magistrado e às partes cooperarem para a prestação da justiça íntegra, imparcial e independente. "O dispositivo distribui cargas de deveres não apenas ao juiz, mas a todos os sujeitos processuais", ponderou.

O ministro Luís Roberto Barroso também considerou a norma constitucional, mas acompanhou o relator com ressalvas, pois entende que sua incidência deve ficar condicionada às situações em que o magistrado tem ciência ou razoavelmente deveria ter ciência do impedimento.

Ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia acompanharam integralmente o relator.

Não impedido

Primeiro a divergir, o ministro Gilmar Mendes observou que o CPC já prevê o impedimento se o parente do magistrado atuar como defensor público, advogado ou membro do MP, ainda que não intervenha diretamente no processo. Em seu entendimento, a extensão do impedimento dá às partes a possibilidade de usá-lo como estratégia para definir quem julgará a causa. “A escolha dos julgadores, de outra forma definida pela distribuição, passa ao controle das partes, principalmente daquelas com maior poder econômico.”

O ministro destacou, ainda, possíveis reflexos nos Tribunais Superiores, cujo principal interesse não é a solução do caso concreto, mas a formação de precedente para orientar julgamentos futuros. “Prevalece o interesse coletivo de que o precedente formado represente a opinião da Corte, não a opinião de uma maioria eventual.

Gilmar ressaltou que, para se alcançar a finalidade pretendida com o inciso VIII, a imparcialidade do julgador já seria resguardada pela regra do inciso III c/c § 3º.

"Essa, sim, é orientada pela ideia objetiva de impedir que o magistrado exerça suas funções em processos que atue, como defensor público, advogado ou membro do Ministério Público, seu cônjuge ou companheiro, ou qualquer parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, ou, ainda, qualquer outro membro de escritório de advocacia que tenha em seus quadros algum familiar do magistrado, mesmo que esse não intervenha diretamente no processo."

Segundo Gilmar, não se desconhece que há, em nossa história, relatos de episódios de julgamentos em que o magistrado, a pretexto de favorecer a parte patrocinada por seu cônjuge ou parente, tenha deixado de observar a regra de impedimento do art. 144 do CPC.

No entanto, o ministro salientou que uma cláusula aberta, "excessivamente abrangente", como a do inciso VIII, segundo a qual basta que a parte seja cliente do escritório para afastar o magistrado, não seja o melhor remédio para o combate do problema.

Em verdade, para o ministro, isso pode causar "o nefasto efeito contrário de aplicação induzida da regra de impedimento pela parte, o que fere, de plano, o princípio do juiz natural, bem como a razoabilidade e a proporcionalidade".

O voto divergente foi acompanhado por Luiz Fux, Dias Toffoli, Alexandre de Moraes e Nunes Marques.

Acompanhando a divergência com acréscimo de fundamentos, o ministro Cristiano Zanin considerou em seu voto que a norma questionada ofende a Constituição, pois (i) impõe regra objetiva de impedimento de magistrado de forma desproporcional, em grave prejuízo ao serviço público e à segurança jurídica; (ii) afeta inclusive interesse de terceiros, parentes de magistrados, em ofensa aos postulados da livre iniciativa e do direito ao trabalho; e (iii) cria injustificada distinção entre advogados públicos e privados.

Para Zanin, impedir o parente do magistrado de atuar como advogado, além de ser juridicamente impossível, restringe as oportunidades de terceiro, em afronta à liberdade de iniciativa e ao direito ao trabalho e à subsistência.

"Tanto os clientes quanto os advogados não são obrigados a permanecer no mesmo escritório. É a regra da iniciativa privada. Os vínculos se alteram tanto entre os advogados e os escritórios como entre os escritórios e os seus clientes. O controle, então, por parte do magistrado é praticamente impossível."

O julgamento tem data prevista para término nesta segunda-feira, 21.

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