Duas ações indenizatórias por violação ao direito de imagem e honra estão sendo movidas pela diretora e roteirista Janaina Diniz Guerra, filha da atriz Leila Diniz, contra Regina Duarte, o Partido Liberal e Michelle Bolsonaro.
Os dois casos aconteceram pelo uso indevido de fotografia emblemática das atrizes Eva Todor, Tônia Carrero, Eva Wilva, Leila Diniz, Odete Lara e Norma Bengell em protesto contra a censura na ditadura militar de 1964.
De acordo com a inicial, em 13 de fevereiro de 1968, as atrizes realizaram uma manifestação no aterro do flamengo, cujo pano de fundo foi uma greve de artistas e produtores de teatro, que fecharam teatros do Rio de Janeiro em oposição à censura instituída pela ditadura militar.
“A moralidade e os bons costumes, a figura de ‘boa moça’ e de subjugação das mulheres aos seus maridos, [...] eram as marcas do que se esperava e se exigia das mulheres naquele período. E Leila de forma natural, sincera e corajosa se opunha a tudo isso. Era livre e fazia questão de sê-lo, não escondia a sua liberdade. Por isso, ficou conhecida, e até hoje ainda é, por esse papel fundamental de vanguarda do feminismo e que se contrapunha à moralidade imposta pela Ditadura Empresarial-Militar”.
Regina Duarte
Em dezembro de 2022, Regina Duarte publicou um vídeo que reproduzia discurso de Jair Bolsonaro em defesa do golpe militar e da ditadura. Em um determinado momento do vídeo, quando o discurso diz que "64 foi uma exigência da sociedade" e que "as mulheres nas ruas pediam o reestabelecimento da ordem", a imagem que aparece é a foto das atrizes.
A inicial realça a marca que Leila Diniz deixou na vanguarda de direitos das mulheres, ao contrário do que o vídeo publicado por Regina veiculou. A exordial aponta que Leila não se submetia a padrões e normas conservadores, impostos pelo momento histórico, principalmente após a instituição da ditadura militar.
"O vídeo postado por Regina Duarte, alcançou mais de 67 mil curtidas e atingiu em cheio a reputação, respeitabilidade, honra e imagem de Leila Diniz, que agora é protegida por sua única descendente, Janaina, na forma do parágrafo único do art. 209 e parágrafo único do art. 1.210, ambos do CC [...]".
Janaina Diniz apontou que respeita as posições políticas de Regina Duarte, embora discorde completamente delas, mas julga inadmissível que Regina inverta por completo a realidade, “utilizando a imagem de suas colegas como se tivessem ido às ruas pedir intervenção militar, quando estavam fazendo o contrário, o protesto era justamente contra a censura imposta pela ditadura”.
Considera que Regina publicou uma mentira em suas redes, como forma de defesa da ditadura e incitação aos atos de 8 de janeiro. "É de uma gravidade indescritível", afirmou.
PL e Michelle Bolsonaro
A outra demanda, movida contra o Partido Liberal e a presidente do "PL Mulher", Michelle Bolsonaro, tem por objeto a mesma foto. Ela foi usada em fevereiro de 2023 com Michelle aparecendo "ao lado" das atrizes, em uma peça comemorativa pela "conquista do voto feminino".
Conforme a inicial, a foto em nada se relaciona com a conquista do voto feminino, pois este evento se deu em 24 de fevereiro de 1932. Ainda de acordo com a inicial, o uso da foto em contexto diverso atrelado à Michelle e ao PL representa “flagrante violação aos direitos da personalidade de Leila, defendidos por sua herdeira Janaina”.
Segundo Janaina Diniz, a memória de sua mãe é “justamente a de ruptura através da liberdade feminina com todo o conservadorismo moralista e machista defendido pelo PL e por Michelle Bolsonaro. Conservadorismo esse que, naquela época, era imposto pela ditadura militar, regime ao qual minha mãe sempre se opôs. O uso político, não autorizado, da imagem de minha mãe respaldando a pré-campanha de Michelle Bolsonaro é uma imensurável ofensa a tudo que minha mãe representou e ainda representa".
Janaina Diniz pede a remoção do conteúdo veiculado por Regina e por Michelle, além de R$ 52.800,00 em cada uma das ações.
Internet não é vale tudo
Segundo a advogada Maria Isabel Tancredo, especialista em responsabilidade civil do João Tancredo Escritório de Advocacia, que patrocina a causa, é preciso cuidado no uso de imagens na internet, a sensação de que vale tudo no ambiente digital deve ser coibida.
“O uso indevido da imagem de Leila Diniz no material publicado por Regina Duarte é gravíssimo, uma vez que desvirtua em absoluto, seja o contexto propriamente da fotografia, de oposição à Ditadura, seja da história de vida e de luta de Leila Diniz. A imagem, tal qual colocada por Regina Duarte, impõe ao público a sensação de que Leila defendia algo que ela veementemente se opunha, aí está um dos pontos centrais do ataque à sua honra”.
Maria Isabel Tancredo, ainda, explica que na publicidade veiculada pelo PL há violação do direito de imagem e honra de Leila.
"A utilização de imagem em campanha publicitária político-eleitoral deve ser feita com máxima cautela, inclusive porque os cidadãos podem enxergar uma proximidade entre a figura retratada e a figura política ressaltada na campanha, que no caso foi Michelle Bolsonaro. Isso é extremamente grave”.
A advogada disse que a ação é contra o PL e Michelle Bolsonaro porque esta é a pessoa retratada na peça publicitária político-eleitoral e se beneficia diretamente com o material, no qual há uso indevido da imagem de Leila.
"Ao olhar as postagens realizadas nas mais diversas redes sociais, os comentários são unânimes na direção de Michelle. Ela é, sem dúvida, a personagem política beneficiada e peça principal do material divulgado pelo partido”.