Um professor foi condenado em danos morais após ter se direcionado a estudante com as palavras “nordestina” e “grosseira” em sala de aula. Ao manter a sentença, a 3ª turma do Colégio Recursal de Santos/SP considerou que é incabível alegar liberdade de cátedra para ofender alunos e que a fala em questão teve nítido caráter discriminatório.
Na origem, a autora relatou que era representante de classe no curso de Gestão Empresarial oferecido pela Fatec Rubens Lara (Centro Paula Souza). Ela alegou que, durante aula online, questionou o professor a respeito da possibilidade de não serem marcadas eventuais faltas aos alunos que tivessem dificuldade de acompanhar as aulas durante o período de pandemia.
Ele, então, comentou que a aluna era pessoa “grosseira (...) nordestina mesmo, não dá pra conversar muito com ela (...)”, até ser alertado de que o microfone de seu aparelho permanecia aberto e que a aula continuava sendo gravada.
O educador, em sua defesa, argumentou que todo diálogo proferido em sala de aula é protegido pela garantia de liberdade de expressão magisterial, e que o professor representa autoridade máxima durante o período em que a aula é ministrada.
Em 1º grau, a juíza de Direito Carmen Sílvia Hernández Quintana Kammer de Lima considerou incontroverso que o professor proferiu os comentários em relação à autora tal como informado na inicial.
“Também restou evidente a intenção com que se manifestou, tanto que reafirmou por duas vezes em audiência o que quis realmente dizer quando se expressou a respeito da requerente, destacando a intenção de associar sua origem nordestina a comportamento grosseiro, de pessoa mal educada, intenção que foi claramente compreendida pelos ouvintes e que atingiu a honra da autora.”
Segundo a magistrada, o termo “nordestina”, empregado no contexto em questão, não teve a intenção de identificar a origem da autora, mas de associá-la a algo negativo, com nítido caráter discriminatório.
“Não se compreende que um professor, profissional que atua na formação de alunos, possa adotar postura discriminatória, contando com a tolerância da instituição de ensino que integra, e ainda insistir nesse pensamento, tranquilamente, mesmo quando ouvido em Juízo, destacando que seus superiores hierárquicos asseguraram que não havia motivo para se preocupar com as consequências da comunicação feita pela autora. Muitos os nomes de nordestinos que são motivo de orgulho para o povo brasileiro, pela cultura, educação e polidez, como Castro Alves, Rui Barbosa, Clóvis Beviláqua, Raquel de Queiroz, dentre tantos outros, o que deveria ser relembrado àqueles que abraçaram o nobre ofício de ensinar e de quem menos se poderia esperar postura preconceituosa como a que foi descrita nestes autos.”
Com efeito, julgou a ação procedente para condenar o educador e a Fatec ao pagamento de R$ 15 mil de danos morais. Desta decisão foi interposto um recurso, rejeitado pelo Colégio Recursal.
O relator Orlando Gonçalves de Castro Neto entendeu ser incabível alegar liberdade de cátedra ou mesmo liberdade de expressão ou manifestação do pensamento para ofender seus alunos, como pretende o professor em suas razões recursais, “notadamente quando se utilizou do termo ‘nordestina’ a fim de ofender a aluna, discriminando-a, em claro ato de xenofobia, que, além de ilícito civil, pode desbordar para a esfera penal no âmbito dos crimes contra honra”.
- Processo: 1012934-04.2021.8.26.0562
Acesse a decisão.