Nesta terça-feira, 14, a juíza Federal Jaíza Maria Pinto Fraxe, da 1ª vara Federal Cível do Amazonas, acolheu pedido da DPU e ordenou que a Funai - Fundação Nacional do Índio não adote qualquer comportamento que busque desacreditar a trajetória do indigenista Bruno da Cunha Araújo Pereira e do jornalista Dom Phillips, desaparecidos desde o dia 5 de junho.
A magistrada também determinou que o órgão se abstenha de praticar qualquer ato que seja considerado “atentatório à dignidade" contra os desaparecidos.
A decisão vem após a Fundação publicar uma “nota de esclarecimento” (veja ao final da matéria) apontando que Dom e Bruno não teriam autorização para ingressar em terra indígena e que deveriam ter comunicado sobre a expedição.
Na decisão, Jaíza ainda obrigou a Funai a adotar medidas de segurança pública a seus servidores e aos povos indígenas no Vale do Javari/AM.
“A nota da FUNAI, no bojo de uma tragédia revelada pelo desaparecimento de duas pessoas defensoras dos direitos indígenas, é violadora de direitos humanos, é inoportuna, é indevida e seu conteúdo não é compatível com a realidade dos fatos e com as normas em vigor.”
A Fundação terá de excluir o comunicado dos seus veículos oficiais de mídia.
Leia a íntegra da nota da Funai:
A Fundação Nacional do Índio (Funai) vem a público prestar esclarecimentos acerca das afirmações inverídicas divulgadas pela União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja) quanto a supostas autorizações de ingresso em área indígena envolvendo o indigenista licenciado Bruno da Cunha Araújo Pereira e o jornalista inglês Dom Phillips, desaparecidos na região do Vale do Javari (AM).
No caso do indigenista, foi emitida autorização em âmbito regional para que o indigenista ingressasse em terra indígena, com vencimento em 31/05/2022, sem o conhecimento dos setores competentes na Sede da Funai, em Brasília, o que será apurado internamente. Quanto a Dom Phillips, não há sequer menção ao nome dele na solicitação de ingresso citada pela Univaja.
Ainda que Bruno Pereira e Dom Phillips estivessem fora da área indígena, como alega a Univaja, as medidas sanitárias precisariam ser adotadas, bem como a Funai informada, tendo em vista que os dois estiveram com indígenas durante a expedição, os quais podem ter interagido com indígenas de recente contato, dada a proximidade e influência dos limites da Terra Indígena. Nesse sentido, cumpre destacar que a Funai atua com toda a cautela possível para proteger as etnias da região, que abriga a maior concentração de indígenas isolados do mundo.
A Funai irá acionar o Ministério Público Federal (MPF) para que seja apurada a responsabilidade da Univaja quanto à possível aproximação com indígenas de recente contato sem o conhecimento da instituição e, aparentemente, sem a adoção das medidas sanitárias cabíveis, entre elas, a realização de PCR e de quarentena de 14 dias. Registra-se que, em fevereiro de 2022, a Funai foi acionada pela própria Univaja acerca de um surto de covid-19 que alcançou 70% dos indígenas da etnia Korubo na região do Vale do Javari, situação na qual os órgãos competentes tomaram todas as medidas que estavam ao seu alcance para solucionar o caso.
Cabe ressaltar, ainda, que as orientações quanto à emergência em saúde decorrentes da pandemia seguem vigentes em regiões onde há a presença de indígenas isolados e de recente contato, com é o caso da Terra Indígena Vale do Javari, conforme a Lei 14.021, de 2020. O texto estabeleceu o Plano Emergencial para Enfrentamento à Covid-19 nas áreas indígenas, com medidas de vigilância sanitária e epidemiológica para prevenção de contágio e disseminação da doença.
Entre as medidas, está a realização de barreiras sanitárias para impedir a entrada de não-indígenas nas aldeias, as quais vem sendo reforçadas pela Funai por meio da presença de servidores temporários, cuja contratação foi renovada recentemente, em atendimento à Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 709 do Supremo Tribunal Federal (STF), que estabelece a implementação de barreiras sanitárias protetivas de áreas indígenas, consideradas, na ocasião, as terras indígenas com presença de povos isolados e de recente contato como prioritárias para o funcionamento das unidades.
Por fim, a fundação reforça que tem atuado firmemente nas buscas aos desaparecidos, em articulação com as forças de segurança, a fim de que o caso seja esclarecido com a maior brevidade possível. A Funai também se solidariza com os familiares e amigos das vítimas, bem como com os servidores da instituição, ao tempo em que reafirma o seu compromisso com a legalidade, segurança jurídica e pacificação de conflitos.
- Processo: 1004249-82.2018.4.01.3200
Veja a decisão.