Os ministros do STF começaram a julgar ação que questiona alterações promovidas pelo governo Bolsonaro no MNPCT - Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura. A norma mudou o órgão para o ministério da Economia; exonerou os peritos que lá trabalhavam; e estabeleceu que o trabalho não seria mais remunerado.
O relator do caso, ministro Dias Toffoli, votou por julgar inconstitucionais as alterações, sendo acompanhado pelos ministros Edson Fachin e Alexandre de Moraes. A previsão do fim do julgamento é em 25/3, caso não seja interrompido por pedido de vista ou destaque.
O MNPCT é composto por 11 especialistas e foi instituído em 2013 para atuar em instalações de privação de liberdade - trabalho que inclui a elaboração de relatórios e a expedição de recomendações aos órgãos competentes.
Antes do caso chegar ao STF, ele chegou à 6ª vara Federal do Rio de Janeiro, em ação civil pública ajuizada pela DPU. Aquele juízo, então, reintegrou os peritos aos cargos para que continuassem a receber a remuneração.
Em 2019, a PGR ajuizou no STF ação para pedir a suspensão da eficácia do decreto 9.831/19, editado pela presidência da República, que remanejou os 11 cargos de perito do MNPCT - Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura para a estrutura do ministério da Economia, exonerou os então ocupantes e tornou o trabalho não remunerado.
No STF, a PGR argumentou que o decreto invade afronta o princípio da legalidade, já que um decreto regulamentar não pode alterar estrutura de órgão criado por lei. A Procuradoria alegou, ainda, que o MNPCT atende a compromisso internacional assumido pelo Brasil no combate à tortura e que a manutenção dos cargos em comissão ocupados pelos peritos “é essencial ao funcionamento profissional, estável e imparcial do referido órgão que, por sua vez, é indispensável ao combate à tortura”.
“Fragilização do combate à tortura no país”
Dias Toffoli, relator do caso, declarou a inconstitucionalidade do remanejamento do órgão para outro ministério e da exoneração dos ocupantes dos cargos. O ministro deixou claro que os peritos do MNPCT devem ser nomeados para cargo em comissão, devendo, por consequência, ser restabelecida a destinação de 11 cargos em comissão do Grupo Direção e Assessoramento Superiores aos peritos do MNPCT, garantida a respectiva remuneração.
De acordo com o ministro Toffoli, o decreto impugnado tem o condão de fragilizar o combate à tortura no país. O relator registrou que as medidas previstas no decreto esvaziam a estrutura de pessoal técnico do MNPCT, “valendo destacar que a transformação da atividade em serviço público não remunerado impossibilita que o trabalho seja feito com dedicação integral e desestimula profissionais especializados a integrarem o corpo técnico do órgão”.
O relator anotou que as atividades dos peritos do MNPCT são de alto risco e concluiu que o esvaziamento de políticas públicas previstas em lei, mediante atos infralegais, importa em abuso do poder regulamentar e, por conseguinte, contraria a separação dos poderes. “Na espécie, a violação se mostra especialmente grave, diante do potencial desmonte de órgão cuja competência é a prevenção e o combate à tortura”, finalizou.
Acompanharam o entendimento de Toffoli os ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso e a ministra Cármen Lúcia.
Amicus curiae
O GAETS - Grupo de Atuação Estratégica da Defensorias Públicas ingressou como na ação como amicus curiae. O grupo enaltece a imprescindibilidade da atuação do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, "sendo certo que a sua fragilização resultará em retrocesso na política nacional de enfrentamento à tortura". O GAETS opina pela procedência da ação, com a declaração de inconstitucionalidade do decreto 9.831/19.
- Processo: ADPF 607