O plenário do Senado aprovou nesta quarta-feira, 29, o projeto da nova lei de improbidade administrativa (PL 2.505/21). Entre as mudanças em relação à legislação atual (lei 8.429/92), o projeto determina que atos de agentes públicos só podem ser configurados como improbidade quando houver comprovação de dolo. A matéria volta à Câmara dos Deputados para nova análise.
Antes de ser votado em plenário, o projeto passou na CCJ - Comissão de Constituição e Justiça do Senado na manhã desta quarta-feira. A CCJ aprovou a maior parte do texto que havia sido enviado pela Câmara dos Deputados. Relator da matéria, o senador Weverton incorporou algumas emendas, que agora precisaram ser analisadas pelos deputados Federais.
Discordância
Após vários senadores manifestarem contrariedade com os termos do projeto, o texto foi levado a votação nominal, onde acabou prevalecendo por 47 votos a 24. As críticas se referiam principalmente a dois pontos. Um deles é a introdução da chamada prescrição intercorrente — quando o processo deve ser arquivado caso se passe um determinado tempo (no caso, quatro anos) entre cada uma das suas etapas.
O segundo é a transformação da lista de atos de improbidade no texto da lei em lista "taxativa" — ou seja, apenas os atos relacionados são passíveis de punição. De acordo com a lei atual, a lista é considerada exemplificativa; assim, outras condutas também podem ser enquadradas como atos de improbidade.
Para o senador Alessandro Vieira, a aprovação do projeto “fulmina” a possibilidade de punição a gestores que cometeram delitos contra a administração pública. Alessandro também disse que, com a decisão, o Senado prejudica sua credibilidade aos olhos da opinião pública.
“Esse projeto não é favorável à transparência e à administração pública, não protege o bom gestor. Instantaneamente, vamos mandar para o arquivo [caso o projeto se torne lei] 40% das ações de improbidade que estão em tramitação, inclusive de membros desta Casa. Eu tenho dificuldade de encontrar outra expressão que não seja ‘vergonha’. Dá vergonha ver que está sendo votado um projeto em flagrante benefício daqueles que cometeram erros. Ao trazer o prazo da prescrição intercorrente para um parâmetro tão baixo, a gente fulmina o direito de responsabilizar aqueles que erraram” — lamentou o senador, que foi o autor do requerimento para a votação nominal.
O líder da oposição no Senado, Randolfe Rodrigues, também criticou o texto. Segundo ele, o dispositivo sobre a prescrição intercorrente teria sido feito “sob encomenda” para beneficiar políticos que respondem a processos — entre eles o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira.
“[O artigo] foi feito por encomenda. É um ‘jabuti’. A gente aprende aqui em Brasília que jabuti não sobe em árvore; ou é enchente ou é mão de gente. Eu tento dourar a pílula, mas esse artigo é para beneficiar Arthur Lira, foi feito para ele.”
O relator do projeto, senador Weverton, observou que a tese da prescrição intercorrente já estava presente na versão original do projeto de lei, que foi elaborada durante a gestão do antecessor de Lira no comando da Câmara, Rodrigo Maia.
Justiça
Weverton defendeu as mudanças na lei de improbidade previstas no projeto, argumentando que o novo modelo traz mais justiça, principalmente, para os prefeitos do país. Ele afirmou que esses gestores muitas vezes sofrem com perseguições judiciais motivadas por disputas políticas locais.
“Às vezes na procuradoria [do município] nem sequer há um concursado. O advogado da campanha virava o procurador e enchia o ex-gestor de ações de improbidade para simplesmente macular ou tentar encurtar a carreira do adversário. Nós temos que fazer essa justiça aos gestores porque podemos aqui elencar dezenas de casos que nos chegaram e que nos deixam confortáveis em dizer que a legislação precisa, sim, ser melhorada.”
O senador Rogério Carvalho também declarou ser favorável ao projeto. Ele citou sua experiência como secretário estadual de saúde de Sergipe, quando, segundo relatou, foi investigado por comprar medicamentos em caráter emergencial para hospitais desabastecidos.
“Não é razoável expor pessoas honestas, que dedicam a sua vida a uma atividade pública, que precisam tomar decisões que implicam salvar ou perder vidas. Governar é um ato muito difícil. Nós devemos pressupor que a maioria dos gestores públicos tem honestidade como guia na sua atuação. Esse projeto define claramente o que pode ser caracterizado como improbidade. Isso é fundamental para o melhor funcionamento do nosso sistema de justiça e para que os gestores tenham liberdade e condição de exercer o seu papel, fruto da vontade popular.”
Conteúdo
Em relação ao texto que havia sido aprovado na Câmara, o Senado contém seis alterações, que agora serão avaliadas pelos deputados Federais:
- A definição de improbidade administrativa passa a incluir atos que violam “a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções”;
- A denúncia por improbidade administrativa é conceituada de forma a diferenciá-la explicitamente da ação civil pública;
- A mera nomeação ou indicação política não é considerada passível de acusação de improbidade, a menos que se verifique intenção ilícita;
- O prazo para condução do inquérito passa para um ano (antes, o prazo era de 180 dias);
- Em caso de improcedência na ação de improbidade, só haverá a condenação para pagamento de honorários de sucumbência se for comprovada a má-fé;
- Fica criada a possibilidade de transição de processos para o Ministério Público: esse órgão (que passa a ter exclusividade na condução de processos por improbidade) terá um ano para manifestar interesse em assumir as ações em curso.
Principais alterações do PL 2.505/21
Dolo: os atos de improbidade administrativa passam a depender de condutas dolosas. Foi suprimida a modalidade culposa. Exclui-se a necessidade de dolo específico dos atos de improbidade decorrentes do descumprimento da legislação de acesso à informação.
Nepotismo e promoção pessoal: inseridos como novos tipos de improbidade o nepotismo (inclusive cruzado) até o terceiro grau para cargos de confiança e a promoção pessoal de agentes públicos em atos, programas, obras, serviços ou campanhas dos órgãos públicos.
Indicação política: não se configurará improbidade a mera nomeação ou indicação política por parte dos detentores de mandatos eletivos, sendo necessária a aferição de dolo com finalidade ilícita por parte do agente.
Rol taxativo: as condutas consideradas como improbidade são apenas as listadas no texto da lei (hoje, a lista é considerada exemplificativa).
Sanções: prazo máximo de suspensão dos direitos políticos sobe para 14 anos (hoje o máximo são 8 anos); Valor máximo das multas aplicáveis cai em todos os casos.
Regras de prescrição: a ação para a aplicação das sanções prescreverá em oito anos (prazo único), contados a partir da ocorrência do fato ou, no caso de infrações permanentes, do dia em que cessou a permanência. Antes o prazo era de até cinco anos após o fim do mandato do acusado.
Prazo do inquérito: aumento do prazo do inquérito para um ano, prorrogável por mais uma única vez.
Ministério Público: o MP passa a ter exclusividade para propor ação de improbidade.
Transição: a partir da publicação da lei, Ministério Público terá um ano para manifestar interesse no prosseguimento de ações em curso. Processos sem essa providência serão extintos.
Sucumbência: ressalvou-se a condenação em honorários de sucumbência apenas para os casos de comprovada má-fé.
Agentes públicos: São definidos como agentes públicos o político, o servidor público e todos que exerçam, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades referidas. As disposições previstas no projeto são aplicáveis também aos que, não sendo agente público, induzam ou concorram dolosamente para a prática de ato de improbidade.
Atos contra princípios da administração pública: para atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da administração pública será exigido dano relevante para que sejam passíveis de sanção.
Informações: Agência Senado.