Migalhas Quentes

Atos infracionais na adolescência não contam para pena na maioridade

A fundamentação da tese, no entanto, gerou divergência entre os ministros.

8/9/2021

A 3ª seção do STJ, por 7 a 2, negou recurso do MP/SP para manter entendimento de que atos praticados antes de atingir a maioridade penal não podem influir negativamente na aplicação da pena pela prática de crime quando o acusado alcança 18 anos de idade.

A decisão foi por maioria no resultado do julgado. Na fundamentação, no entanto, 4 ministros consideraram que não se pode levar em consideração os atos infracionais para o exame do § 4, art. 33, da lei de drogas; 3 ministros admitiram como tese jurídica o exame dos atos infracionais no conjunto do § 4, art. 33, da lei de drogas desde que tenha reiteração e que seja próximo os fatos antecedentes ao exame do fato que está em julgamento.

(Imagem: Arte Migalhas)

Segundo os autos, os pacientes foram sentenciados às penas de 5 anos e 10 meses de reclusão, em regime inicial fechado, e pagamento de 583 dias-multa, pela prática de tráfico de drogas, em virtude da apreensão de 211,3g de maconha, 58,3g de cocaína e 1,2g de crack.

O TJ reconheceu o privilégio os atos praticados pelos acusados antes de atingir a maioridade penal não podem influir negativamente na aplicação da pena pela prática de crime quando ele alcança 18 anos de idade.

O juízo, então, reduziu as penas para 4 anos e 10 dias de reclusão e 485 dias-multa de um paciente e 2 anos e 11 meses de reclusão e 291 dias-multa de outro, com regime semiaberto e aberto, respectivamente.

No STJ, o MP/SP pede que seja revista a aplicação da causa especial de redução de pena prevista no §4º do artigo 33 da Lei de Drogas para condenados que já cumpriram medida socioeducativa por ato infracional equivalente ao trafica de drogas.

O MP/SP sustenta que o ato infracional não pode ser considerado para fins de reincidência ou de caracterização dos maus antecedentes, mas se presta a demonstrar a dedicação do agente à atividade criminosa, o que impediria a aplicação do redutor de pena no crime de tráfico de entorpecentes.

Vara da Infância e da Juventude

O relator, ministro Joel Ilan Paciornik, ressaltou que, segundo o acordão, “o registro da prática de fato típico e antijurídico por adolescente (inimputável), que não comete crime nem recebe pena, atingida a maioridade penal, não pode ser utilizado como fundamento para se deduzir a dedicação a atividades criminosas, e produzir amplos efeitos desfavoráveis na dosimetria e execução da pena”.

“Os atos infracionais praticados pelo réu, enquanto menor de idade, e que levaram a condenação, não serviriam, por si só, para apontar dedicação à atividade criminosa do tráfico, pois na hipótese ou ato infracional anterior, teria ligação com o art. 207 A, do CP, e 241 do Estatuto da Criança.”

Para o ministro, no entanto, o caso dos autos revela outra particularidade, os réus tiveram passagens pela vara da Infância e da Juventude por infração equivalente ao tráfico, o que denota dedicação na prática delituosa.

“Assim, entendo que mereça prevalecer e ser mantida a orientação consolidada nesta Corte, não só em razão da peculiaridade do caso concreto, mas porque ‘a existência de decisões do STF desprovidas de efeito vinculante em dissonância com o entendimento deste STJ com relação à mesma matéria, não obsta a este Solidalício que continue exercendo sua função constitucional e aplicando o entendimento que concluir mais adequado à legislação infraconstitucional’.”

Assim, deu provimento ao recurso para reformar o julgado e restabelecer a sentença condenatória. O ministro Jesuíno Rissato acompanhou o relator.

Injusto e desnecessário

Ao divergir, a ministra Laurita Vaz salientou que os réus tiveram passagem pela vara da Infância e receberam medidas socioeducativas de internação pela prática de ato infracional análogo ao tráfico de drogas, tendo o mais recente dos episódios, ocorrido cerca de dois anos antes do crime em análise.

“Portanto, não há como extrair a necessária contemporaneidade entre os atos infracionais e o fato sob julgamento, exclusivamente a partir da menção às passagens infracionais, isto é, desacompanhada de qualquer análise concreta das provas atinentes à alegada dedicação às atividades criminosas.”

Para a ministra, no contexto, é inidônea a fundamentação que faz alusão genérica ao histórico infracional para concluir para concluir pela comprovação de dedicação às atividades criminosas.

“Sobretudo porque nenhum outro dado foi extraído do conjunto probatório para respaldar a conclusão de que os agentes vinham se dedicando à atividade criminosa, o que tão pouco é possível identificar a partir da quantidade não expressiva de entorpecentes.”

A ministra finalizou ressaltando ser injusto e desnecessário os pacientes voltarem a cumprir pena.

Diante disso, negou provimento ao recurso.

Os ministros Olindo Menezes, João Otávio de Noronha, Sebastião Reis Jr., Ribeiro Dantas acompanharam a divergência.

Fatos da vida real

O ministro Rogerio Schietti destacou que é evidente que os atos infracionais praticados na adolescência não se constituem crime, mas são fatos contrários ao Direito e implica consequências, inclusive a internação do menor.

“O Estatuto da Criança e do Adolescente não permite a internação por atos infracionais que não tenham sido praticados por violência ou grave ameaças, mas permite sim que se internem adolescentes quando praticam atos infracionais não violentos de forma reiterada. A reiteração da conduta já permite uma solução mais drástica.”

O ministro salientou que quando o adolescente se torna pessoa imputável, essa mesma conduta deixa de ser ato infracional e passa a ser crime, assim, do ponto de vista da essência do fato, não há distinção.

“O fato objetivamente analisado é o mesmo. O legislador, quando previu o redutor, a causa da diminuição de pena, o fez à luz de uma política criminal de drogas que se propõe a punir com maior rigor o traficante habitual, e com menor rigor o traficante que eventualmente venha a cometer essa ilicitude.”

Para Schietti, evidentemente atos infracionais não podem ser considerados como antecedentes penais, mas não há por que desconsiderar todo o passado de uma atuação de um adolescente para concluir pela atividade habitual dele como uma atividade criminosa. “Não vejo impedimento a que se considere fatos da vida real para estes fins”, concluiu.

O ministro, no entanto, concluiu, no caso concreto, aderir à conclusão para permitir a manutenção do benefício devido ao ato infracional ter sido cometido a mais de dois anos e houve mera alusão aos atos anteriores para a sentença condenatória.

Para o ministro, a seção tem que definir se, considerando a atividade criminosa, consubstanciada na prática reiterada de atos infracionais ao longo da adolescência de jovem que se torna acusado, em imputável, e que vê diante de si, não um agravamento de pena, mas a impossibilidade de ter um redutor.

“Seria injusto punir da mesma forma um jovem sem nenhum passado criminoso, com a mesma pena daquele que quando adolescente cometeu reiteradas vezes atos graves.”

Assim, acompanhou a ministra Laurita Vaz, mas sob fundamento diverso. O ministro Antonio Saldanha Palheiros concluiu pelo mesmo entendimento.

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