Nesta quarta-feira, 5, o plenário do STF retomou julgamento sobre dispositivo da lei de propriedade industrial que prorroga prazo de vigência de patentes no Brasil.
Dias Toffoli, Nunes Marques e Alexandre de Moraes foram os únicos ministros que votaram na sessão de hoje. Para os três, a prorrogação de prazo é inconstitucional, pois fere a segurança jurídica, a eficiência da administração, a impessoalidade e a livre concorrência. O julgamento continua amanhã, 6.
Veja como está o placar:
- Entenda
A ação foi ajuizada em 2016 pelo então procurador Rodrigo Janot contra o art. 40 da lei 9.279/96, que regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial. Veja o que diz o dispositivo, que diferencia prazos para data de depósito e concessão da patente:
"Art. 40. A patente de invenção vigorará pelo prazo de 20 (vinte) anos e a de modelo de utilidade pelo prazo 15 (quinze) anos contados da data de depósito.
Parágrafo único. O prazo de vigência não será inferior a 10 (dez) anos para a patente de invenção e a 7 (sete) anos para a patente de modelo de utilidade, a contar da data de concessão, ressalvada a hipótese de o INPI estar impedido de proceder ao exame de mérito do pedido, por pendência judicial comprovada ou por motivo de força maior."
A lei estabelece que as patentes podem ter validade de 20 anos, mas, na prática, com a demora da análise dos processos pelo INPI - Instituto Nacional da Propriedade Industrial, esse prazo pode chegar a 30 anos. Isso porque, de acordo com a lei, o depositante do pedido terá proteção patentária durante toda a tramitação do processo administrativo.
Por exemplo, na hipótese de o INPI demorar 10 anos para deferir um requerimento de patente de invenção, essa vigerá por mais 10 anos, de modo que, ao final do período de vigência, terão transcorrido 20 anos desde o depósito. Em outro exemplo, caso a autarquia demore 15 anos para deferir o pedido, estando garantido que a patente vigerá por mais 10 anos desde a concessão, ao final do período de vigência terão transcorrido 25 anos desde a data do depósito.
A PGR quer que esse prazo "estendido e indeterminado" seja declarado inconstitucional. Um dos recentes argumentos de Augusto Aras é, justamente, a crise sanitária do coronavírus: nos medicamentos, o monopólio na fabricação impede a produção de genéricos, que são cerca de 35% mais baratos. Para Aras, esse prazo indeterminado prejudica a saúde da população e o próprio SUS.
No começo de abril, Toffoli suspendeu o dispositivo e modulou os efeitos da decisão liminar. Assim, manteve a validade das patentes já deferidas e ainda vigentes.
- Inconstitucionalidade da prorrogação do prazo
Dias Toffoli confirmou sua decisão anterior no sentido de declarar inconstitucional a prorrogação do prazo de patentes em razão da demora de análise pelo INPI. De acordo com o ministro, o prolongamento dos prazos de patente tem caráter “injusto e inconstitucional”, por privilegiar o interesse particular em detrimento da coletividade.
Dias Toffoli retomou a leitura de seu voto na tarde de hoje destacando a vigência do prazo de patentes para medicamentos. O ministro enfatizou dado do relatório do Grupo Direito e Pobreza (USP), que demonstrou que dentre as dez patentes com maior período de vigência efetiva, nove são do setor farmacêutico. “Todas vigerão por mais de 28 anos”, destacou.
O relator também destacou estudo da UFRJ, que fez projeções sobre gastos adicionais do ministério da Saúde, em razão da extensão da patente, comparativamente à hipótese da existência de medicamentos genéricos no mercado. Segundo Dias Toffoli, o prejuízo chegou a mais de R$ 2 bilhões.
“Quanto maior o prazo de exclusividade usufruído pelo titular da patente, mais será onerado o Poder Público”, destacou o ministro Dias Toffoli do relatório do TCU sobre o tema.
No que se refere à pandemia, Toffoli salientou que o INPI informou que existem nove patentes atualmente em vigor há mais de 20 anos contendo indicação de possível uso no enfrentamento à covid-19.
“A pandemia evidenciou a necessidade premente de investimentos em saúde pública, pressionando ainda mais pelo gasto racional de recursos públicos na área.”
Para o ministro, um prazo determinado “mostra-se essencial” para a observância da regra constitucional: “o prazo de 20 anos a contar da data do depósito é a medida ideal para a vigência de uma patente”.
O ministro disse que não se pode condicionar a prorrogação “tão somente à demora na análise do processo pelo INPI”, o que pode continuar a retroalimentar a demora e ineficiência administrativa, de acordo com Toffoli.
“Toda a sociedade é beneficiada quando uma patente é extinta pelo decurso do tempo e seu objeto passa ao domínio público.”
Por fim, o ministro destacou que “não podemos continuar sendo, em matéria patentária, o ‘paraíso’ dos países desenvolvidos, mantendo monopólios por décadas sobre produtos que já caíram em domínio público em suas próprias jurisdições”.
“é irracional, sufoca a concorrência e, consequentemente, a inovação, por desestimular o ingresso de novos empreendedores nos nichos monopolizados.”
Sobre o dispositivo, Toffoli:
- Declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 40 da lei 9.279/96;
- Determinou ao INPI, dentre outras coisas, que, no prazo de um ano continue a reunir esforços de modo a efetivamente cumprir as metas do Plano de Combate ao Backlog de Patentes;
- Modulou os efeitos a partir da publicação da ata deste julgamento;
A modulação, no entanto, não incidirá sobre as ações judiciais em curso que eventualmente tenham como objeto a constitucionalidade do parágrafo único do art. 40 da LPI; e sobre as patentes concedidas com extensão de prazo relacionadas a produtos e processos farmacêuticos e a equipamentos e/ou materiais de uso em saúde.
Nunes Marques seguiu o entendimento do relator. O ministro registrou que, com o dispositivo impugnado, empresas já atuaram sem concorrência por prazos superiores a 30 anos, “coisa impensável para qualquer país que queira levar a sério os postulados básicos da economia de mercado”. Para o ministro, estamos diante de um estado de coisas inconstitucional.
De acordo com o ministro Alexandre de Moraes, o art. 40, parágrafo único, da lei impugnada, não está levando em conta o que a Constituição consagrou, qual seja o equilíbrio entre a proteção à propriedade industrial e o interesse do país/coletividade.
Alexandre de Moraes afirmou que o dispositivo impugnado estabelece um “critério subsidiário” de temporariedade das patentes, algo que não acontece no Direito Administrativo, por exemplo, no qual existe o direito de protocolo: “protocolou, tem o direito preservado e começa a contar o tempo”, observou.
“Fere a segurança jurídica, fere a eficiência da administração, fere a impessoalidade, fere a livre concorrência.”
- Processo: ADIn 5.229