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STF valida cota para filmes nacionais em cinemas

O plenário também validou tempo destinado à transmissão de programas culturais e jornalísticos por emissoras de rádio.

17/3/2021

Nesta quarta-feira, 17, o plenário do STF julgou constitucional a norma sobre a obrigatoriedade de exibição de filmes nacionais nos cinemas brasileiros por determinados períodos, a denominada “cota de tela”.

Os ministros também validaram decreto que estabelece percentuais mínimos e máximos a serem observados pelas emissoras de rádio na produção e na transmissão de programas culturais, artísticos e jornalísticos. As teses serão fixadas na sessão de amanhã. 

(Imagem: Arte Migalhas)

Cotas

O RE 627.432 foi interposto pelo Sindicato das Empresas Exibidoras Cinematográficas do Estado do Rio Grande do Sul. O autor sustenta serem inconstitucionais os artigos 55 e 59 da MP 2.228/01, que fixou a “cota de tela” e também estabeleceu sanções administrativas correspondentes. De acordo com o Sindicato, existe violação ao princípio constitucional da livre iniciativa e ingerência do Estado na atividade econômica das empresas do ramo de cinema, bem como desproporcionalidade nas medidas adotadas em relação à programação e à bilheteria arrecadada. O ministro Dias Toffoli é o relator do caso. 

Já o RE 1.070.522 questiona se o decreto que estabelece percentuais mínimos e máximos a serem observados pelas emissoras de rádio na produção e na transmissão de programas culturais, artísticos e jornalísticos locais foi recepcionado pela CF/88.

Na origem, a comissão de licitação desclassificou o Sistema de Comunicação Viaom Ltda. dos procedimentos licitatórios para delegação de serviços de radiodifusão nos municípios de Jupi e Betânia/PE, porque sua proposta técnica não atendeu à condição estabelecida pelo edital relativa ao tempo dedicado a programas culturais, artísticos e jornalísticos locais, contida no decreto 52.795/63. O ministro Luiz Fux é o relator. 

O ministro Dias Toffoli iniciou seu voto afirmando que o mercado audiovisual é um mercado concentrado, dominado por poucos e grandes grupos empresariais, dificultando sobremaneira a inserção de obras fora do “mainstream”, e impondo altas barreiras à entrada de novas empresas.

O relator destacou um estudo em conjunto com o Sebrae, a qual demonstrou que o setor audiovisual movimenta mais de $ 400 bilhões/ano e concentra a produção em três regiões do mundo – EUA, Japão e Europa. Sob essa forte concentração produtiva, ressaltou Toffoli, restou evidenciada severas barreiras à produção audiovisual brasileira.

O ministro Dias Toffoli frisou que constitui objetivo fundamental da República do Brasil a garantia do desenvolvimento nacional: “o Estado exercerá as funções de fiscalização, incentivo e planejamento”, frisou.

“A cota de tela não apenas tem um propósito social, mas também econômico, uma vez que se põe como um entre as diversas medidas voltadas a ampliação da competitividade entre as indústrias do setor.”

O ministro Dias Toffoli citou como exemplo o filme sul-coreano “Parasita”, ganhador do Oscar de melhor filme. Para o ministro, este reconhecimento não vem por acaso, mas é resultado de uma política pública de Estado, que adotou um conjunto de medidas que incluiu, além das cotas, linhas de financiamento, apoio para exportação e programas de qualificação.

Por fim, o ministro concluiu que a norma impugnada promoveu intervenção voltada a viabilizar a efetivação do direito à cultura, sem, de outro lado, atingir o lucro dos direitos à livre iniciativa e à livre concorrência.

O ministro negou provimento ao RE e propôs a seguinte tese:

“São constitucionais a cota de tela consistente na obrigatoriedade da exibição filmes nacionais nos cinemas brasileiros e as sanções administrativas decorrentes de sua inobservância.”

O ministro Luiz Fux, relator do outro processo, acompanhou o entendimento de Dias Toffoli. O entendimento do relator foi seguido por todos os outros ministros, exceto pelo ministro Marco Aurélio. 

O ministro Luiz Fux afirmou que é natural que a empresa de radiodifusão estabeleça um percentual para propiciar a finalidade educativa e cultural, já que a CF é clara ao “estabelecer essa obrigatoriedade de difusão de interesses regionais.”

“A reserva de tempo à programação especial de produção local é constitucional (...) A divulgação do modo de vida, dos costumes locais fortalece o senso de pertencimento dos cidadãos ao município.”

Assim, Fux propôs a seguinte tese:

“São válidos os procedimentos licitatórios que exijam percentuais máximos e mínimos de programação especial observado o artigo 221 da CF de 1988.”

O ministro Dias Toffoli, relator do outro processo, acompanhou o entendimento de Fux. O entendimento do relator foi seguido por todos os outros ministros, exceto pelo ministro Marco Aurélio. 

Divergência

Para o ministro Marco Aurélio, a norma que previu a “cota de tela” vai na contramão da liberdade de mercado. O decano entende que há vício formal no caso, porque deveria ter atuado o Legislativo na matéria.

Com relação à cota de regionalização de conteúdo local, Marco Aurélio entende que é possível haver regionalização de programas, “mas não mediante decreto, mas mediante lei em sentido estrito”.

Sustentações orais

Pela União, falou o AGU José Levi. Com relação às cotas de regionalização de conteúdo local, Levi afirmou que o decreto 52.795/63 foi recepcionada pela CF/88 pela compatibilidade material. “Trata-se de defender e promover a diversidade cultural, inclusive no viés regional”, ressaltou. Quanto à cota de tela para os filmes, o AGU entendeu que tal disposição não restringe a liberdade do consumidor brasileiro, mas amplia suas possibilidades ao permitir acesso às produções locais. Por fim, o AGU entendeu que estão demonstradas a legitimidade das normas questionadas.

No mesmo sentido, falou o advogado Ávio Kalatzis de Brito, pela Ancine - Agência Nacional do Cinema. O advogado defendeu que a cota de tela é um instituto histórico do Direito brasileiro que corrobora pela promoção e proteção do patrimônio cultural nacional, que fomenta a produção e a competitividade de conteúdos nacionais. 

Posteriormente, falou o PGR Augusto Aras pela validade das normas impugnadas. Segundo Aras, as normas materializam a obrigação do Estado brasileiro de promover a difusão e circulação da cultura nacional e asseguram ao povo brasileiro o acesso a estes filmes. “A cota de tela não viola a isonomia”, salientou. Além disso, Augusto Aras rechaçou o argumento de que as normas prejudicam o valor da “livre iniciativa”, pois este princípio não é um poder absoluto, mas poderá sofrer restrições para equilibrar outros princípios constitucionais.

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