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Lewandowski: Não é uma opção do governo vacinar ou não vacinar, é uma obrigação

Além de votar a favor da vacinação compulsória, Lewandowski enfatizou a competência concorrente entre os entes Federados para a implantação do plano de imunização.

16/12/2020

Nesta quarta-feira, 16, o plenário do STF deu início ao debate acerca da obrigatoriedade da vacina contra à covid-19. Único a votar na sessão de hoje, o relator das ações, ministro Lewandowski, votou pela compulsoriedade da vacina  e afirmou:

“A saúde coletiva não pode ser prejudicada por pessoas que deliberadamente se recusam a ser vacinadas, acreditando que ainda assim serão egoisticamente beneficiadas pela imunidade de rebanho (...) Não é uma opção do governo vacinar ou não vacinar, é uma obrigação.

Em seu voto, Lewandowski também enfatizou a competência concorrente entre União, Estados e municípios para a implantação do plano de imunização. O julgamento continua amanhã, 17.

Entenda os casos

As ações foram ajuizadas por partidos políticos que tem pedidos antagônicos. O PDT - Partido Democrático Trabalhista requer que o Supremo fixe a orientação de que compete aos Estados e aos municípios determinarem a realização compulsória de vacinação e outras medidas profiláticas no combate à pandemia da Covid-19, “desde que as medidas adotadas, amparadas em evidências científicas, acarretem maior proteção ao bem jurídico transindividual”.

O PTB - Partido Trabalhista Brasileiro, por sua vez, requer que a regra da lei 13.979/20 (artigo 3º, inciso III, alínea “d”) que confere ao Estado a competência para determinar a realização compulsória de vacinação e adotar outras medidas profiláticas no combate à pandemia seja declarada inconstitucional. Segundo o partido, a norma viola diversos dispositivos da Constituição Federal e geraria lesões irreparáveis a direitos fundamentais, em especial ao direito à vida, à saúde e à liberdade individual. A norma impugnada diz o seguinte:

"Art. 3º Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, poderão ser adotadas, entre outras, as seguintes medidas:
III - determinação de realização compulsória de:
d) vacinação e outras medidas profiláticas"

O recurso também apregoado para julgamento tem origem em ação civil pública ajuizada pelo MPSP contra os pais de uma criança, a fim de obrigá-los a regularizar a vacinação do seu filho. Por serem adeptos da filosofia vegana e contrários a intervenções médicas invasivas, eles deixaram de cumprir o calendário de vacinação determinado pelas autoridades sanitárias.

Antes de apregoar os feitos, o presidente da Corte, ministro Fux, trouxe dados que mostram que o STF é a Corte que mais proferiu decisões atinentes à pandemia no mundo: foram mais de 8 mil ações relacionadas ao tema. Fux agradeceu ao ex-presidente Dias Toffoli, que procedeu à adequação da Corte à realidade pandêmica, por meio de sessões virtuais e assegurando as sustentações orais. 

Após o pregão dos casos, o ministro Lewandowski, relator de duas ações, afirmou que o STF não vai tratar da obrigatoriedade da vacina, se a vacina contra a covid, "seja ela do laboratório A, B, C ou D vai ou não ser obrigatória. Isso é matéria para os epidemiologistas, infectologistas, especialistas, para o ministério da Saúde, para aqueles que têm o poder de desencadear políticas públicas. Não é papel do Judiciário Nós aqui só vamos interpretar essa expressão em face da Constituição"

Relator

O ministro Lewandowski, relator, iniciou seu voto afirmando que a vacinação obrigatória no Brasil é uma realidade, estando prevista em diferentes diplomas legais. Mas, até chegar a este ponto, Lewandowski rememorou fatos históricos tais como a Revolta da Vacina, em 1904, episódio no qual a população foi vacinada à força pelo Estado contra a doença da varíola.

Lewandowski disse enfaticamente que as pessoas não podem sofrer qualquer violência física por parte do Estado: “afigura-se flagrantemente inconstitucional toda determinação legal regulamentar ou administrativa no sentido de implementar a vacinação forçada das pessoas, sem o seu expresso consentimento".

Dando um salto histórico, e fazendo uma comparação com os textos legais contemporâneos, o relator afirmou que a lei impugnada cuidou de estabelecer limites bem definidos à vacinação compulsória. Lewandowski disse que, quando o Estado for disponibilizar a vacina, não só se deve observar o escrupuloso respeito ao corpo humano, como as demais cautelas estabelecidas na lei. “Por tais razões não há inconstitucionalidade no dispositivo impugnado”, disse.

O ministro enfatizou que a obrigatoriedade da vacinação mencionada nos textos normativos atuais não contempla a imunização forçada, “porquanto levada à efeito por meio de sanções indiretas como vedações ao exercício de determinadas atividades”. Veja aqui a diferenciação entre vacinação forçada e compulsória explicada pelo relator. 

De acordo com o ministro, a previsão da vacinação compulsória contra a covid-19 não seria sequer necessária, já que a legislação sanitária brasileira, em especial à lei 6.259/75, já contempla a imunização de caráter obrigatório. Para Lewandowski, o texto contestado não traz nenhuma inovação, mas um reforço diante dos desafios colocados pela pandemia.

Quanto à competência dos entes federados, Lewandowski entende que a União deve assumir a coordenação das atividades do setor, mas tal fato não exclui a competência dos Estados e municípios em cuidar da assistência à saúde com as especificidades locais. “Os Estados podem, sim, agir em caráter supletivo”, afirmou.

O ministro concluiu que a previsão de vacinação obrigatória, excluída a imposição de vacinação forçada, afigura-se legítima, desde as medidas a que se sujeita os refratários observem os critérios da lei 13.979/20, e respeitem os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Por fim, o ministro deu interpretação conforme à Constituição ao dispositivo impugnado para estabelecer que:

A vacinação compulsória não significa vacinação forçada, por exigir sempre o consentimento do usuário podendo, contudo, ser implementada por meio de medidas indiretas, a quais compreendem, dentre outras: a restrição ao exercício de determinadas atividades ou à frequência de determinados lugares;

  1. Tenham como base e evidência científica;
  2. Venham acompanhadas de ampla informação sobre eficácia, segurança e contraindicações;
  3. Respeitem a dignididade humana e os direitos fundamentais das pessoas;
  4. Atendam os critérios de proporcionalidade e razoabilodade;
  5. Sejam as vacinas distribuídas universal e gratuitamente;

Tais medidas podem ser implementadas tanto pela União, como pelos Estados, DF e municípios. 

Sustentações orais

O advogado Walber de Moura Agra, pelo PDT, defendeu que a concretização das políticas públicas já foi superada e o que desafio atual é dar eficácia a estas políticas. Para o advogado, as comprovações científicas já estão em todos os países, e criticou a apologia de cloroquina como cura para a covid-19. 

Pelo PTB, o advogado Luis Gustavo Pereira da Cunha, questionou: “o sistema de saúde brasileiro está preparado com possíveis efeitos colaterais da vacina?”. Para o advogado, o STF deve impedir a vacinação obrigatória, para que seja uma “opção do indivíduo, e não uma obrigação imposta pelo Estado”. Por fim, o causídico afirmou que inexistem estudos científicos que demonstrem a real eficácia da vacina.

O AGU José Levi iniciou sua manifestação dizendo que a proteção à Saúde, enquanto direito fundamental, é dever do Estado. Assim, segundo Levi, a União tem negociado a compra de milhões de doses de vacina. No entanto, de acordo com o advogado da União, essas iniciativas não acontecerão por voluntarismo, “mas acontecerão, ou não, por critérios rigorosamente científicos se, e quando, vier a existir imunizantes eficazes e seguros”.

Pelo MP/SP, o procurador Mário Sarrubbo que o dever à Saúde deve ser observado sob a perspectiva coletiva. “Pais não têm direito incondicional sobre as decisões relativas às saúdes de seus filhos menores, porque os infantes são sujeitos de direito”, afirmou. De acordo com o procurador, a liberdade de convicção dos pais não é plena e exclusiva e deve ceder em face de direitos de maior significância e expressão. 

O defensor público do RJ Pedro Paulo Carriello, representando o amicus curiae Gaets - Grupo de Atuação Estratégica das Defensorias Públicas Estaduais e Distrital nos Tribunais Superiores defendeu a obrigatoriedade da vacina por conta do que mostra a Ciência, bem como das evidências que advém dela. “A vacina é um bem público”, enfatizou. O defensor observou que alguns tipos de doenças foram extirpados da sociedade em razão da vacinação pública. “Até que ponto esses fundamentos de convicções filosóficas podem limitar algo evidenciado pela ciência?”, concluiu o advogado. 

Para o PGR Augusto Aras, a dignidade humana como autonomia não é comprometida pela obrigatoriedade da vacina, defendeu. O PGR afirmou que a vacinação obrigatória não significa “condução coercitiva” para inocular o cidadão e que a saúde pública é dever do Estado para o cuidado dos indivíduos.

Aras defendeu que a vacinação é um valioso instrumento da saúde pública ao salientar que a alegação de que a vacinação seria uma ameaça à vida e a à saúde das pessoas por não ter eficácia comprovada encontra óbice normativo, pois a própria lei prevê que a medida só pode ser determinada com base em evidências científicas. Por conseguinte, a PGR entende que, em caso de inação do governo Federal, os Estados podem estabelecer medidas obrigatórias. 

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