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Para especialistas, fim do voto de qualidade acaba com disparidade nos julgamentos do Carf

Advogada afirma que admitir-se a validade de dois votos proferidos pela mesma pessoa na mesma causa, ainda que no exercício de funções diferentes, ofendia a lógica jurídica de um julgamento colegiado e paritário.

25/4/2020

Sem vetos, o presidente Jair Bolsonaro sancionou a conhecida MP do Contribuinte Legal na lei 13.988/20. Publicada no dia 14 de abril, a norma estabelece as diretrizes para transações tributárias e oferece possibilidade de renegociação de dívidas tributárias com a União. Mas, além disso, põe fim ao chamado voto de qualidade no Carf - Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, uma surpresa que atende anseios de especialistas que atuam no órgão.

O voto de qualidade é uma espécie de voto duplo do presidente das turmas ou câmaras do Conselho, cargo sempre ocupado por representantes da Receita. Com isso, o presidente, mesmo após votar em um processo, poderia desempatar o julgamento votando novamente, o que quase sempre culminava em resultado desfavorável ao contribuinte.

A novidade foi acrescentada na MP pouco tempo antes da lei ser sancionada. A Câmara dos Deputados aprovou uma emenda aglutinativa em meados de março. Em votação em sessão virtual do Senado, a emenda foi mantida. Havia grande expectativa de especialistas em Direito Tributário sobre o veto ou não do art. 28 da nova lei. Contrariando orientação do agora ex-ministro da Justiça, Sérgio Moro, Bolsonaro sancionou sem vetos.

A mudança na lei muda radicalmente os julgamentos no tribunal da Receita e, conforme o advogado Willer Tomaz, sócio do Willer Tomaz Advogados Associados: “põe fim ao velho fantasma da disparidade nos julgamentos do órgão”.

“O Carf não é, como deveria ser, um órgão paritário, formado por servidores da Receita Federal e por civis em igualdade numérica, haja vista que os presidentes das turmas representam o Fisco e a eles cabe o voto de minerva, deturpando assim o resultado das votações.”

O especialista ainda ressalta que o tribunal era conhecido como meramente arrecadatório.

“Estudos de jurisprudência já revelaram que o Carf, exatamente por essa disparidade, funciona como um tribunal meramente arrecadatório, de modo que somente entre os anos de 2000 e 2015, 75% de todos os julgamentos foram favoráveis ao Fisco, e 100% dos votos de minerva foram desfavoráveis ao contribuinte.”

Para a advogada Daniela Ferrazzo, do Ogawa, Lazzerotti & Baraldi Advogados, admitir-se a validade de dois votos proferidos pela mesma pessoa na mesma causa, ainda que no exercício de funções diferentes, ofendia a lógica jurídica de um julgamento colegiado e paritário.

“Tal fato contraria a determinação expressa no art. 112, inciso II, do CTN - Código Tributário Nacional (princípio in dubio pro contribuinte), pelo que inclusive esse voto de qualidade já era amplamente questionado pelos contribuintes perante o Poder Judiciário.”

Conforme a tributarista, foi correta a alteração legislativa. “A qual prestigia o princípio in dubio pro contribuinte e poderá, eventualmente, ser invocada pelos contribuintes que tiveram decisões desfavoráveis no passado em razão do voto de qualidade, obviamente desde que respeitado determinados requisitos previstos no art. 106 do CTN.”

A advogada também considera falaciosa a argumentação contrária de alguns especialistas, de que o voto de qualidade deve existir porque a administração não pode, em caso de decisão favorável ao contribuinte, levar a matéria ao Poder Judiciário.

“Em verdade a Administração não pode levar a matéria ao Judiciário porque ela não possui interesse de agir. Havendo processo administrativo regular, a decisão desse feito só pode ser questionada se houver ilegalidade na produção do ato e não sobre seu conteúdo.”

Mas, para Daniela Ferrazzo, adotar entendimento diverso sobre o fim do voto de qualidade é ignorar diversos princípios constitucionais, entre eles o devido processo legal e ampla defesa no processo administrativo.

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