Migalhas Quentes

Políticas de combate e prevenção à automutilação e ao suicídio

Conheça políticas de prevenção e combate ao suicídio no Brasil e no mundo.

17/2/2020

Em 2019, por meio da lei 13.819/19, o governo Federal instituiu a Política Nacional de Prevenção da Automutilação e do Suicídio a ser implementada pela União, em colaboração com os Estados, Municípios e Distrito Federal. Além disso, a lei 13.968/19 criminalizou a indução a automutilação, alterando e ampliando a redação original do artigo 122 do Código Penal.

A novel legislação vem na esteira de um triste cenário: segundo a OMS, a taxa de suicídio na região das Américas apresentou um aumento de 6% entre 2010 e 2016. No mesmo período, o índice global teve queda de 9,8%.

OMS

Às vésperas do Dia Mundial para Prevenção do Suicídio no ano passado, a OMS divulgou um relatório com informações de 183 países sobre suicídio. Segundo o material, com dados coletados até 2016, apesar da taxa de suicídio estar em declínio quanto à média global, o mesmo não é observado em todos os países.

O relatório chama atenção para três importantes pontos: os países desenvolvidos têm as maiores taxas de suicídio; é a segunda principal causa de morte entre jovens meninas na faixa de 15 a 29 anos, e a terceira entre meninos na mesma faixa etária; e a restrição do acesso aos meios usados para cometer o suicídio.

Segundo a OMS, o número de países com estratégias nacionais de prevenção ao suicídio aumentou para 38 nos cinco anos desde a publicação do primeiro relatório global sobre o tema. O órgão afirmou, também, que o número ainda é baixo e que os governos precisam se comprometer a estabelecer as medidas preventivas.

Legislação internacional

Austrália

A abordagem estratégica de prevenção do suicídio do governo estadual de Vitória, na Austrália, procura reduzir pela metade a taxa de suicídios do Estado até 2025. A estratégia envolve cinco objetivos principais:

Escócia

Em 2018, o Governo da Escócia designou um novo plano de ação para manter as estratégias de prevenção realizadas no período de 2013 a 2016. Segundo o texto da nova legislação, na última década, o país "alcançou grande progresso ao tratar desse problema extremamente importante". A norma aponta que, entre os anos de 2002 a 2006 e 2013 a 2017, a taxa de suicídio caiu 20%.

Entre as medidas adotadas pela norma, está a criação e o financiamento de um grupo nacional de liderança e prevenção ao suicídio. O grupo será responsável por fazer recomendações para apoiar o desenvolvimento e a entrega de planos de ação locais de prevenção. Além disso, o governo escocês é encarregado de financiar a criação e a implementação de um novo treinamento em saúde mental e prevenção de suicídio.

Suíça

Em 2016, o parlamento suíço adotou um plano nacional de ação para prevenção do suicídio, que inclui medidas para prevenção seletiva de grupos de pessoas que têm um risco de suicídio acima da média como, por exemplo, idosos, pessoas afetadas pelo desemprego, adolescentes LGBT ou prisioneiros.

Promover intervenções que fortaleçam os recursos pessoais e sociais de crianças, adolescentes, adultos e idosos; conscientizar provedores de informações que estão em contato direto com grupos de risco e informá-los sobre comportamentos suicidas e intervenções eficazes para prevenção; bem como, consolidar serviços de aconselhamento e emergência e promover seu uso, são apenas algumas das dez medidas previstas no plano de ação.

E no Brasil?

Para o advogado e especialista em Direito Digital Luiz Augusto Filizzola D’Urso (D'Urso e Borges Advogados Associados), a legislação brasileira é prematura na questão de prevenção ao suicídio.

“O Brasil precisa se preocupar muito mais com a prevenção, aplicando políticas públicas neste sentido com mais veemência. Prevenir e falar sobre suicídio significa salvar vidas.”

Segundo o promotor de Justiça aposentado Eudes Quintino de Oliveira Júnior, o fato de existirem leis tratando do assunto já abre caminho para que as pessoas possam ter uma dimensão mais abrangente a respeito do suicídio e da automutilação.

“Não que será, como muitos outros temas, discutido nas ruas e até mesmo entre rodas de amigos, mas já é uma abertura para se procurar informações mais apropriadas.”

D’Urso aponta que o problema do suicídio se tornou mais grave quando criminosos passaram a utilizar as redes sociais para estimular e induzir crianças e adolescentes a cometerem o suicídio. Afirma que, com o advento da lei 13.968/19, que criminalizou o induzimento à autolesão corporal, “nota-se, portanto, a preocupação com o legislativo com tal situação, inclusive com jogos e conteúdos perigosos, difundidos nas redes sociais, como foi o caso do jogo Baleia Azul e da boneca Momo”.

Vale lembrar que, em 2017, o desafio da Baleia Azul viralizou nas redes sociais em todo o mundo, incitando os participantes a completarem 50 desafios que, no final, conduziam à morte. Cerca de um ano depois, foi a vez da Boneca Momo ganhar os holofotes e deixar pais e escolas em alerta. Através de mensagens enviadas pelo WhatsApp, a boneca também instigava crianças a realizarem os mais diversos desafios, entre eles o suicídio. 

Atualmente, mais um jogo tem chamado atenção, trata-se do jogo da rasteira: em uma formação em linha reta composta por três pessoas, as duas pessoas na ponta pulam como se performassem uma coreografia; ao ser instigado, o integrante do meio pula e, ao sair do chão, leva uma rasteira e cai no chão. Especialistas apontam para o risco de lesões e fraturas graves e até mesmo morte. 

Quintino, por sua vez, ressalta que a inserção correspondente à prática da automutilação no Código Penal fazia-se necessária, pois tal conduta permanecia no limbo jurídico. Quanto à lei 13.819/19, que institui a Política Nacional de Prevenção da Automutilação e do Suicídio, o ex-promotor acredita confere legitimidade não só para a União como também para a participação da sociedade civil e instituições privadas. 

“Todos, desta forma, ficam envolvidos na busca de orientação e acompanhamento das pessoas com histórico de ideação suicida, automutilações e tentativa de suicídio.”

D’Urso reitera que, ao se tratar de suicídio, é necessário pensar primeiro em prevenção, e ao final em punição àqueles que os induzem. "Um indivíduo só será induzido se fragilizado ou vulnerável, portanto, com prevenção poderemos cuidar tanto daquele que pensa em cometer o suicídio, como naquele que pode ser induzido pelas redes sociais”.

O pensamento é compartilhado por Quintino: "acredito que doravante teremos a implementação das propostas legislativas e poderão ser colhidos ótimos resultados.”

Ligue 188

No Brasil, o CVV – Centro de Valorização da Vida, uma entidade filantrópicase encarrega de fornecer apoio emocional e prevenção do suicídio, atendendo de forma voluntária e gratuita pessoas que sintam necessidade de conversar, sob total sigilo por telefone, e-mail e chat 24 horas todos os dias. 

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