Migalhas Quentes

STF analisará constitucionalidade da execução imediata de pena aplicada por Júri

Plenário virtual já tem cinco votos pela repercussão geral da matéria.

10/10/2019

O plenário do STF vai debater a constitucionalidade da execução imediata de pena aplicada pelo Tribunal do Júri. Na última sexta-feira, 4, foi iniciada a análise da existência de questão constitucional com repercussão geral da matéria.

O relator, ministro Luís Roberto Barroso, votou favoravelmente à repercussão (v. ementa abaixo)Conforme S. Exa., o tema envolve e exame dos princípios da presunção de inocência, da soberania dos veredictos do Tribunal do Júri, da dignidade da pessoa humana e da proibição da proteção insuficiente do estado.

Além de estar relacionado a direitos fundamentais de inegável interesse jurídico, a matéria possui repercussão geral sob os pontos de vista político, na medida em que envolve diretrizes de formulação da política criminal e mesmo de encarceramento, e social, pelos impactos negativos gerados pela sensação de impunidade gerada no meio social diante de condenações graves que, muitas vezes, não são efetivamente cumpridas.

Os ministros Toffoli, Moraes, Marco Aurélio e Rosa também seguiram o entendimento da questão constitucional com repercussão geral.

Os ministros Celso de Mello, Gilmar, Lewandowski, Cármen Lúcia, Fux e Fachin têm até o fim do mês (24) para votar no plenário virtual – de todo modo, mesmo que todos neguem a repercussão, o placar necessário para o julgamento no plenário físico já foi formado.

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Manifestação do ministro Luís Roberto Barroso

Ementa: Direito constitucional e processual penal. Recurso extraordinário. Crimes de Feminicídio duplamente qualificado e Posse irregular de arma de fogo de uso permitido. Condenação pelo Tribunal do Júri. Execução imediata da pena. Presença de repercussão geral.

O Senhor Ministro Luís Roberto Barroso (Relator):

1. Trata-se de recurso extraordinário, interposto pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina, com fundamento no artigo 102, inciso III, alínea "a", da Constituição Federal, contra acórdão da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, assim ementado (fl. 686):

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. TRIBUNAL DO JÚRI. FEMINICÍDIO QUALIFICADO E POSSE DE ARMA DE FOGO. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA. CONDENAÇÃO AINDA NÃO TRANSITADA EM JULGADO OU CONFIRMADA POR COLEGIADO DE SEGUNDO GRAU. EXPEDIÇÃO DE MANDADO DE PRISÃO OBSTADA. AGRAVOREGIMENTAL IMPROVIDO.

1. É pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de que a negativa do direito de recorrer em liberdade somente fundada na premissa de que a decisão condenatória proferida pelo Tribunal do Júri deve ser executada prontamente, sem qualquer elemento do caso concreto para justificar a custódia cautelar, não transitada em julgado ou não confirmada a condenação por Colegiado de segundo grau, torna a prisão ilegal. Precedentes.

2. Agravo regimental improvido.

2. A parte recorrente sustenta a repercussão geral da questão constitucional debatida e que houve ofensa ao artigo 5º, XXXVIII, c, da Constituição Federal. Alega que a execução provisória de condenação proferida pelo Tribunal do Júri decorre do fato de que o reconhecimento da responsabilidade penal, na hipótese, está diretamente relacionado à soberania dos veredictos, que não poderá ser revista pelo Tribunal de apelação. Daí o pedido de conhecimento e provimento do presente recurso extraordinário para determinar a execução provisória da condenação imposta pelo Tribunal do Júri nestes autos.

3. Em contrarrazões, a defesa apresentou os seguintes argumentos: i) ausência de repercussão geral da matéria; ii) o acórdão recorrido está alinhado com a jurisprudência deste STF, no sentido de que não cabe a prisão automática do réu condenado pelo Tribunal do Júri, sendo necessária a demonstração empiricamente motivada da real necessidade do encarceramento; iii) incidência das Súmulas 279, 282, 284 e 356 do STF. Com esses argumentos, postula o não conhecimento deste recurso e, acaso conhecido, o seu desprovimento.

4. É o relatório. Passo à manifestação.

5. O recurso deve ser conhecido. A matéria constitucional está prequestionada e estão presentes os requisitos de admissibilidade. Está em exame aqui a constitucionalidade do imediato cumprimento de pena aplicada pelo Tribunal do Júri.

6. No caso de que se trata, o recorrido foi condenado a uma pena de 26 anos e 8 meses de reclusão e de 1 ano de detenção, em regime fechado, pelos crimes de feminicídio duplamente qualificado e posse de arma de fogo. O réu cometeu o crime no apartamento da vítima, na presença das suas duas filhas, uma com 14 e outra com 2 anos de idade. Vítimas que ficaram precocemente privadas do convívio e orientação materna. Embora o acusado tenha respondido aos termos do processo solto, negou-se ao réu a possibilidade de recorrer da sentença, em liberdade, tendo em vista o princípio da soberania dos veredictos do Tribunal do Júri, nos termos do art. 5º, inciso XXXVI, alínea c, da CF/88.

7. A Constituição Federal prevê a competência do Tribunal do Júri para o julgamento de crimes dolosos contra a vida (art. 5º, inciso XXXVIII, d). Prevê, ademais, a soberania dos veredictos (art. 5º, inciso XXXVIII, c), a significar que os tribunais não podem substituir a decisão proferida pelo júri popular. Partindo desses vetores, hauridos diretamente do texto constitucional, a Primeira Turma desta Corte, no julgamento do HC 118.770, a que fui designado redator para o acórdão, decidiu que não viola o princípio da presunção de inocência ou da não culpabilidade a execução da condenação pelo Tribunal do Júri, independentemente do julgamento da apelação ou de qualquer outro recurso.

8. Essa decisão está em consonância com a lógica do precedente firmado em repercussão geral no ARE 964.246-RG, Rel. Min. Teori Zavascki, já que, também no caso de decisão do Júri, o Tribunal não poderá reapreciar os fatos e provas, na medida em que a responsabilidade penal do réu já foi assentada soberanamente pelo Júri.

9. Por outro lado, reconheço a existência de decisões monocráticas pontuais no âmbito desta Corte, em sentido oposto à jurisprudência que se consolidou na Primeira Turma do STF. Refiro-me, a título de amostragem, ao HC 174.759-MC, Rel. Min. Celso de Mello; e ao HC 176.229-MC, Rel. Min Gilmar Mendes.

10. O tema envolve, portanto, o exame dos princípios da presunção de inocência, da soberania dos veredictos do Tribunal do Júri, da dignidade da pessoa humana e da proibição da proteção insuficiente do estado. Além de estar relacionado a direitos fundamentais de inegável interesse jurídico, a matéria possui repercussão geral sob os pontos de vista político, na medida em que envolve diretrizes de formulação da política criminal e mesmo de encarceramento, e social, pelos impactos negativos gerados pela sensação de impunidade gerada no meio social diante de condenações graves que, muitas vezes, não são efetivamente cumpridas.

11. Diante do exposto, manifesto-me no sentido de reconhecer a repercussão geral da seguinte questão constitucional: saber se a soberania dos vereditos do Tribunal do Júri autoriza a imediata execução de pena imposta pelo Conselho de Sentença.

12. É a manifestação.

 

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