Migalhas Quentes

STF: Ministros trocam farpas sobre omissão de votos no plenário virtual

"Essa presidência faz a leitura do regimento, tenha certeza disso", disse Toffoli a Marco Aurélio após discordância.

9/10/2019

Uma discussão envolvendo omissão de votos no plenário virtual foi protagonizada pelos ministros Dias Toffoli e Marco Aurélio na sessão plenária desta quarta-feira, 9.

O recurso em julgamento (RE 817.338) discutia resolução sobre anistia de militares, e foi apresentada preliminar sobre o não alcance de votos para reconhecimento de questão constitucional no plenário virtual – requisito para admissibilidade do recurso.

Ao iniciar seu voto e tratar da preliminar, o relator, ministro Dias Toffoli, destacou que, de fato, houve cinco votos no plenário virtual pela não existência de matéria constitucional. Mas a CF (art. 102) estabelece que, para o não reconhecimento da repercussão geral é necessária manifestação expressa de pelo menos oito ministros.

Mas Toffoli, relator, concluiu que havia matéria constitucional, e destacou que, conforme previsão regimental, aqueles que não votaram anuíram tacitamente com o relator.

Seguidamente, o ministro Marco Aurélio questionou:

Marco Aurélio
Mas foi aprovado isso, presidente? Penso que não. O voto omissivo, pela omissão?

Toffoli:
Resolução da época da ministra Ellen Grace, já tem mais de dez anos.

Marco Aurélio
Não tenho recordação disso, presidente. Então passamos a ter na magistratura nacional o voto implícito pela omissão daquele que deveria se pronunciar?

Toffoli:
Está na nossa resolução. Resolução aprovada há mais de dez anos, eu nem estava na Corte quando foi aprovada.

Marco Aurélio
Olha que eu tenho lembrança, presidente, de que não passou essa proposta...

Toffoli:
Mas essa presidência faz a leitura do regimento. Tenha certeza disso.

Marco Aurélio
Eu vou pedir ao gabinete para fazer a pesquisa respectiva, sem duvidar da palavra de V. Exa.

Toffoli:
Agradeço a confiança de V. Exa., assim como sempre confio em V. Exa.. E V. Exa. nunca afirmou, apresentou dúvidas.

Neste momento, o ministro Alexandre de Moraes se manifestou, concordando com o que dizia o presidente sobre o Regimento Interno.

Moraes:
Presidente, só para corroborar o que V. Exa. disse. Eu, como mais recente aqui, logo fui analisar e estudar o regimento interno, e quando é proposta realmente a repercussão geral e há omissão, significa a concordância. Da mesma forma o inverso, quando há proposta pela não repercussão geral.

Marco Aurélio:
V. Exa. realmente gosta de ser meu revisor.

Moraes:
Uma honra e um prazer.

Terminada a discussão, Toffoli rejeitou a preliminar.

Regimento interno

O dispositivo citado pelo ministro Toffoli no julgamento desta quarta-feira é a emenda regimental nº 21, datada de 30 de abril de 2007.

Após a norma, o art. 324 do Regimento Interno passou a vigorar com a seguinte redação: 

Art. 324. Recebida a manifestação do(a) Relator(a), os demais ministros encaminhar-lhe-ão, também por meio eletrônico, no prazo comum de 20 (vinte) dias, manifestação sobre a questão da repercussão geral.

Parágrafo único. Decorrido o prazo sem manifestações suficientes para recusa do recurso, reputar-se-á existente a repercussão geral.

Assim, a omissão é computada como voto a favor da existência de repercussão geral no tema.

Plenário virtual

O problema relacionado à omissão por parte dos ministros no plenário virtual, criado em 2007, é antigo. Há mais de cinco anos Migalhas apontou que com mais de 700 questões analisadas à época (fev/14), o plenário virtual contabilizava ínfimos 40 processos nos quais houve manifestação de todos os membros da Corte - apenas em 5% dos casos todos os ministros votaram.

No levantamento, o ministro Marco Aurélio, mesmo conhecidamente crítico do modelo virtual de julgamento, foi o único que não teve nenhuma omissão - não deixou de votar em um processo sequer. Na ocasião, a ministra Cármen Lúcia e o ministro Joaquim Barbosa eram os campeões em omissões, deixando de votar em mais da metade dos temas submetidos à análise.

Mais recentemente, em outubro de 2016, novo levantamento apontou 21% dos casos com a manifestação de todos os ministros da Corte. 

Mais recentemente mostramos que, só em 2018, os ministros analisaram 43 temas, conferindo repercussão geral a 32 destes. E, no cômputo total, apenas nove dos 32 temas com repercussão geral reconhecida contaram com a manifestação de todos os integrantes da Corte, o que representa menos de 30%. 

"Plenário virtual não é plenário"

Em entrevista concedida à TV Migalhas em 2016, o ministro Marco Aurélio fez críticas ao modelo de votação virtual. "Plenário virtual não é plenário: o sentido de colegiado é a troca de ideias, é nos completarmos mutuamente." Assista:

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