Uma discussão envolvendo omissão de votos no plenário virtual foi protagonizada pelos ministros Dias Toffoli e Marco Aurélio na sessão plenária desta quarta-feira, 9.
O recurso em julgamento (RE 817.338) discutia resolução sobre anistia de militares, e foi apresentada preliminar sobre o não alcance de votos para reconhecimento de questão constitucional no plenário virtual – requisito para admissibilidade do recurso.
Ao iniciar seu voto e tratar da preliminar, o relator, ministro Dias Toffoli, destacou que, de fato, houve cinco votos no plenário virtual pela não existência de matéria constitucional. Mas a CF (art. 102) estabelece que, para o não reconhecimento da repercussão geral é necessária manifestação expressa de pelo menos oito ministros.
Mas Toffoli, relator, concluiu que havia matéria constitucional, e destacou que, conforme previsão regimental, aqueles que não votaram anuíram tacitamente com o relator.
Seguidamente, o ministro Marco Aurélio questionou:
Mas foi aprovado isso, presidente? Penso que não. O voto omissivo, pela omissão?
Resolução da época da ministra Ellen Grace, já tem mais de dez anos.
Marco Aurélio:
Não tenho recordação disso, presidente. Então passamos a ter na magistratura nacional o voto implícito pela omissão daquele que deveria se pronunciar?
Toffoli:
Está na nossa resolução. Resolução aprovada há mais de dez anos, eu nem estava na Corte quando foi aprovada.
Marco Aurélio:
Olha que eu tenho lembrança, presidente, de que não passou essa proposta...
Toffoli:
Mas essa presidência faz a leitura do regimento. Tenha certeza disso.
Marco Aurélio:
Eu vou pedir ao gabinete para fazer a pesquisa respectiva, sem duvidar da palavra de V. Exa.
Toffoli:
Agradeço a confiança de V. Exa., assim como sempre confio em V. Exa.. E V. Exa. nunca afirmou, apresentou dúvidas.
Neste momento, o ministro Alexandre de Moraes se manifestou, concordando com o que dizia o presidente sobre o Regimento Interno.
Presidente, só para corroborar o que V. Exa. disse. Eu, como mais recente aqui, logo fui analisar e estudar o regimento interno, e quando é proposta realmente a repercussão geral e há omissão, significa a concordância. Da mesma forma o inverso, quando há proposta pela não repercussão geral.
Marco Aurélio:
V. Exa. realmente gosta de ser meu revisor.
Uma honra e um prazer.
Terminada a discussão, Toffoli rejeitou a preliminar.
Regimento interno
O dispositivo citado pelo ministro Toffoli no julgamento desta quarta-feira é a emenda regimental nº 21, datada de 30 de abril de 2007.
Após a norma, o art. 324 do Regimento Interno passou a vigorar com a seguinte redação:
Art. 324. Recebida a manifestação do(a) Relator(a), os demais ministros encaminhar-lhe-ão, também por meio eletrônico, no prazo comum de 20 (vinte) dias, manifestação sobre a questão da repercussão geral.
Parágrafo único. Decorrido o prazo sem manifestações suficientes para recusa do recurso, reputar-se-á existente a repercussão geral.
Assim, a omissão é computada como voto a favor da existência de repercussão geral no tema.
Plenário virtual
O problema relacionado à omissão por parte dos ministros no plenário virtual, criado em 2007, é antigo. Há mais de cinco anos Migalhas apontou que com mais de 700 questões analisadas à época (fev/14), o plenário virtual contabilizava ínfimos 40 processos nos quais houve manifestação de todos os membros da Corte - apenas em 5% dos casos todos os ministros votaram.
No levantamento, o ministro Marco Aurélio, mesmo conhecidamente crítico do modelo virtual de julgamento, foi o único que não teve nenhuma omissão - não deixou de votar em um processo sequer. Na ocasião, a ministra Cármen Lúcia e o ministro Joaquim Barbosa eram os campeões em omissões, deixando de votar em mais da metade dos temas submetidos à análise.
Mais recentemente, em outubro de 2016, novo levantamento apontou 21% dos casos com a manifestação de todos os ministros da Corte.
Mais recentemente mostramos que, só em 2018, os ministros analisaram 43 temas, conferindo repercussão geral a 32 destes. E, no cômputo total, apenas nove dos 32 temas com repercussão geral reconhecida contaram com a manifestação de todos os integrantes da Corte, o que representa menos de 30%.
"Plenário virtual não é plenário"
Em entrevista concedida à TV Migalhas em 2016, o ministro Marco Aurélio fez críticas ao modelo de votação virtual. "Plenário virtual não é plenário: o sentido de colegiado é a troca de ideias, é nos completarmos mutuamente." Assista: