Yom Kippur
Mesário de religião judaica convocado para trabalhar no dia das eleições é liberado
O advogado Hugo Chusyd, do escritório Ribeiro Advogados Associados, não se conformou com a decisão e, juntamente com o advogado José Horácio Halfeld Rezende Ribeiro - da mesma banca -, impetrou MS (v. abaixo) contra o ato do juiz. Isso porque neste ano o Yom Kippur (Dia do Perdão), data sagrada para a comunidade judaica, ocorre dia 2/10, dia seguinte ao pleito.
E, ontem veio à luz a ansiada decisão. A juíza Salette Nascimento deferiu a liminar, liberando-o “dos trabalhos eleitorais no dia 1º de outubro p.f, coincidente com a celebração do Yom Kipur, invocando o disposto no art. 5º, VI da Constituição Federal.”
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TSE determina que mesários judeus trabalhem nas eleições
A Confederação Israelita do Brasil fracassou na tentativa de impedir que judeus fossem convocados como mesários na eleição de 1.º de outubro, data que coincide a mais importante celebração do calendário judaico: o Yon Kippur, o Dia do Perdão.
Os ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) rejeitaram um pedido da entidade para que fosse concedida uma dispensa ampla a todos os judeus. A confederação também não conseguiu que os prédios ligados à comunidade judaica, como escolas, deixassem de ser usados como locais de votação.
Durante o julgamento, os ministros do TSE ponderaram que se o pedido fosse atendido poderia abrir um precedente para que praticantes de outras religiões fizessem solicitações semelhantes.
Mas, apesar de terem rejeitado o pedido, os integrantes do tribunal ressaltaram que situações específicas podem ser analisadas por juízes eleitorais. "Ressalvo a possibilidade de o juiz eleitoral analisar caso a caso. Acho perigosa a generalidade", afirmou o relator do caso, ministro José Delgado.
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EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ PRESIDENTE DO TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO ESTADO DE SÃO PAULO
Mandado de Segurança com pedido liminar
HUGO CHUSYD, brasileiro, solteiro, advogado, portador do RG n.º 28.051.557-1 – SSP/SP e do CPF n.º 220.006.418-73, inscrito na 251ª Zona Eleitoral do Estado de São Paulo sob o número 2826400301/75 (doc. 1), residente e domiciliado à Rua Tucumã, 746, 5º andar, <_st13a_personname productid="em São Paulo" w:st="on">em São Paulo, Capital, CEP: 01455-010, por seu procurador infra-assinado (doc. 2), vem, muito respeitosamente, a presença de Vossa Excelência, impetrar o presente MANDADO DE SEGURANÇA, com pedido liminar, com fulcro no artigo 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal, c.c. artigo 23, inciso I, alínea “g”, do Regimento Interno deste Tribunal, bem como na Lei 1.533/51, contra ato ilegal praticado pelo meritíssimo Juiz da 251ª Zona Eleitoral de São Paulo, Dr. João Carlos Sá Moreira de Oliveira, conforme argumentos que seguem:
I – DOS FATOS
No início de agosto do corrente ano, o impetrante recebeu correspondência da 251ª Zona Eleitoral de São Paulo comunicando-lhe que o mesmo fora escolhido para compor Mesa Receptora de Justificativas nas eleições de 1 de outubro de 2006, devendo comparecer ao cartório eleitoral no dia 17 de agosto próximo (doc. 3).
Comparecendo ao cartório eleitoral na data indicada, o impetrante foi intimado da nomeação que recebera, devendo trabalhar como 1º Secretário da 9091 Mesa Receptora de Justificativas, localizada no Colégio Madre Alix, <_st13a_personname productid="em São Paulo" w:st="on">em São Paulo, Capital (doc. 4).
Na mesma ocasião de sua intimação, o impetrante protocolizou junto ao cartório eleitoral requerimento de dispensa, fundado em motivos religiosos (doc. 5).
O referido requerimento de dispensa foi indeferido pela autoridade coatora, sem ser fundamentado, nos seguintes termos:
“V. Indefiro o pedido de dispensa, porém autorizo a saída às 15h00. São Paulo, 18/8/06”. (doc. 6).
Inconformado, o impetrante protocolizou junto ao cartório eleitoral, no dia 24 de agosto, um pedido de reapreciação da r. decisão que indeferiu o requerimento de dispensa, expondo com detalhes os motivos da impossibilidade de conciliação da atividade civil com a religiosa (doc. 7).
Neste requerimento, foi explicado à autoridade coatora que no dia 1 de outubro de 2006, precisamente às 17h45 horas, terá início o dia máximo do calendário judaico, o chamado Yom Kipur, ou Dia do Perdão.
Trata-se de um dia de extrema solenidade, marcado por jejum e preces, em que o principal objetivo é pedir perdão ao próximo e a D'us por todas as transgressões cometidas no ano que se passou, voluntárias ou não.
Por vinte e cinco horas, os judeus maiores de idade devem se abster de comer, beber e lavar-se, dentre outras proibições.
Sendo assim, argumentou-se que é necessária uma preparação antes do início deste festival, para que seja possível suportar, sem prejuízo do princípio constitucional da dignidade humana, as vinte e cinco horas de jejum e penitências que se seguirão.
Neste sentido, o impetrante concluiu que uma eventual liberação às 15h, não será suficiente para possibilitar que o jovem judeu convocado para as eleições descanse e se alimente para estar na sinagoga às 17h45 (horário de início das rezas).
Outrossim, explicou-se que a véspera de Yom Kipur, além de demandar tempo para a referida preparação, é marcada por diversas obrigações religiosas, verbis:
“Na madrugada da véspera de 'Yom Kipur', deve-se fazer 'caparot', ritual em que cada judeu toma para si um galo ou uma galinha, e os entrega a um abatedor, o qual procederá ao abate do animal na sua frente, com a intenção de despertar sentimentos de remorso pelas transgressões cometidas durante o ano, visando evitar novas infrações no futuro.
Já na parte da manhã, há um antigo costume de ao final do serviço religioso matinal, ser distribuído aos fiéis um pedaço de bolo de mel, sendo que cada indivíduo deve pedir o seu. A explicação é a de que no caso de ser decretado que durante o ano a pessoa precise mendigar, que a mesma não tenha a necessidade de pedir nada a mais do que um pedaço de bolo.
Outro preceito religioso é o de comer e beber o dobro do que o costumeiro, por este dia e pelo dia de 'Yom Kipur'. Por esta razão, duas refeições são realizadas durante a véspera: uma pela manhã; e outra durante a tarde.
Cite-se também, como costume tradicional, o recebimento de 39 chicotadas simbólicas, antes da oração da tarde. Usa-se um cinto de couro, e bate-se com este levemente nas costas do indivíduo, que deverá estar curvado, apoiado sobre os joelhos. É uma tradição voltada a despertar os corações para o arrependimento e o retorno a D'us.
Destaque-se ainda a obrigação religiosa de imersão no 'micvê', uma piscina de água da chuva destinada à purificação, para que se possa entrar com pureza no dia sagrado.
Esta obrigação religiosa restringe-se a uma única imersão, porém muitos tem o costume de se emergir em três diferentes momentos do dia.
Há ainda o costume de visitação de cemitérios judaicos, o qual é fundado em diversos motivos. Um deles é o de que a visão da morte motiva o arrependimento.
Durante todos os dias do ano o judeu é obrigado a dar caridade, porém na véspera de 'Yom Kipur' essa obrigação é maior ainda, pois a caridade é uma proeminente fonte de mérito e serve como proteção contra maus decretos.
'Yom Kipur' não tem o condão de perdoar o pecado entre uma pessoa e seu próximo até que o primeiro tenha pedido perdão ao seu semelhante. A véspera de 'Yom Kipur', portanto, é o momento final para as devidas retratações, antes que 'o julgamento seja selado'.
Um outro costume é o de os pais abençoarem os filhos e as filhas antes de se dirigirem à sinagoga, desejando que tenham uma longa vida, com temor a D'us.
Por fim, deve-se acender velas em homenagem ao festival que se aproxima, com a antecedência mínima de 18 minutos do pôr do sol.” (doc. 8)
Ao final deste pedido de reapreciação, chegou-se a conclusão de que afigura-se incompatível o trabalho eleitoral com as obrigações religiosas, motivo pelo qual se faz necessária a concessão de dispensa.
Outrossim, registrou-se a vontade do impetrante de trabalhar no 2º Turno da eleição que se aproxima, bem como de ser novamente convocado pela Justiça Eleitoral na próxima eleição, como forma de repor a sua ausência.
Mesmo diante de todos os argumentos expostos, a autoridade coatora manteve o indeferimento do requerimento de dispensa, novamente sem fundamentar a sua decisão, verbis:
“V. Mantenho o indeferimento do pedido de dispensa, autorizando a saída às 15h00. Dê se ciência. S Paulo, 24/8/06”. (doc. 9).
Ante o duplo indeferimento do pedido de dispensa, não resta alternativa ao impetrante, senão a de se socorrer do presente mandado de segurança, como forma de assegurar a sua liberdade religiosa que se encontra ameaçada!
II – DO DIREITO LÍQUIDO E CERTO
Da ausência de fundamentação
Como se vê das decisões que indeferiram o pedido de dispensa (docs. 6 e 9), ambas não foram fundamentadas!
Há, portanto, gritante contrariedade ao artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, que diz:
“todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação”. (nossos realces).
Data venia, a ausência de fundamentação caracteriza a ilegalidade e a arbitrariedade das decisões impugnadas, o que é inadmissível <_st13a_personname productid="em um Estado Democrático" w:st="on">em um Estado Democrático de Direito!
Da inexistência de dispensa parcial
Verifica-se das r. decisões da autoridade coatora (docs. 6 e 9), que ambas dispensaram o impetrante às 15h.
A dispensa parcial, contudo, é inviável, visto que não está prevista em lei.
Admitindo-se a dispensa parcial, as mesas receptoras de votos e de justificativas ficariam desfalcadas de seus membros a partir de determinado horário, comprometendo o trabalho eleitoral!
Neste sentido, salientamos a preocupação do legislador com o comparecimento dos convocados, expressada no artigo 124, caput e parágrafos 3º e 4º da Lei 4.737/65, verbis:
“O membro da mesa receptora que não comparecer no local, em dia e hora determinados para a realização de eleição, sem justa causa apresentada ao juiz eleitoral até 30 (trinta) dias após, incorrerá na multa de 50% (cinqüenta por cento) a 1 (um) salário-mínimo vigente na zona eleitoral cobrada mediante sêlo federal inutilizado no requerimento em que fôr solicitado o arbitramento ou através de executivo fiscal.
§ 3º - As penas previstas neste artigo serão aplicadas em dôbro se a mesa receptora deixar de funcionar por culpa dos faltosos.
§ 4º - Será também aplicada em dôbro observado o disposto nos §§ 1º e 2º, a pena ao membro da mesa que abandonar os trabalhos no decurso da votação sem justa causa apresentada ao juiz até 3 (três) dias após a ocorrência”. (nossos realces)
Como se vê, o legislador estabelece altas penas pecuniárias aos mesários que deixarem de comparecer, ou que comparecendo, abandonarem os trabalhos no decurso da votação, quando estes não apresentarem justa causa ao juiz eleitoral.
Este é exatamente o caso do impetrante: Há justa causa que o impeça de trabalhar no dia das eleições.
Assim, o trabalho eleitoral que será realizado no dia 1 de outubro de 2006, na 9091 Mesa Receptora de Justificativas, localizada no Colégio Madre Alix, está sendo desnecessariamente posto em risco.
Por que não dispensar o impetrante, e convocar outro eleitor em seu lugar, assegurando desta forma o bom andamento dos trabalhos eleitorais?
E frise-se: o impetrante registrou e novamente registra a sua vontade de trabalhar no 2º Turno da eleição que se aproxima, bem como de ser novamente convocado pela Justiça Eleitoral na próxima eleição, como forma de repor a sua ausência.
Do direito à liberdade religiosa
O direito à liberdade religiosa é constitucionalmente assegurado, conforme determina o inciso VI do artigo 5º da Constituição Federal, verbis:
“É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”. (nossos realces).
Ressalte-se também o artigo 18 da Declaração Universal dos Direitos Humanos - proclamada pela Assembléia Geral das Nações Unidas em 1948 - da qual o Brasil é signatário, verbis:
“Everyone has the right to freedom of thought, conscience and religion; this right includes freedom to change his religion or belief, and freedom, either alone or in community with others and in public or private, to manifest his religion or belief in teaching, practice, worship and observance”. (nossos realces).
Em português:
“Toda a pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou de crença, assim como a liberdade de manifestar a religião ou crença, sozinho ou em comum, tanto em público como em privado, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pelos ritos”. (nossos realces).
A r. decisão impugnada, ao indeferir o requerimento de dispensa, determinou ao impetrante que trabalhe durante o dia 1 de outubro de 2006 em prol da Justiça Eleitoral.
No entanto, por coincidir o dia 1 de outubro de 2006 com a data máxima do calendário judaico, o chamado Yom Kipur¬ – Dia do Perdão, a obrigação que foi imposta ao impetrante de trabalhar em prol da Justiça Eleitoral neste dia, o impedirá de cumprir com os seus deveres religiosos.
Em outras palavras, A R. DECISÃO IMPUGNADA NÃO ASSEGURA AO IMPETRANTE O LIVRE EXERCÍCIO DO CULTO RELIGIOSO, contrariando, destarte, direito líquido e certo assegurado no inciso VI do artigo 5º da Constituição Federal, e no artigo 18 da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Outrossim, data venia, verifica-se que a r. decisão impugnada, além de ilegal, desrespeita e menospreza a religião judaica.
Destarte, não há razão para negar a dispensa do impetrante, convocando-se outro eleitor em seu lugar, de forma a respeitar, assim, o credo alheio, bem como a evitar, de forma prudente, que seja conturbado o trabalho da mesa receptora de justificativas.
III – DO PEDIDO LIMINAR
Determina o artigo 7º, inciso II, da Lei 1.533/51, verbis:
“Ao despachar a inicial, o juiz ordenará:
II - que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido quando for relevante o fundamento e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja deferida”.
São dois, portanto, os requisitos justificadores da concessão da liminar: fundamento relevante e risco de ineficácia da medida.
Quanto ao fundamento relevante, destaca-se a inconstitucionalidade da decisão que indeferiu a dispensa do impetrante, pois como já exposto alhures, o inciso VI do artigo 5º da Constituição Federal restou contrariado.
No tocante ao risco de ineficácia da medida, ou seja, a necessidade da prestação da tutela de urgência antes da concessão final da ordem, esta é patente, visto que as eleições estão muito próximas, marcadas para menos de três semanas da presente data.
Sendo assim, diante do risco do presente mandado de segurança não ser julgado a tempo, faz-se necessária a concessão de liminar, dispensando o impetrante dos trabalhos eleitorais no dia 1 de outubro de 2006.
IV - DO PEDIDO
Ex positis, requer-se a concessão da segurança, para que seja o impetrante dispensado dos trabalhos eleitorais no dia 1 de outubro de 2006, em razão da justa causa pelo credo religioso, com fulcro no inciso VI do artigo 5º da Constituição Federal, bem como no artigo 18 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário, postulando-se a concessão da medida liminar, antes mesmo do recebimento das informações da autoridade apontada como coatora, dando-se vista ao digno representante do Ministério Público, registrando-se novamente a intenção do impetrante de trabalhar no 2º Turno da eleição que se aproxima, assim como a de ser convocado pela Justiça Eleitoral na próxima eleição, como forma de repor a sua ausência, fazendo-se, assim, a mais cristalina,
J U S T I Ç A !
Dá-se a causa o valor de R$ 1.000,00
Termos em que,
Pede deferimento.
São Paulo, 12 de setembro de 2006.
JOSÉ HORÁCIO HALFELD REZENDE RIBEIRO
OAB/SP 131.193
HUGO CHUSYD
OAB/SP 242.345
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