Nem todos os artigos da Constituição foram votados pela Assembleia Constituinte. Assim revelou, após cumprir pacto de 15 anos de silêncio, o ministro aposentado do STF e constituinte de 88 Nelson Jobim.
A revelação foi feita em 2003, ao jornal O Globo. Jobim contou ao matutino que houve a inserção de dois artigos "de última hora" no texto constitucional. Um dos artigos enxertados é o 2º, que trata da separação de Poderes:
Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
Houve também introdução de artigo sobre a autonomia das universidades.
Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.
Em entrevista ao Migalhas, Jobim narrou a história da Constituinte e explicou como e por que isto se deu. Assista.
De acordo com Jobim, terminado o primeiro turno de votações dentro da Assembleia, percebeu-se que ainda faltava muita coisa. No segundo turno, a rigor, só poderiam ser votados temas que já haviam sido votados anteriormente. O que não conseguisse maioria absoluta, por sua vez, saia do texto.
Quando o documento foi para a comissão de redação, veio o problema: verificou-se a falta de assuntos importantes, como a questão da independência e harmonia entre os Poderes. Segundo Jobim, não havia motivo para não estar no texto, já que a questão havia sido discutida.
Houve, então, uma reunião da comissão de redação, e, por concordância unânime, decidiu-se introduzir o artigo, mesmo sem votação.
Ao votar o texto final, Ulysses, presidente da Assembleia, fez uma votação não simbólica para ratificar o que aconteceu. "A Constituinte, na época, era soberana. Podia decidir a forma como bem entendesse."
Polêmica
A revelação gerou grande polêmica. À época, o ministro foi duramente criticado, chegando até a falar-se em impeachment. Outros magistrados, por sua vez, saíram em defesa de Jobim, como Flávio Dino, juiz Federal e ex-presidente da Ajufe:
"Somente um formalismo jurídico extremado e torto pode conduzir ao raciocínio de que o descumprimento de normas regimentais abala a legitimidade ou a validade jurídica da Constituição de 1988."
O assunto acabou sendo encaminhado à Comissão de Estudos Constitucionais da OAB, para possíveis providências. Ao final, a OAB rejeitou as três representações contra o ministro.