Migalhas Quentes

Impenhorabilidade de salário pode ser excepcionada se preservado valor que garanta dignidade do devedor

Decisão é da Corte Especial do STJ.

4/10/2018

A regra geral da impenhorabilidade de salários, vencimentos, proventos etc. (art. 649, IV, do CPC/73; art. 833, IV, do CPC/15), pode ser excepcionada quando for preservado percentual de tais verbas capaz de dar guarida à dignidade do devedor e de sua família. Foi o que decidiu a Corte Especial do STJ nesta quarta-feira, 3, nos termos do voto do ministro Benedito Gonçalves, relator.

O colegiado julgou embargos de divergência em que se discute se a regra de impenhorabilidade das verbas previstas no art. 649, IV, do CPC/73 encontra exceção apenas para o pagamento de verba alimentar ou se também se deverá permitir a penhora de parte de tais verbas no caso de a proporção penhorada do salário do devedor se revelar razoável, de modo a não afrontar a dignidade ou subsistência do devedor e de sua família.

Relator, o ministro Benedito Gonçalves destacou em seu voto que o caso dos autos é bastante ilustrativo da complexidade da questão relativa à impenhorabilidade das verbas que representam a remuneração pelo trabalho ou proventos de aposentadoria. “É que, em um primeiro momento, tais verbas destinam-se à manutenção do devedor e de sua família, que recebem do Código de Processo Civil proteção com o fim de que possam manter sua subsistência, seu mínimo essencial e, quiçá, um padrão de vida ao qual já estejam habituados.” 

Sob outra perspectiva, o ministro pontuou que o processo civil em geral, nele incluída a execução civil, é orientado pela boa-fé que deve reger o comportamento dos sujeitos processuais (art. 5º do CPC/15). 

“Para além do dever de portar-se processualmente de acordo com os preceitos da boa-fé, as partes têm direito ao tratamento processual isonômico, o que se revela na execução civil como o direito a receber tratamento jurisdicional que saiba equilibrar, de um lado, o direito do credor à satisfação do crédito executado e, de outro, o direito do devedor a responder pelo débito com a preservação de sua dignidade.”

Isto considerado, o relator ressaltou que estavam em questão, potencialmente contrapostos, direitos fundamentais das partes. “De um lado, o credor tem direito ao Estado de Direito, ao acesso à ordem jurídica justa, ao devido processo legal processual e material. De outro, também o devedor tem direito ao devido processo legal, que preserve o mínimo existencial e sua dignidade."

Segundo o relator, aos casos de impenhorabilidade (e sua extensão), só se revela necessária, adequada, proporcional e justificada a impenhorabilidade daquela parte do patrimônio do devedor que seja efetivamente necessária à manutenção de seu mínimo existencial, à manutenção de sua dignidade e da de seus dependentes. 

No caso dos autos, a remuneração líquida percebida pelo embargante é de R$ 20.996,00 e foi feita a penhora de 30% deste valor.

Para Benedito, o devedor, mesmo com a penhora de percentual de seus rendimentos (definido pelo Tribunal local e mantido pela 3ª turma da Corte), é capaz de manter bom padrão de vida para si e para sua família, muito superior à média das famílias brasileiras.

De acordo com o ministro, caso se afirmasse que os vencimentos do devedor, nestes autos, são 100% impenhoráveis, “estar-se-ia chancelando o comportamento de qualquer pessoa que, sendo servidor público, assalariado ou aposentado, ainda que fosse muito bem remunerada, gastasse todas as suas rendas e deixasse de pagar todas as suas dívidas, sem qualquer justificativa.

“Tal comportamento não merece proteção judicial. Ao contrário. Aquele que tem um título executívo líquido, certo e exigível é quem tem o direito a receber tutela jurisdicional que confira efetividade, na medida do possível e do proporcional, a seus direitos materiais.”

Desta forma, o ministro negou provimento aos embargos por concluir que foi correta a interpretação que a 3ª trma deu à regra de impenhorabilidade das verbas previstas no art. 649, IV, do CPC/73, com a admissão de uma exceção implícita para o caso em que a penhora de parte dos vencimentos do devedor não é capaz de atingir a dignidade ou a subsistência do devedor e de sua família.

O entendimento foi acompanhado pela maioria da Corte Especial. 

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