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Arma branca pode voltar a ser majorante em crime de roubo

Entenda os reflexos e reviravoltas de lei que excluiu a majorante do CP.

26/6/2018

O emprego de armas brancas pode voltar a ser majorante de pena em crimes de roubo. A previsão, que constou no Código Penal desde 1940, foi excluída em abril deste ano pela lei 13.654/18, pela qual apenas o uso de arma de fogo figura como agravante.

A reviravolta pode se dar porque tramita no Senado o PLS 279/18, que prevê aumento entre um terço e metade da pena para quem usar esse tipo de arma no crime. O texto está na pauta e pode ser votado ainda nesta terça-feira, 26.

A proposta teve origem na CCJ após uma série de questionamentos de especialistas em Direito Penal e integrantes do Judiciário diante da mudança no CP. Afinal, teria sido um erro excluir as armas brancas do texto?

Para a 4ª câmara de Direito Criminal do TJ/SP, sim. Ao julgar recurso do MP/SP em ação sobre roubo, o colegiado reconheceu o vício formal do dispositivo da nova lei, afirmando que a norma, neste ponto, não teve a devida apreciação pelo Congresso. Assim, entendeu pela inconstitucionalidade do artigo 4º da lei 13.654/18, suspendeu o julgamento do mérito do recurso e determinou a instauração de incidente de inconstitucionalidade com remessa ao órgão especial da Corte.

Em outro caso, também no Estado de SP, um juiz de Direito reconheceu incidentalmente a inconstitucionalidade do texto e, ignorando previsão da nova lei, majorou a pena do condenado pelo uso de um facão.

Mas, diferentemente da Corte estadual, na última sexta-feira o STJ aplicou a nova lei, e a 6ª turma afastou majorante pelo emprego de arma branca, reduzindo pena de condenado. A ministra relatora, Maria Thereza de Assis Moura, destacou que há de se reconhecer a existência de nova lei mais benéfica ao condenado, devendo ela retroagir (conforme previsto na CF, art. 5º, XL) para alcançar os roubos cometidos com emprego de arma branca, beneficiando o réu.

Os advogados Ricardo Pagés e Tiago Caruso, do escritório David Rechulski, Advogados, explicam que, por tratar-se claramente de uma norma penal mais benéfica (novatio legis in mellius), ela aproveitará não apenas aos acusados cujos processos estejam em curso, como também retroagirá para alcançar aqueles já condenados por roubo com o emprego de arma branca. "No caso destes, competirá ao juízo da execução o cálculo da nova pena, nos termos do artigo 66, inciso I, da lei de execuções penais ("Art. 66. Compete ao Juiz da execução: I - aplicar aos casos julgados lei posterior que de qualquer modo favorecer o condenado”). Aqueles poderão requerer o afastamento da causa de aumento de pena via recursos próprios e habeas corpus."

A decisão do STJ não vincula os demais juízes e tribunais, mas serve de precedente a ser sopesado. Do mesmo modo, eventual decisão do órgão especial do TJ/SP pela inconstitucionalidade da lei se daria apenas em caráter incidental.

Ex-crime?

As discussões sobre os efeitos do novo texto lembram o caso do cloreto de etila, famoso lança-perfume. A substância constava da lista de substâncias psicotrópicas de uso proibido no Brasil, mas, com a publicação da resolução 104, em 7 de dezembro de 2000, pela Anvisa, o item foi excluído da lista. Oito dias depois, 15/12/00, o cloreto de etila foi reincluído no rol por nova portaria da agência reguladora. Neste caso, teria sido um erro?

Não se sabe. O fato é que, por oito dias, o lança-perfume deixou de ser crime.

Em decorrência daquela exclusão, em 2010 a 2ª turma do STF extinguiu punibilidade de acusado de comercializar lança-perfume em 1998. O ministro Cezar Peluso, relator do HC 94.397, ressaltou que o efeito concreto da primeira resolução 104 da Anvisa foi retirar o consumo, porte e tráfico do lança-perfume do rol de substâncias alcançadas pela antiga lei de drogas (lei 6.368/76). Assim, pelo princípio constitucional da retroatividade da lei penal mais benéfica, haveria que se considerar extinta a punibilidade dos acusados de consumo, porte ou tráfico de lança-perfume até a data da edição da segunda Resolução 104 da Anvisa, em 15 de dezembro de 2000.

Em 2015, o entendimento foi novamente aplicado. Relembrando o precedente, o ministro Celso de Mello concedeu HC (120.026) para invalidar condenação criminal de uma pessoa por tráfico de drogas por estar transportando frascos de "lança-perfume". Para o ministro, tratou-se de abolitio criminis temporária, uma vez que o cloreto de etila foi excluído da lista de substâncias entorpecentes proibidas, descaracterizando "a própria tipicidade penal da conduta do agente".

"A exclusão do cloreto de etila da lista de substâncias psicotrópicas vedadas editada pelo órgão competente do Poder Executivo da União Federal faz projetar, retroativamente, os efeitos da norma integradora mais benéfica, registrando-se a abolitio criminis em relação a fatos anteriores à sua vigência relacionados ao comércio de referida substância, pois, em tal ocorrendo, restará descaracterizada a própria estrutura normativa do tipo penal em razão, precisamente, do desaparecimento da elementar típica 'substância entorpecente ou que determina dependência física ou psíquica'".

Da mesma forma, caso o projeto que tramita no Senado acerca do uso de arma branca como majorante seja aprovado, a lei 13.654/18 continuará a ser aplicada aos fatos praticados durante a sua vigência e, inclusive, aos praticados anteriormente à sua entrada em vigor, devido à manutenção da retroatividade da norma penal mais benéfica, conforme explicam os advogados Pagés e Caruso, ainda que tenha ela sido revogada antes do julgamento do caso. Já os fatos praticados posteriormente à entrada em vigor da lei que poderá decorrer do PLS serão regulados por essa nova lei, ainda que mais grave.

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