A autora, para conseguir ministrar suas aulas, dependia da vontade de uma servidora em entregar as chaves da sala, e que, a despeito de ter sido solicitada a abrir a sala, informou que “só abre a sala para professor”, não reconhecendo, portanto, a condição profissional da transexual.
Em 1º grau, o juízo da 7ª vara de Natal/RN fixou na sentença que o depoimento da testemunha no sentido de que a servidora agiu com preconceito e o fato de que a servidora já sabia que a autora era professora comprovam que houve preconceito transfóbico, em razão da identidade de mulher transexual da autora.
Desorganização administrativa
O juiz Federal Almiro Lopes, relator do recurso, afirmou na decisão ser “inacreditável” que se instaure “um verdadeiro incidente de reconhecimento como condição prévia para a existência da aula”.
“Tal implica uma assunção de risco desnecessária, na medida em que o professor só conseguirá ingressar e cumprir o seu mister após ser identificado - e eventualmente aceito - como tal por algum dos funcionários da ré, ficando, caso contrário, diante da porta trancada da sala de aula.”
O relator considera que, sendo mesmo necessário que exista tal controle, caberia à UFRN promover os meios para que aqueles que são responsáveis pela abertura das salas saibam identificar os professores e que a sala esteja pontualmente aberta no instante em que a aula deve começar.
“Qualquer coisa diversa disso, com o perdão do trocadilho, é porta aberta para o problema, além de ser por si lamentável, pois minutos que deveriam ser dedicados ao aprendizado são perdidos por pura e simples desorganização administrativa.”
Almiro Lopes apontou como verdadeiro constrangimento a figura de um professor diante de uma sala trancada rodeado por seus alunos. “Infelizmente, chega mesmo a ser emblemática, e, nas mãos de alguém mais talentoso, daria um belo ensaio sobre a realidade da educação no Brasil.”
Ainda, conforme os autos, as chaves eventualmente eram entregues nas mãos dos próprios alunos.
Especificamente quanto ao dano moral, o colegiado concluiu que um professor barrado na porta de sua sala sofrerá o justo receio de sua autoridade, requisito imprescindível para desenvolver sua atividade.
“A discriminação pessoal não comporta justificativa e é censurável sendo até mesmo irrelevantes do ponto de vista jurídico, ao menos na seara cível, os motivos. Tratar um ser humano como não-semelhante é igualmente reprovável, seja o outro negro, branco, feio, bonito, heterossexual, homossexual, transgênero, masculino, feminino."
Dessa forma, apontou, a reparação por dano moral é necessária, e o valor fixado na origem (R$ 15 mil) como razoável. O advogado Felipe Neves Rodrigues atuou na causa pela professora.
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Processo: 0505346-54.2016.4.05.8400