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STF pode não mais dar ordem de ofício em HC não conhecido

Debate acerca do tema ocorreu na 1ª turma, que tem os ministros Barroso, Marco Aurelio, Fux, Rosa e Fachin.

29/6/2016

Algo comum para os que advogam no STF é ter o remédio heroico não conhecido pela Corte, mas por outro sair-se com ele ministrado. Com efeito, muitas vezes não se conhece do HC, e mesmo assim concede-se a ordem de ofício. Essa situação aparentemente contraditória, no entanto, pode estar com os dias contados.

Na sessão da 1ª turma nesta terça-feira, 28, veio à baila a discussão da pertinência de tal prática, quando os ministros julgavam HC cujo paciente era Silval da Cunha Barbosa, que foi governador do MT no período de 2010/14. Silval é acusado de lavagem de dinheiro e organização criminosa no âmbito da operação Sodoma – que investiga a extorsão de empresários que tinham contratos com a Administração Pública.

Foi impetrado habeas no STF – em que atua o advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, o mundialmente conhecido Kakay - contra decisão do STJ que indeferiu liminarmente o HC 355.308/MT. O habeas corpus impugnava decisão proferida pelo relator, no TJ/MT, que, em 9 de abril de 2016, indeferiu a liminar nos autos de outro HC (49754/2016). Objetivo era a revogação da decisão proferida pelo Juízo da 7ª vara Criminal de Cuiabá/MT, para o fim de revogar ou anular a prisão preventiva do ex-governador, autorizando-o a responder ao processo em liberdade, aplicando, se fosse o caso, medida cautelar alternativa.

Na impetração afirma-se, acerca da súmula 691 ("não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar"), que os fundamentos invocados, que evidenciam a teratologia da decisão impugnada, são suficientes para justificar a mitigação do seu enunciado.

Supressão de instância

Em parecer, a subprocuradora-Geral da República Cláudia Sampaio Marques opinou pelo não conhecimento do HC por supressão de instância, tendo em vista que o tema ainda está pendente de julgamento no TJ.

Segundo a subprocuradora, “a defesa do paciente adotou uma prática que se revelou comum na quase totalidade dos casos, qual seja, a impetração de um primeiro habeas corpus no Tribunal de Justiça; com o indeferimento da liminar, a imediata impetração de outro habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça e, com o indeferimento da liminar ou com a extinção do feito, a impetração de um terceiro habeas corpus nessa Suprema Corte. Todas essas impetrações, em regra, acontecem em curtíssimo prazo, chegando o paciente ao Supremo Tribunal Federal em poucos dias após a prisão, sem que tenha havido decisão sobre a custódia pelo Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso ou pelo Superior Tribunal de Justiça”.

Essa prática, inegavelmente perniciosa, configura um modo de transgredir as regras de competência, permitindo aos Impetrantes que a pretensão seja julgada originariamente pelo Supremo Tribunal Federal, sem que tenha havido decisão das instâncias anteriores sobre a legalidade da prisão preventiva.”

O parquet opinou pelo acerto da decisão impugnada ao invocar o enunciado da súmula 691 dessa Corte, "ressaltando a inexistência de situação de flagrante ilegalidade, tendo em vista se fazerem presentes os pressupostos da prisão preventiva do paciente".

Vulgarização

Com o caso em pauta na 1ª turma, Cláudia Sampaio tornou a manifestar a opinião: “Se a coisa está sub judice no Supremo, eles estão aguardando a decisão do Supremo. O Supremo tem que cortar essa prática. Diz que não cabe o HC mas analisa de qualquer maneira? Todos sabem que o HC vai ser analisado no mérito. (...) Na prática, esse não conhecimento não vale de nada. Se a Corte afirma que não tem competência, não pode julgar. O constituinte previu o habeas corpus para violações à liberdade de locomoção por ato ilegal. Todos ficam esperando já que o Supremo vai julgar.”

De acordo com a subprocuradora-Geral, a Corte Suprema tem se transformado em Casa que julga apenas HC’s. Acompanhe a íntegra da sustentação:


O relator do HC, ministro Fachin, votou pelo não conhecimento do habeas, de acordo com a jurisprudência da Casa, e, antes de tratar da concessão ou não de ofício, o ministro Fux antecipou-se a favor da posição do MPF. Segundo o ministro, os argumentos da subprocuradora deveriam ser levados em consideração.

Efetivamente, nós estamos trocando seis por meia dúzia. O Supremo Tribunal Federal não conhece mas analisa o mérito para conceder ou não de ofício. (...) Como parto desta premissa, de que há uma vulgarização na utilização do habeas corpus no STF, eu confesso que é a vez primeira que ouço essa argumentação nesse sentido de que efetivamente é uma heterodoxia do Supremo dizer que não cabe HC mas analisar para concessão de ofício. Eu particularmente entendo que essa seria a postura correta de um Supremo Tribunal Federal diante desta constatação real, eu acredito que realmente o Tribunal fique esperando o Supremo se pronunciar. (...) Essa postura vai desabarrotar o Supremo Tribunal Federal.”

Para Fux, ou a Corte adota a súmula 691 ou não.

Acerca da ideia de restrição, o ministro Marco Aurélio logo ponderou que, daqui a pouco, vai-se generalizar a decisão dessa espécie de impetração que é o habeas corpus monocrática e aí se inserir no plenário virtual o consequente agravo. A propósito, o decano da turma já se manifestou sobre a proposta de que as listas (agravos regimentais e embargos de declaração) possam ser colocadas para apreciação do plenário virtual.

Não sei, presidente, onde nós vamos parar. Porque hoje prender-se para depois apurar-se é a tônica. Prende-se até mesmo para se fragilizar um homem e se lograr a delação premiada. E enquanto não delata, não é libertado. Se recorre sucessivamente e se fica por isso mesmo. Avança-se culturalmente assim? Não, é retrocesso. É retrocesso quanto a garantias e franquias constitucionais. Adentra-se um campo muito perigoso quando se coloca até mesmo em segundo plano o princípio da não-culpabilidade.”

O presidente Luís Roberto Barroso destacou que a discussão é importante, mas que seria preciso refletir melhor acerca do tema. “Bem reconheço que no fundo há pouco sentido em a gente dizer que não conhece e ter o mesmo trabalho se tivesse conhecido. Mas é preciso pesar um pouco as implicações dessa mudança de jurisprudência.”

Ao fim, por maioria de votos, a turma não conheceu da impetração, nos termos do voto do relator, vencido o ministro Marco Aurélio, que conhecia e concedia a ordem.

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