“Estamos assistindo verdadeiro teatro do absurdo. Parafraseando Cícero: até quando vamos tolerar atos abusivos praticados por quem deveria dar bom exemplo de respeito à ordem jurídica, à ordem constitucional?”
O questionamento é do ministro Carlos Velloso, magistrado de carreira, integrante do STF quando do impeachment do ex-presidente Collor, e que presidiu aquela Casa, em entrevista exclusiva ao portal Migalhas quanto à decisão de Waldir Maranhão de anular a tramitação do impeachment da presidente Dilma.
Velloso lembra que, no processo, convive-se “com prazos e, sobretudo, em nome da segurança jurídica, com preclusões e trânsito em julgado”.
“É dizer, há sempre a fixação de prazos para defesa e momentos certos em que o juiz (ou a autoridade incumbida do processo administrativo) despacha e decide. O ato administrativo gera direitos e obrigações e está sujeito à preclusão, inclusive à preclusão máxima. Em termos de processo, anda-se sempre para frente, convindo esclarecer que a autoridade para praticar o ato depende de expressa autorização legal. Não tem competência funcional -- vale lembrar a advertência do notável e saudoso professor Caio Tácito -- a autoridade que quer, mas a autoridade que recebe da lei a competência, mesmo porque, acrescentamos, em termos de Direito Público, enquanto o particular está autorizado a fazer o que não é proibido, o agente público só pode fazer o que é expressamente permitido.”
S. Exa. afirma ainda quanto ao ato do presidente da Câmara:
“Atos apanhados pela preclusão, inclusive pela preclusão máxima - os atos do processo legislativo correm por conta do Senado - foram desenterrados numa decisão - a do atual presidente interino da Câmara - que retrata abuso de poder, e que os franceses denominam “détournement du pouvoir", ou desvio de finalidade. O abuso de direito da autoridade administrativa, e, no caso, o ato do presidente interino da Câmara é um ato administrativo praticado ao arrepio do processo legislativo, constitui, inclusive, crime. O abuso de direito é crime pela lei brasileira. Falamos, claro, em tese, dado que a palavra final corre por conta do Ministério Público. Em síntese, estamos assistindo verdadeiro teatro do absurdo. Parafraseando Cícero: até quando vamos tolerar atos abusivos praticados por quem deveria dar bom exemplo de respeito à ordem jurídica, à ordem constitucional?”