O entendimento é da 4ª turma do STJ ao julgar um processo em que o réu se recusou por duas vezes a fazer o exame, e o juízo de 1º grau reconheceu a presunção absoluta por considerar que seria impossível ao autor da ação apresentar provas por outros meios, tendo em vista se tratar de um relacionamento esporádico e clandestino.
O juízo afirmou que seria desarrazoado impor ao autor prova impossível. O réu, no entanto, reclamou que o magistrado antecipou o julgamento da matéria e com isso cerceou sua defesa, já que não havia no processo elementos mínimos que indicassem a existência do suposto relacionamento entre o casal. A sentença se baseou no art. 232 do CC, segundo o qual a recusa à perícia ordenada pelo juiz poderá suprir a prova que se pretendia obter com o exame.
De acordo com o ministro Luis Felipe Salomão, que proferiu o voto vencedor na 4ª turma, a questão deve ser tratada da mesma forma como quando há revelia em processo de investigação de paternidade. Nesses casos, os fatos alegados não podem ser tidos como verdadeiros, cabendo ao autor apresentar prova mínima dos fatos alegados. O ministro considera que a recusa ao exame de DNA não é mais grave do que a revelia.
"Também deve o autor, por simetria, provar minimamente os fatos apontados na inicial da ação."
Casos furtivos
O relator do processo, ministro Marco Buzzi, que ficou vencido no julgamento, afirmou que não se poderia exigir a produção de provas por parte do autor da ação, porque esta seria impossível. Segundo ele, o relacionamento sexual, muitas vezes, reveste-se de caráter reservado e furtivo, o que dificulta a produção de prova.
Para Salomão, a prova do relacionamento amoroso não é condição indispensável para a declaração de paternidade, muito menos a prova de um relacionamento clandestino ou esporádico. Mas a prova indireta, consistente em indícios, deve ser produzida para que seja prestigiada a verdade real dos fatos. Ele votou no sentido de que o processo volte à primeira instância para que sejam produzidas as provas necessárias.
Segundo alegações do processo, o autor, atualmente com 32 anos, teria tido educação custeada no exterior pelo réu, mas sempre por meios indiretos e com a preocupação de não deixar provas da paternidade.
O réu sustentou que, dado o seu poder econômico, é inviável fornecer material genético toda vez que alguém alega ser seu filho, ainda mais diante de uma realidade de laboratórios mal equipados e de profissionais mal treinados.
Presunção relativa
No Brasil não há norma que obrigue a pessoa a se submeter ao exame de DNA.
No recurso de apelação, a defesa sustentou que, nos termos do art. 2º-A da lei 8.560/92 (com redação dada pela lei 12.004/09), "a recusa do réu em se submeter ao exame genético gerará a presunção de paternidade, a ser apreciada com o conjunto probatório". A defesa sustenta que não houve contexto probatório levado em consideração pela sentença.
Ao julgar a matéria, o TJ/SP aplicou o enunciado da Súmula 301 do STJ, a qual determina que, "em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade" – ou seja, presunção relativa, que admite prova em contrário.
O TJ/SP apontou julgado do STF segundo o qual "a necessidade da produção da prova há de ficar evidenciada para que o julgamento antecipado da lide implique cerceamento de defesa" (RExt 101.171).
Situação delicada
O ministro Luis Felipe Salomão considerou que, no caso em julgamento, não houve menção na sentença nem no acórdão aos fatos narrados ou às provas eventualmente produzidas pelas partes.
"Tudo no processo revela a necessidade de as instâncias ordinárias avaliarem com mais precisão a situação posta nos autos, que é extremamente delicada." Salomão entende que o TJSP pode vir a aplicar o enunciado da Súmula 301 do STJ, como o fez, mas após o necessário cotejo da prova produzida.
Votaram com Salomão os ministros Raul Araújo e Antonio Carlos Ferreira para dar parcial provimento ao pedido do réu recorrente. A ministra Isabel Gallotti também deu parcial provimento, mas em menor extensão.
O ministro Marco Buzzi, relator original, negou provimento por entender que a procedência da ação investigatória é medida necessária, tendo em vista que não existe nos autos nenhuma prova capaz de desconstituir a presunção relativa de paternidade decorrente da recusa do réu.
O número do processo não é divulgado em razão de segredo judicial.