De acordo com a Anvisa, o anúncio ainda provocaria temor ao sugerir que o não uso do medicamento pudesse sujeitar o indivíduo a situações de constrangimento por meio da frase “Não passe vergonha, passe Vodol”. E que, ainda, estimularia o uso indiscriminado do medicamento ao usar a frase “Use Vodol, Vodol acaba com as micoses”, irregularidades tipificadas, conforme a Anvisa, no art. 10, V, da lei 6.437/77.
A 15ª vara Federal do DF acolheu o argumento da Anvisa. No caso, a Anvisa aplicou multa de R$ 20 mil, que, depois de recurso administrativo, foi reduzida para R$ 10 mil.
A Globo recorreu no TRF alegando que “os veículos de comunicação não podem ser responsabilizados por vícios de conteúdo verificados nas matérias publicitárias por eles veiculadas, responsabilidade que recai exclusivamente sobre os fornecedores dos produtos”. Disse, ainda, não ser possível à Anvisa, via resolução (resolução RDC 102/00), impor limites à propaganda de medicamentos, matéria regida pelo princípio da legalidade na forma do art. 220, § 4º, da CF.
Ao analisar o recurso, o relator, desembargador Federal Jirair Aram Megueriam, deu razão à Globo. Segundo o magistrado, não consta na lei 9.294/96 a previsão de que na propaganda de medicamentos deverá haver referência ao número de registro do produto na Anvisa e à contraindicação principal do produto. A decisão da turma foi unânime.
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Processo : 0058163-07.2011.4.01.3400
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APELAÇÃO CÍVEL N. 0058163-07.2011.4.01.3400/DF (d)
RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL JIRAIR ARAM MEGUERIAN
APELANTE : GLOBO COMUNICACAO E PARTICIPACOES S/A
ADVOGADO : LUIS ROBERTO BARROSO
ADVOGADO : ANA PAULA DE BARCELLOS
ADVOGADO : VIVIANE PEREZ
ADVOGADO : KARIN BASILIO KHALILI
ADVOGADO : RAFAEL BARROSO FONTELLES
ADVOGADO : FELIPE MONNERAT SOLON DE PONTES RODRIGUES
ADVOGADO : FELIPE FIDELIS COSTA DE BARCELLOS
ADVOGADO : JULIA RYFER
ADVOGADO : THIAGO MAGALHÃES PIRES
ADVOGADO : DEBORAH G DAHER
APELADO : AGENCIA NACIONAL DE VIGILANCIA SANITARIA - ANVISA
PROCURADOR : ADRIANA MAIA VENTURINI
EMENTA
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PROPAGANDA DE MEDICAMENTOS. ART. 220, § 4º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. EXIGÊNCIA DE LEI FEDERAL. AUTO DE INFRAÇÃO. INFRAÇÃO PREVISTA EM RESOLUÇÃO. APLICAÇÃO DE PENALIDADE: IMPOSSIBILIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA NA ESFERA ADMINISTRATIVA NÃO CONFIGURADO.
I - O só fato de a autoridade administrativa responsável pelo julgamento de impugnação a auto de infração sanitária acrescentar penalidade originariamente não prevista na autuação questionada não configura cerceamento de defesa, seja porque, no caso concreto, decorrente da mesma situação fática que ensejou a atuação administrativa, seja porque o administrado pôde se defender por meio da interposição de recurso administrativo, sem que maiores prejuízos lhe tenham sido causados.
II - A teor do § 4º do art. 220 da Constituição Federal, "a propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias estará sujeita a restrições legais, nos termos do inciso II do parágrafo anterior, e conterá, sempre que necessário, advertência sobre os malefícios decorrentes de seu uso". O inciso II do § 3º do art. 220 do diploma constitucional, por seu turno, dispõe que "compete à lei federal estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de propagandas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente".
III - Em razão da previsão de que a propaganda de medicamentos seja regida por lei federal, foi editada em 1996 a Lei nº 9.294, de cujo art. 7º não consta a necessidade, tampouco qualifica como infração a omissão, de que seja informado "o número de registro do medicamento na ANVISA" e a "contraindicação principal do produto", infrações nas quais incorreu a impetrante e que apenas estão previstas na Resolução RDC nº 102/2000 (arts. 3º, I, e 12, "a", respectivamente).
IV - Ineficaz para conferir validade à atuação administrativa o fato de ter constado do auto de infração sanitária que a conduta imputada à impetrante seria contrária ao art. 94, § 1º, II, do Decreto nº 79.094/77, que disciplina o padrão dos dizeres da rotulagem e das bulas dos medicamentos e que determina a exigência de que deles constem o número de registro do produto na ANVISA, hipótese diversa dos autos, e ao art. 10, V, da Lei nº 6.437/77, que apenas afirma constituir infração sanitária a propaganda de produtos que contrarie a respectiva legislação, propaganda essa que é disciplinada pela Lei nº 9.294/96 e que não tipifica como infração as condutas imputadas à impetrante.
V - Não constando da Lei nº 9.294/96 a previsão de que na propaganda de medicamentos deverá haver referência ao "número de registro do produto na ANVISA" e à "contraindicação principal do produto", exigência apenas contida na Resolução RDC nº 102/2000, não há porque subsistir, diante da ausência de amparo legal, o auto de infração questionado. Prejudicialidade da tese de inexistência de responsabilidade do veículo de comunicação.
VI - Não analisada a alegação da impetrante, veiculada por meio de petição após a conclusão do processo para relatório/voto, de que sobre a matéria controvertida a ANVISA já teria se manifestado em processo judicial distinto, trazendo aos autos cópia da respectiva peça processual, desnecessária a intimação da agência reguladora para sobre ela se manifestar.
VII - Recurso de apelação interposto pela impetrante provido e concessão da segurança vindicada (item V). Ressarcimento das custas processuais pela ANVISA. Sem honorários de sucumbência em razão das Súmulas nº 105/STJ e 512/STF.
ACÓRDÃO
Decide a Sexta Turma, por unanimidade, dar provimento à apelação.
Sexta Turma do TRF da 1ª Região - 13.12.2013.
Desembargador Federal JIRAIR ARAM MEGUERIAN
Relator