A cidade está em polvorosa; milhares de paulistas tomam as ruas da capital do interior do Estado. Jovens, adultos, idosos, todos se unem com um único objetivo: mudar o curso da história vigente, com novos princípios e valores a guiarem a política nacional. A cena, ocorrida em 9 de julho de 1932, em muito se assemelha às recentes manifestações que se alastraram pelo país em pleno ano de 2013. A Revolução Constitucionalista encontra eco, 81 anos depois, na necessidade de transformação requerida pela sociedade brasileira.
Liderados por SP (também palco de estreia das passeatas contemporâneas), os constitucionalistas pegaram em armas contra o governo Federal do presidente Getúlio Vargas. À época, a suspensão da Constituição de 1891 e a falta de perspectiva da promulgação de uma nova Carta originaram manifestações populares encabeçadas por diversos setores da sociedade, principalmente estudantes.
Ao final, a superioridade das armas a serviço do governo triunfou sobre a determinação e coragem dos revolucionários na busca por uma Constituição. Mas em 1933 foi eleita uma Constituinte e em 1934 o país tinha uma nova Carta Magna, consequência direta da Revolução de 1932. É certo que durou pouco, pois o ditador Vargas tinham mefistofélicos planos para o país, com sua Constituição Polaca e seu Estado Novo.
Mas o fato é que assim como as passeatas de outrora, estas de agora levaram às ruas do país milhões de brasileiros e forçaram o governo a repensar as estruturas de poder, com sugestões (Constituinte, plebiscito) que reformem a política nacional.
Tanto em 1932 quanto em 2013 a Constituição é a base das reivindicações. Enquanto no século XX o objetivo era impedir que Vargas limitasse a participação pública nas decisões mais importantes do país, e uma nova Constituição fazia-se necessária, as passeatas ocorridas desde o início de junho exigem, acima de tudo, o cumprimento dos direitos sociais na Carta Magna atual.
Não à toa, comentando as manifestações ocorridas recentemente, o ex-ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos disse: "A sociedade se organiza politicamente em torno do Estado para realizar a Constituição, não para negar os seus pressupostos mais fundamentais." Nesse sentido, vale a pena relembrar palestra proferida pelo jornalista e exilado Vivaldo Coaracy, diretor da sucursal do jornal O Estado de S.Paulo no Rio, no dia 12 de julho de 1932:
“Duas palavras
Poucas palavras para dizer duas verdades que precisam de ser repetidas.
O movimento constitucionalista de que S. Paulo, com a solidariedade das forças armadas, na plena consciência das suas responsabilidades para com o país, tomou a iniciativa, é de caráter essencialmente nacional. Só a insídia, a perfídia e a mentira podem pretender atribuir-lhe um aspecto regionalista e partidário.
Os que acabamos de recorrer ao argumento extremo das armas, sabemos que o fazemos em nome da vontade brasileira, da vontade profunda de um povo cansado de ser ludibriado, de um povo que aspira à liberdade sob o regime da lei, de um povo farto do regime de arbítrio e do capricho a que vem sendo submetido há longos vinte meses.
É das forças vivas de toda a nacionalidade, do extremo norte ao sul extremo, de leste a oeste, que se levanta este anseio, esta aspiração de todo o Brasil, que veio explodir em S. Paulo porque a terra onde soou um dia o grito do Ipiranga há de cumprir o seu destino histórico.
Este movimento é nacional, este movimento é brasileiro, feito em nome do Brasil, com forças de todo o Brasil e pelo Brasil!
E esta é a primeira verdade que é preciso ser repetida para combater a mentira de que os nossos inimigos se servem como de uma arma insidiosa, traiçoeira e vil.
O movimento constitucionalista que acaba de irromper não é uma contrarrevolução. Iludem-se ou mentem os que o pensam e os que o dizem.
A vida dos povos é como a vida dos indivíduos. O que está feito não pode ser desfeito. A existência é irreversível e não se reconstrói o passado.
Este movimento é simplesmente um passo a frente na Revolução Brasileira, mais uma etapa na evolução nacional.
Tomamos as armas e pomo-nos em marcha, como vanguardeiros da vontade do Brasil, para reconduzir a Revolução a sua verdadeira finalidade, para arrancá-la do predomínio daqueles que a desvirtuaram, que esqueceram os princípios e ideais que lhe deram alma e virtude.
Não olhamos para trás. Marchamos para frente, em nome do Brasil e pela Revolução!
E esta é a segunda verdade que nesta hora é preciso ser repetida para combater a mentira de que os nossos inimigos se servem como uma arma insidiosa, traiçoeira e vil.” (grifo nosso)
História em vida
Em visita ao Memorial'32, no Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo – IHGSP (rua Benjamin Constant, 158, SP), a TV Migalhas registrou documentos, obras, periódicos e artefatos dos mais variados que narram os acontecimentos da luta constitucionalista. O Memorial, inaugurado em 2005, abriga acervo raro deste capítulo importante da história nacional.