A seccional catarinense da OAB ingressou com ação civil pública, com pedido de liminar, na 3ª vara Federal para garantir que os advogados tenham acesso aos presos, sob pena de multa diária de R$ 60 mil. Os presos estão incomunicáveis desde o início da greve dos agentes penitenciários, na quarta-feira, 17.
Na ação, protocolada no final da tarde desta quarta-feira, 24, a OAB sugere que ou o Estado disponibilize policiais militares para garantir a segurança e comunicação entre presos e seus advogados, ou que 30% dos agentes permaneçam em atividade nos estabelecimentos prisionais - como determina a legislação trabalhista no caso de greve em serviço público considerado essencial. O direito do advogado de conversar com o cliente preso está previsto no Estatuto da Advocacia (lei 8.906).
Veja abaixo a petição inicial.
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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA VARA CÍVEL DE FLORIANÓPOLIS – SEÇÃO JUDICIÁRIA DE SANTA CATARINA
PEDIDO URGENTE
A ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – SECCIONAL DE SANTA CATARINA, serviço público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa, inscrita no CNPJ nº 82.519.190/0001-12, com sede à Rua Paschoal Apóstolo Pítsica, 4860, Agronômica, Florianópolis, Santa Catarina, por seus procuradores, com fulcro nos arts. 1º, III, e 5º, LV e LXIII, ambos da Constituição Federal, art. 7º, III, da Lei nº 8.906/94, art. 461, par. 3º, do CPC, e observância da Lei nº 7.347/85, arts. 1º, IV, e 3º, entre outros dispositivos legais, vem à elevada presença de Vossa Excelência propor a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA
C/ PEDIDO LIMINAR
em face de: a) ESTADO DE SANTA CATARINA, pessoa jurídica de direito público, a ser citada na pessoa de seu representante legal, localizável na Avenida Prefeito Osmar Cunha, 289, Edifício Bancário J. J. Cupertino, CEP 88015-100;
b) SINDICATO DOS TRABALHADORES DO SERVIÇO PÚBLICO ESTADUAL DE SC – SINTESPE, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ nº 80.673.429/0001-89, a ser citado na pessoa do seu representante legal, encontradiço à Praça Olívio Amorim, 82, centro, Fpolis, SC, CEP 88020-090, ante os relevantes fatos e fundamentos perfilados abaixo:
RESUMO FÁTICO
É fato público e notório, dispensando maiores provas (art. 334, I, do CPC), que os servidores públicos estaduais ligados ao sistema penitenciário catarinense se encontram paralisados desde a semana passada, tendo em vista reivindicações de ordem salarial.
Por conta disto, os advogados não estão conseguindo ter acesso e manter qualquer tipo de comunicação com as pessoas que se encontram reclusas dentro dos estabelecimentos prisionais de Santa Catarina, fato este que vem causando enormes e gravíssimos prejuízos ao salutar direito de defesa dos seus clientes, conforme comprovam os documentos em anexo.
Vale ressaltar, neste pormenor, o termo de diligência elaborado pelo Dr. Fabrício Vargas Schütz, Membro da Comissão de Prerrogativas da OAB/SC, relatando as dificuldades encontradas no Presídio Feminino de Florianópolis (doc. anexo).
Situação ainda mais grave está ocorrendo na Cidade de Joinville, onde os agentes penitenciários daquela comuna vêm se negando a receber nos estabelecimentos prisionais as pessoas detidas provisoriamente ou em flagrante, estando elas recolhidas indevidamente nas respectivas Delegacias de Polícia e desprovidas de quaisquer condições mínimas de higiene, salubridade, alimentação, etc, conforme relatado nos ofícios encaminhados pelos Delegados Douglas Roberto de Cinque e Isaias Cordeiro, levando inclusive a Subseção da OAB de Joinville a impetrar habeas corpus em favor dos segregados (docs. anexos).
A Seccional Catarinense da Ordem dos Advogados do Brasil já encaminhou ofício à Secretaria de Justiça e Cidadania do Estado de Santa Catarina, solicitando “a elaboração e adoção de medidas paliativas para garantir o regular acesso dos advogados aos estabelecimentos prisionais, bem como assegurar o contato e a comunicação com os seus clientes reclusos, conforme preceitua o art. 7º, III, da Lei n. 8.906/94”, bem como ao Presidente do Tribunal de Justiça de Santa Catarina requerendo “sejam suspensos os prazos dos processos que envolvam réus presos”, não obtendo até o presente momento qualquer resposta (docs. anexos).
Outrossim, em 22 de abril último, o Presidente da Comissão de Assuntos Prisionais da OAB/SC se reuniu com representantes da segunda requerida, também pleiteando fosse disponibilizado um número mínimo de agentes penitenciários para garantir o acesso e a comunicação dos advogados com os segregados nas cadeias e presídios barriga-verde, também sem sucesso (doc. anexo).
Destarte, como até o presente momento os advogados estão incapacitados de manter qualquer contato com as pessoas recolhidas nos estabelecimentos prisionais, não podendo assim exercer com plenitude o seu mister e prejudicando sobremaneira o hierático direito de defesa dos seus clientes, não resta alternativa senão o socorro do Judiciário, como forma de coartar de maneira rápida e eficaz esta flagrante ilegalidade.
QUAESTIO JURIS
1. Competência da Justiça Federal.
De imediato, cumpre fixar a competência da Justiça Federal para processar e julgar esta ação civil pública, já que a OAB é uma autarquia profissional especial, com natureza de serviço público federal, conforme assentado pelo eg. TRF da 4ª Região no AG nº 2008.04.00.016937-6, Rel. Desa. Maria Lúcia Luz Leiria, D.E. 14/01/2009, cuja ementa soa:
“OAB. COMPETÊNCIA. SERVIÇOS DE CONSULTORIA E ASSESSORIA. ATIVIDADES PRIVATIVAS DE ADVOGADO. 1. Em se tratando a Ordem dos Advogados do Brasil de autarquia profissional especial, cuja natureza jurídica é de serviço publico federal, é competente a Justiça Federal para o julgamento do feito (...)”
2. Legitimidade ativa ad causam.
Inegável, também, a legitimidade ativa ad causam da OAB/SC para formular este pleito, consoante disposto no art. 5º, IV, da Lei nº 7.347/85, deste teor:
“Art. 5º. Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar:
IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista;”
De igual modo, o art. 57 da Lei nº 8.906/94 confere ao Conselho Seccional da OAB/SC as mesmas competências e funções atribuídas ao Conselho Federal, verbis:
“Art. 57. O Conselho Seccional exerce e observa, no respectivo território, as competências, vedações e funções atribuídas ao Conselho Federal, no que couber e no âmbito de sua competência material e territorial, e as normas gerais estabelecidas nesta lei, no regulamento geral, no Código de Ética e Disciplina, e nos Provimentos.”
Outrossim, o art. 54, incisos II e III, do EOAB, autoriza o Conselho Federal a “representar, em juízo ou fora dele, os interesses coletivos ou individuais dos advogados”, bem como “velar pela dignidade, independência, prerrogativas e valorização da advocacia”.
Esta condição esta também assentada pelo art. 49 do mesmo diploma:
“Art. 49. Os presidentes dos Conselhos e das Subseções da OAB têm legitimidade para agir, judicial e extrajudicialmente, contra qualquer pessoa que infringir as disposições ou os afins desta Lei.
Parágrafo único. As autoridades mencionadas no caput deste artigo têm, ainda, legitimidade para intervir, inclusive como assistentes, nos inquéritos e processos em que seja indiciados, acusados ou ofendidos os inscritos na OAB”.
Aplica-se ao presente caso, ainda, os preceitos contidos no art. 44, I e II, da Lei nº 8.906/94:
“Art. 44. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), serviço público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa, tem por finalidade:
I - defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas;
II - promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados em toda a República Federativa do Brasil”.
Já o art. 7º, III, do EOAB, dispõe que:
“Art. 7º São direitos do advogado:
III - comunicar-se com seus clientes, pessoal e reservadamente, mesmo sem procuração, quando estes se acharem presos, detidos ou recolhidos em estabelecimentos civis ou militares, ainda que considerados incomunicáveis”.
Assim, em se tratando de clara violação ao art. 7º, III, do Estatuto da Advocacia, fica configurada a mácula aos direitos e interesses coletivos e/ou individuais dos advogados catarinenses, comprovando a legitimidade da OAB/SC para propor a presente demanda, consoante definiu o TRF da 4ª Região no Agravo de Instrumento nº 2009.04.00.009299-2/SC, Rel. Des. ROGER RAUPP RIOS, julg. 21/07/09: R:
“(...) A entidade da advocacia é legítima para o aforamento desta ação civil pública, nos termos do artigo 44 da Lei nº 8.906/1944, que estabelece entre suas finalidades precípuas a defesa da Constituição e da ordem jurídica do Estado Democrático de Direito, hipóteses em que se amolda a alegação de edição de lei municipal com vício de inconstitucionalidade por ofender os princípios da impessoalidade e da moralidade administrativa. Ademais, o empreendimento cuja paralisação se requer afetará de modo direto as condições de habitabilidade do prédio da Seccional da OAB, donde também exsurge seu interesse e legitimidade (...)”.
Por fim, não é demasiado salientar que como estamos tratando de uma situação emergencial e especialíssima, a Diretoria da OAB/SC já autorizou o manejo desta ação civil pública, como preconiza o art. 105, V, ‘b’ e parágrafo único do Regulamento Geral da EOAB (doc. anexo):
“Art. 105. Compete ao Conselho Seccional, além do previsto nos arts. 57 e 58 do Estatuto:
V – ajuizar, após deliberação:
b) ação civil pública, para defesa de interesses difusos de caráter geral e coletivos e individuais homogêneos;
Parágrafo único. O ajuizamento é decidido pela Diretoria, no caso de urgência ou recesso do Conselho Seccional”.
3. Necessidade de manutenção de serviço essencial – Direito do advogado de comunicar-se com o seu cliente preso.
De outra banda, quanto ao direito de greve dos agentes penitenciários de Santa Catarina, os arts. 9º e 37, VII, da Constituição Federal, preconizam que:
“Art. 9º - É assegurado o direito de Greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender.
Art. 37- (...) VII- o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica”.
Leitura atenta a tais dispositivos revela que, para que o direito de greve seja exercido, é necessária a edição de lei específica para sua regulamentação, providência legislativa ainda não efetivada.
No entanto, em 25 de outubro de 2007, o Supremo Tribunal Federal, regulamentou o direito de greve dos servidores públicos, determinando que a Lei de Greve que estabelece as paralisações na iniciativa privada (Lei nº 7.783/89), passe a valer também para os servidores públicos, conforme assentado no Mandado de Injunção nº 712, cuja ementa segue:
“MANDADO DE INJUNÇÃO. ART. 5º, LXXI DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. CONCESSÃO DE EFETIVIDADE À NORMA VEICULADA PELO ARTIGO 37, INCISO VII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. LEGITIMIDADE ATIVA DE ENTIDADE SINDICAL. GREVE DOS TRABALHADORES EM GERAL [ART. 9º DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL]. APLICAÇÃO DA LEI FEDERAL N. 7.783/89 À GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO ATÉ QUE SOBREVENHA LEI REGULAMENTADORA. PARÂMETROS CONCERNENTES AO EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE PELOS SERVIDORES PÚBLICOS DEFINIDOS POR ESTA CORTE. CONTINUIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO. GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO. ALTERAÇÃO DE ENTENDIMENTO ANTERIOR QUANTO À SUBSTÂNCIA DO MANDADO DE INJUNÇÃO. PREVALÊNCIA DO INTERESSE SOCIAL. INSUBSSISTÊNCIA DO ARGUMENTO SEGUNDO O QUAL DAR-SE-IA OFENSA À INDEPENDÊNCIA E HARMONIA ENTRE OS PODERES [ART. 2O DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL] E À SEPARAÇÃO DOS PODERES [art. 60, § 4o, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL]. INCUMBE AO PODER JUDICIÁRIO PRODUZIR A NORMA SUFICIENTE PARA TORNAR VIÁVEL O EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS, CONSAGRADO NO ARTIGO 37, VII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL (...)” (MI nº 712, Rel. Min. EROS GRAU, julg. 25/10/2007).
Com efeito, enquanto o Congresso Nacional não legislar sobre o exercício do direito de greve do servidor público, mostra-se perfeitamente aplicável, por analogia, a Lei nº 7.783/89. Nesse viés, cumpre verificar, se na vertente hipótese, a greve deflagrada pela segunda demandada foi, ou não, exercida dentro dos limites estabelecidos pela lei de regência.
Para tanto, é preciso verificar se o movimento grevista respeitou a continuidade do serviço essencial atinente à segurança pública, em especial se estão sendo observados:
1) a prerrogativa do advogado em avistar-se com o seu cliente, para que possa desempenhar o seu múnus público em uma área tão sensível que trata da liberdade dos seres humanos custodiados pelo Estado.
2) o direito do preso ter o tratamento adequado no sistema carcerário, conforme a Lei de Execuções Penais;
3) o direito dos reclusos em ter contato com o seu advogado, a fim de ver assegurado o direito de defesa;
E tendo em vista os documentos acostados, a resposta é desenganadamente não. Os requeridos estão deixando de manter um número mínimo de agentes prisionais em exercício, no patamar de 30% de seus funcionários, necessários para garantir a comunicação dos presos com os seus respectivos advogados, como preconiza a lei 7.783/89, estabelecendo-se, para tanto, sistema de rodízio entre os grevistas.
O descumprimento dessa exigência, assim, implica na incomunicabilidade do preso e no cerceamento do exercício de profissão do advogado, vale dizer, importa, em tese, crime de abuso de autoridade, consoante leitura do artigo 3º, alínea "j", da Lei nº 4.898/1965, que define como abuso de autoridade qualquer atentado “aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício profissional.”
Afinal, a própria Lei nº 7.783/1989, no parágrafo único do seu artigo 11, aduz que "são necessidades inadiáveis da comunidade aquelas que, não atendidas, coloquem em perigo iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população".
Assim, a paralisação de todos os agentes penitenciários poderá trazer prejuízos não só ao direito de defesa dos segregados, mas também a possibilidade de uma insegurança ainda maior ao já combalido sistema penitenciário catarinense, tais como a ocorrência de rebeliões dentro dos presídios, mortes, fuga de presos, etc.
Neste cenário, de acordo com o art. 14 da Lei n° 7.783/1989, a inobservância destas premissas constitui abuso do direito de greve, sendo possível a intervenção do Judiciário para garantir este serviço essencial do Estado relativo à segurança pública. Afinal, os advogados vêm sendo impedidos de adentrarem nos estabelecimentos prisionais pelos próprios agentes penitenciários, em claro desrespeito ao estatuído no art. 7º, III, do EOAB, conforme demonstrado no termo de diligências elaborado pelo Dr. Fabrício Vargas Schütz, Membro da Comissão de Prerrogativas da OAB/SC, relatando as dificuldades encontradas no Presídio Feminino de Florianópolis (doc. anexo).
Frise-se, por oportuno, que o direito do preso se entrevistar com seu advogado possui contornos de verdadeira garantia, assim definida pela Convenção Americana de Direitos Humanos — Pacto de San José da Costa Rica — em seu artigo 8º, 6º inciso, ao situar entre as “garantias judiciais” o “direito ao acusado de defender-se pessoalmente ou de ser assistido por um defensor de sua escolha e de comunicar-se, livremente e em particular, com seu defensor.” Sobre o tema, o STJ já se manifestou:
“ADMINISTRATIVO - DIREITO DO PRESO - ENTREVISTA COM ADVOGADO - ESTATUTO DA OAB - LEI DE EXECUÇÕES PENAIS - RESTRIÇÃO DE DIREITOS POR ATO ADMINISTRATIVO - IMPOSSIBILIDADE.
1. É ilegal o teor do art. 5º da Portaria 15/2003/GAB/SEJUSP, do Estado de Mato Grosso, que estabelece que a entrevista entre o detento e o advogado deve ser feita com prévio agendamento, mediante requerimento fundamentado dirigido à direção do presídio, podendo ser atendido no prazo de até 10 (dez) dias, observando-se a conveniência da direção.
2. A lei assegura o direito do preso a entrevista pessoal e reservada com o seu advogado (art. 41, IX, da Lei 7.210/84), bem como o direito do advogado de comunicar-se com os seus clientes presos, detidos ou recolhidos em estabelecimento civis ou militares, ainda que considerados incomunicáveis (art. 7º, III, da Lei 8.906/94).
3. Qualquer tipo de restrição a esses direitos somente pode ser estabelecida por lei.
4. Recurso especial improvido” (REsp 673.851/MT, Rel. Ministra ELIANA CALMON, julg. 08/11/2005)Neste cenário, ad argumentandum tantum, a conduta ilegal dos agentes penitenciários poderá inclusive causar a nulidade de inúmeros atos processuais realizados durante o período de greve, tendo em vista o severo cerceamento de defesa decorrente da impossibilidade dos advogados conversarem com os seus clientes presos.
Outrossim, deve ser levado em conta a situação gravíssima existente na Cidade de Joinville, onde os agentes penitenciários daquela comuna vêm se negando a receber nos estabelecimentos prisionais as pessoas detidas provisoriamente ou em flagrante, estando elas recolhidas indevidamente nas respectivas Delegacias de Polícia e desprovidas de quaisquer condições mínimas de higiene, salubridade, alimentação, etc, repita-se, conforme relatado nos ofícios encaminhados pelos Delegados Douglas Roberto de Cinque e Isaias Cordeiro, levando inclusive a Subseção da OAB de Joinville a impetrar habeas corpus em favor dos segregados (docs. anexos).
Destarte, em se tratando de serviço público essencial, os agentes penitenciários deveriam manter um mínimo de funcionários para atendimento aos advogados que adentrar nos estabelecimentos prisionais, sob pena de ser considera ilegal a sua greve. Em caso análogo envolvendo policiais civis no Distrito Federal, o TJDF definiu:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. GREVE DOS POLICIAIS CIVIS DO DISTRITO FEDERAL. ANTECIPAÇÃO DA TUTELA. SERVIÇO ESSENCIAL À SOCIEDADE. DECISÃO MANTIDA. CONFORME PRESCREVE O ARTIGO 273 DO CPC, A ANTECIPAÇÃO DA TUTELA ESTÁ CONDICIONADA A COMPROVAÇÃO DA VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES E DA POSSIBILIDADE DE OCORRÊNCIA DE DANO IRREPARÁVEL OU DE DIFÍCIL REPARAÇÃO. ACERCA DO DIREITO DE GREVE DOS POLICIAIS CIVIS, O C. STF JÁ SE MANIFESTOU NO SENTIDO DE SER RELATIVIZADO TAL DIREITO, POR EXERCEREM, OS POLICIAIS, ATIVIDADES RELACIONADAS À MANUTENÇÃO DA ORDEM PÚBLICA E À SEGURANÇA PÚBLICA, SOBRELEVANDO OS INTERESSES MAIORES DA SOCIEDADE E A BUSCA DO BEM COMUM; LOGO, PATENTE A VEROSSIMILHANÇA E O RISCO DE DANO IRREPARÁVEL. DECISÃO MANTIDA” (AI nº 0005724-33.2011.807.0000, Rel. Desa. CARMELITA BRASIL, julg. 27/05/2011).
Mutatis mutandis, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina segue o mesmo darsana:
“É certo que o direito de greve tem índole constitucional (art. 9º); porém, não é ele absoluto, visto que o Legislador Originário lhe impôs certas limitações, quais sejam, quando se trata de serviço ou atividade essencial, os sindicatos, os empregadores e os trabalhadores ficam obrigados a garantir, durante o ato de paralisação, a prestação dos serviços indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade (§ 1º) e, no caso de abuso de direito, os responsáveis sujeitam-se às penas da Lei (§ 2º) (...)” (Apelação Cível nº 2004.018818-8, Rel. Des. GILBERTO GOMES DE OLIVEIRA, julg. 28/02/2013).
Frente ao elencado, a procedência desta actio é medida impositiva.
PEDIDO LIMINAR
Com fulcro no art. 12 da Lei nº 7.347/85 c/c art. 461, § 3º, do CPC, inter alia, necessário o deferimento de medida liminar para determinar que os réus disponibilizem ao menos 30% do efetivo dos agentes prisionais do Estado de Santa Catarina, a fim de que os advogados possam ter acesso e comunicação com os seus clientes recolhidos nos estabelecimentos prisionais, sob pena de cominação de multa diária, no valor R$ 60.000,00 (sessenta mil reais).
A fumaça do bom direito está evidenciada em todos os argumentos narrados ao longo deste petitório, em especial:
a) termo de diligências elaborado pelo Dr. Fabrício Vargas Schütz, Membro da Comissão de Prerrogativas da OAB/SC, relatando as dificuldades encontradas no Presídio Feminino de Florianópolis (doc. anexo).
b) ofícios encaminhados pelos Delegados Douglas Roberto de Cinque e Isaias Cordeiro, relatando que os agentes penitenciários de Joinville estão se recusando a receber nos estabelecimentos prisionais as pessoas presas provisoriamente ou em flagrantes, fato este que levou a Subseção da OAB de Joinville a impetrar habeas corpus em favor dos segregados;
c) violação ao art. 7º, III, do EOAB, dada a impossibilidade dos advogados em ter acesso e comunicação com os seus clientes reclusos, conjurando assim o pleno exercício do seu múnus público;
b) necessidade de manter um mínimo de agentes penitenciários necessários para garantir o funcionamento do serviço essencial atinente à segurança pública, conforme reiteradas decisões dos nossos tribunais pátrios;
c) severos prejuízos ocasionados ao direito de defesa das pessoas segregadas, que não podem conversar com os seus defensores sobre os fatos que lhe são imputados, em clara ofensa ao art. 5º, LV e LVIII, da CF;
d) possibilidade de uma insegurança ainda maior ao já combalido sistema penitenciário catarinense, tais como a ocorrência de rebeliões dentro dos presídios, mortes, fuga de presos, etc.
Já o perigo da demora encontra-se consubstanciado na mantença da greve dos agentes penitenciários por tempo indeterminado, sendo que, neste período, continuam tramitando normalmente os processos criminais das pessoas presas, que se encontram impossibilitadas de discutirem com os seus patronos todos os nuances necessários para a sua defesa.
Destarte, necessária a concessão de liminar para garantir o pleno cumprimento do art. 7º, III, do EOAB, estabelecendo que, depois de demonstrada e conferida as respectivas credenciais do profissional, os requeridos tomem medidas no sentido de garantir a comunicação e o acesso dos advogados com os seus clientes segregados, no prazo máximo de 20 (vinte) minutos, evitando-se assim eventual operação padrão dos agentes penitenciários.
À derradeira, pedem desculpas os signatários por algum eventual erro ou excesso, eis que este petitório foi redigido de um só fôlego.
REQUERIMENTOS
REQUER, ante o exposto, se digne Vossa Excelência, em sua tradição de grandeza e sensibilidade, conceder liminar, inaudita altera pars, para determinar que os réus garantam o mínimo necessário de 30% dos agentes penitenciários em atividade nos estabelecimentos prisionais, ou que o Estado de Santa Catarina disponibilize policiais militares, a fim de garantir a segurança e comunicação entre os advogados e os seus clientes reclusos, sob pena de multa diária no valor R$ 60.000,00 (sessenta mil reais).
REQUER, ainda, a citação dos réus para contestar a presente ação, no endereço consignado preambularmente, sob pena de revelia, bem como a intimação do Ministério Público Federal, para fins de acompanhar o presente feito.
REQUER, outrossim, a produção de ampla prova em direito admitida, sem exceção, tais como requisição de documentos públicos e particulares, perícia, oitiva de testemunhas, etc, todas marcadas com a cláusula da imprescindibilidade.
REQUER, por fim, a total procedência desta actio, confirmando a liminar pleiteada, determinando que os réus garantam o mínimo necessário de 30% dos agentes penitenciários em atividade nos estabelecimentos prisionais, ou que o Estado de Santa Catarina disponibilize policiais militares, a fim de garantir a segurança e comunicação entre os advogados e os seus clientes reclusos, condenando-se a parte adversa nos ônus sucumbenciais de estilo. Far-se-á a salutar JUSTIÇA.
Dá-se à causa o valor de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais).
Pede Deferimento
Florianópolis, 24 de abril de 2013
pp. Tullo Cavallazzi Filho
Presidente da OAB/SC
pp. Leonardo Pereima de Oliveira Pinto
Conselheiro Estadual da OAB/SC
pp. Gabriel Henrique da Silva
Membro da Comissão de Segurança Pública