Migalhas Quentes

Exame demissional após dispensa gera reintegração de trabalhador inapto

Obreiro deveria ter sido encaminhado para o INSS.

16/4/2012

Um trabalhador procurou a JT afirmando que não poderia ser dispensado, pois, no exame demissional, realizado quinze dias após o encerramento do contrato, foi apurada a sua inaptidão para as funções exercidas na empresa. Por isso, o empregado requereu a nulidade da dispensa, com a reintegração no emprego e o devido encaminhamento ao INSS.

A desembargadora Lucile D'Ajuda Lyra de Almeida, da 5ª turma do TRT da 3ª região, destacou que a conduta da empresa, ao realizar o exame demissional depois da dispensa, é incorreta por si só. Entretanto, após a conclusão do médico, a reclamada deveria ter revisto o ato de dispensa, encaminhando o reclamante para o INSS, como recomendado pelo profissional da saúde. O que não poderia ter ocorrido é a manutenção da dispensa do trabalhador incapacitado.

"A conduta da reclamada demonstra omissão intencional ou, no mínimo, configura ato ilícito decorrente de culpa grave, em total desprezo à situação e saúde do trabalhador, como realçado na origem. Ressalte-se que o contrato do reclamante só não foi suspenso em razão dessa omissão, sendo que reclamada não pode se beneficiar dessa atitude e simplesmente dizer que a dispensa já estava homologada", frisou a magistrada.

Acompanhando esse entendimento, a turma declarou a nulidade da dispensa, determinando a reintegração do empregado, com posterior encaminhamento ao INSS. Foi mantida também a condenação da reclamada ao pagamento dos salários vencidos e dos que estão por vencer até o efetivo encaminhamento à Previdência Social.

Veja a íntegra da decisão.

___________

01179-2011-062-03-00-3 RO

RECORRENTE(S): ERGOM DO BRASIL LTDA.

RECORRIDO(S): J.E.N.

EMENTA: NULIDADE DA DISPENSA. EXAME DEMISSIONAL. REINTEGRAÇÃO. Constatada a incapacidade do reclamante em exame demissional realizado após a dispensa, a reclamada deveria ter revisto o seu ato e encaminhado o obreiro para o INSS como sugeriu o seu próprio médico. Ocorre que, na hipótese em exame, a reclamada optou por permanecer inerte, desamparando o trabalhador incapacitado que foi irregularmente dispensado. Assim, merece prevalecer a decisão que declarou a nulidade da dispensa, determinando a reintegração do reclamante, com pagamento dos salários e encaminhamento ao INSS.

Vistos os autos, relatado e discutido o presente Recurso Ordinário, DECIDE-SE:

RELATÓRIO

O MM. Juiz da Vara do Trabalho de Itaúna pela sentença proferida às fls. 185/189, cujo relatório adoto e a este incorporo, julgou parcialmente procedentes os pedidos.

Recorre a reclamada às fls.192/202. Insiste na validade da dispensa. Não se conforma com a manutenção do contrato de trabalho. Insurge-se contra a indenização por danos morais.

Depósito recursal e custas devidamente recolhidas às fls.200.

Contrarrazões às fls.205/210, com arguição de preliminar de não conhecimento do recurso em razão do disposto no artigo 557 do CPC.

Não se vislumbra, no presente feito, interesse público a proteger.

É o relatório.

VOTO

ADMISSIBILIDADE

Satisfeitos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso interposto, bem como das contrarrazões, regular e tempestivamente apresentadas. Ao contrário do que alega o reclamante, entendo que o recurso da reclamada não é manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado, ou em confronto com súmula ou jurisprudência, o que torna inaplicável o disposto no artigo 557 do CPC.

DA VALIDADE DA DISPENSA - DA MANUTENÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO

A reclamada alega que o reclamante não se encontrava em tratamento médico que o impedisse de laborar quando da ruptura do pacto laboral. Ressalta que o obreiro não apresentou atestados médicos nesse sentido. Salienta que não há qualquer documento que comprove que o recorrido se encontrava inapto quando de sua dispensa. Aduz que a sua dispensa se deu de forma correta e legal. Afirma que é direito potestativo do empregador a dispensa sem justa causa do trabalhador, ressalvando-se a hipótese de contrato suspenso ou interrompido, ou se o empregado é detentor de garantia de emprego. Insiste que o contrato do reclamante estava em pleno vigor quando de sua dispensa. Alega que não há que se falar em nulidade da rescisão contratual e manutenção ilimitada do contrato de trabalho, uma vez que, quando da dispensa do obreiro, não existia qualquer estabilidade, seja em razão da ausência dos requisitos estabelecidos no artigo 118 da Lei 8.213/1991, seja por qualquer outra razão.

Ressalta que, no caso em exame, não restou comprovada a existência de doença profissional, sendo que esta somente pode ser atestada por laudo médico pericial do INSS.

Afirma que a doença que o reclamante alega possuir não tem relação com as atividades exercidas na empresa, sendo que ele mesmo confessa que tal doença foi diagnosticada antes mesmo de ser admitido na recorrente. Informa que o reclamante não percebeu auxílio-doença acidentário no período de 12 (doze) meses que antecederam a dispensa voluntária. Cita a Súmula 378 do TST.

Examina-se.

O reclamante alegou, na inicial que foi dispensado em 02.02.2011 e que ao realizar o exame demissional em 17.02.2011 restou constatada a sua inaptidão para o trabalho, sendo que conforme relatório médico deveria ser encaminhado para o INSS, o que não foi cumprido pela reclamada. Requereu a nulidade da dispensa em razão de sua incapacidade. Pediu a reintegração e o devido encaminhamento para a Autarquia Previdenciária.

A primeira reclamada, em defesa, insistiu na validade da dispensa do reclamante, afirmando que ele não faz jus à manutenção do contrato em face da inexistência de garantia de emprego.

Verifica-se do documento de fls.139 que se consubstancia no exame demissional do reclamante que o médico o declarou inapto para a função em 17.02.2011. No referido documento há também a observação médica no sentido de necessidade de

encaminhamento ao INSS.

Não se pode olvidar que o referido exame foi realizado apenas após a dispensa do obreiro que ocorreu em 02.02.2011 (fls.20).

Lado outro, os documentos de fls.22/29 revelam que o reclamante sofre de problemas na coluna, corroborando a conclusão do exame demissional.

O reclamante disse em seu depoimento de fls.181:

Que após o exame demissional, no dia seguinte, o depoente foi à empresa e a comunicou do resultado do exame...”.

...após isso, ficou aguardando contato com a empresa e somente após ligar para empresa três vezes, recebeu a resposta de que não tinha resposta, o que ocorreu após 30 dias da demissão...”.

O preposto da primeira reclamada disse às fls.182:

O reclamante fez seu exame demissional no dia 17.02.2011; a 1ª reclamada tomou conhecimento do resultado do exame do reclamante no dia 19.02.2011; perguntado que providências foram tomadas, respondeu que verificaram a data da dispensa e como ele já havia sido dispensado antes e com homologação, apenas arquivaram o atestado médico; não tomaram qualquer outra providência...”. (grifo meu)

Como bem asseverado pelo juízo a quo não se discute nos autos se a doença do reclamante é de origem ocupacional, sendo que as partes dispensaram perícia médica neste sentido (fls.37), tornando incontroversa a conclusão do médico da reclamada.

A conduta da ré, ao realizar o exame demissional após a dispensa já se mostra incorreta. Todavia, após a conclusão do seu médico, a ré deveria ter revisto a dispensa do reclamante e o encaminhado para o INSS como foi recomendado no exame.

Neste sentido, o reclamante, incapacitado, não poderia ser dispensado, sendo que a prova oral deixa absolutamente claro que a reclamada optou por ficar inerte diante da irregularidade constatada na dispensa do obreiro.

A conduta da reclamada demonstra omissão intencional ou, no mínimo, configura ato ilícito decorrente de culpa grave, em total desprezo à situação e saúde do trabalhador, como realçado na origem.

Ressalte-se que o contrato do reclamante só não foi suspenso em razão dessa omissão, sendo que reclamada não pode se beneficiar dessa atitude e simplesmente dizer que a dispensa já estava homologada.

Assim, merece prevalecer a decisão que declarou a nulidade da dispensa com a manutenção do contrato de trabalho, determinando a reintegração do reclamante ao emprego nas mesmas condições contratuais anteriores, bem como o seu encaminhamento ao INSS para fins de realização de perícia e requerimento de benefício previdenciário.

A sentença deferiu, ainda, os salários vencidos desde 02.02.2011, bem como os vincendos, inclusive aquele relativo aos quinze primeiros dias de afastamento até o efetivo encaminhamento à Autarquia Previdenciária.

O juízo a quo determinou que a reclamada proceda aos depósitos de FGTS do reclamante, devendo as parcelas relativas ao 13º salário e férias acrescidas do terço constitucional serem quitadas no decorrer do contrato, observada a época do

encaminhamento ao INSS; eventual afastamento e como de efetivo trabalho o período de 02.02.2011 até a reintegração.

A sentença autorizou ainda, a dedução dos valores pagos a título de verbas rescisórias, bem como da multa de 40%, caso demonstrado o seu pagamento.

Nego provimento.

DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS

A reclamada não se conforma com a indenização por danos morais. Insiste na validade da dispensa do reclamante. Diz que o obreiro não demonstrou qualquer prejuízo, sendo que não há provas de que foi impedido de reingressar no mercado de trabalho. Requer a redução do valor fixado a título de indenização por danos morais.

Examina-se.

O reclamante alegou, na inicial, que a manutenção de sua dispensa diante da inaptidão declarada no exame demissional e o seu não encaminhamento ao INSS geram danos morais.

A reclamada, por sua vez, afirmou que a dispensa do reclamante foi correta e legal e que estão ausentes os requisitos para o deferimento de indenização por danos morais.

Na teoria subjetivista da responsabilidade civil estão presentes três elementos ditos essenciais, quais sejam, a ofensa a uma norma preexistente ou erro de conduta, um dano e o nexo causal entre uma e outro.

Nesse contexto, a pretensão indenizatória por danos morais e materiais, prevista no artigo 7º, XXVIII, da CR/88 e artigos 186 e 927 do Novo Código Civil, pressupõe necessariamente, um comportamento do agente que, (...) “desrespeitando a ordem jurídica, cause prejuízo a outrem, pela ofensa a bem ou direito deste. Esse comportamento deve ser imputável a consciência do agente por dolo (intenção) ou por culpa (negligência, imprudência ou imperícia), contrariando seja um dever geral do ordenamento jurídico (delito civil), seja uma obrigação em concreto (inexecução da obrigação ou do contrato)”. (Rui Stoco, Responsabilidade Civil, 2ª ed., Revista dos Tribunais).

O comportamento do agente que desrespeita a ordem jurídica, causando prejuízo a outrem pela ofensa a bem ou direito deste, gera responsabilidade civil, traduzindo-se, na prática, pela reparação do dano ocasionado, é o ilícito figurando como fonte geradora de responsabilidade, devendo o agente recompor o patrimônio (moral ou econômico) do lesado, ressarcindo-lhe os prejuízos (danos) acarretados.

Como bem asseverado na decisão de origem, a reclamada, durante os fatos narrados nesse processo, demonstrou total desprezo pelos direitos do empregado, pela sua saúde e dignidade humana, já que deixou o reclamante desamparado, apesar de estar ciente de sua incapacidade laborativa, preferindo ficar inerte, ao argumento que a dispensa já tinha sido efetivada antes do exame demissional.

Destaque-se, ainda, a atitude da ré que não se dignou sequer a dar uma posição para o reclamante sobre o exame demissional, sendo que o obreiro ficou aguardando a referida resposta e não fez o requerimento do benefício previdenciário, como se apura de suas declarações de fls.181.

Apesar de o reclamante poder se dirigir diretamente ao INSS, na hipótese em exame, não há dúvidas de que esse encaminhamento deveria ter sido feito pela reclamada, como realçado na origem.

Portanto, merece prevalecer a decisão que considerou que a conduta da ré implica, no mínimo, omissão culposa que atingiu a dignidade humana do reclamante, o que enseja a indenização por danos morais requerida.

Para se arbitrar o valor da indenização por danos morais, deve-se adotar critérios orientadores, tais como a natureza e a gravidade do ato ofensivo, bem como a intensidade de repercussão do ato e intensidade do sofrimento do ofendido.

Assim, irretocável a decisão que fixou a indenização por danos morais em R$10.000,00.

Não houve violação de quaisquer dispositivos legais ou constitucionais citados pela reclamada.

Desprovejo.

CONCLUSÃO

Conheço do recurso interposto, rejeito a preliminar e, no mérito, nego-lhe provimento.

FUNDAMENTOS PELOS QUAIS,

O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, por sua Quinta Turma, à unanimidade, conheceu do recurso interposto; rejeitou a preliminar e, no mérito, negou-lhe provimento.

Belo Horizonte, 13 de março de 2012.

LUCILDE D’AJUDA LYRA DE ALMEIDA

Desembargadora Relatora

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Notícias Mais Lidas

Leonardo Sica é eleito presidente da OAB/SP

21/11/2024

Suzane Richthofen é reprovada em concurso de escrevente do TJ/SP

23/11/2024

Ex-funcionária pode anexar fotos internas em processo trabalhista

21/11/2024

PF indicia Bolsonaro e outros 36 por tentativa de golpe em 2022

21/11/2024

Bolsonaro será preso na investigação de golpe? Criminalistas opinam

22/11/2024

Artigos Mais Lidos

A insegurança jurídica provocada pelo julgamento do Tema 1.079 - STJ

22/11/2024

Penhora de valores: O que está em jogo no julgamento do STJ sobre o Tema 1.285?

22/11/2024

ITBI - Divórcio - Não incidência em partilha não onerosa - TJ/SP e PLP 06/23

22/11/2024

Reflexões sobre a teoria da perda de uma chance

22/11/2024

STJ decide pela cobertura de bombas de insulina por planos de saúde

22/11/2024